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ARRITMIAS CARDÍACAS - Cardiologia

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Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp 
As arritmias são qualquer distúrbio na geração ou na condução do impulso, ocorrendo de forma 
isolada ou em combinação. Arritmias cardíacas então são situações onde o ritmo cardíaco sai do 
normal. O ritmo sinusal é de 50 a 100 bpm. Acima ou abaixo disso é arritmias, bem como batimento 
desordenado. Engloba distúrbios da condução elétrica que não interferem propriamente no ritmo, 
mas estão incluídos. 
Quando surge nos átrios, no nó sinoatrial (SA) ou nó atrioventricular (AV) é chamada de arritmia 
supraventricular. Quando surge nos ventrículos, arritmia ventricular. As principais causas são: 
aterosclerose, espasmo coronariano, bloqueio do coração, isquemia do miocárdio. A oclusão 
coronária aguda provoca a necrose da maioria das células da região afetada pela ausência de 
sangue arterial, em algumas horas; entretanto, fibras de Purkinje, em áreas adjacentes, conseguem 
sobreviver, porém com atividade elétrica anormal. A despolarização diastólica destas fibras se 
acelera, podendo iniciar impulsos ectópicos automáticos durante vários dias. 
Determinadas células cardíacas têm capacidade de iniciar potenciais de ação espontaneamente e 
são designadas como células automáticas. A condução do impulso assim gerado se faz fibra a fibra 
e sua velocidade varia amplamente nos diversos tecidos cardíacos, dependendo do tipo de resposta 
obtido: lenta ou rápida. 
As enfermidades podem transformar fibras rápidas em fibras lentas, ao alterar as correntes iônicas, 
normalmente existentes nas células do coração. As arritmias podem surgir por modificações do seu 
automatismo normal, originando batimentos ou ritmos de escape, passivos ou ativos; quando células 
não automáticas mostram atividade elétrica espontânea, geram distúrbios do ritmo por automatismo 
anormal. 
O potencial transmembrana tem a capacidade de apresentar oscilações, durante ou no final da 
repolarizaçao (pós-despolarizações) que, se forem suficientemente amplas e repetitivas, podem 
originar arritmias por atividade deflagrada. 
A progressão do impulso através do coração pode encontrar uma área onde exista condução lenta 
e bloqueio unidirecional, permanecendo neste local, durante um tempo suficientemente longo para 
que possa novamente reexcitá-lo, induzindo arritmias por reentrada. O fenômeno de reentrada 
poderá ocorrer pela presença de um obstáculo 
anatômico, funcional, por anisotropia ou por adição. 
1. FISIOLOGIA NORMAL DA CÉLULA CARDÍACA 
O coração é coordenado por um sistema elétrico próprio. 
A direção do estímulo segue: nó sinusal → tratos intra-
atriais → nó atrioventricular → feixe de His → fibras 
de Purkinje. 
O impulso originado no nódulo sinoatrial é transmitido 
através do sistema especializado de condução ao 
miocárdio atrial e ventricular. A velocidade de condução 
não é constante: é mais rápida no sistema His-Purkinje 
e nos tratos internodais; mais lenta, na região central 
do nódulo AV e no miocárdio comum, atrial ou ventricular. 
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Branda de Oliveira de Lima, Turma LVI - MedUnicamp 
Essa transmissão do impulso ocorre por canais iônicos (sódio, 
potássio e cálcio). A alteração que ocorre durante a ativação de uma 
célula cardíaca é chamada de potencial de ação e, quando 
observada em uma típica fibra de Purkinje, compreende quatro 
fases: 
A fase 0 mostra uma ascensão rápida, tornando positivo o meio 
intracelular, em relação ao meio exterior, o qual passa de um valor 
igual a -90 mV para +30 mV. Esta modificação acontece porque, ao 
ser atingido o potencial limiar, a membrana torna-se permeável aos 
íons sódio, que penetram em grande quantidade, através dos 
canais rápidos. 
As fases seguintes são de repolarizaçao. Na fase 1, existe uma 
recuperação relativamente rápida, aproximando-se o potencial do 
nível 0, sendo sua existência atribuída a uma corrente de entrada 
efetuada por íons cloreto. 
A fase 2 ou platô não apresenta alterações no potencial da 
membrana devido ao aparecimento de duas correntes iônicas 
opostas com a mesma magnitude: entrada lenta de sódio (em 
algumas células, cálcio) e saída lenta de potássio. 
Na fase 3, há uma queda do potencial intracelular, relativamente rápida, até ser atingido o valor 
existente durante o período de repouso, decorrente da saída de íons potássio para o meio 
extracelular. No final desta fase, o potencial intracelular retornou aos níveis iniciais (-90 mV), porém 
com íons trocados: sódio no seu interior e potássio, externamente. 
A fase 4 não apresenta modificações no potencial; entretanto, pela ação da bomba de sódio e 
potássio (uma ATPase), íons sódio são expulsos da fibra, enquanto há uma entrada progressiva 
de íons potássio. 
Essas mudanças no potencial de ação são visíveis no eletrocardiograma. 
2. MECANISMOS DAS ARRITMIAS 
Automatismo é a capacidade que determinados tipos de células cardíacas apresentam de iniciar 
potenciais de ação espontaneamente, ao alterar progressivamente o potencial de repouso, tornando-
se menos negativo, até atingir o potencial limiar. Ocorre principalmente nos marcapassos (nó 
sinusal), capacidade de despolarizar espontaneamente. Mas qualquer célula, por algum motivo, pode 
desencadear a despolarização espontânea (automatismo anormal). 
Defeito na formação do impulso nervoso: 
• AUTOMATISMO NORMAL ALTERADO 
O nó sinusal é sensível aos efeitos do sistema nervoso autônomo, de forma que a estimulação 
simpática produz taquicardia sinusal e a estimulação parassimpática provoca bradicardia. A perda 
das células marca-passo sinusais pode produzir bradicardias ou outros tipos de bradiarritmias. Ex.: 
taquicardia ou bradicardia inapropriadas para a situação clínica, marcapassos ectópicos. 
• AUTOMATISMO ANORMAL 
Ocorre em condições patológicas, que produzem alteração do metabolismo celular, com diminuição 
do potencial de repouso diastólico, as células miocárdicas comuns podem adquirir propriedade de 
automatismo. Ex.: ritmo idioventricular acelerado pós IM, taquicardia atrial ectópica. 
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O automatismo anormal depende do potencial diastólico máximo, do limiar de excitabilidade e da 
inclinação da fase 4 do potencial de ação. Quanto menos negativo o limiar, mais fácil surgir 
automatismo anormal. 
As fibras musculares comuns, atriais ou ventriculares, normalmente não apresentam despolarização 
diastólica, não iniciando impulsos, mesmo se não forem excitadas por períodos de tempo 
prolongados. Se os potenciais de repouso destas células são deslocados para um valor aproximado 
de -60 mV, poderá surgir atividade espontânea, causando impulsos repetitivos. 
Essas arritmias automáticas costumam se aquecendo (warm up) e depois se esfriando até de 
interromper (cool down). As mais comuns são taquicardias atriais. 
Clinicamente, pelo EEF vemos que são difíceis de induzir com estimulação programada, mas 
facilitada pelo Isoproterenol e podem sumir pela anestesia geral. 
• ATIVIDADE DEFLAGRADA 
Ocorre quando o potencial de ação normal pode deflagrar 
despolarizações anormais adicionais. A atividade elétrica é 
deflagrada pelo batimento anterior. O estimulo anterior 
provoca alterações na eletrofisiologia da célula, originando 
despolarizações. 
A indução nos exames é feita por estimulação continua e 
facilitada pelo Isoproterenol. A adrenalina (secretada no 
exercício) facilita a indução dessas arritmias. 
Podem aparecer oscilações no potencial da membrana, seguindo um potencial de ação, capazes de 
dar origem a uma nova atividade elétrica e, deste modo, um impulso ao coração, denominadas pós-
despolarizações. São divididas em duas subcategorias: pós-despolarizações precoces, que 
precedem a recuperação completa da membrana e pós-despolarizações tardias, que surgem após 
ter-se encerrado a repolarizaçao celular. Como estas oscilações têm a capacidade de gerar impulsos, 
isolados ou múltiplos, são intrinsecamente arritmogênicas.As pós-despolarizações recebem o nome 
genérico de atividade deflagrada porque os potenciais de ação por elas gerados dependem da 
despolarização normal prévia, o gatilho. 
- Pós-despolarização precoce: ocorre antes da 
repolarização. Fenômeno reconhecido em laboratório, auto 
limitado, mecanismos iônicos pouco conhecidos. Os fatores 
que podem desencadear isso são distensão de fibras, 
hipóxia, adrenalina, drogas antiarrítmicas. 
A redução da FC pode causar aumento da duração do 
potencial de ação e facilitar a ocorrência dessa arritmia. O 
aumento da duração do potencial de ação pode levar ao 
surgimento de um novo potencial de ação e depois novos. 
Ex.: síndrome do QT longo adquirida e congênita. 
- Pós-despolarização tardia: ocorre depois da repolarização. Corrente iônica transitória ativada 
pela repolarização. Essa corrente transitória pode ser subliminar (baixa) mas podem deflagrar 
novos potenciais de ação e crescer. 
Essa ocorre em várias condições, principalmente com acumulo de cálcio no meio intracelular. A 
causa mais comum é intoxicação digitálica. Catecolaminas também podem desencadear essas 
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arritmias porque aumentam o cálcio intracelular. 
Clinicamente, no EEF (estudo eletrofisiológico) podem ser 
iniciadas com estimulação como aumento da FC, pois 
aumenta o influxo de cálcio. 
Ex.: extrassístoles ventriculares, taquicardias atriais e 
ventriculares catecolamino-dependentes, arritmias 
induzidas por intoxicação digitálica, arritmias causadas por 
reperfusão ou isquemia. 
Distúrbios na condução do impulso: 
• BLOQUEIO UNI/BIDIRECIONAL SEM REENTRADA 
O sinal não passa e não tem contração. Ex.: bloqueio sinoatrial, bloqueio atrioventricular, bloqueio 
de ramo. 
• REENTRADA 
É muito importante pois é o mecanismo mais frequente na gênese das 
arritmias cardíacas. A ativação do impulso nervoso pode persistir em uma 
região do coração, pelo tempo suficiente para que o tecido adjacente recupere 
a excitabilidade. Assim, o mesmo impulso volta a excitar o coração. 
As alterações podem ser anatômicas ou funcionais, levando a reentrada. Mas 
são necessárias condições para ocorrência de reentrada: necessário ter pelo 
menos 2 vias de condução distintas do estimulo (barreira anatômica ou 
funcional), são vias unidas proximalmente e distalmente. Além disso, deve ter 
boqueio de uma das vias. Essa condução da via útil tem que ser uma 
condução lenta. Essa condução lenta faz com que a outra via recupere a capacidade de condução e 
entra na outra e volta, fica dando voltas (reentrada). 
A reentrada pode ocorrer por barreira anatômica (como na síndrome de Wolf-Parkinson-White); ou 
pode ser funcional (fibrilação atrial), em que a própria revolução do impulso ativa constantemente 
a área central (refratária). 
Há uma variação ampla nos períodos refratários de diferentes células do nódulo atrioventricular, 
principalmente na junção atrio-nodal que, sob condições apropriadas, tornam-se importantes para 
a formação de uma via reentrante funcional 
Taquicardia regular de QRS 
estreito geralmente é por 
reentrada. Taquicardia 
ventricular é de QRS alargado. 
Comum em doenças estruturais. 
No WPW é uma via que une 
átrio e ventrículo numa via 
anômala. Nas taquicardias 
paroxísticas supraventriculares 
as duas vias estão no nó 
atrioventricular. 
O paciente pode ter 
extrassístoles lentas por 
recuperação lenta das células; 
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ou por isquemia; ou alterações no arcabouço, como fibrose, hipertrofia. Tudo isso deixa a condução 
lenta e permite reentradas. 
As características clinicas das arritmias reentrantes são geralmente arritmias estáveis, ou seja, 
costuma se manter na taquicardia, não passa sozinho. São induzidas por estimulação programada, 
estimulamos com frequência fixa e dá um batimento precoce que retarda a condução e propicia 
o início da reentrada. Também podemos usar técnicas como encarrilhamento para comprovar que é 
arritmia por reentrada. 
Mecanismos mistos de arritmias: 
- Automatismo anormal + reentrada: por ex, a fibrilação atrial focal, é iniciada por focos automáticos 
localizados nas veias pulmonares e mantida por múltiplas ondas de reentrada. 
- Pós-despolarização precoce + reentrada: por ex, a Torsades de Pointes (TdP), inicia por pós 
despolarização precoce, mas mantida por mecanismo de reentrada. 
As implicações clinicas da gente saber o mecanismo da arritmia é importante para o correto 
tratamento clinico. Se queremos mudar a refratariedade para impedir ocorrências de reentrada 
usamos antiarrítmicos; na TdP podemos aumentar a FC, porque assim encurta o potencial de ação 
e previne essa arritmia. 
Outro tratamento é o cirúrgico ou por ablação: em WPW, taquicardia atrial incisional, taquicardias 
ventriculares (isquêmica, chagásica). 
3. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DAS ARRITMIAS 
O quadro clinico das arritmias é bem variado, desde assintomáticos, palpitações, síncope, parada 
cardiorrespiratória. Coração estruturalmente normal, doença cardíaca estrutural (pós infarto, 
chagas) ou patologias associadas (hipertireoidismo). 
A arritmia pode ser um marcador de risco, não tratamos toda arritmia, as vezes só mostra que aquele 
paciente está em risco. Principalmente nos doentes estruturais. 
Na anamnese é importante verificar a queixa principal, duração (tempo de evolução ou duração do 
paroxismo), fatores desencadeantes (exercício, digestão, postura, situações), variações (dia noite, 
circadianas). 
Procurar antecedentes, como fatores de risco para coronariopatia, doença de chagas, história de 
cardiopatia isquêmica, cirurgias cardíacas previas (inclusive para correção de cardiopatias 
congênitas). 
No exame físico procuramos sinais de doença cardíaca, como edema, congestão pulmonar, 
hepatomegalia, sopros e medida da PA. Palpação dos pulsos e ausculta do ritmo do coração. A 
palpação não dá o diagnóstico, é importante o ECG quando identificamos uma arritmia no pulso. 
O ECG holter grava o eletro durante as 24hrs e é útil para verificar completamente a ocorrência de 
arritmias durante o dia. Existem aparelhos que gravam até durante uma semana para verificar 
arritmias menos comuns. Também tem monitores implantáveis, com duração de até 3 anos. 
Podemos fazer um estudo eletrofisiológico invasivo, colocamos cateteres intravenosos até o coração 
e estimulamos o coração para tentar provocar arritmias e diagnosticar. 
• TRATAMENTO 
O tratamento clinico farmacológico é feito com antiarrítmicos e tratamento de condições clinicas 
subjacentes, como HAS, ICC, cardiopatia isquêmica. 
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Antiarrítmicos: apesar do grande e rápido desenvolvimento de tratamentos não farmacológicos 
para arritmias, os fármacos antiarrítmicos tem ainda um papel muito importante na terapêutica. 
Importante conhecer as outras patologias associadas no paciente pois pode ter interação 
farmacológica. 
Os antiarrítmicos são classificados segundo a farmacodinâmica em 4 grupos: 
Grupo I: agem em canais rápidos de sódio; 
IA: prolongam também o potencial de ação; não tem mais no mercado (Quinidina). 
IB: prolongam pouco ou encurtam o potencial de ação. Lidocaína e Mexiletina. 
IC: não afetam a repolarização, mas deprimem a fase 0. Propafenona. 
Grupo II: bloqueadores dos receptores beta adrenérgicos (BRA); Propranolol, Atenolol. 
Grupo III: bloqueiam o canal de potássio ou facilitam a corrente lenta de sódio. 
Grupo IV: bloqueiam a corrente lenta de cálcio. Verapamil e Diltiazem. 
 
Essa classificação tem limitações, os fármacos podem ter mais de uma ação eletrofisiológica e não 
prediz eficácia. 
Interação medicamentosa: muito complicado nos antiarrítmicos pois pode até gerar novas 
arritmias. São em nível celular, mas existem interações relacionadas com absorção, distribuição, 
metabolismo e excreçãodo medicamento. 
O tratamento não farmacológico: implante de marcapasso, implante de CDI (cardioversor 
desfibrilador implantável - CDI) para prevenir morte súbita, ressincronização cardíaca (distúrbios de 
condução), tratamento cirúrgico, ablação com radiofrequência. 
O marcapasso está disponível desde 1950’s, é um gerador embaixo da pele e eletrodos até o 
coração. Na ablação é com cateter que vai até o coração, no local do problema, aplicamos uma onda 
de rádio que cauteriza essa via acessória e normaliza o eletro.

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