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As queimaduras são lesões decorrentes de agentes (térmicos, químicos ou elétricos) capazes de produzir calor excessivo que danifica os tecidos corporais e acarreta em morte celular. É uma das principais causa de morte externa no Brasil. Junto com o afogamento, é a primeira causa de morte entre as crianças. Os estados que mais possuem casos de mortes por queimaduras é o Nordeste e o Sudeste. Os homens são mais vítimas de queimaduras do que as mulheres. A lesão por chamas é mais rápida e evidente do que as lesões químicas. Etiologia As causas são: - Chama e fogo (pelo ar oxidado superaquecido) - Escaldadura (líquido quente) - Contato (materiais sólidos quentes ou frios) - Químicas (agentes químicos nocivos) - Eletricidade (corrente elétrica) - Ionizantes (por raios solares, aparelhos de raio-x e UV) - Biológicas (animais) - Por atrito ou fricção As causas mais comuns são de chamas e escaldaduras (em até 5 anos de idade). Os FATORES DE RISCO são: - Idade - Localização - Demografia - Baixo nível socioeconômico (baixos recursos / espera prolonga por atendimento) Fisiopatologia ALTERAÇÕES LOCAIS Mesmo com a retirada do foco causador da queimadura, a resposta dos tecidos locais posse causar lesão nas camadas mais profundas. A queimadura por chama, líquidos quentes e por contato, induzem ao dano celular por transferência de energia, que culmina em uma necrose de coagulação. Já as queimaduras elétricas e químicas causam lesão direta às membranas celulares, além de transferência de calor, e podem causar necrose de coagulação OU de liquefação. Podemos dividir a queimadura em 3 zonas: - Zona de coagulação: área necrótica da queimadura onde as células foram destruídas, e o tecido está danificado de forma irreversível. - Zona de estase: área abaixo da de coagulação com grau de lesão moderado e com uma perfusão tissular reduzida, pois possui dano vascular com extravasamento de fluidos. Há resposta inflamatória local. Essa área pode sobreviver ou se transformar em necrose de coagulação. - Zona de hiperemia: a última, caracterizada por uma vasodilatação em virtude da inflamação circunjacente à queimadura. Região de tecido viável, na qual se inicia o processo de cicatrização. Não possui risco de necrose. ALTERAÇÕES SISTÊMICAS Ocorrem quando as queimaduras cobrem mais de 20% da área de superfície corporal total (ASCT) em adultos, e 40% em crianças. Há as seguintes fases: - Estresse - Inflamação - Hipermetabolismo É caracterizada por uma resposta circulatória hiperdinâmica com: - Aumento da temperatura corporal - Glicólise - Proteólise - Lipólise - Ciclo de substrato RESPOSTA HIPERMETABÓLICA Após a queimadura há o aumento de secreção de: catecolaminas, glicocorticoides, glucagon e dopamina, que causam a resposta hipermetabólica aguda, que culmina em um estado catabólico. Além disso, participam desse processo: - Interleucina 1 e 6 - PAF - TNF - Endotoxinas - Complexos de adesão - Radicais livres de neutrófilos - NO - Cascata de coagulação - Cascata do complemento Logo após a queimadura, iniciam os fenômenos metabólicos. FASE EBB (DE CHOQUE) = começa entre 24 a 48h e suas variáveis aumentam gradualmente dentro de 5 dias até atingirem um platô. São elas: - Redução do DC - Redução do consumo de O2 - Redução da taxa metabólica - Redução da tolerância à glicose com hiperglicemia (RI) Após isso, começa a: FASE FLOW (FASE DE FLUXO) = Começa entre 48 e 72h. Possui uma circulação hiperdinâmica e um estado hipermetabólico. Aqui a liberação de insulina chega ao dobro (RI). Há DC alto, com aumento do consumo de O2, imunossupressão e infecções. Essas alterações metabólicas se resolvem por completo após o fechamento da ferida, mas pode durar por mais 12 meses após o evento, além disso, pode permanecer: Queimadura - Níveis plasmáticos de catecolaminas e corticoides aumentados por 3 anos - Proteínas de fase aguda e constitutivas começam a se alterar 5 a 7 dias após a lesão e permanecem durante toda a internação aguda - Paratormônio e osteocalcina reduzem 10x por até 6 meses - GH e hormônio sexual diminuem após a queimadura e por 3 semanas. 1. RESISTENCIA A INSULINA A resistência insulínica (RI) vista em ambas as fases ocorre porque com a queimadura grave, aumenta-se a produção de catecolaminas, glucagon e cortisol, que por si só, estimulam a produção de glicose no fígado. A produção aumentada da glicose é direcionada às feridas, para apoiar o metabolismo anaeróbico relativamente ineficiente de fibroblastos e células endoteliais e inflamatórias. Contudo, como a produção é maior que o gasto, mesmo com a produção de insulina aumentada, há a RI. 2. CAQUEXIA LETAL Após a queimadura, a proteína muscular é degradada muito mais rápido do que é sintetizada (pode durar por 1 ano), e isso causa perda de massa corporal magra, e desgaste muscular severo. Isso culmina em diminuição da força e incapacidade de reabilitação total. Perda de 10% da massa -> disfunção imune Perda de 20% da massa -> menor capacidade de cicatrização Perda de 30% da massa -> aumento do risco de pneumonias e úlceras de pressão Perda de 40% da massa -> risco de morte Todo esse quadro é chamado de CAQUEXIA LETAL, e pode ser alcançada em menos de 1 mês. 3. SEPSE Com esse estado hipermetabólico, o paciente se torna mais suscetível de sepse. E os pacientes sépticos possuem aumento nas taxas metabólicas e no catabolismo proteico. Isso forma um ciclo vicioso. INFLAMAÇÃO E EDEMA 1. EDEMA Há ainda a liberação de mediadores inflamatórios, tanto na ferida como em outros tecidos. Isso causa vasodilatação e vasoconstrição, aumento da permeabilidade capilar e edema local e em órgãos. O edema generalizado surge por alterações nas forças de Starling, com queda da pressão hidrostática intersticial da pele queimada e aumento na pressão intersticial na pele saudável. Esse edema é maior nos tecidos queimados. 2. HISTAMINA A pele queimada possui mastócitos que liberam histamina em grandes quantidades de forma imediata. Isso causa respostas em vênulas e aumenta a formação de espaços nas junções intercelulares. EFEITOS CARDIOVASCULARES Há perda de volume plasmático, aumento da RVP e redução do DC (pela redução do volume sanguíneo, aumento da viscosidade sanguínea, redução da contratilidade cardíaca) imediatamente após a lesão. Ocorre disfunção ventricular em virtude da circulação de uma substância no sistema linfático. Assim, o aumento do estresse cardíaco, está associada a depressão miocárdica, contribuindo para a mortalidade. EFEITOS RENAIS - DC e volume sanguíneo reduzidos -> redução do fluxo sanguíneo renal e da TFG - Aumento de angiotensina, aldosterona e vasopressina, causando mais redução do fluxo renal = Oligúria Caso essa oligúria não seja revertida, pode evoluir para necrose tubular aguda e IR. As chances de IR reduzem ao realizar uma reanimação volêmica precoce. EFEITOS DIGESTIVOS - Atrofia da mucosa, em 12h após o trauma, proporcional a extensão da queimadura - Alterações na absorção, principalmente de glicose, aminoácidos, ácidos graxos e redução da atividade da lipase. Essa alteração volta ao normal entre 48 a 72h após o trauma; - Aumento da permeabilidade intestinal, principalmente ao polietilenoglicol 3350, à lactulose e ao manitol. Aumenta ainda mais e caso de infecção das queimaduras. - Redução do fluxo sanguíneo intestinal. EFEITOS IMUNES Principal efeito: DEPRESSÃO da função imunológica, marcada pela depressão da função celular em todas as partes do sistema imunológico incluindo a ativação de suas células. Com isso, possuem alto risco de desenvolver complicações infecciosas, como infecção bacteriana, pneumonia e infecções fúngicas e virais. Outras alterações:- Redução da produção de macrófagos - Contagem de neutrófilos incialmente é aumentada, após 48 a 72h, diminui um pouco - Depressão da função das células T helper - Alteração da função dos linfócitos T citotóxicos, que podem melhorar com o desbridamento precoce. Complexidade A complexidade das queimaduras é avaliada pela associação entre agente causador, tipo de queimadura e extensão da área queimada. Determinantes de gravidade: - Profundidade - Eventual lesão inalatória - Politrauma PEQUENO QUEIMADO OU QUEIMADO DE PEQUENA GRAVIDADE - Paciente com queimadura de 1º grau em qualquer extensão, em qualquer idade E/OU - Queimaduras de 2º grau com área corporal atingida até 5% em crianças < 12 anos OU - Queimaduras de 2º grau com área corporal atingida até 10% em > 12 anos MÉDIO QUEIMADO OU QUEIMADO DE MÉDIA GRAVIDADE ₢ - Queimaduras de 2º grau com área corporal atingida entre 5 e 15% em < 12 anos OU - Queimaduras de 2º grau com área corporal atingida entre 10 a 20% em > 12 anos OU - Qualquer queimadura de 2º grau envolvendo mão ou pé ou face ou pescoço ou axila ou grande articulação (axila, cotovelo, punho, coxofemoral ou hoelho ou tornozelo), em qualquer idade OU - Queimaduras que não envolvam face ou mão ou períneo ou pé, de 3º grau com até 5% da área corporal atingida em crianças de até 12 anos OU - Queimaduras que não envolvam face ou mão ou períneo ou pé, de 3º grau com até 10% da área corporal atingida em > 12 anos GRANDE QUEIMADO OU QUEIMADO DE GRANDE GRAVIDADE Consiste no paciente mais grave. - Queimaduras de 2º com área corporal atingida > 15% em < 12 anos - Queimaduras de 2º grau com área corporal atingida > 20% em > 12 anos - Queimaduras de 3º grau com área corporal atingida > 5% em < 12 anos - Queimaduras de 3º com área corporal atingida > 10% em > 12 anos - Queimaduras de 2 ou 3º grau atingindo períneo, em qualquer idade - Queimaduras de 3º grau atingindo mão ou pé ou face ou pescoço ou axila, em qualquer idade - Queimaduras de corrente elétrica - Queimaduras de qualquer extensão que tenham associadas uma das seguintes situações: lesão inalatória, politrauma, fratura óssea, trauma craniano, choque, insuficiência renal, cardíaca ou hepática, diabetes, distúrbios da coagulação e hemostasia, embolia pulmonar, infarto agudo do miocárdio, quadros infecciosos graves, síndrome compartimental ou do túnel do carpo, doenças consumptivas ou qualquer outra afecção que possa ser fator de complicação à lesão ou ao quadro clínico da queimadura. Complicações As consequências das queimaduras estão ligadas à extensão do processo inflamatório como resposta da lesão. Assim, quanto maior e mais profunda a queimadura, pior é a inflamação. Os óbitos geralmente ocorrem logo após a lesão ou semanas mais tarde em decorrência de uma falência múltipla de órgãos. As chances de morte são maiores nos extremos de idade (crianças e idosos). SÍNDROME DO COMPARTIMENTO Resulta do aumento da pressão dentro de um compartimento que interfere a perfusão para estruturas dentro desse. Na queimadura isso ocorre pela combinação da redução da elasticidade da pele e aumento do edema em tecido mole. Os sinais e sintomas são: - Dor maior que o esperado e fora de proporção ao estímulo ou lesão - Dor no alongamento passivo do músculo afetado - Edema tenso do compartimento afetado - Parestesias ou sensação alterada distal ao compartimento afetado Síndromes de compartimento também podem se apresentar na circunferência do tórax e do abdome, levando ao aumento das pressões inspiratórias máximas ou abdominais. Nesses casos é necessário a realização de escarotomias torácicas e abdominais, ao longo das linhas axilares anteriores, com incisão transversal na linha clavicular e na junção do tórax e abdome. INFECÇÃO E SEPSE As condições que favorecem a infecções são: - Perda da integridade cutânea - Imunodepressão - Predisposição à translocação bacteriana do trato digestivo - Presença de dispositivos invasivos, como uma IOT. As principais evidências de processo infeccioso são: - Evolução da área de queimadura de 2º grau para necrose de toda espessura da derme - Surgimento de focos hemorrágicos escuros ou negros - Aparecimento de lesões sépticas na pele integra em torno da queimadura O diagnóstico definitivo é feito a partir da biópsia da lesão suspeita, que se positivo, irá demonstrar invasão bacteriana da derme e contagem de 104 a 107 UFC/g no tecido queimado. Quando NÃO é possível a realização da biópsia, pode diagnosticar com achados clínicos + piora dos leucócitos + piora da curva térmica LESÃO INALATÓRIA O 1º evento é o aumento do fluxo sanguíneo nas artérias brônquicas. Nos 3 primeiros dias, um intenso broncoespasmo e a própria lesão térmica da via aérea podem causar insuficiência respiratória aguda. A broncopneumonia secundária à colonização da árvore brônquica pode complicar ainda mais o quadro. Os principais agentes associados são o Staphylococcus resistente a meticilina e o Pseudomonas aeruginosa. O diagnóstico de pneumonia é feito com: - Surgimento de nova imagem radiológica, Iinfiltrado, cavitação ou consolidação - Presença de sepse - Alterações recentes no aspecto do escarro e/ou cultura quantitativa. Nos pacientes com quadro leve apenas o uso de O2 a 100% e a fisioterapia são suficientes. Em casos graves (PaO2 < 60 mmHg; PaCO2 > 50 mmHg; relação PaO2/FiO2 < 200 – SDRA; sinais de desconforto respiratório), processe com IOT e VM. FALÊNCIA MÚLTIPLA DE ÓRGÃOS Normalmente está associada a sepse pela resposta inflamatória sistêmica oriunda da queimadura. O paciente queimado pode ter origem infecciosa de agentes invasivos ou de infecções pulmonares. À medida que microrganismos proliferam desordenadamente, endotoxinas são liberadas das paredes celulares de bactérias Gram-negativas, e exotoxinas de bactérias Gram-positivas e Gram-negativas. Isso leva ao início de uma cascata de mediadores inflamatórios que podem resultar em lesões de órgãos e progressão para a falência dos órgãos. O desenvolvimento geral da falência de órgãos começa quer no sistema renal quer no pulmonar e pode progredir para o fígado, intestino, sistema hematológico e sistema nervoso central. INSUFICIÊNCIA RENAL Apesar da ressuscitação volêmica, a insuficiência renal (IR) pode se desenvolver 2 a 14 dias após a reanimação volêmica inicial. Ela se caracteriza por: - Redução débitos urinário - Sobrecarga volêmica - Anormalidade eletrolíticas - Incluindo acidose metabólica - Hipercalemia - Desenvolvimento de azotemia - Aumento sérico de creatinina O tratamento é voltado à prevenção das complicações associadas. Quase invariavelmente, os pacientes gravemente queimados necessitam de potássio exógeno por causa da resposta de aumento da aldosterona que resulta em perda de potássio. Caso nenhuma outra terapia seja eficaz, pode realizar diálise, sendo a hemodiálise a preferida nos adultos. INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA Ocorre redução das concentrações de proteínas da cascata da coagulação para níveis críticos, e o paciente desenvolve coagulopatia. Toxinas não são eliminadas da circulação sanguínea e aumentam as concentrações de bilirrubina. O empenho em prevenir a insuficiência hepática representa o único método de tratamento eficaz. Em casos de coagulopatia o tratamento deve ser direcionado à reposição dos fatores II, VII, IX e X até a recuperação hepática. A reposição de albumina pode ser necessária também. INSUFICIÊNCIA HEMATOLÓGICA Pode ocorrer: - Depleção e comprometimento da síntese de fatores de coagulação - Trombocitopenia. A depleção dos fatores de coagulação ocorre pela coagulação intravascular disseminada associada à sepse. Para o seu tratamento, deve ser realizado a infusão de plasma fresco congelado e crioprecipitado. Trombocitopenia é comum em caos graves pela depleção que ocorre durante as excisões cirúrgicas. Acontagem de plaquetas < 50.000 é comum e não requer tratamento. Apenas quando o sangramento é difuso e observado a partir de acessos intravenosos deve-se considerar a administração de plaquetas exógena. FALÊNCIA DO SNC O surgimento de alterações no estado mental em um grande queimado não atribuídas a sedativos deve motivar a busca de um foco séptico. O tratamento é de suporte. OUTRAS COMPLICAÇÕES - Íleo adinamico, pode aparecer nos primeiros dias após a queimadura; - Úlcera de Curling, que consiste em uma ulceração aguda do estomago e duodeno - Síndrome de Ogilvie, pseudo obstrução colônica - Úlcera de Marjolin, um carcinoma de células escamosas que ocorre na cicatriz da queimadura após anos da fase aguda (média de 35 anos). O tumor possui comportamento agressivo. Cuidados Pré-Hospitalar 1. Antes de serem submetidos a qualquer tratamento específico, os pacientes queimados devem ser removidos do cenário do trauma, e o processo lesivo, interrompido. 2. Precauções como o uso de luvas, aventais, máscara e óculos de proteção, devem ser tomadas quando há probabilidade de contato com sangue ou fluidos corporais. 3. Deve-se apagar o fogo das roupas em combustão e removê-las o mais cedo possível para prevenir lesões adicionais. Todos os anéis, relógios, joias e cintos devem ser removidos, pois eles retêm calor e podem produzir um efeito torniquete. 4. Água à temperatura ambiente pode ser derramada no ferimento dentro de 15 minutos da lesão para diminuir a profundidade do ferimento, mas quaisquer medidas subsequentes para refrescar o ferimento devem ser evitadas de modo a prevenir a hipotermia. 5. O paciente deve ser envolvido com um cobertor para minimizar a perda de calor e controlar a temperatura. 6. Deve cobrir o ferimento para evitar o contato com as terminações nervosas expostas. 7. Em caso de vítimas com lesões a partir de 2º grau com > 20% de SCQ, obter acesso venoso periférico e realizar infusão de cristaloide (RL) calculando Kg X SCQ estimada / 8 8. Pequenas doses de morfina intravenosa podem ser administradas após a avaliação completa. Avaliação Primária A primeira etapa é identificar as condições que colocam a vida em risco e seguir com a identificação do tipo de queimadura, extensão e profundidade. Deve-se adotar medidas para salvar o paciente: interromper o processo, garantir as vias aéreas e a ventilação, manejo da circulação. INTERNAÇÃO EM CENTRO DE TRATAMENTO DE QUEIMADURAS: - Queimadura de 3º grau - Queimadura de 2º grau ≥ 10% - Paciente com comorbidades - Queimadura elétrica e/ou inalatória - Queimadura em face, mãos, pés, genitália, períneo e articulações principais - Vítimas de trauma - Risco social INTERNAÇÃO EM UTI: - Queimadura ≥ 20% - Paciente com comorbidades - Queimadura elétrica e/ou inalatória - Vítimas de trauma - Pacientes que necessitam de droga vasoativa ou VM PASSO 1 – INTERROMPER O PROCESSO Deve remover as roupas do paciente para impedir o processo de queima, tomando cuidado para não descolar as aderências. Ao mesmo tempo deve ter cuidado com a hipotermia. Deve ter cuidado ao retirar roupas ainda contaminadas pelo produto químico. Escove qualquer produto químico seco da ferida e depois descontamine as áreas queimadas e enxague com grandes quantidades de irrigação com solução salina. Por fim, cubra o paciente com lençóis quentes, limpos e secos para evitar hipotermia. Após terem sido observadas as etapas da abordagem geral inicial, quando se deve assegurar que o local e o contato com a vítima estejam seguros, deve-se realizar o clássico ABCDE: A (airway), B (breathing), C (circulation), D (disability), E (exposition). PASSO 2 – (A) VIA AÉREA A via aérea do paciente queimado pode sofrer com lesão direta, obstrução por edema, lesão química e intoxicação. Esse paciente pode se apresenta com insuficiência respiratória precoce ou tardia. É importante avaliar a necessidade de IOT, sendo as principais indicações de uma IOT precoce: - Sinais de obstrução das VA (rouquidão, estridor, uso de músculo respiratório acessório, retração esternal) - Extensão da queimadura (SCQ > 40-50%) - Edema significativo ou risco de edema - Dificuldade em engolir - Queimadura de cabeça e face - Queimadura ou trauma intraoral - Queimadura da circunferência do pescoço - Sinais de comprometimento respiratório: incapacidade para limpar secreções, fadiga respiratória, pobre oxigenação ou ventilação - Diminuição do nível de consciência - Transferência antecipada de serviço, com o conhecimento de inexperiência do pessoal transportador - Estridor (é tardio), significa IOT imediata - Glasgow < ou = 8 As queimaduras de face e boca causam edema mais localizado e apresentam maior risco de comprometimento das vias aéreas. Contudo, as manifestações clínicas de lesão por inalação podem ser sutis e não aparecem nas primeiras 24h. Assim, deve examinar a orofaringe do paciente, buscando sinais de inflamação, lesão de mucosa, fuligem na faringe e edema. NÃO deve esperar por alterações no raio-x ou mudanças na gasometria arterial para realizar a IOT. É recomendado a extubação precoce dos pacientes queimados, para permitir que os pacientes limpem sua spróprias vias aéreas (toalete pulmonar). O primeiro sinal de insuficiência pulmonar iminente é um declínio na oxigenação (SatO2 < 92%). A traqueostomia precoce (dentro da 1º semana) pode ser indicada naqueles com queimaduras importantes, que provavelmente necessitarão de ventilação mecânica a longo prazo. PASSO 3 – (B) VENTILAÇÃO Deve-se se preocupar com a ventilação por 3 causas: hipóxia, envenenamento por monóxido de carbono e lesão por inalação de fumaça. Nessas situações deve administrar oxigênio suplementar com ou sem IOT. Sempre deve presumir a inalação de monóxido de carbono (CO) em pacientes queimados em áreas fechadas, mas o diagnóstico de envenenamento é feito com a medição direta de carboxigemoglobina (HbCO). Níveis mais altos de CO podem resultar em: - Dor de cabeça - Confusão mental - Coma - Morte Além disso, a meia-vida do CO no ar ambiente é de 40 minutos, enquanto com O2 a 100% através de máscara não-reinalante, a meia-vida passa a ser de 40 minutos. Assim, todo paciente que esteve envolvido em um incêndio em espaço fechado, deve receber o tratamento empírico com o O2 a 100% por 4 a 6 horas. * Se o paciente possuir DPOC, deve ser intensamente monitorado quando submetido a O2 100%. * A oximetria de pulso não é útil para diagnosticar, pois não consegue diferenciar as hemoglobinas. O tratamento da lesão por inalação consiste em suporte ventilatório, toalete pulmonar agressiva, remoção broncoscópica de rolhas de secreção e terapia de nebulização. A terapia de nebulização pode consistir em heparina, alfamiméticos ou polimixina B e é aplicada entre 2 e 6 vezes ao dia. A intoxicação por cianeto é causada pela inalação de fumaça derivada da combustão de alguns elementos como poliuretano, náilon, lã e algodão. A clínica é inespecífica e o diagnóstico deve ser empírico, nos pacientes vítimas de incêndio de ambientes fechados que não respondem completamente ao O2. O tratamento é feito com tiossulfato de sódio e hidroxicobalamina. PASSO 4 – (C) CIRCULAÇÃO E RESSUCITAÇÃO É difícil a avaliação do volume circulante no paciente gravemente queimado. Ele pode possuir lesões que contribuam para o choque hipovolêmico, oriundo da inflamação e assim deve fornecer fluidos de reanimação em queimaduras profundas e de extensão > 20%. Para isso, estabelece 2 acessos venosos periférico de grande calibre (18). Se a extensão da queimadura impedir a colocação do cateter através da pele não queimada, coloque o IV através a pele queimada em uma veia acessível. Se IVs periféricos não pode ser obtido, considere o acesso venoso central ou infusão intraóssea. Após isso, comece a infusão com um cristaloide isotônico aquecido, de preferência o Ringer Lactato. Assim,a ressuscitação de fluidos deve começar com: 2ml de Ringer lactato X Kg do paciente X Extensão da queimadura de 2º e 3º grau (%) Após esse cálculo, inicia metade do fluido total nas primeiras 8h após a queimadura; e metade restante é administrada durante as 16h subsequentes. Exemplo: Homem, de 100kg, com 80% de SCQ 2ml X 100 X 80 = 16.000 mL em 24h 8.000 mL – nas primeiras 8h 8.000 mL – nas próximas 16h Padrão de 1.000mL/h Em pacientes com queimadura elétrica, realiza a seguinte fórmula: 4 ml LR x kg x % TBSA until urine clears Em seguida, insira um cateter urinário permanente em todos os pacientes que recebem fluidos de reanimação, para monitorar o débito urinário e avaliar a perfusão. A quantidade de fluidos fornecido deve ser ajustado com base na produção de urina. Em adultos, urina a saída deve ser mantida entre 30 e 50 mL/Kg/h, para minimizar as chances de ressuscitação excessiva. Se a taxa de ressuscitação inicial não produzir a saída de urina desejada, aumente a taxa de fluido até que a meta de produção de urina é atingida. Em casos de sub-reanimação pode haver hipoperfusão e lesão de órgão-alvo. Já uma ressuscitação excessiva resulta em aumento do edema. 1. MONITORIZAÇÃO CARDÍACA É importante a monitorização com eletrocardiograma para avaliar distúrbios do ritmo cardíaco que podem aparecer em casos de hipóxia e anormalidades eletrolíticas ou ácido-básicas. 2. REPOSIÇÃO DE ALBUMINA Só deve ser realizada nas primeiras 12h após a queimadura e se o paciente tiver > 30% de SCQ. Usa a albumina a 20% diluída para correr apenas albumina 5%. Atendimento do Paciente Nessa etapa realiza: história através da AMPLE, extensão da queimadura e sua profundidade. A história é coletada seguindo o AMPLE: A – Alergias M – medicamentos usados atualmente P – Pregnanc (gravidez) ou Past illnesses (doenças anteriores L – Last (última refeição) E – Eventos relacionados a lesão Deve ainda verificar o estado de imunização do paciente contra o tétano. EXTENSÃO Quanto mais extensa a lesão maior a inflamação e maiores são as chances de disfunções respiratórias, circulatórias, choque, infecção e óbito. Por isso, a conduta depende da extensão. Para calcular a extensão da queimadura, pode ser utilizada: o Diagrama de Lund e Browder (precisa), Regra dos Nove e cálculo da área em relação à palma da mão (aproximações). O DLB é bastante preciso em diferentes faixas etárias e usa um cálculo para cada área do corpo. Outra forma de medir é utilizando o tamanho da palma da mão do paciente, incluindo os dedos, como 1%. A mais utilizada é a Regra dos nove, criada por Wallace e Pulaski, que conta a superfície corporal queimada (SCQ) de forma aproximada. Os vários segmentos corporais são estimados em 9 ou múltiplos de 9. PROFUNDIDADE A profundidade da lesão depende de: - Temperatura à qual a pele foi exposta - Calor específico do agente causal - Duração da exposição Epiderme -> Derme -> Tecido Adiposo Subcutâneo -> Estruturas Subjacentes a) QUEIMADURA 1º GRAU = são dolorosas, eritematosas e empalidecem ao toque. - A barreira epidérmica está INTACTA. - NÃO causam cicatrizes - Evoluem com melhora espontânea dos sintomas em 2 ou 3 dias, podendo apresentar descamação nesse período - Há regeneração integral da epiderme após 1 semana Ex.: Queimadura solar ou pequena escaldadura. b) QUEIMADURAS DE 2º GRAU = SEMPRE possui dano dérmico. São divididas em 2 tipos: Dérmicas Superficiais (papilar) – eritematosas, dolorosas, empalidecem ao toque. Formam bolhas. / Reepitelizam espontaneamente por estruturas epidérmicas retidas nas cristas dermoepidérmicas, folículos pilosos e glândulas sudoríparas em 1 a 2 semanas. Após a cicatrização, podem ter leve descoloração a longo prazo. Dérmicas Profundas (reticular) – atinge a derme reticular. São mais pálidas e mosqueadas, não empalidecem ao toque. São DOLOROSAS ao estímulo tátil. Cicatrizam em 2 a 5 semanas por reepitelização a partir de queratinócitos dos folículos pilosos e das glândulas sudoríparas. Formam cicatrizes. c) QUEIMADURAS DE 3º GRAU: envolvimento total da derme e epiderme, não restando apêndice dérmico ou epidérmico. É uma escara dura, semelhante ao couro. É INDOLOR e preta ou branca ou cor de cereja. Reepitalizam-se a partir das bordas cutâneas. Quando são profundas e de espessura total, requerem enxertos de pele do paciente para cicatrizarem em tempo hábil. Como a rede vascular foi destruída, não há exsudação. d) QUEIMADURAS DE 4º GRAU = envolvem órgãos abaixo da pele, como músculos, ossos e cérebro. Avaliação Secundária Essa avaliação inclui: - Documentação - Exames - Manutenção da circulação - Inserção de tubo gástrico - Analgésicos narcóticos e sedativos - Tratamento de feridas - Imunização contra tétano EXAMES Deve ser obtido: - Gasometria arterial, para avaliar a capacidade pulmonar; - Radiografia de tórax; - Hemograma, tipagem sanguíne e fator RH - Medição de HbCO basal. - Glicose sérica - Eletrólitos - Bhcg (mulheres em idade fértil) MANUTENÇÃO DA CIRCULAÇÃO PERIFÉRICA Serve para descartar a síndrome compartimental. Para manter a circulação periférica, o médico deve: - Remover todas as joias e bandas nas extremidades - Avaliar o status da circulação distal, verificando cianose, recarga capilar e sinais neurológicos progressivos (parestesias e dor no tecido profundo). - O Doppler pode avaliar o fluxo arterial das artérias digitais e dos arcos palmoplantares das extremidades afetadas. - Aliviar o comprometimento circulatório em um membro circunferenciamente queimado com escarotomia. - Pode ser necessário a fasciotomia para restaurar a circulação em pacientes com trauma esquelético associado, lesão por esmagamento ou lesão elétrica de alta tensão CATETERISMO GÁSTRICO Deve ser inserido na forma de sucção caso o paciente apresente: vômitos, náuseas, distensão abdominal ou quando as queimaduras envolvam mais de 20% SCQ ANALGESIA Não devem ser realizados antes da ressuscitação volêmica e do aporte de O2, uma vez que a hipovolemia e a hipoxemia podem causar agitação e ansiedade, que podem ser mascaradas pelo uso de narcóticos. Quando administrados, devem ser em pequenas doses, apenas IV. Pode empregar a morfina em doses IV de 2 a 5mg até o alívio sintomático. Nos pacientes com ansiedade, pode ser realizado benzodiazepínicos. TRATAMENTO DAS FERIDAS - Apenas cobrir as feridas de queimadura com lençóis limpos diminui a dor e desvia as correntes de ar. - NÃO deve estourar bolhas ou aplicar anti-séptico. - NÃO aplique água fria em um paciente com queimaduras extensas (> 10%) - Pode limpar a ferida suja com soro fisiológico estéril - Ao entrar em contato com a ferida, deve usar luvas e aventais 1º GRAU: Conforto com uso tópico de pomadas emolientes, com ou sem aloé, e anti-inflamatórios orais não esteroidais. Os AINES orais ajudam no controle da dor. 2º GRAU: São tratadas com trocas diárias de curativo com antibióticos tópicos, compressas ou gazes de algodão e ataduras elásticas. 2º GRAUS PROFUNDAS OU 3º GRAU: Exigem excisão cirúrgica e enxerto de pele quando as queimaduras apresentam tamanhos consideráveis. Os curativos pré-cirurgicos devem conter a proliferação bacteriana e ocluir até que a cirurgia seja realizada. 1) EXCISÃO CIRÚRGICA DAS FERIDAS: O tecido queimado é removido de modo tangencial e sequencial, até a ferida ser exposta a uma derme saudável, gordura, musculo e periósteo. Após a excisão cirúrgica deve ser realizado o fechamento da ferida. Pode ser feito com autoenxertos de pele não lesionada. Em caso de queimadura de 40% da ASCT, é preferível o uso de aloenxertos (pele de cadáver). 2) ESCAROTOMIAS: Devem ser realizadas quando queimaduras de 2º e 3º grau envolvem a circunferência de uma extremidade, com sinais clínicos de comprometimento da circulação periférica ou de pressões teciduais >30 mmHg. É realizada por meio de incisão lateral e medial da extremidade afetada usando uma lâmina de bisturi ou um eletrocautério. As incisões são realizadas nas eminências tenar e hipotenar e ao longo das faces dorsolaterais dos dígitos para abrir a mão completamente, se ela estiver envolvida. A fasciotomia (incisões nas camadas fasciais) pode ser necessário caso haja aumento das pressões compartimentais musculares (síndrome compartimental). Pode ainda ser realizada as escarotomias descompressivas no tórax e abdome que consiste em incisões de relaxamento de uma crosta constritiva circular que esteja comprometendo a expansibilidade torácica, prejudicando a ventilação. Complicações: hipotensão transitória. ANTIBIÓTICOS NÃO há indicação de ABO sistêmicos profiláticos no período pós-queima, apenas quando houver infecção. (ATLS) Antibióticos tópicos, principalmente as pomadas são aplicadas diretamente na ferida, que, por sua vez, é coberta com curativo. As principais pomadas são: sulfadiazina de prata 1%, neomicina, bacitracina e nistatina (antifúngico). A sulfadiazina de prata é a pomada mais utilizada. Ela tem um amplo espectro de atividade, pois cobrem Gram-positivos, a maioria dos Gram- negativos e alguns fungos. Tratamento Adicional SUPORTE NUTRICIONAL A composição da dieta ideal deve conter 1 a 2 g/kg/dia de proteína. As calorias não proteicas podem ser fornecidas tanto como carboidratos quanto como gorduras. Os hidratos de carbono têm a vantagem de estimular a produção endógena de insulina, que pode ter efeitos benéficos no músculo. A dieta pode ser administrada em 2 formas, tanto por via enteral através de cateteres enterais, ou por via parenteral através de cateteres intravenosos. SUPORTE AMBIENTAL + FISIOTERAPIA Transferência do paciente Normalmente requer transferência para centro de trauma: - Queimaduras de espessura parcial em > 10% - Queimaduras envolvendo o rosto, mãos, pés, genitália, períneo e grandes articulações - Queimaduras de 3º grau em qualquer faixa etária - Queimaduras elétricas, incluindo ferimentos por raios - Queimaduras químicas - Lesão por inalação - Queimadura em pacientes com doenças pré-existentes passíveis de complicação - Qualquer paciente com queimaduras e trauma concomitante, em que a queimadura consiste no maior risco a vida - Crianças queimadas em hospitais sem qualificação pessoal ou equipamento para cuidados pediátricos - Queimadura em pacientes que necessitarão de intervenção social, emocional. Queimadura Elétrica Queimaduras elétricas resultam quando uma fonte de energia elétrica o poder faz contato com o paciente, e a corrente é transmitido através do corpo. O corpo também pode servir como um condutor de volume de energia elétrica, e o calor gerado resulta em lesão térmica ao tecido. São queimaduras graves e a superfície do corpo e as extremidades, especialmente os dedos, estão especialmente em risco. Além disso, a condução elétrica dentro dos vasos e nervos pode causar trombose e lesão dos nervos. Lesões elétricas graves geralmente resulta em contratura da extremidade afetada. Pacientes com graves lesões elétricas frequentemente requerem fasciotomias e deve ser transferido para centros de queimados no início do tratamento. O tratamento inclui estabelecimento de via aérea para garantir a ventilação e oxigenação adequadas; estabelecer um acesso venoso periférico na extremidade não envolvida; monitorização por ECG; e cateter urinário. Complicações: arritmias cardíacas e rabdomiólise. Queimadura Química Queimaduras ácidas causam uma necrose de coagulação do tecido circundante, que impede a penetração do ácido em alguma extensão. TRATAMENTO DA ÁREA QUEIMADA Curativos Oclusivos: 1º-3º dia = sulfadiazina de prata 1% + nitrato de cérico 0,4% > 4º dia = sulfadiazina de prata 1% A troca deve ser diária de preferência em centro cirúrgico, em ambiente estéril. A limpeza deve ser cuidadosa com sabão neutro As queimaduras por álcali são geralmente mais graves do que as queimaduras com ácido, à medida que o álcali penetra mais profundamente. A remoção rápida e imediata do produto químico e o cuidado da ferida são essenciais. Se o pó seco ainda estiver presente na pele, escove-o antes de irrigar com água. Caso contrário, imediatamente enxágue o produto químico com grandes quantidades de água aquecida água, por pelo menos 20 a 30 minutos, usando um chuveiro ou mangueira. Queimaduras alcalinas requerem mais tempo irrigação. REFERÊNCIAS - ATLS 10ª edição - Tratado de Cirurgia, Sabiston 20º edição - Cartilha de tratamento de emergência de queimaduras, MS, 2012 - Queimadura, PROVAB, UNASUS, 2014 - Revista Brasileira de Queimaduras, 2016
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