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PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 1 DEFINIÇÃO ❖ Definimos queimadura como uma lesão tecidual decorrente de trauma térmico, elétrico, químico ou radioativo, que destrói parcialmente ou totalmente a pele e seus anexos, podendo alcançar camadas mais profundas como o tecido celular subcutâneo, músculos, tendões e ossos. TIPOS ❖ As queimaduras são lesões decorrentes de agentes (tais como a energia térmica, química ou elétrica) capazes de produzir calor excessivo que danifica os tecidos corporais e acarreta a morte celular. ❖ Tais agravos podem ser classificados como queimaduras de primeiro grau, de segundo grau ou de terceiro grau. AGENTES ❖ Chama / fogo – lesão pelo ar oxidado superaquecido ❖ Escaldadura – lesão pelo contato com líquidos quentes ❖ Contato – lesão pelo contato com materiais sólidos quentes ou frios ❖ Químicas – contato com agentes químicos nocivos ❖ Eletricidade – condução de corrente elétrica através dos tecidos QUEIMADURA ELÉTRICA ❖ Muitas vezes, o principal sintoma é uma queimadura na pele, mas nem todas as lesões sérias são visíveis. ❖ Os médicos examinam a pessoa em busca de ritmos cardíacos anormais, fraturas, deslocamentos e lesões da medula espinhal ou outras. ❖ Os ritmos cardíacos anormais são monitorados, as queimaduras tratadas e, se a queimadura tiver causado um dano interno extenso, são administrados líquidos por via intravenosa e outros tratamentos. ❖ Uma lesão provocada pela eletricidade pode ser consequência do contato com maquinaria ou dispositivos elétricos com defeitos ou, ainda, por um contato inadvertido com cabos domésticos ou linhas elétricas. Tomar um choque ao entrar em contato com uma tomada elétrica em casa ou com um pequeno aparelho não costuma ser sério, mas exposição acidental a alta voltagem causa cerca de 300 mortes todos os anos nos Estados Unidos. ❖ Como a eletricidade afeta o corpo? A corrente elétrica que atravessa o corpo gera calor, que queima e destrói os tecidos. As queimaduras podem afetar tanto os tecidos internos como a pele. Uma descarga elétrica pode provocar um curto-circuito nos sistemas elétricos próprios do organismo e interromper a transmissão de impulsos por parte dos nervos ou fazer com que estes os transmitam de forma errada. A transmissão anômala de impulsos pode afetar o(s): • Músculos, causando sua contração violenta • Coração, causando sua parada (parada cardíaca) • Cérebro, causando convulsões, perda de consciência ou outras anomalias ❖ A gravidade da lesão varia de pouco grave a fatal e é determinada pelos seguintes fatores: • INTENSIDADE DA CORRENTE: Qualquer corrente superior a 500 V é considerada como alta voltagem ou alta tensão. Uma alta voltagem pode saltar (arco) pelo ar desde 2,5 cm até alguns metros, conforme a voltagem. Deste modo, uma pessoa pode ficar lesionada apenas por se aproximar demasiadamente de uma linha de alta voltagem. Uma alta voltagem causa lesões mais graves do que uma baixa voltagem e tem mais probabilidade de produzir danos internos. • TIPO DE CORRENTE: A corrente alternada é mais perigosa que a corrente direta. A corrente contínua tende a causar uma única contração muscular, muitas vezes intensa o suficiente para afastar bruscamente a pessoa da fonte de eletricidade. A corrente alternada causa uma contração muscular contínua que, quase sempre, impede a liberação da fonte de eletricidade. Como resultado, a exposição pode ser prolongada. Até mesmo uma pequena quantidade de corrente alternada, apenas a suficiente para que se sinta uma leve descarga, pode fazer com que fique preso sem conseguir se soltar. Um pouco mais de corrente alternada pode causar uma contração dos músculos torácicos, impedindo a respiração e, ainda, podendo originar ritmos cardíacos mortais. Mais corrente pode causar ritmos cardíacos anormais (arritmias) mortais. • PERCURSO DA CORRENTE NO CORPO: O percurso da eletricidade através do corpo tende a determinar que tecidos são afetados. Como a corrente alternada inverte continuamente a QUEIMADURA TUTORIA PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 2 direção, os termos mais comumente usados "entrada" e "saída" são inapropriados. Os termos "origem" e "aterramento" são mais exatos. A mão é o ponto de origem mais frequente de eletricidade; o segundo é a cabeça. O ponto de aterramento mais frequente é o pé. Uma corrente que passe de um braço para o outro ou de um braço para uma perna pode atravessar o coração e é muito mais perigosa do que a corrente que passa de uma perna para a terra. Uma corrente que percorra a cabeça pode afetar o cérebro. • DURAÇÃO DA EXPOSIÇÃO À CORRENTE: Em geral, quanto maior a exposição da pessoa à corrente, pior a lesão. • RESISTÊNCIA ELÉTRICA À CORRENTE: A resistência é a capacidade de impedir o fluxo de eletricidade. Quase toda a resistência do corpo está concentrada na pele. Quanto mais espessa for a pele, maior será sua resistência. Por exemplo, a pele espessa e calejada de uma palma da mão ou de uma planta do pé é muito mais resistente à corrente elétrica do que uma zona de pele fina, como a parte interna do braço. A resistência da pele diminui quando está lesionada (por exemplo, puncionada ou raspada) ou quando está úmida. Se a resistência da pele for alta, a maior parte do dano será local e, muitas vezes, causará apenas queimaduras cutâneas. Se a resistência da pele for baixa, grande parte do dano afetará os órgãos internos. Do mesmo modo, o dano acometerá principalmente os órgãos internos se pessoas que estiverem molhadas entrarem em contato com uma corrente elétrica, por exemplo, quando um secador de cabelo cai dentro da banheira ou quando uma pessoa pisa em uma poça de água que está em contato com uma linha elétrica caída. ❖ Para o diagnóstico de lesões provocadas pela eletricidade a maioria das pessoas que não tem sintomas não precisa de exames ou monitoramento. Um eletrocardiograma (ECG) é feito para monitorar a frequência cardíaca em algumas pessoas. Para algumas pessoas, podem ser necessários exames de urina e sangue. Se as pessoas estiverem inconscientes, podem ser necessários exames de imagem, como tomografia computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM) do cérebro. QUEIMADURA QUÍMICA: ❖ As queimaduras químicas da pele geralmente causam sintomas semelhantes aos de queimaduras de primeiro grau (superficiais). A área fica vermelha, inchada e dolorosa, mas não se formam bolhas. Às vezes, as queimaduras são mais profundas, com bolhas e dor intensa. Raramente, um ácido ou álcalis forte irá causar uma queimadura de espessura total (terceiro grau), que lesiona a pele por inteiro. ❖ As medidas para deter uma queimadura química são • Remover as roupas contaminadas. • Eliminar todas as partículas ou pós secos. • Enxaguar a zona com água em abundância. ❖ Considerando que produtos químicos podem continuar a causar danos muito depois do primeiro contato com a pele, deve-se enxaguar durante pelo menos trinta minutos. ❖ Em casos raros, com determinados produtos químicos industriais (por exemplo, metal sódico), não se deve usar água, visto que a queimadura, na verdade, pode piorar. ❖ Além disso, para alguns produtos químicos há tratamentos específicos que podem diminuir ainda mais um dano na pele. O tratamento adicional para uma queimadura química é o mesmo tratamento para queimaduras térmicas. QUEIMADURA ENERGIA TÉRMICA ❖ Queimaduras térmicas podem resultar de qualquer fonte externa de calor (chama, líquidos, objetos sólidos ou vapor). O fogo também pode causar inalação de fumaça tóxica ( Intoxicação por monóxido de carbono). ❖ Queimaduras por radiação são mais comuns por exposição prolongada aos raios ultravioleta (queimadura solar), embora também possamocorrer por exposição intensa a outras fontes de radiação ultravioleta (p. ex., bronzeamento artificial), radiografia ou outras radiações não solares ( Exposição e contaminação radioativa). GRAU PRIMEIRO GRAU ❖ As queimaduras de primeiro grau ou superficiais, são limitadas à epiderme e manifestam-se clinicamente através de eritema, secundário à vasodilatação, e dor moderada, não ocorrendo bolhas nem comprometimento dos anexos cutâneos (folículos pilosos, glândulas sudoríparas e sebáceas). ❖ Não há fibrose na sua resolução, sendo essas lesões tratadas através de analgesia com anti-inflamatórios orais e soluções tópicas hidratantes. ❖ Exemplo clássico é a queimadura por exposição ao sol. ❖ As queimaduras de primeiro grau não possuem significado fisiológico de impacto (exceto nos extremos da idade), não sendo considerada em cálculos de SCQ SEGUNDO GRAU PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 3 ❖ SUPERFICIAL: As queimaduras de segundo grau superficiais caracterizam-se por comprometer toda a epiderme até porções superficiais da derme (camada papilar), apresentando-se muito dolorosas, com superfície rosada, úmida e com presença de bolhas. Estas surgem em 12 a 24h, o que pode nos levar à classificação errônea de queimadura de primeiro grau no atendimento inicial. Não ocorrendo infecção, essas lesões tendem a cicatrizar em até três semanas com resultado estético bom, sendo raras as cicatrizes hipertróficas. ❖ PROFUNDA: As queimaduras de segundo grau profundas acometem toda a espessura da epiderme e se estendem pela derme envolvendo sua camada reticular. A pele apresenta-se seca com coloração rosa pálido e, dependendo do grau de comprometimento da vascularização, a dor é moderada. Quando ocorre alteração na sensibilidade, observa-se diminuição da sensibilidade tátil com preservação da sensibilidade à pressão (barestésica). Estas lesões costumam cicatrizar entre três a nove semanas, sendo comum a formação de cicatrizes não estéticas e risco razoável de cicatrização hipertrófica, principalmente em afrodescendentes e crianças. TERCEIRO GRAU ❖ Nas queimaduras de terceiro grau, ocorre comprometimento de toda a espessura da epiderme, da derme e parte do tecido celular subcutâneo (hipoderme). ❖ A área queimada pode apresentar-se tanto pálida quanto vermelho-amarelada e chamuscada, podendo ser visto na sua base vasos coagulados. ❖ Sua textura é firme, semelhante ao couro, e a sensibilidade tátil e à pressão encontram-se diminuídas. ❖ A cicatrização só ocorre à custa de contração importante da ferida ou através de enxerto cutâneo. ❖ Como vimos antes, as queimaduras de terceiro grau com disposição circunferencial em tórax podem determinar insuficiência respiratória. ❖ Quando dispostas circunferencialmente em um dos membros, por exercer compressão, pode determinar hipoperfusão distal importante. O tratamento para todos os casos é a escarotomia QUARTO GRAU ❖ Queimaduras de quarto grau acometem toda a espessura da pele, tecido celular subcutâneo e alcançam tecidos profundos como músculo e ossos. Exemplo típico é a queimadura elétrica. EPIDEMIOLOGIA ❖ Nos Estados Unidos, aproximadamente dois milhões de indivíduos sofrem queimaduras anualmente. Destes, aproximadamente 100.000 necessitarão de internação hospitalar, com 5.000 óbitos. No Brasil ainda não dispomos de um banco de dados nacional com informações sobre queimaduras e as estatísticas oficiais não apresentam números consistentes. O que sabemos é que em nosso país a maioria das vítimas é do sexo masculino, predominantemente adultos jovens entre 20 e 29 anos e crianças menores de 10 anos. ❖ Embora em alguns casos a lesão tenha efeito devastador, observamos principalmente em países desenvolvidos uma discreta redução na mortalidade nas vítimas de queimaduras. Este fenômeno é resultado de diversos fatores, tais como um melhor atendimento pré-hospitalar, com uma correta abordagem da via aérea e o início precoce de reposição volêmica, e um melhor entendimento das alterações humorais e metabólicas que doentes graves desenvolvem. O tratamento em Centro Especializado em Tratamento de Queimados (CETQs) tem contribuído também para a redução no número de óbitos. ❖ A ótima qualidade do tratamento do paciente queimado não implica somente em uma melhora na sobrevida, mas também na recuperação da funcionalidade do segmento atingido e na manutenção do aspecto cosmético da área comprometida. Sendo assim, a participação de uma equipe de cirurgia plástica habituada a lidar com esses pacientes é de fundamental importância. ❖ Sabemos que o prognóstico de uma vítima de queimadura vai depender da extensão da Superfície Corporal Queimada (SCQ), da profundidade e localização da lesão, da presença ou não de doenças crônicas associadas e da idade do paciente (mais grave em crianças e idosos). ❖ A mortalidade em pacientes queimados apresenta distribuição bimodal, ocorrendo imediatamente após a lesão (principal causa) ou semanas mais tarde, neste caso tendo como etiologia mais frequente a falência multiorgânica, geralmente associada à sepse grave ou ao choque séptico. ❖ As queimaduras térmicas, por chama ou por líquidos ou sólidos superaquecidos, são as mais frequentes. Geralmente a lesão por escaldos é mais encontrada na população pediátrica, ao passo que os acidentes com chama são mais observados em adultos. POPULAÇÃO DE RISCO ❖ PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 4 FISIOPATOLOGIA DA QUEIMADURA ❖ A fisiopatologia da lesão por queimadura se dá pela destruição da integridade capilar e vascular, em razão de seus efeitos serem locais e sistêmicos. ❖ O comprometimento do tecido vai depender da intensidade da exposição térmica, das características da área queimada e das reações locais e sistêmicas. ❖ Assim, a queimadura irá comprometer a integridade funcional da pele, responsável pela homeostase hidroeletrolítica, controle da temperatura interna, flexibilidade e lubrificação da superfície corporal. Portando, a magnitude do comprometimento dessas funções depende da extensão e profundidade da queimadura. ❖ A injúria térmica provoca no organismo uma resposta local, traduzida por necrose de coagulação tecidual e progressiva trombose dos vasos adjacentes num período de 12 a 48 horas. ❖ A ferida da queimadura a princípio é estéril, porém o tecido necrótico rapidamente se torna colonizado por bactérias endógenas e exógenas, produtoras de proteases, que levam à liquefação e separação da escara, dando lugar ao tecido de granulação responsável pela cicatrização da ferida, que se caracteriza por alta capacidade de retração e fibrose nas queimaduras de terceiro grau. ❖ Nas grandes queimaduras, além da resposta local, o dano térmico desencadeia ainda uma reação sistêmica do organismo, em consequência da liberação de mediadores pelo tecido lesado. Ocorre extenso dano à integridade capilar, com perda acelerada de fluidos, seja pela evaporação através da ferida ou pela sequestração nos interstícios, que é agravada por subprodutos da colonização bacteriana. ❖ Além disso, nas queimaduras extensas, superiores a 40% da área corporal, o sistema imune é incapaz de delimitar a infecção, que, sistematizando-se, torna rara a sobrevida nesses casos. Essa resposta sistêmica manifesta-se por febre, circulação sanguínea hiperdinâmica e ritmo metabólico acelerado, com aumento do catabolismo muscular, decorrente de alteração da função hipotalâmica (aumento da secreção de glucagon, cortisol e catecolaminas), da deficiência da barreira gastrointestinal (passagem de bactériase seus subprodutos para a circulação sistêmica), da contaminação bacteriana da área queimada (liberação sistêmica de bactérias e subprodutos), da perda de calor(evaporação através da ferida levando à hipotermia) e da perda de fluidos (desequilíbrio hidroeletrolítico). (REMIT) ZONAS DE LESÃO ❖ Sendo a pele responsável por fornecer uma forte barreira à transferência de energia para os tecidos mais profundos, mesmo com a remoção do foco desencadeador da queimadura, a resposta dos tecidos locais pode levar à lesão nas camadas mais profundas. ❖ A área de lesão cutânea ou superficial é assim dividida em três zonas – ZONA DE COAGULAÇÃO, ZONA DE ESTASE E ZONA DE HIPEREMIA . ❖ A ÁREA NECRÓTICA da queimadura onde as células foram destruídas é denominada ZONA DE COAGULAÇÃO . Esse tecido é danificado irreversivelmente quando ocorre a lesão. ❖ A área imediatamente adjacente à zona necrótica tem um grau de lesão moderado, com perfusão tissular reduzida. Essa área é chamada de ZONA DE ESTASE e, dependendo das condições da ferida, pode sobreviver ou evoluir para necrose coagulativa. ❖ Tratamento direcionado para o controle da inflamação local, imediatamente após a queimadura pode preservar a zona de estase. ❖ A última área é denominada ZONA DE HIPEREMIA, caracterizada pela vasodilatação em razão da inflamação circunjacente à queimadura. Essa região contém o tecido claramente viável do qual se inicia o processo de cicatrização e, geralmente, não tem risco de necrose adicional. RESPOSTA HIPERMETABÓLICA À LESÃO POR QUEIMADURA ❖ . ABORDAGEM AO QUEIMADO AVALIAÇÃO INICIAL ❖ Antes de serem submetidos a qualquer tratamento específico, os pacientes queimados devem ser removidos do cenário do trauma, e o processo lesivo, interrompido. ❖ Lesão por inalação sempre deve ser suspeitada e oxigênio a 100% deve ser administrado por máscara. ❖ Enquanto se remove o paciente do local do trauma, deve-se ter cuidado para que o socorrista não se torne outra vítima. ❖ Todos os profissionais de saúde e cuidadores devem estar cientes de que eles podem se ferir pelo contato com o paciente ou roupas do paciente. ❖ Precauções universais, incluindo o uso de luvas, aventais, máscara e óculos de proteção, devem ser tomadas quando há probabilidade de contato com sangue ou fluidos corporais. PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 5 ❖ Deve-se apagar o fogo das roupas em combustão e removê-las o mais cedo possível para prevenir lesões adicionais. ❖ Todos os anéis, relógios, joias e cintos devem ser removidos, pois eles retêm calor e podem produzir um efeito torniquete. ❖ Água à temperatura ambiente pode ser vertida no ferimento dentro de 15 minutos da lesão para diminuir a profundidade do ferimento, mas quaisquer medidas subsequentes para refrescar o ferimento devem ser evitadas de modo a prevenir a hipotermia durante as manobras de reanimação. ❖ Como qualquer paciente traumatizado, o paciente queimado deve ser abordado inicialmente com uma avaliação primária e secundária. ❖ Na AVALIAÇÃO PRIMÁRIA, condições que ameaçam imediatamente a vida são rapidamente identificadas e tratadas. ❖ Na AVALIAÇÃO SECUNDÁRIA, procede-se a uma avaliação mais completa da cabeça aos pés. ❖ A exposição a gases aquecidos e à fumaça resulta em danos ao trato respiratório superior. ❖ Lesão direta às vias aéreas resulta em edema, que, em combinação com o edema generalizado associado à queimadura grave, pode obstruir as vias aéreas. ❖ Nos pacientes que estiveram em uma explosão ou em um acidente de desaceleração, existe a possibilidade de lesão da medula espinal. Estabilização adequada da coluna cervical, com o uso de colar ou qualquer outro meio disponível, deve ser instituída para manter a cabeça imobilizada até que o paciente possa ser mais bem avaliado. CUIDADOS INICIAIS COM A FERIDA ❖ Os cuidados pré-hospitalares com a área queimada são básicos e simples, porque requerem apenas proteção contra o ambiente com a aplicação de um curativo limpo e seco ou de um lençol para cobrir a parte envolvida. ❖ Curativos úmidos não devem ser usados. ❖ O paciente deve ser envolvido com um cobertor para minimizar a perda de calor e controlar a temperatura durante o transporte. ❖ O primeiro passo na diminuição da dor é cobrir o ferimento para evitar o contato com as terminações nervosas expostas. ❖ Injeções intramusculares ou subcutâneas de narcóticos contra a dor nunca devem ser utilizadas, pois a absorção das drogas está reduzida devido à vasoconstrição periférica. ❖ Pequenas doses de morfina intravenosa (IV) podem ser administradas após a avaliação completa do paciente por um médico experiente que possa garantir a segurança do uso deste medicamento. ❖ Um estudo recente na Nova Zelândia 21 mostrou que os primeiros socorros a queimados são inadequados em 60% dos pacientes entrevistados. Este estudo também mostrou que os primeiros socorros inadequados são claramente associados a resultados piores. Foi sugerido que programas educacionais específicos visando às populações de risco podem melhorar esses resultados. A – VIAS AEREAS ❖ Queimaduras podem causar grande edema e, por isso, a via aérea superior está em risco de obstrução. ❖ Os sinais de obstrução podem ser inicialmente sutis até o doente entrar em crise; portanto, a avaliação precoce da necessidade de intubação endotraqueal é essencial. ❖ Fatores que aumentam o risco de obstrução da via aérea são profundidade e extensão de queimaduras maiores, queimaduras na cabeça e na face, lesões inalatórias e queimaduras no interior da boca. ❖ Queimaduras localizadas na face e na boca causam edema mais localizado e apresentam maior risco de comprometimento da via aérea. Por terem a via aérea menor, as crianças têm maior risco de problemas na via aérea. ❖ Como identificar lesão por inalação? • Queimaduras faciais e/ou cervicais • Chamuscamento dos cílios e das vibrissas nasais • Depósitos de carbono na boca e/ou nariz e expectoração carbonácea • Alterações inflamatórias agudas na orofaringe, incluindo eritema • Rouquidão • História de confusão mental e/ou de confinamento no local do incêndio • Explosão com queimaduras da cabeça e do tronco • Níveis sanguíneos de carboxi-hemoglobina maiores que 10% se o doente foi envolvido em um incêndio • Deve-se suspeitar de lesão às vias aéreas nos casos de queimaduras faciais, vibrissas chamuscadas, escarros carbonáceos e taquipneia ❖ A presença de qualquer um desses achados sugere lesão inalatória aguda e a necessidade de intubação traqueal. Sempre que exista uma lesão por inalação, indica-se a transferência para um centro de queimados. ❖ Obstrução das vias aéreas superiores pode-se desenvolver rapidamente, e o estado respiratório deve ser monitorado continuamente para avaliar a necessidade de controle das vias aéreas e suporte ventilatório. ❖ Se o tempo de transporte for prolongado, a intubação deve ser realizada antes do transporte. A presença de estridor é tardia e é indicação imediata para intubação endotraqueal. ❖ Queimaduras circunferenciais do pescoço podem produzir edema dos tecidos ao redor da via aérea. Portanto, nessa situação, indica-se a intubação precoce. ❖ Durante a avaliação inicial do doente traumatizado, a via aérea deve ser avaliada em primeiro lugar para assegurar a sua permeabilidade. Essa rápida PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 6 avaliação para identificar sinais de obstrução da via aérea deve incluir aspiração e inspeção para a presença de corpos estranhos e fraturas faciais, mandibulares ou traqueolaríngeas, que podem resultar em obstrução da via aérea. ❖ As manobras para estabelecer a permeabilidade da via aérea devem ser feitas com proteção da coluna cervical. ❖ Se o doenteconsegue comunicar-se verbalmente, é pouco provável que a obstrução da via aérea represente um risco imediato; no entanto, é prudente que a permeabilidade da via aérea seja avaliada a curtos intervalos de tempo. ❖ Cabe enfatizar que os doentes com trauma craniencefálico grave e rebaixamento do nível de consciência ou portadores de um escore na escala de coma de Glasgow ( GCS) igual ou inferior a 8 habitualmente exigem o estabelecimento de uma via aérea definitiva (isto é, tubo com balão insuflado, na traqueia). ❖ Durante a avaliação e a manipulação da via aérea, deve-se tomar muito cuidado para evitar a movimentação excessiva da coluna cervical. A cabeça e o pescoço do doente não devem ser hiperestendidos, hiperfletidos ou rodados com o intuito de estabelecer ou manter a via aérea. B – RESPIRAÇÃO ❖ A permeabilidade da via aérea, por si só, não garante ventilação adequada. ❖ Uma troca adequada de gases é necessária para que seja possível a oxigenação e a eliminação de dióxido de carbono num grau máximo. ❖ Uma boa ventilação exige um funcionamento adequado dos pulmões, da parede torácica e do diafragma. ❖ Cada componente deve ser avaliado e examinado rapidamente. ❖ O pescoço e o tórax do doente devem ser expostos para avaliar adequadamente a distensão de veias jugulares, a posição da traqueia e a movimentação da parede torácica. ❖ A ausculta deve ser realizada para se confirmar o fluxo de ar nos pulmões. ❖ A inspeção visual e a palpação poderão detectar lesões da parede do tórax capazes de comprometer a ventilação. ❖ A percussão do tórax também pode identificar anormalidades, mas no ambiente barulhento da reanimação, isso pode ser difícil ou levar a resultados não confiáveis. ❖ As lesões que podem prejudicar gravemente a ventilação num curto prazo são o pneumotórax hipertensivo, o tórax instável (retalho costal móvel) com contusão pulmonar, o hemotórax maciço e o pneumotórax aberto. ❖ Tais lesões devem ser identificadas na avaliação primária e podem exigir atenção imediata para que o esforço ventilatório seja efetivo. ❖ O hemotórax ou o pneumotórax simples, as fraturas de arcos costais e a contusão pulmonar podem comprometer a ventilação, mas em grau menor, e são habitualmente identificados na avaliação secundária. C - CIRCULATION ❖ CIRCULAÇÃO COM CONTROLE DA HEMORRAGIA ❖ O comprometimento da circulação no traumatizado pode resultar de muitas lesões diferentes. Os principais fatores circulatórios a considerar são volume sanguíneo, débito cardíaco e hemorragia ❖ A hemorragia é a principal causa de mortes pós- traumáticas evitáveis. Por isso, a identificação e a parada da hemorragia são passos cruciais na avaliação e tratamento desses doentes. ❖ Uma vez descartado o pneumotórax hipertensivo como causa de choque, a hipotensão em doentes traumatizados deve ser considerada hipovolêmica até prova em contrário. ❖ E essencial a avaliação rápida e precisa do estado hemodinâmico do doente traumatizado. Os elementos clínicos que oferecem informações importantes dentro de poucos segundos são o nível de consciência, a cor da pele e o pulso. ❖ NÍVEL DE CONSCIÊNCIA: Quando o volume sanguíneo está diminuído, a perfusão cerebral pode estar criticamente prejudicada, resultando em alteração do nível de consciência. Contudo, um doente consciente também pode ter perdido uma quantidade significativa de sangue. ❖ COR DA PELE: A cor da pele pode ser importante na avaliação de um doente traumatizado hipovolêmico. O doente traumatizado com pele de coloração rósea, especialmente na face e nas extremidades, raramente está criticamente hipovolêmico. Ao contrário, a coloração acinzentada da face e a pele esbranquiçada das extremidades são sinais evidentes de hipovolemia. ❖ PULSO: Um pulso central de fácil acesso ( femoral ou carotídeo) deve ser examinado bilateralmente para se avaliar sua qualidade, frequência e regularidade. Pulsos periféricos cheios, lentos e regulares são, usualmente, sinais de normovolemia relativa em doente que não esteja em uso de bloqueadores beta-adrenérgicos. Pulso rápido e filiforme é habitualmente um sinal de hipovolemia, embora possa ter outras causas. Uma frequência normal de pulso não é garantia de que o doente esteja normovolêmico. Mas quando irregular, o pulso costuma ser um alerta para uma potencial disfunção cardíaca. A ausência de pulsos centrais, não relacionada a fatores locais, significa a necessidade de uma ação imediata de reanimação para restaurar o défice sanguíneo e um débito cardíaco adequado. ❖ Relação com a queimadura elétrica e a fasciotomia: As lesões mais importantes localizam-se nos tecidos profundos, e o desenvolvimento subsequente de PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 7 edema pode causar comprometimento vascular a qualquer região distal à lesão. A avaliação deve incluir a circulação dos leitos vasculares distais, pois podem ser necessárias escarotomias e fasciotomias imediatas. Se o compartimento muscular se encontrar excessivamente danificado e necrótico, de forma que a perspectiva de preservação de sua função seja mínima, a amputação precoce poderá ser necessária. Defendemos a exploração precoce dos leitos musculares afetados e desbridamento dos tecidos desvitalizados, prestando-se atenção aos planos periostais profundos, pois esta é a área com mais tecido muscular. As fasciotomias devem ser amplas e podem exigir descompressões nervosas SÍNDROME COMPARTIMENTAL ❖ A síndrome compartimental é uma cascata de eventos que se autoperpetua. Começa com o edema do tecido que normalmente ocorre após a lesão (p. ex., por edema ou hematoma de tecidos moles). Se o edema ocorre dentro do compartimento fascial, normalmente, no compartimento anterior ou posterior do membro inferior, há pouco espaço para expansão do tecido; dessa maneira, a pressão intersticial (compartimental) aumenta. ❖ À medida que a pressão compartimental excede a pressão capilar normal de cerca de 8 mmHg, a perfusão celular desacelera e com o tempo pode parar. (NOTA: como 8 mmHg é muito menor que a pressão arterial, o fluxo celular pode estar ocluído bem antes do pulso desaparecer.) A isquemia tecidual resultante posteriormente piora o edema, e isso gera um círculo vicioso. ❖ Conforme a isquemia progride, os músculos tornam- se necrosados, o que leva, às vezes, à rabdomiólise, infecções e hiperpotassemia, ameaçando a perda do membro e podendo levar ao óbito, caso não seja tratada. Hipotensão ou insuficiência arterial pode comprometer a perfusão tecidual mesmo com pressão compartimental levemente elevada, causando ou piorando a síndrome compartimental. Podem aparecer contraturas depois da cicatrização dos tecidos necrosados. ❖ A síndrome compartimental é fundamentalmente uma doença dos membros, sendo mais comum na parte inferior do membro inferior e no antebraço. No entanto, a síndrome compartimental também pode ocorrer em outros locais (p. ex., no membro superior, no abdome e na região glútea). ❖ A fasciotomia é um procedimento cirúrgico realizado como tratamento da síndrome compartimental. O método tem como objetivo aliviar a pressão nos músculos quando ela aumenta demasiadamente e impede que chegue sangue no músculo, situação está que provoca isquemia e necrose nos membros. Portanto, nesse tipo de cirurgia, deve-se avaliar a fáscia, tecido que recobre os músculos. D – DISFUNÇÃO NEUROLÓGICA ❖ No final da avaliação primária, realiza-se uma avaliação neurológica rápida. Esta avaliação neurológica estabelece o nível de consciência do doente, o tamanho e reatividade das pupilas, sinais de lateralização e o nível de lesão da medula espinhal. ❖ O rebaixamento do nível de consciência pode representar diminuição da oxigenação e/ou da perfusão cerebral ouser resultado de um trauma direto ao cérebro. ❖ A alteração do nível de consciência implica necessidade imediata de reavaliação de ventilação, oxigenação e perfusão. Hipoglicemia, álcool, narcóticos ou outras drogas também podem alterar o nível de consciência do doente. ❖ No entanto, se excluídos os problemas mencionados, toda alteração do nível de consciência deve ser considerada originária de um trauma ao sistema nervoso central até que se prove o contrário. ❖ A lesão cerebral primária resulta do efeito estrutural do trauma sobre o cérebro. A prevenção da lesão cerebral secundária, por meio da manutenção de oxigenação e perfusão adequadas, são os principais objetivos do atendimento inicia E - EXPOSUE ❖ O doente deve ser totalmente despido, usualmente cortando as roupas para facilitar o exame e avaliação completos. Depois de retirar a roupa do doente e completar a avaliação, o doente deve ser coberto com cobertores aquecidos ou algum dispositivo de aquecimento externo para prevenir a ocorrência de hipotermia na sala de trauma. Os fluidos intravenosos devem ser aquecidos antes de administrados e o ambiente deve ser mantido aquecido. O mais importante é garantir a temperatura corporal do doente e não o conforto da equipe de atendimento. F – FÓRMULA DE PARKLAND ❖ Reanimação volêmica adequada do paciente de queimadura depende do estabelecimento e da manutenção de acesso venoso confiável. Atrasos para iniciar a reanimação volêmica de pacientes com queimadura resultam em piores resultados e devem ser minimizados. O acesso venoso é mais bem PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 8 obtido com punção venosa periférica através de pele não queimada e usando cateteres curtos; entretanto, a punção de veia através de pele queimada pode ser utilizada e é preferível à não punção de acesso intravenoso. ❖ Solução de Ringer lactato sem glicose é o fluido de escolha, exceto em crianças com menos de dois anos, que devem receber Ringer lactato com glicose a 5%.Solução de Ringer lactato sem glicose é o fluido de escolha, exceto em crianças com menos de dois anos, que devem receber Ringer lactato com glicose a 5%. ❖ Fórmula de Parkland = 2 a 4ml x % SCQ x peso (kg): • 2 a 4ml/kg/% SCQ para crianças e adultos. • Idosos, portadores de insuficiência renal e de insuficiência cardíaca congestiva (ICC) devem ter seu tratamento iniciado com 2 a 3ml/kg/%SCQ e necessitam de observação mais criteriosa quanto ao resultado da diurese. • Use preferencialmente soluções cristaloides (ringer com lactato). • Faça a infusão de 50% do volume calculado nas primeiras 8 horas e 50% nas 16 horas seguintes. • Considere as horas a partir da hora da queimadura. • Mantenha a diurese entre 0,5 a 1ml/kg/h. • No trauma elétrico, mantenha a diurese em torno de 1,5ml/kg/hora ou até o clareamento da urina. • Observe a glicemia nas crianças, nos diabéticos e sempre que necessário. • Na fase de hidratação (nas 24h iniciais), evite o uso de coloide, diurético e drogas vasoativas. COMO SABER A SCQ? COMPLICAÇÕES GRAVIDADE DA QUEIMADURA ❖ Extensão/profundidade maior do que 20% de SCQ em adultos. ❖ Extensão/profundidade maior do que 10% de SCQ em crianças. ❖ Idade menor do que 3 anos ou maior do que 65 anos. ❖ Presença de lesão inalatória. ❖ Politrauma e doenças prévias associadas. ❖ Queimadura química. ❖ Trauma elétrico. ❖ Áreas nobres/especiais (veja o terceiro tópico do item 4). ❖ Violência, maus-tratos, tentativa de autoextermínio (suicídio), entre outras. MEDIDAS IMEDIATAS PARA TRATAMENTO DA QUEIMADURA ❖ Limpe a ferida com água e clorexidina degermante a 2%. Na falta desta, use água e sabão neutro. ❖ Posicionamento: mantenha elevada a cabeceira da cama do paciente, pescoço em hiperextensão e membros superiores elevados e abduzidos, se houver lesão em pilares axilares. ❖ Administre toxoide tetânico para profilaxia/ reforço antitétano. ❖ Administre bloqueador receptor de H2 para profilaxia da úlcera de estresse. ❖ Administre heparina subcutânea para profilaxia do tromboembolismo. ❖ Administre sulfadiazina de prata a 1% como antimicrobiano tópico. ❖ Curativo exposto na face e no períneo. ❖ Curativo oclusivo em quatro camadas: atadura de morim ou de tecido sintético (rayon) contendo o princípio ativo (sulfadiazina de prata a 1%), gaze absorvente/gaze de queimado, algodão hidrófilo e atadura de crepe. ❖ Restrinja o uso de antibiótico sistêmico profilático apenas às queimaduras potencialmente colonizadas e com sinais de infecção local ou sistêmica. Em outros casos, evite o uso. PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 9 ❖ Evite o uso indiscriminado de corticosteroides por qualquer via. ❖ As queimaduras circunferenciais em tórax podem necessitar de escarotomia para melhorar a expansão da caixa torácica. ❖ Para escarotomia de tórax, realize incisão em linha axilar anterior unida à linha abaixo dos últimos arcos costais ❖ Para escarotomia de membros superiores e membros inferiores, realize incisões mediais e laterais. ❖ Habitualmente, não é necessária anestesia local para tais procedimentos; porém, há necessidade de se proceder à hemostasia. SINTOMAS DE INFECÇÃO DA ÁREA QUEIMADA ❖ Mudança da coloração da lesão. ❖ Edema de bordas das feridas ou do segmento corpóreo afetado. ❖ Aprofundamento das lesões. ❖ Mudança do odor (cheiro fétido). ❖ Descolamento precoce da escara seca e transformação em escara úmida. ❖ Coloração hemorrágica sob a escara. ❖ Celulite ao redor da lesão. ❖ Vasculite no interior da lesão (pontos avermelhados). ❖ Aumento ou modificação da queixa dolorosa. QUANDO TRANSFERIR O PACIENTE PARA A UNIDADE DE TRATAMENTO DE QUEIMADURAS? ❖ Queimaduras de 2° grau em áreas maiores do que 20% da SCQ em adultos. ❖ Queimaduras de 2° grau maiores do que 10% da SCQ em crianças ou maiores de 50 anos. ❖ Queimaduras de 3° grau em qualquer extensão. ❖ Lesões na face, nos olhos, no períneo, nas mãos, nos pés e em grandes articulações. ❖ Queimadura elétrica. ❖ Queimadura química. ❖ Lesão inalatória ou lesão circunferencial de tórax ou de membros ❖ Doenças associadas, tentativa de autoextermínio (suicídio), politrauma, maus-tratos ou situações sociais adversas. ❖ A transferência do paciente deve ser solicitada à unidade de tratamento de queimaduras (UTQ) de referência, após a estabilização hemodinâmica e as medidas iniciais, com leito de UTI reservado para queimados. ❖ Pacientes graves somente deverão ser transferidos acompanhados de médico em ambulância com UTI móvel e com a possibilidade de assistência ventilatória. ❖ O transporte aéreo para pacientes com trauma, pneumotórax ou alterações pulmonares deve ser realizado com extremo cuidado, pelo risco de expansão de gases e piora clínica. ❖ As UTQs de referência sempre têm profissionais habilitados para dar orientações sobre o tratamento completo das vítimas de queimaduras. ❖ A transferência do paciente deve ser solicitada à UTQ de referência após a estabilização hemodinâmica e as medidas iniciais. ❖ Envie sempre relatório com todas as informações colhidas, as anotações de condutas e os exames realizados COMPLICAÇÕES NO PACIENTE QUEIMADO INFECÇÃO E SEPSE ❖ Mesmo com os avanços nos cuidados da vítima de queimadura, a maioria dos óbitos nessa população ocorre devido à infecção. Sabemos que estes pacientes apresentam condições favoráveis à instalação de processos infecciosos, tais como perda da integridade cutânea, imunodepressão, predisposição à translocação bacteriana a partir do trato digestivo e presença de dispositivos invasivos (ventilação mecânica, cateteres venosos profundos, sonda vesical de demora). ❖ O emprego de curativos sintéticos e biológicos e o usode curativos tradicionais, com gaze e antibióticos tópicos, reduziu expressivamente o risco de infecção da queimadura. Os antimicrobianos locais não esterilizam a área queimada, apenas mantém o número de micro-organismos sob controle. Todavia, em pacientes com mais de 30% de SCQ e naqueles onde ocorreu falência de enxerto cutâneo, esse equi- líbrio pode ser rompido, propiciando o surgimento de infecção invasiva e sepse ❖ As principais evidências de processo infeccioso incluem: • evolução de área de queimadura de segundo grau para necrose de toda a espessura da derme; • surgimento de focos de hemorragia, escuros ou negros; • aparecimento de lesões sépticas na pele íntegra em torno da queimadura, como o ectima gan- grenoso (característico da infecção por Pseu- domonas), ou surgimento de celulite (celulite infecciosa, também conhecida como celulite bacteriana, acontece quando bactérias conseguem entrar na pele, infectando as camadas mais profundas e causando sintomas como vermelhidão intensa na pele, dor e inchaço, acontecendo principalmente nos membros inferiores) em áreas adjacentes à queimadura. ❖ A propedêutica precisa ser complementada pela avaliação microbiológica. O diagnóstico definitivo de infecção de área queimada exige biópsia quantitativa da lesão suspeita; na área queimada a biópsia demonstrará invasão bacteriana da derme e contagem de 104 a 107 UFC/g de tecido queimado. Quando não é possível a realização de biópsia, os achados clínicos da ferida associados a uma piora da PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 10 contagem de leucócitos e da curva térmica podem ser elementos suficientes para o diagnóstico. ❖ Quais são as medidas que devemos adotar para reduzir a incidência de complicações infecciosas? • Existem algumas condutas que obrigatoriamente devem ser tomadas. A vigilância constante da área queimada é fundamental e um tratamento agressivo é recomendado na presença de infecção invasiva. Nos pacientes que não desenvolveram infecção, antibióticos profiláticos perioperatórios devem ser usados em desbridamento e trocas de curativos em centro cirúrgico. • A higiene das mãos, manipulação adequada de cateteres profundos e o posicionamento da cabeceira do leito a 30º a 45º são medidas a serem adotadas pela equipe assistencial. A nutrição enteral precoce reduz a probabilidade de translocação bacteriana a partir do trato gastrointestinal, preservando a integridade da mucosa intestinal. • Hoje em dia, sabemos que um controle glicêmico adequado (e não mais rigoroso) deve ser empreendido em pacientes críticos. Níveis man- idos entre 140 e 180 mg/dl parecem os ideais LESÃO PULMONAR POR INALAÇÃO ❖ Como vimos antes, em vítimas de queimaduras térmicas confinadas, a inalação de fumaça tóxica proveniente da combustão de alguns elementos que se encontravam no meio ambiente em chamas pode causar traqueobronquite e pneumonite químicas, determinando uma entidade conhecida como lesão pulmonar por inalação. ❖ As principais evidências que levam a suspeita de lesão pulmonar por inalação incluem queimaduras em cabeça e pescoço, chamuscamento das vibrissas nasais, hiperemia da orofaringe (este o mais confiável, pois coexiste lesão térmica da via aérea), tosse com escarro carbonáceo, rouquidão, sibilos, broncorreia e hipoxemia sem causa aparente. A presença de rouquidão e sibilos expiratórios evidenciam edema grave da via aérea e intoxicação por fumaça (CO). A ausência de escarro carbonáceo e produção excessiva de muco não afastam a presença de inalação. ❖ O primeiro evento na resposta à inalação é o au- mento do fluxo sanguíneo nas artérias brônquicas, com formação de edema e aumento da linfa pulmonar. O edema está associado ao aumento do número de neutrófilos locais. Essas células produzem elastase e radicais livres derivados do oxigênio, mediadores responsáveis pela lesão pulmonar. ❖ Posteriormente, as células epiteliais ciliares se separam da membrana basal e ocorre a formação intensa de exsudato. Este coalesce e forma “rolhas” de fibrina, que obstruem a via aérea, funcionando como uma espécie de válvula de direção única: o ar durante a inspiração passa por esta “rolha” e alcança as vias aéreas distais e na expiração ocorre uma redução do calibre da via aérea e o ar é aprisionado. ❖ O aprisionamento predispõe ao barotrauma durante a ventilação mecânica. Nos primeiros três dias, um intenso broncoespasmo e a própria lesão térmica da via aérea (está de forma mais imediata), podem levar à insuficiência respiratória aguda. ❖ Na evolução dos pacientes com lesão por inalação, podemos encontrar entre 72 e 96 horas após a queimadura, quadro clínico e radiológico semelhante à Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA), com infiltrados lobares difusos, resultado do aumento da permeabilidade capilar alveolar e exsudação para sua luz. Podem ocorrer microatelectasias difusas por perda de surfactante. ❖ Posteriormente, broncopneumonia secundária à colonização da árvore traqueobrônquica pode complicar ainda mais o quadro clínico. A pneumonia antes de cinco a sete dias tem como principal agente Staphylococcus resistente a meticilina; após este período, os micro-organismos mais encontrados são os Gram-negativos, sobretudo Pseudomonas aeruginosa. ❖ A radiografia de tórax é muito pouco sensível, sendo necessária a utilização de recursos diagnósticos mais sofisticados. A broncofibrosc-pia permite a visualização de inflamação e/ou ulceração da árvore traqueobrônquica além do depósito de partículas de carbono; a cintilografia de ventilação evidencia aprisionamento do radiofármaco, indicando obstrução segmentar das vias aéreas, consequência da lesão por inalação. ❖ O tratamento depende do grau de disfunção respiratória determinada pela lesão. Nos pacientes com quadros leves a moderados, o uso de oxigênio a 100% umidificado associado à fisioterapia para o tratamento da broncorreia são suficientes. ❖ Os casos graves são abordados com intubação endotraqueal seguida de ventilação mecânica. As indicações de acesso definitivo à via aérea incluem: (1) PaO2 < 60 mmHg; (2) PaCO2> 50 mmHg; (3) relação PaO2/FiO2 < 200 (SDRA); e (4) sinais de desconforto respiratório. Valores da relação PaO2/FiO2 inferiores a 350 são preocupantes, com esses pacientes necessitando de reavaliações constantes. ESPECIFICIDADES DA QUEIMADURA ELÉTRICA TRATAMENTO INICIAL ❖ De todos os pacientes internados com queimaduras, 3% a 5% possuem queimaduras pelo contato com eletricidade. ❖ A lesão elétrica é diferente das outras queimaduras, na medida em que as áreas visíveis de necrose tissular representam apenas uma pequena porção do tecido destruído. PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 11 ❖ A corrente elétrica penetra em uma parte do corpo, como os dedos ou a mão, e progride através dos tecidos com a menor resistência à corrente elétrica, geralmente os nervos, vasos sanguíneos e músculos. A pele tem uma resistência relativamente alta à corrente elétrica e é, desta forma, predominantemente poupada. ❖ A corrente, então, deixa o corpo através de uma área aterrada, tipicamente o pé. O calor gerado pela transferência de corrente elétrica e pela passagem da própria corrente danifica os tecidos. Durante essa troca, o músculo é o principal tecido através do qual a corrente flui, e, desta forma, sofre a maioria das lesões. A maior parte da musculatura está em estreita proximidade com os ossos. ❖ Os vasos sanguíneos, que transmitem grande parte da eletricidade, inicialmente permanecem patentes, mas podem progredir para trombose progressiva,à medida que as células morrem ou se reparam, resultando, desta forma, em perda tissular adicional por isquemia ❖ As lesões dividem-se nas de alta voltagem e nas de baixa voltagem. A lesão de baixa voltagem é similar às queimaduras térmicas, sem transmissão de energia aos tecidos profundos; as zonas de lesão da superfície se estendem para o interior do tecido. ❖ A maioria das correntes domiciliares (110 a 220V) produz esse tipo de lesão, que causa apenas danos locais. A pior destas lesões é a que envolve os cantos da boca (comissuras orais), e ocorre quando crianças mordem fios elétricos domiciliares. ❖ A síndrome da lesão de alta voltagem consiste em graus variáveis de queimaduras cutâneas nos sítios de entrada e saída, combinados com a destruição oculta de tecidos profundos. Frequentemente, esses pacientes também apresentam queimaduras térmicas cutâneas associadas à ignição de roupas pela descarga de corrente elétrica. ❖ A avaliação inicial consiste em reanimação cardiopulmonar, caso tenha ocorrido fibrilação ventricular. Desta forma, se os achados eletrocardiográficos iniciais estiverem alterados, ou se houver um histórico de parada cardíaca associada à lesão, a monitoração cardíaca contínua é necessária, juntamente com o tratamento farmacológico para quaisquer arritmias. ❖ Os distúrbios mais graves ocorrem nas primeiras 24 horas após a lesão. Se os pacientes com lesões elétricas não apresentarem arritmias cardíacas no eletrocardiograma inicial ou histórico recente de parada cardíaca, não é necessária monitoração adicional. ❖ Os pacientes com lesões elétricas estão sob risco de outras lesões, como serem lançados a distância pelo choque elétrico, ou caírem de alturas consideráveis, após desligarem-se da corrente elétrica. Além disso, as contrações musculares tetânicas violentas resultantes das correntes alternadas podem causar uma variedade de fraturas e luxações. Esses pacientes devem ser avaliados da mesma maneira como qualquer outro paciente com trauma contuso. ❖ O ponto principal na abordagem dos pacientes com lesões elétricas é o tratamento dos ferimentos. As lesões mais importantes localizam-se nos tecidos profundos, e o desenvolvimento subsequente de edema pode causar comprometimento vascular a qualquer região distal à lesão. A avaliação deve incluir a circulação dos leitos vasculares distais, pois podem ser necessárias escarotomias e fasciotomias imediatas. Se o compartimento muscular se encontrar excessivamente danificado e necrótico, de forma que a perspectiva de preservação de sua função seja mínima, a amputação precoce poderá ser necessária. Defendemos a exploração precoce dos leitos musculares afetados e desbridamento dos tecidos desvitalizados, prestando-se atenção aos planos periostais profundos, pois esta é a área com mais tecido muscular. O ponto principal na abordagem dos pacientes com lesões elétricas é o tratamento dos ferimentos. As lesões mais importantes localizam-se nos tecidos profundos, e o desenvolvimento subsequente de edema pode causar comprometimento vascular a qualquer região distal à lesão. A avaliação deve incluir a circulação dos leitos vasculares distais, pois podem ser necessárias escarotomias e fasciotomias imediatas. Se o compartimento muscular se encontrar excessivamente danificado e necrótico, de forma que a perspectiva de preservação de sua função seja mínima, a amputação precoce poderá ser necessária. Defendemos a exploração precoce dos leitos musculares afetados e desbridamento dos tecidos desvitalizados, prestando-se atenção aos planos periostais profundos, pois esta é a área com mais tecido muscular desvitalizados, o fechamento dos ferimentos torna-se a prioridade. Apesar de os enxertos cutâneos serem suficientes para o fechamento da maioria dos ferimentos, os retalhos podem representar uma alternativa melhor, especialmente se houver ossos e tendões expostos. Mesmo ossos e tendões expostos e superficialmente infectados podem ser preservados com a cobertura adequada usando tecidos vascularizados. É fundamental o envolvimento precoce de cirurgiões plásticos treinados nos diversos métodos de cobertura de feridas. ❖ O dano muscular resulta na liberação de hemocromatinas (mioglobina), as quais são filtradas nos glomérulos e podem resultar em nefropatia obstrutiva. Desta forma, a hidratação vigorosa e infusão de bicarbonato de sódio intravenoso (infusão contínua a 5%) e manitol (25 g a cada seis horas para adultos) são indicadas para solubilizar as hemocromatinas e manter o débito urinário, nos casos em que forem encontradas quantidades significativas de hemocromatinas no soro. Esses pacientes também requerem reposição de volumes intravenosos adicionais além das quantidades PRISCILA HIPÓLITO SILVA REIS | PÁGINA 12 previstas baseadas na área da queimadura, porque a maior parte das lesões é profunda e não pode ser avaliada pelo exame físico convencional. Nesta situação, a diurese deve ser mantida a 2 mL/kg/h. EFEITOS TARDIOS ❖ Podem ocorrer déficits neurológicos. Avaliações neurológicas seriadas devem ser realizadas como parte do exame de rotina para detectar qualquer neuropatologia precoce ou tardia. Efeitos no sistema nervoso central, como encefalopatia cortical, hemiplegia, afasia e disfunção do tronco cerebral têm sido relatados até nove meses após a lesão; lesões nervosas periféricas tardias, caracterizadas por desmielinização com vacuolização e gliose reativa, também foram observadas. Outro efeito devastador a longo prazo é o desenvolvimento de catarata, que pode surgir vários anos depois. Essas complicações podem ocorrer em até 30% dos pacientes com lesões significativas por alta voltagem, e os pacientes devem estar cientes destas possibilidades, mesmo com o melhor tratamento. PNEUMOTÓRAX DEFINIÇÃO ❖ Pneumotórax é a presença de ar entre as duas camadas da pleura (membrana fina, transparente, de duas camadas que reveste os pulmões e o interior da parede torácica), resultando em colapso parcial ou total do pulmão. Os sintomas incluem dificuldade respiratória e dor torácica. ❖ O pneumotórax é uma das complicações intraoperatórias mais comuns, ocorrendo em 5% a 8% dos pacientes. A incidência real de pneumotórax é desconhecida, pois geralmente não são realizadas radiografias pós-operatórias de rotina. ❖ Considerando que o pneumotórax resulta de uma violação do espaço pleural pelo dióxido de carbono, não existe necessidade de evacuar o gás. ❖ Uma vez que o dióxido de carbono é rapidamente absorvido e não há lesão pulmonar subjacente, o pulmão reexpande-se sem incidentes. ❖ Se identificado um pneumotórax, o paciente é mantido em terapia com oxigênio e a radiografia de tórax é repetida 2 horas após a intervenção cirúrgica. O pneumotórax deverá ser resolvido durante esse período. ❖ Pneumotórax é o acúmulo de ar no espaço pleural. Colapso cardiopulmonar e óbito podem acontecer. Descompressão imediata com jelco grosso ou colocação de um dreno torácico são procedimentos salvadores nesta situação SINTOMAS ❖ Sintomas de pneumotórax incluem dor e dispneia. Pacientes com pneumotórax espontâneo são geralmente jovens altos e magros. Exames de imagem para o diagnóstico incluem radiografia de tórax e, ocasionalmente, TC. Blebs apicais e bolhas são comumente encontrados. TC deve ser reservada para pacientes com suspeita de outras doenças pulmonares associadas. O enfisema subcutâneo pode ou não estar presente CAUSAS ❖ Ele pode ocorrer após trauma, cirurgia, punção com agulha, inserção de cateter venoso central, aumento da pressão da ventilação mecânica, ou em consequência de doença pulmonar (p. ex., DPOC, fibrose cística ou fibrose pulmonar) ou outras condições (p. ex., pneumotórax catamenial. Pneumotórax espontâneo ocorreem consequência da ruptura de blebs subpleurais (primário) ou alguma outra doença pulmonar (secundário). Pneumotórax hipertensivo ocorre quando o ar continua a se acumular no espaço pleural sem descompressão. Este problema resulta em pressão intratorácica positiva causando compressão do pulmão e mediastino, desvio do mediastino para o tórax contralateral e diminuição na ventilação e retorno venoso. TRATAMENTO PARA SEPSE DE FOCO PULMONAR ❖ Outras medidas incluem toalete pulmonar agressivo, remoção periódica (através da broncofibroscopia) de debris e “rolhas” de fibrina da via aérea distal e nebulização regular com heparina, alfa-miméticos ou polimixina B. ❖ Os broncodilatadores (β2-agonistas) devem ser usados na presença de hiperreatividade brônquica. ❖ Na presença de infecções pulmonares, está indicada antibioticoterapia sistêmica. Os esquemas devem apresentar cobertura tanto para Staphylococcus aureus resistentes à meticilina quanto para Gram- negativos, principalmente Pseudomonas aeruginosa e Klebsiella spp
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