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Brasília-DF. Cuidados Paliativos: asPeCtos ÉtiCos, soCiais e PsiCológiCos Elaboração Wellington Luiz de Lima Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................. 4 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA .................................................................... 5 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7 UNIDADE I CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS ................................................................... 9 CAPÍTULO 1 CUIDADOS PALIATIVOS FRENTE AOS CUIDADOS, DIAGNÓSTICO E SUPORTE FAMILIAR................. 9 UNIDADE II ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS ................................................................................................. 22 CAPÍTULO 1 MANEJO DOS CUIDADOS PALIATIVOS ..................................................................................... 22 UNIDADE III CUIDADOS PALIATIVOS DE FORMA AMPLA ............................................................................................ 40 CAPÍTULO 1 CONHECIMENTO SOBRE OS CUIDADOS PALIATIVOS ................................................................ 40 PARA (NÃO) FINALIZAR ..................................................................................................................... 88 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 89 4 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 5 Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Praticando Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer o processo de aprendizagem do aluno. 6 Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 7 Introdução O tema “Cuidados Paliativos: Aspectos Éticos, Sociais e Psicológicos” visa a ajudar os profissionais enfermeiros no aprimoramento dos conhecimentos específicos e científicos na assistência de Enfermagem aos pacientes críticos, atualizando-os de modo a atuarem em caso de pacientes em estágio terminal. O enfermeiro deve possuir habilidades e competências quanto aos cuidados intensivos prestados a crianças, a adultos graves e a idosos, dedicando-lhes assistência durante todo o processo terapêutico. Objetivos » Agregar conhecimentos ao profissional para prestação de assistência adequada ao paciente em estágio terminal que necessita de cuidados diários e intensivos. » Apresentar as principais situações de cuidados, assistência e habilidades do profissional enfermeiro dentro de um ambiente intra e extra-hospitalar. 8 9 UNIDADE I CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS CAPÍTULO 1 Cuidados paliativos frente aos cuidados, diagnóstico e suporte familiar O que são cuidados paliativos De acordo com a Academia Nacional de Cuidados Paliativos (2012), são princípios dos Cuidados Paliativos que, finalmente, começam a ser reconhecidos em todas as esferas da sociedade brasileira: o alívio do sofrimento, a compaixão pelo doente e por seus familiares, o controle impecável dos sintomas e da dor, a busca pela autonomia e pela manutenção de uma vida ativa enquanto ela durar. Importante sabermos quando foram definidos os referidos cuidados: Os Cuidados Paliativos foram definidos pela Organização Mundial de Saúde em 2002 como uma abordagem ou tratamento que melhora a qualidade de vida de pacientes e familiares diante de doenças que ameacem a continuidade da vida. Para tanto, é necessário avaliar e controlar de forma impecável não somente a dor, mas, todos os sintomas de natureza física, social, emocional e espiritual (ANCP, 2012). Conforme explica a Academia Nacional de Cuidados Paliativos (2012), o tratamento em Cuidados Paliativos deve reunir as habilidades de uma equipe multiprofissional para ajudar o paciente a adaptar-se às mudanças de vida, impostas pela doença, e promover a reflexão necessária para o enfrentamento dessa condição de ameaça à vida para pacientes e familiares. Para esse trabalho ser realizado, é necessária uma equipe mínima, composta por (ANCP, 2012): » um médico; 10 UNIDADE I │ CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS » uma enfermeira; » uma psicóloga; » uma assistente social; » pelo menos um profissional da área da reabilitação (a ser definido conforme a necessidade do paciente); » Todos esses profissionais devem ser devidamente treinados no que diz respeito à prática da paliação. Vale ressaltar que as ações paliativas devem iniciar-se já no momento do diagnóstico e devem permanecer de forma conjunta com as terapêuticas utilizadas no combate à doença: A Organização Mundial de Saúde desenhou um modelo de intervenção em Cuidados Paliativos onde as ações paliativas têm início já no momento do diagnóstico e o cuidado paliativo se desenvolve de forma conjunta com as terapêuticas capazes de modificar o curso da doença. A paliação ganha expressão e importância para o doente à medida que o tratamento modificador da doença (em busca da cura) perde sua efetividade.Na fase final da vida, os Cuidados Paliativos são imperiosos e perduram no período do luto, de forma individualizada (ANCP, 2012). Como bem explica a Academia Nacional de Cuidados Paliativos (2012), as ações incluem medidas terapêuticas para o controle dos sintomas físicos, intervenções psicoterapêuticas e apoio espiritual ao paciente do diagnóstico ao óbito. Para os familiares, as ações se dividem entre: 1. apoio social e espiritual; 2. intervenções psicoterapêuticas do diagnóstico ao período do luto. Um programa adequado inclui ainda outras medidas, quais sejam, sustentação espiritual e psicoterapia para os profissionais da equipe, além de educação continuada (ANCP, 2012). Então, qual seria a condição ideal para o desenvolvimento de um atendimento satisfatório? “[...] uma rede de ações composta por consultas ambulatoriais, assistência domiciliar e internação em unidade de média complexidade, destinada ao controle de ocorrências clínicas e aos cuidados de final de vida” (ANCP, 2012). 11 CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE I Figura 1. Fonte: http://www.sol.pt/noticia/19689 História dos cuidados paliativos Alguns historiadores apontam que a filosofia paliativista começou na antiguidade, com as primeiras definições sobre o cuidar. Na Idade Média, durante as Cruzadas, era comum achar hospices (hospedarias, em português) em monastérios, que abrigavam não somente os doentes e moribundos, mas também os famintos, mulheres em trabalho de parto, pobres, órfãos e leprosos. Essa forma de hospitalidade tinha como característica o acolhimento, a proteção, o alívio do sofrimento, mais do que a busca pela cura (ANCP.2012). Um jovem padre francês, no século XVII, chamado São Vicente de Paula fundou a Ordem das Irmãs da Caridade em Paris e abriu várias casas para órfãos, pobres, doentes e moribundos. Em 1900, cinco das Irmãs da Caridade, irlandesas, fundaram o St. Josephs´s Convent, em Londres, e começaram a visitar os doentes em suas casas. Em 1902, elas abriram o St. Joseph´s Hospice com 30 camas para moribundos pobres (ANCP.2012). Bem, e no Brasil? Quando surgiu? Muitos afirmam que algumas iniciativas ocorreram por volta dos anos 70, entretanto, os primeiros serviços organizados remontam aos anos 90. Vale a pena, ainda, citar um serviço pioneiro no que diz respeito a Cuidados Paliativos no Brasil: trata-se do hospital Unidade IV, inaugurado em 1998 pelo Instituto Nacional do Câncer – INCA, do Ministério da Saúde. Após esse breve histórico, vejamos como atualmente estão as atividades relacionadas a Cuidados Paliativos no Brasil: No Brasil, as atividades relacionadas a Cuidados Paliativos ainda precisam ser regularizadas na forma de lei. Ainda imperam no Brasil um enorme desconhecimento e muito preconceito relacionado aos 12 UNIDADE I │ CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS Cuidados Paliativos, principalmente entre os médicos, profissionais de saúde, gestores hospitalares e poder judiciário. Ainda se confunde atendimento paliativo com eutanásia e há um enorme preconceito com relação ao uso de opióides, como a morfina, para o alívio da dor (ANCP, 2012). Infelizmente, ainda são poucos os serviços de Cuidados Paliativos no Brasil. Menor ainda é o número daqueles que oferecem atenção baseada em critérios científicos e de qualidade. A grande maioria dos serviços ainda requer a implantação de modelos padronizados de atendimento que garantam a eficácia e a qualidade (ANCP, 2012). A Academia Nacional de Cuidados Paliativos (2012) aponta que há uma lacuna na formação de enfermeiros e profissionais de saúde em Cuidados Paliativos, essencial para o atendimento adequado. Isso ocorre em virtude da ausência de residência na enfermagem e da pouca oferta de cursos de especialização e de pós-graduação de qualidade. Há que se ressaltar que o Cuidado Paliativo não se baseia em protocolos, mas em princípios. Não se fala mais em terminalidade, mas em doença que ameaça a vida. Indica-se o cuidado desde o diagnóstico, expandindo nosso campo de atuação (ADRIANA et al. 2009). Hospedaria de cuidados paliativos A fim de garantir melhor qualidade de vida ao paciente e a seus familiares ou a pessoas de seu convívio social, o objetivo do serviço é promover uma assistência ativa e integral ao paciente cuja doença não responda mais ao tratamento curativo (MATSUMOTO e MANNA, 2008). E isso deve ser feito com a utilização de técnicas que aumentam o conforto, mas não aumentam nem diminuem a sobrevida” (MATSUMOTO e MANNA, 2008). Matsumoto e Manna (2008) afirmam que: Os pacientes atendidos em nosso serviço têm doença em fase avançada, progressiva e incurável; falta de possibilidades razoáveis de resposta ao tratamento específico; presença de numerosos problemas ou sintomas intensos, múltiplos, multifatoriais e alternantes e com grande impacto emocional, tanto do paciente como de seus familiares, relacionado à presença ou possibilidade incontestável da morte (MATSUMOTO e MANNA, 2008). 13 CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE I As ações são desenvolvidas por equipe multiprofissional, com abordagem baseada na haptonomia, ciência das interações e das relações afetivas humanas. Há que se esclarecer que a palavra “haptonomia” vem da conjunção dos termos gregos “hapsis”, que significa tato, sentido, sentimento e “nomos”, que significa a lei, a norma, a regra (FRANZ VELDMAN, 2001). A equipe é composta por: médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, auxiliares de enfermagem, nutricionistas, cozinheiros, seguranças, cuidadores, voluntários e um assistente espiritual, contando também com o auxílio de dentistas, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e fonoaudiólogas, em prédio próprio para esse fim, com salas, cozinha, banheiros, quartos, jardim, varanda, propiciando um ambiente familiar que se distancia do aspecto hospitalar, aproximando-o ao contexto da rotina doméstica (MATSUMOTO e MANNA, 2008). Todos são estimulados a participar das atividades que envolvem os pacientes e seus familiares, inclusive o pessoal de apoio, como os seguranças e funcionários da limpeza, buscando uma integração com a equipe técnica e humanizando as relações. O controle clínico de sintomas é realizado por médicos e equipe de enfermagem, que reconhecem, avaliam e tratam adequadamente os problemas que possam causar sofrimento ao paciente (MATSUMOTO e MANNA, 2008). É praticada a aplicação de moderna tecnologia e de conhecimentos médicos para aliviar os sintomas decorrentes de doenças crônico-degenerativas, incapacitantes e fatais, mesmo que sem a pretensão da cura, em decorrência de sua impossibilidade (MATSUMOTO e MANNA, 2008). A equipe acompanha o paciente e seus familiares durante todo o processo do cuidar, quando por ocasião do óbito e após, no período de luto. São realizados grupos de luto para acompanhamento e acolhimento dos familiares no pós-óbito. Esse trabalho é orientado pela psicóloga, em parceria com a assistente social, mas sempre com a possibilidade de participação de qualquer membro da equipe (MATSUMOTO e MANNA, 2008). São realizadas as avaliações das necessidades sociais, espirituais e financeiras do paciente e de sua família, com elaboração de plano de cuidado frente às necessidades identificadas. Pode-se dizer que se procura que o paciente e seus familiares alcancem crescimento pessoal com as vivências que o morrer oferece, como por exemplo, a tentativa de solução de questões familiares mal resolvidas, com foco na dignidade humana (MATSUMOTO e MANNA, 2008). 14 UNIDADE I │ CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS Figura 2. INTEGRALIDADE ASSISTENCIAL 1 2 3 5 4 Porta de Entrada Emergência Porta de Entrada 1 – Atenção Básica: Promoção, Prevenção, Diagnóstico Precoce, Acompanhamento e Cuidados Paliativos 2 – Alta Complexidade: Diagnóstico, Tratamento/Acompanhamento, Reabilitação e Suporte para Cuidados Paliativos 3 – Média Complexidade:Especialidades, Diagnóstico Precoce, Diagnóstico Oportuno, Tratamento/Acompanhamento, Reabilitação e Cuidados Paliativos 4 – Diagnóstico 5 – Cuidado Paliativo Fonte: http://slideplayer.com.br/slide/1658473/ O diagnóstico de doença grave e incurável e a abordagem dos cuidados paliativos Pela própria definição de Cuidados Paliativos da OMS, esses devem ser iniciados desde o diagnóstico da doença potencialmente mortal. Dessa forma, devemos cuidar do paciente em diferentes momentos da evolução da sua doença. Não devemos privá-lo dos recursos diagnósticos e terapêuticos que o conhecimento médico pode oferecer, mas sim, podemos utilizá-los de forma hierarquizada, levando em consideração os benefícios que podem trazer e os malefícios que possam ser evitados (MACIEL, 2008). A prevenção dos sintomas e das complicações inerentes à doença base pode ser feita com uma abordagem precoce. Além disso, tal abordagem propicia cuidados adequados de enfermidades que possam cursar paralelamente à doença principal. Uma boa avaliação embasada nos exames necessários, além da definição da performance do paciente, é 15 CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE I indispensável para a elaboração de um plano integral de cuidados, adequado a cada caso e adaptado a cada momento da evolução da doença (ADRIANA et al, 2009). Silva, Araújo e Firmino (2008) mencionam que, após um diagnóstico grave de uma potencial doença incurável, cuidar é o verbo presente em todas as teorias de enfermagem. Em Cuidados Paliativos, cuidar significa estar o profissional ao lado de pessoas com perda de vitalidade, com dor, depressão, perda de autonomia, entre outros sintomas e sinais, tentando conhecer e respeitar seus valores espirituais e culturais, criando oportunidades para que resolvam assuntos não resolvidos – principalmente com a família, e sendo “ponte” na relação com os médicos, por estar presente mais horas do dia junto ao paciente. Para a enfermagem, os Cuidados Paliativos são inerentes à sua prática cotidiana. Aliar ciência e arte para prestar um cuidado que ampare, suporte e conforte é dever do enfermeiro, desde o auxílio no nascimento ao diagnóstico de uma doença avançada, fortalecendo-se e tornando-se ainda mais presente na terminalidade e continuando durante o período de luto (SILVA, ARAÚJO e FIRMINO, 2008). Pode-se dizer que: Oferecer Cuidados Paliativos em enfermagem é vivenciar e compartilhar momentos de amor e compaixão, aprendendo com os pacientes que é possível morrer com dignidade e graça; é proporcionar a certeza de não estarem sozinhos no momento da morte; é oferecer cuidado holístico, atenção humanística, associados ao agressivo controle de dor e de outros sintomas; é ensinar ao doente que uma morte tranquila e digna é seu direito; é contribuir para que a sociedade perceba que é possível desassociar a morte e o morrer do medo e da dor (MATZO, 2001 e SKILBECK, 2005). Prestar um cuidado competente, qualificado e diferenciado ao fim da vida é responsabilidade de todos os profissionais de saúde, cada um focando diferente ângulo, de acordo com sua formação e especialidade. No entanto, a enfermagem e, especialmente, o profissional da enfermagem, tem enorme potencial para otimizar esse cuidado. No plano técnico, o enfermeiro é um excelente avaliador dos sintomas e de suas intensidades (não só da dor), está mais atento aos sintomas de natureza não apenas física, pode ajudar muito a prevenir complicações indesejáveis, tem a arte do manejo das feridas e de saber como lidar com as limitações que vão surgindo a cada dia. Aliás, uma das queixas mais importantes e presentes dos pacientes é o surgimento das limitações: eu andava, sentava, trabalhava, fazia tudo.... tudo no passado! Ressalta Silva, Araújo e Firmino (2008). 16 UNIDADE I │ CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS Por meio da compreensão da natureza humana, sua atenção é direcionada para as necessidades do paciente por completo. Cabe ao profissional identificar e compreender as demandas e os desejos individuais de cada ser cuidado, planejando e implementando ações que permitam ao indivíduo o máximo controle sobre sua própria vida e doença. (SILVA, ARAÚJO e FIRMINO, 2008). Preservar a autonomia do paciente, exercitando sua capacidade de se autocuidar, reforçando o valor e a importância da participação ativa do doente e de seus familiares nas decisões e cuidados ao fim da vida, permitindo uma melhor vivência do processo de morrer. Quem efetivamente está inserido nos Cuidados Paliativos tem um desafio a mais: ser maleável, entender que é desejável atender às necessidades do paciente em detrimento, às vezes, de algumas normas e protocolos de serviço e até de algumas vaidades pessoais. (SILVA, ARAÚJO e FIRMINO, 2008). Pela proximidade de suas ações para e com o paciente (hidratação, nutrição, cuidado com lesões, controle da náusea, vômitos, movimentação, por exemplo), observa-se a importância do seu desenvolvimento na habilidade de comunicação verbal e não verbal: saber falar (fazer perguntas diretivas e não diretivas, usar paráfrases, metáforas), saber calar (usar adequadamente o silêncio), saber tocar o paciente (de forma afetiva, não só instrumentalmente). Além de estar atento às suas expressões faciais e posturas corporais (SILVA, 2002). Essa mesma proximidade exige, além do conhecimento técnico para implementar essas ações do cuidar de maneira individualizada, o aprendizado do lidar com o sofrimento psicológico, social, espiritual e físico, entendendo que esse mesmo sofrimento leva o paciente e os familiares a apresentarem reações emocionais diferentes em diferentes momentos, tais como: chorar, calar, zangar, duvidar, argumentar (CALLANAN, 1994). No Brasil, o termo “enfermagem paliativa” não é reconhecido e parece sofrer os mesmos questionamentos conceituais que os termos “cuidados paliativos” e “paciente terminal”. Já nos EUA, a Hospice and Palliative Nurses Association (HPNA), instituição que tem como missão proporcionar o gerenciamento da dor e a excelência nos cuidados de enfermagem perto da extremidade final da vida, decorrente de uma doença crônica degenerativa, completou 20 anos (1986-2006) (Hospice And Palliative Nurses Association, 2006). O investimento na formação profissional em Cuidados Paliativos, além de proporcionar menor sofrimento ao paciente e a familiares, minimiza o custo do cuidado ao sistema de saúde, uma vez que evita consultas reincidentes e internações hospitalares desnecessárias para o controle de sintomas (PIMENTA, MOTA, 2006). 17 CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE I Figura 3. Fonte: http://www.usp.br/cje/babel/exibir2.php?edicao_id=5&materia_id=70 O suporte à família do paciente O cuidar é a essência da enfermagem. Considerando-o como o objeto de trabalho, é necessário que seja eficiente e prestado de forma humanizada. Ao se estabelecer o cuidado, esse deve ser sistematizado e holístico, a fim de promover a qualidade da assistência e o cuidado emocional. (ORIÁ, MORAES, VICTOR, 2004). Sá apud Oriá, et al (ORIÁ, MORAES, VICTOR, 2004), “[...] define o cuidado emocional como a habilidade de perceber o imperceptível [...]” (p. 293). Dessa afirmação, evidencia- se a necessidade de sensibilidade dos profissionais para executarem os cuidados, observando as manifestações verbais e não verbais do cliente, podendo indicar ao enfermeiro suas necessidades individuais. Tal cuidado envolve as necessidades biopsicossocial-espirituais e afetivas e está diretamente relacionado com o processo de comunicação entre o enfermeiro–cliente. Para haver o cuidado eficiente e eficaz, ambos os sujeitos precisam compreender os sinais presentes na relação interpessoal, seja pelos gestos, expressões, seja pelas palavras (ORIÁ et al. 2004 e FIORANO, 2002). O enfermeiro tem habilidade para discernir a comunicação entre família/profissional/ paciente de modo geral, ajudando na assistência de forma humanizada.Vale ressaltar que o diálogo é fundamental para um melhor resultado no prognóstico do paciente e uma assistência à família que passa por um processo difícil, estressante e sofrido de hospitalização de um membro. É importante que o enfermeiro sempre se coloque à disposição em caso de dúvidas, possibilitando que o familiar o procure, evitando assim ansiedade, medo e estresse. 18 UNIDADE I │ CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS Com isso a família interage de forma a ajudar o paciente nos cuidados, pensando sempre na recuperação do paciente. É fato que um ambiente hospitalar apresenta características de ambiente estressante. Veja que o paciente está em um lugar sem ao menos saber se retornará ou não para o seu lar. É um ambiente cuja dinâmica impõe ações complexas, nas quais a consciência da finitude da vida é uma constante, gerando ansiedade, tanto do doente e do familiar como dos profissionais que ali desempenham suas atividades. A internação em um hospital rompe bruscamente com o modo de viver do paciente e de seus familiares. O paciente sente-se impedido de manter sua identidade, seus valores, sua autonomia, levando-o à incapacidade de se autocuidar, deixando de ser singular e passando a ser tratado como objeto (NASCIMENTO, 2004). A equipe pertencente ao hospital necessita estabelecer um elo de confiança com o familiar/paciente, para que seus cuidados possam ir além de cuidados físicos. Ouvir as queixas do paciente com cuidado e ter sempre em mente a relação de humanização da assistência faz com que o paciente tenha uma recuperação rápida e com qualidade, aumentando uma relação de confiança entre enfermeiro/paciente/familiar. Esse cuidado, que vai além dos cuidados rotineiros, emprega-se também ao paciente em coma, pois muitas vezes a humanização, cuidado e respeito deixam de ser empregados a esses pacientes. É importante abordar os familiares sempre com diálogos fáceis de serem entendidos, evitando termos técnicos, para que os membros da família possam interagir e se comunicar, recebendo e passando alguma informação importante para a equipe. Existe a obrigação da identificação das causas, positivas ou negativas, que possam prejudicar a assistência ao paciente em coma, por isso a importância de avaliar a necessidade do paciente por meio da família. A relação de empatia entre paciente/familiar/profissional ajudam a ter um retorno mais abrangente em relação à melhora do paciente, contudo aplicando a humanização e o cuidado como um todo ao paciente crítico. Podemos perceber que a comunicação é um ponto positivo que permeia a interação enfermeiro–cliente e que pode se tornar terapêutico. Os cuidadores devem promover o bem-estar, tanto para doentes quanto para familiares. Os profissionais devem perceber a importância do relacionamento, da presença, da comunicação, da disponibilidade, de forma efetiva e com qualidade. Quando os profissionais da enfermagem delegarem atividades administrativas, como normas e rotinas, e se envolverem de forma comprometida com os cuidados humanos, aliados à habilidade técnico-científica, obterão resultados mais positivos frente ao processo de humanização da assistência. (PAULA, FUREGATO, SCATENA, 2000). 19 CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE I Figura 4. Fonte:http://www.laclinicamed.com/webmed/index.php?option=com_content&view=article&id=165&Itemid=947 Comunicando-se com a criança e com a família em cuidados paliativos Pinto (1996) discute a relação pediatra-família e paciente, destacando também a importância da verdade na condução da comunicação com eles. Além disso, coloca a importância do entendimento, pelo pediatra, da dialética da sua própria morte, pois só assim, segundo o autor, estará preparado para manejar com competência e maturidade o desafio da morte de seus pacientes fora de possibilidades terapêuticas. Mesmo em se tratando de criança, o autor Pinto (1996) menciona duas regras que regem a maneira de se comunicar com a criança e com sua família. A primeira é que a verdade não deve ser apresentada de forma macabra, porque a perspectiva da terminalidade não deve ser transformada em uma câmara de horrores. A segunda regra é que a mentira deve ser banida desse cenário porque não há, definitivamente, espaço para ela, independente da faixa etária da criança. A mentira, ele afirma, ainda que caridosa e humanitária, diminui a autoridade do pediatra e enfraquece a confiança nele depositada. Lembra que muitos pais, no entanto, não admitem que seus filhos saibam de toda a verdade; que preferem continuar a esconder sua tristeza através de uma fisionomia falsamente alegre, justificando que assumem essa postura em benefício da própria criança (SILVA, 2008). O que ele lembra, porém, é que a criança percebe a realidade camuflada e entra nesse jogo de mentiras e fingimentos, passando a fingir também, por causa da família que nega a sua condição terminal (SILVA, 2008). Refere, por outro lado, que não raro o pediatra ( PINTO,1996) deva discutir a relação pediatra-família e paciente, destacando também a importância da verdade na condução da comunicação com eles e coloca a importância do entendimento, pelo pediatra, 20 UNIDADE I │ CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS da dialética da sua própria morte. Só assim, reitera o autor, estará preparado para enfrentar, com competência e maturidade, o desafio da morte de seus pacientes fora de possibilidades terapêuticas. Os detalhes abundantes, desnecessários, ansiogênicos, iatrogênicos que acompanham esse tipo de revelação, nesse contexto, ocorrem muito pela atitude defensiva do pediatra, que o autor chama de “Síndrome da Explicação Ansiosa”, sobre o fantasma do erro médico. Trata-se de uma ameaça, geralmente, usada como objeto de exploração pela imprensa injusta e por advogados gananciosos que farejam esse tipo de situação para transformá-la na rendosa indústria de erro médico (SILVA, 2008). A comunicação, como se pode ver, permeia todas as ações de Cuidados Paliativos e todas as dimensões do ser humano. Informar (leia-se: informações boas e “más”) a cada paciente sua doença e tratamento faz parte da atividade médica e da equipe de saúde e obedece princípios básicos da relação médico-paciente (SILVA, 2006). O alicerce fundamental na estruturação de cuidados paliativos é a confiança nos profissionais que cuidam e deve ser buscada de forma consciente e ativa. Essa confiança se desenvolve nas ações comunicativas do dia a dia das relações. O lugar onde cuidamos de alguém que está morrendo pode ser um hospital, pode ser a casa do paciente, pode variar de acordo com a condição social do paciente e com a estrutura social que esteja vivendo (SILVA, 2008). É fundamental que toda a equipe de saúde aceite a responsabilidade de que a forma de se comunicar com o paciente permanecerá na lembrança das pessoas para sempre; são os profissionais que criam as memórias das pessoas, que viverão pelo resto da vida com a lembrança de “como foi” o momento em que perderam alguém que amam. Refletir sobre comunicação em Cuidados Paliativos significa resgatar a importância do afetivo em um ambiente (área de saúde) em que tudo é baseado no efetivo (SILVA, 2008). Analise a figura 5: 21 CONCEITOS E APLICABILIDADE DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE I Figura.5. Representação ilustrativa das diversas etapas envolvidas na definição dos cuidados e das ações em pediatria. ↕ ↕ ↓↓↓↓↓ 1- Entendendo a doença e suas limitações (Cura ↔ Paliativo) ‘’ ...estabelecendo uma relação de confiança...’’ Médicos ←↑→ Família 2 - Definição dos objetivos e intervenções Médicos ←↓→ Família Considerando prognóstico, opções terapêuticas e valores do binômio família- criança 3 - Prover as necessidades individualizadas e antecipar eventos Intervenções fúteis (exames, monitoração excessiva...) Prioridades terapêuticas (anagelsia, sedação...) Decisões de final de vida econduta nas possíveis complicações (convulsões, apnéia, sangramento) Ambiente Solidário, tratamento, fraterno, privacidade Suporte espiritual, psicológico, assistência social ... Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103507X2011000100013&script=sci_arttext Figura 6. Fonte:http://meninasplugadas.com.br/prevencao-de-doencas-cronicas-pode-fazer-criancas-viverem-100-anos/ 22 UNIDADE IIATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS CAPÍTULO 1 Manejo dos cuidados paliativos Aspectos ético-legais dos cuidados paliativos Da visão ética Pensar os limites do investimento curativo supõe e requer perspectivas a partir da noção ética de limite, de desenvolvimento da biomedicina e de reflexões da bioética, bem como da natureza dos cuidados paliativos. Portanto, esboçaria uma reflexão a partir de três perspectivas: primeira, a da ética, seguindo-se a da bioética e, depois, a dos cuidados paliativos (NUNES, 2008). Naturalmente, configuram-se territórios partilhados entre essas três visões. O aspecto propriamente ético da conduta não se dá em nível dos comportamentos exteriores, mas em nível constituinte do agir – isso quer dizer que a ação resulta dos fins que a pessoa estabeleceu para si, o que implica a referência à liberdade da ação (NUNES, 2008). Daí resulta o elemento determinante, a intenção, que move para a deliberação e a tomada de decisão. Ou seja, a pessoa quer realizar algo (intenção), pondera entre as alternativas (delibera) e age em conformidade (decide). A responsabilidade é uma das noções éticas fundamentais e é correlativa à liberdade, uma vez que se é responsável pelas ações que se escolheu voluntariamente (NUNES, 2008). Note-se, porém, explica Nunes (2008), que a responsabilidade é constitutiva do ato e não consecutiva ao ato, de onde se conclui que se é responsável pelo ato ao escolhê- lo e realizá-lo e não apenas pelo que decorre das suas consequências. Nesse ponto, encontra-se a ideia de autonomia da conduta, já que, pode-se dizer, agir eticamente é agir autonomamente. 23 ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE II A liberdade que define o ser pessoal manifesta-se em suas escolhas porquanto um compromisso reflexivo da vida ética, já que o ser humano põe fins a si mesmo, perspectiva-se como projeto de construção autônoma e é, em última instância, o criador de si ou causa sui (causa de si mesmo) (NUNES, 2008). A problemática da ética reside exatamente no fato do seu suposto ser, a pessoa humana, que é um fim em si mesma – um ser único, original, dotado de dignidade própria. A sua conduta é sempre singular, imprevisível e ‘irrepetível’. Não podemos ser como os outros, mesmo quando os tomamos como exemplos, da mesma forma que não há verdades nem modelos em ética (NUNES, 2008). Portanto, cada um deve percorrer seu caminho: Cada um traça seu próprio caminho e é nesse percurso existencial que se define a si próprio, transformando-se pouco a pouco na imagem que desenhou para si ou na pessoa que deseja ser. Assim, ninguém pode percorrer o caminho de outrem, tal como não se pode trocar de lugar com ninguém, por mais próximo esteja. Só o que se pode fazer é estar com, mas não no lugar de outro ser humano. E ao agir segundo o seu ser pessoal, adquire-se aquilo que é definido como personalidade, isto é, cada um estrutura-se de determinada maneira (NUNES, 2008). Assim, é possível encontrar personalidades mais ou menos amadurecidas pelo grau de consciência e de responsabilidade no agir e no pensar face ao mundo, face aos outros e face ao absoluto. É particularmente no confronto horizontal entre as pessoas, no eu-tu e no ser tu para um outro eu, que os seres humanos se estruturam e identificam fora de si o ideal de ser pessoa que pode, então, ser erigida como norma de agir. Percebemos que será mais simples compreender que a personalização ocorre no nível interpessoal (NUNES, 2008). A ilimitada capacidade da ação para estabelecer relações (a sua “produtividade específica”) faz com que uma das virtudes políticas por excelência seja a moderação, o manter-se dentro de certos limites, pois que a tentação por excelência é a hubris, incorrer no excesso, no deslimite (ARENT, 2001). Podem existir mecanismos que instaurem limitações e fronteiras à ação, na sequência da tendência a violar os limites, mas são impotentes para conter sua inerente imprevisibilidade (ARENT, 2001). A noção do limite traz a ideia do manter confinado, circunscrito à esfera própria. O limite pode ser visto como espécie de linha de demarcação, sobraçando o triplo sentido de conter, manter e encerrar, da mesma forma que o traço de uma circunferência contém o círculo (NUNES, 2008). 24 UNIDADE II │ ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS Pois, a rigor, o círculo só existe – verdadeiramente – pela existência do traço, que o delimita e, ao mesmo tempo, o contém. É a dimensão ética do ser humano, que idealizamos e realizamos por meio dos juízos morais, que dá conotação existencial à vida. Talvez sejam o desenhar e o testar os limites que configurem as dimensões existenciais de cada um (NUNES, 2008). Figura 7. Fonte: http://jpress.jornalismojunior.com.br/wp-content/uploads/2012/10/Cuidados-paliativos.png Da visão da bioética Nunes (2008) menciona que, nas últimas décadas, de forma evidente, a biomedicina conheceu um desenvolvimento extraordinário, o qual, suportado pelo progresso da tecnologia e da informática, ampliou muito as possibilidades de intervenção sobre o ser humano. Concordamos que grandes conquistas foram alcançadas no campo da genética, da biologia molecular, dos transplantes ou das neurociências. Naturalmente, os progressos alicerçam-se, prioritariamente, na investigação, e cada nova descoberta produz efeitos (alguns deles, em série), abrindo mais do que um novo horizonte. Maiores possibilidades técnicas de intervenção sobre o homem devem exigir maior responsabilidade por parte dos cientistas e dos profissionais, além de maior necessidade de orientação ética na ação (NUNES, 2008). Na verdade, e por princípio, não existem limites éticos à ciência, em si mesma. Mas tão somente à sua utilização. A reflexão orientada pela ética, que se debruça sobre o desenvolvimento científico, encaminha para a dimensão dos limites que se impõem a esse progresso. Se a finalidade da ciência é melhorar a vida das pessoas e da sociedade em geral, há que equacionar alguns limites éticos ao horizonte infinito do apetite pelo conhecimento científico (NUNES, 2008). 25 ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE II Evidente que essa equação terá tanto maior relevo quanto mais nos aproximarmos da investigação realizada com pessoas e, sem passar para o território dos protocolos de investigação, daqui decorre igualmente a reafirmação da diferença entre o tecnicamente possível e o eticamente admissível (OSSWALD, 2001). E com razão se pode falar de uma ética da investigação biomédica, passível de ajudar a fazer um itinerário que respeite a dignidade da pessoa. É fundamental reforçar a ideia de que a dignidade humana é o verdadeiro pilar do qual decorrem os outros princípios e que deve estar presente, de forma inequívoca, em todas as decisões e intervenções (NUNES, 2008). Situemo-nos, por exemplo, nos princípios bioéticos aplicados à saúde: o princípio da beneficência, da não maleficiência, do respeito pela autonomia, da justiça, bem como o de vulnerabilidade. O princípio da beneficência relaciona-se ao dever de fazer o bem, de ajudar os outros a ganhar ou a ter o que é para seu benefício (NUNES, 2008). É evidente que a tomada de decisão, baseada exclusivamente nesse princípio, pode incorrer em paternalismo, enquanto atuação limitante da liberdade do outro e que é invocado com frequência como estando ao serviço dos desejos, do bem ou dos melhores interesses das pessoas. Deve-se lembrar que a aplicação prática do princípio de beneficência é muito complexa (NUNES, 2008). A ponderação entre risco e benefício não é fácil, uma vez quedepende dos valores e dos interesses das pessoas implicadas, da reflexão das consequências individuais e sociais, entre outros fatores (NUNES, 2008). O princípio da não maleficência implica em não fazer o mal, não causar dano. Há autores que defendem que não causar dano é imperativo, mais obrigatório que a exigência de promover o bem. O respeito pela autonomia refere-se à liberdade de ação com que cada pessoa escolhe. As pessoas autônomas são capazes de escolher e agir segundo planos que elas mesmas selecionem. Respeitar a autonomia é reconhecer que a pessoa é um fim em si mesma – livre e autônoma – capaz de autogovernar-se e de decidir por si mesma (NUNES, 2008). Por isso, a informação antecede as escolhas de maneira a que essas possam ser livres e esclarecidas, devendo-se, subsequentemente, serem respeitadas. O princípio da justiça enfatiza que situações idênticas devem ser tratadas igualmente e as que não são iguais, tratadas de forma diferente, de acordo com as suas diferenças (NUNES, 2008). E o que seria a justiça em cuidados de saúde? Vejamos: Tradicionalmente, define-se justiça como dar a cada um o que lhe é devido, mas as concepções de justiça, em cuidados de saúde, diferem 26 UNIDADE II │ ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS bastante, sendo candente o tema da distribuição de recursos e dos critérios a utilizar. O conceito de vulnerabilidade liga-se à possibilidade de ser ferido, de se encontrar diminuído, fragilizado, de ter a autonomia reduzida e de precisar ser protegido e suportado em suas decisões (NUNES, 2008). Naturalmente esses princípios não têm relação simples nem hierárquica; frequentemente, existem tensões na sua aplicação. Talvez a tensão mais frequente seja entre o princípio da autonomia e o da beneficência (NUNES, 2008). Há circunstâncias em que se atribui o primado à beneficência, colocando em primeiro lugar a saúde e a vida, como acontece no internamento compulsivo de doentes mentais. Em outros casos, confere-se a primazia ao princípio da autonomia, respeitando na globalidade a decisão e a vontade da pessoa. O critério que pode ser decisivo nessa decisão reporta-se, segundo julgamos, à operacionalização do respeito pela dignidade da pessoa (NUNES, 2008). Dos cuidados paliativos Neste ponto, encontramo-nos frente ao cuidado total ativo de doentes cuja doença não tem benefício com o tratamento curativo. O objetivo é a obtenção de melhor qualidade de vida para o doente e para sua família, de acordo com a definição da Organização Mundial da Saúde (OMS), ressalva Nunes (2008). Se a doença está no estádio de evolução chamado “terminal”, a morte é previsível em mais ou menos curto termo. As intervenções levadas a cabo visam atenuar os sintomas da doença (em particular, a dor), sem agir sobre a causa (NUNES, 2008). Nesse contexto, o objetivo dos cuidados é preservar não a integridade corporal ou a saúde, mas a dignidade humana, que é essa possibilidade, para cada ser humano, de, por intermédio da consciência, agir livremente e se autodeterminar (NUNES, 2008). Segundo Nunes (2008): Assim se afirma o valor da vida e de lidar com o processo de morrer como fato normal no decurso da vida. Não se atrasa nem apressa a morte. Pretende fornecer-se um alívio da dor e de outros sintomas penosos. Integram-se os aspectos psicológicos e espirituais e oferece-se um sistema de apoio que ajuda a viver tão ativamente quanto possível até a morte; e mais, proporciona-se um sistema de apoio que ajuda a família nos aspectos que se relacionam aos cuidados paliativos. 27 ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE II Neste ponto, estamos frente ao cuidado total ativo de doentes cuja doença não tem benefício com o tratamento curativo (NUNES, 2008). O objetivo é a obtenção de melhor qualidade de vida para o doente e para sua família, de acordo com a definição da Organização Mundial da Saúde (OMS). Se a doença está no estágio de evolução chamado “terminal”, a morte é previsível em mais ou menos curto termo. As intervenções levadas a cabo visam apenas atenuar os sintomas da doença (em particular, a dor), sem agir sobre a causa (NUNES, 2008). Nesse contexto, o objetivo dos cuidados é preservar não a integridade corporal ou a saúde, mas a dignidade humana, que é essa possibilidade, para cada ser humano, de, por intermédio da consciência, agir livremente e se autodeterminar. Tem-se o valor da vida e de lidar com o processo de morrer como fato normal no decurso da vida. Não se atrasa nem se apressa a morte. (NUNES, 2008). Integram-se os aspectos psicológicos e espirituais e oferece-se um sistema de apoio que ajuda a viver tão ativamente quanto possível até a morte; e mais, proporciona- se um sistema de apoio que ajuda a família nos aspectos que relacionam cidadãos e profissionais de saúde. Como bem afirma Nunes (2008), fomos educados tendo a morte como tabu, portanto, tornamo-nos profissionais de saúde para ajudar a curar, debelar a doença, vencer a morte, reanimar com sucesso: Não me parece que sejamos formados para lidar com a inevitabilidade da morte, de tal modo que me interrogo se, em algumas reanimações, em vez de se lutar pela vida o combate não é, simplesmente, contra a morte. Também parece que nos hospitais os cuidados correm o risco de diminuir à medida que a necessidade desses doentes aumenta (NUNES, 2008). Ademais, a medicalização da morte é fácil, caracterizando-se pela relação impessoal com o doente, estudos diagnósticos excessivos e agressivos, terapêuticas de alta tecnologia ineficazes, hospitalização desnecessária e morte institucional. Essas estratégias afastam a reflexão sobre a morte e sua inevitável proximidade (NUNES, 2008). Parece que, quando orientam as intervenções para o alívio do sofrimento, está-se mais preocupado com a pessoa doente do que com a doença da pessoa. Na perspectiva ética, não bastam a linha cultural, o desenvolvimento econômico ou o ambiente social para determinar a qualidade de vida: o homem ético é o profundamente humano, fiel a si próprio (NUNES, 2008). 28 UNIDADE II │ ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS E a qualidade de vida poderá consistir principalmente na capacidade de integração e de aceitação dos desafios, desembocando numa sabedoria pessoal e num estilo de vida. Mas, sobretudo, cabe ao profissional assumir sua ignorância em relação ao que é qualidade de vida para cada pessoa. E que o conceito e a vivência da qualidade de vida são verdadeiramente subjetivos, pertencem a cada um (NUNES, 2008). Os portadores de doenças incuráveis e crônico-degenerativas ou os doentes terminais atravessam uma trajetória de sobrevivência, e a falência de qualquer dos sistemas de apoio (da família aos profissionais) pode levá-los a uma penosa vivência de sua trajetória pela doença. Portanto, do ponto de vista da concepção dos cuidados paliativos, o dever de quem cuida é agir de modo a respeitar a autonomia desse doente (NUNES, 2008). Figura 8. Fonte: https://institutopaliar.files.wordpress.com/2013/01/zopt_spiritual_care_slide1_resized.jpeg Os cuidados paliativos no Brasil e na assistência aos pacientes de baixa renda Cuidados paliativos a paciente de baixa renda A assistência domiciliária a pacientes de baixa renda visa à promoção, à manutenção e/ou à restauração da saúde do paciente e ao desenvolvimento e à adaptação de suas funções de maneira a favorecer o restabelecimento de sua independência e a preservação da autonomia do indivíduo no domicílio. Dessa forma, a estrutura hospitalar convencional 29 ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE II é utilizada no domicílio do paciente com toda segurança e comodidade, gerando ações de saúde que são desenvolvidas por equipe multidisciplinar, a partir da realidade em que o paciente está inserido, e considerando seu potencial e limitações (CARLETTI, 1996). A assistência domiciliária surge como alternativa que beneficia especialmente idosos com doenças incapacitantes, dependentes do auxílio de terceirospor tempo prolongado e que tendem a permanecerem isolados em seus lares sem assistência adequada (RODRIGUES e ALMEIDA, 2001). Esse grupo de indivíduos carece da presença de uma pessoa que se encarregará dos cuidados básicos ao paciente com doenças que requerem cuidados paliativos diários, denominado responsável pelos cuidados (RC). A atenção prestada pelo RC pode ser do tipo formal ou informal (RODRIGUES e ALMEIDA, 2005). Na atenção formal, o RC presta cuidados ao paciente no domicílio com remuneração e com poder decisório reduzido, já que cumpre tarefas delegadas pela família. A atenção informal emerge das relações interpessoais e se constrói no cotidiano familiar e social (RODRIGUES e ALMEIDA, 2005). Esse indivíduo é eleito pela família e normalmente com pouca ou nenhuma experiência de cuidar de pessoas doentes, mas com algum poder decisório (CRUZ, BARROS, JUNG, 2001 e MINCHILLO,2000). Na prática, observa-se que nem sempre a divisão de responsabilidade do RC é feita de maneira equilibrada e cooperada entre membros de uma família, seja em função das condições econômicas, estrutura familiar, seja por características culturais. É comum observar que os cuidados aos pacientes com diferentes graus de necessidades fiquem sob a responsabilidade de uma única pessoa (FLORES, MARCHIORETTO, 2000 e CRUZ, BARROS, FERREIRA, 2001). A assistência à saúde no domicílio gera dúvidas e ansiedade com relação ao tratamento, necessidade de reorganização dos afazeres domésticos e sobrecarga de trabalho. Essas questões são mais diretamente vivenciadas pelo RC, que assume a responsabilidade de cuidar e organizar a estrutura à disposição do paciente (CRUZ, BARROS, FERREIRA, 2001). Diante disso, é impossível não reconhecer o importante papel que o RC tem no sucesso do plano terapêutico. Assim, o RC deve ser considerado como membro da equipe assistencial (RODRIGUES e ALMEIDA, 2005). Cuidados paliativos no Brasil Peixoto afirma que os Cuidados Paliativos no Brasil e nos países em desenvolvimento, onde as prioridades ainda giram em torno das necessidades básicas para a sobrevivência 30 UNIDADE II │ ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS das pessoas (ter comida, água e segurança), nesse contexto, esses são vistos por muitos como mero luxo. Mesmo assim, o modelo de Cuidados Paliativos chegou ao Brasil no início da década de1980. O cenário da saúde nesse período se caracterizava pela modalidade hospitalocêntrica, curativa, em que o paciente era fragmentado pela atenção não integrada das várias especialidades (PEIXOTO). Havia um manejo inadequado da dor crônica e uma “conspiração do silêncio” em que os profissionais do cuidado não discutiam sobre a doença e a morte com o paciente e/ou com os seus familiares (PEIXOTO). O primeiro serviço de Cuidados Paliativos no Brasil surgiu no Rio Grande do Sul, em meados de 1983. Em 1986, amplia-se para São Paulo e, em 1989, para Santa Catarina. Outro marco foi a inauguração da Hospedaria (termo aportuguesado para hospice) de Cuidados Especiais do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo, em 2004 (PEIXOTO). O Brasil atual, sem dúvida, difere do país de apenas duas décadas atrás. Mudanças internas, associadas à globalização, que envolve todos os países do mundo, criaram uma nova realidade política e econômica, que se reflete nas condições de vida de nossa população. (BRASIL, 2001). Em que pese haver mudanças expressivas, há que se melhorar: Paralelamente, observa-se uma maior consciência quanto aos valores sociais e entende-se que mudanças expressivas só ocorrerão com um forte engajamento do governo e da sociedade civil na construção de uma democracia em que se combatam, de maneira vigorosa, as intensas desigualdades sociais que ainda persistem e dificultam uma considerável parcela dos brasileiros a ter acesso a instrumentos sociais que lhes permitam viver com dignidade (BRASIL, 2001). Na área da saúde, pode-se afirmar que muito se avançou com o preceito constitucional de que saúde é um dever do Estado e um direito do cidadão. Com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), deu-se um importante passo na modernização das ações de saúde em nosso país. (BRASIL, 2001). O SUS, entretanto, não tem conseguido atingir plenamente seus objetivos de equidade e universalidade, devido a uma conjuntura de fatores, que inclui ingredientes de difícil manipulação, entre eles a limitação de recursos financeiros, as amarras administrativas e gerenciais do setor público e o preparo técnico, científico e até mesmo humanitário 31 ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE II de parte dos profissionais de saúde, sem deixar de mencionar constantes desavenças políticas, que não raro dificultam sua implantação (BRASIL, 2001). Ao longo dos últimos anos, tornou-se evidente que o atendimento primário, base de entrada para o sistema público de saúde, necessitava de uma nova abordagem, uma vez que a estrutura clássica de unidades básicas de saúde vinha apresentando, em diversos locais do país, uma baixa resolubilidade. Assim, a partir de experiências na região Norte-Nordeste, criou-se o Programa Saúde da Família (PSF), baseado em equipes de saúde da família, que são constituídas por médicos, enfermeiras, auxiliares de enfermagem e agentes comunitários de saúde que atendem populações geograficamente definidas e com número definido de famílias (BRASIL, 2001). Essa estratégia vem não só melhorando o acesso da população ao sistema, como tem proporcionado considerável melhora na qualidade do atendimento oferecido, o que traz um admirável grau de satisfação da população e das próprias equipes de saúde. A experiência desses primeiros anos de PSF mostrou, entretanto, que existe uma dificuldade de se arregimentar médicos adequadamente treinados para exercer a função de generalistas, e enfermeiras com o devido preparo para as abrangentes funções por elas desempenhadas no PSF (BRASIL, 2001). Embora polos de capacitação estejam sendo instalados em todo o país para treinar os profissionais que atuam no PSF, ressente-se da falta de material instrucional para auxiliá-los no processo decisório do dia a dia. Por esse motivo, criou-se uma importante parceria, envolvendo diferentes setores da sociedade: o Instituto para o Desenvolvimento da Saúde (IDS), uma organização não governamental voltada para a melhoria das atenções de saúde no país, a Universidade de São Paulo (USP), que cumpre assim seu papel de centro divulgador de conhecimentos, a Fundação Telefônica (FT), que se sensibiliza com as necessidades sociais, e o Ministério da Saúde (MS), que acreditou na proposta e se propôs a divulgar o material instrucional que aqui é apresentado para todas as equipes do PSF (BRASIL, 2001). O tratamento dado a esses pacientes que necessitam de cuidados paliativos é de suma importância, e uma equipe bem estrutura e capacitada deve existir de modo a auxiliar os médicos e enfermeiros a tomarem decisões quanto ao diagnóstico médico e diagnóstico de enfermagem e tratamento das enfermidades selecionadas, além de, quando pertinente, tomar medidas relacionadas com a doença e suas complicações (BRASIL, 2001). Um enfoque complementar é o de tentar definir os limites de atenção no PSF e de quando encaminhar o paciente para um especialista ou centro de referência. Já os textos 32 UNIDADE II │ ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS de enfermagem, além de procurar normatizar as ações desses profissionais, procuram trazer informações complementares que auxiliam as enfermeiras na consecução dos objetivos do PSF (BRASIL, 2001). O Ministério da Saúde vem consolidando formalmente os Cuidados Paliativos no âmbito do sistema de saúde do país por meio de Portarias (BRASIL, 1998, 2001, 2002, 2002): Tabela 1. Portaria Data Resolução No 881 19 de julho de 2001 Institui o Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar No 3.535 02 de setembro de 1998 Insere várias modalidades assistenciais como o serviço de cuidados paliativos nos centrosde atendimento em Oncologia de alta complexidade No 19 03 de janeiro de 2002 Institui no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) o Programa Nacional de Assistência a Dor e Cuidados Paliativos No 1319 23 de julho de 2002 Criou no âmbito do SUS os Centros de Referência em Tratamento da Dor Com o objetivo de agregar profissionais atuantes em Cuidados Paliativos e a fim de consolidar essa área do cuidado no sistema de saúde brasileiro, foram fundados em outubro de 1997, a Associação Brasileira de Cuidados Paliativos (ABCP), na cidade de São Paulo, e, em fevereiro de 2005, a Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), também na cidade de São Paulo (PEIXOTO). Essa última visa estabelecer a Medicina Paliativa como especialidade médica, em articulação com a Associação Médica Brasileira (AMB). Um levantamento feito pela ABCP identificou que, no Brasil, existem 31 serviços que se cadastraram como prestando Cuidados Paliativos. A maioria desses serviços é um desdobramento das clínicas de dor (PIMENTA, 2006). Segundo Figueredo (2006), o crescimento das unidades ou grupos de Cuidados Paliativos em todo o Brasil é ainda lento e é urgente implantar nas universidades, em nível da graduação, cursos ou disciplinas de Cuidados Paliativos. Cabe aos governantes reconhecerem e serem persuadidos da importância da Medicina Paliativa como direito do cidadão, e se esforçarem para incluí-la nas políticas e nos serviços de saúde. Para isso, é importante elevar a consciência pública a respeito da filosofia paliativa do cuidado, envolvendo a mídia no debate dessa temática já instalada nesse país (FIGUEIREDO, 2006). 33 ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE II Figura 9. Fonte:http://www.somiti.org.br/pg/noticia/?noticia_id=543 Cuidados paliativos no mundo Atualmente, a Inglaterra é o país com maior cobertura de Cuidados Paliativos no mundo, sendo a Medicina Paliativa reconhecida como especialidade médica desde 1987, nesse país (PEIXOTO). Em segundo lugar, cita-se a Espanha. Nos Estados Unidos (EUA), o movimento hospice começa em 1974 e, a partir daí, surgem várias equipes de Cuidados Paliativos na modalidade em maior escala de atendimento domiciliar (PEIXOTO). Inicialmente, os médicos não eram envolvidos nesse cuidado domiciliar, devido à resistência da categoria e pelo fato de que a assistência médica domiciliar não era coberta pelas seguradoras de saúde (PEIXOTO). Atualmente, os cuidados paliativos são legalmente cobertos por seguros de saúde que garantem assistência a pacientes e a familiares com prognóstico de morte previsível de seis meses. Além do prazo de seis meses, os custos do cuidado ficam a cargo dos familiares (Peixoto). A França implantou o modelo de cuidados paliativos na década de 1980, inicialmente para os idosos e, em seguida, incorporando os pacientes fora de possibilidade de cura. Na década de 1990, houve o desenvolvimento de programa de Cuidados Paliativos em vários locais (PEIXOTO): » África do Sul, Austrália, Ásia, Japão, Taiwan, China e Coréia do Sul. Na América do Sul, os Cuidados Paliativos surgiram na década de 1980 em Buenos Aires e Bogotá. 34 UNIDADE II │ ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS Na legislação da implantação dos Cuidados Paliativos no mundo, destacam-se (PEIXOTO): » Publicação da Recomendação no 1418 relacionada à “Proteção dos Direitos Humanos e da Dignidade dos Direitos dos Pacientes Incuráveis e Terminais através por meio da Declaração da Assembleia Parlamentar do Conselho Europeu em 1999. » Lei Francesa de Cuidados Paliativos: lei que ampara os pacientes terminais de 1999. Pesquisas e expansão dos serviços de Cuidados Paliativos no mundo inteiro, assim como os grandes eventos científicos na área e a criação de associações em muitos países trouxeram grandes contribuições à Medicina Paliativa (PEIXOTO). Em 1984, foi fundada a Associação Internacional de Hospice e Cuidados Paliativos (IAHPC) que desenvolve trabalho de divulgação dos Cuidados Paliativos e incentivo à formação de profissionais na área (PEIXOTO). Comemora-se o dia mundial de Cuidados Paliativos e Hospice no segundo sábado de outubro anualmente desde 2005 (PEIXOTO). Figura 10. Fonte:http://aenfermagem.com.br/materia/eutanasia-ortotanasia-e-distanasia-qual-a-diferenca/ A aplicação de cuidados paliativos por equipes não especializadas A complexidade da deterioração física que acompanha uma doença que coloca a vida em risco, além do comprometimento emocional e psicológico, vai demandar uma coordenação entre os diversos níveis de atendimento da saúde primário, secundário e terciário. Uma grande quantidade de cuidados é oferecida de forma ambulatorial, independente do atendimento hospitalar (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). 35 ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE II Muitos dos pacientes em Cuidados Paliativos terão uma grande parte do seu tratamento ocorrendo em suas casas. Sempre que necessário, o planejamento do cuidado de preferência deve existir em concordância com o plano de cuidados, sendo que os pacientes e suas famílias devem ter a oportunidade de opinar e expressar os seus desejos, que devem ser levados em conta (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). Dessa forma, devem-se considerar as escolhas válidas dos pacientes: Devemos sempre considerar que as escolhas dos pacientes são escolhas válidas, mesmo que não haja a concordância da equipe responsável pelos cuidados. Os pacientes fazem escolhas válidas quando sabem o que está acontecendo; o que há disponível; e o que se espera que vá acontecer no futuro. Uma das escolhas que os pacientes gravemente enfermos podem fazer é solicitar a permanência na sua cidade ou o retorno às suas casas, para que, perto das suas raízes, tenham o tratamento e os cuidado estabelecidos (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). Pode parecer mais fácil cuidar de pacientes no hospital, por conta da infraestrutura e do suporte disponível. Na opção pelo tratamento em casa, esse cuidado do paciente vai implicar, muitas vezes, uma sobrecarga para os cuidadores. Certamente pacientes gravemente enfermos, ou com doenças que colocam a vida em risco, passam algum tempo da enfermidade em ambiente hospitalar (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). O local de cuidados finais pode ser alterado conforme as circunstâncias, sendo que um dos fatores que podem influenciar essa escolha é o tipo e a necessidade de cuidados necessários para manter o indivíduo bem, com o controle dos sintomas (O’NEILL, RODWAY, 1998). O cuidado e o manuseio do paciente fora do grande centro vão implicar a avaliação do paciente, de seus sintomas físicos e psicológicos, além da sua história social. Uma rede de suporte e de acompanhamento desse paciente em casa também deve ser providenciada. A articulação entre os diversos recursos deve existir desde o serviço de acompanhamento da patologia no grande centro até os diversos serviços de saúde e sociais existentes na comunidade (O’NEILL, RODWAY, 1998). . Em um centro de referência ou em um serviço, a instituição de Cuidados Paliativos vai requerer mudanças tanto no âmbito dos profissionais envolvidos, quanto na estruturação das unidades de saúde. Algumas mudanças são simples e de mais fácil execução, outras mais complexas. A implantação desses cuidados será mais difícil e mais demorada, quanto menos estruturado for o serviço (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). 36 UNIDADE II │ ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS O profissional de saúde O primeiro passo para o desenvolvimento da política de Cuidados Paliativos deve ser a conscientização do profissional que atende os pacientes fora de possibilidade terapêutica. Isso acontecerá à medida que esses profissionais tenham acesso às informações. Com este objetivo, podem ser formados grupos de estudos que aglutinem os profissionais com interesse no assunto, para conhecimento das experiências descritas na literatura e discussão para implantação do atendimento (COSTA et al, 2003) . Nesse sentido também é importante a participação ativados profissionais encarregados da organização dos serviços, para que esse tratamento seja implementado como rotina do serviço e não por meio de ações individuais de determinados profissionais. Os profissionais devem estar atentos à necessidade de sua capacitação, para que possam desenvolver suas ações no melhor interesse do paciente e seus familiares (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). A partir desse profissional sintonizado com a política da não realização de tratamentos fúteis em pacientes selecionados, é necessário que o serviço esteja estruturado para propiciar a retaguarda que este tratamento – e seus desdobramentos – possam necessitar. A formação de um grupo é fundamental para que todas as necessidades do paciente sem possibilidade de cura possam ser atendidas. Assim, devem participar profissionais das áreas de medicina, enfermagem, psicologia e serviço social. Esse grupo deve atuar de modo multiprofissional, ou seja, cada profissional atua dentro da sua especialidade e especificidade, mas de forma sincronizada com o grupo, para que o resultado final possa ser otimizado (CASSORIA,1994 e JAPIASSU, 1976). À medida que estes grupos estejam capacitados, também podem desenvolver a função de manter a informação para o restante da equipe, de forma que todos possam discutir as dificuldades e necessidades do paciente (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). A organização do serviço Após a formação desses grupos de trabalho, deverão ser avaliados os recursos institucionais necessários para que o tratamento seja instituído. Quando essa ação ocorre nos hospitais, podem ser necessárias articulações com os serviços de atenção primária, para que o cuidado seja continuado por ocasião da alta hospitalar. Para esse fim, têm importância fundamental o controle da dor e o acesso aos medicamentos controlados (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). Souza, Costa, Barbosa (2008) explicam que o contrário também se aplica, uma vez que serviços primários que atendem o paciente na política de Cuidados Paliativos podem 37 ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE II necessitar de retaguarda das unidades de internação, quando houver necessidade de encaminhamento, em situações de agudização da enfermidade do paciente. Instituições hospitalares No âmbito hospitalar, algumas mudanças podem ser necessárias para a atuação do grupo de Cuidados Paliativos. Deve-se (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008): » estabelecer protocolos de atendimento para padronização dos cuidados; » proporcionar retaguarda de profissionais como: psicólogas, assistentes sociais, fisioterapeutas e fonoaudiólogas; » oferecer espaço físico onde os familiares possam ficar, de modo a possibilitar o acompanhamento do paciente durante o maior tempo possível; » oferecer local privativo onde pacientes e familiares possam ser acolhidos durante o processo de morte; » possibilitar o acesso de religiosos (por exemplo, capelão, padre ou pastor), de modo a atender as necessidades dos pacientes e de seus familiares; » promover atendimento à equipe de saúde, no sentido de minorar as situações de estresse frente ao atendimento do paciente terminal e de seus familiares. Rede básica de saúde Nas instituições de saúde primária, são necessárias ações, no sentido de prestar atendimento aos pacientes em acompanhamento domiciliar (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008): » Preparar equipes para que atendam adequadamente às necessidades do paciente fora de possibilidade terapêutica, como: › trocas de sonda, atendimentos fisioterápicos; » Fornecer materiais e medicamentos necessários para o atendimento dos pacientes. » Formar grupos de orientação e apoio para atendimento aos cuidadores. Todas essas modificações demandam tempo, e esse tempo será tanto maior quanto menor for a estrutura do serviço em questão. O Cuidado Paliativo, apesar de ser um 38 UNIDADE II │ ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS conceito mais difundido na Europa e nos Estados Unidos, vem sendo instituído também no Brasil, há poucos anos. Essa é uma realidade que ainda não é rotina, mesmo nos grandes centros de atendimento, particularmente para pacientes pediátricos (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). Fora dos grandes centros, ainda depende da ação de um ou outro profissional, com ações individualizadas e, muitas vezes, sem continuidade. Entre as dificuldades que podemos observar na implantação dos Cuidados Paliativos, principalmente fora dos grandes centros, figuram (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008): » falta de formação dos profissionais quanto ao tratamento paliativo, já que as instituições de ensino estão mais voltadas para o tratamento curativo; » profissionais que atuam de forma individualizada, cada um em seu período de atendimento, sem estruturação para o acompanhamento longitudinal do paciente e consequente continuidade do tratamento; » profissionais especialistas que atendem o paciente de forma a “segmentá-lo”, fora do seu contexto holístico, sem um profissional que faça esta ligação de todas as necessidades do paciente; » falta de profissionais como psicólogas e assistentes sociais na composição dos grupos de atendimento dos serviços de saúde; » falta de interesse econômico no atendimento paliativo, uma vez que o atendimento curativo leva à necessidade de procedimentos mais lucrativos; » falta de informação do profissional quanto à legislação vigente e as suas implicações no atendimento paliativo dos pacientes terminais; » dificuldades no cumprimento da prescrição médica por carência de recursos para materiais e medicamentos. Para muitas unidades de saúde, a aplicação do tratamento paliativo como ele é feito no exterior é uma ação muito distante da sua realidade. A partir do momento em que as instituições nacionais formadoras de opinião possam difundir os conceitos de Hospice e sua aplicabilidade nos diversos serviços, as unidades de saúde que atendem os pacientes fora de possibilidade terapêutica, fora dos grandes centros, poderão adaptar essa forma de atendimento aos seus potenciais (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). Deve haver também uma sincronia entre as diferentes unidades para que possa haver referência e contrarreferência dos pacientes, de forma a aproveitar de cada instituição o que ela tem de melhor a oferecer. Para que a referência a contrarreferência funcionem 39 ATUAÇÃO DOS CUIDADOS PALIATIVOS │ UNIDADE II de forma adequada, é necessária comunicação de qualidade entre as equipes de saúde locais (saúde primária ou hospitais locais) e os centros de referência (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). Os médicos, enfermeiros e equipe de saúde da comunidade devem contar com acesso à consultoria com especialistas em dor, medicina paliativa, oncologistas e cirurgiões. Às vezes, apenas a consultoria resolve, porém, em certos casos, pode ser necessária a transferência do paciente para ser examinado no centro de referência e essa transferência deve ocorrer da forma mais tranquila possível (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). Atualmente, a melhor forma de atuação talvez esteja focada na conscientização e capacitação dos profissionais, pois, a partir desse marco, outras mudanças podem ser alavancadas. Cada vez mais os pacientes perceberão que é seu direito permanecer e morrer na comunidade, sendo necessário que os diversos locais e serviços de saúde se estruturem para possibilitar este tipo de atenção ao paciente enfermo e à sua família (SOUZA, COSTA, BARBOSA, 2008). www.paliativo.org.br/dl.php?bid=15 40 UNIDADE IIICUIDADOS PALIATIVOS DE FORMA AMPLA CAPÍTULO 1 Conhecimento sobre os cuidados paliativos O que os profissionais de saúde precisam saber sobre cuidados paliativos Nos últimos séculos, o conceito de vida e morte no contexto da medicina e da bioética tem passado por uma fase literalmente agitada. Essa polêmica, por um lado, deve ser vista com bons olhos, por ser uma consequência direta da evolução da ciência biomédica, que conseguiu diminuir a mortalidade, inclusive, a de crianças, por meio da melhoriade saneamento básico e da introdução de esquemas de vacinação, e pela melhoria da acurácia diagnóstica e tratamento adequado (CHIBA, 2008). E isso se deve à introdução de novos conceitos: A introdução de conceitos de medicina intensiva, quimioterapias, imunoterapias, radioterapias, tratamento de suporte na área de controle de sintomas e de nutrologia, no século passado, vem possibilitando que a sobrevida seja incrementada, principalmente na área de oncologia. O melhor entendimento dos mecanismos de várias doenças cardiovasculares (e de suas intervenções preventivas não farmacológicas e farmacológicas) fez aumentar a expectativa de vida, invertendo a ordem das causas mortis que no início do século XX eram encabeçadas pelas afecções infectocontagiosas e parasitárias (CHIBA, 2008). O que era presságio ou sinal da morte no início do século passado – a “ausência da respiração” (BERNAT, 1990) –, especificamente denominada no nosso meio como parada respiratória ou quadro de insuficiência respiratória em franca progressão, simplesmente passou a ser uma manifestação clínica, passível de tratamento através de 41 CUIDADOS PALIATIVOS DE FORMA AMPLA │ UNIDADE III suporte ventilatório invasivo. A “ausência do pulso” (BERNAT, 1990) – que nos dias de hoje, chamaríamos de taquiarritmia de várias formas potencialmente letais, ou o que traduziríamos como choques de várias etiologias, como choque hipovolêmico, séptico ou cardiogênico, entre outros tipos de choques – também culminava num evento morte, na esmagadora maioria dos episódios. (CHIBA,. 2008). Atualmente, esses acontecimentos passaram a figurar como um capítulo relativamente longo que precede o próprio fim, graças ao advento de drogas vasoativas, inotrópicas, antimicrobianas de extensíssimos espectros e a toda alta tecnologia, que possibilitou um monitoramento contínuo destes indivíduos que se encontram em unidades de cuidados intensivos. (CHIBA, 2008). Desde o final da década de1960 a “ausência da função cerebrocortical” (BERNAT, 1990) é adotada como finitude da vida, possibilitando que outras vidas continuem seguindo, por meio de transplantes de órgãos (ou de determinados tecidos), substituindo aqueles que comprometem a qualidade ou colocam em risco a vida dos pacientes com as insuficiências orgânicas (RANDELL, 2004). Assim, a humanidade caminhou o último século, adaptando-se dentro de vários conceitos e preceitos da sociedade, de cada cultura, religiosidade e espiritualidade, arcando com a realidade acerca dos conceitos de vida e morte, que se modificavam a cada momento da evolução do homem como ser inteligente (CHIBA, 2008). O fato é que o processo de viver se prolongou de uma forma exponencial nas últimas décadas, e isso, na verdade, dentro de considerações epidemiológicas não muito complicadas, nos faz perceber que a morte, na maioria das vezes, já não é um episódio e sim um processo, às vezes, até prolongado, demorando anos e até mesmo uma década dependendo da enfermidade (LYNN e ADAMSON, 2003). Entre os países desenvolvidos, esse tipo de perfil epidemiológico é bastante comum (CHIBA, 2008). Mesmo países em desenvolvimento, como o Brasil, rumam para tal quadro em que a população é acometida por doenças com características eminentemente crônicas, e, muitas vezes, de lenta evolução. Dessa forma, o evento morte – que, alguns séculos atrás, era considerado como um “episódio” – passou a ser um “processo” (CHIBA, 2008). Entretanto, junto com esse prolongamento de vida e com surgimento do “processo de morrer”, os profissionais da área de saúde começaram a perceber que, mesmo não havendo cura (o que acontece na maioria dos casos, como diz a estatística), há uma forma de atendimento com ênfase à qualidade de vida e cuidados ao paciente, por meio 42 UNIDADE III │ CUIDADOS PALIATIVOS DE FORMA AMPLA de assistência interdisciplinar, e da abordagem aos familiares que compartilham desse processo e do momento final de vida – os Cuidados Paliativos (CHIBA, 2008). Sua atuação é definida como sendo interdisciplinar, para atingir sua principal meta: a qualidade de vida (CHIBA, 2008). Atentamos, nesta definição, para a quebra de um mito comum entre os “leigos” – e mesmo, entre muitos profissionais de saúde – segundo o qual “a pessoa que necessita de Cuidados Paliativos sempre é um paciente com neoplasia” (CHIBA, 2008). Sabe-se que outros pacientes que apresentam vários tipos de doenças crônico-degenerativas e progressivas necessitam de Cuidados Paliativos, tais como (CHIBA, 2008): » portadores de insuficiência cardíaca avançada; » portadores de quadro demencial de várias etiologias; » pacientes pneumopatas crônicos com quadro de hipoxemia grave; » pacientes sequelados de vários episódios de isquemia cerebral; » pacientes com esclerose lateral amiotrófica e com outras doenças neurológicas degenerativas progressivas etc. A lista de enfermidades é quase infindável e envolve situações que requerem atenção direcionada à qualidade de vida, individualização e respeito pelo paciente e pelos seus familiares (CHIBA, 2008). No Brasil, parâmetros adequados são necessários para que, em um sistema de saúde que ainda carrega necessidades específicas, haja uma justa alocação de recursos destinados tanto ao tratamento daqueles que precisam de suportes avançados de vida (em UTIs) quanto àqueles que necessitam de Cuidados Paliativos, possibilitando o atendimento interdisciplinar para o controle adequado de sintomas, e, eventualmente, para o atendimento aos familiares (CHIBA, 2008). Mais uma vez, o bom senso de um profissional de saúde é o melhor aliado, na área de Cuidados Paliativos, visto que cada doença apresentada pelo paciente tem sua característica de evolução e sua sobrevida individualizada (LYNN e ADAMSON, 2003). A interface de cada especialidade médica dá-se conforme a necessidade e evolução de cada fase da doença. É importante ressaltar que a chave de um bom atendimento consiste na capacidade de cada profissional enfermeiro reconhecer o limite de sua atuação em Cuidados Paliativos. Esse item é especialmente destacado em relação a controle de dor 43 CUIDADOS PALIATIVOS DE FORMA AMPLA │ UNIDADE III e de outros sintomas e corresponde ao que chamamos de interface extrínseca de cada especialidade (CHIBA, 2008). A interação com outros profissionais (enfermeiros, auxiliares de enfermagem) deve ocorrer sempre que nos depararmos com dificuldades. Vale usar os recursos possíveis, com criatividade e persistência. Mesmo em locais com menores recursos não devemos hesitar em incluir na terapêutica, por exemplo, colegas anestesistas, preparados para nos auxiliar na realização de um eventual bloqueio anestésico, ou na analgesia controlada por paciente com bomba de infusão (CHIBA, 2008). Cirurgiões gerais podem nos ajudar, realizando, se necessária, uma intervenção cirúrgica paliativa, como traqueostomia, gastrostomia, colostomia, toracocentese, peritoneocentese, debridamento de tecidos desvitalizadas de um tumor exofítico e outros procedimentos destinados a aliviar o sofrimento dos nossos pacientes. (CHIBA, 2008). Temos uma interface que denominamos de intrínseca por designar os profissionais que fazem parte da equipe de Cuidados Paliativos, tais como assistente social, farmacêutico(a), fisioterapeuta, fonoaudiólogo(a), terapeuta ocupacional, enfermeiro(a), psicólogo(a), nutricionista, dentista e outros, unidos na atenção não só ao paciente, mas também aos familiares, em suas necessidades vinculadas a um bom atendimento, conforme a definição da Organização Mundial de Saúde (CHIBA, 2008). Figura 11. Equipe de Saúde Multidisciplinar. Fonte: http://revista.hupe.uerj.br/detalhe_artigo.asp?id=324 Perspectivas O ato de cuidar dos nossos pacientes em fase final das suas vidas, como mostra a estatística, é cada vez mais frequente. Não é possível explanar de forma sintética as particularidades apresentadas por essas pessoas. Mas vale a lição de que cada indivíduo
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