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Unidade II A arquitetura no Brasil Imperial Introdução; O Neoclassicismo no Brasil; O Romantismo no Brasil; O Ecletismo no Brasil. Objetivo de aprendizado Compreender as novas tipologias arquitetônicas e a contribuição de arquitetos de origem estrangeira num período marcado pela mudança de um Brasil Colônia para uma “capital” de um Reino Unido transoceânico. Introdução Essa unidade concentra uma análise da arquitetura no período em que o Brasil deixa de ser uma mera colônia agrícola-escravocrata e se transforma em capital de um Reino Unido transoceânico. São inúmeras transformações que acontecem em território brasileiro, desde mudanças na estratificação social do período colonial (senhor do engenho vindo de Portugal no topo da pirâmide, ordens religiosas na segunda camada e escravos na camada mais baixa) para o período Imperial (nobreza e proprietários de terras na camada mais alta, comerciantes, profissionais liberais e militares na segunda camada, operariado na terceira camada e escravos na última). Outro fator importante são as atividades econômicas onde a cultura da cana-de- -açúcar deixa de ser dominante e o ciclo do café passa a ser o protagonista. Além da própria chegada da Corte portuguesa no ano de 1808, que resulta na proclamação da Independência do Brasil em 7 de setembro de 1822, abrindo possibilidades de novas dinâmicas no país. Além dessas modificações, outros acontecimentos na Europa, como a Revolução Industrial que tem início na capital inglesa por volta de 1760, geram efeitos no Brasil. Pioneira na industrialização, a Inglaterra imperialista provoca um domínio no continente europeu. Entre outros fatores, o território brasileiro se abre para a vinda de imigrantes de outros países da Europa, entre eles profissionais da construção civil vindos da França. Portanto, em função dessas e outras condições, transformações políticas e sociais implicarão em uma série de mudanças tanto na arquitetura quanto nos traçados urbanos brasileiros. Portanto, essa unidade objetiva compreender a produção arquitetônica no Brasil ao destacar os novos estilos implantados no país, como o Neoclassicismo, o Romantismo e o Ecletismo, revelando a influência que não se limita apenas à herança portuguesa, mas que também abrange arquiteturas oriundas de outros países europeus. O Neoclassicismo no Brasil Jean-Nicolas-Louis Durant (1760-1835) é considerado um dos responsáveis pela formulação do neoclassicismo na França na virada do século XVIII para o XIX. Durant resgata a tríade vitruviana e define a utilitas (funcionalidade) como mais importante do que a firmitas (firmeza) e a venustas (beleza). Dessa forma, a coluna, que antigamente era considerada apenas um elemento compositivo do conjunto, passa a ser a protagonista ao adquirir certa autonomia e ao insinuar um procedimento projetual nas novas tipologias arquitetônicas. A disposição dos elementos de sustentação como as paredes, arcadas, colunas criam uma reticula quadrada, o que implica em uma planta caracterizada pela modulação. Portanto, através das combinações horizontais e verticais de diferentes grupos construtivos, qualquer edifício tornar-se-ia fácil de executar, do projeto à construção. Essa maneira de compor ficou conhecida como neoclássico revolucionário. (MENDES et al, 2011, p. 37) Dentro do que se convencionou como sistema de Belas Artes, Quatremère de Nincy requalifica o método definido por Durand e propõe “a criação de conceitos do decoro ou conveniência, da linguagem e do caráter próprio da obra de arquitetura” (MENDES et al, 2011, p.38). Nincy sugere a adoção de uma clássica para determinados programas como fábricas e instituições públicas ligadas ao poder. Dessa forma, o sistema de Belas Artes oferece ampla flexibilidade compositiva para os arquitetos do século XIX. Um dos responsáveis por introduzir o revivescimento da linguagem clássica no território brasileiro é o francês Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny (1776-1850) que, após permanecer uma longa temporada na Itália estudando a arquitetura romana, chega ao novo continente em 1816 com a “missão francesa” e implanta o ensino regular de arquitetura no Brasil. Porém, há registros de edificações com clara influência clássica em várias regiões da Colônia que antecedem esse episódio, ainda no século XVIII. A antiga Casa de Câmara e Cadeia de Vila Rica (Ouro Preto, Minas Gerais) estabelece referência direta ao Capitólio italiano de Michelangelo (Roma, 1537). As igrejas de Nossa Senhora da Candelária e São Francisco de Paula, ambas no Rio de Janeiro, recebem elementos de influência neoclássica por conta de reformas realizadas ao longo a segunda metade do século XVIII, sendo que a Candelária possui referências diretas às igrejas portuguesas, como o Convento de Mafra ou a Basílica da Estrela. No Rio de Janeiro, o Real Teatro São João possui nítida influência clássica dos teatros São Carlos e do Escala de Milão. Já em Salvador, Bahia, o projeto para edificação na Praça do Comércio (1811) do sargento-mor Cosme Damião da Cunha Fidié possui influência do estilo inglês Adams, verificado no projeto Bowood House. De acordo com Mendes (2011, p. 67), “o neoclassicismo no Brasil, entretanto, apenas a partir do Primeiro Reinado, sob a égide de D. Pedro I, definiu-se como arquitetura oficial” de modo que esse estilo, num primeiro momento, faz-se predominante nas construções de caráter público com o objetivo de demonstrar imponência, austeridade, tornando-se símbolos de uma nova fase pela qual o país estaria entrando. Os arquitetos responsáveis por introduzir os conceitos do neoclassicismo no território brasileiro são os franceses Pierre Joseph Pézerat (1801-1872) que chega no país em 1825 e instala-se na capital, Rio de Janeiro à época; e Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny (1776-1850). Ainda que Pézerat tenha assumido o posto de arquiteto particular de Dom Pedro I, Grandjean de Montigny oferece uma inestimável contribuição à arquitetura brasileira. Além de desenvolver projetos de relevância, muitos deles não executados por falta de mão de obra qualificada e recursos financeiros, Grandjean de Montigny exerce valiosa contribuição ao ensino de arquitetura com a fundação do curso de arquitetura no país na Academia Imperial de Belas Artes. Enquanto projetista, Grandjean de Montigny destaca-se, sobretudo, pela atenção dada às fachadas e aos adornos em excesso, itens que lhe rendem inúmeras críticas pelos arquitetos contemporâneos. Dois de seus mais relevantes projetos são a Praça do Comércio e a própria Academia Imperial de Belas Artes, onde leciona entre os anos de 1827 e 1850. A Praça do Comércio, transformada em Alfândega, II Tribunal do Júri e, no final do século XX, Casa França-Brasil, revela uma edificação ostensiva, de proporções monumentais que compreende uma grande praça coberta por abóbodas de berço dispostas em cruz grega, com transepto iluminado por claraboia-lanternim central apoiada em tronco de cilindro. Os negócios e pregões eram realizados numa ágora delimitada por um grandioso peristilo de colunas dóricas que sustentam imponentes arquitraves. O projeto da Academia Imperial de Belas Artes admite outras dificuldades. A falta de mão de obra e as complicações econômicas e políticas da época fazem com que o projeto leve dez anos para ser executado, sendo inaugurado em 1826, após a Independência. O projeto está localizado num terreno estreito inserido na malha colonial urbana da cidade. Por estar inserido num lote numa quadra, a edificação encontra-se geminada às construções vizinhas. Com o intuito de valorizar o prédio do liceu, o arquiteto cria uma nova rua que conecta o Largo do Rocio, atual Praça Tiradentes, a uma praça semicircular à frente da nova edificação. O edifício é construído com apenas um único pavimento térreo, tendo apenas o bloco central resolvido em dois pavimentos, de modo que o segundo pavimento, previsto no projeto original, é implantado no decorrer do século XIX. O pavimento térreo está organizado em um trapézioque ocupa todo o lote. Abriga a grande entrada para o vestíbulo no corpo central que conduz à biblioteca no pavimento superior através de uma escada localizada à esquerda. Há uma galeria que corre paralelamente à fachada principal e garante o acesso às salas de aula que ocupam a faixa voltada à travessa das Belas Artes e aos ateliês, voltados aos fundos do terreno. A fachada principal está voltada para a travessa e é dividida em três seções, sendo o bloco central, com dois pavimentos, coroado com um frontão triangular apoiado em quatro colunas jônicas dispostas sobre um embasamento de pedra aparente; além do bloco central, há os dois laterais, de único pavimento, com esquadrias arrematadas em arco pleno e dispostas de modo a revelar a simetria da composição. Além da Praça do Comércio e da Academia Imperial, Grandjean de Montigny é responsável pelo projeto do Mercado da Candelária em 1834, também no Rio de Janeiro. A edificação possui cerca de 5.000m² distribuídos em uma planta quadrangular com simetria biaxial, contando com quatro fachadas. Há acessos nos quatro lados marcados por colunas dóricas que sustentam um arco pleno sob um frontão triangular. O neoclassicismo não atinge apenas as construções públicas, mas também as moradias, sobretudo as urbanas. Isso se dá, sobretudo, pela chegada da Corte ao Brasil, que acarreta uma série de transformações na pirâmide social, sobretudo nas elites locais. Portanto, o país inicia um processo de modernização ao adotar a linguagem clássica na arquitetura. Verifica-se uma forte correspondência do palacete francês em exemplos como a chácara da Gávea e o solar da Marquesa de Santos. O primeiro, projeto de Grandjean de Montigny, esboça uma planta quadrangular, sendo que seu núcleo é delimitado por uma varanda em U com o intuito de proteger as paredes do calor excessivo. A fachada posterior possui acesso arrematado por um frontão triangular e marcado por uma superfície curva. Já o projeto de Pézerat para o solar possui um vestíbulo de formato retangular que se apresenta ao visitante no primeiro pavimento. Há uma forte influência dos chateaux franceses no projeto de Pézerat, que revela harmonia e graça na sua composição. Parte da elite instala-se entre o meio urbano e o rural em palacetes localizados em lotes de proporções avantajadas, como é o caso das chácaras. Há nessa nova tipologia arquitetônica a extinção das varandas como espaço de celebração, socialização. Em alguns casos, onde há reforma de construções do período colonial, a varanda acaba sendo reduzida a meros alpendres, quando não é completamente eliminada. A capela, espaço de extrema importância na casa rural colonial, é reduzida a um espaço na sala de recepção, limitando-se a um nicho ou oratório de dimensões módicas. Outra condição que deve ser destacada é a incorporação da cozinha a partir de 1860, após ter sido separada do corpo principal da casa durante algumas décadas ao longo do século XIX. O Romantismo no Brasil Um novo cenário urbano se estabelece no Império por conta da estabilidade econômica proveniente da produção cafeeira a partir de 1850. A classe média brasileira se consolida e a partir desse momento opta pela moradia nas áreas urbanas já dotadas de certa infraestrutura e, portanto, consolidadas, mas em contínua expansão. Enquanto que essa classe se adequa à condição urbana ao ocupar casas de aluguel por não possuir capital suficiente para adquirir o imóvel próprio, a classe mais nobre e os associados à Corte, ao procurar se adaptar ao ambiente urbano, transformam as antigas casas de chácaras em palacetes, dando continuidade ao processo de modernização iniciado nas primeiras décadas do século XIX. Com o surgimento dos novos bairros, nota-se uma fase de transição em que novas tipologias arquitetônicas convivem com as antigas casas coloniais. Algumas características dos séculos passados, como implantação das novas residências com a fachada no limite da testada nos terrenos mais estreitos são mantidas; por outro lado, a inclusão de um porão elevado e, posteriormente, a adoção do recuo frontal em lotes mais generosos distinguem as novas das antigas tipologias residenciais. Outro fator a ser ponderado refere-se à setorização. Enquanto que na casa colonial há a justaposição dos setores íntimos, serviço e trabalho, a partir da segunda metade do século XIX, o setor social é evidenciado enquanto a área de trabalho é omitida da edificação. Os porões incorporados nas novas tipologias residenciais urbanas em meados do século XIX, além de melhorar a privacidade, tornam-se responsáveis pelo conforto ao aprimorar a ventilação e diminuir a umidade. Um outro fato importante que impulsiona o crescimento do Brasil nessa fase é a relação mais próxima com eventos internacionais, como as exposições universais, fruto da Revolução Industrial, e também com o fato de haver uma grande demanda de jovens brasileiros em busca de melhor formação no exterior. Através desse contato, especialmente com os países europeus, faz com que os jovens brasileiros se interem das manifestações do Romantismo vigente na Europa desde as últimas décadas do século XVIII. A essência do Romantismo, de maneira muito similar à do Neoclássico, gira em torno da incorporação de elementos do passado, por outro lado, o que a distingue é o fato de haver uma reinterpretação do passado, sinalizando uma projeção para a modernidade que acontecerá na virada do século. Tendo em vista a imigração, a industrialização e a busca da modernidade, a arquitetura no Brasil adquire um caráter plural nessa fase ao incorporar diversas tendências estéticas, bem distinto da produção europeia. Logo, o paisagismo no Brasil é o que mais absorve as experiências românticas europeias. Entre as características mais reveladoras, “o exotismo, o passado, a fuga de maneiras variadas, o isolamento e a valorização da natureza em seu estado primitivo” (Mendes et al, 2011, p. 134) definem a essência desses jardins. O jardim de estilo inglês acaba se tornando uma das principais referências compositivas com seus caminhos sinuosos, massas de vegetação organizadas de maneira assimétrica, espelhos d’água, quiosques ou caramanchões, falsas ruínas, lago artificial abrigando peixes exóticos e aves. Esses elementos simulam o sítio natural desejado por esse tipo de jardim diametralmente oposto ao jardim francês. O responsável por trazer essa concepção de projeto paisagístico para o Brasil é o francês Auguste Glaziou, que se estabelece na Corte a partir de 1858 quando começa a desenvolver uma série de projetos urbanos, além de parques e jardins particulares. No Rio de Janeiro, entre os projetos de destaque de Glaziou estão a reforma no Passeio Público (1860), o Campo de Santana (1880), a Quinta da Boa Vista; em Petrópolis, o jardim do Palácio Imperial; em Nova Friburgo, o parque São Clemente; em São Paulo, o jardim da Aclimação e em Barra Mansa, o parque da Preguiça. O Ecletismo no Brasil Em função dessa miscigenação de estilos europeus no Brasil, as novas experiências exploradas conduzem a uma estética muito peculiar a partir de meados do século XIX. A essas experimentações atribui-se o nome de Ecletismo, defendido por alguns pensadores como os franceses Victor Cousin (1792-1867) e César Denis Daly (1811-1893). Ambos compreendem que a arquitetura pode retomar o passado de maneira livre, mas com a responsabilidade de reconfigurar as características dos demais estilos. Em suma, extrair aquilo que revela determinado estilo e, associado a outros elementos de estilos variados, compor uma nova edificação. Tal postura causa furor entre outros arquitetos que, como Friedrich Schinkel (1718-1841) e Gilbert Scott (1811-1878), defendem a adoção de forma pura das arquiteturas do passado. Dessa forma, o Ecletismo se distingue do Neoclassicismo e estabelece alguns pontos de contato com o Romantismo. Ainda assim, os princípios do Ecletismo são muito bem aceitos no Brasil, sobretudo pela sua elite. No Rio de Janeiro, as residências mais abastadas, implantadasnos arredores das áreas mais adensadas, incorporam, por exemplo, a platibanda como coroamento de suas fachadas principais, e abandonam, portanto, a solução dos beirais. O porão alto das primeiras décadas dos oitocentos é substituído pelo porão habitável nas duas últimas décadas do século XIX. O pé-direito do andar nobre é ampliado enquanto que as demais dimensões são diminuídas, tornando o lote ainda mais estreito. Também surge uma nova tipologia arquitetônica, o chalé. Normalmente isolada no centro do terreno, essa edificação tem as quatro fachadas desobstruídas de quaisquer superfícies verticais, de modo que os ambientes internos recebem ventilação natural e iluminação direta em abundância, diferentemente da sua versão popular, geminada. Em terrenos de maiores proporções, a existência de um jardim inglês na lateral e de árvores frutíferas, horta e galinheiro, podem complementar o programa dessa tipologia. O chalé, por outro lado, resgata a presença estética do frontão de clara influência neoclássica, sendo que em alguns casos, o tímpano é decorado com baixos relevos de traços do rococó. A versão popular do chalé passa a acontecer com mais frequência com as mudanças ocorridas tanto na economia quanto na estrutura social, que alteram as dinâmicas urbanas ao fazerem com que a crescente classe média busque moradia nas áreas urbanas. Essa tipologia torna-se comum em áreas ainda não muito valorizadas com terrenos baratos e possuem em sua essência os ideais da industrialização, tendo em vista a sua produção seriada. A industrialização é presente também nos elementos compositivos, como as esquadrias, ornamentos e equipamentos adquiridos através de catálogos. O programa usualmente possui duas salas, dois dormitórios, cozinha, despensa no corpo principal, enquanto que a área de serviço e o banheiro, cada vez mais presentes nas moradias, encontram-se numa edícula independente. O porão, vez ou outra habitável, contribui para amenizar a umidade ao elevar a construção do solo. A fachada principal possui óculos para ventilar o porão, portas-janelas garantindo o acesso a pequenos balcões; já a fachada lateral guarda o acesso à edificação, garantido por uma escada e protegido por um elegante alpendre. Um dos expoentes do Ecletismo em São Paulo é Francisco de Paula Ramos de Azevedo. Nascido em 1851, Ramos de Azevedo realiza os seus estudos em engenharia civil na Bélgica e, ao retornar ao Brasil, propõe algumas obras em Campinas, local que adotou como sua cidade natal, e em 1889, instala-se definitivamente em São Paulo, onde deixará uma herança majestosa. Além da arquitetura residencial destinada às classes mais abastadas, Ramos de Azevedo tem fundamental participação na concepção de obras públicas, como a Escola Normal Caetano de Campos (1890-94), localizada à Praça da República. Ainda na região central, o Teatro Municipal inaugurado em 1911, o Quartel da Polícia (1892), a Pinacoteca do Estado (1900) e o Palácio dos Correios (1922) complementam o conjunto de edifícios públicos que marcam a ascensão da cidade de São Paulo à modernidade.
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