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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS ESCOLA DE ENGENHARIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE MATERIAIS E CONSTRUÇÃO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM CONSTRUÇÃO CIVIL PATOLOGIA DAS ALVENARIAS Causa / Diagnóstico / Previsibilidade Belo Horizonte 2008 UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS ESCOLA DE ENGENHARIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE MATERIAIS E CONSTRUÇÃO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM CONSTRUÇÃO CIVIL PATOLOGIA DAS ALVENARIAS Causa / Diagnóstico / Previsibilidade JULIANA BORGES DE SENNA VALLE Monografia apresentada à Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais, como parte dos requisitos para obtenção do título de Especialização em Tecnologia da Construção Civil Orientador: Abdias Magalhães Gomes Belo Horizonte 2008 SUMÁRIO _______________________________________________ Lista de figuras.......................................................................................................... Lista de tabelas.......................................................................................................... Resumo ...................................................................................................................... 1. Introdução............................................................................................................... 1 2. Conceitos fundamentais ......................................................................................... 2 2.1 – Definição de alvenaria ................................................................................... 2 2.2 – Classificação das paredes ............................................................................... 3 2.3 – Patologias das paredes não estruturais ........................................................... 3 2.4 – Fissuração das paredes de alvenaria não estrutural ........................................ 5 2.5 – Patologias em paredes estruturais .................................................................. 6 2.6 – Fissuração das paredes de alvenaria estrutural................................................ 7 3. Comportamento das alvenarias .............................................................................. 8 3.1 – Fissuração das alvenarias submetidas à compressão ..................................... 8 3.2 – Carga admissível de compressão .................................................................. 11 4. Mecanismo de formação de fissuras ...................................................................... 16 4.1 – Fissuras causadas por movimentações térmicas .......................................... 18 4.1.2 – Movimentação térmica da laje de cobertura sobre paredes ................... 19 4.2 – Fissuras causadas por movimentações higroscópicas................................... 22 4.3 – Fissuras causadas por atuação de sobrecargas ............................................. 28 4.4 – Fissuras causadas por recalques de fundação ............................................... 31 4.5 – Fissuras causadas pela retração de produtos à base de cimento ................... 42 5. Deformações estruturais ......................................................................................... 48 5.1 – Fissuras causadas por deformação estrutura de concreto armado................ 50 6. Fatores que alteram que a resistência final das alvenarias...................................... 56 7. Previsibilidade das fissuras .................................................................................... 61 8. Conclusão ............................................................................................................... 70 9. Referências bibliográficas ...................................................................................... 72 i v vi i LISTA DE FIGURAS _______________________________________________ Figura 2.3.1 – Síntese das ocorrências das patologias ............................................... 4 Figura 3.1.1- Solicitação flexo compressão no componente alvenaria....................... 8 Figura 3.1.2 – Interação bloco – argamassa ............................................................... 9 Figura 3.1.3 – Resistência à compressão da alvenaria em função da resistência à compressão da argamassa .......................................................................................... 10 Figura 3.2.1 - Deformação da parede x Tipo de argamassa ..................................... 11 Figura 3.2.2 – Tensões admissíveis na interação bloco – argamassa ......................... 11 Figura 3.2.3 – Excentricidades das reações ............................................................... 12 Figura 3.2.4 – Momentos fletores resultantes de excentricidades de cargas verticais e ou transversais ..................................................................................................... 13 Figura 3.2.5 – Esforços de cisalhamento e flexão devido a cargas horizontais aplicadas na direção paralela ao plano da parede........................................................ 13 Figura 3.2.6 – Fatores de majoração das tensões ao longo de janela presente numa parede (comp. parede/h parede =2 e comp. Parede/comp.janela= 2,8)................. 14 Figura 3.2.7 – Fatores de majoração das tensões ao longo de janela presente numa parede (comp. parede/h parede =1 e comp. Parede/comp.janela= 2,9)................. 14 Figura 3.2.8 – Fatores de majoração das tensões ao longo da porta (comp. parede/h parede =1 e porta no centro da parede)............................................ 15 Figura 3.2.9 – Fatores de majoração das tensões ao longo da porta (comp. parede/h parede =1 e porta deslocada em relação ao centro da parede)..................... 15 Figura 4.1 – Mecanismo de formação de fissura........................................................ 16 Figura 4.2 – Formação de fissura diagonal................................................................. 16 Figura 4.3 – Formação de fissuras escalonada............................................................ 17 Figura 4.4 – Combinação de fissuras.......................................................................... 17 Figura 4.5 – Modelos de ruptura por carga horizontal no plano da parede................ 17 Figura 4.6 – Propagação das tensões numa laje de cobertura com bordos vinculados devido a efeitos térmicos ...................................................................... 19 Figura 4.7 – Movimentações que ocorrem numa laje de cobertura , sob ação da elevação da temperatura .......................................................................................... 20 Figura 4.8 – Trinca típica presente no topo da parede paralela ao comprimento da laje, a direção das fissuras são perpendiculares às resultantes de tração(δt) , indica o sentido da movimentação térmica ( no caso, da esquerda para direita )................. 20 Figura 4.9 – Fissura causada pela expansão térmica da laje de cobertura ............... 21 Figura 4.10 – Fissura causada pela expansão térmica da laje de cobertura................ 21 Figura 4.11 – Trincas de cisalhamento provocadas por expansão térmica da laje de cobertura..................................................................................................................... 21 Figura 4.12 – Fissura causada pela retração térmica da laje de cobertura.................. 22 Figura 4.13 – Propriedades higrotérmicas de alguns materiais de construção........... 24 Figura 4.14 – Gráfico retração x tempo em relação as movimentações reversíveis... 24 Figura 4.15 – A expansão dos tijolos por absorção de umidade provoca o fissuramento vertical da alvenaria no canto do edifício .............................................25 Figura 4.16 – Parede externa assentada com juntas a prumo sem alinhamento vertical ocasionando aparecimento de ponto de penetração de umidade para 26 ii interior do edifício....................................................................................................... Figura 4.17 – Trincas horizontais na alvenaria provenientes da expansão dos tijolos: o painel é solicitado à compressão na direção horizontal............................... 26 Figura 4.18 – Trinca vertical no terço médio da parede, causada por movimentações higroscópicas de tijolos de solo-cimento.......................................... 27 Figura 4.19 – Destacamento entra argamassa e componentes de alvenaria................ 27 Figura 4.20 – Trinca horizontal na base da alvenaria por efeito da umidade do solo. 28 Figura 4.21 – Fissuração típica da alvenaria causada por sobrecarga vertical............ 29 Figura 4.22 – Trincas horizontais na alvenaria provenientes de sobrecarga ............. 29 Figura 4.23- Ruptura localizada da alvenaria sob o ponto de aplicação da carga e propagação de fissuras a partir desse ponto................................................................ 30 Figura 4.24- Fissuração no entorno de abertura em parede solicitada por sobrecarga vertical...................................................................................................... 30 Figura 4.25 – Fissuração típica nos cantos das aberturas sob atuação de sobrecargas ................................................................................................................. 31 Figura 4.26 – Configurações das fissuras em algumas situações de recalques........... 32 Figura 4.27 – Gráfico pressão x recalque de sapatas apoiadas em areias ................. 33 Figura 4.28 – Gráfico pressão x recalque de sapatas apoiadas em argilas.................. 34 Figura 4.29 – variação dos recalques absolutos e diferenciados em edifícios assentados sobre argila ............................................................................................... 36 Figura 4.30 – Fundações contínuas solicitadas por carregamentos desbalanceados : o trecho mais carregado apresenta maior recalque , originando-se trincas de cisalhamento no painel................................................................................................ 37 Figura 4.31 – Fundações contínuas solicitadas por carregamentos desbalanceados : sob as aberturas surgem trincas de flexão................................................................... 37 Figura 4.32 – Recalque diferenciado no edifício menor pela interferência no seu bulbo de tensões , em função da construção do edifício maior................................... 38 Figura 4.33 – Recalque diferenciado por consolidações distintas do aterro carregado..................................................................................................................... 38 Figura 4.34 – Fundações assentadas sobre seções de corte e aterro , trincas de cisalhamento nas alvenaria.......................................................................................... 38 Figura 4.35 – Recalque diferenciado por falta de homogeneidade do solo................ 39 Figura 4.36 – Recalque diferenciado por rebaixamento do lençol freático. O terreno foi cortado à esquerda do edifício................................................................... 39 Figura 4.37 – Diferentes sistemas de fundação na mesma construção: recalques diferenciados entre os sistemas com presença de trincas de cisalhamento no corpo da obra............ ............................................................................................................ 40 Figura 4.38 – Recalques diferenciados entre pilares: surgem trincas inclinadas na direção do pilar que sofreu maior recalque ................................................................ 40 Figura 4.39 – Trinca provocada por recalque advindo da contração do solo, devida à retirada de água por vegetação próxima................................................................... 41 Figura 4.40 – Fissura de recalque vertical: as partes seccionadas da construção comportam-se individualmente como corpos rígidos................................................. 41 Figura 4.41 – Fissuras em paredes externa promovidas pela retração da laje de cobertura..................................................................................................................... 44 Figura 4.42 – Fissuras em paredes externas causadas pela retração de lajes intermediárias ............................................................................................................. 44 Figura 4.43 – Destacamento provocado pelo encunhamento precoce da alvenaria ... 45 Figura 4.44 – Retração de paredes e blocos de concreto em função da idade e da vinculação................................................................................................................... 45 iii .Figura 4.45 – Retração de blocos de concreto assentados com diferentes tipos de argamassa.................................................................................................................... Figura 4.46 – Fissura de retração na alvenaria em seção enfraquecida pela presença de tubulação................................................................................................................ 46 Figura 4.47 – Fissuração generalizada causada pela retração dos componentes de alvenaria e pelo excesso de aberturas ( janelas) na parede......................................... 47 Figura 4.48 – Fissura de retração em parede de concreto na seção enfraquecida pela presença do vão de janela.................................................................................... 47 Figura 4.49 – Fissura em parede monolítica relativamente extensa provocada pela retração do concreto................................................................................................... 48 Figura 5.1 – Previsão de flechas em componentes fletidos ( paredes)........................ 49 Figura 5.2 - Componente fletido ocasionando a formação de bielas de compressão em paredes sem aberturas........................................................................................... 50 Figura 5.3 – Trincas em paredes de vedação: deformação do suporte maior que a deformação da viga superior....................................................................................... 51 Figura 5.4 – Trincas em parede de vedação: deformação do suporte inferior à deformação da viga superior ...................................................................................... 51 Figura 5.5 – Trincas em parede de vedação : deformação do suporte idêntica à deformação da viga superior....................................................................................... 51 Figura 5.6 - Componente fletido ocasionando a formação de bielas de compressão em paredes com aberturas ( janelas)........................................................................... 52 Figura 5.7 – Configuração típica de fissuras em paredes com aberturas causadas pela deformação dos componentes estruturais ........................................................... 52 Figura 5.8 – Configuração típica de fissuras em paredes estruturais com aberturas . 52 Figura 5.9 - Componente fletido ocasionando a formação de bielas de compressão em paredes com aberturas ( portas)............................................................................. 53 Figura 5.10- Componente fletido ocasionando a formação de bielas de compressão em região de balanço da viga...................................................................................... 53 Figura 5.11 – Trincas na alvenaria provocadas por deflexão da região em balançoda viga......................................................................................................................... 54 Figura 5.12 – Exemplos de trincas na alvenaria em edifício provocadas por deflexão da região em balanço da viga....................................................................... 54 Figura 5.13 – Exemplos de trincas na alvenaria em edifício provocadas por deflexão da região em balanço da viga....................................................................... 54 Figura 5.14 – Trinca horizontal na base da parede provocada pela deformação excessiva da laje ( rotação da laje).............................................................................. 55 Figura 6.1 – Influência da execução na resistência final da parede............................ 56 Figura 6.2 – Assentamentos de blocos com preenchimento inadequado das juntas de assentamento.......................................................................................................... 56 Figura 6.3 – Espessura da junta de assentamento variando entre 16 a 19 mm reduz a resistência final da parede ....................................................................................... 57 Figura 6.4 – Amarração das paredes (correto e errado).............................................. 58 Figura 6.5 – Encontro das amarrações das paredes ................................................... 58 Figura 6.6. – Fissura causada por falha na concretagem e amarração incorreta......... 59 Figura 7.1 – Exemplo de edifício sobre pilotis. O edifício compõem-se de estrutura de concreto e as paredes de alvenaria tem função de vedação..................... 61 Figura 7.2 – Configuração de tensões de compressão e tração no componente estrutural ( viga superior) ........................................................................................... 62 Figura 7.3 – Configuração de tensões de tração no componente estrutural(viga superior) e formação de bielas de compressão( nas paredes) em direção a viga 62 iv superior, onde está sendo tracionado, devido a deformação por flexão do suporte superior....................................................................................................................... Figura 7.4 – Configuração de tensões de compressão no componente estrutural( viga) e formação de bielas de compressão ( nas paredes ) em direção contrária a parte comprimida, devido a deformação por flexão do suporte inferior .................... 63 Figura 7.5 – Configuração de tensão axial provocado por recalque diferencial da fundação com formação de bielas de compressão no canto extremo do recalque ..... 63 Figura 7.6 – A mesma configuração de tensão da figura anterior , porém observa- se quanto maior o comprimento da parede de alvenaria , maior será a magnitude das bielas de compressão............................................................................................ 64 Figura 7.7. – Configuração de tensão de compressão em vão de alvenaria( janela) em balanço de viga , formando bielas de retração na alvenaria.................................. 64 Figura 7.8 – Configuração de tensões de compressão em balanço de vigas sem aberturas de vãos de alvenaria. ............................................................................... 65 Figura 7.9 - Configuração de tensões de compressão em balanço de viga com aberturas nos vãos de alvenaria. ................................................................................. 65 Figura 7.10 - Configuração de tensões de compressão em balanço de vigas sem aberturas de vãos de alvenaria , provocadas por deflexão da região do suporte inferior na extremidade dos cantos............................................................................. 66 Figura 7.11 - Configuração de tensões de compressão em balanço de viga com aberturas de vãos de alvenaria , provocadas por deflexão da região do suporte inferior na extremidade dos cantos ............................................................................ 66 Figura 7.12 - Configuração de tensões de compressão em balanço de viga sem aberturas de vãos de alvenaria ................................................................................... 67 Figura 7.13 - Configuração de tensões de compressão em balanço de viga com abertura de vãos de alvenaria ..................................................................................... 67 Figura 7.14 – Configuração de tensões provocada por movimentações térmicas na interação laje de cobertura sobre paredes de alvenaria que introduzem tensões de tração e de cisalhamento nas paredes.......................................................................... 68 v LISTA DE TABELAS _______________________________________________ Tabela 2.2.1 - Classificação das paredes ................................................................... 3 Tabela 2.3.2 – Causas e agentes de patologias não estruturais................................... 5 Tabela 2.4.1 – Classificação das principais causas de fissuração em paredes ........... 6 Tabela 6.1 – Distância máxima entre a juntas de controle ......................................... 59 Tabela 6.2 – Recomendação de juntas de controle em função da intensidade da contração esperada para alvenaria .............................................................................. 60 Tabela 6.3 – Distância máxima entre juntas de controle em alvenarias armadas e não armadas ................................................................................................................ 60 vi RESUMO _______________________________________________ Em função da grande procura de soluções sobre o tema justifica-se estudar o comportamento das alvenarias estruturais e de vedação , os mecanismos que levam ao surgimento de patologias. Permitir o diagnóstico das mesmas e a aplicação de medidas preventivas, baseado em conhecimentos científicos e suas respectivas soluções para tratamento. Pretende –se aqui, identificar e distinguir as patologias inerentes ao comportamento estrutural (aspectos relacionados com concepção e construção) e patologias inerentes ao comportamento da alvenaria como material, patologias oriunda da interação bloco - argamassa , com ênfase na no mecanismo de formação de fissuras de origem térmica . Recorda-se que as variações térmicas provocam a dilatação das paredes dos elementos construtivos e dos diversos materiais que os compõem, gerando tensões significativas , não só nas ligações entre os elementos construtivos, como também em relação as peças de concreto armado e as argamassas , que apresentam o dobro da dilatação térmica linear do elemento bloco. Deste modo, optou-se por restringir essa apresentação ao domínio da fissuração causadas por movimentação térmicas, higroscópica, por atuação de sobrecargas, deformações geradas por estruturas de concreto, recalques de fundação e fissuras causadas por retração de produtos cimentícios. 1 1 - INTRODUÇÃO ________________________________________________ Nos últimos anos, houve uma profunda mudança na maneira de construir, pois antigamente as alvenarias eram utilizadas como elemento resistente e de vedação e a sua estabilidade e resistência eram definidos em função de sua geometria. Com advento do concreto armado, ocorreram profundas alterações no comportamento das alvenarias. Hoje, os edifícios são mais altos e esbeltos, a concepção privilegia grandes vãos, há menos pilares e as lajes apresentam espessura reduzida. Essas ,características, sem dúvida, trouxeram implicações e tornaram as estruturas mais deformáveis, em paradoxo , com o advento de blocos vazados , tanto de cerâmica como de concreto mais resistente e dimensões maiores, o que reduziu a capacidade das alvenarias absorver as deformações. De fato, isso colaborou para o surgimento das patologias sem que estas mudanças fossem estudadas. O processo de racionalização e aceleração da velocidade de execução de obras trouxeram problemas , pois com o ritmo acelerado da obra pode fazer com que as fôrmas e cimbramentos sejam retirados antes do momento adequado, e as deformações estruturais iniciais tendem a ser maiores, reflete em períodos menores de escoramento e início antecipado das alvenarias, sendo que as patologias mais comum relacionadas à deformação acabam se manifestando na alvenaria na formação de fissuras em bielas de compressão , arqueamento, indicando transmissão de cargas para os apoios e também podendo apresentar várias ocorrência de esmagamento da argamassa de assentamento ocasionando rompimento do revestimento. Por todas essas razões, a execução torna-se uma etapa fundamental para minimizar as patologias decorrentes de deformações estruturais. Já existe a consciência de que não se deve carregar a estrutura precocemente e dar um tempo razoável para que ocorram as reações do cimento. È necessário, portanto, repensar sobre a interação estrutura – vedações , para ganhar em qualidade e produtividade. 2 2 – CONCEITOS FUNDAMENTAIS __________________________________________________ 2.1 – DEFINIÇÃO DE ALVENARIA Entende-se por “alvenaria” a associação de um conjunto de unidades de alvenaria (tijolos, blocos, pedras, etc.) e ligante(s) que resulta num material que possuiu propriedades mecânicas intrínsecas capaz de constituir elementos estruturais. Nas alvenarias antigas, as unidades de alvenaria eram , vulgarmente, a pedra ou o tijolo cerâmico, eventualmente reforçadas com estrutura interna de madeira. As alvenarias de pedra tem uma diversificada constituição interna, dependente da época, dos costumes e do local de construção. São caracterizadas por uma grande irregularidade geométrica e falta de homogeneidade material, resultado da diversidade de características (físicas, mecânicas e geométricas) dos materiais utilizados. A presença de cavidades ou vazios interiores é uma característica destas alvenarias que aparecem, em maiores ou menores percentagens. Os tijolos cerâmicos, elaborados a partir de uma pasta de material argiloso, mais ou menos homogenia, geralmente com formas paralelepípedo , eram cozidos, por exposição ao sol – tijolos de adobe – ou em fornos de lenha, têm características mais regulares do que as unidades de pedra natural. Como conseqüência, o uso de unidades de tijolo cerâmico, traduz- se, também, numa maior regularidade e homogeneidade das suas alvenarias. As estruturas de alvenaria resultaram, por processos empíricos de aprendizagem (tentativa e erro), numa associação de elementos resistentes através dos quais a transmissão das cargas se faz por “trajetórias” de tensões de compressão. Apesar da aparente falta de ligação entre os elementos o fato é que, muitas destas estruturas, deram provas da sua eficácia e mantiveram a sua forma durante séculos. Aliás, o sistema construtivo das alvenarias, baseado na justaposição de unidades com uma fraca ligação entre si, permite o seu fácil desmonte, o que se traduz numa maior facilidade de manutenção. 3 2.2 – CLASSIFICAÇÃO DAS PAREDES A classificação tipológica tem como objetivo facilitar a percepção do comportamento mecânico-estrutural e a origem das patologias. Para o efeito é possível agrupar paredes com idênticas características morfológico-construtivas, com respeito, nomeadamente, às unidades de alvenaria, às características de assentamento, às características do(s) ligante(s) e, fundamentalmente, às características da secção transversal, para definir tipologias de paredes. A análise da seção desempenha um papel fundamental no estudo das propriedades e comportamento das alvenarias pelo que uma classificação mais geral apenas se refere às características da secção transversal, nomeadamente, ao número de paramentos e ao seu grau de sobreposição. PAREDES DE VEDAÇÃO RELAÇÃO AO EDIFÍCIO POSIÇÃO RELAÇÃO A ESTRUTURA LIGAÇÃO COM ESTRUTURA PROCESSO DE PRODUÇÃO Internas Externas Eixo Face Vinculada desvinculada Moldada “in loco” Industrializada PAREDES ESTRUTURAIS SITUAÇÃO RELAÇÃO EDIFÍCIO SITUAÇÃO ESTRUTURAL Internas Externas Não armada/ parcialmente armada / armada / contraventamentos/ sismos Tabela 2.2.1 - Classificação das paredes 2.3 – PATOLOGIAS DAS PAREDES NÃO ESTRUTURAIS No caso das paredes, entenda-se pois, por agora, como patologia não-estrutural aquela que corresponde a paredes das quais não depende diretamente a estabilidade de outros elementos construtivos. Esta opção resulta menos clara, do ponto de vista da designação, para as situações em que os defeitos das paredes não-estruturais resultam do deficiente 4 desempenho ou interação dos elementos estruturais confinantes ou de suporte e para as ações mecânicas externas ou internas, a que está sujeita a parede, e que põem em causa a sua própria estabilidade , sem que da sua eventual ruína resultem conseqüências para outros elementos construtivos. Figura 2.3.1 – Síntese das ocorrências das patologias TIPO DE CAUSA FASE AGENTE HUMANAS Na fase de concepção e projeto Na fase de execução Na fase de utilização -Ausência de projeto - Má concepção - inadequação ao ambiente (geotécnico , geofísico, Climático ) - Inadequação a condições técnico-econômicos - Informação insuficiente - Escolha ou quantificação inadequada de ações - Modelos de análise ou de dimensionamento incorretos - Pormenorização deficiente -Erros numéricos ou enganos de representação - Má qualidade dos materiais - Despreparo da mão de obra - Má interpretação do projeto - Ausência ou deficiência de fiscalização - Ações excessivas face ao projeto - Alteração das condições de utilização - Remodelação e alterações mal estudadas - Degradação dos materiais (deterioração anormal) - Ausência, insuficiência ou inadequação da manutenção - Gravidade - Variações de temperatura 5 AÇÕES NATURAIS Ações físicas Ações químicas Ações biológicas - Temperaturas extremas - Vento (pressão, abrasão, vibração) - Presença da água (chuva, neve, umidade do solo,...) -Efeitos diferidos (retração fluência, relaxação) - Oxidação - Carbonatação - Presença de água - Presença de sais - Chuva ácida - Reações eletroquímicas - Radiação solar (ultra-violetas) - Vegetais (raízes, trepadeiras, líquenes, bolores, fungos) - Animais (vermes, insetos, roedores, pássaros) DESASTRES NATURAIS - Sismo, ciclone, tornado - Trovoada, cheia, tempestade marítima, tsunami - Avalanche, deslizamento de terras, erupção vulcânica DESASTRES DE CAUSAS HUMNAS - Fogo, explosão, choques, inundações Tabela 2.3.2 – Causas e agentes de patologias não estruturais 2.4 – FISSURAÇÃO DAS PAREDES DE ALVENARIA NÃO ESTRUTURAL Na Tabela abaixo, resumem-se as causas técnicas da fissuração de paredes de alvenaria não estruturais. Estas causas são observáveis em paredes correntes executadas com os mais diversos materiais, mas é possível identificar um número reduzido de patologias que são exclusivas - ou têm manifestações particulares - de alguns tipos de materiais. Assuntos que serão detalhados posteriormente. CAUSAS DE FENÔMENOS DE FISSURAÇÃO ASPECTOS PRESENTES Movimentos das fundações – recalques diferenciais - Acomodação diferenciais de fundações diretas - Variação do teor de umidade dos solos argilosos - Heterogeneidade e deficiente compactaçãode aterros Ação de cargas externas – atuação de sobrecargas - concentração de cargas e esforços 6 Deformação da parede devido a deformabilidade excessiva das estruturas - Pavimento inferior mais deformável que o superior - Pavimento inferior menos deformável que o superior - Pavimento inferior e superior com deformação idêntica - Fissuração devida à deformação de consolos - Fissuração devida à rotação do pavimento no apoio Variações térmicas - Fissuração devida aos movimentos das coberturas - Fissuração devida aos movimentos das estruturas reticuladas - Fissuração devida aos movimentos da própria parede Variações de umidade - Movimentos reversíveis e irreversíveis - Fissuração devido à variação do teor de umidade por causas externas - Fissuração devido à variação natural do teor de umidade dos materiais - Fissuração devida à retração das argamassas - Fissuração devida à expansão irreversível do tijolo Alterações químicas - Hidratação retardada da cal - Expansão das argamassas por ação dos sulfatos - Corrosão de armaduras e outros elementos metálicos Ação do gelo - Fissuração devido a condições climáticas muito desfavoráveis - Fissuração devida à vulnerabilidade dos materiais Outros casos de fissuração - Ações acidentais (sismo, incêndios e impactos fortuitos) - Retração da argamassa e expansão irreversível do tijolo - Choque térmico - Envelhecimento e degradação natural dos materiais e das estruturas - Paredes de blocos de betão (situações particulares) - Revestimentos - Paredes com funções estruturais Tabela 2.4.1 – Classificação das principais causas de fissuração em paredes 2.5 – PATOLOGIAS EM PAREDES ESTRUTURAIS Relativamente às patologias interessa identificar e distinguir entre patologias inerentes ao comportamento estrutural (aspectos relacionados com a concepção/construção) e patologias inerentes ao comportamento da alvenaria como material (dependente das características dos materiais utilizados, das técnicas construtivas, da tipologia da secção, etc.). No entanto, as patologias nas alvenarias estruturais manifestam-se, geralmente, como uma combinação destas vertentes, sendo por vezes difícil atribuir-lhes uma origem específica. As principais patologias das alvenarias, como material estrutural, relacionam-se frequentemente com: 7 • fraca resistência à tração; • resistência à compressão muito dependente, do volume de vazios e, no caso, de paredes compostas, do grau de confinamento dos paramentos; • fraca resistência ao corte; • mecanismos de ruptura frágil. As patologias em paredes, como elemento estrutural, relacionam-se com fenômenos de instabilidade, local ou global, associados, geralmente, à: • deficiente integridade estrutural (fraca ligação entre elementos estruturais); • fraco embeiçamento na secção da parede; • esbelteza excessiva; • deficiente contraventamento; • reduzida ductilidade. Esses fatores explicam porque as fissuras constituem um estado patológico bastante comum em estruturas de alvenaria. 2.6 – FISSURAÇÃO DAS PAREDES DE ALVENARIA ESTRUTURAL Segundo GRIMM (1988 a 1997)a fissuração pode ser considerada como causa mais freqüente de falha de desempenho da alvenaria. As fissuras , entretanto , prejudicam , a estética , o conforto do usuário , a estanqueidade da construção , ou seja, as condições de serviços deixam de ser atendidas. Com base nas causas de fissuras em alvenarias apresentadas por GRIMM (1988), PAGE (1993) e THOMAZ (1998) , pode classificá-las em basicamente em três tipos: efeitos externos, mudanças volumétricas dos materiais e interação com outros elementos estruturais. Os efeitos externos compreendem principalmente a atuação das cargas variáveis e movimentação das fundações . O segundo tipo de classificação, refere-se às mudanças volumétricas, provocadas por retração, mudanças de temperatura e de umidade, etc. A interação da alvenaria com outros 8 elementos estruturais causam fissuras, quando tais elementos retraem-se ou dilatam, ou quando induzem a deformações excessivas na alvenaria. 3 – COMPORTAMENTO DAS ALVENARIAS __________________________________________________ 3.1 – FISSURAÇÃO DAS ALVENARIAS SUBMETIDAS À COMPRESSÃO Do ponto de vista material a alvenaria pode considerar-se um compósito heterogenia, intrinsecamente descontínuo, com boa resistência à compressão, fraca resistência à tração e, que conta apenas com a ação coesiva da gravidade. Homogeneidade, isotropia e propriedades mecânicas uniformes, são hipóteses vulgarmente assumidas na análise de estruturas modernas que não podem aqui aplicar-se com rigor. Figura 3.1.1- Solicitação flexo compressão no componente alvenaria Nas alvenarias constituídas por tijolos maciços, em função da sua heterogeneidade( forma, composição, etc.) e da diferença de comportamento entre tijolos e argamassa de assentamento são introduzidas solicitações locais de flexão nos tijolos, podendo surgir 9 fissuras verticais na alvenaria.Ocorre que também na argamassa de assentamento, apresentando deformações transversais mais acentuadas que os tijolos, introduz nos mesmos tensões de tração nas duas direções do plano horizontal , que também pode levar ao fissuramento vertical da alvenaria. Figura 3.1.2 – Interação bloco – argamassa No caso de alvenarias constituídas por blocos vazados, com furos retangulares, disposto horizontalmente, a argamassa de assentamento apresentará deformações axiais mais acentuadas sob s nervuras verticais do bloco, introduzindo –se como conseqüências solicitações de flexão em suas nervuras horizontais , o poderá inclusive conduzir à ruptura do bloco. De maneira geral, para os tijolos maciços , a fissuração típica das paredes axialmente carregada é vertical. Além da forma geométrica do componente de alvenaria,diversos outros fatores intervêm na fissuração e na resistência final de uma parede a esforços axiais de compressão, tais como : resistência mecânica dos componentes de alvenaria e da argamassa de assentamento, módulos de deformação longitudinal e transversal dos componentes de alvenaria e da argamassa , rugosidade superficial e porosidade dos componentes de alvenaria, poder de aderência, retenção de água, elasticidade e retração da argamassa , espessura , regularidade e tipo de junta de assentamento e , finalmente, esbeltez da parede. 10 Em trabalho realizado sobre alvenarias de blocos sílico- calcários , SABBATINI resume nas seguintes conclusões : a) a resistência da alvenaria é inversamente proporcional à quantidade de juntas de assentamento; b) componentes assentados com juntas em amarrações produzem alvenarias com resistência superior aquelas onde os componentes são assentados com juntas verticais aprumadas; c) a resistência da parede não varia linearmente com a resistência do componente de alvenaria e nem com a resistência da argamassa de assentamento; d) a espessura ideal da junta de assentamento situa-se em torno de 10mm. O principal fator que influi na resistência à compressão da parede é a resistência à compressão do componente de alvenaria, a influência da resistência da argamassa de assentamento é ao contrário do que se poderia intuir , bem menos significativa. Figura 3.1.3 – Resistência à compressão da alvenaria em função da resistência à compressão da argamassa Pesquisas desenvolvidas no BRE, tomando como referência a resistência à compressão de uma argamassa 1:3( cimento e areia em volume), revelam que o emprego de argamassa 90% menos resistentes que a de referência redundam em alvenarias apenas 20% menos resistente que a de referência, assentada com argamassa 1:3.11 Como regra geral, de acordo com SAHLIN, a resistência da parede em situações normais ficará compreendida entre 25% e 50% da resistência do componente da alvenaria. 3..2 – CARGA ADMISSÍVEL DE COMPRESSÃO As alvenarias autoportantes devem ser projetadas para resistirem a compressão vertical , momentos fletores resultantes de excentricidades de cargas verticais e / ou transversais e esforços de cisalhamento e flexão devido a cargas horizontais aplicadas na direção paralela ao plano da parede. Figura 3.2.1 - Deformação da parede x Tipo de argamassa Figura 3.2.2 – Tensões admissíveis na interação bloco – argamassa 12 Considerando-se o coeficiente de segurança igual a 5 , normalmente adotado pelas diversas normas para determinação da tensão admissível da alvenaria submetida `a compressão axial. Fcpa = 0,20 f”m[ 1 – (h/40t)3 ] Onde : fcpa – tensão admissível da parede comprimida h- altura da parede t – espessura da parede f”m – resistência média à compressão de no mínimo 5 prismas constituídos por dois blocos, assentados com argamassa a ser empregada na obra , em função da relação entre altura (h) e a largura (d) , o valor de f’m deve ser multiplicado pelos seguintes fatores : - 0,86 para h/d = 1,5 - 1,00 para h/d = 2,0 - 1,20 pra h/d = 3,0 - 1,30 para h/d = 4,0 - 1,37 para h/d = 5,0 A introdução de uma taxa mínima de armadura (0,2%) na alvenaria não chega a aumentar significativamente a resistência à compressão da parede , entretanto, tal armadura melhora substancialmente o comportamento da alvenaria quanto à fissuração, normalmente provocada por atuação de cargas excêntricas, ocorrência de recalques diferenciados ou concentração de tensões. Figura 3.2.3 – Excentricidades das reações 13 Figura 3.2.4 – Momentos fletores resultantes de excentricidades de cargas verticais e ou transversais Quando à presença na alvenaria de aberturas de portas e janelas, em cujos os cantos ocorre acentuada concentração de tensões pela perturbação no andamento isostáticas. Figura 3.2.5 – Esforços de cisalhamento e flexão devido a cargas horizontais aplicadas na direção paralela ao plano da parede 14 UTKU simulou, através de um programa baseado na teoria dos elementos finitos, a atuação de cargas verticais e horizontais atuando à altura do respaldo de paredes com aberturas, supondo a parede constituída por material perfeitamente isotrópico e elástico. Verificou-se que as concentrações de tensões variam em função do tamanho e da localização da abertura da parede. Para o caso de cargas verticais uniformemente distribuídas, , por exemplo, tensões unitárias aplicadas no topo da parede chegam a triplicar-se ou mesmo quadruplicar-se nas proximidades dos cantos superiores da abertura, podendo duplicar-se na região dos cantos inferiores. Nas figuras abaixo, são apresentados alguns fatores de majoração das tensões principais, obtidos por UTKU, através das quais pode-se visualizar a importância da localização da abertura e de seu tamanho em relação a parede. Figura 3.2.6 – Fatores de majoração das tensões ao longo de janela presente numa parede (comp. parede/h parede =2 e comp. Parede/comp.janela= 2,8) Figura 3.2.7 – Fatores de majoração das tensões ao longo de janela presente numa parede (comp. parede/h parede =1 e comp. Parede/comp.janela= 2,9) 15 Figura 3.2.8 – Fatores de majoração das tensões ao longo da porta (comp. parede/h parede =1 e porta no centro da parede) Figura 3.2.9 – Fatores de majoração das tensões ao longo da porta (comp. parede/h parede =1 e porta deslocada em relação ao centro da parede) 16 4 – MECANISMO DE FORMAÇÃO DAS FISSURAS __________________________________________________ Os elementos e componentes de uma construção estão sujeitos a variações que repercutem numa variação dimensional dos materiais de construção( dilatação ou contração), os movimentos de dilatação e contração são tensões que poderão provocar o aparecimento de fissuras. Figura 4.1 – Mecanismo de formação de fissura Em painéis de alvenaria as fissuras podem se apresentar nas direções horizontal , vertical, diagonal , ou uma combinação destas. Quando verticais ou diagonais, elas podem ser retas, atravessando unidades e juntas , ou podem ter aspecto escalonado, passando apenas pelas juntas . A forma da fissura é influenciada por vários fatores, incluindo a rigidez relativa das juntas com relação às unidades, a presença de aberturas ou outros pontos de fragilidade, as restrições da parede e a causa da fissura. Figura 4.2 – Formação de fissura diagonal 17 Figura 4.3 – Formação de fissuras escalonada Figura 4.4 – Combinação de fissuras Figura 4.5 – Modelos de ruptura por carga horizontal no plano da parede 18 4.1 – FISSURAS CAUSADAS POR MOVIMENTAÇÕES TÉRMICAS As movimentações térmicas de um material estão relacionadas com as propriedades físicas do mesmo e com a intensidade da variação da temperatura, a magnitude das tensões desenvolvidas é função da intensidade da movimentação , do grau de restrição imposto pelos vínculos a esta movimentação e das propriedades elásticas do material. As trincas de origem térmica podem também surgir por movimentações diferenciadas entre componentes de um elemento , entre elementos de um sistema e entre regiões distintas de um mesmo material. As principais movimentações diferenciadas , ocorrem em função de : - junção de materiais com diferentes coeficientes de dilatação térmica, sujeito às mesmas variações de temperatura ( por exemplo, movimentações diferenciadas entre argamassa de assentamento e componentes de alvenaria); - exposição de elementos a diferentes solicitações térmicas naturais ( por exemplo, cobertura em relação as paredes de uma edificação); - gradiente de temperatura ao longo de um mesmo componente ( por exemplo, gradiente entre a face exposta e a face protegida de uma laje de cobertura). No caso das movimentações térmicas diferenciadas é importante considerar-se não só a amplitude da movimentação, como também a rapidez com que esta ocorre. Se ela for gradual e lenta muitas vezes um material que apresenta menor resposta ou que é menos solicitado às variações da temperatura pode absorver movimentações mais intensas do que um material ou componente a ele justaposto, o mesmo pode não ocorrer se a movimentação for brusca. Por outro lado, alguns materiais também podem sofrer fadiga pela ação de ciclos alternados de carregamento – descarregamento ou por solicitações alternadas de tração – compressão. Todos os materiais empregados nas construções estão sujeitos a dilatações com o aumento de temperatura , e as contrações com a sua diminuição.A intensidade desta variação dimensional , para uma dada variação de temperatura , varia de material para material. Para quantificarem-se as movimentações sofridas por um componente, além de suas propriedades 19 físicas, deve se conhecer o ciclo de temperatura a que está sujeito e determinar também a velocidade de ocorrência das mudanças térmicas , como no caso de alguns selantes que possuem pouca capacidade de acomodação a movimentos bruscos. 4.1.2 – MOVIMENTAÇÃO TÉRMICA DA LAJE DE COBERTURA SOBRE PAREDES Em geral , as coberturas planas estão mais expostas às mudanças térmicas naturais do que os paramentos verticais das edificações , ocorrem , portanto, movimentos diferenciados entre os elementos horizontais e verticais. Além disso, podem ser mais intensificados pelas diferenças nos coeficientes de expansão térmica dos materiaisconstrutivos desses componentes. Segundo CHAND, o coeficiente de dilatação térmica linear do concreto é aproximadamente duas vezes maior que o das alvenarias de uso corrente, considerando-se aí a influência das juntas de argamassa. Deve-se considerar também que ocorrem diferenças significativas de movimentação entre as superfícies superiores e inferiores das lajes de cobertura , sendo que normalmente as superfícies superiores são solicitadas por movimentações mais bruscas e de maior intensidade. Por estas razões , e devido ao fato de que as lajes de cobertura normalmente encontram-se vinculadas às paredes de sustentação, surgem tensões tanto no corpo das paredes , quanto nas lajes . Teoricamente, as tensões de origem térmica são nulas nos pontos centrais das lajes , crescendo proporcionalmente em direção aos bordos onde atingem seu ponto máximo. Figura 4.6 – Propagação das tensões numa laje de cobertura com bordos vinculados devido a efeitos térmicos 20 A dilatação plana das lajes e o abaulamento provocado pelo gradiente de temperatura ao longo de suas alturas, introduzem tensões de tração e de cisalhamento nas paredes das edificações. As trincas se desenvolvem quase que exclusivamente nas paredes, apresentando tipicamente as configurações. Figura 4.7 – Movimentações que ocorrem numa laje de cobertura , sob ação da elevação da temperatura Figura 4.8 – Trinca típica presente no topo da parede paralela ao comprimento da laje, a direção das fissuras são perpendiculares às resultantes de tração(δt) , indica o sentido da movimentação térmica ( no caso, da esquerda para direita ) A presença de aberturas nas paredes , propiciará o aparecimento de regiões naturalmente enfraquecidas ( ao nível do peitoril e ao nível do topo de caixilhos) , desenvolvendo –se as fissuras preferencialmente nessas regiões. Assim, em função das dimensões da laje , da natureza dos materiais que constituem as paredes , do grau de aderência entre paredes e laje e da eventual presença de aberturas , poderão desenvolver trincas inclinadas próximos ao topo das paredes. 21 Figura 4.9 – Fissura causada pela expansão térmica da laje de cobertura Figura 4.10 – Fissura causada pela expansão térmica da laje de cobertura Figura 4.11 – Trincas de cisalhamento provocadas por expansão térmica da laje de cobertura 22 Figura 4.12 – Fissura causada pela retração térmica da laje de cobertura 4.2 – FISSURAS CAUSADAS POR MOVIMENTAÇÕES HIGROSCÓPICAS As mudanças higroscópicas provocam variações dimensionais nos materiais porosos que integram os elementos e componentes da construção, o aumento do teor de umidade produz uma expansão do material enquanto a diminuição desse teor provoca uma contração. No caso da existência de vínculos que impeçam ou restringem essas movimentações poderão ocorrer fissuras nos elementos e componentes construtivos. A umidade pode ter acesso aos materiais de construção através de diversas vias : a) Umidade resultante da produção dos componentes: Na fabricação de componentes construtivos à base de ligantes hidráulicos emprega-se geralmente uma quantidade de água superior à necessária para que ocorram as reações químicas de hidratação. A água em excesso permanece em estado livre no interior do componente e ao se evaporar, provoca a contração do material. b) Umidade proveniente da execução da obra: è usual umedecerem-se componentes de alvenaria no processo de assentamento, ou mesmo painéis de alvenaria que receberão argamassas de revestimento. Esta prática é correta, pois visa impedir a saída brusca de água das argamassas, o que viria prejudicar a aderência com os componentes de alvenaria ou mesmo as reações de hidratação do cimento. Ocorre que nesta operação de 23 umedecimento poderá elevar o teor de umidade dos componentes de alvenaria a valores muito acima da umidade higroscópica de equilíbrio, originando-se uma expansão do material, a água em excesso tenderá a evaporar-se , provocando uma contração do material. c) Umidade do ar ou proveniente de fenômenos meteorológicos: O material poderá absorver água de chuva antes mesmo de ser utilizado na obra, durante o transporte até a obra ou por armazenagem desprotegida no canteiro.Também a umidade presente no ar pode ser absorvida pelos materiais de construção, quer sob forma de vapor, quer sob a de água líquida( condensação do vapor sobre as superfícies mais frias da construção). d) Umidade do solo: A água presente no solo poderá ascender por capilaridade à base da construção, desde que os diâmetros dos poros capilares e o nível do lençol d’água assim o permitem. A quantidade de água absorvida por um material de construção depende de dois fatores: porosidade e capilaridade. O fator mais importante que rege a variação do teor de umidade dos materiais é a capilaridade. Na secagem de materiais porosos, a capilaridade provoca o aparecimento de forças de sucção, responsáveis pela condução da água até a superfície do componente , onde ela será posteriormente evaporada. Deve-se considerar também que estas forças de sucção são inversamente proporcionais às aberturas dos poros , desta maneira quando dois materiais diferentes são colocados em contato, o material dos poros mais fechados, teoricamente, absorverá água do material com poros mais abertos. . Na prática, os materiais normalmente contem poros de variadas aberturas, sendo o sentido de percolação da água dos mesmos determinado pela diferença do teor de umidade dos materiais em contato, variando a sucção por capilaridade com o teor de umidade dos materiais. Se um material poroso é exposto por tempo suficiente a condições constantes de umidade e temperatura , seu teor de umidade acabará estabilizando-se, atinge-se , então a umidade higroscópica de equilíbrio do material. 24 Figura 4.13 – Propriedades higrotérmicas de alguns materiais de construção As variações no teor de umidade provocam movimentações de dois tipos: irreversíveis e reversíveis . As movimentações irreversíveis são aquelas que ocorrem geralmente logo após a fabricação do material e originam-se pela perda ou ganho de água até que se atinja a umidade higroscópica de equilíbrio do material fabricado. As movimentações reversíveis ocorrem por variações do teor de umidade do material, ficando delimitadas a um certo intervalo, mesmo no caso de secar-se ou saturar-se completamente o material. Figura 4.14 – Gráfico retração x tempo em relação as movimentações reversíveis 25 As movimentações higroscópica em materiais cerâmicos, normalmente apresentam pequenas movimentações reversíveis com as variações de umidade e de temperatura. As expansões irreversíveis começam a ocorrer imediatamente após a queima do produto e podem processar-se durante longos períodos , dependerão da natureza dos argilo minerais presentes ma matéria – prima e das condições de queima do tijolo. Grande parte da movimentação irreversível , no caso da expansão, ocorre nos primeiros meses de idade. A duração deste ciclo estará condicionada não só às propriedades do corpo cerâmico , mas também às condições de umidade a que estará submetido. Pesquisas revelam , que a expansão de tijolos cerâmicos pode variar de 0,04% a 0,12% , sendo que metade da expansão é verificada nos primeiros seis meses de idade. Conclui-se ainda que os tijolos mal queimados apresentam dilatação bastante superior aos bem queimados , todavia , o módulo de deformação dos tijolos mal queimados é geralmente pequeno, o que lhes confere maior poder de acomodação. As trincas provocadaspor variação de umidade dos materiais de construção são muito semelhante aquelas provocadas pelas variações de temperatura ou de umidade. Segue abaixo , alguns registros de ocorrências de alguns casos de trincas provocadas pela expansão de tijolos cerâmicos com elevada resistência à compressão. Figura 4.15 – A expansão dos tijolos por absorção de umidade provoca o fissuramento vertical da alvenaria no canto do edifício 26 Figura 4.16 – Parede externa assentada com juntas a prumo sem alinhamento vertical ocasionando aparecimento de ponto de penetração de umidade para interior do edifício. Figura 4.17 – Trincas horizontais na alvenaria provenientes da expansão dos tijolos: o painel é solicitado à compressão na direção horizontal Para tijolos maciços de solo-cimento , constata-se que na prática um tipo de fissura bastante característico, ou seja, fissura vertical que ocorre no terço médio da parede. Essa trinca geralmente aparece em paredes relativamente longas ( com cerca de 6 a 7 metros) e pode ser causada tanto pela contração de secagem do produto quanto por suas movimentações reversíveis , ressalta-se que o solo-cimento é um material altamente suscetível às variações de umidade , particularmente quando a argila contiver argilominerais da família das montmorilonitas. 27 Para paredes monolíticas construídas com solo estabilizado ( solo-cimento ou solo-cal) são altamente suscetíveis à formação de fissuras, tanto pela retração inicial quanto pelas movimentações higroscópicas reversíveis do material. Até mesmo a adição de saibro à argamassa para a construção de paredes monolíticas tem conduzido a experiências muito mal sucedidas , exatamente em função das grandes variações volumétricas que a argila apresenta ao variar seu teor de umidade. Figura 4.18 – Trinca vertical no terço médio da parede, causada por movimentações higroscópicas de tijolos de solo-cimento Movimentações reversíveis ou irreversíveis podem originar também destacamentos entre componentes de alvenaria e argamassa de assentamento. Esses destacamentos ocorrem em função de inúmeros fatores , sendo os mais importantes : aderência entre a argamassa e componente de alvenaria, tipo de junta adotada, módulo de deformação dos materiais em contato, propriedades higroscópicas desses materiais e intensidade da variação da umidade. Figura 4.19 – Destacamento entra argamassa e componentes de alvenaria 28 Trincas horizontais podem aparecer também na base de paredes , onde a impermeabilização dos alicerces foi mal executada. Nesse caso , os componentes de alvenaria que estão em contato direto com o solo absorvem sua umidade, apresentando movimentações diferenciadas em relação as fiadas superiores que estão sujeitas à insolação direta e a perda de água por evaporação . Essas trincas quase sempre são acompanhadas por eflorescência . Figura 4.20 – Trinca horizontal na base da alvenaria por efeito da umidade do solo 4.3 – FISSURAS CAUSADAS PELA ATUAÇÃO DE SOBRECARGAS A atuação de sobrecargas pode produzir a fissuração de componentes estruturais , tais como pilares, vigas e paredes. Considerando-se como sobrecarga uma solicitação externa , prevista ou não em projeto, capaz de provocar a fissuração de um componente com ou sem função estrutural. Em trechos contínuos de alvenarias solicitadas por sobrecargas, uniformemente distribuídas , dois tipos característicos de trincas podem surgir : a) Trincas verticais provenientes da deformação transversal da argamassa sob ação das tensões de compressão, ou de flexão local dos componentes de alvenaria. b) Trincas horizontais provenientes da ruptura por compressão dos componentes de alvenaria da própria argamassa de assentamento ou ainda de solicitações de flexo compressão da parede. 29 Figura 4.21 – Fissuração típica da alvenaria causada por sobrecarga vertical Figura 4.22 – Trincas horizontais na alvenaria provenientes de sobrecarga Além da fissuração da parede carregada , outros fenômenos poderão ocorrer : mo caso de alvenarias constituídas por blocos cerâmicos estruturais, com furos dispostos verticalmente , a deformação transversal da argamassa de assentamento poderá provocar a ruptura por tração de nervuras internas dos blocos . Nesse caso , além de fissuras verticais, ocorrerão destacamentos de paredes externas dos blocos . A atuação de sobrecargas localizadas ( concentradas) também pode provocar a ruptura dos componentes de alvenaria na região de aplicação da carga e ou o aparecimento de fissuras inclinadas a partir do ponto de aplicação. Em função da resistência à compressão dos componentes de alvenaria é que poderá predominar uma ou outra das anomalias. 30 Figura 4.23- Ruptura localizada da alvenaria sob o ponto de aplicação da carga e propagação de fissuras a partir desse ponto Nos painéis de alvenaria onde existem aberturas , as trincas formam-se a partir dos vértices dessa abertura e sob o peitoril, teoricamente, em função do caminhamento das isostáticas de compressão. Figura 4.24- Fissuração no entorno de abertura em parede solicitada por sobrecarga vertical Essas trincas , entretanto, podem se manifestar segundo diversas configurações , em função da influência de uma gama de fatores, tais como : dimensões do painel de alvenaria , dimensões da abertura , posição que a abertura ocupa no painel , anisotropia dos materiais que constituem alvenaria dimensões e rigidez de vergas e contravergas etc. A maior deformação da alvenaria e a eventual deformação do suporte nos trechos mais carregados da parede ( fora das aberturas), contudo, originam nos casos reais de trincas com as configurações indicadas na figura abaixo. 31 Figura 4.25 – Fissuração típica nos cantos das aberturas sob atuação de sobrecargas 4.4 – FISSURAS CAUSADAS POR RECALQUES DE FUNDAÇÃO Ate´ há pouco tempo as fundações dos edifícios eram dimensionadas pelo critério de ruptura do solo, apresentando as construções , cargas que geralmente não excediam a 500tf.Ao mesmo tempo que as estruturas iam ganhando esbeltez , iam ganhando maior altura, chegando-se atingir 20.000tf. Dentro desse, é imprescindível uma mudança de postura para o cálculo e dimensionamento das fundações dos edifícios. Embora seja difícil impedir o aparecimento de fissuras em edifícios , medidas preventivas adotadas ainda na fase de projeto podem minimizá-las. Se a movimentação da fundação puder ser prevista , PAGE(1993) afirmou que ela deve então ser dimensionada rígida o suficiente para acomodar esses movimentos , evitando assim deformações excessivas na alvenaria. A norma australiana limita a curvatura de vigas e lajes que suportam paredes de alvenaria a vão/500. quando se tomam providências para minimizar os efeitos da movimentação, ou vão/1000, no caso contrário. Alternativamente, a alvenaria pode ser projetada para atuar como viga- parede , cujo vão seria o da região do recalque. Todavia, se houver fissuração neste caso, ela tende a ser excessiva. Se forem projetadas juntas de controle de fissuração , de forma que a alvenaria possa tolerar algum movimento da fundação, a rigidez desta última pode ser reduzida. THOMAZ(1998) ressaltou a prática da inserção de juntas nas estruturas como forma eficiente de evitar fissuras provocadas por acomodações da fundação. Foram citados alguns casos em que se recomendam juntas: edifícios com forma muito alongada, plantas recortadas, carregamentos muito diferenciados, fundações apoiadas em cotas diferentes , diferentes tipo de fundação e diferentes etapas deconstrução. 32 Figura 4.26 – Configurações das fissuras em algumas situações de recalques Em se tratando sobre a deformabilidade dos solos e a rigidez dos edifícios , de acordo com VITOR MELLO , apenas em argilas de baixa plasticidade o critério de cálculo condicionantes é de ruptura, já em argilas de alta plasticidade os recalques acentuam-se , passando em geral a ser condicionante o critério recalques admissíveis. Em siltes e areias, solos com coeficiente de atrito interno, o critério de ruptura só pode ser condicionante para sapatas muito pequenas, em construção de maior porte automaticamente passa a ser condicionante o critério de recalques. A capacidade de carga e a deformabilidade dos solos não são constantes , sendo função dos seguintes fatores mais importantes : - Tipo e estado do solo( areia nos vários estados de compacidade ou argilas nos vários estados de consistência); - Disposição do lençol freático; - Intensidade da carga , tipo de fundação( direta ou profunda) e cota de apoio da fundação; 33 - Dimensões e formato da placa carregada( placas quadradas, retangulares, circulares); - Interferência de fundações vizinhas. Os solos são constituídos basicamente por partículas sólidas , água , ar e material orgânico. Sob efeitos de cargas externas, todos os solos, em maior ou menor proporção se deformam. No caso em que estas deformações sejam diferenciadas ao longo do plano das fundações de uma obra, tensões de grande intensidade serão introduzidas na estrutura da mesma , podendo gerar o aparecimento de trincas. Se o solo for uma argila dura ou uma areia compacta, os recalques decorrem essencialmente de deformações por mudança de forma, função da carga atuante e do módulo de deformação do solo. No caso de solos fofos e moles os recalques são basicamente provenientes da sua redução de volume, já que a água presente no bulbo de tensões das fundações tenderá a percolar para regiões sujeitas a pressões menores. Ao fenômeno de mudança de volume do solo por percolação da água , denomina-se consolidação. Para os solos altamente permeáveis como as areias, a consolidação, ou seja , os recalques acontecem em períodos de tempo relativamente curtos após serem solicitados . Já para os solos menos permeáveis , como as argilas , a consolidação ocorre de maneira bastante lenta , ao longo de vários anos. Para fundações diretas , a intensidade dos recalques dependerá não só do tipo de solo, mas também das dimensões do com componente da fundação. Para as areias, onde a capacidade de carga e o módulo de deformação aumentam rapidamente com a profundidade, existe a tendência de que os recalques ocorram com a mesma magnitude , tanto para as placas estreitas quanto para placas mais largas. Figura 4.27 – Gráfico pressão x recalque de sapatas apoiadas em areias 34 Para solos com grande coesão , onde os parâmetros de resistência e deformabilidade não variam tanto com a profundidade , pode-se raciocinar hipoteticamente que uma sapata com maior área apresentará maiores recalques que uma outra , menor, submetida à mesma pressão , pois o bulbo de pressões induzidas no terreno na primeira sapata alcança maior profundidade, como mostra o gráfico abaixo. Figura 4.28 – Gráfico pressão x recalque de sapatas apoiadas em argilas Para as fundações profundas podem ocorrer recalques bastante significativos. MELLO , cita como exemplo dessas situações o efeito de agrupamento de estacas , as estacas flutuantes e as estacarias muito profundas , lembra que ainda que o máximo atrito lateral mobilizado ocorre para pequenos recalques , independentemente do diâmetro do componente de fundação, ou seja, ultrapassado esses pequenos limites haverá uma grande probabilidade de ocorrer recalques intensos. Um outro fator importante que regula o comportamento das fundações profundas é o atrito negativo, nas construções que se assentam sobre seções mistas de cortes e aterro, a este fenômeno pode dar origem a recalques diferenciados de considerável intensidade. Quando as estacas atravessam uma camada de solo em vias de adensamento e apóiam-se em terrenos subjacentes pouco compressíveis , elas irão recebendo , a medida que se processa o recalque , um acréscimo de carga proveniente do peso do solo em movimento descendente , traduzido por tensões de atrito ao longo das paredes das estacas. O adensamento da camada de argila pode provir, além do lançamento de aterros , de outras fontes: construção de novos edifícios adjacentes à estacaria e apoiados em fundações 35 rasas, acréscimo de pressões efetivas devido a um rebaixamento do lençol freático , etc. Convém frisar ainda que mesmo sem qualquer desses carregamentos externos, o simples amolgamento provocado pela própria cravação das estacas pode ser responsável pelo atrito negativo, visto que as argilas pouco consistentes tornam a adensar sob seu peso próprio após amolgadas. O comportamento do edifício depende de interações extremamente complexas entre a sua estrutura, a estrutura da fundação e o solo de suporte. Nesse sentido, uma estrutura poderá ter comportamento flexível quando apoiada sobre um solo pouco deformável , ao passo que tenderá a comporta-se como um corpo rígido se apoiada em solo muito deformável. Em geral, há grande probabilidade das estruturas lineares desempenharem-se de maneira flexível , predominando nas paredes de fechamento, enquanto que as alvenarias portantes, apresentam comportamento muito mais próximo da rigidez. Em estudo sobre as tensões e deformações em edifícios com 4 pavimentos em alvenaria não armada e fundação por sapatas corridas, foram obtidos algumas conclusões importantes : - a falta de homogeneidade do solo ao longo de edifícios muitos extensos , com carregamento uniformemente distribuído, é provavelmente o fator mais importante na ocorrência de recalques diferenciados que provocarão a fissuração das paredes. - em paredes com altura “h” e comprimento “b” entre contraventamentos , providas de janelas com altura “hw” e comprimento “bw” , relações hw/h >0,4 ou bw/b>0,4 , farão com que os trechos de alvenaria sobre as aberturas comportam-se como vigas , predominando as tensões de tração no centro das aberturas e as tensões de cisalhamento nas proximidades do apoio. - para essa configuração de aberturas em edifícios uniformemente carregados apoiados sobre solos homogêneos , as tensões máximas ocorrerão nas vigas superiores , nas extremidades (regiões onde aparecem os maiores esforços cortantes), se o edifício apresentar um carregamento maior na sua região central, as tensões máximas vão se desenvolver nas vigas centrais. - o comportamento do edifício só se torna mais flexível ( tendo , portanto melhor absorção das tensões introduzidas pelos recalques), mediante o aumento do seu comprimento , a adoção de aberturas com grandes dimensões ( hw/h>0,4 ou bw/b>0,4), o que aparentemente diminui a rigidez da obra , torna-se ainda mais suscetível às tensões de cisalhamento que se desenvolve ao redor das aberturas. 36 - a introdução de armaduras na alvenaria pode melhor sensivelmente seu comportamento frente às tensões de tração e de cisalhamento. Analisando diversos casos de recalques ocorridos em edifícios, uniformemente carregados apoiados sobre camadas de solo com alturas bem regulares, BJERRUM verifiocou que , para as areias, os recalques diferenciados são da mesma ordem de grandeza dos recalques absolutos , já para as argilas este comportamento é distinto, o que mostra o gráfico abaixo. Figura 4.29 – variação dos recalques absolutos e diferenciados em edifícios assentados sobre argila De maneira geral, asfissuras provocadas por recalques diferenciados são inclinadas , confundindo-se às vezes com as fissuras provocadas por deflexão de componentes estruturais. Em relação as trincas provocadas por recalques de fundação, apresentam-se aberturas geralmente maiores , inclinando-se em direção ao ponto onde ocorreu o maior recalque. Outra característica das fissuras é a presença de esmagamentos localizados , em forma de escamas, dando início as tensões de cisalhamento que as provocaram. Além disso, quando os recalques são acentuados, observa-se nitidamente uma variação na abertura da fissura. Os recalques diferenciados podem provir de carregamentos desbalanceados, nesse caso , as trincas apresentarão as configurações indicadas nas figuras abaixo. 37 Figura 4.30 – Fundações contínuas solicitadas por carregamentos desbalanceados : o trecho mais carregado apresenta maior recalque , originando-se trincas de cisalhamento no painel Figura 4.31 – Fundações contínuas solicitadas por carregamentos desbalanceados : sob as aberturas surgem trincas de flexão Para edifícios uniformemente carregados, são diversos fatores que podem conduzir aos recalques diferenciados e consequentemente a fissuração. Nas figuras abaixo são ilustrados alguns desses casos. 38 Figura 4.32 – Recalque diferenciado no edifício menor pela interferência no seu bulbo de tensões , em função da construção do edifício maior Figura 4.33 – Recalque diferenciado por consolidações distintas do aterro carregado Figura 4.34 – Fundações assentadas sobre seções de corte e aterro , trincas de cisalhamento nas alvenaria 39 Figura 4.35 – Recalque diferenciado por falta de homogeneidade do solo Figura 4.36 – Recalque diferenciado por rebaixamento do lençol freático. O terreno foi cortado à esquerda do edifício A construção de edifícios dotados de um corpo principal ( mais carregado) e de um corpo secundário ( menos carregado) , com um mesmo sistema de fundação , conduz a recalques diferenciados entre as duas partes, surgindo fissuras verticais entre elas e fissuras inclinadas no corpo menos carregados. A adoção de sistemas diferentes de fundação numa mesma obra provoca o mesmo problema., como mostra a figura abaixo. 40 Figura 4.37 – Diferentes sistemas de fundação na mesma construção: recalques diferenciados entre os sistemas com presença de trincas de cisalhamento no corpo da obra Em edifícios com estrutura reticulada , os recalques diferenciados da fundação induzem a fissuração por tração diagonal das paredes de vedação. As trincas inclinam-se na direção do pilar que sofreu maior recalque, como mostra a figura abaixo. Figura 4.38 – Recalques diferenciados entre pilares: surgem trincas inclinadas na direção do pilar que sofreu maior recalque 41 As variações de umidade do solo , principalmente no caso das argilas, provocam alterações volumétricas e variações no seu módulo de deformação, com possibilidade de ocorrência de recalques localizados. Segundo BRE, estes recalques , bastante comuns por causa da saturação do solo pela penetração de água de chuvas nas vizinhanças da fundação, podem ocorrer pela absorção de água por vegetação localizada próxima à obra , conforme figura abaixo. Figura 4.39 – Trinca provocada por recalque advindo da contração do solo, devida à retirada de água por vegetação próxima Figura 4.40 – Fissura de recalque vertical: as partes seccionadas da construção comportam-se individualmente como corpos rígidos 42 4.5 – FISSURAS CAUSADAS PELA RETRAÇÃO DE PRODUTOS À BASE DE CIMENTO A hidratação do cimento consiste na transformação de compostos anidros mais solúveis em compostos hidratados menos solúveis , ocorrendo na hidratação a formação de uma camada de gel em torno dos grãos dos compostos anidros. De acordo com HELENE, para que ocorra a reação química completa entre a água e os compostos anidros é necessária cerca de 22 a 32% de água em relação à massa do cimento. Para a constituição do gel é necessária uma quantidade adicional em torno de 15 a 25%. Em média , uma relação água/cimento de aproximadamente 0,40 é suficiente para que o cimento se hidrate completamente. Em função da trabalhabilidade necessária , os concretos e argamassas normalmente são preparados com água em excesso , o que vem acentuar a retração. Na realidade , é importante distinguir as três formas de retração que ocorrem no produto preparado com cimento: a) Retração química: a reação química entre o cimento e a água se dá com redução de volume, devido às grandes forças interiores de coesão, a água combina quimicamente (22 a 32%) e sofre uma contração de cerca de 25% de seu volume original; b) Retração de secagem: a quantidade excedente de água empregada na preparação do concreto ou argamassa , permanece livre no interior da massa , evaporando –se posteriormente. Tal evaporação gera forças capilares equivalentes a uma compressão isotrópica da massa , produzindo a redução do seu volume; c) Retração por carbonatação: a cal hidratada liberada nas reações de hidratação do cimento reage com gás carbônico presente no ar , formando carbonato de cálcio. Esta reação é acompanhada de uma redução de volume , gerando a chamada retração por carbonatação. Os três tipos de retração ocorrem com o produto endurecido, ou em processo de endurecimento, em períodos longos.Porém existe um quarto tipo de retração, que ocorre com a massa no estado plástico, e que provém da evaporação da água durante a pega ou da percolação da água de regiões mais pressionadas para regiões menos pressionadas. Essa 43 retração plástica explica o adensamento das juntas de argamassas de uma alvenaria recém – construídas e a exsudação de água num concreto recém – vibrado. Inúmeros fatores intervêm na retração de um produto à base de cimento, sendo os principais: a) Composição química e finura do cimento: a retração aumenta com a finura do cimento e com o seu conteúdo de cloretos (CaCl2) e álcalis ( NaOH, KOH); b) Quantidade de cimento adicionada à mistura : quanto maior o consumo de cimento, maior a retração; c) Natureza do agregado: quanto menor o módulo de deformação do agregado, maior sua suscetibilidade à compressão isotrópica e portanto, maior retração do cimento e também maior retração dos agregados com maior poder de absorção de água; d) Granulometria dos agregados : quanto maior finura dos agregados , maior será a quantidade necessária de pasta de cimento para recobri-los , portanto , maior será a retração; e) Quantidade de água na mistura: quanto maior a relação água/cimento, maior retração de secagem; f) Condições de cura: se a evaporação da água iniciar-se antes do términio da pega do aglomerante, isto é, antes de começarem os primeiras reações entre os cristais desenvolvidos com a hidratação, a retração poderá ser acentuadamente aumentada. Sem dúvida a relação água/ cimento é a que mais influencia a retração de um produto à base de cimento. A retração da laje de concreto armado poderá provocar o aparecimento de fissuras na própria laje, contudo, o efeito mais nocivo da retração de lajes será a fissuração de paredes solidárias à laje. Estudos desenvolvidos na Suécia, indicam que fissuras horizontais, oriundas da retração de lajes, poderão aparecer também em paredes de andares intermediários, de edifícios constituídos por alvenaria estrutural, nesse caso , as fissuras poderão surgir imediatamente abaixo da laje ou nos cantos superiores de caixilhos, conforme figura abaixo.
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