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FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO Lucimara Ferreira Magalhães Introdução à fisiologia do exercício OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Contrastar os termos homeostasia e estado estável. > Diferenciar atividade física de exercício. > Definir sedentarismo. Introdução No âmbito da fisiologia do exercício, existem inúmeras formas de mensurar adaptações e de monitorar a prática de atividades físicas. Pela análise dessas informações, é possível aprimorar a performance e o rendimento de atletas e os níveis de saúde da população em geral. Ademais, as análises fisiológicas permitem aferir os ganhos e controlar as atividades físicas de populações especiais. Dentre os principais parâmetros a serem observados pelo profissional da área, destacam-se as noções de homeostase e estado estável e as distinções entre atividade física e exercício físico. Além disso, nos dias de hoje o sedentarismo também se impõe cada vez mais como um tema de grande relevância nos estudos de fisiologia do exercício. Neste capítulo, você vai estudar os conceitos e as diferenças entre homeostase e estado estável e entre atividade física e exercício físico. Além disso, o conceito de sedentarismo também será examinado, associado a formas de calcular o gasto energético no âmbito da fisiologia do exercício. Homeostasia e estado estável A fisiologia do exercício estuda o comportamento do corpo frente às adaptações provocadas pela atividade física e por estímulos sistematizados propostos na prescrição de exercícios físicos. Assim, seu foco é a forma como as alterações acontecem, a fim de prever as adaptações que podem ocorrer frente aos estí- mulos. Dentro dessa temática, podemos incluir estudos voltados ao esporte e também à saúde de uma forma geral. Segundo Wilmore e Costill (2001), a melhora do condicionamento e da aptidão física está relacionada às melhores condições de desempenho no esporte e na saúde da população comum. No contexto da fisiologia do exercício, são observadas adaptações fisio- lógicas dos sistemas frente ao estímulo externo, ou seja, a atividade física. Existem diversas formas de mensurar as capacidades físicas e fisiológicas corporais, como exames laboratoriais, respiratórios e cardiovasculares. Um exemplo importante é o indivíduo que inicia uma atividade física com o objetivo de emagrecimento e regulação do peso e da proporção corporal, e a partir disso é avaliado e reavaliado a fim de observar as alterações físicas sofridas por seu corpo ao longo da prática de exercícios. No âmbito da fisiologia do exercício, ainda se estuda a interação da nutri- ção no desenvolvimento esportivo e nos ganhos gerais de condicionamento e medidas fisiológicas. Os efeitos da suplementação e da administração de nutrientes podem contribuir para a performance do atleta e para produzir os efeitos esperados a partir de sua integração aos treinos. Além disso, fatores relativos aos treinos podem ser estudados no campo da fisiologia. Fatores como excesso de treino (overtraining) e destreinamento podem provocar mudanças atípicas nos indivíduos, incluindo alterações não esperadas nas adaptações ao exercício (WILMORE; COSTILL, 2001). Homeostase e estado estável O conceito de homeostasia está relacionado com o controle do meio interno corporal frente às adaptações e estímulos externos e internos ao corpo. Nessa concepção, compreende-se que o processo de homeostase acontece de forma contínua, visando o equilíbrio e o funcionamento normal das fun- ções corporais. Introdução à fisiologia do exercício2 A ideia por trás do termo homeostasia foi concebida pelo médico francês Claude Bernard em 1849 para indicar a estabilidade do meio interno, mas o termo em si foi cunhado somente em 1926, pelo fisiologista norte-americano Walter Cannon. A homeostasia ficou conhecida, então, como o equilíbrio fisiológico das funções corporais, incluindo o controle da temperatura corporal, da frequência cardíaca e da pressão arterial. Morfologicamente, a palavra homeostasia é formada pelo prefixo homeo-, que significa semelhante, de mesma natureza, e pelo sufixo -stasia, que significa estabilidade, fixidez, ou seja, que não sofre alterações (TATE; KENNEDY; SEELEY, 2003; SILVERTHORN, 2010). No entanto, é importante ressaltar que as funções corporais e fisiológicas não são estáveis e sofrem alterações o tempo todo. Nesse sentido, há uma faixa de alterações que pode estar considerada dentro da normalidade. A partir disso, podemos compreender que o estado estável se diferencia da homeostase por questões conceituais e formas de interpretações diferentes (TATE; KENNEDY; SEELEY, 2003; SILVERTHORN, 2010). O estado estável está relacionado com a manutenção de um padrão exato de funcionamento corporal, como uma mesma frequência cardíaca ou pressão diastólica. No entanto, se pensarmos na condição de um exercício, por exemplo, para suprir as demandas corporais frente ao estresse e maior exigência de energia e nutrientes, é necessário que o corpo altere muitas de suas funções para a manter o equilíbrio, ou seja, a homeostase. Nesse sentido, podemos compreender que a homeostase é o termo correto para delimitar o controle das alterações corporais, tendo em vista seu dinamismo. O termo homeostasia pode ser relacionado com a palavra homeodinâ- mica, termo, por sua vez, relacionado com as alterações que acontecem no meio interno envolvendo os líquidos corporais. Vale ressaltar que, independentemente do termo utilizado, deve-se considerar que o corpo humano é capaz de monitorar e controlar ou modular suas funções internas, envolvendo todos os sistemas corporais de forma constante e simultânea. Sendo assim, a função da homeostase é basicamente manter a vida e suas funções de forma a não alterar a dinâmica dos sistemas, considerando as situações de estresse e até mesmo as pequenas mudanças diárias. É Introdução à fisiologia do exercício 3 importante lembrar que as funções corporais estão relacionadas e interli- gadas para o funcionamento do organismo no geral. Assim, tanto o estresse físico causado pelo exercício físico de alta intensidade quanto o estresse causado por uma situação emocional instável podem provocar diversas alterações nos sistemas (SILVERTHORN, 2010). Diante disso, é necessário compreender os efeitos do controle home- ostático para os sistemas corporais. É importante ressaltar que o não fun- cionamento ou o excesso de alterações não controláveis podem resultar em distúrbios e alterações que, a longo prazo ou em caráter agudo, podem levar a lesões e doenças. Nesse sentido, o controle homeostático tem grande importância para a regulação dos sistemas e da fisiologia, tanto em situações brandas quanto nas situações mais extremas. Em caso de doenças e distúrbios que levam ao descontrole home- ostático, é importante que os indivíduos disponham de meios para o condicionamento dessas funções e prevenção das situações extremas. As doenças podem ser consideradas de duas formas: as causadas pela insuficiência do sistema ou falha de algum processo e as derivadas de alguma origem externa ao organismo. As causas internas estão relacio- nadas com anormalidade dos tecidos e células, ocasionando tumores ou produção de anticorpos, por exemplo. Nesse contexto, podemos considerar que as doenças hereditárias devem ser classificadas como alterações internas. Já as causadas por estímulos externos podem ser originadas por substâncias tóxicas, traumas de origem física e micror- ganismos (SILVERTHORN, 2010). Em ambas condições de alterações dos níveis da homeostase o corpo tem sempre a função de reequilibrar as funções por meio de mecanismos integrativos entre os sistemas. Esses mecanismos são responsáveis por comandar as respostas adaptativas dos órgãos efetores, normal- mente moduladas pelo sistema nervoso central e sistema endócrino. Os mecanismos pelos quais as compensações acontecem são conhecidos como mecanismos compensatórios, como ilustrado na Figura 1. De acordo com Silverthorn (2010),a falha na tentativa de compensação pode levar ao estado de doença, que é mais em estudado no âmbito da fisiopatologia. Introdução à fisiologia do exercício4 O meio interno e a movimentação das substâncias O meio interno consiste no interior do organismo, onde acontece grande parte do controle homeostático. No contexto interno, existe, por exemplo, a faixa de normalidade para a concentração de água e acidez dos líquidos corporais. Os mecanismos de homeostase são responsáveis por manter essas funções e concentrações dentro da faixa aceitável de equilíbrio. Assim, o corpo é capaz de gerar informações sobre as concentrações de controle e, a partir delas, modulá-las. Logo, temos que o pH sanguíneo, a taxa de batimentos cardíacos e a frequência respiratória estão em conformidade com outras funções e com as demandas exigidas a cada momento (SILVERTHORN, 2010). Figura 1. Mecanismos compensatórios e seus efeitos. Fonte: Silverthorn (2010, p. 10). Introdução à fisiologia do exercício 5 É no meio interno que ocorre a circulação dos líquidos corporais, como o líquido extracelular. Esse líquido está relacionado com o líquido intrace- lular, que é o que circula no interior das células. Pelas relações entre esses dois tipos de líquidos, ocorre o transporte de nutrientes e de metabólitos celulares para os sistemas de recolhimento e excreção. O líquido extracelular funciona como uma espécie de tamponamento e oferece certo controle para o líquido interno, mantendo a estabilidade e homeostase da funcionalidade em âmbito celular. Além disso, o controle e a manutenção das concentrações do pH desse líquido são modulados pelos mecanismos compensatórios já citados. Nesse sentido, quando o indivíduo ingere grandes quantidades de água, o corpo trabalha para eliminar esse excesso, reduzindo os riscos de edema (SILVERTHORN, 2010). Uma ilustração sobre a localização dos líquidos e suas movimentações pode ser observada na Figura 2. Obedecendo às funções estruturais celulares, o líquido tende a se deslocar do meio mais concentrado para o meio menos concentrado e também em direção ao ambiente que possui maior quantidade de eletrólitos. Isso evita que o líquido transborde a célula de água, podendo ocasionar lesões em suas estruturas. Logo, é importante que seja mantida certa constância em suas concentrações para que as funções sejam desempenhadas de forma adequada. Os sistemas de controle funcionam como portas de entrada e de saída, em que são controlados todos os tipos de substâncias presentes no corpo em condições normais. A lei do balanço indica que esse controle está rela- cionado com o ganho e perda de substâncias de forma proporcional para a Figura 2. Localização dos líquidos no meio intracelular e extracelular e suas movimentações. Fonte: Silverthorn (2010, p. 11). Introdução à fisiologia do exercício6 manutenção da estabilidade. Assim, as concentrações corporais podem ser chamadas de cargas corporais, como a carga de sódio corporal. Como exemplo, podemos pensar que a excreção de urina está relacionada com a ingestão de líquidos; sendo assim, excretamos a quantidade de líquido correspondente à que ingerimos (SILVERTHORN, 2010). O balanço de massa corporal também está relacionado com as variáveis citadas, correspondendo à soma entre a massa corporal existente e a entrada ou produção por meios metabólicos, subtraindo-se a excreção ou remoção metabólica. Assim, as concentrações de dióxido de carbono dependem da respiração celular e também da capacidade do corpo em excretá-lo. A excreção é o mecanismo pelo qual acontece a retirada de substân- cias e metabólitos resultantes do funcionamento dos sistemas para o meio externo. Nesse contexto, essas substâncias chegam ao meio externo através da urina, fezes, pele e pulmão. Outra forma é a conversão dessas substâncias em novos produtos para o metabolismo. Vale ressaltar que algumas substâncias podem ser metabolizadas várias vezes por meio dos processos de anabolismo e catabolismo (SILVERTHORN, 2010). O fluxo da massa está relacionado também com o controle das substâncias corporais e é mensurado pelo produto da concentração da substância pelo seu fluxo de volume por minuto. Sendo assim, o resultado pode ser mensurado em volume por minuto da substância em questão. Esse fluxo indica a velocidade de entrada e saída, como, por exemplo, a infusão de soro no sangue em uma determinada velocidade. É importante lembrar que, para essa substância chegar ao nível celular, é essencial que outros mecanismos de transporte contribuam para esse fluxo, como a permeabilidade da membrana plasmática das células (SILVERTHORN, 2010). O controle promovido pela homeostase está relacionado com o estado estável, mas que acontece dinamicamente no organismo. Sendo assim, não podemos dizer que ambos termos possuem significados iguais, tendo em vista as diferenças apontadas nesta seção. Devemos considerar que a manutenção da homeostase é a manutenção do equilíbrio interno, ou seja, da estabilidade, considerando sua dimensão dinâmica. Por outro lado, não podemos considerar que o estado estável está diretamente relacionado com a homeostase, visto que somente significa um estado sem alterações de concentrações, mas que pode estar em desequilíbrio constante (SILVERTHORN, 2010). Introdução à fisiologia do exercício 7 Atividade física versus exercício físico O movimento humano está relacionado com as condições de independência e funcionalidade do indivíduo. Nesse sentido, percebe-se a necessidade de deslocamento e da função locomotora, características inerentes do ser humano. Juntamente a isso, podemos citar o bom funcionamento fisiológico e a manutenção da homeostase, o que confere equilíbrio entre saúde–doença e a qualidade de vida do indivíduo. Frente às discussões sobre a manutenção do estado saudável para a população em geral, os órgãos de saúde têm recomendado a prática de atividade física de regular como forma de manter uma vida mais saudável. A Organização Mundial de Saúde (OMS) define atividade física como todo tipo de movimento corporal realizado pelos sistemas neuromusculoesquelé- ticos (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010). Uma atividade física compreende gasto energético e está relacionada com todas as formas de movimento, como atividades laborais, domésticas, lazer, brincadeiras, entre outras. Nesse con- texto, a diferença entre atividade física e exercício físico reside na presença ou não de sistematização. Enquanto a atividade física compreende todas as formas de movimento, o exercício físico se apresenta de forma sistematizada, voltado para o ganho de aptidão física em geral e com objetivos específicos. Sendo assim, o exercício pode ser classificado como uma subclassificação da atividade física. Ainda de acordo com a OMS (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010), a prática regular de atividade física promove grandes benefícios à população em geral, fugindo das novas rotinas propensas ao imobilismo e sedentarismo. Nesse contexto, as atividades físicas são promissoras na prevenção de doenças crônicas como hipertensão arterial e diabetes, além de terem efeito positivo sobre as condições psicológicas, como autoestima e bem-estar. É importante ressaltar que as recomendações para a atividade física são voltadas para a população normal e que há recomendações diferentes para cada faixa etária. Para indivíduos com mais de 60 anos de idade, por exemplo, são recomenda- dos exercícios de menor intensidade e atividades voltadas para a locomoção e tarefas domésticas, o que confere a manutenção da independência para essa população. Órgãos de saúde pública tendem a indicar a prática de atividades f ísicas para controle ou prevenção de doenças, principalmente as crônicas. De acordo com a OMS (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010), a indicação geral para a população saudável é de cerca de 150 minutos de atividade f ísica moderada ou 75 minutos de atividade vigorosa por Introdução à fisiologia do exercício8semana. O Quadro 1 apresenta uma síntese realizada por um artigo de revisão de literatura sobre as recomendações de atividade f ísica pelos principais órgãos de saúde. Quadro 1. Recomendações de quantidade de atividade física por diferentes órgãos de saúde Recomendação Definição das metas recomendadas* American College of Sports Medicine (ACSM)/2007 30 minutos de atividade física moderada, 5 dias por semana; ou 20 minutos de atividade física vigorosa, 3 dias por semana, em sessões de pelo menos de 10 minutos de duração. OMS/2010 150 minutos de atividade física moderada ou 75 minutos de atividade física vigorosa por semana em sessões de pelo menos 10 minutos de duração. Institute of Medicine/2004 60 minutos de atividade física moderada todos os dias da semana. União Europeia/2008 30 minutos de atividade física moderada todos os dias da semana. Advisory Committee on International Physical Activity Questionnaire (IPAQ)/2005 30 minutos de atividade física moderada, 5 ou mais dias por semana; 20 minutos de atividade física vigorosa 3 ou mais dias por semana; ou qualquer combinação de intensidade, desde que atinja o mínimo de 600 MET-minutos/semana.** * Inativo: para todas as recomendações, foram consideradas inativas as pessoas que não praticam nenhuma quantidade de atividade física. Ativo insuficiente: quando realiza atividade física abaixo do nível recomendado; para cada diretriz, o nível recomendado é diferente, conforme descreve a definição. Ativo: quando alcança as metas recomendadas. Muito ativo: quando ultrapassa as metas recomendadas. ** MET — múltiplo da taxa metabólica em repouso. Fonte: Adaptado de Lima, Levy e Luiz (2014). O objetivo das atividades físicas também pode variar e os exercícios po- dem ser prescritos de acordo com os objetivos ou necessidades dos clientes. Para idosos, por exemplo, a indicação comum visa a melhoria das funções osteomusculares e cardiorrespiratórias em geral. Além disso, é comum que idosos apresentem alguma comorbidade, à qual o profissional deverá dar maior atenção. Essa população ainda tende a ter suas condições psicológicas Introdução à fisiologia do exercício 9 abaladas por fatores culturais e pessoais, o que também pode se beneficiar de práticas coletivas, em que há vínculo entre os praticantes. O Quadro 2 apresenta recomendações para diversas faixas etárias e tipos de atividades que podem ser realizadas para cada uma delas. Quadro 2. Recomendações da OMS para prática de atividade física em diferentes faixas etárias População Recomendação Tipo de atividade Crianças e adolescentes (5 a 17 anos) Pelo menos 60 minutos de atividade física moderada a vigorosa, em pelo menos 3 sessões/semana. Atividades voltadas para o sistema musculoesquelético. Adultos (18 a 64 anos) Pelo menos 150 minutos de atividade moderada ou 75 minutos de atividade vigorosa, podendo combinar as duas modalidades. As sessões podem ser divididas em 2 ou mais sessões semanais. Atividades voltadas para fortalecimento muscular dos principais grupos. Idosos (acima de 65 anos) Pelo menos 150 minutos de atividade moderada ou pelo menos 75 de atividade vigorosa, podendo ser combinadas as duas modalidades. Atividades voltadas para equilíbrio, prevenção de quedas e fortalecimento osteomuscular. Fonte: Adaptado de World Health Organization (2018). Exercício físico e seus efeitos O exercício físico consiste na forma sistematizada, repetitiva e planejada de movimentos, prescritos com ou sem carga e realizados de forma guiada ou livre. Segundo Wilmore e Costill (2001), ele pode ser mensurado e prescrito em diversas formas, intensidades, velocidades, entre outros aspectos, e pode ser altamente controlado para que sua prática atinja objetivos específicos. Além disso, o exercício físico, ou treinamento, apresenta alguns princípios, como individualidade, sobrecarga, especificidade, continuidade e interdependência volume–intensidade. Introdução à fisiologia do exercício10 O princípio da individualidade está relacionado com as condições e res- postas individuais de cada praticante. Já o princípio da sobrecarga está relacionado com a necessidade de aumento da carga para que haja adaptações relacionadas aos ganhos. Por sua vez, o princípio da especificidade está rela- cionado com os objetivos do treinamento e os efeitos almejados. O princípio da continuidade está relacionado com a adaptação ao treinamento a longo prazo para que possam ser alcançados os resultados. Por fim, o princípio da interdependência volume–intensidade está relacionado ao princípio da sobrecarga e embasado na ideia de que o treino é dependente de seu volume e intensidade (TUBINO, 1984). As respostas fisiológicas ao exercício também podem ser agudas ou crôni- cas. As adaptações agudas são relativas às alterações fisiológicas de ordem instantânea ou que ocorrem em curtos períodos durante ou após o exercício, como o aumento da frequência cardíaca e respiratória. As adaptações crô- nicas, por sua vez, são decorrentes da continuidade das adaptações agudas a longo prazo. Sendo assim, a maior parte das adaptações relacionadas ao exercício é considerada crônica, como a amenização da hipertensão arterial, a melhoria da capacidade respiratória, entre outros. Em geral, as adapta- ções promovem a redução da frequência cardíaca e respiratória, menores oscilações na temperatura e maior ativação muscular. Todas as condições são estudadas a partir da fisiologia do exercício e de suas ferramentas de mensuração (WILMORE; COSTILL, 2001). Os exercícios de intensidade leve e moderada podem ser considerados importantes para elevar o senso de independência e revigorar funções cor- porais, principalmente para as populações consideradas especiais, ou seja, que possuem alguma patologia ou distúrbio instalado. Essas atividades são mais bem distribuídas dentro do cronograma semanal e visam alterar em menor intensidade as adaptações corporais frente aos exercícios. Tal nível de intensidade é ideal para o paciente que possui certo limite ou restrições à prescrição de exercícios mais intensos e vigorosos. O exercício considerado de alta intensidade apresenta diversos efeitos de adaptação corporal, como a facilidade de reserva de carboidratos para a produção de energia para os movimentos. Por meio de controles fisiológicos e estratégias baseadas em fisiologia do exercício, os profissionais da área podem planejar formas de melhorar a capacidade de armazenamento de car- boidratos no organismo e reduzir a velocidade de degradação de carboidratos durante a prática de exercícios, como forma de aperfeiçoar a performance do atleta/praticante, visando evitar estresses e desequilíbrios agudos im- portantes no organismo (WILMORE; COSTILL, 2001). Introdução à fisiologia do exercício 11 Sedentarismo Sedentarismo é o termo empregado para denominar a falta de atividade física ou inatividade. Está relacionado com alta prevalência de doenças crônicas comuns e agravamento das situações de enfermidade. Nesse sentido, o se- dentarismo é percebido como um problema de saúde pública que gera gastos adicionais tanto para os sistemas de atendimento quanto para a economia, visto que os trabalhadores tendem a faltar mais ao trabalho por problemas direta ou indiretamente relacionados. De acordo com a OMS (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010), cerca de 23% dos adultos com mais de 8 anos não são suficientemente ativos, e isso inclui a soma de todas as atividades físicas cotidianas de cada pessoa. Isso indica que a população está tendendo cada vez mais ao imobilismo como adapta- ção às novas exigências tecnológicas e laborais. Essas mudanças advém da revolução tecnológica e da proliferação de novas profissões que demandam apenas do uso das habilidades cognitivas. A redução das atividades físicas diárias também pode estar relacionada à falta de lazer e a maior acesso a meios de transporte passivos. Frente às necessidades de melhorar o quadro de sedentarismomundial, a OMS promove, por meio de reuniões e formação de estratégias periódi- cas, indicações e recomendações para melhorar as condições de saúde da população mundial pela prática de atividade física. Sendo assim, no ano de 2004 a OMS lançou a Estratégia Global para Alimentação, Atividade Física e Saúde, com o objetivo de propor o aumento da atividade física por parte da população. Em 2010, publicou as Recomendações Globais sobre Atividade Física para a Saúde, visando à prevenção de doenças não transmissíveis. Nesse documento, são propostos níveis adequados de atividade física e políticas para a implantação dessas recomendações, como: desenvolvimento e implementação de diretrizes nacionais para a atividade física; apoio aos setores públicos para a integração da atividade física; uso da mídia para divulgação; e vigilância e monitoramento da população por órgãos locais competentes (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2010). Atividade física e gasto energético Como se sabe, o gasto energético está relacionado com a quantidade de energia despendida para a atividade ou tarefa. Mesmo na presença de se- dentarismo, ainda há gasto com as funções neurovegetativas, por exemplo. Já as funções locomotoras estão relacionadas com a dissipação de maior Introdução à fisiologia do exercício12 quantidade de energia, principalmente direcionada para o mecanismo de contração muscular. Sendo assim, podemos considerar dois tipos de taxas metabólicas: a basal e a de esforço. As taxas basais representam o mínimo de energia para a manutenção das funções básicas corporais. Durante a atividade física, as taxas de esforço são proporcionais à intensidade e à duração dos estímu- los. É importante ressaltar que outras condições, como a experiência e o condicionamento físico, também promovem alterações nas taxas de esforço habituais. Por esse motivo, não é possível afirmar genericamente a quantidade de energia gasta durante uma caminhada de 30 minutos, por exemplo, pois diversas condições podem interferir no gasto energético (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2011). Quando o exercício é sistematizado e individualizado, além das recomen- dações quanto à duração da atividade física, podem ser tomadas como base as alterações da frequência cardíaca ou do volume de oxigênio consumido para realizar a tarefa. A partir dos cálculos dessas condições, os profissionais podem definir a intensidade do exercício de forma mais objetiva e efetiva, de acordo com as necessidades e individualidades do praticante. Além das avaliações subjetivas do praticante, existem outras formas de classificar o exercício quanto à sua intensidade, como atividade leve, moderada ou pesada. De acordo com McArdle, Katch e Katch (2011), o cálculo da razão de atividade física está relacionado com a comparação entre o gasto energético durante o repouso e durante o esforço. Para homens, o trabalho é considerado leve quando atinge até três vezes o valor do gasto em repouso. Já o trabalho considerado pesado recai na faixa de 6 a 8 vezes a condição de repouso. O múltiplo da taxa metabólica em repouso (MET) é outra forma de mensurar o gasto de energia despendida na atividade física. Sendo assim, 1 MET consiste na quantidade de energia despendida pelo corpo durante o repouso, ou 250 ml de oxigênio por minuto para homens e 200 ml para mulheres. Sendo assim, a atividade física realizada para 2 METs implica no gasto de 500 ml de oxigênio por minuto para homens, e assim sucessivamente (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2011). No entanto, como sabemos, o tamanho corporal também pode ser uma variável influenciadora no gasto energético: quanto maior o corpo, maior o gasto. Sendo assim, para incluir o tamanho corporal ao cálculo do MET, podemos tomar como unidade o consumo de oxigênio por unidade de massa corporal. Nesse contexto, o MET está relacionado com 3,5 ml/kg/minuto, e assim pode-se correlacionar a quantidade de METs com o gasto de oxigênio e tamanho corporal. O Quadro 3 mostra a correlação entre nível de atividade Introdução à fisiologia do exercício 13 física, quantidade de energia despendida, ou quilocaloria (Kcal), volume de oxigênio gasto por minuto, volume de oxigênio por peso por minuto e quantidade de METs (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2011). Quadro 3. Relação do gasto energético em mensurações diferentes Nível Gasto energético Kcal/min L/min ml/kg/min METs Homens Leve 2,0 a 4,9 0,4 a 0,99 6,1 a 15,2 1,6 a 3,9 Moderado 5,0 a 7,4 1,00 a 1,49 15,3 a 22,9 4,0 a 5,9 Pesado 7,5 a 9,9 1,50 a 1,99 23,0 a 30,6 6,0 a 7,9 Muito pesado 10,0 a 12,4 2,00 a 2,49 30,7 a 38,3 8,0 a 9,9 Extremamente pesado ≥ 12,5 ≥ 2,50 ≥ 38,4 ≥ 10,0 Mulheres Leve 1,5 a 3,4 0,30 a 0,69 5,4 a 12,5 1,2 a 2,7 Moderado 3,5 a 5,4 0,70 a 1,09 12,6 a 19,8 2,8 a 4,3 Pesado 5,5 a 7,4 1,10 a 1,49 19,9 a 27,1 4,4 a 5,9 Muito pesado 7,5 a 9,4 1,50 a 1,89 27,2 a 34,4 6,0 a 7,5 Extremamente pesado ≥ 9,5 ≥ 1,90 ≥ 34,5 ≥ 7,6 Fonte: Adaptado de McArdle, Katch e Katch (2011). A partir da prática de atividade física regular, o indivíduo passa a gas- tar uma quantidade de energia maior mesmo em repouso. Sendo assim, o indivíduo sedentário apresenta constantemente menores taxas de gasto energético. O gasto energético também pode ser mensurado em proporção direta com o nível de frequência cardíaca. Em programas de reabilitação, por exemplo, é comum que se trabalhe com uma taxa entre 60 a 80% da frequência cardíaca máxima. Segundo McArdle, Katch e Katch (2011), essa é uma medida Introdução à fisiologia do exercício14 importante, visto que é de fácil acesso e não possui custos adicionais com exames laboratoriais ou equipamentos tecnológicos. Uma maneira de calcular a frequência cardíaca máxima é a seguinte: 220 menos a idade para homens, e 200 menos a idade para mulheres. Es- ses valores são genéricos para a população, devendo o profissional ter os cuidados adicionais de acordo com a individualidade do praticante. Nesse sentido, o cálculo da frequência cardíaca máxima é obtido com maior rigor e o exercício pode ser controlado a partir de uma porcentagem desse total, de acordo com a intensidade que se quer alcançar em cada treino (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2011). Referências LIMA, D. F. de; LEVY, R. B.; LUIZ, O. do C. Recomendações para atividade física e saúde: consensos, controvérsias e ambiguidades. Revista Panam. Salud. Publica, v. 36, nº. 3, p. 164–170, 2014. Disponível em: https://www.scielosp.org/pdf/rpsp/2014.v36n3/164-170. Acesso em: 9 set. 2020. MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: energia, nutrição e desempenho Humano. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011. SILVERTHORN, D. U. Fisiologia humana: uma abordagem integrada. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. TATE, P.; KENNEDY, J.; SEELEY, R. R. Anatomia e fisiologia. 6. ed. Loures: Lusociência, 2003. TUBINO, M. J. G. Metodologia científica do treinamento desportivo. 3. ed. São Paulo: Ibrasa, 1984. WILMORE, J. H.; COSTILL, D. L. Fisiologia do esporte e do exercício. Barueri: Manole, 2001. WORLD HEALTH ORGANIZATION. Global recommendations on physical activity for health. Genebra: WHO, 2010. (E-book). WORLD HEALTH ORGANIZATION. Physical activity. 2018. Disponível em: https://www. who.int/en/news-room/fact-sheets/detail/physical-activity. Acesso em: 9 set. 2020. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Introdução à fisiologia do exercício 15
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