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Afecções da vesícula e vias biliares (Capítulo de Livro)

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Afecções da vesícula e vias
biliares
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1. Etiologia do cálculo biliar
Figura 1 - Cálculos biliares humanos (A) de colesterol (amarelo-esbranquiçados,
mistos) e (B) pigmentares (negros e marrons)
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2. Colelitíase
Na história natural da litíase biliar, a maioria dos pacientes
com colelitíase é assintomática. Existe uma regra mnemônica
para guardar a população que é mais acometida: regra dos
“Fs” em inglês (Female, Fat, Forty, Fertility e Familiar). A
incidência do desenvolvimento de sintomas é em torno de 15 a
25%, durante um seguimento de 15 anos. Dos pacientes que se
tornam sintomáticos e, portanto, com indicação para
colecistectomia, a maioria se apresenta sob a forma de cólica
biliar.
Apesar de ser denominada cólica biliar, a dor é usualmente
constante, e não uma cólica. A dor biliar é visceral, localiza-se
no epigástrio ou no hipocôndrio direito, com frequência se
irradia para o ombro direito e a escápula e resulta da obstrução
transitória do canal cístico pelos cálculos, seguida de espasmo.
A dor pode ser precipitada por uma refeição gordurosa, porém,
mais comumente, não há evento estimulante e a dor pode
começar até mesmo à noite. O exame físico geralmente é
normal.
Tipicamente, a avaliação na suspeita de litíase biliar inicia-se
com ultrassonografia de abdome, já que essa é a modalidade
mais sensível para a sua detecção (sensibilidade de 84% e
especificidade de 99%). Cálculos se apresentam na
ultrassonografia como focos ecogênicos que causam sombra
acústica posterior e são móveis.
A colecistectomia é o único tratamento definitivo para a
colelitíase e está indicada para a maioria dos pacientes
sintomáticos, mas não há consenso quanto à indicação para
pacientes assintomáticos. A colecistectomia é tipicamente
realizada por via laparoscópica.
Nos assintomáticos, geralmente não é requerido tratamento, já
que o risco de desenvolver complicações graves e fatais é
baixo (taxa de progressão de doença assintomática para
sintomática de 1% ao ano). A colecistectomia profilática está
indicada àqueles com risco aumentado de câncer de vesícula
(drenagem anômala do ducto pancreático, vesícula “em
porcelana”, adenoma de vesícula e cálculos grandes >3cm),
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àqueles com desordens hemolíticas e aos submetidos ao
bypass gástrico.
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3. Síndrome de Mirizzi
A síndrome de Mirizzi consiste na obstrução da via biliar por
um cálculo impactado no infundíbulo da vesícula biliar (bolsa
de Hartmann) ou no ducto cístico. A presença de ducto cístico
longo, com implantação baixa e paralelo ao ducto hepático
comum, predispõe à síndrome.
Os cálculos impactados causam compressão mecânica do
ducto hepático comum, levando a um quadro de icterícia
contínua ou intermitente e episódios de colangite. Noventa por
cento dos casos apresentam aumento de fosfatase alcalina e
bilirrubinas.
Existem algumas classificações na literatura, sendo mais
utilizada a proposta por Csendes, dividida em 4 estágios, que
vão desde a simples compressão extrínseca até a fístula
colecistobiliar.
A colangiografia pré-operatória ajuda a confirmar o
diagnóstico e determinar a presença de fístula. A
colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) é
usada como preferência, mas a colangiografia percutânea
trans-hepática e a colangiorressonância são opções.
A cirurgia é considerada padrão-ouro para o tratamento
definitivo.
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4. Coledocolitíase
Coledocolitíase é a presença de um cálculo no ducto colédoco.
A maioria é secundária à passagem de cálculos da vesícula
para o colédoco. A primária é menos comum e caracteriza-se
pela formação de cálculos no próprio ducto.
Tipicamente, os cálculos apresentam-se com dor tipo cólica
biliar e os exames laboratoriais mostram padrão colestático
(aumento de bilirrubina e fosfatase alcalina). Pacientes sem
complicações são afebris, com leucograma e enzimas
pancreáticas normais. Além disso, podem ser assintomáticos, e
suas complicações são pancreatite e colangite. Náuseas e
vômitos costumam estar associados, e a dor se resolve quando
há passagem espontânea do cálculo ou a sua retirada. Ao
exame físico, há rigidez no quadrante superior direito do
abdome, com possível icterícia. Precocemente, há elevação de
TGO e TGP e, mais tardiamente, elevação de padrão
colestático.
O 1º exame utilizado é a ultrassonografia. Outros estudos são
colangiorressonância, ultrassonografia endoscópica e CPRE.
Um guideline de 2010 da American Society for
Gastrointestinal Endoscopy (ASGE) propôs uma estratificação
com base na probabilidade de coledocolitíase. São
considerados preditores muito fortes: coledocolitíase na
ultrassonografia, clínica de colangite aguda e bilirrubina
>4mg/dL; preditores fortes: colédoco dilatado na
ultrassonografia (>6mm) e bilirrubina entre 1,8 e 4mg/dL; e
preditores moderados: anormalidade na bioquímica hepática
outra que a bilirrubina, mais de 55 anos e clínica de
pancreatite biliar. São estratificados como de alto risco: se pelo
menos 1 preditor muito forte e/ou ambos os preditores fortes;
de risco intermediário: se 1 preditor forte e/ou pelo menos 1
moderado; e de baixo risco: se nenhum preditor presente.
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5. Íleo biliar
O chamado íleo biliar consiste na obstrução intestinal por
cálculo biliar grande (90% dos casos >2cm, a maioria >2,5cm)
impactado no íleo (50 a 70% dos casos). A passagem desse
cálculo é consequência de uma fístula entre a vesícula biliar e
o intestino, sendo a colecistoduodenal a mais comum (60%). A
fístula colecistoduodenal, colecistogástrica ou
colecistocolônica, normalmente, decorre de uma colecistite
aguda.
Apesar de ser raro, o íleo biliar é responsável por 25% dos
casos de abdome agudo obstrutivo em pacientes idosos (>65
anos) sem hérnia e sem cirurgia prévia. Obstrução subaguda
com dor abdominal e vômitos costuma ser a apresentação.
O diagnóstico radiológico clássico é descrito como tríade de
Rigler, que compreende a distensão do delgado, a aerobilia e a
presença de imagem com calcificação no quadrante inferior
direito do abdome (Figura 2).
O tratamento é cirúrgico. Realiza-se enterotomia no íleo distal
acima do nível da impactação para retirada do cálculo. A
correção do trajeto fistuloso e a colecistectomia são realizadas,
de preferência, no mesmo ato cirúrgico, naqueles de baixo
risco, pois isso diminui a taxa de recorrência do íleo biliar
(>17% dos casos tratados apenas com enterolitotomia).
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Figura 2 - Raios X simples de abdome com distensão de delgado e aerobilia
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6. Colecistite aguda
O termo “colecistite” refere-se à inflamação da vesícula biliar
que pode ser aguda calculosa, aguda sem cálculos e crônica. A
colecistite aguda corresponde à síndrome de dor no quadrante
superior direito, febre e leucocitose, associada aos cálculos na
vesícula biliar. A colecistite alitiásica (10% dos casos) é
clinicamente idêntica a ela, mas não é associada à litíase e
ocorre em pacientes críticos, o que confere alta
morbimortalidade.
A colecistite aguda ocorre no quadro de obstrução do ducto
cístico, e a infecção é, provavelmente, um evento secundário
(aeróbios Gram negativos – Escherichia coli e Klebsiella sp.).
Suas manifestações clínicas incluem dor prolongada e de forte
intensidade no quadrante superior direito ou no epigástrio,
febre, rebote abdominal, sinal de Murphy positivo e
leucocitose. Em cerca de 1/3 dos pacientes, palpa-se a vesícula
biliar ou um plastrão.
Durante a crise, o número de leucócitos é de, em média,
12.000/mm3, com desvio à esquerda. Elevações dos níveis
séricos de bilirrubinas, fosfatase alcalina e aminotransferases
não são comuns na doença não complicada e devem levantar a
suspeita de colangite, coledocolitíase ou síndrome de Mirizzi
(cálculoimpactado no ducto cístico distal levando à
compressão do ducto hepático).
O diagnóstico deve ser suspeitado em caso de dor, febre,
leucocitose e sinal de Murphy positivo (sensibilidade de 97% e
especificidade de 48%). No entanto, esses dados não são
insuficientes para confirmá-lo, requerendo-se a
ultrassonografia, com a demonstração de espessamento (>4 a
5mm – Figura 1) ou edema da parede vesicular (duplo sinal da
parede), sinal de Murphy ultrassonográfico positivo e cálculos
impactados no infundíbulo, ou ainda falência da vesícula de se
encher durante a colecintilografia.
O paciente com colecistite aguda deve ser internado e
colocado em jejum. Infundem-se soluções eletrolíticas para
manter a hidratação, repor perda pelos vômitos ou déficit pela
redução da ingesta por via oral. A analgesia pode ser obtida
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com a administração de espasmolíticos (N-butilbrometo de
hioscina) associados ao diclofenaco sódico intramuscular.
Seguem os antibióticos de escolha:
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Figura 3 - Ultrassonografia com achados de colecistite aguda litiásica: notar a
imagem hiperecogênica impactada no infundíbulo com sombra acústica
posterior, o edema e a delaminação da parede vesicular
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7. Colangite aguda
A colangite é um quadro infeccioso que tem como foco a via
biliar e que necessita de 2 condições para se instalar:
Presença de bactérias no trato biliar;
Obstrução parcial ou completa das vias biliares.
A teoria mais aceita a respeito da infecção da bile é a ascensão
de bactérias provenientes do intestino para as vias biliares que
estão preenchidas por bile. A pressão aumentada nas vias
biliares faz que as bactérias ganhem a circulação sistêmica,
comprometendo o estado geral. Os micro-organismos mais
comumente encontrados nas culturas de pacientes com
colangite são E. coli, Klebsiella e Enterococcus.
O quadro clínico da colangite baseia-se na tríade de Charcot,
presente em 50 a 70% dos portadores dessa afecção, e na
pêntade de Reynolds, a qual indica quadro de sepse grave (pior
prognóstico).
Figura 4 - Estrutura da pêntade de Reynolds
Exames laboratoriais devem ser solicitados para a avaliação
global do paciente.
Assim como na colecistite aguda, são importantes enzimas
canaliculares e bilirrubinas. A ultrassonografia abdominal é o
exame de eleição àqueles com quadro clínico sugestivo de
colangite aguda. Uma vez diagnosticada, inicia-se o
tratamento clínico com reposição volêmica, correção
metabólica e antibioticoterapia parenteral.
Naqueles com colangite e coledocolitíase, devem-se introduzir
antibióticos de largo espectro (intravenoso dirigido às
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bactérias entéricas) e realizar CPRE com papilotomia e
retirada dos cálculos para a descompressão da via biliar
(Figura 5). Respondem à terapia conservadora com antibiótico
70 a 80% dos pacientes, mas drenagem biliar deve ser feita
assim que possível em 24 a 48 horas via CPRE. No entanto, se
não melhorarem em 24 horas, é requerida descompressão de
urgência.
Figura 5 - Tratamento da colangite aguda por colangiopancreatografia
retrógrada endoscópica: (A) retirada de cálculos da via biliar principal com saída
de bile purulenta e (B) saída de bile purulenta após a cateterização da via biliar
principal
Na indisponibilidade desses métodos, a descompressão deve
ser feita por intervenção cirúrgica.
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