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QUESTIONÁRIO CAGE 1. Alguma vez o(a) senhor(a) sentiu que deveria diminuir a quantidade de bebida alcoólica ou parar de beber? Cut down; 2. As pessoas o(a) aborrecem porque criticam o seu modo de tomar bebida alcoólica? Annoyed; 3. O(a) senhor(a) se sente chateado(a) consigo mesmo(a) pela maneira como costuma tomar bebidas alcoólicas? Guilty; 4. Costuma tomar bebidas alcoólicas pela manhã para diminuir o nervosismo ou ressaca? Eye-opener). Duas respostas positivas sugerem a presença de dependência de álcool. A absorção do etanol se dá por difusão simples para o sangue, dependendo de concentrações entre os dois setores e a permeabilidade da mucosa. A presença de alimentos no estômago retarda a absorção. Outros fatores envolvidos na absorção são o tipo de bebida (cerveja mais lenta que destilados), idade e sexo (mulheres absorvem mais rapidamente). O metabolismo do etanol se inicia no estômago e intestino, pela etanol desidrogenase (ADH), a qual possui algumas variantes (isoenzimas) com atividades diferenciadas, a intestinal age de maneira diferente da hepática. A etapa gástrica do metabolismo é menos eficiente em mulheres do que nos homens. Estudos recentes mostram que também haveria metabolismo pelas bactérias intestinais, convertendo-o a acetaldeído por ADH bacteriana, o qual seria novamente metabolizado pela aldeído desidrogenase (ALDH) também de origem da flora intestinal. Como a atividade da ALDH colônica é baixa, pode ocorrer acúmulo de acetaldeído no cólon, o que seria responsável por alguns casos de diarreia devido ao etanol. Uma vez no fígado, o etanol é convertido em acetaldeído o qual é convertido em acetato. A enzima etanol desidrogenase ADH é a responsável pela primeira etapa da reação e a aldeído desidrogenase ALDH pela segunda. NAD+ é a coenzima presente em todas as etapas. O consumo do etanol pode levar a diferentes alterações no aparelho digestivo, desde lesões diretas na mucosa, alterações neurais e musculares (repercutindo na motilidade digestiva) , toxicidade a diferentes tecidos (como no fígado e pâncreas), comprometimento na absorção de diferentes nutrientes e até carcinogênese. Cavidade oral: lesões diretas na mucosa, glossites por hipovitaminoses e desnutrição geral, perda dentária, doenças gengivais e hipertrofia de parótidas. Esôfago: lesões diretas na mucosa, relaxamento do EII, favorecimento de refluxo gastroesofágico (e consequentes esofagites), esôfago em quebra nozes (dor torácica), síndrome de mallory-weiss (erosões no esôfago distal devidas a vômitos de repetição, podendo manifestar-se com sangramentos após períodos de vômitos intensos). Maior incidência de esôfago de Barret (alterações na mucosa esofageana com surgimento de epitélio glandular em áreas mais expostas ao refluxo, o que eleva o risco de surgimento de adenocarcinoma de esôfago). Estômago: alterar a secreção gástrica, provocar lesões mucosas de forma direta, interferir com a motilidade. atrofia de mucosa gástrica em etilistas crônicos, por ação direta do etanol na mucosa, originando uma progressiva redução na produção ácida, o que, além de interferir com processos digestivos, reduz as defesas primárias contra bactérias e eleva o risco de infecção por certos agentes patogênicos e de colonização em porções altas do trato digestivo. Potencializar a lesão por medicamentos como antiinflamatórios. Intestino delgado: interferir com a absorção de diversos nutrientes, interfere com a ação de várias enzimas intestinais (lactase), Por causar lesões na mucosa duodenal (pela liberação de citocinas, histamina e leucotrienos), mesmo ingestões agudas em indivíduos saudáveis podem apresentar erosões e até sangramentos. As lesões podem se estender aos vilos intestinais, facilitando a penetração de certas moléculas, como endotoxinas bacterianas, interleucinas e fator de necrose tumoral (TNF) na corrente sanguínea e linfática. Tais substâncias podem contribuir para o desenvolvimento das lesões hepáticas em etilistas. Foi observado um sobrecrescimento de certas bactérias produtoras de endotoxinas no intestino delgado de etilistas. Associada ao aumento de permeabilidade da mucosa, essa condição aumenta a exposição sistêmica às endotoxinas e ao risco de lesões hepáticas. Fígado: Doença hepática alcoólica: Alguns sinais relacionados ao alcoolismo podem ajudar no diagnóstico, como aumento de parótidas, contratura de Dupuytren, sinais de feminilização. No tecido hepático, três sistemas enzimáticos, o sistema de etanol desidrogenase citosólica (ADH); o sistema microssomal de oxidação do etanol (MEOS) e o sistema catalase peroxissomal; podem oxidar o etanol. O acetaldeído é o agente lesivo mais importante que resulta do metabolismo do etanol. Ele pode afetar diversos tecidos, através de processos oxidativos (principal) e ações imunológicas. ESTEATOSE HEPÁTICA A oxidação do etanol requer a conversão do NAD ao NADH. Como o NAD é necessário para a oxidação de gorduras, sua depleção inibirá tal processo, causando a acumulação de gorduras no hepatócito (esteatose). O acúmulo de gordura no hepatócito pode se dar em dias após consumo excessivo de etanol, podendo retornar ao estado oxidativo normal com abstinência do mesmo. A permanência desse estado de alteração do metabolismo lipídico do hepatócito pode gerar inflamação, formação de granulomas, de fibrose e evoluir para a cirrose hepática. Pode ser reversível com a suspensão da ingestão de etanol. Caso contrário, tende a evoluir para fibrose. HEPATITE ALCOÓLICA O efeito tóxico do etanol e do acetaldeído sobre as membranas celulares pode alterar tanto sua fluidez quanto sua capacidade de ligação enzimática e com carreadores. Nas mitocôndrias, as lesões podem se manifestar com a formação de megamitocôndrias. As lesões nos hepatócitos se manifestam mais nas regiões perivenulares (zona 3), mais sensíveis aos danos por hipóxia. O etanol também induz um estado de hipermetabolismo no hepatócito, em parte pelo fato do metabolismo do etanol pelo o sistema microssomal de oxidação do etanol (MEOS) não resultar em ganho energético pela formação de ATP. A geração de radicais livres superóxidos e hidroperóxidos pelo metabolismo de etanol e aldeído, também levam à depleção de glutation, a principal defesa contra os mesmos radicais. Outras defesas contra os radicais livres como zinco e vitamina E também costumam estar reduzidos em pacientes etilistas. Linfócitos B e T podem ser observados em espaços portal e periportal e linfócitos killer naturais podem ser vistos circundando hepatócitos de conteúdo hialino. Os pacientes costumam apresentar quedas nos linfócitos circulantes com aumento na relação de células helper/supressoras, demonstrando envolvimento da imunidade celular no quadro. O fator de necrose tumoral alfa (TNF-alfa) encontra-se muito elevado no plasma de portadores de hepatites alcoólicas, assim como as interleucinas 1, 6 e 8; supostamente envolvidas na modulação de certas complicações metabólicas do quadro. A imunossupressão com corticoides apresenta resultados positivos em alguns casos severos de hepatite alcoólica, reforçando essa teoria. Com a abstinência os pacientes podem apresentar melhoras sensíveis na função hepática dentro de meses ou anos, inclusive com melhora histológica. Se o abuso do etanol persistir, a hepatite também persistirá e a progressão para cirrose se torna um risco estabelecido dentro de meses ou anos. CIRROSE A cirrose é definida histologicamente como um processo difuso de fibrose (deposição de componentes da matriz extracelular, como colágeno) hepática e conversão da arquitetura normal do órgão para a formação de nódulos. O processo pode se dar desde meses até vários anos e representa o resultado final de diferentes doenças hepáticas crônicas. As principais complicações da cirrose são a hipertensão portal, a ascite, a encefalopatia hepática, diferentes distúrbios metabólicos e hormonais e a redução da imunidade, todos com diferentes possíveis desdobramentos. - A hipertensão portal em geral se manifesta clinicamente por esplenomegalia (em geral indolor),ascite de diferentes proporções e sangramentos por varizes de esôfago ou fundo gástrico (esse um quadro em geral grave e responsável por elevada mortalidade). Classificação de Child: Nota: o escore de Child- Pugh é calculado somando os pontos dos cinco fatores, variando entre 5 a 15. A classe de Child-Pugh é A (escore entre 5- 6), B (escore entre 7-9), C (escore acima de 10). Quando há descompensação da cirrose o escore de Child-Pugh é maior que 7. Escore de MELD: Escore que avalia a urgência para realização de transplante hepático. Model of end-stage liver disease. O escore tem parâmetros objetivos, varia entre 6 a 40 pontos. Cálculo do escore MELD = 3,8 log (bilirrubina) + 11,2 log (INR) + 9,6 log (creatinina) + 6,4 (etiologia*) A perda de função do hepatócito, em geral, se manifesta por hipoproteinemia (com consequente edema de membros inferiores e ascite), alterações de coagulação (podendo ir desde hematomas e sangramentos pequenos mais frequentes, até grandes hemorragias). A icterícia pode não se manifestar até em estágios avançados da doença, em geral relacionada tanto a falhas na conjugação quanto na excreção da bilirrubina, ou seja, manifestando-se laboratorialmente com aumento das duas bilirrubinas, conjugada e não conjugada. A encefalopatia hepática possui uma fisiopatologia complexa, relacionada tanto com perda da função de metabolização pelo fígado quanto de shunts vasculares, e pode se manifestar desde formas brandas com tremores de mãos (os quais podem ser atribuíveis a outras causas como a perda de massa muscular e lesões neurológicas também frequentes nos etilistas) confusão leve e inversão do sono para um padrão diurno despertar noturno; quanto estados de comas profundos (graduada de encefalopatia 1 a 4). Outros achados na cirrose seriam as manifestações vasculares cutâneas, como eritema palmar e aranhas vasculares (telangiectasias mais visíveis no tronco), baqueteamento digital, desaparecimento da lúnula ungueal, perda de massa muscular e fadiga associada e síndrome hepatopulmonar. PÂNCREAS A pancreatite crônica é definida como uma inflamação contínua e de longa duração do pâncreas, caracterizada por alterações estruturais irreversíveis no tecido, infiltrado linfomonocitário, calcificação e fibrose; podendo levar a dor abdominal crônica e perdas de função exócrina e endócrina do órgão. Os níveis sanguíneos das enzimas pancreáticas podem estar levemente elevados ou normais. A diferença com a pancreatite aguda é marcante, onde observamos dor abdominal severa e aguda, vômitos e diferentes graus de complicações metabólicas e infecciosas. Observamos também elevados níveis de enzimas pancreáticas (amilase e lipase) e infiltrado inflamatório neutrofílico. A pancreatite crônica pode apresentar surtos de agudização, clinicamente e laboratorialmente indiferenciáveis dos casos de pancreatite aguda, sendo a epidemiologia e os exames de imagem grandes auxiliares no diagnóstico diferencial. O etanol e o aldeído induzem a um aumento da produção de proteínas pelo tecido pancreático (células acinares) com redução de sua fluidez e da concentração normal de bicarbonato pelas células ductais. O líquido mais espesso tende a formar debris proteicos na luz dos ductulos, levando a pequenas obstruções com consequente atrofia acinar e fibrose. A produção alterada de litostamina (inibidora da formação de cristais de carbonato de cálcio) secundária às lesões induzidas pelo etilismo seria a principal responsável pelas condições que favorecem a formação de calcificações ductais. Uma teoria adicional postula que as demandas excessivas do metabolismo do etanol associadas a outros originadores de estresse oxidativo como a má nutrição e o tabagismo contribuem para a lesão celular. Assim como no fígado, o consumo de etanol leva a alterações enzimáticas no tecido, com subsequente metabolização e elevação de níveis de acetaldeído. No pâncreas, uma menor parte do metabolismo do etanol se dá também por via não oxidativa, gerando outros fatores tóxicos (etil ésteres) derivados de ácidos graxos, o que o torna mais sensível à toxicidade pelo etanol do que outros órgãos. Os homens são mais acometidos que as mulheres (6.7 vs 3.2 por 100,000), com maior prevalência na população negra (3:1). A idade do diagnóstico costuma ser levemente mais elevada para os homens (45 vs 35). Os fatores prognósticos associados são a idade no diagnóstico, tabagismo, persistência do etilismo e presença de doença hepática associada. A complicação mais frequente é o pseudocisto do pâncreas, uma coleção de suco pancreático restrita por estruturas vizinhas como estômago e mesocólon e por tecido fibrótico e de granulação, que pode assumir grandes proporções. Aparece em 10% dos casos e pode ser responsável por dores crônicas, compressão duodenal e de vias biliares, além de poder sofrer infecção bacteriana. Muitos se comunicam com o sistema ductal e podem conter grandes concentrações de enzimas pancreáticas. Fístulas para o peritônio e formação de ascite ou formação de derrames pleurais estão entre complicações menos frequentes. A perda da função exócrina (redução na produção da lipase) pode se manifestar com quadros de diarreia com presença de gordura (esteatorréia), perda ponderal e desnutrição. Lembremos que apenas 10% do conteúdo lipídico da dieta pode ser digerido até o estômago, dependendo fortemente da ação duodenal da lipase pancreática para seguir no processo digestivo, com a quebra dos triglicérides e posterior emulsificação pela bile. Como a reserva funcional do pâncreas é grande, não aparecem problemas com digestão de lipídios até que se atinja ao redor de 10% da função exócrina do órgão. A má absorção de gorduras também levaria a perda de absorção de componentes lipossolúveis como vitaminas A, D, E e K. Mais raramente pode ser vista a perda de função endócrina, com redução dos níveis de insulina e diabetes tipo pancreático, em geral sem gravidade e de mais fácil controle que as demais formas da doença.
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