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10,0 RESENHA - O MORRO DOS VENTOS UIVANTES

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BRONTË, Emily. O Morro dos Ventos Uivantes. São Paulo: Landy Editora, 2003. 
WUTHERING Heights. Direção: SKYNNER, David. Boston: WGBH/LWT, 1998. 113 
min. 
 
 Uma das obras mais marcantes da Literatura inglesa, O Morro dos Ventos Uivantes, 
de Emily Brontë, ao lado de narrativas como Drácula (1897) de Bram Stoker e 
Frankenstein (1818) de Mary Shelly, constitui a gama de romances vitorianos do século 
XIX. O clássico e único romance publicado de Emily, sob o pseudônimo de “Elis Bell”, 
em 1847, nos transporta para um cenário ornamentado com elementos do gótico, que 
envolvem uma história ultrarromântica, permeada por circunstâncias catastróficas, 
resultantes da oscilação entre amor e vingança. 
 Assim como os romances supracitados, Wuthering Heights (título original) ganhou 
diversas adaptações cinematográficas e televisivas, desde as versões em preto e branco, 
sendo a primeira lançada na Inglaterra em 1920, até à mais atual, lançada na Irlanda em 
2011. O romance de Brontë inspirou mais de uma dezena de adaptações no cinema e na 
TV. Entre elas, encontram-se adaptações de produção japonesa, francesa, mexicana e até 
brasileira. Objetiva-se aqui, abordagem comparativa acerca da versão de filme de 
televisão britânico de 1998. Essa versão, de mesmo título do livro, foi produzida por Joe 
Wright – conhecido pela direção de Pride and Prejudice (2005) – dirigida por David 
Skynner, estrelada por Robert Cavanah e Orla Brady. É considerada pelo público, como 
uma das versões mais próximas ao romance de Brontë, ao lado da adaptação de 1992, 
estrelada por Ralph Finnes e Juliette Binoche. Ambas incluem a segunda geração, Cathy 
e Hareton, no corpo das adaptações. 
 Em termos de análise, pode-se afirmar que a construção de Wuthering Heighs (1998), 
em sua estrutura, transpôs-se de modo muito semelhante ao texto elaborado por Emily 
Brontë, não apenas em sua cronologia e enredo, mas trouxe em essência alguns pontos 
principais dessa construção em passagens poéticas e na intensidade das emoções e falas 
dos protagonistas. Pode-se citar, a exemplo, a exibição dos discursos célebres do livro e 
a forma fiel como foram retratados. Os discursos mais famosos do romance, como a 
declaração melancólica de Catherine, em que ela afirma ser Heathcliff, além do seu último 
diálogo com o amado, em seu leito de morte, são sintetizados de forma poética e bem 
construída, o que resgata o sentimento trazido pela leitura da obra. 
 Nota-se, no entanto, de forma discreta, a escolha pelo foco no romântico em 
algumas cenas, enquanto outras nuances do gótico, como o caráter assombroso e 
mórbido, apresentam-se mais aprofundados na leitura, nos trazendo um pouco mais de 
desconforto no texto do que no filme. O apelo emotivo, na adaptação, se manifesta nas 
cenas de beijo, acrescentadas de forma estratégica à massa espectadora, já que o filme 
foi destinado à programação televisiva da época. Apesar dos pequenos acréscimos, essa 
versão permanece na linha do amor romântico entre o casal byroniano, amor de muita 
força, sofrimento e pouca sensualidade. A adaptação também aborda o outro fio que 
rege a trama: além do amor imortal, o desejo de vingança, as cenas de degradação em 
ambas as famílias e a violência também estão presentes. 
 O filme não focaliza sua atenção à psiquê das personagens, como no livro, mas 
retrata as transições entre os planos da realidade e da fantasia, resultado dos conflitos 
internos dos protagonistas. Expõe-se o martírio de Catherine em seus delírios até sua 
morte, tornando-se ela, posteriormente, o fantasma dos martírios de Heathcliff. Assim, os 
espectros aparecem com mais frequência no filme, embora não apareçam de forma tão 
lúgubre quanto no romance. 
 Outro ponto importante, é a representação de meados do século XVIII e início do 
século XIX – época que abarca a história – que se deu através das vestimentas das 
personas, a decoração dos espaços e os costumes. A dominância do ambiente escuro nos 
lembra a atmosfera da casa dos Earnshaws, assim como a escolha do ambiente iluminado 
nos remete à residência dos Lintons, reproduzindo aspectos da dualidade presente no 
romance. A atmosfera que envolve o enredo, se apresenta pela presença das charnecas, 
morros, árvores, e pelo teor de obscuridade estética na maioria das cenas, auxiliadas pela 
trilha sonora dramática de Warren Benett. 
 Um dos clímax surge a partir da morte do maléfico protagonista, que após enterrado, 
por sua exigência, ao lado de sua amada, parece enveredar em uma vida após a morte 
junto dela, trazendo para o público, uma deia de final feliz. Depois da morte de Heathcliff, 
o TV movie reforça essa ideia com o desenvolvimento amoroso da segunda geração, Cathy 
e Hareton. O desfecho agregou uma espécie de céu límpido após a tempestade, ao criar 
uma final feliz para as duas gerações. Já na narrativa de Brontë, o destino das duas almas 
mais antigas parece incerto, mas turbulento, dando lugar a nossa imaginação. 
 O Morro dos Ventos Uivantes (1847) é um dos romances mais adaptados para o 
cinema, presente em diversos lugares do mundo. Inclusive, o maior meio de divulgação 
da história escrita por Emily, no século XX, foi através do cinema. Essa, é uma das 
histórias mais bonitas e trágicas já escritas, com personagens que transcendem a época. 
O romance também inspirou uma canção de mesmo nome, escrita por Kate Bush, canção 
que posteriormente ganhou uma versão no Power Metal brasileiro, com a banda Angra. 
Em relação ao TV movie de 1998 e os seus dados registrados na rede, esse possui, Na 
Base de Dados de Filmes na Internet ou IMDb, uma nota mediana de 6,5 pela crítica e 
comentários positivos pelo público. 
 Sobre a relação entre cinema e literatura, tendo em mente que as duas formas de arte 
se realizam por diferentes meios e sistemas, sabe-se que, as adaptações, principalmente 
das classic novels, muitas vezes, são erroneamente tratadas com desdém, se não forem 
fiéis, à risca, ao texto pelo qual se embasaram. Cada um de nós, que lemos a obra, 
construímos uma imagem mental, parcialmente individual, do texto literário, com base 
em nossa visão de mundo. Assim, é quase inevitável fazer associações e comparações ao 
nos depararmos com as adaptações. Em contra partida, essa perspectiva pode, muitas 
vezes, divergir da visão advinda da direção do filme, por exemplo, assim como das suas 
motivações para a elaboração de seu trabalho, entrando em questão, a tarefa de englobar 
e retratar aspectos literários nas adaptações visuais e, também, a liberdade de criação. 
 Não importa, portanto, qual versão do romance é a mais fiel, pois a grandiosidade do 
texto continua a transcender o tempo, e continua sendo a fonte de todas as inspirações 
criadas a partir dela. Wuthering Heights (1998) tem a capacidade de envolver o espectador 
em sua trama, apresentando pontos principais da história. Apesar dos aspectos sombrios 
não estarem tão marcantes em seu corpo, o filme teve a liberdade de trazer uma 
perspectiva diferente quanto ao final, explorando o romance de Cathy e Hareton como 
uma forma de concretização daquilo que não foi vivido por Catherine e Heathcliff em 
vida, e, dando uma ideia diferente para o desfecho de Catherine e Heathcliff. Os espectros 
que, no livro, nos fazem deduzir sua viagem ao outro plano em forma de tormenta, 
ganharam um outro olhar. 
 
Roseli Bastos Almeida Mateus, acadêmica do curso de Letras pelo Instituto Federal 
de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará.

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