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ARQUITETURA Betina Conte Cornetet Introdução a projetos de arquitetura e urbanismo Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Reconhecer as características dos diferentes acessos e da circu- lação. � Identificar os acessos e a circulação nos projetos de arquitetura e urbanismo. � Relacionar o uso adequado dos acessos e da circulação conforme a necessidade funcional do projeto. Introdução Na elaboração dos projetos de arquitetura e urbanismo, alguns crité- rios são seguidos, como circulação e acesso, por exemplo. A circula- ção é a função articuladora, organizadora e distributiva nos projetos de edificações ou no planejamento urbano. Por meio dela, chegamos aos acessos de uma edificação, de um estacionamento ou parque, de um ou vários ambientes. Neste texto, você vai conhecer as características da circulação quanto a escalas e dimensões: a circulação do interior de um prédio comercial (circulação interna) e a circulação nas vias em uma cidade (circulação externa). Características dos diferentes acessos e da circulação Além da qualidade estética e estrutural, é fundamental que os projetos sejam funcionais. Quando você pensar em um projeto de uma edificação, ou ainda no planejamento urbano de uma cidade, deve levar em consideração quais ele- mentos são mais importantes e como será a conexão entre eles, que podem ser U N I D A D E 4 espaços internos ou externos. Em diferentes escalas, o projeto deve sempre possibilitar que os usuários façam suas atividades sem que o espaço apresente barreiras ou os elementos impeçam o seu deslocamento. Para que os projetos possibilitem espaços com funcionalidade, eles devem ser baseados nas dimensões médias do corpo humano. Considerando os usu- ários como referência dimensional, eles poderão se movimentar através dos espaços com a finalidade de utilizá-los, e também terão qualidade e conforto no deslocamento de um ambiente para o outro. Antropometria é definida como a medição e estudo do tamanho e das proporções do corpo humano. Para mais informações a respeito de medidas básicas e dimen- sionamento de espaços e mobiliários, é necessário consultar bibliografia específica e verificar as normas vigentes no local do projeto. Consulte algumas referências nas leituras recomendadas. Arquitetura60 Figura 1. Dimensionamentos para a elaboração de projetos. Fonte: Associação Brasileira de Normas Técnicas (2015, p. 8-9). Dimensões em metros 61Introdução a projetos de arquitetura e urbanismo Além disso, você deve considerar o uso dos espaços e o fluxo de pes- soas que o projeto deve atender. Para projetos com pequeno fluxo de usuários (como pequenos edifícios comerciais e residências), o recomendado é usar as dimensões mínimas de duas pessoas passando pelas circulações. As cir- culações podem ser horizontais ou verticais. Dessa forma, é usual a medida mínima de 1,10 m em corredores, rampas e escadas de pequenas edificações. Para saber mais sobre dimensionamento de circulações externas, calçadas e vias, con- sulte o livro Infraestrutura Urbana (MASCARÓ, 2005). Acessos O acesso principal de um projeto pode ser considerado o elemento de pre- paração. Quando o usuário visualiza o acesso a distância, ele já compreende que, a partir daquele ponto, será possível penetrar no projeto. No livro Arqui- tetura: forma, espaço e ordem, Francis Ching (2013) apresenta uma forma bastante simples de classificar diferentes acessos: frontal, oblíquo e espiral. Veja exemplos desses diferentes tipos de acesso nas Figuras 2, 3 e 4. Figura 2. O acesso frontal é quando o usuário é levado diretamente, através de um percurso reto, até o plano de entrada. Assim, o foco visual passa a ser o próprio plano de entrada. Fonte: Ching (2013, p. 243). Arquitetura62 Figura 3. O acesso oblíquo prioriza o visual do edifício em perspectiva. Quando esse acesso ocorre perpendicularmente à edificação, é possível propor soluções de fachada que tornem mais visível o acesso. Fonte: Ching (2013, p. 243). Figura 4. O acesso espiral prolonga o percurso, enfatizando a forma do edifício, já que é possível a visualização de todo o seu perímetro. Fonte: Ching (2013, p. 243). 63Introdução a projetos de arquitetura e urbanismo O acesso é composto ainda do elemento de entrada que configura a pas- sagem do usuário através de um plano físico ou sugerido. Entre outras possi- bilidades morfológicas, esse elemento físico pode ser um portal, uma porta, um portão, uma reentrância. A entrada pode ocorrer também através da pas- sagem por um plano sugerido, como uma pequena mudança de nível ou a mar- cação de duas colunas, ou ainda através de projeções ou recuos de um plano. As soluções para os planos de entrada são muitas e dependem do efeito que se deseja em cada partido arquitetônico. Em relação às edificações, a sugestão é que essa passagem ocorra sempre de forma suave, resguardando a entrada. Isso evita uma passagem brusca de um espaço externo, público, descoberto, iluminado, para outro espaço in- terno, privado, protegido e fechado. Ainda que passagens bruscas possam ser desejadas para causar um efeito emocional e impactante, o mais usual é criar um espaço intermediário de preparação e passagem da área externa para a área interna. Observe os exemplos de acesso protegido na Figura 5. Figura 5. Áreas cobertas e abertas, sugerindo uma transição entre o plano exterior e o interior, através da adição de um elemento de proteção ou de uma reentrância no próprio volume. Fonte: Ching (2013, p. 251). Arquitetura64 Igreja de Santo André do Monte Quirino (San Andrea del Quirinale), Roma, Itália, 1670, Giovanni Bernini Nesta igreja, projeto de Bernini (CHING, 2013a, p. 260), você pode ver a adequação da escala de um edifício monumental, onde o acesso se reduz à escala do usuário. Como você pode observar na planta baixa, a transição do espaço externo e interno se dá através da mudança de plano no nível da rua, com uma pequena escada, e de uma pe- quena projeção na cobertura, criando um espaço protegido e adequado à escala humana. Outro parâmetro fundamental é a definição da localização da entrada na fa- chada do edifício. Essa localização deve ser definida tendo em mente a circulação externa para o acesso, e também a circulação interna que o fluxo de pessoas vindo do plano de acesso irá gerar no ambiente. Para definir a melhor solução, é preciso fazer uma análise ampla das circulações e das atividades internas. 65Introdução a projetos de arquitetura e urbanismo Para cada projeto, a escolha do tipo de acesso e a definição do plano de entrada fazem parte do partido arquitetônico definido pelo projetista. O partido é a proposta que será investigada pelo projetista, a fim de verificar se é viável a sua proposta de solução para atender às necessidades do usuário, do programa de necessidades e do terreno. Para saber mais sobre partido no projeto de arquitetura, consulte o livro Composição, Partido e Programa (CANEZ; SILVA, 2010). Circulações Todos os trajetos realizados de um ponto a outro podem ser considerados cir- culações. Quando se aborda a escala urbana, o desenho da circulação externa está diretamente ligado ao nosso meio de transporte. Ao nos deslocarmos de carro, devemos seguir as vias específicas para isso, seguindo determinações legais e fatores de mecânica do veículo. Quando realizamos o deslocamento caminhando, há uma liberdade maior de escolhas ao longo do percurso. A configuração dos percursos realizados pelos usuários, consequência dos trajetos realizados para acessar a sequência de espaços, é chamada de circulação interna. Em uma edificação, podemos ter circulações horizontais e verticais. Você vai ver aqui as circulações horizontais, que podem variar bastante de forma. Na Figura 6, você observa uma referência de Francis Ching para diferentes desenhos de circulações. Arquitetura66 Figura 6. Seis diferentes tipologias de circulação, segundo Francis Ching. Fonte:Ching (2013, p. 265). As dimensões destas circulações refletem a importância e o fluxo de pes- soas ou veículos que devem realizar o trajeto. Em diferentes escalas, podemos comparar vias principais e secundárias com percursos de circulações internas principais e secundárias dentro de uma edificação. O oposto também pode acontecer. Ao possibilitar um fluxo maior de usuários, os espaços de um de- terminado projeto passam a ser privilegiados. 1. Linear Todas as vias de circulação são lineares. Contudo, uma via reta pode ser o principal elemento organizador de uma série de espaços; mas a via também pode ser curvilínea ou segmentada, intersectar outras vias, ter ramificações ou formar um circuito fechado. 2. Radial Uma configuração radial é formada por vias que saem de um ponto comum, central, ou terminam nele. 3. Espiral Uma configuração espiral é uma única via, contínua, que se origina de um ponto central, desenvolve-se ao redor dele e aos poucos se afasta. 4. Grelha Uma configuração em grelha consiste em dois conjuntos de vias paralelas que se cruzam em inter- valos regulares e criam módulos de espaço quadrados ou retangulares. 5. Rede Uma configuração em rede consiste em vias que conectam pontos determinados no espaço. 6. Composta Na realidade, uma edificação normalmente emprega uma combinação dos padrões citados. Os pontos importantes em qualquer padrão são centros de atividade, entradas para os cômodos e saguões e núcleos de circulação vertical compostos de escadas, rampas e elevadores. Estes nós pontuam as vias de circulação através de uma edificação e criam oportunidades para parada, descanso e reorientação. A fim de evitar a criação de um labirinto desorientador, deve ser estabelecida uma ordem hierárquica entre as circulações e os nós de um prédio, por meio da diferenciação de escala, forma, comprimento e localização. 67Introdução a projetos de arquitetura e urbanismo No livro A Imagem da Cidade, Kevin Lynch (2008) sugere elementos de identificação das relações da cidade: vias, limites, bairros, cruzamentos e pontos marcantes. Esta também é uma forma interessante de analisar as relações que ocorrem através do mo- vimento dos usuários configurando um espaço. As relações entre a circulação e o espaço podem acontecer de diferentes maneiras e se alteram ao longo da história. O conceito de circulação como “corredor”, quando o usuário pode percorrer um trajeto linear, tendo outros espaços com a integridade preservada, é mais recente historicamente. Nas edificações clássicas e em programas mais tradicionais, era comum que fosse necessário atravessar espaços para transitar dentro de uma edifi- cação. Este tipo de circulação, muito comum em museus e galerias, cria áreas de circulação e repouso dentro dos ambientes. Ainda há a possibilidade de a circulação terminar em um espaço, dando grande visibilidade e importância para ele. Essa morfologia é comum em igrejas e templos. Veja os exemplos na Figura 7. Arquitetura68 Figura 7. Respectivamente, exemplos de circulações independentes, através dos ambien- tes, e com a terminação em um espaço especial. Fonte: Ching (2013, p. 278). Embora identifiquemos algumas morfologias recorrentes, não existem cir- culações mais ou menos adequadas a programas específicos. É possível ainda combinar os diferentes tipos de circulação citados, gerando ambientes mais complexos. 69Introdução a projetos de arquitetura e urbanismo Uso dos acessos e da circulação Ao projetarmos, temos que definir como distribuir os acessos e as circulações de modo a articular os diferentes espaços projetados. Para realizar escolhas que priorizem a funcionalidade dos projetos, é importante que você conheça os princípios de organização formal e morfológica de uma planta. Várias situ- ações podem definir a melhor forma de organizar as plantas baixas, definindo os elementos de projeto. No entanto, existem conceitos consagrados de prin- cípios ordenadores da arquitetura que nos auxiliam a definir as relações entre os espaços. São eles: eixo, simetria, hierarquia, referência e ritmo. Eixo e simetria Um dos princípios ordenadores de arquitetura que pode ser levado em con- sideração quando estamos distribuindo espaços de um projeto é a simetria. Esse arranjo pode ser completamente simétrico ou, o que é mais comum, par- cialmente simétrico. A simetria parcial atende às necessidades de uma planta mais complexa, que deve se adequar a um determinado terreno, com um pro- grama de necessidades específico e relacionando-se corretamente com as di- ferentes insolações. O conceito de simetria parte da existência de um eixo estabelecido por dois pontos. O rebatimento das formas e elementos de ambos os lados desse eixo garantem a simetria bilateral. O rebatimento pode ocorrer em mais de um eixo simultaneamente, de modo que as repetições ocorram mais de uma vez, como fatias de pizza. Neste caso, chamamos de simetria radial. Veja os exemplos na Figura 8. Arquitetura70 Figura 8. Dois exemplos de simetria: no primeiro projeto de Eladio Dieste, identificamos um eixo central e a simetria bilateral. No projeto de Frank Lloyd Wright, existem vários eixos de rebatimento, criando simetrias radiais. Fonte: Ching (2013, p. 352, 354). Metade da planta baixa do pavimento térreo Metade da planta baixa do mezanino Templo da Unidade, Oak Park, Illinois, Estados Unidos, 1905–7, Frank Lloyd Wright Igreja de Cristo, o Trabalhador, Atlântida, Uruguai, 1958–60, Eladio Dieste 71Introdução a projetos de arquitetura e urbanismo Hierarquia A hierarquia é um princípio fundamental. Ela ajuda o usuário a compreender o espaço de acordo com a importância de cada ambiente. A definição da importância de cada ambiente depende do programa determinado e deve se refletir nas decisões projetuais. O destaque necessário de um determinado espaço pode ser alcançado de diferentes maneiras, desde que se trate de uma exceção ao padrão em que se insere. Veja na Figura 9 os exemplos de dife- rentes composições, em que um ou mais elementos dominantes destacam-se visualmente por tamanho, formato ou posição. Em todos os exemplos, o destaque ocorre quando um elemento não segue o padrão. Fique atento, pois o excesso de elementos especiais pode acabar tendo o efeito inverso: criando uma confusão onde nada se destaca e não há hierarquia. Figura 9. Composições que destacam espaços por hierarquia de tamanho, formato e localização. Fonte: Ching (2013, p. 359). A hierarquia pelo tamanho A hierarquia pelo formato A hierarquia pela localização Arquitetura72 Referência Referência é o elemento que, através da sua regularidade, relaciona os de- mais elementos aleatórios de um projeto. Pode ser uma linha, um plano, um volume, um ambiente específico, etc. É fundamental que esse elemento de referência tenha dimensão e regularidade suficientes para cortar, englobar ou reunir todos os outros elementos por ele organizado. Veja os exemplos na Figura 10. Figura 10. Composições onde um elemento de referência (uma linha, uma malha, um pla- no, um volume, etc.) organiza demais elementos aleatórios. Fonte: Ching (2013, p. 367). 73Introdução a projetos de arquitetura e urbanismo Ritmo A repetição de elementos distribuídos em intervalos regulares é um recurso de organização de formas e espaços. Poderíamos apenas acompanhar este movi- mento visualmente, ou ainda percorrer esta sequência de espaços. Diferentes padrões de repetição, gerando diferentes ritmos, podem ser usados na organi- zação de estruturas, espaços, aberturas, e assim por diante. O ritmo pode ser es- tabelecido ao agruparmos elementos por proximidade ou porque identificamos características em comum. Veja na Figura 11 um exemplo de ritmo. Figura 11. Ritmo gerado pela repetição da modulação espacial das unidades habitacionais. Fonte: Ching (2013, p. 385). Planta Baixa do Pavimento Tipo, Unidade de Habitação de Marselha, França, 1946–52, Le Corbusier Arquitetura74 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMASTÉCNICAS. NBR 9050: acessibilidade a edifica- ções, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. São Paulo: ABNT, 2015. CANEZ, Anna Paula; SILVA, Cairo Albuquerque. Composição, partido e programa: uma revisão crítica de conceitos em mutação. Porto Alegre: UniRitter, 2010. CHING, Francis D. Arquitetura: forma, espaço e ordem. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013a. LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. Lisboa: Edições 70, 2008. MASCARÓ, Juan Luis. Infraestrutura urbana. Porto Alegre: L. Mascaró & J. Mascaró, 2005. Leituras recomendadas ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9077: saídas de emergência em edifícios. São Paulo: ABNT, 2001. CHING, Francis D.; ECKLER, James F. Introdução à arquitetura. Porto Alegre: Bookman, 2013. NEUFERT, Ernst. Arte de projetar em arquitetura: princípios, normas e prescrições sobre construção, instalações distribuição e programa de necessidades; dimensões de edifí- cios, locais e utensílios. 13. ed. São Paulo: G. Gili, 1998. PANERO, Julius; ZELNIK, Martin. Dimensionamento humano para espaços interiores. São Paulo: G. Gili, 2013. UNWIN, Simon. A análise da arquitetura. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013. 75Introdução a projetos de arquitetura e urbanismo Conteúdo:
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