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Geografia Urbana Redes urbanas Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Dra. Vivian Fiori Revisão Textual: Prof. Ms. Luciano Vieira Francisco 5 Redes urbanas · Introdução · Teorias sobre redes urbanas e outros conceitos inerentes à urbanização · Redes e hierarquia urbana no Brasil · Cidades médias, regiões metropolitanas e Ride · Discutir a questão da formação de redes urbanas e dos sistemas de hierarquias urbanas. · Evidenciar os processos da formação das metrópoles e das regiões metropolitanas do Brasil. Como na Unidade anterior, a leitura do texto teórico e o desenvolvimento das atividades são fundamentais para o acompanhamento do conteúdo a ser desenvolvido. Para que os exemplos e discussões teóricas fiquem mais claros, conhecer os materiais complementares auxilia na compreensão dos conceitos básicos que serão desenvolvidos sobre hierarquias e redes urbanas. É essencial conhecer os processos e conceitos inerentes à formação de redes urbanas e de outros processos de urbanização no Brasil. Desse modo, leia atentamente o texto, os dados e procure observar as diferentes concepções sobre redes urbanas e as diversas formas existentes no Brasil. 6 Unidade: Redes urbanas Contextualização Conforme se observa no quadro abaixo, de população total e urbana do Brasil desde censos de 1940 até 2010, a população brasileira foi crescendo, mas em ritmos menores, principalmente entre 1991 e 2010. Já a população urbana e o índice de urbanização também foram se ampliando, alcançando 84% em 2010. Significa que hoje a maior parte da população brasileira vive em áreas urbanas. Cabe ressaltar que algumas dessas áreas, do ponto de vista da existência real, não são tão urbanas assim, principalmente no caso das sedes de municípios cuja população é contada como urbana, embora comumente tenham atividades mais relacionadas ao campo. Ano do censo População total População urbana Índice de urbanização Índice de crescimento populacional 1940 41.326.000 10.891.000 26,35 % 33,46 % 1950 51.944.000 18.783.000 36,16 % 25,7 % 1960 70.191.000 32.004.817 45,52 % 35,13 % 1970 93.139.000 52.904.744 56,80 % 32,69 % 1980 119.099.000 82.013.375 68,86 % 27,87 % 1991 150.400.000 110.875.826 73,80 % 26,28 % 2000 169.799.170 137.755.550 81,0% 15,6 % 2010 190.732.694 160.925.792 84,0 % 12,3 % De qualquer modo, o Brasil urbanizou-se, formando cada vez mais redes urbanas de diferentes tipos. Há aquelas formais, como as regiões metropolitanas, mas também diferentes situações dessas cidades quando comparadas em seu nível dentro da hierarquia urbana. Destacam-se entre essas as metrópoles por concentrarem cada vez mais um conjunto de atividades comerciais e de serviços especializados. Mas o que é metrópole? O que é megalópole? O que são regiões metropolitanas? Leia o material teórico para compreender os conceitos existentes para esses termos da Geografia urbana. 7 Introdução Esta Unidade apresenta teorias e reflexões sobre redes urbanas, bem como de outras categorias relacionadas ao processo de urbanização. Por fim, traz à tona a discussão sobre os processos de hierarquia e redes urbanas no território brasileiro. Teorias sobre redes urbanas e outros conceitos inerentes à urbanização No início do século XX alguns geógrafos e urbanistas passaram a refletir um pouco mais sobre a questão da formação de redes e hierarquização urbanas. Embora tais temas já tivessem sido estudados no passado, tornavam-se mais comuns a partir da década de 1930. Por redes urbanas entende-se um conjunto de cidades que mantêm relação entre si e que, em geral, possuem diferentes níveis de hierarquia. No caso do conhecimento geográfico, isso tem relação com as novas propostas de Geografia da época, primeiramente, a chamada Geografia de diferenciação de áreas e depois, principalmente pós- 1950 e 1960, com a Geografia pragmática, mediante a perspectiva denominada teórico-quantitativa. Um dos autores conhecidos sobre estudos de hierarquia urbana é Walter Christaller, geógrafo alemão, que em 1933 elaborou a teoria dos lugares centrais. Essa teoria trata da questão da hierarquia urbana, conforme nos explica Roberto Lobato Corrêa (1990, p. 21): Localidades centrais: dotadas de funções centrais, isto é, atividades de distribuição de bens e serviços para uma população externa, residente na região complementar (hinterlândia). A centralidade de um núcleo refere-se ao grau de importância a partir de suas funções centrais: maior a população externa atendida, maior número de funções, maior sua centralidade. Neste caso, a hinterlândia é a área de influência de uma cidade. Christaller define também outros conceitos: » Alcance espacial máximo (raio a partir da localidade central) e sua região complementar; » Alcance espacial mínimo engloba um número mínimo de consumidores que são necessários para a atividade comercial ou de serviços, uma função central, possa economicamente se instalar. Estabelece-se uma hierarquização de ofertas de bens e serviços, ou seja, para Christaller as localidades com maior nível de centralidade são aquelas que têm o maior número de atividades comerciais ou de serviços instalados e que, ao mesmo tempo, atendem a uma população externa à própria cidade, ou seja, a sua hinterlândia. Na teoria de Christaller, portanto, existe uma hierarquia urbana, cuja principal localidade é a chamada metrópole. No caso da metrópole oferece-se um maior número de atividades de 8 Unidade: Redes urbanas bens e serviços, ou seja, uma maior concentração de atividades ligadas a bens e serviços, caso, por exemplo, de serviços de saúde, educação, mas também serviços especializados. Depois da metrópole, seguindo a hierarquização urbana proposta pelo autor, há a capital regional, o centro sub-regional, o centro da zona e o centro local. Outra proposta recente baseada na teoria de Christaller, elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2007, denomina-se de Regiões de Influência das Cidades (Regic). Pela proposta do IBGE, utiliza-se também a hierarquia urbana no Brasil a partir de cálculos matemáticos, em uma proposta pragmática, na qual se quantificam as atividades de serviço, de gestão no território, bem como as atividades comerciais. Desse modo, mediante cálculos e fórmulas matemáticas, estabelecem-se as hierarquias, conforme se pode observar no mapa (Figura 1). No ápice dessa hierarquia estão as metrópoles, que no caso da proposta das Regic são divididas em grande metrópole nacional, com apenas São Paulo; metrópole nacional, as cidades do Rio de Janeiro e Brasília e, por fim, a metrópole, que seria Manaus, Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Recife, Curitiba, Goiânia e Porto Alegre. Após esse primeiro nível de hierarquia há a capital regional e assim sucessivamente, centro sub- regional e centro de zona. Observa-se no mapa que há metrópole, capital regional, centro sub-regional e centro da zona. Significa que cada uma dessas categorias tem uma quantidade e nível de centralidade de serviços ligados à gestão do território, aos negócios, às atividades comerciais, aos serviços de saúde e aos serviços especializados, entre outras atividades. Apesar da abordagem feita pelo IBGE ser relevante para estudos urbanos no Brasil, há críticas à metodologia proposta por Christaller, bem como – e também – a proposta pelo IBGE. Figura 1 – Parte Centro-Sul do Brasil – regiões de influência das cidades, Regic 2007. Fonte: IBGE (2008). 9 Um dos autores que critica essa proposta é Milton Santos (2008, p. 5), ao afirmar que: Houve tempo em que se podia tratar a rede urbana como uma entidade onde as cidades se relacionavam segundo uma hierarquia de tamanhos e funções. Este tempo passou. Hoje, cada cidade é diferente da outra, não importa o seu tamanho, pois entre as metrópoles também há diferenças. A crítica de Milton Santos diz respeito ao fato de que hoje, com o processo de expansão capitalista, bem como no atual momentoda globalização, o tamanho da cidade e sua função transcendem as características que são importantes para o entendimento do atual processo de urbanização no mundo e suas relações com outras cidades. Sobre a hierarquia dos centros urbanos, conforme as Regic (IBGE, 2008), as cidades foram classificadas em cinco grandes níveis, a saber: • Metrópoles – são os 12 principais centros urbanos do País, que caracterizam-se por seu grande porte e por fortes relacionamentos entre si, além de, em geral, possuírem extensa área de influência direta. O conjunto foi dividido em três subníveis, segundo a extensão territorial e a intensidade dessas relações: » Grande metrópole nacional – São Paulo, o maior conjunto urbano do País, com 19,5 milhões de habitantes, em 2007, e alocado no primeiro nível da gestão territorial; » Metrópole nacional – Rio de Janeiro e Brasília, com população de 11,8 milhões e 3,2 milhões em 2007, respectivamente, também estão no primeiro nível da gestão territorial. Juntamente com São Paulo, constituem foco para centros localizados em todo o País; e c. Metrópole – Manaus, Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Curitiba, Goiânia e Porto Alegre, com população variando de 1,6 (Manaus) a 5,1 milhões (Belo Horizonte), constituem o segundo nível da gestão territorial. Note- se que Manaus e Goiânia, embora estejam no terceiro nível da gestão territorial, têm porte e projeção nacional que lhes garantem a inclusão neste conjunto. • Capital regional – integram este nível 70 centros que, como as metrópoles, também se relacionam com o estrato superior da rede urbana. Com capacidade de gestão no nível imediatamente inferior ao das metrópoles, têm área de influência de âmbito regional, sendo referidas como destino, para um conjunto de atividades, por grande número de municípios. Como o anterior, este nível também tem três subdivisões. O primeiro grupo inclui as capitais estaduais não classificadas no nível metropolitano e Campinas. O segundo e o terceiro, além da diferenciação de porte, têm padrão de localização regionalizado, com o segundo mais presente no Centro-Sul, e o terceiro nas demais regiões do País; • Centro sub-regional – integram este nível 169 centros com atividades de gestão menos complexas, dominantemente entre os níveis 4 e 5 da gestão territorial; têm área de atuação mais reduzida, e seus relacionamentos com centros externos à sua própria rede dão-se, em geral, apenas com as três metrópoles nacionais. Com presença mais adensada nas áreas de maior ocupação do Nordeste e do Centro-Sul, e mais esparsa nos espaços menos densamente povoados das Regiões Norte e Centro-Oeste, estão também subdivididos em grupos [...]; • Centro de zona – nível formado por 556 cidades de menor porte e com atuação restrita à sua área imediata; exercem funções de gestão elementares. 10 Unidade: Redes urbanas Como afirma o autor, podemos ter duas cidades, como é o caso de São Paulo e o Rio de Janeiro, com praticamente o mesmo tamanho e função, no entanto, ambas são totalmente diferentes. Logo, para entender a urbanização, não basta fazer apenas a classificação de hierarquia nos moldes tratados pelo IBGE, embora tal proposta seja interessante para verificarmos o nível de centralidade considerando-se a questão de serviços e gestão do território. Na teoria dos lugares centrais, a metrópole é aquela cidade que possui o maior nível de hierarquia urbana, ou seja, a cidade importante do ponto de vista da produção de serviços e atividades comerciais. Desse modo, não importa tão somente a quantidade de população. Por outro lado, ao definir que a cidade mais importante de uma hierarquia urbana é a metrópole, pode-se passar a ideia de que estar na metrópole é ter acesso a tais atividades comerciais e bens e serviço. No entanto, nas metrópoles brasileiras, encontram-se as maiores desigualdades espaciais no Brasil. Portanto, estar em uma metrópole nem sempre possibilita o acesso a todos os seus cidadãos a esses serviços existentes. Assim, é importante, para além de que se faça comparações entre cidades, ou seja, evidenciar as relações interurbanas, também sejam observadas as condições intraurbanas, em outras palavras, dentro da mesma cidade. As hierarquias urbanas no mundo atual são mais complexas que no passado, e sua hinterlândia já não se estabelece no binômio local-regional apenas, assim como não se dá somente em um nível estadual entre municípios da capital e do interior. Com o processo de globalização comumente uma cidade pode não ter relação econômica direta com as cidades vizinhas, mas estar inserida em uma lógica global. Outro conceito que deriva desses estudos urbanos é o de megalópole. Considera-se megalópole um espaço contínuo de urbanização, delimitado por algumas cidades polos, que em geral são metrópoles. É importante reiterar a diferença entre metrópole e megalópole. A metrópole é uma cidade de intensa urbanização que, por conta do nível de centralidade em relação as suas atividades econômicas, serviços, atividades comerciais, ou mesmo administrativas, tem relevância e importância em relação às demais cidades. Já o conceito de megalópole possui relação com uma região de intensa urbanização, geralmente delimitada por metrópoles ou áreas com certo nível de polarização conurbadas ou em fase de conurbação, tal o seu grau de urbanização. Há exemplos de grandes megalópoles no mundo; caso, por exemplo, de Tóquio – Yokohama – Osaka. Aqui não é Tóquio e/ou Osaka que são megalópoles, mas todo o espaço urbano dessas e entre as duas cidades. Do mesmo modo, a geógrafa Sandra Lencioni (2003) propõe dizer que no atual momento de urbanização do Estado de São Paulo, há uma megalópole em formação, composta pela região metropolitana de Campinas (o trajeto de São Paulo à Campinas, formando um contínuo urbano); de São Paulo ao Vale do Paraíba, principalmente ao longo da rodovia Presidente Dutra, formado pelas cidades de Jacareí, São José dos Campos, Taubaté, Pindamonhangaba e Guaratinguetá, municípios esses atualmente pertencentes à região metropolitana do Vale do Paraíba e litoral Norte, assim como de São Paulo à região metropolitana da baixada santista e 11 região metropolitana de Sorocaba. Essa região entre São Paulo, Sorocaba, Campinas, baixada santista e Vale do Paraíba seria a megalópole em formação. Região que está se conurbando e formando um contínuo de urbanização, a qual se denomina megalópole. Na Figura 2 observa- se um espaço contínuo de urbanização de uma megalópole brasileira em formação. Figura 2 – Megalópole brasileira em formação. Fonte: Adaptado de IBGE (2008). Mas o que é conurbação? Conurbação é aquele processo urbano no qual as cidades vão se urbanizando, dotando-se de infraestrutura urbana e vão se integrando a um ponto de não distinguirmos na paisagem onde começa uma e termina a outra. Um exemplo comum no Brasil é a conurbação existente entre a cidade de São Paulo e Guarulhos, Santo André, São Caetano, São Bernardo, ou seja, juntas essas formam áreas conurbadas. Outra questão importante a salientar é a diferença entre metrópole e região metropolitana. Quando afirmamos que São Paulo é uma metrópole nacional, partimos do princípio de que São Paulo é uma grande centralidade em termos de atividade de serviços, de gestão de negócios, de serviços especializados, entre outros e que diversas cidades no Brasil se utilizam dos serviços de São Paulo, por isso essa é uma metrópole. Contudo, isso não significa a mesma coisa que região metropolitana. As Regiões Metropolitanas (RM) são unidades territoriais formais, que foram criadas legalmente em 1973 pelo governo militar de Médici, à época com nove regiões: Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre. Figura 3 – Região metropolitana de São Paulo. Fonte: daee.sp.gov.br 12 Unidade: Redes urbanas Posteriormente à Constituição de 1988, delegou-se aos Estados a possibilidade de criaçãodas RM, o que ampliou significativamente seu número e características. Observe na Figura 3 a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), cuja metrópole é a cidade de São Paulo. A RMSP é formada por 39 municípios, inclusive alguns com menor nível de urbanização, como é o caso dos municípios de Salesópolis e Santa Isabel, cujos territórios são principalmente rurais. Portanto, nem sempre a região metropolitana é constituída por uma área intensamente urbanizada de todos os municípios membros. Outro conceito desenvolvido pela geógrafa Sandra Lencioni (2003) diz respeito ao sentido de “metropolização do espaço”. Segundo a autora, esse processo está em andamento no Estado de São Paulo e, portanto, dentro desse processo atual de globalização não cabe mais pensarmos o Estado de São Paulo de forma regionalizada, já que suas regiões estão cada vez mais interligadas. Esse processo de metropolização do espaço imprime ao território características que até então eram características da região metropolitana. Essas características fazem com que não só as práticas sociais, mas, inclusive as identidades dos lugares fiquem sujeitas aos códigos metropolitanos. Assim, esses códigos, os avatares, os novos valores e signos da sociedade contemporânea (LENCIONI, 2003, p. 35). Na concepção da autora o Estado de São Paulo está passando por um processo de metropolização, no qual os fluxos de capitais, as atividades econômicas da indústria e atividades de serviço vão formando cada vez mais um contínuo urbano e é por isso que Lencioni sugere haver a formação de uma megalópole no Estado de São Paulo. 13 Redes e hierarquia urbana no Brasil No Brasil a formação de redes urbanas (conjunto de cidades interligadas) tornou-se mais comum após a década de 1960. Embora já houvesse anteriormente a esse período formação de redes urbanas, essas se intensificaram a partir do período do meio técnico-científico informacional. É importante lembrar que após 1960 o Brasil foi se interiorizando mais, bem como os processos de urbanização foram se tornando mais variados, tanto de urbanização das antigas regiões industrializadas, que foram se tornando espaços metropolitanos densamente povoados, quanto de novos territórios incorporados ao processo capitalista, principalmente do Centro- Oeste. Região ocasionada pela dinâmica econômica e pela existência das rodovias, que criaram uma rede de cidades interligadas pelo sistema rodoviário. Após 1991 as taxas de urbanização diminuíram, segundo o IBGE. No período entre 1991 e 2000 foi de 31,3%, de modo que intensificou-se a urbanização das cidades de porte médio em detrimento das grandes cidades e/ou das metrópoles. Essa situação já vinha ocorrendo desde 1980, o que leva alguns autores a denominarem o processo de desmetropolização ou involução da metrópole (SANTOS, 1994, 2008). Sobre esse papel das cidades de médio porte, Milton Santos (2008, p. 53) diz que: “Esse fenômeno de difusão do trabalho intelectual na rede urbana, alcançando não apenas as grandes cidades, mas também cidades médias e os centros locais, parece ser geral, isto é, em escala de todo o território”. De qualquer forma, há uma intensa urbanização no Brasil, mas essa se dá de maneira distinta. Primeiramente, as regiões mais densamente urbanizadas situam-se na região concentrada e essas nas últimas décadas passaram por um processo de novas funções e atividades, principalmente relacionadas ao setor de serviços e atividades comerciais. Foi o caso da cidade de São Paulo, citado por Sandra Lencioni (2003, p. 40-41): Na cidade de São Paulo o que vem ocorrendo é um processo de desindustrialização relativa que a faz desenvolver novas funções urbanas, notadamente a de serviços superiores, a faz se firmar, sobretudo, como um centro de negócios. Aí reside o coração e a alma de São Paulo com seus múltiplos centros de serviços avançados, de informação, de gestão, de coordenação e de controle do capital que conformam territórios globalizados, a exemplo das avenidas Paulista e Berrini. Os serviços agora funcionam como indústria; quer sejam serviços de informação, marketing ou propaganda. Tanto quanto os de auditoria contábil, de consultoria financeira, de seguros, de engenharia industrial, de tecnologia, de computação etc. Desse modo, transformam-se as relações de espaço e tempo nesses territórios globalizados, pois os espaços metropolitanos são a imagem e semelhança dos espaços da globalização e do meio técnico-científico-informacional, dado que esses possuem novos fluxos e funções urbanas, entre as quais os serviços de marketing, informação ou propaganda; auditoria contábil, de consultoria financeira, de tecnologia de ponta; atividades que envolvem concepção, inovação e criação; vantagens locacionais devido a maior densidade de vias que atendem principalmente aos atores hegemônicos etc. 14 Unidade: Redes urbanas Além de trabalho material, tais espaços possuem significativo trabalho imaterial. É o caso, por exemplo, das atividades ligadas ao circuito cultural, de lazer, de educação, de produção de conhecimento, de pesquisa de ponta, entre outras, apesar de nos processos homogeneizadores empreendidos pelo capitalismo e pela globalização da economia ainda persistem as diferenças sócio-espaciais nesses territórios globalizados (LENCIONI, 2003). Se de um lado há territórios globalizados, nessas mesmas cidades coexistem favelas, cortiços, atividades do circuito inferior, denominados por alguns de setor informal. Por isso, Milton Santos (1994, p. 151) diz que São Paulo torna-se uma metrópole incompleta, mas que ainda assim é a principal centralidade do Brasil. O autor assim afirma: “Agora São Paulo passa a ser essa área polar do Brasil, não mais propriamente pela importância de sua indústria, mas pelo fato de produzir, coletar, classificar informações, próprias e dos outros e distribuí-las e administrá-las de acordo com seus próprios interesses”. Dessa maneira, os espaços metropolitanos tornam-se territórios globalizados dentro da divisão internacional e territorial do trabalho, cujo papel é ser espaço de gestão de negócios, de terciário moderno (serviços, consultoria) etc. Alguns autores, como é o caso da socióloga Saskia Sassen, definem essas cidades, cujos territórios são globalizados, como cidades globais. Embora alguns autores e mesmo políticos brasileiros utilizem esse termo para São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, é importante ressaltar que apenas algumas porções dos territórios das metrópoles paulistana e carioca são efetivamente globais. Por outro lado, nessas metrópoles encontram-se também enormes problemas espaciais relacionados à questão de habitação, bem como de acesso aos usos do território às atividades de lazer, de comércio e de serviços de ponta, que geralmente atendem apenas a uma parcela das classes sociais existentes. Dessa forma, afirma-se que, embora São Paulo possa ser considerado um território globalizado, é, conforme afirma Milton Santos, uma metrópole incompleta e que teve uma urbanização crítica, considerando-se sua dimensão social e da apropriação das classes populares aos serviços da cidade. 15 Cidades médias, regiões metropolitanas e Ride Outro aspecto a ser considerado na urbanização brasileira diz respeito às cidades médias. Atualmente afirma-se que essas são as que têm o maior crescimento urbano e populacional no Brasil (IBGE, 2008). Mas o que são cidades médias? A definição do que é uma cidade média pode variar tanto conforme o autor quanto das definições formais do governo. Uma forma de definição de cidade média pode ser elaborada considerando-se o número de habitantes, ou seja, em geral as cidades entre cem a quinhentos mil habitantes podem ser denominadas de cidades médias. Porém, além do critério de número de habitantes, podemos também conceber cidade média como aquela cidade intermediária entre uma metrópole e uma cidade local ou de menor nível na hierarquia urbana. Logo, considera-se a cidade média, independentementedo número de habitantes, pois se essa possuir uma centralidade e importância do ponto de vista das atividades econômicas e de serviços poderá ser considerada também uma cidade média. Nesse caso, geralmente considera- se que essa cidade média não fará parte das RM. Baseando-se nessa concepção, mais atrelada aos aspectos da quantidade de população, Mayara Michella Araújo e outros autores definem assim a definem: a cidade média estaria numa faixa de população compreendida entre o limite mínimo de 100 mil e o máximo de 350 mil habitantes. De forma geral, nas últimas décadas, vêm sendo consideradas médias as cidades com tamanhos demográficos variando entre 100 mil e 500 mil habitantes. Acrescente-se que, em estudos sobre cidades médias (ou intermediárias) latino-americanas, muitas vezes se trabalha com populações superiores a esse corte. Em relação a esta questão, Amorim Filho e Rigotti (2002) verificaram que, nos países da América do Norte, Argentina e até mesmo Brasil, o patamar superior que define uma cidade média se situa em 500 mil habitantes, enquanto, no padrão europeu, esse limite oscila entre 50 mil e 300 mil habitantes (ARAÚJO et al., 2011, p. 63, grifo nosso). Assim, verifica-se que a definição pode variar mesmo em relação ao número de habitantes e conforme o país ou região do mundo. No Brasil, em geral, há a seguinte divisão: cidade pequena (em geral até cem mil habitantes), média (de cem a quinhentos mil habitantes) e grande (mais de quinhentos mil habitantes). No Brasil, contudo, uma cidade de cem mil habitantes na Amazônia tem um significado diferente de uma cidade com mesmo número de habitantes no Sudeste. Por isso, o ideal é não considerar exclusivamente o número de habitantes, mas também o nível de centralidade da cidade na região onde está inserida. Por isso, reconhece-se que o termo município de pequeno porte, referente aquele com até cem mil habitantes pode ser relativo, já que possui diferente valor conforme a localidade, por exemplo, um município na Amazônia e outro na região concentrada do Brasil em relação ao grau de importância que podem ter em suas regiões ou Estados e de suas conexões interurbanas. 16 Unidade: Redes urbanas Há também casos de capitais que podem ser classificadas como cidades médias, tanto pelo critério de número de habitantes, quanto pelo grau de importância que alcançam, sem, entretanto, serem metrópoles. É o caso da cidade de Macapá, no Amapá. Segundo a classificação das regiões de influência das cidades (IBGE, 2008), Macapá é uma capital regional; classificação que a coloca entre o nível hierárquico da metrópole e os centros sub-regionais. Já na conceituação de Márcio Amaral (2010) é uma cidade média, que tem influência maior exercida por Belém e Manaus. das políticas de desenvolvimento regional para a produção de cidades médias como Marabá, Santarém e Castanhal, deve-se destacar que na região existem cidades médias capitais, dentre elas, Macapá, Rio Branco, Boa Vista e Porto Velho, cuja gênese está relacionada à criação dos antigos Territórios Federais pela União, que para transformá-los em capitais administrativas fizeram nas mesmas uma série de investimentos em sua infra-estrutura e em sua dinamização econômica que acabaram, posteriormente, fazendo com que elas se constituíssem em cidades médias (AMARAL, 2010, p. 140). Como afirma o autor, essas capitais de antigos territórios federais, caso do Amapá (Macapá), do Acre (Rio Branco), de Rondônia (Porto Velho) e de Roraima (Boa Vista) possuem infraestruturas e serviços por serem capitais de seus Estados e, portanto, tornam-se centralidades em suas regiões, mas não alcançam a importância das metrópoles de Belém e Manaus, por isso são cidades médias e não metrópoles. Trindade Júnior e Pereira (2007) destacam algumas cidades médias da Amazônia, caso de Marabá (Sudeste do Pará), Santarém (baixo Amazonas e Sudoeste do Pará) e Castanhal (Nordeste do Pará), considerando-se os atributos dessas para serem consideradas cidades médias: Pela estrutura e diversidade de bens e serviços existem – maior organização na rede de saúde, com serviços mais especializados; maior diversidade de vagas e cursos em instituições de Nível Superior públicas ou privadas; diversificação de atividades culturais e de lazer –, tais cidades médias se constituem em pólos regionais para o atendimento de necessidades da população, tanto para aquelas residentes na própria cidade, como para aquelas de cidades próximas. Isso confere a elas o papel de subsidiárias para atendimento de necessidades de determinadas mesorregiões nas quais estão inseridas e com as quais se articulam diretamente (TRINDADE JR.; PEREIRA, 2007, p. 324). Outra questão a ser destacada refere-se às RM. Observe na Figura 4 as dez maiores RM em população no Brasil. A partir da Constituição Federal de 1988 houve a possibilidade de criação pelos Estados das regiões metropolitanas. Essa permissão levou a criação de regiões metropolitanas em áreas que sequer tinham uma metrópole ou cidades com maior integração espacial, o que do ponto de vista técnico e/ou teórico não teria cabimento. Contudo, como a definição é política, cabendo aos Estados essa criação, das antigas nove criadas em 1973 chegamos, em 2013, a 64 RM no Brasil, caso emblemático, por exemplo, de três novas no Estado de Roraima, ou seja, mais uma situação que nos leva a lembrar da diferença entre metrópole e região metropolitana. 17 Além disso, o governo federal criou por Decreto a Região Integrada de Desenvolvimento Econômico (RIDE). No Brasil, atualmente há duas RIDE, uma na região de Teresina (Piauí) e outra no Distrito Federal e entorno. No caso da RIDE do Distrito Federal e entorno é constituída pelo Distrito Federal, alguns municípios de Goiás e de Minas Gerais (Figura 5). Ocupa uma região aproximada de 55.434km². A ideia de constituir essa Ride foi a tentativa de criar uma possibilidade de gestão integrada entre esses municípios que, embora sejam de Estados diferentes e do Distrito Federal, compõem um contínuo urbano. Essa é a lógica, portanto, de uma gestão compartilhada, buscando pensar, de forma integrada, o processo de urbanização existente. Nem sempre isso acontece na prática, comumente a criação das RM ou das RIDE acaba ficando mais no plano formal, da Lei, do plano do que propriamente de ações conjuntas visando uma gestão e planejamento integrados, caso do projeto para as áreas de transporte, resíduos sólidos, abastecimento de água e esgoto, entre outras ações. Figura 4 – As dez maiores regiões metropolitanas do Brasil em população, 2010. Fonte: Elaborado por Vivian Fiori e Hesly Leandro Costa da Silva Nos municípios da RIDE Distrito Federal e entorno há significativa diferença em relação à quantidade de população, bem como ao Produto Interno Bruto (PIB) e PIB per capita – produção econômica dividida pelo número de habitantes. Há casos de municípios de pequeno porte, do ponto de vista populacional, que, no entanto, têm um alto PIB per capita. Há também casos de problemas sociais decorrentes da própria urbanização do Distrito Federal. 18 Unidade: Redes urbanas Figura 5 – Ride do Distrito Federal e entorno. Fonte: Adaptado de fflch.usp.br À medida que Brasília se urbanizou e os preços da terra foram se tornando mais caros, a tendência da população foi morar ao redor dessa localidade, inclusive em municípios do Estado de Goiás. Logo, a urbanização de Brasília tem relação também com seu entorno, levando, inclusive, alguns problemas ligados à questão social, à violência urbana e aos problemas de habitação para esses municípios vizinhos. Finalizando, verifica-se nesta Unidade que há diferentes concepções teórico-metodológicas sobre hierarquizações urbanas e, além disso, no Brasil formalmente criarem-se as entidades regionais denominadas de RM e mais recentemente Ride, ambas como tentativas de criar uma gestão integrada de territórios. 19 Material Complementar Para aprofundamento dostemas discutidos nesta Unidade tome contato com as seguintes referências: Leituras: BARRETO, Ilson Juliano. O surgimento de novas regiões metropolitanas no Brasil: uma discussão a respeito do caso de Sorocaba (SP). Espaço e Economia, v. 1, 2012. Disponível em: http://espacoeconomia.revues.org/374 COSTA, Marco Aurélio; TSUKUMO Isadora Tami Lemos (Org.). 40 anos de regiões metropolitanas no Brasil. Brasília, DF: Ipea, 2013. 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