Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
MECÂNICA GERAL II Marcelo Quadros Cinemática do ponto material I Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Descrever a cinemática dos corpos. � Analisar os movimentos retilíneo e curvilíneo plano, suas características de velocidade e aceleração. � Reconhecer as coordenadas retangulares e o deslocamento de um projétil. Introdução Um dos principais objetivos da cinemática dos corpos é criar movimentos desejados em qualquer partícula e, a partir disso, determinar suas posições, velocidades e acelerações. Na engenharia, a maioria dos projetos de desenvolvimento de sistemas de movimentação e transmissão inicia-se pela definição da configuração cinemática necessária para fornecer os movimentos desejados. Em geral, a análise das forças, tensões e deformações necessita de estudos preliminares da cinemática para o desenvolvimento dos projetos. Dentre esses movimentos, destacam-se os retilíneos e os curvilíneos planos, presentes em vários sistemas de movimentação e deslocamento, base fundamental para determinação das velocidades e acelerações de todas as partículas. Neste capítulo, você estudará a cinemática dos corpos, analisará os movimentos retilíneo e curvilíneo plano, assim como suas características de velocidade e aceleração. Por fim, conhecerá as coordenadas retangu- lares e o deslocamento de um projétil. Cinemática dos corpos A cinética é o estudo da relação existente entre as forças que atuam sobre um corpo, a massa do corpo e seu movimento. Usamos a cinética para prever o movimento causado por forças conhecidas ou determinar as forças necessárias para produzir um dado movimento (BEER et al., 2019). Entretanto, o objeto de nosso estudo é a cinemática, ou seja, o estudo do movimento sem levar em conta as forças ou outros fatores que o influenciam. Posição, velocidade, aceleração e tempo estão relacionados ao movimento de uma partícula que ocupa um ponto no espaço. Na realidade, uma partícula pode ser uma miçanga em um fio ou um avião no céu (NELSON et al., 2013). A primeira e a terceira leis de Newton do movimento são muito utilizadas na estática para estudar corpos em repouso e forças que atuam sobre eles. Essas duas leis também são usadas em dinâmica. De fato, elas são suficientes para o estudo do movimento de corpos que não têm aceleração. Entretanto, quando eles são acelerados, isto é, na cinemática, quando a intensidade ou a direção de suas velocidades mudam, é necessário utilizar a segunda lei de Newton do movimento, para relacionar o movimento do corpo às forças que atuam sobre ele. De acordo com a segunda lei, se a resultante das forças que atuam sobre uma partícula não for zero, a partícula terá uma aceleração proporcional à intensidade da resultante e na direção dessa força resultante. Mais do que isso, a razão entre as intensidades da força resultante e da aceleração pode ser usada para definir a massa da partícula (BEER et al., 2019). Engenheiros projetam e desenvolvem sistemas segundo essas leis, para que não haja falhas durante o tempo de vida útil desses mecanismos. Para isso, o grande objetivo desses profissionais é manter os esforços dentro dos limites aceitáveis para todos os materiais escolhidos conforme cada exigência. Esse é um dos objetivos principais da cinemática, ou seja, criar os movimentos desejados desses sistemas e, a partir disso, calcular as posições, velocidades e acelerações dos movimentos de cada mecanismo. Isso requer que todas as forças aplicadas nesses sistemas sejam definidas e mantidas dentro do limite escolhido e proporcionais à aceleração. Por exemplo, no caso da massa que não se altera com o tempo, podemos calcular a aceleração e a força em função do tempo. Já as tensões, por sua vez, são definidas em função das forças inerciais e forças internas. Em função dessa análise, podemos concluir que a cinemática é a base fundamental no desenvolvimento desses projetos, de pleno conhecimento do engenheiro, pois muitas definições básicas e decisões iniciais no processo do projeto envolvem os princípios da cinemática. A partir do estudo da cinemática, Cinemática do ponto material I2 garantimos que não haja falhas nesses importantes sistemas de movimentação demonstrados na Figura 1, a seguir. Figura 1. Exemplos de aplicação da cinemática. Fonte: (a) Basyn/Shutterstock.com; (b) u3d/Shutterstock.com; (c) ADS-DESIGN/Shut- terstock.com. 3Cinemática do ponto material I Para iniciarmos o estudo da cinemática, o primeiro passo é conhecer o movimento retilíneo das partículas. Movimento retilíneo de partículas Diz-se que uma partícula em deslocamento ao longo de uma linha reta está em movimento retilíneo. As únicas variáveis necessárias para descrever esse movimento são o tempo t e a distância ao longo da linha x em função do tempo. Com elas, podemos definir a posição, a velocidade e a aceleração da partícula, que descrevem completamente o seu movimento. Quando estudamos o movimento de uma partícula movendo-se em um plano (duas dimensões) ou no espaço (três dimensões), utilizamos um vetor de posição mais geral ao invés de simplesmente a distância ao longo de uma linha (BEER et al., 2019). Posição, velocidade e aceleração Em qualquer instante dado t, uma partícula ocupará certa posição sobre a linha reta. Para definir a posição P da partícula, escolhemos uma origem fixa O na linha reta e um sentido positivo ao longo da reta. Medimos a distância x de O a P e anotamos com um sinal positivo ou negativo, de acordo com o fato de P ter sido alcançado a partir de O movendo-se no sentido positivo ou no negativo ao longo da linha. A distância x, com o sinal adequado, define completamente a posição da partícula; ela é chamada de coordenada de posição da partícula. Por exemplo, a coordenada de posição correspondente a P, na Figura 2a, é de x = 5 m; e a coordenada correspondente a P©, na Figura 2b, é de x’ = –2 m. Quando a coordenada de posição x de uma partícula é conhecida para qualquer valor do tempo t, dizemos que o movimento da partícula é conhecido (BEER et al., 2019). Cinemática do ponto material I4 Figura 2. (a) Posição medida a partir da origem de coordenada posi- tiva; (b) posição medida a partir da origem de coordenada negativa. Fonte: Beer et al. (2019, p. 617). A velocidade e a aceleração podem estar em sentidos iguais ou diferentes. No caso de estarem no mesmo sentido, a partícula acelera, porém, quando a aceleração e a velocidade estiverem em sentidos opostos, ela desacelera, conforme demonstrado na Figura 3, a seguir. Figura 3. Sentido da velocidade e da aceleração. Fonte: Beer et al. (2019, p. 619). 5Cinemática do ponto material I Em todos os problemas relacionados à área da cinemática, você será soli- citado a determinar a posição, a velocidade e a aceleração de uma partícula em movimento retilíneo. À medida que lê cada problema, é importante que você identifique a variável independente (tipicamente t ou x) e também o que é pedido (por exemplo, a necessidade de expressar v como função de x). Nesse caso, pode ser útil começar cada problema escrevendo a informação dada e um enunciado simples do que deve ser determinado. Resumidamente, para todos os problemas envolvendo a cinemática, teremos as relações conforme apresentadas na Figura 4. Figura 4. Relações cinemáticas. Fonte: Beer et al. (2019, p. 629). Movimentos retilíneo e curvilíneo plano Movimento retilíneo é o movimento de um ponto P ao longo de uma linha reta que, por conveniência, será escolhida como o eixo x. Símbolos vetoriais são desnecessários nessa parte. A posição do ponto P em qualquer instante t é expressa em termos de sua distância x de uma origem fixa O no eixo x (NELSON et al., 2013). Cinemática do ponto material I6 Essa distância x é positiva ou negativa, de acordo com a convenção de sinal utilizada. A velocidade média vméd do ponto P durante o intervalo de tempo entre t e t + Δt, durante o qual sua posição muda dex para x + Δx, é o quociente . Matematicamente, isso é: A velocidade instantânea v do ponto P no tempo t é o limite da velocidade média quando o incremento de tempo aproxima-se de zero. Matematicamente, isso é: A aceleração média améd do ponto P durante o intervalo de tempo entre t e t + Δt, durante o qual sua velocidade muda de v para v + Δv, é o quociente . Matematicamente, isso é: A aceleração instantânea a do ponto P no tempo t é o limite da aceleração média quando o incremento de tempo aproxima-se de zero. Matematicamente, isso é: Para aceleração constante a = a0, as seguintes fórmulas são válidas: v = v0 + a0t v2 = v0 2 + 2a0s s = v0 t + ½ a0t 2 s = ½ (v+v0)t 7Cinemática do ponto material I onde: v0 = velocidade inicial; v = velocidade final; a0 = aceleração constante; t = tempo; s = deslocamento. No exemplo prático, temos um carro-foguete que se move ao longo de uma pista de teste reta, de acordo com a equação x = 3t3 + t + 2, onde x está em metros e t em segundos. Em função dessa equação e do tempo, quando t = 4s, podemos determinar: � deslocamento; � velocidade; � aceleração; � aceleração média no quinto segundo. O primeiro passo é determinar o deslocamento em função do tempo. Nesse caso, temos: x = 3t3 + t + 2 → x = 3(4)3 + 4 + 2 → x = 198 m O segundo passo é calcular a velocidade em função do tempo e do deslocamento: v = 9t2 + 1 → v = 9(4)2 + 1 → v = 145 m/s O terceiro passo é calcular a aceleração em função da velocidade e do tempo: a = 18t → a = 18(4) → a = 72 m/s2 Por fim, calculamos a velocidade média no fim do quinto segundo. v = 9(5)2 + 1 → v =226 m/s. Cinemática do ponto material I8 Assim, a mudança na velocidade durante o quinto segundo é 226 m/s − 145 m/s = 81 m/s. A aceleração média é: Além do movimento retilíneo, temos o movimento curvilíneo que, em um plano, é o movimento ao longo de uma curva plana (trajetória). A velocidade e a aceleração de um ponto sobre essa curva são expressas em componentes retangulares, componentes tangencial e normal, e componentes radial e trans- versal (NELSON et al., 2013). Para definir a posição P ocupada por uma partícula em movimento curvi- líneo em um dado tempo t, selecionamos um sistema de referência fixo, como os eixos x, y, z mostrados na Figura 5, a seguir, e desenhamos o vetor r, unindo a origem O e o ponto P. O vetor r é caracterizado pela sua intensidade r e sua direção em relação aos eixos de referência, de modo que define completamente a posição da partícula em relação a esses eixos. Referimo-nos ao vetor r como vetor de posição da partícula no tempo t. Figura 5. Vetores de posição para uma partícula que se move ao longo de uma curva. Fonte: Beer et al. (2019, p. 663). 9Cinemática do ponto material I Considere, agora, o vetor r’ que define a posição P’ ocupada pela mesma partícula em um momento posterior t+Δt. O vetor Δr unindo P e P’ representa a variação no vetor de posição durante o intervalo de tempo Δt e é chamado de vetor de deslocamento. Podemos verificar isso diretamente na Figura 6, onde obtemos o vetor r’ adicionando os vetores r e Δr de acordo com a regra do triângulo. Notamos que Δr representa uma variação na direção, bem como uma variação na intensidade do vetor de posição r. A velocidade média da partícula no intervalo de tempo Δt é definida como o quociente de Δr e Δt. Como Δr é um vetor, e Δt é um escalar, o quociente Δr/Δt é um vetor ligado a P com a mesma direção que Δr e uma intensidade igual à intensidade de Δr dividida por Δt. Figura 6. Vetores de velocidade média. Fonte: Beer et al. (2019, p. 663). Obtemos a velocidade instantânea da partícula no instante t, usando o limite quando o intervalo de tempo Δt aproxima-se de zero. A velocidade instantânea é, então, representada pelo vetor: Cinemática do ponto material I10 À medida que Δt e Δr se tornam menores, os pontos P e P’ se aproximam. Assim, o vetor v obtido no limite deve ser tangente à trajetória da partícula, conforme demonstrado na Figura 7. Figura 7. Vetor de velocidade instantânea. Fonte: Beer et al. (2019, p. 663). Para se aprofundar nos conhecimentos sobre movimentos retilíneo e curvilíneo plano, e em suas características de velocidade e aceleração, leia o livro Mecânica Vetorial para Engenheiros — Dinâmica, de Beer et al. , publicado pela McGraw-Hill Education/ Bookman em 2019. 11Cinemática do ponto material I Coordenadas retangulares e descolamento de um projétil Suponha que a posição de uma partícula P seja definida em qualquer instante pelas suas coordenadas retangulares x, y e z. Nesse caso, é frequentemente conveniente decompor a velocidade v e a aceleração a da partícula em compo- nentes retangulares, conforme demonstrado na Figura 8 (BEER et al., 2019). Figura 8. Componentes retangulares de posição e de velocidade para uma partícula. Fonte: Beer et al. (2019, p. 667). Para decompor o vetor de posição r da partícula em componentes retan- gulares, escrevemos que as coordenadas x, y e z são funções de t. Derivando duas vezes, obtemos velocidade e aceleração em componentes retangulares, conforme Figura 9, a seguir. Cinemática do ponto material I12 Figura 9. Componentes retangulares de aceleração para a partícula P. Fonte: Beer et al. (2019, p. 667). Nesse caso, o vetor posição r de um ponto P sobre essa curva, em termos dos vetores unitários i e j ao longo dos eixos x e y, respectivamente, é escrito: r = xi + yj À medida que P move, r varia, e a velocidade v pode ser expressa como: Usando dx / dt = ẋ, dy/dt = ẏ e dr/dt = ṙ como símbolos convenientes, temos: v = ṙ = ẋi + ẏj 13Cinemática do ponto material I A velocidade do ponto é a magnitude da velocidade v. Ou seja: A utilização de componentes retangulares para descrever a posição, a velocidade e a aceleração de uma partícula é particularmente eficaz quando o componente ax da aceleração depende apenas de t, x, ou vx, e, da mesma forma, quando ay depende somente de t, y, ou vy, e quando az depende de t, z ou vz. Nesse caso, podemos integrar equações independentemente. Em outras palavras, o movimento da partícula na direção x, seu movimento na direção y e seu movimento na direção z podem ser estudados separadamente. No caso do movimento de um projétil, por exemplo, os componentes da aceleração são: Se a resistência do ar for desprezada, indicando as coordenadas de uma arma por x0, y0 e z0 e os componentes da velocidade inicial v0 do projétil por (vx)0, (vy)0 e (vz)0, podemos integrar duas vezes em t e obter: Se o projétil é disparado no plano xy da origem O, temos x0 = y0 = z0 = 0 e (vz)0 = 0, e as equações de movimento reduzem-se a: Essas equações mostram que o projétil permanece no plano xy, que seu movimento na direção horizontal é uniforme e seu movimento na direção vertical é uniformemente acelerado, conforme Figura 10. Cinemática do ponto material I14 Figura 10. Componentes retangulares de aceleração para a partícula P. Fonte: Beer et al. (2019, p. 668). Portanto, podemos substituir o movimento de um projétil por dois movi- mentos retilíneos independentes (Figura 11), que são facilmente visualizados se considerarmos que o projétil é disparado verticalmente com uma velocidade inicial (vy)0 de uma plataforma, movendo-se com uma velocidade horizontal constante (vx)0. Figura 11. Componentes retangulares de aceleração para a partícula P. Fonte: Beer et al. (2019, p. 668). 15Cinemática do ponto material I De maneira resumida, a coordenada x do projétil é igual, em qualquer instante, à distância percorrida pela plataforma. Podemos calcular sua co- ordenada y como se o projétil estivesse movendo-se ao longo de uma linha vertical. Além disso, como os valores (vx)0 são os mesmos, o projétil pousará na plataforma, independentemente do valor de (vy)0. Observe que as equações que definem as coordenadas x e y de um projétil em um instante qualquer são as equações paramétricas de uma parábola. Dessa forma, a trajetória de um projétil é parabólica.Esse resultado, entretanto, deixa de ser válido em projetos quando a resistência do ar ou a variação da aceleração da gravidade com a altitude forem levadas em conta (BEER et al., 2019). BEER, F. P. et al. Mecânica vetorial para engenheiros: dinâmica. 11. ed. Porto Alegre: AMGH; Bookman, 2019. 894 p. NELSON, E. W. et al. Engenharia mecânica: dinâmica. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013. 310 p. (Coleção Schaum). Leitura recomendada NORTON, R. L. Cinemática e dinâmica dos mecanismos: com unidades do Sistema In- ternacional. Porto Alegre: AMGH; Bookman, 2010. 800 p. Cinemática do ponto material I16
Compartilhar