Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
REVISÃO ANATÔMICA O pâncreas é uma glândula retroperitoneal que é dividido em: a cabeça, corpo e cauda. Pesa entre 60 e 170g e mede de 12 a 25cm. Esse órgão é dividido funcionalmente em exócrino e endócrino. O canal de Winsurg é um ducto excretório, o qual acompanha toda a extensão do pâncreas. Conecta-se ao duodeno através da ampola de Vater, onde se junta ao ducto biliar. O esfíncter de Oddi, juntamente com a ampola de Vater, regula a secreção pancreática no trato gastrointestinal. Pâncreas exócrino → Mais de 95% da massa pancreática corresponde a células exócrinas, agrupadas em lóbulos (ácinos). → As células acinares sintetizam enzimas digestivas, em sua forma inativa, tais como amilases, proteases, lipases e nucleases. → Posteriormente, essas enzimas são secretadas nos ductos pancreáticos e transportadas até o duodeno, onde são ativadas. → As células dos ductos produzem mucina e fluidos ricos em bicarbonato, úteis na neutralização do conteúdo ácido estomacal. → Os principais exemplos são a amilase pancreática (para carboidratos), lipase pancreática (para gordura), tripsinogênio e quimiotripsinogênio (para proteínas). Pâncreas endócrino A função é desempenhada por aglomerados de células denominados Ilhotas de Langerhans. São distribuídas mais densamente na região da cauda. Existem pelo menos 6 tipos de células pancreáticas descritas: α, δ, β, células PP (ou células Ƴ), G e ε. Dessas as mais importantes e prevalentes são as células α e β. As células α correspondem 15-20% das células das ilhotas. Localizam-se na periferia e sintetizam e secretam glucagon, glicentina, GRPP (peptídeo pancreático relacionado com glicentina), GLP 1 e GLP 2 (peptídeo tipo glucagon 1 e 2). Já as células β são as mais numerosas 70 – 80% das células das ilhotas. São responsáveis pela síntese e pela secreção, principalmente, da insulina e peptídeo C. Em menor escala, produzem amilina, também conhecida como IAPP (polipeptídeo amilóide das ilhotas) Funções do Pâncreas → Secretar líquidos contendo enzimas digestivas no duodeno → Secretar os hormônios insulina e glucagon, que ajudam a regular os níveis de glicose na corrente sanguínea → Secretar grandes quantidades de bicarbonato de sódio (o produto químico presente no fermento) no duodeno, necessárias para neutralizar os ácidos produzidos pelo estômago OBS.: Quando tem lesão nas células acinares elas liberam as enzimas ativas para o interstício o tripsinogênio é convertido em tripsina dentro da célula acinar, ativando as outras enzimas: liberados no interstício e fazem autodigestão. PANCREATITE AGUDA A pancreatite aguda é definida como uma condição inflamatória aguda do pâncreas. Existem diferentes etiologias, no entanto, um ponto comum a elas é que o processo depende da autodigestão tecidual do pâncreas, e possivelmente tecidos vizinhos, devido a secreção das próprias enzimas pancreáticas. A pancreatite aguda deflagra um quadro de abdômen agudo inflamatório intenso que pode causar uma síndrome de resposta inflamatória sistêmica SIRS). Esse processo pode desencadear um quadro grave, levando a disfunção orgânica e morbimortalidade relevante. Epidemiologia A incidência da pancreatite aguda varia em diferentes países e depende da exposição aos hábitos e comorbidades que estão associados à pancreatite (por exemplo, álcool, cálculos biliares, fatores metabólicos, drogas). Etiologia e Patogênese Existem várias causas de pancreatite aguda, mas os mecanismos pelos quais essas condições desencadeiam a inflamação pancreática. → Litíase biliar e álcool são responsáveis por 75% a 80% dos casos de pancreatite aguda. A litíase biliar ainda a maior causa (30% a 60%) dos casos de pancreatite aguda, enquanto o consume crônico de grandes volumes de etanol é a principal causa da pancreatite crônica. O risco de uma pedra na vesícula < 5 mm é 4x maior do que em pacientes que apresentam apenas pedras maiores. (facilita a migração). → Após a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) em 5-10% dos pacientes. Os fatores de risco incluem esficterotomia da papila menor, disfunção do esfíncter de Oddi, história pregressa de pancreatite pós-CPRE, idade <60 anos, >2 injeções de contraste no ducto pancreático e participação de estagiários em endoscopia. → A hipertrigliceridemia é a causa de pancreatite aguda em 1,3 – 3,8% dos casos (quando > 1.000mg/dL). A lipase pancreática causa a liberação de grande quantidade de ácidos graxos livres nos capilares pancreáticos, que deflagram o processo inflamatório no pâncreas. → Medicamentos: que é rara, mas pode ser causada por diversos medicamentos como sulfonamidas, ácido valproico, azatioprina e diversos diuréticos. Patogênese Patologicamente, a pancreatite aguda varia desde pancreatite intersticial (suprimento sanguíneo do pâncreas mantido), a qual costuma ser autoliitada, até pancreatite necrosante (suprimento sanguíneo do pâncreas interrompido). No caso da pancreatite biliar, a teoria mais aceita é a de que a passagem do cálculo pela via biliar causa lesão, inflamação e edema no ducto, o que pode causar obstrução dos ductos pancreáticos, e em algumas situações o cálculo fica impactado na porção distal do ducto colédoco, também obstruindo o ducto de Wirsung. Essa obstrução da saída dos ductos pancreáticos, provocaria lesão dos ácinos por estase dos fluidos, e contribuiria para a ativação das enzimas pancreáticas, dando início ao processo de auto-digestão que causa a lesão e inflamação característicos da pancreatite aguda. Manifestações Clínicas A maioria dos pacientes com pancreatite aguda começa o quadro com uma dor persistente e intensa em faixa, abrangendo desde a região epigástrica, aos hipocôndrios e podendo irradiar para o dorso. → Em pacientes com litíase biliar, a dor é localizada e o início da dor é rápido, pico 10 a 20 minutos após o início dos sintomas. Ao contrário, pancreatite aguda causada por alguma doença metabólica ou abuso de álcool, a dor pode ser menos abrupta e mais difícil de localizar. Aproximadamente 90% dos pacientes têm náuseas e vômitos associados, os quais podem persistir por várias horas. Inchaço Abdominal e febre tambem são sintomas característicos. Exame Físico: Os achados do exame físico podem variar dependo da gravidade da pancreatite. → Alguns pacientes podem apresentar distensão abdominal e ruídos hidroaéreos diminuídos devido à um íleo paralítico secundário à inflamação → Escleras ictéricas devido à coledocolitíase ou edema na cabeça do pancreas, que causa processo colestático e elevação dos níveis séricos de bilirrubina. → A presença de equimose periumbilical (sinal de Cullen) e equimose em flancos (sinal de Grey Turner), é rara, porém em pacientes com pancreatite aguda sugere a presença de hemorragia retroperitoneal, indicando provável presença da forma necrotizante da doença. Diagnóstico: O quadro pode se complicar rapidamente com pela SIRS e até mesmo pelo desenvolvimento de disfunção orgânica, portanto, o diagnóstico precoce é importante. Exames Laboratoriais O desequilíbrio entre a síntese e a secreção das enzimas digestivas pancreática faz com que essas enzimas extravasem o interior das células acinares e atinjam a circulação sistêmica. Amilase sérica: A amilase aumenta rapidamente, já entre as primeiras 6 a 12 horas do início do quadro de pancreatite aguda, e pode voltar ao normal já em cerca de 3 a 5 dias. Valores considerados altamente indicativos de pancreatite aguda são elevações de 3x do valor de referência Lipase sérica: A medição mais sensível e específica para o diagnóstico de pancreatite alcoólica. Sua elevação se dá entre 4 e 8 horas do início dos sintomas, atingindo seu pico em 24 horas e retornando aos valores normais em 8 a 14 dias. → A lipase pode se encontrar elevada também em casos de pancreatite crônica, insuficiência renal, colecistite aguda eoutras causas diversas, dessa maneira, a lipase elevada por si só não fecha o diagnóstico de pancreatite aguda. A leucocitose é comum, principalmente nos casos graves, podendo chegar até 30.000/mm3, refletindo grau de inflamação sistêmica. O aumento da proteína C reativa é outro marco laboratorial de gravidade, já que mede a intensidade da resposta inflamatória. A hiperglicemia é uma alteração comum, no início do quadro é devida à SIRS, e posteriormente, pode ser secundária a uma destruição maciça das ilhotas de Lahngerhans. Hipocalcemia é um achado frequente, decorre da saponificação do cálcio circulante pela gordura peripancreática necrosada, e tem relação direta com a gravidade do quadro Aumento das aminotransferases (TGO, TGP), bilirrubina e fosfatase alcalina. O aumento das aminotransferases, além de ter valor prognóstico, pode sugerir o diagnóstico etiológico da pancreatite. Exames de Imagem: → Radiografia de abdome e tórax → Ultrassonografia de abdome: Em pacientes com pancreatite aguda, o pâncreas aparece difusamente aumentado no ultrassom abdominal. Litíase biliar pode ser visualizada no ducto biliar. Entretanto, não é um dos melhores exames para avaliar, pois a localização retroperitoneal do pâncreas não favorece a visualização. → Tomografia: Os achados incluem alargamento focal ou difuso do pâncreas com realce heterogêneo com contraste intravenoso. A necrose do tecido pancreático, um importante marcado de gravidade. → Ressonância Magnética: encontradas imagens de supressão de gordura, alargamento difuso ou focal da glândula pancreática e as margens do pâncreas podem estar borradas. → Colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) em sensibilidade e especificada para a detecção de coledocolitíase, um achado comum nos pacientes com pancreatite de etiologia biliar. Diagnóstico Diferencial: Vísceras perfuradas, sobretudo úlcera péptica, Colecistite aguda e cólica biliar, Obstrução intestinal aguda, Oclusão vascular mesentérica, Cólica renal, Infarto do miocárdio inferior, Aneurisma dissecante da aorta, Distúrbios do tecido conectivo com vasculite, Pneumonia, Cetoacidose diabética Prognóstico Cada vez mais tem se usado o critério tomográfico Balthazar: Critério de Ranson: É muito antigo reflete a gravidade e extensão do processo inflamatório, baseado em 11 critérios, sendo 5 na admissão e 6 nas primeiras 48h → 0-2 critérios: 1% de letalidade 3-4: 16% de letalidade 5-6: 40% de letalidade > 6: 100% de letalidade Critério de APACHE II: É outro escore validado para estimativa do prognóstico. Foi criado para avaliação de pacientes graves em geral e, portanto, pode ser utilizado na pancreatite. Considera-se grave a pancreatite que soma 8 ou mais pontos. A avaliação não é simples, levando em conta diversas funções orgânicas (circulatória, pulmonar, renal, cerebral, hematológica, etc.). Para tonar mais prático, o cálculo pode ser feito online A vantagem em relação ao RANSON, que só pode ser calculado após 48h, é que já pode ser calculado dentro das primeiras 24h de admissão. Tratamento: O tratamento depende da gravidade do quadro. As medidas iniciais, independentemente da gravidade do quadro, devem ser: reposição volêmica, analgesia e dieta zero. Após isso, é feita a avaliação de risco (após 48h, utilizado o critério de RANSON). Reposição volêmica: Sua necessidade se justifica pelo frequente quadro de hipovolemia apresentado por pacientes com pancreatite aguda, que ocorre por múltiplos fatores, como vômitos, aumento da permeabilidade vascular secundário ao processo inflamatório. → Obs.: Pacientes com comorbidades, principalmente insuficiência cardíaca e renal, podem tolerar mal a hidratação vigorosa e apresentar complicações como congestão. Controle da dor: A dor geralmente é o principal sintoma apresentado pelo paciente. Os opioides são drogas seguras nesses casos, adm por via EV. Tramadol e morfina são drogas comumente utilizadas na prática clínica para abordagem desses pacientes, cursando com bons resultados. Monitorização: Sinais vitais, mudança no estado físico e débito urinário > 0,5mL/kg/hora, eletrólitos (Mg e Ca), SatO2 >95%, Glicemia 1/1hora. Suporte Nutricional: Restabelecer o mais rápido possível a nutrição oral. → Via enteral: é a via de escolha quando a alimentação por via oral não se faz possível (sonda). → Via parenteral: é a via que oferece maior risco de complicações, tais como infecção de cateter e translocação bacteriana intestinal. PANCREATITE CRÔNICA A pancreatite crônica é uma inflamação do pâncreas de longa duração, resultante de uma deterioração irreversível da estrutura e da função pancreáticas. A PC é classicamente dividida em três tipos: → Pancreatite Calcificante Crônica: Principal causa: Etilismo, a mais comum - 95%, presença de cálculos pancreáticos → Pancreatite Obstrutiva Crônica: Principal causa: tumor intraductal (adenocarcinoma), Obstrução no ducto pancreático principal (Wirsung), Dilatação homogênea e generalizada da árvore pancreática. → Pancreatite Inflamatória Crônica: Principal causa: doença autoimune (ex.: Sd Sjögren), Tipo raro, não causa dilatação ou calcificação. Etiologia: Causas da pancreatite crônica As categorias incluem a Tóxica-Metabólica, Idiopática, Genética e AutoImune, Pancreatite Aguda Recorrente Severa e mecanismos Obstrutivos. Alguns casos de pancreatite crônica não têm uma causa óbvia (eles são idiopáticos). Em países tropicais (por exemplo, Índia, Indonésia e Nigéria), pancreatite crônica de origem desconhecida ocorre em crianças e adultos jovens (pancreatite tropical). Fisiopatologia: Na etiologia alcoólica, por exemplo, acredita-se que o álcool modifica a constituição do suco pancreático tornando-o bastante proteico. As proteínas formariam plugs, obstruiriam os ductos pancreáticos e ativariam enzimas que causariam a inflamação do órgão. O cálcio tenderia a se depositar nos plugs proteicos e formaria, assim, os cálculos pancreáticos, causadores de obstrução, comuns na doença. Além desse mecanismo, sabendo que a patologia é multifatorial, temos outros mecanismos potencialmente envolvidos, tais como: isquemia tissular, estresse oxidativo, efeito tóxico metabólico e fenômenos autoimunes. Manifestações Clínicas: O sintoma predominante na pancreatite crônica é dor abdominal. Ela, em geral, se apresenta ou piora 15 a 30 minutos após a alimentação. A dor localiza-se frequentemente ao abdome superior e médio. Por vezes, irradiando para o dorso. A diabetes surge quando o parênquima pancreático endócrino é substituído por fibrose e, uma vez instalada a lesão, o paciente pode ter as mesmas complicações de qualquer outro paciente diabético. Outro sintoma frequente é o emagrecimento e desnutrição, já que hábitos alimentarem mudam em decorrência da dor pós-prandial. A insuficiência pancreática exócrina com perda de absorção de gordura e proteínas só ocorre quando a perda de função do órgão é maior que 90%. Assim, observamos esteatorreia com fezes gordurosas, volumosas e malcheirosas. A tríade clássica da PC é composta de Esteatorreia + Diabetes Mellitus + Calcificações, todavia ocorre em menos de um terço dos pacientes. Diagnóstico O diagnóstico é feito com história clínica associada a exames de imagem. Exames laboratoriais como as enzimas pancreáticas, as quais se elevam na pancreatite aguda (amilase e lipase), apenas se elevam nas fases iniciais da pancreatite crônica, durante as crises de agudização. Alguns testes podem ser realizados para diagnóstico de má absorção de gorduras: → Teste quantitativo de gordura fecal: quantidade de gordura presente nas fezes acumuladas em 72 horas. Normal menos de 7 g/dia. → Teste qualitativo de gordura fecal: usando o corante para gorduras Sudan III.Indica a presença ou não de gordura fecal em excesso. → Teste da bentiromida: é um peptídeo sintéticoligado ao ácido PABA. Diagnostica-se insuficiência pancreática exócrina. → Teste da secretina: considerado o melhor teste para diagnóstico de insuficiência pancreática exócrina. Exames de Imagem: → Radiografa de abdome: Apesar de baixa sensibilidade, a presença de calcificações em topografia pancreática fecha o diagnóstico de PC. → Ultrassonografia abdominal pode também ser requerida, com sensibilidade entre 60 e 70% e especificidade de 85%. → Tomografia computadorizada helicoidal com contraste venoso é um excelente exame para pancreatite crônica. → Colangiopancreatografia endoscópica retrógrada (CPER) é um exame invasivo de alta sensibilidade e especificidade, a partir de 90% ambas. Só deve ser solicitado, caso exames não invasivos não fechem o diagnóstico. → Ultrassonografia endoscópica: São visualizadas alterações da ecogenicidade, identificação de calcificações e alterações dos ductos pancreáticos. Ainda permite a realização de biópsia do pâncreas, na suspeita de câncer. Tratamento: O alicerce do tratamento de PC é a reposição das enzimas pancreáticas (lipase e protease), tratamento da diabetes mellitus, caso já instalada e cuidar da dor. Assim, podemos lançar mão de: → Fracionamento das refeições → Reduzir ingestão de gorduras → Analgesia farmacológica (escalonada) → Descompressão ductal endoscópica → Descompressão ductal cirúrgica (pancreatojejunostomia lateral) → Pancreatectomia subtotal (Whipple) → Bloqueio de plexo celíaco Complicações → Pseudocistos Pancreáticos: São geralmente maduros e apresentam uma cápsula visível ao redor. Alguns pseudocistos podem ser benignos, mas outros podem apresentar estruturas císticas dentro e ao redor do pâncreas gerando neoplasias císticas. → Pseudocistos sintomáticos necessitam de drenagem, e os neoplasmas precisam de ressecção. → Características que sugerem neoplasia: cisto com parede espessa ou nodular, cisto com múltiplas septações internas, ou cisto que ocorre em pacientes sem histórico de pancreatite. → Malignidade: Pancreatite crônica é um forte fator de risco para adenocarcinoma ductal pancreático.
Compartilhar