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PROJETO DELTA – CADERNO DE RESUMO – DIREITO CONSTITUCIONAL Capitulo 4 – Poder Constituinte Poder Constituinte Originário É responsável pela escolha e formalização do conteúdo das normas constitucionais. O adjetivo originário é empregado para diferenciar o poder criador de uma nova constituição daqueles instituídos para alterar o seu texto ou elaborar as constituições dos estados membros da federação. O PCO pode ser definido, portanto, como um poder político, supremo e originário, responsável por estabelecer a constituição de um estado I. Espécies A. Quanto ao modo de deliberação constituinte a. Poder constituinte Concentrado (ou demarcado) – quando o surgimento da constituição resulta da deliberação formal de um grupo de agentes, como no caso das constituições escritas; b. Poder constituinte difuso – quando a constituição é resultante de um processo informal em que a criação ou modificação de suas normas ocorre a partir da tradição de uma determinada sociedade ou de mutação constitucionais realizadas por meio da intepretação conferida aos dispositivos pelos tribunais. B. Quanto ao momento de manifestação a. Histórico – o responsável pelo surgimento da 1ª Constituição de um estado; ou b. Revolucionário – o que elabora as constituições posteriores a partir de uma revolução ou de transição constitucional. C. Quanto ao papel na elaboração do documento constitucional O poder constituinte costuma ser dividido em duas espécies complementares, e não antagônicas. São eles: a. Poder constituinte material – é o responsável por definir o conteúdo fundamental da constituição, elegendo valores a serem consagrados e a ideia de direito que irá prevalecer; b. Poder constituinte formal – atuam em momento posterior ao poder constituinte material, sendo responsável pela formalização das escolhas políticas no plano normativo. O poder constituinte material precede o formal sob 2 aspectos: (i) logicamente, porque a ideia de direito precede a regra do direito; o valor comanda a norma; a opção política fundamental, a forma que elege para agir sobre os fatos; a legitimidade, a legalidade; e (ii) historicamente posto que o triunfo de certa ideia de direito ou nascimento de certo regime ocorre antes de sua formalização. II. O fenômeno constituinte O fenômeno constituinte pode se manifestar em diferentes situações. A elaboração da constituição pode ser decorrente do surgimento de um novo estado ou de algum fato suficientemente relevante para causar a ruptura com a ordem jurídica estabelecida. A criação de novos Estados, na atualidade, costuma ocorrer nos casos de divisão de um país, ou de união de países ou, ainda, de emancipação de colônias ou libertação de alguma forma de dominação. No caso de estados já existentes, a nova constituição pode surgir em decorrência de revolução, de transição constitucional ou de derrota em uma guerra. A revolução se caracteriza pelo triunfo de um novo direito ou de um novo fundamento de validade do sistema jurídico positivo do estado. A função ou atividade do Poder Constituinte Originário é essencialmente revolucionária, na medida em que esse poder tende a substituir a ordem política e social existente por uma nova. As revoluções podem ser frutos de um (a) golpe de Estado, quando o exercício do Poder Constituinte é usurpado por um governante; ou de uma insurreição (revolução em sentido estrito), quando implementada por um grupo ou movimento externo aos poderes constituídos. PROJETO DELTA – CADERNO DE RESUMO – DIREITO CONSTITUCIONAL A transição constitucional tem como nota distintiva a observância das competências e formas de agir preestabelecidas, é marcada por um dualismo: enquanto a nova constituição é preparada, a anterior subsiste. Canotilho menciona a função de bootstrapping como uma reação interna ao processo constituinte, deflagrada quando a assembleia rejeita se submeter ao seu ato de criação e busca legitimar o resultado de seus trabalhos diretamente perante o povo ou convenções especiais. Nas palavras de Canotilho: Bootstrapping é o processo pelo qual uma assembleia constituinte liberta os atadores que as autoridades lhe haviam posto, arrogando-se a todos ou a alguns dos poderes destas mesmas autoridades. Esta libertação de amarras tem os seus limites. [...] as normas constitucionais dever revelar-se aptas a conseguir uma articulação das preferências e interesses públicos dos produtores de normas e as preferências e interesses dos destinatários. III. Natureza Pode variar conforme a concepção de direito adotada. Na concepção jusnaturalista trata-se de um poder jurídico (ou de direito); sustentam que o Poder Constituinte, apesar de não encontrar limites no direito positivo anterior estaria subordinado aos princípios do direito natural. Na concepção positiva, por inexistente outro direito além daquele posto pelo estado, o poder constituinte é anterior e se encontra acima de toda e qualquer norma jurídica, devendo ser considerado um poder político (extrajurídico ou de fato) resultante da força social responsável por sua criação. Por ter o ser sentindo na existência política, o sujeito do Poder Constituinte pode fixar livremente o modo e a forma da existência estatal a ser consagrada na constituição, sem ter que se justificar em uma norma ético ou jurídica. IV. Titularidade e exercício A questão envolvendo a titularidade do PCO não encontra resposta homogênea. Para a doutrina majoritária, reside sempre na soberania do povo. Em sentido diverso, há quem atribua a titularidade do PC não apenas ao povo, mas também ao monarca, as facções ou elites dirigentes ou, ainda, aos partidos políticos (resposta autocrática). O papel do povo no processo constituinte é sobretudo, de legitimação do agente que exerce o Poder. A titularidade do PC não pode ser confundida com o seu exercício. Titular é quem detém o poder, ainda que eventualmente este seja exercido por outros agentes. A elaboração do texto constitucional por um grupo minoritário não o transforma no detentor da titularidade do PC, apenas revela o exercício ilegítimo desde poder por ter sido usurpado de seu autêntico titular. V. Características essenciais Sob a ótica positivista, trata-se de um poder: a. Inicial – por não existir nenhum outro antes ou acima dele; b. Autônomo – por caber apenas ao seu titular a escolha do conteúdo a ser consagrado na constituição; e c. Incondicionado – por não estar submetido a nenhuma regra de forma ou de conteúdo. Sob uma perspectiva jusnaturalista: a. Incondicionado juridicamente pelo poder positivo, mas submetido aos princípios do direito natural; b. Permanente – por não se exaurir com a conclusão de sua obra; e c. Inalienável – devido a impossibilidade de transferência, pela nação, dessa titularidade. VI. Limitações materiais A visão positivista de que o PCO tem plena liberdade para definir o conteúdo a ser consagrado no texto constitucional é refutada com base no argumento de que, fora do direito positivo interno, existem limitações a serem observadas. Jorge Miranda aponta três categorias de limites materiais: a. Limites transcendentes – são aqueles que, advindos de imperativos de direito natural, de valores éticos ou de uma consciência jurídica coletiva, impõe-se à vontade do Estado, demarcando sua esfera de intervenção. O dever de manutenção, imposto ao PCO pelo princípio da proibição de retrocesso, dos direitos fundamentais objeto de consensos sociais profundos ou diretamente ligados à dignidade da pessoa humana; PROJETO DELTA – CADERNO DE RESUMO – DIREITO CONSTITUCIONAL b. Limites imanentes – relacionam-se à configuração do Estado à luzo do Poder Constituinte Material ou à própria identidade do Estado, de que cada constituição representa apenas um momento da marcha histórica; c. Limites heterônomos – são provenientes da conjugação com outros ordenamentos jurídicos. Sob essa perspectiva, seria vedado às futuras constituiçõesbrasileiras consagrar a pena de morte para além dos casos de guerra externa, ante o disposto na Convenção Americana sobre Direitos Humanos que, promulgada pelo Decreto nº 678, dispõe em seu Art. 4º, § 3º: Não se pode restabelecer a pena de morte nos Estados que a hajam abolido. VII. Legitimidade A análise pode ser feita sob dois prismas distintos. Do ponto de vista subjetivo, a titularidade está relacionada à titularidade e ao exercício do poder. Para ser considerado legítimo, o Poder Constituinte deve ser exercido por representantes do povo (titular), eleitos especificamente para esse fim (Assembleia Nacional Constituinte) e nos limites da delegação. Do ponto de vista objetivo, o Poder Constituinte deve consagrar na constituição um conteúdo valorativo em conformidade com determinadas limitações materiais e/ou correspondentes aos anseios de seu titular. O critério de legitimidade do Poder Constituinte não é a mera posse do poder, mas a conformidade do ato constituinte com a ideia de justiça e com os valores radicados na comunidade em um determinado momento histórico. A consagração de uma justa ordenação dos interesses e forças sociais das quais a constituição se originou é fator indispensável para sua legitimidade. Poder constituinte decorrente A CF impôs aos estados-membros a necessidade de (re) criar as respectivas constituições, a fim de se adaptarem à nova realidade; tal tarefa é exercida pelo Poder Constituinte decorrente, tendo este um caráter de complementariedade em relação à Constituição, atuando para “perfazer a obra do Poder Constituinte Originário nos Estados Federais, para estabelecer a constituição dos seus estados componentes. Costuma ser dividido em duas espécies: i. Poder Constituinte Decorrente Inicial, instituidor ou institucionalizador – responsável pela elaboração das constituições estaduais; ii. Poder constituinte decorrente reformador, de revisão ou de segundo grau – tem a função de promover as alterações no texto das constituições estaduais. I. Natureza É objeto de grande controvérsia na doutrina, a questão da natureza jurídica do PCD. Anna Cândida da Cunha Ferraz sustenta a manifestação deste poder deve ser considerada constituinte, pelas seguintes razões: i. a unidade federada é um estado; ii. o poder constituinte originário não é totalmente ilimitado; iii. o estado membro goza de autonomia constitucional; iv. o poder institucionalizador das unidades federadas; v. a descentralização vertical do poder impõe e exige a constituição locais ao lado da constituição federal; e vi. o estado membro possui competências próprias, as quais somente podem ser distribuídas entre os poderes constituídos estaduais, por meio da constituição estadual. Celso Ribeiro Bastos em sentido oposto, defendem serem de tal monta as diferenças em relação ao PCO que parece impróprio conservar-se o mesmo nome para realidades tão dispares. Segundo o constitucionalista, o único ponto em comum entre eles é o fato de ambos se reunirem para elaborar uma constituição, tudo o mais são diferenças. Raul Machado Horta adota entendimento intermediário, defendendo que o Poder Constituinte decorrente possui uma dupla natureza: é um poder originário em reação à constituição do estado membro e, ao mesmo tempo, é um poder derivado por ter sua origem na constituição federal e se submeter às suas normas. Três elementos PROJETO DELTA – CADERNO DE RESUMO – DIREITO CONSTITUCIONAL informadores da natureza do PCD: a origem jurídica, a delimitação da competência e a atividade sucessiva à do constituinte federal. II. Constituinte Federal Possui características diametralmente opostas ás do Poder Constituinte Originário. O Poder Constituinte Decorrente é instituído pela CF e limitado por suas normas; é um poder de direito, secundário, limitado e condicionado. III. Existe poder constituinte fora dos estados membros Há controvérsia acerca da existência de outros poderes constituintes decorrentes, além do estadual. A federação brasileira é composta por quatro entes federados: União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Todos possuem as mesmas autonomias, inclusive, auto-organização por meio de estatutos próprios. No DF e Municípios, embora tenham recebido denominação diversa, esses estatutos têm a mesma natureza de autênticas constituições por serem responsáveis pela estruturação e organização dos respectivos entes federativos. Em sendo admitida a correção de tais premissas não parece haver óbice ao reconhecimento da existência de um Poder Constituinte decorrente não apenas nos estados, mas também no DF e municípios. No caso do DF, esse parece ser o entendimento majoritário. A lei orgânica distrital, além de retirar seu fundamento de validade diretamente da CF, tem natureza de verdadeira constituição, características reforçadas pela possibilidade de servir como parâmetro para o controle de constitucionalidade concentrado exercido pelo TJ. No que se refere aos municípios, parece predominar entendimento diverso. O principal argumento contrário à existência de um Poder Constituinte Decorrente nesta esfera federativa é a subordinação da lei orgânica municipal à constituição do respectivo Estado. O poder constituinte derivado decorrente deve ser de segundo grau, o que não acontece com o poder encarregado de elaborar a lei orgânica dos municípios. Nos territórios federais, descabe pretender a existência de um poder desta natureza, por tratar de meras autarquias territoriais pertencentes à União, e não de entes federativos. IV. Limitações impostas à auto-organização dos Estados As constituições estaduais não apenas estão submetidas às normas da CF, como devem guardar simetria como o modelo básico federal em determinadas matérias. As denominadas normas de observância obrigatória (normas centrais ou normas de reprodução) impõe limitações condicionantes ao poder de organização dos estados-membros e estabelecem paradigmas para a elaboração de normas das constituições estaduais, conferindo-lhes homogeneidade. Na CF/1988 as normas de observância obrigatória não foram elencadas de forma textual. Adotou-se uma formulação genérica que, embora não tecnicamente confira maior liberdade de auto-organização aos estados-membros, cria o risco de possibilitar interpretações excessivamente amplas na identificação de tais normas. Não se confunde com as normas de mera imitação, porquanto estas designam dispositivos voluntariamente copiados da CF pelo PCD. São diferenciadas em três espécies: i. Princípios constitucionais sensíveis – representam a essência da organização constitucional da federação brasileira e estabelecem limites à autonomia organizatória dos Estados-membros (Art. 34, VII, CF); ii. Princípios constitucionais extensivos – consagram normas organizatórias para a União cuja incidência se estende aos Estados por previsão constitucional expressa (Art. 28 e 75, da CF) ou implícita (Art. 58, §3º, 59, ss, da CF); e iii. Princípios constitucionais estabelecidos – restringem a capacidade organizatória dos estados federados por meio de limitações expressas (Art. 37, CF) ou implícitas (Art. 21, da CF). PROJETO DELTA – CADERNO DE RESUMO – DIREITO CONSTITUCIONAL Poder Constituinte Derivado É responsável pelas alterações no texto constitucional segundo as regras instituídas pelo Poder Constituinte Originário. Caracteriza-se por ser um poder instituído, limitado e condicionado juridicamente. A CF/1988 estabeleceu a possibilidade de sua manifestação por meio de reforma (Art. 60, CF) ou de revisão (Art. 3º, ADCT); I. Limitações impostas ao Poder Reformador As limitações impostas pela CF/1988 estão consagradas no Art. 60, da CF. A. Limitações temporais Consiste na proibição de reforma de determinados dispositivos durante certo período de tempo após ser promulgada uma nova constituição. O objetivo é garantir a estabilidade de novos institutos. B. Limitações circunstanciaisSão limitações consubstanciadas em normas aplicáveis a situações excepcionais, de extrema gravidade, nas quais a livre manifestação do poder reformador possa estar ameaçada. A instabilidade institucional poderia motivar alterações precipitadas e desnecessárias no texto da CF. A CF veda qualquer tipo de reforma de seu texto durante a vigência de intervenção federal, estado de necessidade ou estado de sítio (Art. 60, § 1º, CF). C. Limitações Formais (processuais ou procedimentais) Classificadas por parte da doutrina como limitações implícitas, referem-se aos órgãos competentes e aos procedimentos a serem observados na alteração do texto constitucional. As limitações formais subjetivas são relacionadas a competência para propositura de emendas a constituição. As limitações formais objetivas são referentes ao processo de discussão, votação, aprovação e promulgação das PEC’s. O processo legislativo das emendas (Art. 60, CF) é mais dificultoso que o processo legislativo ordinário (Art. 47, CF). A proposta de emenda deve ser discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, sendo necessário o voto de 3/5 (60%) dos membros da Câmara e do Senado para sua aprovação. Toda a fase de elaboração ocorre dentro do parlamento, cabendo às mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal promulgar as emendas com o respectivo número de ordem e ao Congresso Nacional determinar sua publicação. A matéria constante de proposta de emenda constitucional rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. É o chamado princípio da irrepetibilidade. A sessão legislativa ordinária é anual e compreende dois períodos legislativos: 2 de fevereiro a 17 de julho e 1º de agosto a 22 de dezembro. Tal limitação não se aplica à hipótese de rejeição do substitutivo, espécie de proposição que altera integralmente proposta de emenda ou projeto de lei originariamente apresentados. Quando o substitutivo é rejeitado, o projeto originário pode ser votado por não se tratar de nova proposta. D. Limitações materiais (substanciais) Destacam-se duas teorias: a do pré-comprometimento (Jon Elster) e da democracia dualista (Bruce Ackerman). O argumento baseado no pré-compromisso é o de que a proteção qualificada de determinados conteúdos, visa a assegurar o próprio processo democrático ao resguardar metas de longo prazo, geralmente subavaliadas por maiorias ávidas em maximizar seus interesses imediatos. As constituições democráticas são vistas como mecanismos de autovinculação adotados pela soberania popular para se proteger de suas próprias paixões e fraquezas. Jon Elster traça um paralelo entre este e a solução adotada por Ulisses para não sucumbir ao canto das sereias. Oscar Vilhena Vieira adverte que esta analogia deve ser tomada com cautela, pois nesse caso se trata de uma limitação pessoal, ao passo que a rigidez atribuída às decisões constituintes tem um caráter supraindividual, sendo imposta não apenas à sociedade como um todo, mas especialmente às correntes vencidas no embate constituinte, as quais podem se converter em maioria no futuro. Em contrapartida, os mecanismos PROJETO DELTA – CADERNO DE RESUMO – DIREITO CONSTITUCIONAL constitucionais tradicionais de pré-comprometimento não estabelecem uma vedação total à liberdade de ação dos parlamentos, salvo em relação às cláusulas pétreas. Nos termos da teoria da democracia dualista, as decisões adotadas pelo povo em contexto de grande mobilização cívica, como no caso das Assembleias Constituintes, devem ser protegidas do alcance de seus representantes, manifestada em momentos nos quais a cidadania não se apresenta de forma tão intensa. Sob esta perspectiva, Bruce Ackerman faz uma distinção entre a política ordinária, realizada cotidianamente por meio das deliberações dos órgãos de representação popular, e a política extraordinária, correspondente aos momentos de intensa manifestação da cidadania que, por estar em um patamar superior ao da política ordinária, pode impor limites legítimos ao seu exercício. Veiculadas por meio de cláusulas pétreas, as limitações materiais impostas ao Poder Reformador restringem a alteração de determinados conteúdos, seja de forma expressa, seja de maneira implícita, a fim de proteger institutos e valores imprescindíveis à preservação da identidade constitucional ou à continuidade do processo democrático. a. Cláusulas pétreas O dispositivo deve ser interpretado no sentido de se impor a preservação do núcleo essencial dos princípios e institutos protegidos por cláusulas pétreas, e não como uma vedação absoluta de alteração de seu texto (intangibilidade literal). Um dos grandes desafios da jurisdição constitucional é conseguir encontrar um ponto de equilíbrio entre a preservação do núcleo essencial das cláusulas pétreas e a constante necessidade de desenvolvimento da constituição, de modo a evitar a ruptura como única alternativa legítima. São cláusulas pétreas previstas na CF: forma federativa - deve ser conceituada a partir do modelo concretamente adotado pelo constituinte originário. A violação de seu núcleo essencial ocorrerá, em regra, nos casos de alteração potencialmente capazes de afetar as autonomias constitucionalmente conferidas a quaisquer dos entes políticos da federação brasileira. Da forma federativa de Estado defluem princípios cujo núcleo essencial deve ser protegido. É o caso por exemplo do princípio da indissolubilidade do pacto federativo, princípio da imunidade tributária reciproca. À preservação institucional das próprias unidades federativas, a imunidade recíproca é considerada cláusula pétrea pelo STF; voto direto, secreto, universal e periódico – a palavra voto tem sido empregada não apenas em sua acepção própria, mas também no sentido de sufrágio e de escrutínio. O sufrágio é a essência do direito político e consiste na capacidade de eleger, ser eleito e, de forma geral, participar da vida política do Estado. O voto obrigatório não é considerado cláusula pétrea; princípio da separação dos poderes – estabelece uma repartição das funções estatais entre órgãos distintos com a finalidade de proteger as liberdades dos particulares por meio da limitação do poder do Estado; direitos e garantias individuais – embora consagradas de forma sistemática no Art. 5º, da CF/1988, não se restringem a esse dispositivo, encontrando-se espalhados por toda a Constituição. Se por um lado, há direitos e garantias desta espécie consagrado em outros dispositivos constitucionais, dentre os incisos do Art. 5º há dispositivos sem o caráter de fundamentalidade e, por isso é passiveis de serem suprimidos por emenda. É o caso, por exemplo, de certas normas penais. Há quem defenda que todos os direitos e garantias fundamentais, e não apenas os individuais, foram consagrados como cláusulas pétreas. São invocados, dentre outros, os seguintes argumentos: i. a expressão direitos e garantias individuais, utilizados no Art. 60, § 4º, IV, encontra reproduzida em nenhum outro dispositivo da Constituição, razão pela qual mesmo com base numa interpretação literal, não se poderia confundir estes direitos individuais com os direitos individuais e coletivos do Art. 5º de nossa lei fundamental; ii. não existe expressamente na CF/1988 qualquer regime jurídico diferenciado a justificar a distinção no que se refere à fundamentalidade dos direitos sociais; e iii. a intenção do legislador constituinte originário, quando da elaboração do dispositivo foi contemplar todos os direitos e garantias fundamentais. b. Cláusulas pétreas implícitas Dois critérios podem ser utilizados na localização de limites materiais implícitos: a legitimidade ou a identidade da constituição. Devido a abrangência do rol de princípios elencados no § 4º, do Art. 60, não parece ser adequada a defesa de limites implícitos como modo de suprir um suposto déficit da evocação destedispositivo ao núcleo da legitimidade da constituição. Isso não exclui, a possibilidade de fundamentação da existência de uma limitação PROJETO DELTA – CADERNO DE RESUMO – DIREITO CONSTITUCIONAL implícita como decorrência daquele núcleo de legitimidade ao qual fazem referência as cláusulas pétreas expressas, mas que não se pode ter como indiscutivelmente contemplada por elas. Somente a atividade hermenêutica poderá revelar os princípios constitucionais que, ainda que não contemplados expressamente nas cláusulas pétreas, guardam estreita vinculação aos princípios por elas protegidos e estão, por isso, cobertos pela garantia de imutabilidade que delas dimana. Desde a formação inicial feita por Carl Schmitt, a ideia de identidade da constituição está no centro do problema da localização dos limites implícitos, ainda que se trate de uma noção bastante imprecisa, que exige um juízo de valor, não sendo uma tarefa eminentemente descritiva. De acordo com a delimitação da identidade da Constituição é uma operação complexa que diz respeito não à interpretação dos dispositivos da Constituição, mas da ordem constitucional em sua inserção na realidade histórica. Dentre as cláusulas pétreas implícitas estão as limitações impostas pelo Poder Constituinte Originário ao Poder Reformador. A maior parte da doutrina brasileira não admite alterações nos limites constitucionais, formais e materiais previstos no Art. 60, da CF/1988. Há quem defenda a possibilidade da chamada dupla reforma (reforma em dois tempos ou dupla revisão), na qual a modificação do texto constitucional ocorre em duas etapas: na primeira, o limite imposto pelo poder constituinte originário é revogado, e em seguida, altera-se a norma constitucional de fundo em relação à qual a proteção foi afastada. Os fundamentos da República Federativa do Brasil (Art. 1º, da CF1) por conferirem identidade material à constituição, devem ser considerados cláusulas pétreas. Para parte da doutrina, seria desta espécie não apenas os fundamentos do Estado Brasileiro, mas todos os princípios fundamentais do Título I da CF/1988. Ivo Dantas defende a impossibilidade de o sistema presidencialista e da forma republicana de governo, sob a alegação de terem sido submetidos a plebiscito para se tornarem definitivos. Outra linha de raciocínio, complementar a esta, é no sentido da incompatibilidade do sistema parlamentarista com o princípio da separação dos poderes nos termos em que foi consagrado na CF. De fato, não parece ser possível compatibilizar a forma monárquica de governo com alguns princípios petrificados na constituição, em especial, o da separação dos poderes e o da isonomia. Em relação ao sistema parlamentarista, no entanto, parece-nos que a conclusão deve ser em outro sentido. Mesmo porque a análise do contexto histórico quando da elaboração da Constituição revela que a previsão do plebiscito teve sentido de compromisso dilatório, resultante da inexistência de consenso quanto ao sistema de governo (presidencialista ou parlamentarista) a ser adotado. Em relação ao Presidencialismo, não parece existir qualquer relação essencial entre esse sistema de governo e o núcleo da legitimidade da Constituição. A separação de poderes, assim como todo o princípio, pode ser realizada de diferentes modos. Sua consagração não significa a impossibilidade de alteração da sistemática de inter-relação entre os poderes, mas apenas a vedação de transformações que possam ser interpretadas como uma tendência à abolição do próprio princípio. De todo modo, qualquer alteração do sistema de governo, para ser considerada legítima em face do plebiscito anteriormente realizado, deverá ser submetida a uma nova consulta popular (plebiscito ou referendo). II. Limitações impostas ao Poder Revisor A revisão consiste em uma via extraordinária e transitória de alteração do texto constitucional (Art. 3º, do ADCT2). Possuía uma limitação temporal de 5 anos, contados a partir de 05 de outubro de 1988, data da promulgação da 1 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. 2 Art. 3º. A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral. PROJETO DELTA – CADERNO DE RESUMO – DIREITO CONSTITUCIONAL CF/1988. Por ter sido consagrada em uma norma constitucional transitória, cuja eficácia se exauriu com sua aplicação, a possibilidade de novas revisões constitucionais tem sido descartada pela jurisprudência do STF. Em relação as limitações formais, o Poder Constituinte Originário estabeleceu um procedimento menos rígido de reforma, de modo a tornar viável, se necessário, uma ampla e profunda alteração do texto constitucional. A aprovação de emendas de revisão ficou condicionada ao voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral. As limitações materiais e circunstanciais eram consideradas as mesmas impostas ao poder reformador. Poder Constituinte Supranacional Poder destinado a elaborar uma constituição supranacional, apta a vincular os Estados ajustados sob o seu comando e fundamentada na vontade do povo-cidadão universal, seu verdadeiro titular. É considerado constituinte por ter a força de criar uma ordem jurídica de cunho constitucional, na medida em que reorganiza a estrutura de cada um dos estados que adere ao direito comunitário e submete as constituições nacionais ao seu Poder Supremo.
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