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1 A ESCOLA CONTEMPORÂNEA E A VIOLÊNCIA ESCOLAR 1 SUMÁRIO 1 - Da escola tradicional á escola contemporânea: algumas considerações sobre a constituição do espaço escolar................................................................................. 04 1.1 - Escola tradicional: a sala de aula como o único espaço de aprendizagem..... 04 1.2 - Escola contemporânea: novas faces e espaços de interação e aprendizagem........................................................................................................... 07 2 - A crise da escola moderna e a transição para a escola contemporânea............ 09 3 - A escola e os avanços tecnológicos ................................................................... 11 4 - A formação de professores na contemporaneidade ........................................... 11 5 - A escola contemporânea e a violência escolar: .................................................. 12 5.1 - Desenvolvimento ............................................................................................. 15 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 29 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história, inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender a crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós- Graduação.Com isso foi criado a instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética.Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 1 - Da escola tradicional á escola contemporânea: algumas considerações sobre a constituição do espaço escolar Este material se propõe a pesquisar a reconstrução do olhar pedagógico acerca da importância dos espaços externos e internos do ambiente escolar no desenvolvimento da criança. Para tanto, esta pesquisa procura se orientar pelo seguinte problema: “Os espaços externos e internos do ambiente escolar são importantes para o desenvolvimento da criança?” Partindo desse problema, buscar-se-á aprofundar por que os professores durante a graduação aprendem que ensinar fazendo é a melhor maneira de compartilhar saberes e, na prática, por vezes, acabam reduzindo sua atuação pedagógica a uma sala de aula delimitada por paredes. Ainda, qual o significado da escola e dos seus múltiplos espaços para as crianças e seus professores e em quais circunstâncias os espaços externos estão sendo utilizados nas escolas, em face de importância dos mesmos para o desenvolvimento da criança? O propósito deste material é, portanto, aprimorar, verificar, analisar, investigar, observar e avaliar se as escolas pesquisadas em seu conjunto de espaços externos e internos percebem a influência destes ambientes no desenvolvimento da criança. Deste modo, apresentamos nesta pesquisa o propósito de investigar as relações e vivências em todos os espaços do ambiente escolar, na tentativa de mostrar o quanto eles podem influenciar no processo educativo da criança/aluno. Sua importância está na reflexão acerca da prática cotidiana nas escolas dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, destacando que educar uma criança vai muito além de livros, cadernos e do tradicional ambiente da sala de aula. 1.1 - Escola tradicional: a sala de aula como o único espaço de aprendizagem Geralmente quando falamos da escola, o nosso primeiro pensamento remete-nos a uma sala de aula, com carteiras e cadeiras enfileiradas. Essa ideia passa a ser introduzida em nossas concepções de uma forma tradicional, na qual, na maior parte do tempo o professor fala e os alunos o escutam. A visão de escola vai se transformando com o tempo, mas mesmo diante das inúmeras mudanças que vem ocorrendo neste ambiente, a mesma continua se caracterizando como um espaço de reprodução de conhecimentos, e não um lugar em que os conhecimentos, as aprendizagens e as experiências sejam uma construção dos próprios alunos com o “aprender fazendo”. Ou seja, nesse espaço dedicado ao “ensino”, nem sempre o diálogo, a interação e a aprendizagem estiveram “ligados” ao processo de educar. Ao longo da história, acabaram surgindo pequenas escolas, que tinham a função de “ensinar”. Sabe-se que essas apenas transmitiam os conhecimentos, ao invés de mediá-los através dos espaços. Sua educação era voltada para uma proposta não muito distante da nossa realidade, se comparado à educação que vem sendo oferecida em nossas escolas. São as chamadas “escolas tradicionais” nas quais 4 O professor acredita que ele, como adulto, já descobriu as “verdades” sobre o mundo, as pessoas, as ideias... e precisa em sua função de expectador e animador fazer com que o aluno descubra estes conhecimentos. O professor assume, assim, a condição de modelo e referência para seus alunos, que na categoria de aprendizes precisam imitar seu mestre para aprender (SCHMITZ, 2006, p. 78). Realmente, soa-nos um tanto estranho ouvir a expressão: “imitar seu mestre”. Sabemos que o processo de imitação faz parte do desenvolvimento infantil. Entretanto, reduzir à criança a uma educação “empobrecida”, que não tenha qualidade e objetivos, faz do aluno um simples indivíduo para ser “moldado”. O aluno é visto como uma folha em branco, “alguém que precisa ir à escola para começar a treinar e memorizar, para escrever seu livro da vida” (SCHMITZ, 2006, p. 80). O professor tradicional não abre espaços para questionamentos do conteúdo, dificultando ainda mais a aprendizagem do aluno, bem como da turma. Desse modo, as palavras são “jogadas” aos alunos que as “captam” de formas e significados tão diversos e muitas das dúvidas que surgem entre colegas, são levadas para casa sem um real entendimento. “A criança deve, portanto, aceitar as regras, entrar no jogo. Nesse jogo dar a resposta certa, no mais das vezes, confunde-se com dar qualquer resposta, desde que seja a que o professor quer...” (FREIRE, 1996, p. 54). Fazendo uma análise desta ilustração com o contexto tradicional do cotidiano escolar, constata-se que os alunos estão realmente em um jogo, o qual deve ser jogado conforme o “Manual do Professor”, que se prende fielmente a seu dizer. “Ainda existe a ideia de que o professor precisa estar lá na frente, falando aos alunos, e de que esse é o modo pelo qual se aprende” (JENSEN, 2013, p. 18). Cabe aos alunos reproduzir esse discurso sem poder trocar as palavras, mesmo o significado sendo o mesmo. Ou seja, a resposta deve ser “tal qual”, e não como foi entendida. As carteiras e cadeiras enfileiradas revelam uma educação tradicional, na qual, segundo Freire (1996), o bom aluno é...uma criança dócil, paciente, que sabe calar- se e escutar o que o professor fala. Figura 01: Visão de uma sala de aula tradicional. Fonte: (FREIRE, 1996, p. 48). 5 O autor nos remete a pensar na ideia de que, a educação está voltada ao cumprimento das regras ditadas, ou seja, o bom aluno permanece sentado numa carteira, escutando, sem ao menos poder dialogar sobre o assunto, mesmo que, porvezes, ele não encontre o sentido daquela ação. Assim, são muitas dessas salas que só mudam de número, professor, e alunos, pois as características costumam ser sempre iguais, bem como a metodologia da aula deve seguir um padrão, para que o professor não se “perca” em sua aula. Essa, aliás, é, uma concepção muito forte que não consegue ser desmistificada: o modelo de sala fixa, onde todos os dias a rotina se repete e o ambiente está sempre igual. E esse espaço que deveria ser de convívio é demarcado pelo silêncio exigido dos alunos frente a um professor falante. Se você cria um ambiente em que as crianças podem mover-se mais, explorar, procurar objetos e fazer atividades, elas automaticamente vão aprender, entender, construir. No entanto, se são colocadas naquela estrutura sem esperança, sentadinhas olhando o professor diante delas, que tipo de comportamento estará esperando? (JENSEN, 2013, p. 18). O fato é que tudo evolui: e, no ritmo em que a sociedade evoluiu a educação precisaria estar mais a frente, inovando e ampliando para cumprir a sua real função no século XXI: a educação inovadora que transforme os educandos e os educadores, tendo o desafio de construir e reconstruir conteúdos com metodologias que proporcionem aos alunos e aos professores um maior encantamento e envolvimento no processo de construção dos conhecimentos. Nessa perspectiva, questiona-se: Como construir uma educação de conhecimentos e aprendizagens que sejam significativas tanto para alunos como para professores? Como motivar os docentes para perceberem que a educação de hoje não está mais somente “presa” a um espaço de quatro paredes, com um quadro repleto de escritas? 6 Percebe-se, assim, que aos poucos a educação vem oferecendo novas possibilidades para que o aluno e o docente tenham uma melhor formação, uma vez que, nos dias atuais essa educação inovadora pode ser desenvolvida nos diversos espaços, proporcionando desafios e metodologias que visam um melhor comprometimento e conhecimento tanto para alunos como para professores. 1.2 - Escola contemporânea: novas faces e espaços de interação e aprendizagem “Para que serve uma sala de aula se não for capaz de nos transportar além da sala de aula?” (MORAIS, 2009, p. 15). A sala de aula da escola contemporânea é tão mais do que um ambiente delimitado por paredes, porta e janelas, onde estão dispostas inúmeras carteiras e cadeiras. Para, além disso, este é um espaço no qual se devem acolher diferenças, questionamentos, dúvidas e saberes. Ambiente esse que pode ser transformado com a necessidade existente e se for preciso criar cenários, histórias e espaços de interação e aprendizagem. Aliás, “qualquer atividade humana precisa de um espaço e de um tempo determinados. Assim acontece com o ensinar e o aprender; com a educação” (FRAGO; ESCOLANO, 2001, p. 61). E, nesta perspectiva, a escola transforma-se num lugar no qual é permitido ir além dos limites de uma apostila/livro conseguindo alcançar o diferente, pois as vivências normais e comuns são esquecidas num piscar de olhos, enquanto aquelas significativas serão lembradas e relembradas por décadas e décadas. Se a escola precisa ser um espaço para as crianças, há que se pensar na sua reorganização. Mas, por onde começar? Ou como questiona Morais, “então, qual o remédio” (2009, p. 17) pode ser indicado para a cura desse problema? Rojas (2013), segue afirmando que esta “cura” pode iniciar pela introdução das temáticas em brincadeiras, que façam os alunos serem quem eles são: “crianças”. É necessário superar a visão de que estas criaturas são “moldadas” de forma mecânica pelo mundo e a sociedade através das atividades, jogos, e programas que exploram o fascínio infantil, no intuito de transformá-la em “gente grande”. Para tanto, é preciso sair do tradicional modo de ensino e ir além: da postura rígida de um professor diante de alunos, apenas repassando conhecimento, para a reunião em rodas, brincadeiras, gincanas e outras formas de aprendizagem que passam a ter um contato mais afetuoso entre alunos e professores, para em conjunto aprender sobre a vida real (FREIRE, 1996). Nesta perspectiva, é que a porta e as janelas da sala se “abrem”, expandindo-se para o mundo externo, como pode ser visualizado na ilustração que segue: 7 Figura 02: A sala de aula muito além de um quadro “negro”. Fonte: https://projetoletrasearteshoracio2011.wordpress.com. Neste novo contexto, o pedagogo assume o desafio de orientar e participar, sem medo de se envolver, ou se preocupar com a opinião das outras pessoas. Ele sabe que é mais eficaz correr e brincar com as crianças, do que reuni-las em uma sala para “hipocritamente” acreditar que estão aprendendo na perspectiva do escrever e copiar. É, neste contexto, que o professor tem o desafio de compreender que ele não é sabedor do mundo, e está ali para orientar e aprender. Não cabe a ele dar o trajeto pronto, mas sim ensinar o aluno a juntar seus pés e mover-se, tal como este é desafiado na sociedade real. É preciso ter persistência, instigar o foco e descobrir a razão dos inúmeros porquês. Ou seja, já não basta o melhor aluno chegar ao pódio sozinho: é preciso trabalhar a cooperação, o trabalho em equipe, o diálogo, a persistência e a determinação para aquilo que se pretende alcançar. Desse modo, “é essencial à boa convivência em grupo para que a criança se construa um ser instrumentalizado para o bom convívio e para construir-se aprendiz” (PAROLIN, 2011, p. 11). Essa mudança de paradigma gera um convívio mais afetivo e faz as crianças interagirem, conhecendo e apreciando jeitos, manias, qualidades e defeitos. Isto faz- nos perceber, inclusive, que algumas são mais perfeccionistas em determinadas atividades e outras preferem apenas realizar a atividade proposta para prosseguir 8 brincando. Juntas vão conhecendo diversos modos e maneiras diversas de encarar uma situação. Aprendem também, a conviver com o (s) outro (s), respeitar suas diferenças e superar os conflitos. Percebe-se, portanto, que ao longo da sua história a escola, nem sempre desenvolve a arte do convívio e da apreciação de atitudes mais humanas e singelas. Para Moraes (2013), essa proposta educativa foca na exatidão e na definição de conceitos muito amplos, nos quais se esquece de que as crianças são verdadeiras cientistas, pois questiona o impalpável, o admirável, o imaginável, o mundo da criação. Pode se afirmar, portanto, que os espaços educativos da escola contemporânea vão muito além do apenas ensinar. Esse lugar de interação e aprendizagem se torna de grande relevância para o processo de construção de conhecimentos do aluno/criança, no qual o mesmo passa a se relacionar e cultivar saberes ao interagir com situações que contribuem para o seu desenvolvimento. 2 - A crise da escola moderna e a transição para a escola contemporânea Séculos se passaram desde a criação da escola como instituição responsável pela educação de crianças e jovens. No transcorrer desse tempo, ela tem sido objeto de estudos e teorizações por filósofos, sociólogos, historiadores, pedagogos e pensadores em geral (Costa, 2007). Os discursos provenientes desses estudos e teorizações atribuem à escola as mais variadas competências, responsabilidades e tarefas. O surgimento da escola, para Costa (2007), ocorreu por volta do século XV, incorporada ao conjunto de transformações sociais, econômicas e culturais que apontam a emergência do mundo moderno. Para o autor, a escola apresenta-se, desde então, como fundamental na constituição da modernidade: “Uma instituição sólida, com poucas mudanças através dos séculos, e uma poderosa maquinaria, ainda hoje, na formação, no disciplinamento e no processo civilizatório empreendido pelas sociedades modernas” (Costa, 2007, p. 54). Para dar conta daqueles indivíduosnos quais a escola não conseguiu produzir os efeitos civilizatórios desejados, de acordo com Veiga-Neto (2007), foram inventadas instituições como o manicômio, a prisão, o quartel. Cabe ressaltar que “[...] entre todas essas instituições, a escola é a mais geral, é aquela que se estende – ou a que deve se estender, é o que se espera a mais ampla e duradouramente a todos os indivíduos dessa sociedade que se quer civilizada” (Veiga-Neto, 2007, p. 99). Assim como Costa (2007), os autores Sibilia (2012) e Veiga-Neto (2007) também reconhecem a escola como uma maquinaria. Uma maquinaria, segundo Veiga-Neto (2007), capaz de plasmar as subjetividades dos indivíduos a partir de modos de viver socialmente o espaço e o tempo. Para o referido autor, muito antes de funcionar como um aparelho de ensinar conteúdos e de reprodução social, a escola moderna funcionou, e ainda funciona, como uma grande fábrica que produziu, e, ainda gera 9 novas formas de vida. Nesse contexto, em concordância com o autor, pode-se dizer que a escola operou como uma grande maquinaria incumbida de fabricar o sujeito moderno. Ao pensar o espaço e o tempo em que se forma o sujeito moderno, o autor apresenta a disciplinaridade como o elo entre a escola e a sociedade modernas. Ao utilizar o termo disciplinaridade, Veiga-Neto (2007) faz referência tanto à disciplina-corpo quanto à disciplina-saber. Para o autor, “[...] ambas estão implicadas num tipo de poder – o poder disciplinar – do qual depende a nossa “capacidade” de nos autogovernarmos mais e melhor” (Veiga-Neto, 2007, p. 101). Portanto, a escola, em sua origem, foi pensada e fundamentada, conforme Veiga- Neto (2007), em práticas disciplinares e, assim, foi de extrema importância para a criação e a manutenção de uma sociedade disciplinar. No entanto, observa-se que ela está em descompasso com a própria sociedade, uma vez que esta, ainda segundo o autor, está se tornando uma sociedade de controle, “[...] cuja ênfase parece recair cada vez menos no disciplinamento vertical (dos corpos e saberes) e cada vez mais no controle permanente, horizontal e minucioso (sobre os corpos)” (Veiga-Neto, 2007, p. 110). Veiga-Neto (2007) evidencia a conexão entre o que se passa na escola, suas práticas e as demais práticas sociais, de forma que refletir sobre as mudanças na esfera desta instituição pressupõe refletir sobre as mudanças na esfera da sociedade. Assim, o referido autor reitera a existência de um descompasso entre a escola e as mudanças espaciais e temporais, e é neste descompasso entre “[...] as práticas escolares e as rápidas modificações espaciais e temporais que estão acontecendo no mundo atual que está boa parte daquilo que se costuma denominar “crise da escola”” (Veiga-Neto, 2007, p. 102). O sentimento de que a escola está em crise é reforçado por se perceber que ela vai se tornando, de acordo com Sibilia (2012), incompatível com os corpos e as subjetividades das crianças e jovens do século XXI. A incompatibilidade está associada tanto no que se refere aos componentes quanto aos modos de funcionamento da escola. François Dubet (1997) igualmente acredita que existe um descompasso entre a escola e os alunos. Para exemplificar, pode-se pensar a questão do currículo e dos programas escolares que estão em voga. Para o autor, os programas são construídos para alunos que não existem. Ou seja, alunos surpreendentemente inteligentes, que possuem, no mínimo, pais professores de filosofia e de história. Nesse sentido, o autor reforça a necessidade de se repensar os programas escolares, a fim de evitar situações de fracasso escolar. A partir dessas reflexões acerca do descompasso e da incompatibilidade da escola em relação à sociedade e aos alunos, fazem-se oportunos os questionamentos: a escola do século XXI mudou? O que nela mudou? E as pessoas que a constituem mudaram? Para Jorge Ramos do Ó (2007), a escola mudou, não tanto quanto se almeja e na mesma agilidade das mudanças observadas na sociedade e nas pessoas que a foram constituindo ao longo do tempo. 10 Se analisada a questão do modelo estrutural e organizacional que se tem hoje de escola, constata-se, conforme Ó (2007), que esse modelo foi criado no final do século XIX. Ou seja, em termos de estrutura, a escola ainda se mantém segmentada em séries formadas por alunos com idades semelhantes. Os saberes, por sua vez, traduzidos nos conteúdos trabalhados em aula, respeitam essa correlação entre idade e série. No tocante à progressão dos alunos, depende dos resultados obtidos nas avaliações realizadas no transcorrer do ano letivo. Nota-se que as avaliações se aproximam muito do conteúdo ministrado e este, segundo o autor, é um conteúdo racionalista com vistas a: Construir através das disciplinas do plano de estudo uma visão racional e articulada da realidade, que tem dentro dela um modelo intelectual que consiste em imaginar que o mundo é um mundo completo. [...] É, portanto, um modelo racionalista, herdado das luzes, do Iluminismo (Ó, 2007, p. 110). Como apontado anteriormente, a sociedade mudou e, para Ó (2007), ela foi abandonando, principalmente nas últimas décadas, esse modelo racionalista. No entanto, a escola “tem refletido pouco sobre essa mudança; ela continua a funcionar a partir de ideias claras e distintas sobre o que é certo e errado” (Ó, 2007, p. 110). Além dessa mudança em relação ao modelo racionalista, outras transformações igualmente vêm ocorrendo e merecem ser refletidas pela escola, visto que implicam diretamente no papel da escola na contemporaneidade e apresentam-se, muitas vezes, como desafios. Os avanços tecnológicos e científicos, a reestruturação produtiva, as mudanças 11 no processo de trabalho e a intensificação dos meios de comunicação são exemplos de transformações (Libâneo, 2007). Para Moran (2012), entre os desafios enfrentados ao longo dos tempos, ensinar e aprender ainda são os maiores, especialmente agora em que se vive a transição para um modelo de gestão da informação e do conhecimento. Nessa perspectiva, questiona “como ensinar e aprender em uma sociedade mais interconectada?” (Moran, 2012, p. 11). Para tanto, se faz necessário refletir acerca da relação entre escola e os avanços tecnológicos. 3 - A escola e os avanços tecnológicos Quanto ao avanço tecnológico existe uma expectativa de que as tecnologias possibilitarão soluções rápidas para o ensino. No entanto, “se ensinar dependesse só de tecnologias, já teríamos achado as melhores soluções há muito tempo. Elas são importantes, mas não resolvem as questões de fundo” (Moran, 2012, p. 12). Para Masetto (2012), não se trata apenas da substituição do quadro-negro e o giz por slides construídos no Power Point, a utilização de um Datashow (Masetto, 2012) e a utilização de uma lousa digital. Sabe-se que os avanços tecnológicos já repercutem na maneira como os alunos se comunicam, relacionam-se com os outros e acessam as informações disponíveis na internet e nas redes sociais, por exemplo. Diante disso, verifica-se a necessidade de se repensar os processos de ensinar e de aprender. Para Moran (2012, p. 29), “ensinar e aprender exige hoje muito mais flexibilidade espaço-temporal, pessoal e de grupo, menos conteúdos fixos e processos mais abertos de pesquisa e de comunicação”. Para ele, “uma das dificuldades atuais é conciliar a extensão da informação, a variedade das fontes de acesso, com o aprofundamento da sua compreensão, em espaços menos rígidos, menos engessados” (Moran, 2012, p. 29). Em relação ao processo de ensinar, o autor aponta como um dos grandes desafios para o professor tornar a informação significativa para os alunos. Em outras palavras, torna-se necessário ensinar os alunos a selecionarem as informações verdadeiramente relevantes diante de tantas possibilidades, compreendendo-as de forma mais abrangentee profunda e assim torná-las parte do referencial dos alunos (Moran, 2012). No tocante à aprendizagem, segundo o mesmo autor, uma parte significativa da aprendizagem acontece quando se consegue integrar “[...] todas as tecnologias, as telemáticas, as audiovisuais, as textuais, as orais, musicais, lúdicas, corporais” (Moran, 2012, p. 32). Cada um dos meios citados apresenta diversas possibilidades, todavia cabe aprender a explorar cada um deles. 4 - A formação de professores na contemporaneidade Ao se explorar as questões relacionadas aos desafios da escola na contemporaneidade, a dimensão formação docente emerge significativamente. Nóvoa (s/d, texto digital) está convencido de que neste século XXI os professores 12 estão no centro das preocupações educativas. Ao escrever sobre a história da educação em relação às suas preocupações no decorrer das décadas do século XX, o autor destaca que os anos de 1970 foram determinados pela racionalização do ensino. Já os anos de 1980 foram marcados pelas reformas educativas, com atenção aos currículos. Os anos de 1990, por sua vez, foram centrados na organização, administração e gestão dos estabelecimentos de ensino. Já no século XXI, “parece ter voltado o tempo dos professores” (Nóvoa, s/d, texto digital). Para Ghedin (2009) existem atualmente quatro tendências que interferem na formação do professor na contemporaneidade, que são: o saber docente, a reflexão sobre a prática, a pesquisa no ensino e as competências da formação. Essas tendências “interferem no pensamento, no processo pedagógico e na formação dos professores” (Ghedin, 2009, p. 2). Em relação à formação do professor, o autor teoriza que ela deve ser fundamentada em cinco princípios. O primeiro princípio refere-se à dimensão ética, pois “O ser professor está imbuído de um conjunto de valores e de práticas que servem como inspiração, como referência, são formativas dos alunos” (Ghedin, 2009, p. 23). Aliado a uma prática ética, o professor possui um compromisso político, uma vez que “o ato pedagógico é também político” (Ghedin, 2009, p. 24). Como terceira dimensão, o autor cita a dimensão epistemológica, visto que o professor precisa dominar os conceitos da área de conhecimento em que atua. A outra dimensão relaciona-se à técnica, que se refere ao domínio dos procedimentos e métodos de ensino e de aprendizagem. Para o autor, o professor precisa perceber como conduzirá o processo de aprendizagem. Por fim, mas não menos importante, Ghedin (2009, p. 25) destaca a dimensão estética, já que “não somos feitos apenas por racionalidade, mas também por sonhos, carinhos, afetividade e emoções”. Nóvoa (s/d, texto digital) destaca, ainda em relação à formação dos professores, a necessidade de uma formação construída dentro da profissão. Esse autor vem reforçar a ideia de uma formação “baseada numa combinação complexa de contributos científicos, pedagógicos e técnicos, mas que tem como âncora os próprios professores, sobretudo os professores mais experientes e reconhecidos” (Nóvoa, s/d, texto digital). 5 - A escola contemporânea e a violência escolar: Todos os seres humanos têm direito a uma educação de acordo com suas necessidades, características e diferenças individuais, que encoraje seus talentos e que respeite sua integridade como pessoas. Uma educação inclusiva que abranja não somente aos alunos com deficiências, mas também aos alunos com Altas Habilidades / Superdotação (AH/SD) que se sobressaem “por ter duas características marcantes que são a rapidez de aprendizagem e a facilidade com que esses indivíduos se engajam na sua área de interesse” (VIRGOLIM, 2003, p.28). Segundo a Doutora em Educação, Marcília de Morais Dalosto, na sua tese “O aluno com Altas Habilidades/ 13 Superdotação e o Bullying: Manifestações, prevalência e impactos”, o indivíduo AH/SD é definido: [...] segundo a Resolução nº 4 do Conselho Nacional de Educação e da Câmara de Educação Básica do Ministério da Educação (art. 4º, inciso III), como “aquele que apresenta um potencial elevado e grande envolvimento com as áreas do conhecimento humano, isoladas ou combinadas ou seja: habilidades na área intelectual, de liderança, psicomotora, nas artes e na criatividade” (DE MORAIS, 2011, p.16). No intuito de contribuir para uma educação de qualidade em todo Brasil, e não somente em algumas escolas ou regiões, o objetivo do presente artigo é revisar o paradigma educativo cartesiano e sua prática nas salas de aula para analisar se o mesmo é um empecilho na detecção oportuna das AH/SD em alunos, levando-os assim a um envolvimento com a violência escolar. O paradigma cartesiano propôs a fragmentação do conhecimento em áreas específicas de cursos nas quais os professores explicam o conteúdo no quadro e a classe acompanha em silêncio, com o papel de expectadores passivos, para assimilar, memorizar e reproduzir esse conteúdo. Deste modo, a prática pedagógica é baseada em ações mecânicas e autoritárias que provocam que o aluno escute leia, decore e repita. Quando as escolas baseiam suas práticas educativas no paradigma cartesiano contribuem com o descompasso entre a obsolescência dos conteúdos escolares e as mudanças sociais. Transformações que vêm manifestando-se nos últimos anos e que precisam de uma educação inclusiva, voltada ao convívio da democracia, ao exercício da cidadania e ao surgimento do homem global com centros educativos que propiciem a criação do conhecimento. Mas infelizmente, a maioria das escolas ainda baseiam seus projetos políticos pedagógicos no paradigma cartesiano que inclui ideias, mitos e crenças que compartilhados pelos professores, criam cognições, atitudes e condutas que influem na sua prática educativa e no uso de conteúdos obsoletos. 14 Para analisar essas cognições compartilhadas pelos professores utilizaremos o conceito de Cognição Social, na perspectiva da Psicologia Social, que se refere a processos mediante os quais os sujeitos selecionam, interpretam e usam a informação para fazer julgamentos e tomar decisões. Deste modo, existe a possibilidade de que alguns professores ainda compartilhem crenças e atitudes que os levem a considerar a violência como um exagero, uma exceção ou como um fato isolado, a tal ponto, que essas crenças influam na sua inabilidade para identificar as condutas agressivas vivenciadas por eles no âmbito escolar. O tema da violência nas escolas é muito sério na atualidade; tem impacto na formação da personalidade das crianças; é um empecilho no desenvolvimento de alunos AH/SD; é um fenômeno de crescente relevância na educação atual brasileira; é um fato de importância para a segurança nas escolas; e é fator na etiologia das neuroses em adultos. De tal modo, uma análise deste tipo e posteriormente uma pesquisa que tente entender a gênese da violência nas salas de aula sob a perspectiva sócio- psicológica para sua prevenção, terão benefícios tanto para as crianças que sofrem e pratica a agressão, quanto para a sociedade em geral. Reconhecendo assim, que uma pessoa com saúde mental será uma pessoa que procure o bem-estar pessoal e social. Nesse aspecto o Brasil vem se comprometendo no desafio de melhorar sua educação quando: Em um país como o Brasil, onde o incentivo à melhoria da educação de seu povo se tornou um instrumento socializador e de desenvolvimento, onde grande parte das políticas sociais é voltada para a inclusão escolar, as escolas passaram a ser o espaço próprio e mais adequado para a construção coletiva e permanente das condições favoráveis para o pleno exercício da cidadania, pois grande parte das políticas sociais é voltada para a inclusão escolar, passando a escola a ser o espaço propício da construção coletiva e permanente para o exercício da cidadania (LÓPEZ NETO, 2005, p.170). Os alunos e alunas atingidos pela violência na escola tendema sofrer uma “série de consequências em detrimento de sua saúde mental, tais como ansiedade, depressão, medo a assistir à escola, nas relações sociais, ideias suicidas e até suicídios reais” (VARELA, 2009, p.4). Do mesmo modo, “as crianças e adolescentes que sofrem ou praticam bullying podem vir a necessitar de múltiplos serviços como os de saúde mental, justiça da infância e adolescência, educação especial e programas sociais” (LÓPEZ NETO, 2005, p.168), o que aumenta os custos orçamentários do Governo Federal para atingir a toda essa demanda. Desta forma, a pesquisa põe ênfase na prevenção do fenômeno da violência escolar, devido ao fato de que é sempre melhor prevenir as causas do que tentar compreender as consequências o que redundará num benefício para a sociedade. Estudos mostram que as pessoas que vivem a violência escolar têm dificuldades diante de situações de conflito, assim, “são pessoas carentes de ferramentas para a adequada gestão do conflito (autocontrole, capacidade de diálogo, capacidade de empatia), podem afrontá-lo com agressão ou violência” (SEVILLA, 2006, p.2), portanto, seria possível reduzir significativamente a incidência desses transtornos com uma adequada facilitação de ferramentas aos discentes. 15 O bullying pode ser entendido como um balizador para o nível de tolerância da sociedade com relação à violência. Portanto, enquanto a sociedade não estiver preparada para lidar com o bullying, serão mínimas as chances de reduzir as outras formas de comportamentos agressivos e destrutivos (LÓPEZ NETO, 2005, p.170). Verificou-se que os primeiros estudos sobre a violência escolar encetados na Europa Escandinava tinham o intuito de conhecer a sua incidência nas escolas elementares e secundárias. “Os dados obtidos na Noruega destacam que 15% dos alunos participavam em situações de agressão como vítimas ou agressores com certa regularidade, representando 7% aos agressores e 9% das vítimas” (PIÑERO, 2010, p.35). Estudos realizados em outros países (Grã-Bretanha, Portugal) mostram informações muito semelhantes que atingem até um 20.5% de agressores e um 24% de vítimas. No Brasil, a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência (ABRAPIA) desenvolveu o Programa de Redução do Comportamento Agressivo entre estudantes onde encontraram que dos cinco mil quinhentos alunos pesquisados de quinta a oitava série do Ensino Fundamental 40.5% admitiram estar diretamente envolvidos em atos de bullying, 60.2% afirmaram que o bullying ocorre mais frequentemente dentro das salas de aula, e entre os alunos autores de bullying, 51.8% disseram que não receberam nenhum tipo de orientação ou advertência quanto à incorreção de seus atos (LÓPEZ NETO, 2005, p.166). Portanto, devido à incidência de violência no Brasil, aos problemas para identificar alunos AH/SD, às consequências da não identificação desses alunos e a possível ligação entre bullying e AH/SD, foi elaborado este artigo com base numa pesquisa bibliográfica, exploratória e descritiva que inclui a Teoria das Múltiplas Inteligências de Howard Gardner e a Teoria dos Três anéis de Joseph Renzulli. O presente artigo está organizado da seguinte maneira: inicia com uma breve análise estimativa da quantidade de alunos AH/SD que existem na rede educativa brasileira, a problemática e as consequências da não identificação desses alunos. Posteriormente se abordará a matéria da violência nas escolas ou bullying e sua ligação com o paradigma educativo cartesiano. A seguir, ponderar-se-á sobre o descompasso entre obsolescência dos conteúdos escolares e as mudanças sociais que vêm manifestando-se nos últimos anos, a fim de apresentar o conceito de Cognição Social na perspectiva da Psicologia Social. No decorrer do texto serão apresentados exemplos em outros países, relacionados aos temas aqui referidos, que sedimentarão os conceitos propostos e possibilitarão uma visão mais global da problemática e de possíveis soluções. 5.1 - Desenvolvimento Configura-se na atualidade, em muitos países, a presença de alunos com AH/SD na rede escolar pública e privada, porém os alunos corretamente identificados como AH/SD ainda são poucos em comparação com as estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS): 16 A OMS indica em torno de 3,5 a 5% da população escolar como sendo de pessoas com referências de AH/SD, contudo existem estudos que advertem uma porcentagem maior, como o da Associação Brasileira para superdotados do Rio Grande do Sul (ABSD-RS), realizados no ano de 2001, no qual evidencia um índice de 7,78% de alunos AH/SD (NEGRINI, 2008, p.278). Há várias referências teóricas que sugerem porcentagens maiores quanto à expectativa da presença dos alunos AH/SD na rede educativa brasileira, “esta percentagem pode atingir de 15 a 30% da população quando são incluídos aspectos como: liderança, criatividade, competências psicomotoras e artísticas” (VIRGOLIM, 2007, p.58). A porcentagem de alunos AH/SD pode incrementar-se se consideramos a teoria do psicólogo Joseph Renzulli que se interessou por pessoas que haviam se destacado por suas realizações e contribuições criativas, e propôs a sua concepção de superdotação que engloba os seguintes temas: habilidades acima da média que é o aspecto que engloba habilidades gerais e habilidades específicas; envolvimento com a tarefa que se constitui no componente motivacional e representa a energia que o indivíduo canaliza para resolver um dado problema ou tarefa (inclui traços como perseverança, dedicação, esforço, autoconfiança e a crença na própria habilidade de desenvolver um importante trabalho); e criatividade. Nesse sentido, o artigo de Universia publicado na revista da Universidade Federal de Campina Grande esclarece o porquê dessa variação nas porcentagens de alunos AH/SD: Um levantamento feito pela OMS (Organização Mundial da Saúde) aponta que há oito milhões de superdotados no Brasil. Mas o indicador da organização utiliza apenas o Q.I. (Coeficiente de Inteligência) como medidor de altas habilidades. Quem entende do assunto e considera o teste ultrapassado, avalia que o número pode ser muito maior se considerarmos as inteligências múltiplas do psicólogo Howard Gardner para medir a capacidade de um indivíduo (BURGARDT, 2008, s/p). Assim sendo, a quantidade de alunos com AH/SD aumenta quando se toma em conta a Teoria das Múltiplas Inteligências do psicólogo Howard Gardner que define a inteligência como a “capacidade de resolver problemas ou de criar produtos que sejam valorizados dentro de um ou mais cenários culturais” (GARDNER, 1994, p.7). Gardner entendeu que o conceito da inteligência Q.I. não era suficiente para descrever a grande quantidade de habilidades cognitivas humanas, deste modo definiu diferentes tipos de inteligência: lógica-matemática, linguística, espacial, musical, corporal sinestésica, interpessoal, intrapessoal, naturalista e existencial. Assim, Howard Gardner afirma no seu livro “Estruturas da mente: a Teoria das Múltiplas Inteligências” que: [...] existem evidências persuasivas para a existência de diversas competências intelectuais humanas relativamente autônomas abreviadas daqui em diante como 'inteligências humanas'. Estas são as 'estruturas da mente' do meu título. A exata 17 natureza e extensão de cada 'estrutura' individual não é até o momento satisfatoriamente determinada, nem o número preciso de inteligências foi estabelecido. Parece-me, porém, estar cada vez mais difícil negar a convicção de que há pelo menos algumas inteligências, que estas são relativamente independentes umas das outras e que podem ser modeladas e combinadas numa multiplicidade de maneiras adaptativas por indivíduos e culturas. (GARDNER, 1994, p.7). O Censo escolar da Educação Básica 2012 informa a existência de 10.902 alunos com AH/SD em classes regulares(INEP BRASIL, 2014). Sabendo-se que, o total de alunos matriculados nas escolas brasileiras soma mais de 50 milhões, é curioso perceber que os alunos com AH/SD representam apenas 0,02% deste total. Portanto, partindo da hipótese mais conservadora no referente à estimativa total de alunos AH/SD na rede educacional brasileira e tomando em conta o total de alunos matriculados com o cálculo da OMS (3 a 5%), podemos deduzir que ainda faltam mais de dois milhões de alunos AH/SD a serem identificados nas escolas brasileiras. Deste modo, é importante analisar as consequências da falta de identificação desses alunos para entender essa discrepância de números. Com relação a esses dados, Virgolim menciona: Seja como for procedida à identificação dos alunos com altas habilidades, é de especial importância compreender que o fracasso em identificar corretamente e atender as necessidades especiais desta população pode colocar o aluno em risco de fracasso escolar e comprometer seriamente seu desenvolvimento sócio emocional, impedindo-o de realizar plenamente o seu potencial (VIRGOLIM, 2007, p.58). Diante da variabilidade de porcentagens na estimativa de alunos AH/SD na rede escolar brasileira e do número reduzido de identificações destes, em relação ao universo de alunos em idade escolar no Brasil, pode-se deparar com a existência dos seguintes empecilhos e dificuldades em reconhecer as AH/SD, tais como: a carência de conteúdos sobre o tema na formação de professores em cursos superiores de licenciaturas; a falta de formação continuada acerca das teorias em AH/SD para professores em atividades em sala de aula; em algumas ocasiões, a indiferença em aplicar o conhecimento sobre o tema em sala de aula e na falta de estrutura nas redes escolares. Tal como ocorre em muitas escolas particulares, que não investem na implementação de salas de Atendimento Educacional Especializado (AEE) com uma equipe multidisciplinar formada por: psicólogos, pedagogos, assistentes sociais e professores da educação especial capacitados no tema das AH/SD, e em algumas escolas da rede pública cujas salas são inadequadas tanto em infraestrutura e equipamentos quanto em carência de profissionais especializados no tema. Deixando com isso, de lado suas obrigações institucionais em relação às leis vigentes, conforme preceitua o artigo 1°, da Resolução N° 4, de 02 de Outubro de 2009 do Conselho Nacional de Educação (CNE) / Ministério da Educação (MEC): [...] os sistemas de ensino devem matricular os alunos com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades / superdotação nas classes comuns 18 do ensino regular e no atendimento educacional especializado (AEE), ofertado em salas de recursos multifuncionais ou em centros de atendimento especializado na rede pública (BRASIL, 2009, p.17). Além disso, alguns especialistas na educação brasileira mencionam que: É muito comum que desrespeitando todos os dispositivos legais federais vigentes, a escola transfira a sua responsabilidade pela identificação e atendimento educacional especializado AEE desses alunos para à saúde, exigindo um “laudo médico” ou um “parecer técnico” para garantir-lhes esse direito subjetivo e inalienável do aluno com necessidades educacionais especiais (PÉREZ, 2013, p.1). Ainda relacionado às dificuldades concernentes à identificação, pode se observar a existência de situações em que os alunos são ignorados ou erroneamente rotulados com transtornos globais do desenvolvimento. E por isso encaminhados para a área da saúde, atendimentos psicológicos ou psiquiátricos desnecessários. A dificuldade de identificar essas pessoas vem de longa data e está fundamentalmente atrelada à falta de informações e de formação dos professores que deveriam atender esses alunos na educação regular e em sala de recursos multifuncional e aos mitos e crenças populares que a sociedade foi criando para as Pessoas com Altas Habilidades / Superdotação (PAH/SD). Além dessa representação cultural equivocada que temos como sociedade, ainda existe um problema maior devido à frequente confusão das AH/SD com a precocidade, a prodigalidade, a genialidade ou o bom desempenho acadêmico e, em um nível ainda mais grave, devido à confusão com transtornos como os do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) e o Transtorno de Asperger, dentre os mais comuns (CONBRASD, 2013). Os alunos AH/SD apresentam características sócio emocionais, psicológicas e educativas diferenciadas de outros indivíduos. Assim, a ausência de identificação de crianças AH/SD repercute no seu futuro, conduzindo-os a ter um baixo desempenho escolar por não saberem como lidar com suas habilidades. Se o AH/SD não encontra um atendimento especializado e baseado nas suas necessidades: [...] dificilmente terá, em sala de aula, a profundidade e abrangência de informação que necessita nas matérias escolares que domina ou tem vontade de aprender [...] gera, em muitos casos, frustrações, dando origem a diversas dificuldades sociais e emocionais (VIRGOLIM, 2003, p.15). Tomando em conta os relatos comuns entre professores sobre o fracasso escolar e os problemas de desenvolvimento sócio emocional de alguns alunos, surge a pergunta: será que a violência escolar está relacionada com a não identificação e/ou a falta de reconhecimento dos potenciais dos alunos AH/SD? O sujeito AH/SD, por conta de suas características diferenciadas dos demais indivíduos, torna-se mais vulnerável à violência escolar pelo fato dos alunos alvos dessas agressões serem usualmente escolhidos pelas suas diferenças individuais. Aliás, o AH/SD pode apresentar certa dissincronia: uma disparidade entre o seu 19 desenvolvimento cognitivo e maturidade física ou emocional, o que será percebido pelos seus colegas como uma diferença que pode torna-los alvos preferenciais de violência. Um aspecto importante na violência escolar contra alunos AH/SD refere-se ao fato de existirem mitos com respeito ao conceito das AH/SD, tais como: a superdotação é sinônimo de genialidade; a criança superdotada necessariamente terá um bom rendimento na escola; o superdotado é um fenômeno muito raro, sendo poucas as crianças e jovens de nossas escolas que podem ser de fato considerados superdotados ou para alunos com AH/SD tudo é fácil e não precisam esforçar-se. [...] com base nas leituras sobre os mitos acerca das AH/SD, bem como a temática da Inclusão, questionei a possível relação entre os apelidos clássicos: NERDs, CDFs,“puxa-saco”, entre outros com o Bullying que vitimiza (sic) o aluno com AH/SD (OLIVEIRA, 2012, p.18). Mas, para entender como esses mitos repercutem na prática educativa inicialmente se analisará, em forma geral, o conceito de violência escolar, sua relevância atual e suas consequências. Posteriormente se considerará o paradigma cartesiano e sua prática existente em algumas escolas na atualidade e finalmente se aferirá em como esse paradigma influi na percepção dos principais atores educativos, sob a perspectiva da cognição social. A violência escolar ou bullying é um dos conceitos mais difundidos na atualidade pela mídia e é objeto de análise em diferentes âmbitos. Só entre os anos 1996 e 2012 pode-se conhecer tragédias como a de Moses Lake (Washington), onde dois estudantes e uma professora foram feridos, mantidos reféns durante dez minutos e mortos pelo aluno Barry Loukaitis de catorze anos em fevereiro de 1996; ou a de Littleton (Colorado) quando catorze estudantes e um professor foram mortos e vinte e três alunos foram feridos na escola Columbine, por Eric Harris e Dylan Klebold, no dia 20 de abril de 1999; e mais recentemente em Newtown (Connecticut) onde Adam Lanza, de 20 anos, assassinou vinte crianças e seis adultos num tiroteio na escola primária de Sandy Hook em 14 de dezembro de 2012. Poderíamos nomear múltiplas tragédias pelo mundoafora que variam em número de mortos, feridos e danos psicológicos para as vítimas e a sociedade em geral. No Brasil, tragédias como a vivida na Escola Municipal do Rio de Janeiro Tasso da Silveira no 7 de abril de 2011, ou mais recentemente a notícia de que a professora Rosileide Queiros de Oliveira da Escola Municipal Alcina Dantas Feijão em São Paulo foi baleada por um aluno de dez anos que depois cometeu suicídio, mostram a urgência de abordar o tema da violência escolar a partir de uma perspectiva abrangente e profunda, compreendendo a dinâmica inconsciente envolvida na sua gênese e a importância social do seu conteúdo, uma vez que, quando tragédias dessas proporções acontecem, todos são afetados: as pessoas que estão diretamente e indiretamente envolvidas na tragédia e a sociedade em geral. Desta forma, pode-se pontuar para violência escolar as seguintes características: é um conjunto de atitudes agressivas com vários tipos de manifestações; é de caráter intencional e repetitivo; é praticado por um ou vários agressores contra uma ou mais 20 vítimas que se encontram impossibilitadas de defender-se e reflete um desequilíbrio de poder. Este Fenômeno pode ser expresso de diversas maneiras, visto que o agressor se utiliza de muitos meios e diversas formas de atingir suas vítimas. Entre as principais formas de manifestação da agressão de um bully, destaquei as agressões físicas, verbais, morais, intelectuais, virtuais, psicológicas, materiais e sexuais (OLIVEIRA, 2012, p.61). Nesse sentido, e para fins desse artigo, consideraremos a violência escolar de tipo intelectual como a mais significativa para elucidar como o bullying pode estar relacionado com as AH/SD: O Bullying Intelectual pode estar caracterizado por ser aquele tipo de violência ocasionada por agressores que apelidam suas vítimas de NERDs e CDFs em função do desempenho acima da média da turma que a vítima apresenta, ou a apelidam de burra, ignorante, retardada, entre outros apelidos, por seu baixo rendimento em alguma disciplina escolar (OLIVEIRA, 2012, p.62). Com alicerces na ideia de que vítimas da violência escolar são escolhidas pelas suas diferenças individuais, o estudo “Perfil delniño superdotado en México”, realizado pelo Centro de atenção ao talento (Centro de Atención al Talento CEDAT), detectou que as crianças com Superdotação são as que mais sofrem o acosso escolar. De fato 82%, sofreram violência escolar nos seus entornos educativos. Tomando em conta a não identificação dos potenciais de alunos AH/SD e o crescimento da violência escolar se estabelece a premissa de que esses potenciais não identificados podem em várias situações serem canalizados para fins destrutivos: desde jovens envolvidos em crimes tecnológicos conhecidos como hackers, ou casos extremos de atiradores em escolas que possuíam um grau alto de inteligência, como exemplo Barry Loukaitis (tragédia de Moses Lake) que foi um estudante com honrarias, com um Q.I. de 116, tal como o Doutor Langman se refere a seguir: Um dos aspectos fascinantes dos atiradores em escolas é que geralmente são bons estudantes, Contrário ao que possam ser esperados, eles não são estudantes da faixa baixa do espectro académico. Os atiradores não são fracassos acadêmicos, eles são brilhantes, e inclusive superdotados. Dylan Klebold esteve vários anos num programa de crianças superdotadas. Michael Carneal” tinha um Q.I. na faixa superior. Eric Harris era um excelente estudante que participava ativamente na sala de aula e que recebia elogios constantes de seus professores (LANGMAN, 2009, p.1, grifo do autor). [...] formulei a hipótese de que a ausência de reconhecimento de potenciais poderia estar relacionada ao Fenômeno Bullying, pois muitos potenciais podem ser 21 Seguindo essa sucessão ideias, a mestre Miriam de Oliveira Maciel na sua dissertação de mestrado “Alunos com Altas Habilidades / Superdotação e o Fenômeno Bullying” menciona: A violência escolar é influenciada pela percepção do indivíduo à violência que o cerca (na mídia, nas ruas, no lar) e / ou no processo de aculturação sofrido pelas crianças (métodos didáticos, capacitação dos professores e conteúdos curriculares). Assim sendo, podem-se fazer as seguintes perguntas: Em que medida a violência escolar é um transtorno psicossocial? Será que a cognição dos professores, a banalização da violência, as falsas crenças sobre a adolescência e os mitos sobre as AH/SD influem na propagação de ações violentas? Será que a educação tradicional no paradigma cartesiano, comum em muitos universos escolares, tem influência na formação da violência na escola? Entendemos que a escola tem uma importância transcendental para melhorar nossa sociedade, sempre que sua metodologia, didática, conteúdos e paradigmas sejam compatíveis com as necessidades atuais, e dentre estas, pode-se incluir o atendimento a alunos AH/SD. Precisamos de centros educativos que acompanhem o desenvolvimento social, psicológico, cultural e tecnológico. Portanto é importante ter uma escola cujo paradigma seja atual. Infelizmente muitas de elas lidam com paradigmas anacrónicos, com estilos de ensino obsoletos e com professores pouco hábeis para lidar com as crescentes mudanças na sociedade e com alunos AH/SD. O paradigma que frequentemente orienta a educação brasileira é o conservador, baseado no proposto Newtoniano Cartesiano. O paradigma cartesiano, em termos gerais, acredita que os fenômenos físicos podem ser reduzidos em partes mais simples. Este conceito tem influído na educação, quando ela é estereotipada como uma fábrica: o aluno entra numa esteira de produção, é processado e resulta num produto final, sem observar a suas necessidades especificas. Sendo, portanto oposto à premissa da inclusão escolar, levando muitos professores a um pensamento dicotômico, onde inconscientemente veem os alunos com necessidades de atendimento especializado, incluindo os AH/SD, diferentes dos demais. Sem empreender suas especificidades como um enriquecimento para sua prática pedagógica e para as relações interpessoais de seus alunos. “No paradigma cartesiano para que um aluno adquira o conhecimento é preciso que se possa medir quantificar, dividir e repetir” (BEHRENS, 2005, p.21). Assim, propõe a fragmentação do conhecimento em áreas específicas de cursos, eles são divididos em disciplinas e estas em especialidades. O paradigma influi na ação docente e no modo de apresentação do conhecimento aos alunos, tornando a prática pedagógica baseada em ações mecânicas e autoritárias que promovam que o aluno escute, leia, decore e repita. Que de diferentes modos, se denomina metodologia. Em sua grande canalizados para grandes obras, bem como para fins destrutivos. Muitos traficantes e chefes de favelas possuem várias inteligências em destaque. No entanto, se utilizam delas para chefiar gangues e cometer a violência (OLIVEIRA, 2012, p.19). 22 maioria, os professores explicam o conteúdo no quadro e a classe acompanha em silêncio, no papel de expectadores passivos para assimilar, memorizar e reproduzir. “No pensamento cartesiano-newtoniano o professor é quem domina o conhecimento, deixando o aluno refém dele; tanto que o aluno é induzido a não ter criticidade alguma” (BERTOTTI, 2011, p.11568). O professor limita os alunos: Ao espaço reduzido de suas carteiras, imobilizados em seus movimentos, silenciados em suas falas, impedidos de pensar. Reduzidos em sua criatividade e em suas possibilidades de expressão, os alunos também ficam limitados na sociabilidade, presos à mente racional, impossibilitados de experimentar novos voos e de conquistar novos espaços (MORAIS, 1998, p.7). Nesse contexto o professor é o responsável pela transmissão do conhecimento usando métodos expositivos que posteriormente serão repetidos pelos alunos para responder asprovas e assim tirar boas notas. Assim, o aluno é condicionado, e por tanto se torna num estudante responsivo e acrítico. Existem diferentes metodologias que infelizmente se fundamentam em atividades que trazem de volta a reprodução do conhecimento, a memorização dos conteúdos, a valorização de aulas expositivas e os exercícios repetitivos. Mas, é possível que alguns professores ao utilizar a tecnologia pensem que estão oferecendo uma ação pedagógica inovadora, no entanto, simplesmente podem estar trocando o quadro de giz pelo computador. O importante não é que o professor use ou não a tecnologia, o relevante é que essa tecnologia seja o instrumento para influenciar a formação de alunos reflexivos, críticos e investigadores contínuos. Na atualidade, o que se observa é um descompasso da educação com o avanço paradigmático que a sociedade vem desenvolvendo, que pode ser observado na disjuntiva entre o que o aluno aprende na escola e o que dele se requer no mundo do trabalho. Muitas empresas reclamam que os alunos que chegam a trabalhar pela primeira vez, não possuem os conhecimentos básicos requeridos para o desenvolvimento de sua atividade laboral: A escola, de modo geral, prima pela competitividade entre os alunos, o que enfatiza a cultura da violência em seu espaço. Prima também, por métodos de ensino que estão, muitas vezes, dissociados da realidade que os alunos enfrentam na sociedade, o que torna os conteúdos escolares desinteressantes e inúteis, na concepção desses alunos (OLIVEIRA, 2012, p.121). Tomando um exemplo que mostre esse descompasso, entre o avanço da sociedade e os conteúdos escolares e que se assemelhe à realidade brasileira, pode-se citar o livro “El pais de uno: reflexiones para entender y cambiar a México” da doutora em política pela Universidade de Princeton, Dennise Dresser, quando se refere à educação no México: Vítimas de uma educação que não permite o México competir, falar e relacionar-se com o mundo. Vítimas de uma escola pública que cria cidadãos apáticos, treinados 23 para obedecer no lugar de atuar. Educados para memorizar em vez de questionar. Treinados para aceitar os problemas no lugar de perguntar-se como encontrar uma solução. Educados para ajoelhar-se diante da autoridade em vez de pedir-lhe resultados. E diante da catástrofe conhecida, o que mais surpreende é a complacência, a resignação, a justificação governamental e a tolerância social. (DRESSER, 2011, p.33-34). A doutora também menciona os resultados da prova Pisa: […] onde 56 por cento dos mexicanos avaliados pela prova PISA estão entre os níveis 0e 1, isto é, sem as habilidades mínimas para afrontar as demandas dum mundo globalizado e competitivo. Dados duma catástrofe; números que enfatizam aquilo que o escritor James Baldwin advertiu: os países não são destruídos pela maldade más pela fraqueza, pela preguiça. (DRESSER, 2011, p.34-35). E finalmente exemplifica a prática educativa que a maior parte das escolas no México oferecem aos alunos: […] milhões de crianças mexicanas copiando parágrafos, memorizando datas, acumulando ignorância na forma de dados inertes [...] aprendem todo sobre os heróis que construíram a pátria, mas não são educados para serem cidadãos ativos nela [...] México, o país que produz pessoas orgulhosamente nacionalistas, mas, educativamente atrasadas [...] o país que ensina a seus habitantes a lidar com um contexto que não existe mais [...] onde na escola pública aprendem pouco de ciência, mas aprendem muito de obediência; aprendem pouco de tecnologia, mas aprendem muito de simulação; aprendem pouco de álgebra, mas aprendem muito de resultados medíocres, negociações injustas e benefícios extralegais. México o país onde, na escola pública, não se trabalha o sentido crítico, a autonomia ética ou a mudança social, mas, se trabalha uma grande propensão à conformidade. (DRESSER, 2011, p.37). A Doutora Dennise Dresser aponta a um grave problema educativo no México que mostra a obsolescência do paradigma cartesiano na educação, o que também pode observar-se no Brasil e em outros países da América Latina. De tal modo, que reflete a necessidade de mudança de um paradigma por outro que possua uma visão holística, uma visão da totalidade, de conexão e de interdependência. Os países se encontram imbuídos num sistema global, por isso é preciso formar cidadãos que sejam competentes e que tenham as ferramentas para um mundo com esta característica. Urge repensar o papel da escola como geradora do saber num enfoque colaborativo e não simplesmente como um espaço físico, isolado e obsoleto. Todavia, mesmo sendo os professores cônscios dessa necessidade, o que faz com que só pouquíssimas escolas tenham mudado numa educação de visão global? Para responder a esta pergunta é imperioso beber na fonte da Psicologia Social e no 24 conceito denominado Cognição Social, o qual é um campo que investiga a forma como as pessoas compreendem-se mutuamente e a si mesmas. A cognição social pode ser entendida como o conhecimento acerca de qualquer “objeto humano”, seja indivíduo, si próprio, grupos, papéis ou instituições [...] são estruturas e processos mediante os quais os sujeitos selecionam, interpretam, recordam e usam a informação social para fazer julgamentos e tomar decisões (PEREIRA, 2014, p.197). Se analisamos esse conceito no campo dos paradigmas, poderíamos dizer que cada revolução cientifica ou paradigmática20 se apresenta com uma cognição social específica que, para efeitos desse artigo, denominaremos cognição paradigmática. Esta sugere um exercício de compartilhar enfoques e ideias, chegando inclusive à normalização de práticas preestabelecidas. Por conseguinte, implica que os professores podem possuir uma cognição que se enquadra ao paradigma vigente e que se transformam em valores, princípios éticos, estereótipos, prejuízos, crenças e mitos. Assim, ao estudar os mitos relacionados à AH/SD, estes “podem influenciar nas relações interpessoais, causando, muitas vezes, reações agressivas nas pessoas que não apresentam AH/SD” (OLIVEIRA, 2012, p.72). Além dessa normalização, outro fator que influi na cognição paradigmática é o conceito de necessidade social, isto é, as observações devem ser consistentes com as normas e costumes sociais. O ser humano tem a tendência de compartilhá-las para aderir-se ao ponto de vista coletivo o que se torna um empecilho para a prática profissional dos professores e para o aprendizado dos alunos. Isso pode ser exemplificado no campo da violência escolar em relação ao termo bullying, bem como, aos mitos relacionados aos alunos AH/SD. Pelo fato de ainda não existir um consenso do termo bullying, é importante analisar a cognição que tanto os professores como a sociedade têm sobre a violência escolar e assim mostrar a importância do conceito de cognição social que está sendo analisando: Durante séculos a cognição social da violência tem sido normalizada como uma ocorrência cotidiana, o que Nilia Viscardi, no informe sobre “Violência na escola: América Latina e caribe” (UNESCO) denomina de naturalização, que acontece em situações que se percebem como normais e que fazem parte do desenvolvimento das crianças: A naturalização do fenômeno pode constituir-se numa „saída ‟ao problema. Estigmatizando aos „alunos violentos‟ aos centros que sofrem essa problemática no lugar de mostra-la como resultado dum complexo conjunto de determinantes e problemáticas sociais (VISCARDI, 2003, p.199). A violência nas escolas vem sendo considerada como uma exceção ou como um fato isolado que só acontece em outros países ou regiões, mas os efeitos que provoca são tão sérios que obrigam às escolas, às famílias e à sociedade em geral a assumir 25 a responsabilidade ética para enfrentá-los e solucioná-los. Nesse sentido, quando a psicologiadesenvolve uma perspectiva de naturalização: Deixa de contribuir para leituras críticas da sociedade e para a construção de políticas adequadas para a juventude, responsabilizando, com sua leitura o próprio adolescente e seus pais pelas questões sociais que envolvem jovens, como a violência e o abuso de drogas (BAHÍA, 2007, p.66). Para muitos professores a violência escolar só ocorre quando é de tipo físico, consideram outras manifestações da violência como atitudes corriqueiras entre os estudantes, e acham que se exagera no tema. Assim, num estudo comparativo feito pela Universidade de Huelva, Espanha nos anos 2005 / 2007 mostra que: Os resultados apontam que a percentagem dos futuros professores que creem que se exagera ao falar do fenômeno da violência nas escolas aumentou a 15% e os futuros professores que consideram que é normal que ocorram esses atos acresceu a 12% (ALONSO, 2009, p.132). “A ideia prévia que se tem sobre qualquer situação ou circunstância dá lugar a certas crenças, e como consequência formam atitudes; por isso é importante conhecer a opinião que o professor tem sobre os alunos” (CABEZAS, 2006, p.3). Por exemplo, a ideia de que a agressão é uma fase normal no desenvolvimento das crianças e que as condutas agressivas ajudam a endurecer aos alunos prejudicam o entendimento do problema; aliás, as falsas crenças também têm relação ao gênero dos professores, enquanto “os homens tendem a enxergar o fenômeno como uma coisa normal e como consequências não atuam tão oportunamente como as professoras, que mostram maiores níveis de empatia em relação aos alunos” (CABEZAS, 2006, p.3). Deste modo, “a aparente aceitação dos adultos e a consequente sensação de impunidade favorecem a perpetuação do comportamento agressivo” (LÓPEZ NETO, 2005, p.166). Ideias, mitos e crenças que compartilhados pela sociedade e pelos professores, criam cognições, atitudes e condutas que influem na prática educativa. Se a realidade destes alunos nãose encaixa na cognição paradigmática, então essa realidade simplesmente será apagada, ignorada ou mal-entendida. Quase quarenta por cento das crianças superdotadas a nível intelectual não consegue finalizar o ensino médio por não se sentirem estimulados no sistema educativo atual, assegura MENSA, uma organização dirigida a pessoas com elevado coeficiente intelectual (EL PAIS, 2008). Desta forma, entende-se ser correto definir como violência paradigmática aquela que é feita pelas escolas e pelos professores aos alunos AH/SD (tanto por inabilidade na sua identificação quanto por desinteresse), quando baseiam suas ações educativas no paradigma cartesiano. Assim, a violência paradigmática: é um conjunto de omissões e atitudes agressivas que transgridem e violam os direitos dos alunos AH/SD, quando não respeitam suas diferenças e têm suas necessidades individuais ignoradas; segue uma cognição que alude ao exercício de compartilhar e normalizar ideias, enfoques e práticas de caráter intencional e repetitivo com base na metodologia usada na sala de aula; é praticada por um ou vários agressores contra 26 uma ou mais vítimas que se encontram impossibilitadas de defender-se e se configura como um desequilíbrio de poder entre escola e aluno. A doutora Virgolim, no artigo “A criança superdotada e a questão da diferença: um olhar sobre suas necessidades emocionais, sociais e cognitivas”, menciona: Às vezes, a falta de sincronicidade no desenvolvimento da criança superdotada não apenas se dá dentro da própria criança, mas pode ser observada em relação a seu ambiente externo [...] dissincronia externa [...] quando há uma falta de adequação entre as necessidades da criança e o currículo escolar, que na grande maioria das escolas brasileiras, não é diferenciado para atender essa população (VIRGOLIM, 2003, p.15). 27 A violência escolar pode ser influenciada: pelas cognições atreladas ao paradigma cartesiano; pelos mitos sobre as AH/SD; pelo desconhecimento de alguns professores sobre o tema; pela falta de adequação entre as necessidades do estudante e do currículo escolar; pela percepção inadequada que muitos docentes compartilham sobre as AH/SD e a violência escolar; e pelo desinteresse de alguns professores e redes de ensino. Por esse fato é imperativo sopesar o quantitativo de crianças AH/SD que atualmente vivenciam violência física, psicológica, intelectual, sexual ou inclusive cibernética. Desta forma devem-se analisar as estatísticas da violência com mais rigor científico, desprovidos das paixões provenientes da cognição paradigmática já existente. REFERÊNCIAS 28 FRAGO, Antonio; ESCOLANO, Agustín. Currículo, espaço e subjetividade: a arquitetura como programa. 2ª ed. Rio de Janeiro: DP&A editora, 2001. FREIRE, Paulo. Cuidado, escola: desigualdade, domesticação e algumas saídas. 35ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1996. JENSEN, Claus. Lições e descobertas ao ar livre. Revista Pátio. Publicação, nº 34, ano XI, p. 16-19. Jan/Mar, 2013. LA PROFESSORA – Tirinha de Eneko. 2012. Disponível em: <https://projetoletrasearteshoracio2011.wordpress.com/2012/07/30/laprofessora- tirinha-de-eneko/> MORAES, Adriana. O valor das ciências na educação da infância. Revista Pátio. Publicação, nº 34, ano XI, p. 37-39. 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