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INTRODUÇÃO DIREITO CIVIL por Kayane Nied CONCEITO DE DIREITO CIVIL É o direito comum, que rege as relações entre os particulares. Disciplina a vida das pessoas desde a concepção — e mesmo antes dela, quando permite que se contemple a prole eventual (CC, art. 1.799, I) e confere relevância ao embrião excedentário (CC, art. 1.597, IV) — até a morte, e ainda depois dela, reconhecendo a eficácia post mortem do testamento (CC, art. 1.857) e exigindo respeito à memória dos mortos (CC, art. 12, parágrafo único). O Código Civil é considerado a Constituição do homem comum, rege as relações mais simples da vida cotidiana, os direitos e deveres das pessoas, na sua qualidade de esposo ou esposa, pai ou filho, credor ou devedor, proprietário ou possuidor, testador ou herdeiro etc. No dir. civil, estudam-se relações puramente pessoais, bem como as patrimoniais. No campo das relações pessoais, encontram-se importantes institutos, como o poder familiar; já nas relações patrimoniais, todas as que apresentam um interesse econômico e visam à utilização de determinados bens. Devido ao enorme desenvolvimento das relações da vida civil que o legislador é chamado a disciplinar, não é mais possível enfeixar o direito civil no respectivo Código. Muitos direitos e obrigações concernentes às pessoas, aos bens e suas relações encontram–se regulados em leis extravagantes, que não deixam de pertencer ao direito civil, bem como à própria Constituição Federal. É ele, portanto, bem mais do que um dos ramos do direito privado, pois encerra os princípios de aplicação generalizada, que se projetam em todo o arcabouço jurídico, não se restringindo à matéria cível. Nele se situam normas gerais, como de hermenêutica, as relativas à prova e aos defeitos dos negócios jurídicos, as concernentes à prescrição e decadência etc., institutos comuns a todos os ramos do direito. A CODIFICAÇÃO No período colonial, as Ordenações Filipinas vigoraram no Brasil. Com a independência em 1822, a legislação portuguesa continuou sendo aplicada entre nós,mas vigoraria até que se elaborasse o Código Civil. A Constituição de 1824 referiu-se à organização de um Código Civil “baseado na justiça e na equidade”, sendo que, em 1865, essa tarefa foi confiada a Teixeira de Freitas, que já havia apresentado, em 1858, um trabalho de consolidação das leis civis. O projeto então elaborado, denominado “Esboço do Código Civil”, tinha 5 mil artigos e não fora acolhido, após sofrer críticas da comissão revisora. Influenciou, no entanto, o Código Civil argentino, do qual constitui a base. Outras tentativas foram feitas, mas só após a Proclamação da República, com a indicação de Clóvis Beviláqua, foi o projeto de Código Civil por ele elaborado e, depois de revisto, encaminhado ao Presidente da República, que o remeteu ao Congresso Nacional, em 1900. Aprovado em janeiro de 1916, entrou em vigor em 1º de janeiro de 1917. O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO O Código Civil de 1916: Continha 1.807 artigos e era antecedido pela Lei de Introdução ao Código Civil. Possuía uma Parte Geral, na qual constavam conceitos, categorias e princípios básicos aplicáveis a todos os livros da Parte Especial e que produziam reflexos em todo o ordenamento jurídico. A evolução social, o progresso cultural e o desenvolvimento científico pelos quais passou a sociedade brasileira no decorrer do século passado provocaram transformações que exigiram do direito uma contínua adaptação, mediante crescente elaboração de leis especiais, que trouxeram modificações relevantes ao dir. civil, sendo o direito de família o mais afetado. A própria Constituição Federal de 1988 trouxe importantes inovações ao direito de família, especialmente no tocante à filiação, bem como ao direito das coisas, ao reconhecer a função social da propriedade, restringindo ainda a liberdade de contratar em prol do interesse público. Desse modo, contribuiu para o deslocamento do centro da disciplina jurídica das relações privadas, permanecendo o Código Civil como fonte residual e supletiva nos diversos campos abrangidos pela legislação extravagante e constitucional. O Código Civil de 2002: Após tentativas de revisão do Código Civil, o Governo nomeou em 1967 uma nova comissão de juristas: Miguel Reale (supervisor), José Carlos Moreira Alves (Parte Geral), Agostinho Alvim (Direito das Obrigações), Sylvio Marcondes (Direito de Empresa), Ebert Vianna Chamoun (Direito das Coisas), Clóvis do Couto e Silva (Direito de Família) e Torquato Castro (Direito das Sucessões).Essa equipe apresentou, em 1972, um Anteprojeto, com a disposição de preservar, no que fosse possível, a estrutura e as disposições do Código de 1916, mas reformulando-o com base nos valores éticos e sociais revelados pela experiência legislativa e jurisprudencial. Procurou atualizar a técnica deste último, que, em muitos pontos, foi superado pelos progressos da ciência jurídica, assim como afastar-se das concepções individualistas que nortearam esse diploma, para seguir orientação compatível com a socialização do direito contemporâneo, sem se descuidar do valor fundamental da pessoa humana. Enviado ao Congresso Nacional, transformou-se no Projeto de Lei n. 634/75. Finalmente, no limiar deste novo século, foi aprovado, tornando-se o novo Código Civil brasileiro. Entrou em vigor, após um ano de vacatio legis, em 11 de jan. de 2003. O CC de 2002 apresenta tais características: Preserva a estrutura do Código de 1916, atualizando-o com novos institutos e INTRODUÇÃO DIREITO CIVIL por Kayane Nied redistribuindo a matéria de acordo com a sistemática civil moderna; Mantém o CC como lei básica, embora não global, do direito privado, unificando o direito das obrigações na linha de Teixeira de Freitas e Inglez de Souza, reconhecida a autonomia doutrinária do direito civil e do direito comercial; Aproveita as contribuições dos projetos anteriores, assim como os estudos e as críticas; Inclui no sistema do Código, com revisão necessária, a matéria das leis especiais posteriores à 1916, assim como as contribuições da jurisprudência; Exclui matéria de ordem processual, exceto quando ligada à de natureza material; Implementa o sistema de cláusulas gerais, de caráter genérico e abstrato, cujos valores devem ser responsabilidade do juiz, que desfruta de certa margem de interpretação. As cláusulas gerais resultaram do convencimento do legislador de que as leis rígidas, definidoras de tudo e para todos os casos, são necessariamente insuficientes e levam seguidamente a situações de grave injustiça. Embora tenham,no 1° contato, gerado certa insegurança, convivem harmonicamente no sistema jurídico, respeitados os princípios constitucionais concernentes à organização jurídica e econômica da sociedade. Cabe destacar, dentre outras, a cláusula geral que exige um comportamento condizente com a probidade e boa-fé objetiva (CC, art. 422) e a que proclama a função social do contrato (art. 421). São janelas abertas deixadas pelo legislador, para que a doutrina e a jurisprudência definam o seu alcance, formulando o julgador a própria regra concreta do caso. Diferem do chamado “conceito legal indeterminado” ou “conceito vago”, que consta da lei, sem definição (como, v.g., “bons costumes” — CC, arts. 122 e 1.336, IV — e “mulher honesta”, expressão que citava o art. 1.548, II, do Código Civil de 1916), bem como dos princípios, que são fontes do direito e constituem regras que se encontram na consciência dos povos e são universalmente aceitas, mesmo não escritas. O art. 4º da LINDB prevê a possibilidade de o julgador, além dos princípios constitucionais, aplicar também os princípios gerais de direito, de âmbito civil, que têm importante função supletiva. COMPARAÇÃO ENTRE AS CODIFICAÇÕES O CC/02 possui 4 diretrizes: SISTEMATICIDADE, OPERABILIDADE, ETICIDADE e SOCIABILIDADE. SISTEMATICIDADE: o CC/02 funciona como eixo central do sistema civil em inter-relação com a CF, CDC e leis aditivas. Ou seja, é necessário relacionar as suas normas internas (intra-sistemática) e relacioná-las com outros sistemas (inter-sistemática),na análise do caso concreto. OPERABILIDADE: o CC/02 foi feito focado na sua aplicação, logo objetivou-se distinguir conceitos jurídicos como a prescrição e a decadência, p. ex., e, muitas situações, deixando-se a solução legal para a análise do caso concreto, quando são utilizadas as expressões “conforme as circunstâncias”, “conforme os usos e costumes”. ETICIDADE: princípio da confiança como fundamental: lealdade, boa-fé objetiva, além da equidade e da probidade. SOCIALIDADE: função social da posse/propriedade e do contrato. A título de exemplo, a referência à FUNÇÃO SOCIAL aparece nos arts.187, 421, 1228, §1°, §2° e §4°, 1239, 1242 e 2035, parágrafo único. Referência à BOA-FÉ objetiva: arts.113, 128, 164, 187, 422 e 765. Referência aos BONS COSTUMES: arts. 13, 122 e 187. Referência a USOS: arts. 113, 429 e 432. Referência a COSTUMES DO LUGAR: arts.596, 615, 695, 701 e 872. CC/16 (séc XIX à XX) CC/02 (séc XXI) Modelo fechado Modelo aberto: repleto de cláusulas gerais; princípios valorativos; padrões de conduta Lei clara, uniforme, conceitual com pouca possibilidade de abertura interpretativa ou participação do intérprete Diretriz sistemática: o código é o eixo central do sistema civil – deve-se relacioná-lo com a Constituição e outros sistemas como o CDC e outras leis aditivas Prevalência da técnica da tipicidade. A lei consiste somente em suporte fático + preceito Combinação de técnicas: tipicidade + cláusulas gerais Autonomia da vontade; sociedade patrimonialista, individualista, discriminatória; Código Totalitário. Procura adequar-se aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa, da igualdade e da solidariedade; O modelo aberto permite ao juiz a criação do Direito, fazendo conexões sistemáticas.
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