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Ana Carolina Thomaz Mendes Estratificação de risco cardiovascular e dislipidemias A doença cardiovascular aterosclerótica é a principal causa de morte no mundo todo; a prevenção visa os fatores de risco modificáveis. A identificação e o controle desses fatores reduzem as taxas de eventos cardiovasculares. Fatores de risco estabelecidos Tabagismo O consumo de tabaco atualmente causa cerca de 6,4 milhões de mortes por ano (11,5% de todas as mortes), das quais aproximadamente 2,4 milhões são relacionadas com DCV. Mantido o padrão atual de tabagismo, a carga global de doença atribuível ao tabaco alcançará 10 milhões de mortes em 2030. O fumo passivo é outra causa bem-definida de DCC, responsável por 886 mil mortes de não fumantes em 2015. Embora a restrição legal ao fumo tenha efeitos benéficos imediatos e em longo prazo, a implementação varia muito entre os países. O tabagismo aumenta a incidência e a mortalidade associadas à DAC. Estudos observacionais mostram que a cessação do tabagismo reduz o risco de eventos coronarianos em questão de meses. Para os pacientes que fumam, deve-se implementar o aconselhamento e, conforme a necessidade, a terapia farmacológica para auxiliar na cessação. Considerar o rastreamento único com ecografia para aneurisma de aorta abdominal em homens com idade de 65-75 anos que já tenham fumado. Distúrbios lipídicos No que se refere às DCVs, um elemento-chave nas mudanças dietéticas é o aumento na ingestão das gorduras animais saturadas e das gorduras vegetais hidrogenadas, que contêm ácidos graxos trans aterogênicos, juntamente com a redução no consumo de alimentos vegetais e o aumento na ingestão de carboidratos simples. A mecanização que acompanha a transição econômica leva a mudanças no tipo de atividade laboral, passando de um perfil de trabalho agrícola, fisicamente exigente, para outro de base industrial e de serviços, em grande parte sedentário. O sedentarismo tem aumentado nos países que passam por processo acelerado de urbanização como parte da transição econômica. No mundo, estima-se que os níveis elevados de colesterol tenham algum papel em 56% dos eventos isquêmicos cardíacos e em 18% dos AVCs, chegando a 4,3 milhões de mortes anualmente. Tanto o colesterol LDL elevado quanto o HDL baixo estão associados a eventos cardiovasculares. Cada aumento de 1 mg/dL no LDL sérico correlaciona-se com uma elevação de 2 a 3% no risco de DAC; cada redução de 1 mg/dL no HDL aumenta o risco em 3 a 4%. O rastreamento do perfil lipídico para adultos deve incluir colesterol total, triglicerídeos, HDL e LDL. Atividade física regular, melhora da dieta e obtenção de peso corporal desejável são recomendados para todos os pacientes com dislipidemia. As abordagens farmacológicas dependem da presença ou risco de DCVAS. O tratamento deve ser mais vigoroso em pacientes com doença estabelecida e naqueles com o maior risco, sendo baseado na terapia com estatina. Nos pacientes com HDL baixo isolado, deve-se incentivar a adoção de medidas que promovam um estilo de vida saudável: cessação do tabagismo, perda de peso e aumento da atividade física. Hipertensão Ana Carolina Thomaz Mendes No mundo, cerca de 62% dos AVCs e 49% dos casos de DCC podem ser atribuídos à PA acima da ideal (PAS> 115 mmHg), que se acredita ser responsável por > 7 milhões de mortes anualmente. Quase metade dessa carga ocorre entre aqueles com PAS <140 mmHg e, ainda assim, esse valor é usado como limiar arbitrário para definir HAS em muitas diretrizes clínicas nacionais. Uma grande preocupação nos países de rendas baixa e média é o alto índice de HAS não diagnosticada e, portanto, não tratada. Esse fato pode explicar, ao menos em parte, as taxas mais elevadas de AVC nesses países quando comparadas às taxas de DCC nos primeiros estágios da transição. A PA > 115/75 mmHg está associada a maior risco de DC; cada aumento de 20 mmHg na PAS ou de 10 mmHg na PAD acima desse valor duplica o risco. O tratamento da PA elevada reduz a taxa de AVC, ICC e eventos coronarianos. As taxas de eventos cardiovasculares em pacientes idosos com HAS sistólica isolada também são reduzidas pela terapia anti-hipertensiva. As modificações no estilo de vida benéficas para a PA elevada consistem em redução do peso (para atingir um IMC < 25 kg/m2); restrição de sódio; dieta rica em frutas, vegetais e laticínios com baixo teor de gordura; exercício regular; e moderação no consumo de álcool. É recomendado que se inicie a terapia medicamentosa anti-hipertensiva quando a PAS for ≥ 140 mmHg ou a PAD for ≥ 90 mmHg (observe que, se o risco de evento aterosclerótico em 10 anos for ≥ 10%, ou se o paciente já tiver apresentado um evento cardiovascular, deve-se iniciar o tratamento farmacológico para PAS ≥ 130 ou PAD ≥ 80). Sob tratamento, o alvo de PA é < 130/80 mmHg. Diabetes melito/resistência à insulina/síndrome metabólica Como consequência ou em acréscimo aos IMCs crescentes e aos níveis decrescentes de atividade física, as taxas mundiais de DM– especialmente tipo 2 – estão aumentando. Estima-se que 346 milhões de pessoas em todo o mundo tenham DM. A International Diabetes Foundation prevê que esse número alcançará 522 milhões em 2030, uma taxa de crescimento anual acima daquela apresentada pela população adulta mundial. Quase 50% dos indivíduos com DM não são diagnosticados, e 80% vivem em países de rendas baixa e média. Parece haver suscetibilidade genética evidente para DM em diversos grupos raciais e étnicos. Por exemplo, estudos sobre migração sugerem que os asiáticos meridionais e os indianos teriam maior risco do que os indivíduos com origem europeia. Os pacientes com diabetes mais frequentemente morrem por DC. Os níveis de LDL ficam perto da média nos pacientes diabéticos, porém as partículas LDL são menores, mais densas e mais aterogênicas; um HDL baixo e níveis elevados de triglicerídeos são comuns. O controle rígido da glicose sérica no diabetes tipo 2 reduz as complicações diabéticas microvasculares (retinopatia e doença renal), mas historicamente tem tido menos impacto em eventos macrovasculares (DAC e AVC). Por outro lado, foi demonstrado que novos grupos de fármacos hipoglicemiantes (agonistas do receptor do peptídeo- 1 semelhante ao glucagon [GLP-1] e inibidores do cotransportador-2 de sódio-glicose [SGLT2]) reduzem as taxas de eventos cardiovasculares em diabéticos tipo 2. Além disso, o controle bem-sucedido dos fatores de risco associados (dislipidemia e hipertensão) reduz significativamente os eventos cardiovasculares em diabéticos, devendo ser vigorosamente tentado. Os indivíduos sem diabetes franco, mas que exibem a “síndrome metabólica” (constelação de resistência à insulina, obesidade central, hipertensão, hipertrigliceridemia, HDL baixo) também correm alto risco de eventos cardiovasculares. Aconselhamento dietético, perda de peso e aumento da atividade física são importantes para reduzir a prevalência dessa síndrome. Sexo masculino/pós-menopausa O risco coronariano é maior nos homens em comparação com o das mulheres na pré-menopausa da mesma idade, porém o risco acelera nas mulheres após a menopausa. A terapia de reposição estrogênica induz a uma queda no LDL, bem como elevação no HDL em mulheres na pós-menopausa e, em estudos observacionais, esteve associada a redução de eventos coronarianos. Prevenção Fundamentalmente, prevenção primária é a prevenção propriamente dita, ou seja, tomar medidas antes que a doença ocorra – enquanto prevenção Ana Carolina Thomaz Mendes secundária se refere ao tratamento da doença, a fim de evitar maiores complicações. Prevenção, tratamento, e a reabilitação, a qual envolve medidas destinadas a pessoas com deficiência, a fim de restabelecer ou melhorar o usodas suas capacidades remanescentes. Com o passar dos anos, os conceitos de atenção primária e secundária tiveram seu sentido ampliado, abordando a terminologia “fator de risco”, sendo este não apenas uma forma de pré-doença, mas também um fator que, uma vez estabelecido, deve-se tentar deter o seu progresso e reduzir as suas consequências. A prevenção pode ser abordada de duas formas: uma de base individual e outra de base populacional. Na primeira, busca-se oferecer uma proteção individual a pessoas de alto risco. Em contrapartida, a abordagem populacional busca controlar fatores determinantes numa população como um todo. Na prevenção primária, não há nem enfermidade, nem doença. Estritamente falando, “o paciente não é um paciente”. As medidas de prevenção seriam abordar estilo de vida saudável e fazer vacinações, por exemplo. Na prevenção secundária, há condições presentes na forma de rótulos designados como doenças. A maioria deles serão fatores de risco e, dessa forma, é discutível se eles deveriam ser entidades de doença por si só. Sendo assim, a prevenção cardiovascular primária envolve abordar os fatores de risco existentes ou não em pessoas sem a doença cardiovascular, como: sedentarismo, níveis de pressão arterial e de colesterol, entre outros. E a prevenção secundária é a abordagem dos cuidados para evitar uma piora do quadro da doença. Portanto, o objetivo da prevenção secundária é reduzir o risco de estágios mais avançados destas condições, como infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral. Logo, o tratamento da hipertensão, por exemplo, é prevenção e não terapêutico, já que não há enfermidade presente. A prevenção primordial, que é um conceito complementar ao da promoção da saúde, tem o objetivo de evitar a emergência e o estabelecimento de padrões de vida que aumentem o risco de desenvolver doenças. A prevenção primária deve ser pensada em todos os indivíduos e, principalmente, sob a forma de grupo, comunidade ou populacional. As intervenções que promovam subsequentes alterações de comportamento são mais eficazes quando desencadeadas sob forma de leis, decretos que abranjam um grande grupo. A prevenção primária apresenta maiores impactos quando direcionada a grandes públicos (população em geral e/ou grupos saudáveis selecionados), como exemplo, as políticas antitabágicas, a legislação sobre o álcool e os programas de promoção de exercício. Terapia antitrombótica na prevenção primária A trombose no local da ruptura da placa aterosclerótica é a causa mais comum das SCA. O fármaco antitrombótico AAS reduz os eventos cardiovasculares adicionais futuros e a mortalidade e deve ser prescrito em dose de 75-100 mg/dia. Nos ensaios de prevenção primária, foi demonstrado que a terapia crônica com pequenas doses de AAS reduziu o risco de um primeiro IAM em homens e o risco de AVC em mulheres. Porém, o AAS também aumenta a ocorrência de sangramentos maiores. Estudos randomizados prospectivos recentes concluíram que os benefícios cardiovasculares e o risco de sangramento do AAS na prevenção primária são muito parecidos. A prescrição ou não de AAS para a prevenção primária deve se basear em uma discussão com o paciente sobre os potenciais benefícios e riscos no caso específico do paciente, de modo que possa ser tomada uma decisão conjunta. Modificações no estilo de vida Incentivar hábitos saudáveis de exercício (> 30 min de atividade física de intensidade moderada diariamente) e uma dieta equilibrada (pobre em gorduras saturadas e trans; inclusão de peixe, vegetais, grãos integrais e frutas; equilíbrio entre consumo calórico e gasto energético). Aconselhar moderação na ingestão de álcool (não mais de 1 a 2 doses/dia). Ana Carolina Thomaz Mendes Prevenção secundária A diminuição do colesterol LDL reduz o risco cardiovascular, quer na prevenção primária, quer na prevenção secundária. O risco relativo de um evento coronariano maior (desfecho secundário), tal como a morte cardiovascular ou o infarto do miocárdio, foi reduzida em 44%. O número de revascularizações do tipo cirurgia de revascularização miocárdica ou angioplastia também caiu significativamente, em 34%. Importantemente, a redução no risco não foi observada somente entre os pacientes com alto risco de colesterol. O quartil com o risco mais baixo, na avaliação basal, teve proporcionalmente muito maior benefício com o tratamento, comparado com o quartil mais alto. Este aspecto é importante, uma vez que a maioria dos pacientes com doença coronariana não tem colesterol particularmente elevado; de fato, cerca de 35% de todos os pacientes com doença arterial coronariana têm colesterol abaixo de 200mg/dL. A redução agressiva de colesterol em pacientes com doença coronariana ou outras doenças cardiovasculares ateroscleróticas é agora um standard de cuidados médicos, acordados em um documento conjugado da Associação Médica Americana e do Colégio Americano de Cardiologia. A maioria dos pacientes com doença aterosclerótica cardiovascular deve ser considerada candidata à terapêutica por redução de lipídios. Dislipidemia A dislipidemia está presente quando o colesterol total é elevado, quer pelo valor da LDL ou dos triglicerídeos ser elevado, quer pelo valor HDL ser baixo, ou ainda por uma combinação destes fatores. A alteração dos lípidios no plasma pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares. Metas terapêuticas absolutas e redução do percentual: ● LDL: O colesterol elevado é um dos principais fatores modificáveis de DC, principalmente DAC. A recomendação da meta de LDL e HDL é de acordo com o risco cardiovascular. ● Não-HDL: A meta secundária é de 30 mg∕dL acima da meta do LDL, conforme na tabela anterior. Colesterol não-HDL é definido como a diferença entre o colesterol total e o colesterol HDL. Colesterol não- HDL inclui todo o colesterol presente nas partículas de lipoproteínas considerado aterogênico, incluindo o LDL, a lipoproteína(a), as lipoproteínas de densidade intermediária e as lipoproteínas de muito baixa densidade. Tem sido mesmo sugerido que a fração colesterol não-HDL pode ser um melhor instrumento para avaliação de risco do que o LDL colesterol. O ATP – III identifica a concentração de colesterol não- HDL como um alvo secundário na terapêutica em pessoas que apresentam níveis altos de triglicerídeos (200mg/dL ou mais). ● HDL, triglicérides e outras variáveis: Não existem metas para o HDL e não é recomendado tratamento medicamentoso visando aumentá-lo. Com relação ao triglicérides, quando ≥ 500 mg∕dL é recomendado o paciente receber terapia específica para reduzir o risco de pancreatite. Se o valor é entre 150 e 499 mg∕dL, a terapia deve ser individualizada conforme o risco cardiovascular. Para outras variáveis como as apoliproteínas ou Lp(a) não são especificadas metas terapêuticas. ● Tratamento medicamentoso: A decisão do início da terapia medicamentosa depende do: ● Risco cardiovascular do paciente: define se precisa da terapia medicamentosa ou pode só utilizar as modificações do estilo de vida. ● Tipo de dislipidemia presente: define a escolha da classe terapêutica. Ana Carolina Thomaz Mendes Os medicamentos hipolipemiantes podem agir predominantemente nas taxas séricas de colesterol ou nas taxas de triglicérides. Medicamentos com ação predominante na colesterolemia: • Estatinas: atuam inibindo a enzima HMG-CoA redutase, responsável pela formação de colesterol no fígado. A estatina empregada deve ser aquela que esteja disponível no serviço, buscando atingir as metas terapêuticas recomendadas. • Ezetimiba: medicação que inibe a absorção do colesterol na borda em escova do intestino delgado, atuando seletivamente nos receptores NPC1-L1 e inibindo o transporteintestinal de colesterol. Normalmente empregada em dose única de 10 mg∕dia, em associação com as estatinas. • Resinas: atuam reduzindo a absorção de ácidos biliares. Assim, ocorre a depleção do colesterol celular hepático, estimulando a síntese de receptores de LDL e de colesterol endógeno. No Brasil, somente a colestiramina está disponível. Está indicada quando as metas do LDL não são obtidas, apesar do uso de estatinas potentes em doses efetivas. Medicamentos que atuam predominantemente nos triglicerídeos: • Fibratos: medicações derivadas do ácido fíbrico, que aumentam a produção e ação da LPL (responsável pela hidrólise dos TG) e maior síntese de HDL. São indicadas como primeira linha do tratamento de hipertrigliceridemia endógena isolada, quando houver falha nas medidas não farmacológicas. • Ácido nicotínico (niacina): reduz a ação da lipase tecidual nos adipócitos, levando a liberação menor de ácidos graxos livres na circulação. Com isso, reduz a síntese de triglicerídeos pelo fígado. É a segunda escolha para tratar hipertrigliceridemia endógena, podendo ser associado aos fibratos. • Ácidos graxos ômega 3: são derivados do óleo de peixes e certas plantas e nozes. Atuam reduzindo os TG e aumentam o HDL. A terapia conforme o risco cardiovascular é realizada da seguinte forma: • Risco cardiovascular muito alto: é preferível a associação de ezetimiba e sinvastatina do que esta última isolada. • Risco cardiovascular alto: sempre que possível e tolerado, preferir estatina de alta intensidade ou a associação ezetimiba e estatina (sinvastatina 40 mg ou outra). • Risco cardiovascular intermediário: sempre que possível e tolerado, uso de estatina de intensidade pelo menos moderada. • Risco cardiovascular baixo: o tratamento medicamentoso deve ser considerado naqueles com LDL persistente acima de 160 mg∕dL. Aterosclerose A importância da PA como fator de risco para aterosclerose e eventos cardiovasculares há muito foi reconhecida. Informações clínicas mais recentes ressaltaram a importância da pressão de pulso – diferença entre a pressão sistólica e a pressão arterial diastólica mínima – como indicador prognóstico de risco cardiovascular. A abordagem tradicional para a aterosclerose concentra-se na estenose arterial como causa de isquemia e eventos cardiovasculares. Atualmente, existem modalidades disponíveis de revascularização eficientes para abordar as estenoses com limitação do fluxo, mas as placas ateroscleróticas que não causam estenoses também podem precipitar eventos clínicos, como angina instável e IAM. Portanto, faz-se necessário agregar à visão tradicionalmente focalizada sobre a estenose uma apreciação mais ampla sobre a fisiopatologia da aterosclerose subjacente a diversas síndromes coronarianas agudas. Ana Carolina Thomaz Mendes Aterosclerose é a forma mais comum da arteriosclerose, que é um termo geral para várias doenças que provocam espessamento e perda da elasticidade da parede arterial. Aterosclerose é também a forma mais grave e clinicamente relevante da arteriosclerose porque causa doença coronariana e doença cerebrovascular. As formas não ateromatosas da arteriosclerose compreendem arteriolosclerose e arteriosclerose de Mönckeberg. A aterosclerose pode comprometer todas as artérias de médio e grosso calibre, incluindo artérias coronárias, carótidas e cerebrais; aorta e seus ramos; e grandes artérias dos membros. É a causa principal de morbidade e mortalidade na maioria dos países desenvolvidos. Recentemente, a taxa de mortalidade relacionada com a idade atribuível à aterosclerose tem diminuído, mas em 2016, as DCV, principalmente ateroscleroses coronariana e cerebrovascular ainda causaram quase 18 milhões de mortes em todo o mundo (> 30% de todas as mortes). A prevalência da aterosclerose está aumentando rapidamente nos países em desenvolvimento e, como as pessoas em países desenvolvidos vivem por um tempo maior, a incidência também aumentará. Aterosclerose é a principal causa de óbito no mundo todo. Fisiopatologia As estrias de gordura são a lesão mais precoce visível na aterosclerose; representam o acúmulo de células espumosas contendo lipídios na camada íntima da artéria. A placa aterosclerótica é a característica da aterosclerose; é uma evolução da estria gordurosa e tem 3 componentes principais: ● Lipídios ● Células musculares lisas e inflamatórias ● A matriz do tecido conjuntivo que pode conter trombos em vários estágios da organização e depósitos de cálcio Formação de placas ateroscleróticas Todos os estágios da aterosclerose — da iniciação e crescimento à complicação da placa — são considerados uma resposta inflamatória à lesão mediada por citocinas específicas. Considera-se que a lesão endotelial desempenha um papel iniciador ou incitador primário. A aterosclerose afeta preferencialmente certas áreas da árvore arterial. O fluxo sanguíneo turbulento ou não laminar (em pontos de ramificação da árvore arterial) conduz à disfunção endotelial e inibe a produção endotelial de óxido nítrico, uma molécula vasodilatadora e anti-inflamatória potente. Esse fluxo sanguíneo também estimula as células endoteliais a produzir moléculas de adesão, as quais recrutam e se ligam às células inflamatórias. Os fatores de risco de aterosclerose (dislipidemia, DM, tabagismo e hipertensão), estressores oxidativos (radicais superóxidos), angiotensina II, infecção e inflamação sistêmicas também inibem a produção de óxido nítrico e estimulam a produção de moléculas de adesão, citocinas pró-inflamatórias, proteínas quimiotáxicas e vasoconstritores; porém, os mecanismos exatos são desconhecidos. O resultado final é a ligação ao endotélio de monócitos e células T, a migração dessas células ao espaço subendotelial e iniciação e perpetuação de resposta inflamatória vascular local. No subendotélio, os monócitos transformam-se em macrófagos. Os lipídios séricos, particularmente a LDL e VLDL, também se ligam às células endoteliais e são oxidados no subendotélio. A captação de lipídios oxidados e a transformação de macrófagos em células espumosas repletas de lipídios resultam nas lesões ateroscleróticas iniciais típicas, denominadas estrias Ana Carolina Thomaz Mendes gordurosas. As membranas de eritrócitos degradados que resultam da ruptura de vasa vasorum e da hemorragia dentro da placa podem ser uma fonte adicional de lipídios dentro das placas. Os macrófagos elaboram citocinas pró-inflamatórias que acarretam a migração de células musculares lisas da média e que, subsequentemente, atraem e estimulam o crescimento de macrófagos. Vários fatores promovem a replicação de células musculares lisas e o aumento da produção de matriz extracelular densa. O resultado é uma placa fibrosa subendotelial com capa fibrosa, composta por células musculares lisas da íntima, circundadas por tecido conjuntivo e lipídios intra e extracelulares. Um processo semelhante à formação óssea provoca calcificação dentro da placa. Sugere-se uma ligação entre infecção e aterosclerose para explicar as associações sorológicas entre infecções (Chlamydia pneumoniae, citomegalovírus) e DC. Outros mecanismos prováveis compreendem efeitos indiretos de inflamação crônica na corrente sanguínea, anticorpos de reação cruzada e efeitos inflamatórios de patógenos infecciosos na parede arterial. Estabilidade e ruptura da placa As placas ateroscleróticas podem ser estáveis ou instáveis. As placas estáveis regridem, permanecem estáticas ou crescem lentamente ao longo de décadas até que provoquem estenose ou oclusão. As placas instáveis são vulneráveis à erosão, fissura ou ruptura espontâneas, acarretando trombose, oclusão e IAM muito antes de provocarem estenose hemodinamicamente significativa.A maioria dos eventos clínicos resulta de placas instáveis, os quais não parecem graves na angiografia e, por isso, a estabilização da placa pode ser uma maneira de reduzir morbidade e mortalidade. A rigidez da capa fibrosa e sua resistência à ruptura dependem do equilíbrio relativo de deposição e degradação de colágeno. A ruptura da placa envolve a secreção de metaloproteinases, catepsinas e colagenases por macrófagos ativados na placa. Essas enzimas digerem a capa fibrosa, especialmente nos membros, causando adelgaçamento da capa e, finalmente, a ruptura. As células T da placa contribuem com a secreção de citocinas. As citocinas inibem síntese e deposição de colágeno pelas células musculares lisas, o que normalmente reforça a placa. Depois que a placa se rompe, o teor da placa é exposto ao sangue circulante, desencadeando trombose; macrófagos também estimulam trombose porque contêm fator tecidual, que promove a geração de trombina in vivo. Pode ocorrer uma das 5 evoluções: ● O trombo resultante pode organizar-se e ser incorporado dentro da placa, modificando seu formato e deflagrando o crescimento rápido. ● O trombo pode ocluir rapidamente o lúmen vascular e precipitar um evento isquêmico agudo. ● O trombo pode provocar embolia. ● A placa pode ser preenchida por sangue, acarretando expansão e oclusão imediata da artéria. ● Os conteúdos da placa (em vez de trombos) podem provocar embolia, ocluindo o vaso a jusante. A estabilidade da placa depende de múltiplos fatores, envolvendo composição (proporção relativa de lipídios, células inflamatórias, células musculares lisas, tecido conjuntivo e trombo), estresse de parede (fadiga da capa), tamanho e localização do núcleo e configuração da placa em relação ao fluxo sanguíneo. Por contribuir para o crescimento rápido e para a deposição de lipídios, a hemorragia dentro da placa pode desempenhar um papel importante na transformação de placas estáveis em instáveis. Em geral, as placas instáveis da artéria coronária têm alto conteúdo de macrófagos, um núcleo lipídico espesso e uma capa fibrosa fina; elas estreitam o lúmen do vasos para < 50% e tendem a se romper de forma imprevisível. As placas instáveis das artérias carótidas têm a mesma composição, mas classicamente acarretam problemas por estenose e oclusão graves ou deposição de trombos, que se embolizam em vez de romper. Placas de baixo risco têm uma capa mais espessa e contém menos lipídios; elas frequentemente estreitam o lúmen do vaso em > 50% e podem produzir angina estável previsível induzida por exercício. Ana Carolina Thomaz Mendes As consequências clínicas da ruptura da placa dependem não somente de sua anatomia, mas também do equilíbrio relativo da atividade pró- coagulante e anticoagulante do sangue e da vulnerabilidade do miocárdio a arritmias. Fatores de risco Dislipidemia (elevação do colesterol total, de LDL ou nível baixo de HDL), hipertensão e diabetes promovem a aterosclerose por ampliação ou intensificação da disfunção endotelial e vias inflamatórias no endotélio vascular. Na dislipidemia ocorre aumento de captação e oxidação subendoteliais de LDL e, por sua vez, os lipídios oxidados estimulam a produção de moléculas de adesão e citocinas inflamatórias, além da possibilidade de serem antigênicos, incitando a resposta imunomediada por células T e a inflamação na parede arterial. Embora se acreditasse anteriormente que a HDL protegesse contra a aterosclerose por meio do transporte reverso de colesterol e pelo transporte de enzimas antioxidantes, que podem degradar e neutralizar os lipídios oxidados, evidências recentes provenientes de ensaios randomizados e da genética sugerem um papel muito menos importante para a HDL na aterogênese. O papel da hipertrigliceridemia na aterogênese é complexo, apesar de poder ter um pequeno efeito independente. A hipertensão pode acarretar inflamação vascular via mecanismos mediados por angiotensina II. A angiotensina II estimula células endoteliais, células musculares lisas vasculares e macrófagos a produzir mediadores pró-aterogênicos, incluindo citocinas pró- inflamatórias, ânions superóxidos, fatores pró- trombóticos, fatores de crescimento e receptores de LDL oxidados semelhantes à lecitina. O diabetes conduz à formação de produtos finais de glicação avançada, o que aumenta a produção de citocinas pró-inflamatórias pelas células endoteliais. O estresse oxidativo e os radicais reativos de oxigênio, gerados por DM, lesam diretamente o endotélio e promovem a aterogênese. O nível elevado de LDL densa e pequena, característico de DM, é altamente aterogênico. Os mecanismos podem incluir aumento da suscetibilidade à oxidação e ligação inespecífica ao endotélio. O cigarro contém nicotina e outros produtos químicos que são tóxicos ao endotélio vascular. O tabagismo, incluindo o tabagismo passivo, aumenta a reatividade plaquetária (possivelmente promovendo trombose plaquetária), níveis plasmáticos de fibrinogênio e hematócrito (aumentando a viscosidade sanguínea). O tabagismo aumenta a LDL e diminui a HDL, além de promover vasoconstrição, que é especialmente prejudicial às artérias já obstruídas por aterosclerose. A HDL aumenta cerca de 6 a 8 mg/dL em 1 mês de interrupção do tabagismo. Lipoproteína (a) [Lp(a)] é pró-aterogênica e é um fator de risco independente para doença cardiovascular, como IM, AVC e estenose da valva aórtica. Tem uma estrutura semelhante à LDL, mas também possui um componente hidrofílico da apolipoproteína (a) que é covalentemente ligado a uma apolipoproteína B100 hidrofóbica. Níveis de Lp(a) são geneticamente determinados e permanecem razoavelmente estáveis ao longo da vida. Consideram-se os níveis de Lp(a) acima de 50 mg/dL patogênicos. Apolipoproteína (B) (apoB) é uma partícula com duas isoformas: apoB-100, que é sintetizada no fígado, e apoB-46, que é sintetizada no intestino. ApoB-100 é capaz de se ligar ao receptor de LDL e é responsável pelo transporte de colesterol. Também é responsável pelo transporte de fosfolipídios oxidados e tem propriedades pró-inflamatórias. Presume-se que a partícula de apoB dentro da parede arterial seja o evento inicial para o desenvolvimento de lesões ateroscleróticas. O nível elevado de proteína C reativa não prediz confiavelmente a extensão da aterosclerose, mas pode predizer a probabilidade de eventos isquêmicos. Na ausência de outras doenças inflamatórias, níveis elevados podem indicar aumento do risco de ruptura da placa aterosclerótica, ulceração ou trombose em Ana Carolina Thomaz Mendes curso ou maior atividade de linfócitos e macrófagos. A proteína C reativa por si só não parece desempenhar um papel direto na aterogênese. Infecção por C. pneumoniae ou outras infecções (viral, por Helicobacter pylori) pode provocar disfunção endotelial por meio de infecção direta, exposição à endotoxina ou estimulação de inflamação sistêmica ou subendotelial. Doença renal crônica promove o desenvolvimento da aterosclerose por meio de várias vias, incluindo a piora da hipertensão e da resistência à insulina, diminuição dos níveis de apolipoproteína A-I e aumento de lipoproteína (a), homocisteína, fibrinogênio e níveis de proteína C reativa. Transplante de coração costuma ser seguido de aterosclerose coronariana acelerada, que provavelmente está relacionada com lesão endotelial imunologicamente mediada. A aterosclerose coronária acelerada também é observada após radioterapia torácica e provavelmente é resultado de lesão endotelial induzida por radiação. Os estados trombogênicos aumentam a probabilidade de aterotrombose. Associaram-se firmemente muitas variantes genéticas comuns e raras com aterosclerose e eventos cardiovasculares. Embora cada variante tenha um efeito pequenoindividualmente, os classificações de risco genético que somam o número total de variantes de risco mostraram estar fortemente associados à aterosclerose mais avançada, bem como eventos cardiovasculares primários e recorrentes Pacientes com hiper-homocisteinemia (devido à deficiência de folato ou defeito metabólico genético) têm maior risco de aterosclerose. No entanto, por causa dos resultados de ensaios randomizados das terapias de redução de homocisteína que não mostram uma diminuição na doença aterosclerótica, bem como evidências de ensaios de randomização mendeliana, não se acredita mais que a própria hiper- homocisteinemia cause aterosclerose. Doença vascular documentada A presença de doença aterosclerótica em um território vascular aumenta a probabilidade de doença em outros territórios vasculares. Pacientes com doença vascular aterosclerótica não coronariana têm taxas de evento cardíaco comparáveis àquelas dos pacientes com DC conhecida, e são considerados como tendo risco de DC equivalente e devem ser tratados agressivamente. Sinais e sintomas Inicialmente, a aterosclerose é assintomática por décadas. Os sinais e sintomas desenvolvem-se quando as lesões impedem o fluxo sanguíneo. Pode haver desenvolvimento de sintomas isquêmicos transitórios (angina estável por esforço, episódios isquêmicos transitórios e claudicação intermitente) quando as placas estáveis crescem e reduzem o lúmen arterial em > 70%. Vasoconstrição pode alterar uma lesão que não limita o fluxo sanguíneo para uma estenose grave ou completa. Podem surgir sintomas de angina instável ou infarto do miocárdio, acidente vascular encefálico isquêmico ou dor em repouso nos membros inferiores pode se desenvolver quando placas instáveis se rompem e causam oclusão aguda de artéria principal, com superposição de trombose ou embolia. A aterosclerose também pode causar morte súbita, sem angina de peito estável ou instável pregressa. O envolvimento aterosclerótico da parede arterial pode acarretar aneurismas e dissecção arterial, que podem se manifestar por dor, massa pulsátil, ausência de pulsos ou morte súbita. Diagnóstico O diagnóstico da aterosclerose depende da existência ou ausência de sintomas. Pacientes sintomáticos Avaliam-se os pacientes com sinais e sintomas de isquemia para determinar a magnitude e a localização da oclusão vascular, com vários exames invasivos e não invasivos, dependendo do órgão comprometido. Esses pacientes também devem ser avaliados para a determinação da existência de fatores de risco de aterosclerose por ● História e exame físico ● Perfil lipídico de jejum ● Níveis de hemoglobina A1C Ana Carolina Thomaz Mendes Os pacientes com doença documentada em um local devem ser submetidos à investigação clínica para identificação dessa doença em outros locais. Como nem todas as placas ateroscleróticas têm risco semelhante, investiga-se várias tecnologias para testes de imagem como uma forma de identificar placas especialmente vulneráveis à ruptura; mas ainda não se usam essas técnicas na prática clínica. Os exames de imagem não invasivos que podem avaliar a morfologia e as características da placa são ● US vascular tridimensional; ● TC; ● Angiografia por RMN. Exames invasivos por cateterismo também são usados. Esses incluem ● US intravascular, que utiliza um transdutor na ponta de um cateter para gerar imagens da luz e da parede da artéria; ● Angioscopia, que utiliza cateteres especiais de fibra óptica que podem visualizar diretamente a superfície arterial; ● Termografia das placas, que é usada para detectar o aumento da temperatura nas placas com processo inflamatório em atividade; ● Tomografia de coerência óptica, que utiliza laser com luz infravermelha para geração de imagens; ● Elastografia, usada para identificar placas moles ricas em lipídios. A imunocintilografia é uma alternativa não invasiva que usa traçadores radioativos para localizar placas vulneráveis. Exame de imagem do tipo PET da vasculatura é outra abordagem emergente para avaliar placa vulnerável. Além de lipidograma, glicemia plasmática e hemoglobina A1C de jejum, alguns médicos dosam os marcadores séricos de inflamação. Níveis de proteína C reativa ≥ 3,1 mg/L (≥ 29,5 nmol/L) são altamente preditivos de eventos cardiovasculares. Pacientes assintomáticos (triagem) Em paciente com fatores de risco para aterosclerose, mas nenhum sinal ou sintoma de isquemia, o papel dos testes adicionais para além do perfil lipídico não está claro. Embora exames de imagem como US carotídea para medir a espessura das camadas íntima e média e outros estudos que podem detectar placa aterosclerótica estejam sob investigação, eles não melhoram de maneira confiável a previsão de eventos isquêmicos em relação à avaliação dos fatores de risco ou ferramentas de predição consagradas e não são recomendados. Uma exceção é imagem por TC para detectar calcificação das artérias coronárias (isto é, obter uma pontuação de cálcio), para a qual há evidências mais robustas de reclassificação do risco; pode ser útil para refinar as estimativas de risco e para decidir sobre o tratamento com estatina para determinados pacientes (pacientes com risco intermediário e/ou história familiar de doença cardiovascular precoce). A maioria das diretrizes recomenda triagem pelo perfil lipídico em pacientes com qualquer uma das seguintes características: ● Homens ≥ 40 anos ● Mulheres ≥ 50 anos e mulheres na pós- menopausa ● DM tipo 2 ● História familiar de hipercolesterolemia familiar ou doença cardiovascular precoce (idade de início < 55 anos para parente de 1º grau do sexo masculino ou < 65 anos para parente de 1º grau do sexo feminino) ● Síndrome metabólica ● Hipertensão ● Doenças inflamatórias crônicas Atualmente, recomenda-se usar equações de avaliação de risco baseado em dados de coorte para estimar o risco em 10 anos de doença cardiovascular aterosclerótica. A nova calculadora de risco é baseada em sexo, idade, raça, colesterol total e HDL, pressão arterial sistólica (e se a PA está sendo tratada), diabetes e tabagismo. A utilização da SCORE é indicada, calcula o risco com base em idade, sexo, tabagismo, pressão arterial sistólica e colesterol total, para estimar o risco em 10 anos do primeiro evento aterosclerótico fatal. Para pacientes considerados de risco intermediário, sugeriu-se a medição de lipoproteína (a) para ajudar a refinar a classificação. Ana Carolina Thomaz Mendes Albuminúria urinária (> 30 mg de albumina/24 horas) é um marcador de doença renal e de sua progressão, bem como de grande valor preditivo de morbidade e mortalidade cardiovascular e não cardiovascular; porém, não está estabelecida a relação direta entre albuminúria e aterosclerose. Tratamento ● Mudanças no estilo de vida ● Tratamento medicamentoso de fatores de risco diagnosticados ● Antiplaquetários ● Estatinas, possivelmente inibidores da ECA, betabloqueadores O tratamento envolve a modificação agressiva de fatores de risco de progressão lenta e indução de regressão de placas existentes. Não mais se recomenda a redução do colesterol LDL abaixo de certo alvo, e atualmente a abordagem "quanto mais baixo, melhor" é a preferida. As modificações do estilo de vida envolvem dieta, interrupção do tabagismo e atividade física regular. Com frequência, é necessária a utilização de fármacos para dislipidemia, hipertensão e diabetes. Tais fármacos e as modificações do estilo de vida melhoram direta ou indiretamente a função endotelial, reduzem a inflamação e melhoram a evolução clínica. Estatinas podem reduzir a morbidade e mortalidade relacionadas com a aterosclerose mesmo com níveis de colesterol normais ou discretamente aumentados. Antiplaquetários auxiliam todosos pacientes com aterosclerose. Pacientes com doença coronariana podem se beneficiar dos inibidores da ECA e betabloqueadores. Dieta Menos gordura saturada Excluir gordura trans Menos carboidratos refinados Mais frutas e verduras Mais fibras Ingestão moderada (se for utilizar) de álcool Diminuições substanciais na gordura saturada e carboidratos refinados e processados e aumento de carboidratos com fibras (frutas, legumes) são recomendados. Essas modificações dietéticas constituem pré-requisito para o controle de lipídios e redução do peso e são essenciais para todos os pacientes. Deve-se limitar a ingestão de calorias para a manutenção do peso dentro de limites normais. Pequenas reduções na ingestão de gordura não parecem diminuir ou estabilizar a aterosclerose. Alterações efetivas requerem a limitação da ingestão de gordura para 20 g/dia, consistindo em 6 a 10 g de gordura poli-insaturada, com ácidos graxos ômega-6 e ômega-3 em proporções iguais, gordura saturada ≤ 2 g e o restante de gordura monoinsaturada. Ácidos graxos trans devem ser evitados, pois são altamente aterogênicos. O aumento dos carboidratos para compensar a diminuição das gorduras saturadas da dieta eleva os níveis de triglicerídios plasmáticos e reduz os níveis de HDL. Assim, qualquer deficiência calórica deve ser compensada com proteínas e gorduras insaturadas, em vez de carboidratos. A ingestão excessiva de gordura e açúcar refinado deve ser evitada, especialmente em pessoas com risco de diabetes, embora a ingestão de açúcar não esteja diretamente relacionada ao risco cardiovascular. Em contrapartida, deve-se incentivar o consumo de carboidratos complexos (verduras e grãos integrais). Frutas e verduras (5 porções diárias) parecem diminuir o risco de aterosclerose coronariana; porém, não está esclarecido se esse efeito é decorrente de substâncias químicas vegetais ou da diminuição proporcional da ingestão de gordura saturada e do aumento da ingestão de fibras e vitaminas. Substâncias fitoquímicas chamadas flavonoides (existentes em uvas vermelhas e roxas, vinho tinto, chás pretos e cervejas escuras) parecem ser especialmente protetoras. No entanto, não existem dados clínicos que indiquem que a ingestão de alimentos com teor elevado de flavonoides ou a utilização de suplementos em vez de alimentos sejam capazes de prevenir a aterosclerose. O aumento da ingestão de fibras diminui o colesterol total e pode ter efeito benéfico nos níveis de glicose e insulina. Recomenda-se a ingestão diária de pelo menos 5 a 10 g de fibras solúveis (farelo de cereais, produtos de soja e psílio), uma vez que essa quantidade diminui a LDL em aproximadamente 5%. A fibra insolúvel (celulose e lignina) parece não afetar o colesterol, mas pode conferir benefícios salutares Ana Carolina Thomaz Mendes adicionais (redução do risco de câncer de cólon). Entretanto, o excesso de fibras interfere na absorção de certos minerais e vitaminas. Em geral, os alimentos com altos teores de substâncias químicas vegetais e vitaminas também são ricos em fibras. O álcool aumenta a HDL e tem propriedades antitrombóticas, antioxidantes e anti-inflamatórias pouco definidas. Esses efeitos parecem ser os mesmos para vinho, cerveja e bebidas destiladas, e ocorrem em níveis moderados de consumo; cerca de 30 mL de álcool (30 mL em aproximadamente 2 doses médias de bebidas alcoólicas típicas) 5 a 6 vezes por semana protegem contra aterosclerose. Entretanto, em doses mais elevadas, o álcool pode acarretar problemas de saúde significativos. Assim, a relação entre álcool e taxa total de mortalidade tem configuração em forma de J; a taxa de mortalidade é mais baixa para homens que consomem < 14 drinques/semana e para mulheres que consomem < 9 drinques/semana. Pessoas que ingerem quantidades maiores de álcool devem reduzir o consumo. Mas os médicos não costumam recomendar que abstêmios comecem a consumir álcool com base em qualquer efeito protetor aparente. Existem poucas evidências de que a suplementação dietética com vitaminas, substâncias químicas vegetais e elementos minerais reduzam o risco de aterosclerose. A única exceção é suplementos de óleo de peixe. Apesar de fármacos e dietas alternativas estarem se tornando mais populares, e alguns podem até ter efeito discreto na pressão arterial e colesterol, não há provas de que estes tratamentos são seguros ou efetivos e estes podem, inclusive, ter interação negativa com fármacos de eficácia já comprovada. Os níveis da coenzima Q10, que é necessária para o funcionamento básico das células, tendem a aumentar com a idade e podem ser baixos em pacientes com certas doenças cardíacas e outras doenças crônicas; portanto, a suplementação da coenzima Q10 é usada ou recomendada, mas seu benefício terapêutico continua controverso. Atividade física Atividade física regular (30 a 45 minutos, de 3 a 5 vezes por semana) reduz a incidência de alguns fatores de risco (HAS, dislipidemia e DM), DC e óbito atribuível à aterosclerose em pacientes com ou sem eventos isquêmicos anteriores. Não está esclarecido se a associação é casual ou simplesmente indica que pessoas mais saudáveis têm maior probabilidade de realizar esforços regularmente. Também não estão definidos intensidade, frequência e tipo de esforço mais adequados, mas a maioria das evidências sugere uma relação inversa linear entre atividade física aeróbica e risco. A caminhada regular aumenta a distância que os portadores de doença vascular periférica conseguem andar sem dor. Um programa de exercícios que envolva atividade aeróbica tem papel definido na prevenção da aterosclerose e no favorecimento da perda ponderal. Antes de ingressar em um novo programa de esforço, idosos e indivíduos com fatores de risco de aterosclerose ou portadores de eventos isquêmicos recentes devem ser avaliados por um médico. A avaliação é feita por meio de anamnese, exame físico e avaliação do controle de fatores de risco. Antiplaquetários Os fármacos antiplaquetários orais são essenciais porque a maioria das complicações resulta de fissura ou ruptura da placa, ocasionando ativação plaquetária e trombose. Os seguintes fármacos são utilizados: ● Ácido acetilsalicílico ● Fármacos tienopiridínicos como clopidogrel, prasugrel e ticagrelor O ácido acetilsalicílico é o mais utilizado, mas, apesar de seus benefícios já comprovados, permanece subutilizado. Indicado para a prevenção secundária e pode se considerado para prevenção primária da aterosclerose coronariana para os pacientes de alto risco (pacientes com DM com ou sem aterosclerose, pacientes com ≥ 20% de risco de eventos cardíacos em 10 anos entre os quais o risco de sangramento não é proibitivo e pacientes com risco intermediário de 10% a 20% de eventos cardíacos em 10 anos e baixo risco de sangramento). Evidências recentes sugerem que o benefício real do ácido acetilsalicílico na prevenção primária é questionável, especialmente entre as pessoas de baixo risco, e que é necessária uma escolha criteriosa dos pacientes de acordo com as preferências do paciente e após considerar os potenciais riscos e benefícios do ácido acetilsalicílico para cada indivíduo (potencial de dano nos pacientes > 70 anos ou nos pacientes com maior risco de sangramento). A dose e duração ideais são Ana Carolina Thomaz Mendes desconhecidas, mas 81 a 325 mg VO uma vez ao dia, indefinidamente, geralmente são utilizados para prevenção primária e secundária. No entanto, 81 mg são preferíveis porque essa dose pode minimizar o risco de sangramento, particularmente quando aspirina é utilizada em combinação com outros fármacos antitrombóticos. Em cerca de 10 a 20% de pacientes que tomam ácido acetilsalicílico para prevenção secundária, há recorrência deeventos isquêmicos. A razão pode ser a resistência ao ácido acetilsalicílico; métodos para detectar a falta de supressão do tromboxano (indicada pelo aumento do conteúdo urinário de 11-deidrotromboxano B2) estão sendo estudados para uso clínico. Algumas evidências sugerem que o ibuprofeno pode interferir no efeito antitrombótico da aspirina, assim outros AINEs são recomendados para pacientes tomando aspirina para prevenção. Mas todos os AINEs, alguns mais do que outros, como inibidores seletivos de COX-2 parecem aumentar os riscos cardiovasculares. Substitui-se o ácido acetilsalicílico por clopidogrel (em geral, 75 mg/dia VO uma vez ao dia) quando há recorrência de eventos isquêmicos em pacientes que tomam ácido acetilsalicílico e em pacientes intolerantes a ele. Clopidogrel em combinação com ácido acetilsalicílico é eficaz para tratar IAM com ou sem elevação do segmento ST; essa combinação também é prescrita por 9 a 12 meses após IPC para reduzir o risco de eventos isquêmicos recorrentes. Também ocorre resistência ao clopidogrel. Prasugrel e ticagrelor são fármacos mais recentes e mais eficazes do que o clopidogrel para a prevenção de doença coronariana em grupos de pacientes selecionados. A ticlopidina não é mais utilizada amplamente, pois provoca neutropenia grave em 1% dos usuários e tem efeitos colaterais gastrointestinais graves. Estatinas Estatinas reduzem principalmente o colesterol LDL. Outros potenciais efeitos benéficos incluem maior produção de óxido nítrico endotelial, estabilização das placas ateroscleróticas, redução do acúmulo de lípides na parede arterial e regressão das placas. Recomenda- se estatinas como terapia preventiva em 4 grupos de pacientes, constituídos por aqueles com qualquer um dos seguintes: ● Doença cardiovascular aterosclerótica clínica ● Colesterol LDL ≥ 190 mg/dL (≥ 4,92 mmol/L) ● Idade de 40 a 75 anos, com diabetes e LDL de 70 a 189 mg/dL (1,81 a 4,90 mmol/L) ● 40 a 75 anos de idade, com colesterol LDL 70 a 189 mg/dL e risco estimado em 10 anos de doença cardiovascular arteriosclerótica ≥ 7,5% Há também suporte para o uso de estatinas em pacientes com outros fatores de risco, incluindo história familiar de doença cardiovascular arteriosclerótica precoce (idade de início < 55 em parentes de 1º grau do sexo masculino ou < 65 em parentes de 1º grau do sexo feminino), proteína C- reativa de alta sensibilidade ≥ 2 mg/L (19,05 nmol/L), classificação de cálcio na artéria coronária ≥ 300 unidades de Agatston (ou ≥ 75º percentil para a demografia do paciente), índice de pressão arterial tornozelo-braquial < 0,9. O tratamento com estatina é classificado como sendo de intensidade baixa, moderada ou alta, sendo administrado de acordo com a faixa etária e grupo terapêutico. Não mais se recomendam valores alvos específicos para colesterol LDL a fim de orientar a terapia hipolipemiante. Em vez disso, a resposta à terapia é determinada pelo fato de se os níveis de colesterol LDL diminuem como esperado com base na intensidade de terapia (pacientes que recebem terapia de alta intensidade devem ter uma diminuição ≥ 50% no colesterol LDL). Outros fármacos IECA, BRA, ezetimiba, inibidores da pró-proteína convertase subtilisina/kexina tipo 9 (PCSK9) e tiazolidinedion têm propriedades anti-inflamatórias que reduzem o risco de aterosclerose independentemente dos seus efeitos na pressão arterial, nos níveis de lipídios e na glicemia. O inibidor do fator Xa, rivaroxabana, também diminui o risco de eventos cardiovasculares, embora o mecanismo desse efeito seja desconhecido. Os inibidores da ECA e os bloqueadores do receptor da angiotensina II inibem os efeitos da angiotensina na disfunção endotelial e no processo inflamatório. Ana Carolina Thomaz Mendes Ezetimiba também reduz o colesterol LDL bloqueando a captação de colesterol do intestino delgado por meio da inibição da proteína 1 semelhante a Niemann-Pick C1. A ezetimiba acrescentada ao tratamento convencional com estatinas, demonstrou reduzir os eventos cardiovasculares em pacientes com história de eventos cardiovasculares e LDL > 70 mg/dL (1,8 mmol/L). Os inibidores de PCSK9 anticorpos monoclonais que impedem que a PCSK9 se ligue aos receptores de LDL, levando ao aumento da reciclagem desses receptores para a membrana plasmática e resultando em maior depuração do colesterol LDL no plasma para o fígado. O colesterol LDL é reduzido em 40 a 70%. Ensaios clínicos a longo prazo mostraram redução da aterosclerose e de eventos cardiovasculares. Esses fármacos são mais úteis em pacientes com hipercolesterolemia familiar, pacientes com eventos cardiovasculares prévios cuja LDL não está no nível ideal apesar de terapia medicamentosa máxima com estatinas e pacientes que exigem redução lipídica, mas têm evidência objetiva documentada de intolerância a estatinas. O inibidor do fator Xa, rivaroxabana, na dose de 2,5 mg VO duas vezes ao dia diminui o risco de eventos cardiovasculares (morte de origem cardiovascular, acidente vascular encefálico ou infarto agudo do miocárdio) nos pacientes com doença vascular aterosclerótica estável quando acrescentado a 100 mg/dia de ácido acetilsalicílico. O risco de sangramento importante foi mais alto nos pacientes em uso de rivaroxabana e ácido acetilsalicílico do que nos pacientes em uso de ácido acetilsalicílico isoladamente. As tiazolidinedionas podem controlar a expressão de genes pró-inflamatórios, embora estudos sugiram que elas aumentem o risco de eventos coronários. O ácido fólico, 0,8 mg VO duas vezes ao dia era utilizando anteriormente para tratar e prevenir hiper- homocisteinemia; mas não parece reduzir o risco de evento coronariano agudo. As vitaminas B6 e B12 também reduzem os níveis de homocisteína, mas dados atuais não justificam seu uso isolado ou em conjunto com folato. Macrolídios e outros antibióticos dados para o tratamento de infecções ocultas e crônicas por C. pneumoniae (e assim suprimem a inflamação e, teoricamente, alteram o curso e as manifestações da aterosclerose) não se mostraram úteis. Fibratos - Os fibratos são indicados no tratamento da hipertrigliceridemia endógena quando houver falha das medidas não farmacológicas. Mecanismo de ação - medicações derivadas do ácido fíbrico, que aumentam a produção e ação da LPL (responsável pela hidrólise dos TG) e maior síntese de HDL. Consequências da aterosclerose A aterosclerose, por causar a obstrução das artérias, pode levar ao desenvolvimento de outras doenças cardiovasculares, como o AVC e o IAM. A aterosclerose está relacionada também a embolias. A liberação de gordura da ateroma pode formar coágulos sanguíneos que podem soltar-se e deslocar- se pela circulação até atingir uma artéria de menor calibre, provocando uma embolia. Aterosclerose subclínica A avaliação do risco cardiovascular é uma estratégia fundamental no cuidado ambulatorial do paciente. O objetivo é identificar mudanças necessárias no estilo de vida e na dieta, como também definir a necessidade de tratamento medicamentoso para prevenir a aterosclerose. A base da avaliação são escores que estimam o risco de AVC, IAM ou morte nos próximos 10 anos e a maior parte dela leva em consideração a idade, sexo, raça, PA, DM, tabagismo e o colesterol não-HDL. Os pacientes são então classificados como baixo, médio ou alto risco. No baixo risco, não é indicado tratamento farmacológico. No alto risco, é indicada estatina. A grande polêmica é o indivíduo de risco intermediário, para o qual há divergências entre as diretrizes. O grupo americano defende o uso de estatina em dose moderada e o europeu, o uso de metas e avaliação complementar. Novos marcadores de aterosclerose subclínica, laboratoriais ou métodos de imagem, vem sendo utilizados como ferramentapara melhor discriminação e reclassificação do risco cardiovascular, além de melhorar a precisão diagnóstica e Ana Carolina Thomaz Mendes terapêutica. O marcador que pode ser utilizado para melhorar a estratificação de risco é o escore de cálcio coronário (ECC). As imagens da carga de placa aterosclerótica personalizam a avaliação de risco, integrando o efeito cumulativo entre determinantes de risco genéticos ou epigenéticos, com fatores de risco mensuráveis (PA e níveis séricos de colesterol) e não mensuráveis (poluição do ar e fumo passivo), visualizado diretamente no leito vascular. A aterosclerose avaliada por imagem, pode reduzir imprecisões na quantificação da exposição ao risco, que acontece em estágios bem precoces. A visualização direta do leito vascular permite identificar indivíduos que, por razões pouco claras, não desenvolvem aterosclerose apesar do risco aparentemente significativo, bem como indivíduos que, na ausência de fatores de risco, desenvolvem doença aterosclerótica. O escore de cálcio tem uma forte correlação com a carga aterosclerótica coronária total, sendo um marcador independente de risco de doenças cardiovasculares. Estudos demonstram que o ECC deve ser utilizado em pacientes assintomáticos com risco intermediário pelo poder de reclassificação, acima de 30%, do risco cardiovascular para diferentes categorias de risco. Recentemente as diretrizes do ACC/AHA recomendaram ECC como ferramenta adicional na avaliação clínica do risco, visando à prescrição ou não de estatinas em indivíduos de risco intermediário de acordo com escores clínicos. Parâmetros para refinar a estratificação do risco cardiovascular 1) História familiar É um dos parâmetros mais antigos e estudados. É considerado um critério “maior” quando há AVC, IAM ou morte cardiovascular em parentes de primeiro grau, homens menores de 55 anos ou mulheres com menos de 65 anos de idade. 2) Albuminúria Antigamente chamada de microalbuminúria, deve ser determinada na primeira urina da manhã (relação albuminúria/creatinúria em amostra urinária) e preferencialmente confirmada por uma segunda amostra. A urina de 24 horas é reservada para os casos graves ou duvidosos, já que sua coleta ambulatorial é pouco prática. 3) Presença de síndrome metabólica Tem como principal utilidade identificar um paciente de maior risco cardiovascular, ao mostrar a agregação de obesidade visceral, dislipidemia, disglicemia e hipertensão. 4) Proteína C reativa Valores acima de 0,2-0,3 mg/dl (ou 2-3 mg/L) estão associados com maior risco cardiovascular e o estudo JUPITER mostrou benefício com o uso da rosuvastatina. Seu maior “entrave” na prática clínica é a baixa especificidade, pois a PCR está comumente elevada por diversos fatores. 5) Espessura médio-intimal da carótida (IMT) O IMT, bem como as medidas quantitativas do número, espessura e área da placa parecem progressivamente mais sensíveis na predição do risco CV. A avaliação do IMT e da presença de placas em carótidas é indicado para pacientes na categoria de risco intermediário. Quando comparada ao ECC, o índice de reclassificação do IMT é de 23% para outras categorias de risco, menor que o ECC, para pacientes de risco intermediário. Medida simples e de fácil aquisição, o IMT > 0,9 – 1,0 indica a formação inicial de uma futura placa de aterosclerose. Na sua prática, deve ser medida como parte do exame do US com doppler de carótidas. 6) Escore de cálcio (CAC) Medido na TC cardíaca sem contraste – essa é sua principal vantagem, pois o exame é rápido (reduzindo exposição à radiação) e não usa iodo, com menor chance de nefropatia. Tem excelente correlação com risco futuro de eventos cardiovasculares e um escore de cálcio de zero tem alto valor preditivo negativo para doença arterial coronariana. Os raros casos de falso negativos ocorreriam pelas placas “moles”, recentes e instáveis, com maior conteúdo lipídico- inflamatório e ausência de calcificação. 7) Índice tornozelo-braquial (ABI) Foi desenvolvido como marcador de doença arterial periférica, cuja causa mais comum é aterosclerose. O problema é que o método oficial deve ser feito com auxílio do Doppler, para medir a PA sistólica no braço (braquial) e na perna (usando o pulso pedioso) ipsilateral. É anormal quando < 0,9. Há como ser Ana Carolina Thomaz Mendes adaptado para método palpatório, mas a acurácia diminui. Em um estudo europeu recente, o IMT, o CAC e o ABI foram avaliados como estratégia de refinamento do risco cardiovascular e mostraram excelente acurácia. Quando comparados entre si, o CAC foi aquele com melhor predição do risco de eventos cardiovasculares. Todavia, na prática clínica, história familiar, albuminúria, PCRt e a presença de síndrome metabólica são de identificação mais simples e fácil. ERG (Estratificação de Risco Global) O ERG estima o risco de infarto não fatal, morte por doença arterial coronária, AVE fatal e não fatal, insuficiência vascular periférica ou IC em 10 anos, sendo utilizado a partir dos 40 anos. Com o objetivo de reduzir a carga de doença cardiovascular, enfatiza-se o cálculo de risco global em 10 anos. Entretanto, grande parte dos indivíduos que são considerados de baixo risco em 10 anos, na verdade, apresentam alto risco ao longo da vida. A estimativa do risco de doença cardiovascular pelo tempo de vida permite estratificar, de forma mais abrangente, a carga de doença cardiovascular futura, pois leva em conta o risco de doença cardiovascular enquanto o indivíduo envelhece. A Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia recomenda o uso do Escore de Risco pelo Tempo de Vida em indivíduos de riscos baixo e intermediário a partir dos 45 anos. A diretriz americana (ACC/AHA) recomenda utilizá-lo em todas as pessoas entre 20 e 39 anos e naquelas entre 40 e 59 anos definidas como de baixo risco pelo Escore Global em 10 anos. O risco predito pelo Escore de Risco pelo Tempo de Vida > 39% em homens ou > 20% em mulheres caracteriza condição de alto risco ao longo da vida. Na avalição inicial de indivíduos assintomáticos, a estratégia é utilizar o ERG e, por meio do cálculo do risco baseado nos fatores de risco clássicos, classificar o indivíduo em determinada categoria de risco. Para isso, são utilizados fatores de risco como idade, sexo, PA, colesterol total e HDL-colesterol, tabagismo e DM. A diretriz publicada em 2017 considera as seguintes categorias de risco cardiovascular: ● Risco muito alto Indivíduos que apresentem doença aterosclerótica significativa (manifestação clínica prévia de doença coronária, cerebrovascular, vascular periférica, ou na ausência de eventos clínicos, obstrução ≥ 50% em qualquer território arterial). ● Risco alto Indivíduos sem eventos clínicos, em prevenção primária com ERG> 20% em 10 anos ou serem portadores de aterosclerose, na forma subclínica documentada por metodologia diagnóstica: ultrassonografia de carótidas com presença de placas; ITB< 0,9; escore de CAC > 100 unidades Agatston, ou a presença de placas ateroscleróticas na angio-CT de coronárias; aneurisma de aorta abdominal. Além disso, DRC definida por TFG < 60 mL/min, e em fase não dialítica, concentrações de LDL-c ≥ 190 mg/dL. São também classificados como de altos risco indivíduos diabéticos dos tipos 1 ou 2 com presença de Estratificadores de Risco (ER) ou DASC. ● Risco intermediário Indivíduos com ERG entre 5 e 20% no sexo masculino e entre 5 e 10% no sexo feminino, mesmo se diabéticos desde que não apresentem os critérios de DASC ou ER listados anteriormente. A reclassificação do risco pela presença de fatores agravantes do risco: Nos indivíduos de risco intermediário, devem ser avaliados os fatores agravantes de risco, que, quando presentes (um ou mais fatores),reclassificam o paciente para condição de alto risco. São eles: ● História familiar de doença arterial coronária prematura (parente de primeiro grau masculino < 55 anos e feminino < 65 anos). Ana Carolina Thomaz Mendes ● Critérios de síndrome metabólica: obesidade abdominal, hipertensão arterial, baixo HDL-C, hipertrigliceridemia e intolerância à glicose. ● Microalbuminúria (30 – 300 mcg/min) ou macroalbuminúria (> 300 mcg/min). ● Hipertrofia ventricular esquerda. ● Proteína C de alta sensibilidade > 2 mg/dl (na ausência de outras causas inflamatórias). ● Evidência de doença aterosclerótica subclínica. ● Espessura íntima-média de carótidas > 1,0 (estudo doppler). ● Escore de cálcio coronário > 100 (moderado) ou > percentil 75 para idade ou sexo (angiotomografia coronária). ● Índice tornozelo braquial (ITB) < 0,9. ● Baixo risco São considerados indivíduos de baixo risco aqueles com probabilidade menor que 5% em 10 anos de apresentar os principais eventos cardiovasculares: doença arterial coronária, acidente vascular cerebral, doença arterial periférica obstrutiva e insuficiência cardíaca. Os pacientes classificados nessa categoria, mas que tenham história familiar de doença cardiovascular prematura (familiares de primeiro grau < 55 anos masculinos e < 65 anos feminino) serão reclassificados para risco intermediário.
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