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Artigo e Material Complementar - Teorias do Pensamento Contemporaneo

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TEORIAS DO
PENSAMENTO CONTEMPORÂNEO
Paulo César Medeiros
Cleonice Soares de Sales
Diretores
Diretoria Executiva Luiz Borges da Silveira Filho
Diretoria Operacional Marcelo Antonio Aguilar
Diretoria Acadêmica Francisco Carlos Sardo
Editora
Coordenação Editorial Angela Krainski Dallabona
 Projeto Gráfico Evelyn Caroline Betim Araujo
Arte-Final Evelyn Caroline Betim Araujo
Capa Vitor Bernardo Backes Lopes
Direitos desta edição reservados à Fael.
É proibida reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael.
Edição 2021
1 A NATUREZA DO 
CONHECIMENTO HUMANO
“O pensamento é a ação ensaiando.”
Sigmund Freud
1.1 Evolução e conhecimento humano
Sabe-se que as capacidades cognitivas dos seres 
humanos seguiram a trilha do processo evolutivo 
do gênero Homo e de seus predecessores. Segundo 
Foladori (2001), nas últimas décadas, realizaram-se 
avanços importantes na paleontologia humana e na 
biologia molecular. Os dados da biologia molecular 
apontam que os primeiros hominídeos começaram 
a se desprender do tronco comum, que também deu 
origem aos grandes símios, há 5 ou 6 milhões de anos. 
Pouco tempo em relação aos demais seres vivos.
Os fósseis hominídeos primitivos mais conhe-
cidos datam em 3,5 milhões de anos (Australopitecus 
afarensis). Sua diferença básica em relação aos parentes 
símios é a posição erguida e a locomoção bípede nem 
tão sofisticada como as do Homo erectus e Homo habi-
lis, datados em 2,5 milhões de anos. A mudança da 
postura foi fundamental para a liberação das mãos, o 
aperfeiçoa- mento cerebral e a transformação de todo 
o organismo, que foram vinculados, também, às pres-
sões seletivas, produto de importantes transformações 
climáticas.
Por volta de 3 milhões de anos atrás, uma nova 
onda de frio provocou alterações e tornou o clima mais 
seco, acarretando mudança de dietas alimentares. A 
escassez e o processo de seleção natural levaram nossos 
ancestrais a se bifurcarem em duas práticas de sobrevi-
vência. O grupo de Australopitecus se especializou em 
extração de raízes e sementes, e o Homo habilis, com 
uma dieta onívora (alimentação vegetariana e carní-
vora), alcançou o êxito evolutivo mental e físico.
A posição erguida e a locomoção bípede trouxe-
ram vantagem adaptativa, acelerando as funções de 
deslocamento e liberando definitivamente as mãos 
para a transição do símio para o hominídeo. Com a 
nova habilidade internalizada, as pressões sobre as arti-
culações faciais foram reduzidas, dando lugar para a 
expansão dos órgãos da fala e do volume do cérebro.
A transição do hominídeo ao homem é tema de 
muitos debates científicos. Os achados arqueológi-
cos nos permitem compreender como os hominídeos 
fabricavam seus instrumentos e utensílios, como se 
distribuíam espacialmente e como se adaptavam às 
condições ambientais em que viviam. Esses registros 
fornecem ricas informações; porém, restam lacu-
nas sobre aquilo que pensavam e sobre a linguagem 
que utilizavam. Sabe-se que a relação entre cérebro, 
mãos e meio natural representou uma aceleração na 
hominização do humano, pois mudou a história de 
suas relações sociais e delas com a natureza. Assim, o 
pensamento humano seguiu a trajetória de sua pró-
pria humanização.
1.2 O pensamento e a construção 
do conhecimento
O pensamento é considerado como habilidade 
fundamental para a construção de ciência, pois ele 
permite a adaptação às novas realidades, melhorando 
o desempenho de cada indivíduo e a maneira como se 
explicam os fenômenos naturais e humanos. A inves-
tigação científica sobre o conhecimento humano e 
a sua interação com as diversas sociedades ao longo 
do tempo é realizada por diferentes áreas específicas, 
como história, sociologia, filosofia da ciência e episte-
mologia das ciências.
Neste texto, não serão aprofundadas as teorias do 
conhecimento, campo vasto de estudos realizados pela 
filosofia, pela psicologia cognitiva, pela inteligência 
Teorias do Pensamento Contemporâneo
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artificial, pela antropologia, pela neurociência e pelas 
demais ciências da cognição. Este texto se propõe a 
ser apenas um ensaio de orientação sobre as recentes 
abordagens relacionadas ao conhecimento humano. 
Em termos gerais, pode-se considerar que “conhecer” 
é uma necessidade inerente aos seres humanos e que 
envolve três elementos essenciais:
 2 O sujeito: aquele que está na condição de 
busca pela cognição de algo, alguma coisa, 
ou um objeto.
 2 O objeto: aquilo que o sujeito está objeti-
vando conhecer, seja um fato, coisas ou um 
fenômeno.
 2 A imagem da realidade: a representação 
mental que o sujeito realiza sobre o objeto 
da cognição.
Os vários métodos que procuram classificar o 
pensamento humano destacam a capacidade de pensar 
a partir de análises da capacidade mental dos sujeitos 
em relação aos objetos que buscam conhecer. Segundo 
Morin (2002), a mente humana opera sob duas gran-
des bases de pensar: a racional, ligada à lógica, ao cál-
culo e à razão; e a mítica, que ocorre em um âmbito 
mitológico, do imaginário, das analogias e dos símbo-
los. Para ele, o raciocínio humano acontece a partir da 
articulação desses dois tipos de pensamento, os quais 
não podem ser vistos separadamente, de modo que 
a esfera imaginária – dos mitos, religiões, crenças – 
adquire para o ser humano tanta importância quanto 
a esfera do pensamento racional. O conhecimento 
reconstrução do “real” realizado pelo ser humano, por-
tanto, não é completo, nem pode ser encarado como 
uma cópia exata do mundo objetivo, sendo sempre 
permeado por constantes “erros e ilusões”.
O conhecimento humano não se encerra nos 
princípios da razão e da lógica e deve ser sempre con-
siderado dentro de seus limites e incertezas. Dessa 
forma, tanto o pensamento quanto a construção do 
conhecimento são permeados não apenas por proces-
sos relativos à racionalidade e à lógica, mas também 
por fatores de outra natureza. O retorno do pensa-
mento a si mesmo para uma reflexão mais profunda 
aconteceu principalmente na filosofia clássica. Antes 
disso, o pensamento era citado como algo superior, 
quase como indescritível. O logos (razão, pensamento) 
era uma força imensa, que dirigia todo o universo e 
aparecia como inacessível aos seres humanos.
1.3 Estruturas e formas de conhecimento
De acordo com a natureza e a forma de expres-
são do conhecimento (sensação, percepção, imagi-
nação, memória, linguagem, raciocínio e intuição 
intelectual), este pode ser classificado em alguns 
tipos, a saber:
 2 conhecimento empírico;
 2 conhecimento teológico; 
 2 conhecimento filosófico; 
 2 conhecimento científico.
1.3.1 Conhecimento empírico
É também chamado de vulgar, intuitivo, de senso 
comum ou ordinário. Essa forma de conhecimento 
dos fatos não se preocupa em lhes inquirir as 
causas. Esse conhecimento é superficial, acontece 
por informação ou experiência casual. É ametódico 
e assistemático, constituindo a maior parte dos 
conhecimentos locais, pois é gerado para resolver 
problemas do cotidiano de forma instantânea e 
instintiva. Está ligado à vivência, à ação, à percepção e 
subordinado a um envolvimento afetivo dos sujeitos. 
Isso lhe confere dificuldades de se submeter a uma 
crítica sistemática e imparcial, gerando dificuldades 
de controle e avaliação experimental.
1.3.2 Conhecimento teológico
Esse conhecimento busca suas bases em teorias 
criacionistas, as quais explicam a origem do mundo, 
das coisas e do ser humano a partir de princípios 
divinos. O conhecimento teológico foi amplamente 
difundido no período medieval, no qual a autoridade 
divina se tornou inquestionável. Atualmente, desen-
volve-se nos meios acadêmico e religioso. Consiste em 
um conjunto de verdades que ocorre, não com o auxí-
lio de sua inteligência, mas mediante a aceitação de 
uma revelação divina. Tudo em uma religião é aceito 
pela fé, nada pode ser provado cientificamente nem se 
admite crítica, pois o justo viverá pelafé. A revelação 
é a única fonte de dados. Também conhecido como 
conhecimento religioso ou místico, ele é baseado 
exclusivamente na fé humana e desprovido de método 
e de raciocínio crítico. Alguns exemplos de conheci-
mento teológico são as Escrituras Sagradas, tais como 
a Bíblia, o Alcorão, as Encíclicas Papais e a Sagrada 
Tradição, que reúne decisões de Concílios e Sínodos, e 
outros. Também podem ser incluídos como conheci-
Teorias do Pensamento Contemporâneo
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mento teológico os ensinamentos de grandes teólogos 
e mestres da igreja.
O conhecimento humano não 
se encerra nos princípios da 
razão e da lógica e deve ser 
sempre considerado dentro 
de seus limites e incertezas.
1.3.3 Conhecimento filosófico
Sabe-se que a filosofia busca conhecer o esforço 
da razão para questionar os problemas humanos e 
discernir entre o certo e o errado. O conhecimento 
filosófico tem por objetos as ideias, as relações concei-
tuais e as exigências lógicas. Para analisar esses obje-
tos, utiliza o método racional, visando questionar os 
demais tipos de conhecimento (teológico, científico, 
empírico e outros que se apresentem). A ideia de existe 
a “verdade”. Esse termo pode ser aplicado quando os 
sujeitos do pensamento percebem o que está se desen-
rolando em sua volta e o conseguem comunicar, repre-
sentar ou interpretar, segundo sua razão e seus valores. 
O conhecimento filosófico reconhece as limitações da 
construção da verdade, pois ela não é absoluta. Para tal 
reconhecimento, utiliza dois importantes elementos 
para a busca de uma dada verdade: a evidência – o que 
aparece do objeto de estudo, sem invenções sobre o 
que se desvela; e a certeza – a confiança na verdade que 
está fundamentada na evidência, sem dúvida, ignorân-
cia ou juízo de valor.
1.3.4 Conhecimento científico
Esse conhecimento procura conhecer, além do 
fenômeno, suas causas e as leis que o regem. Busca 
descobrir os princípios explicativos que servem de 
base para a compreensão da organização, da classifica-
ção e da ordenação da natureza. Segundo Aristóteles, 
o conhecimento só acontece quando sabemos qual a 
causa e o motivo dos fenômenos. Em seu método, ele 
buscava conhecer perfeitamente essas causas, demons-
trando seus experimentos em laboratório, aplicando 
instrumentos, com trabalhos programados, metódicos 
e sistemáticos.
2 PENSAMENTO CIENTÍFICO: DA 
ERA CLÁSSICA À MODERNA
2.1 A mitologia como 
conhecimento do “mundo”
O termo “mitologia” deriva das palavras gregas 
mytos, que pode ser traduzida como fábula, lenda ou 
a criação de algo concreto ou abstrato que influen-
ciou os humanos, e logos, que significa um tratado 
ou algo a ser estudado. De modo geral, compreende-
-se mitologia como um conjunto de histórias fantás-
ticas e seus personagens fascinantes que influenciam 
o ser humano desde a Antiguidade até os dias atuais, 
desempenhado um papel importante como fonte de 
inspiração e ponto de partida do conhecimento sobre 
a natureza das coisas e do mundo.
Os mitos são um tipo de conhecimento que apa-
rece, geralmente, na forma de histórias baseadas em 
tradições e lendas criadas para explicar o universo, a 
origem do mundo, os fenômenos naturais e qualquer 
outro fato para o qual explicações simples não sejam 
atribuíveis. Em geral, a maioria dos mitos envolve for-
ças sobrenaturais de seres divinos. Esses seres ou figu-
ras mitológicas de sociedades clássicas (romana, grega, 
egípcia, nórdica, chinesa etc.) formaram a base do 
pensamento humano, nas diferentes civilizações.
A mitologia, como forma de explicação dos fenô-
menos naturais e humanos, gerou pontos de vista e 
crenças sobre cultura, política e religião que atraves-
saram os séculos e na atualidade ainda influenciam as 
civilizações. Muitos estudiosos do pensamento consi-
deram as histórias sobre a origem e os acontecimentos 
dos povos como contadores de mitos, como exemplos 
dos textos sagrados que buscam verdades religiosas, 
inspiradas divinamente e repassadas em linguagens 
humanas. Outro exemplo são as crenças em heróis 
nacionais sobre os quais se formam lendas sobre feitos 
espetaculares e incomuns.
Na atualidade, os mitos são retomados pela 
indústria cinematográfica, pela literatura infantojuve-
nil e pelos jogos eletrônicos. Filmes como O senhor 
dos anéis e os livros Star Trek e Harry Potter trazem 
aspectos mitológicos marcantes, que algumas vezes 
desenvolvem-se em sistemas filosóficos profundos e 
intrincados. A mitologia, tomada na forma de ficção, 
recria seres fantásticos que só existiram nas lendas do 
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passado, mas que na sociedade atual assumem forma e 
geram milhões de dólares.
2.2 O conhecimento filosófico 
clássico e medieval
O pensamento filosófico se desenvolveu em todos 
os povos e continentes. No entanto, é indiscutível a 
importância da filosofia que se praticava na Grécia, 
por volta de 2,5 mil anos atrás. Os sophos (sábios, 
em grego), que viveram no século VI a.C., buscaram 
diversos temas para reflexão e procuraram formular 
explicações racionais para tudo aquilo que era 
explicado, até então, pela mitologia. Os pensadores 
desse período clássico são divididos de acordo com sua 
ligação com Sócrates, o principal dos filósofos, em: 
pré-socráticos, socráticos e pós-socráticos.
2.2.1 Pensadores pré-socráticos
Foram os pensadores da Grécia Antiga que vive-
ram antes de Sócrates e tinham como principal preo-
cupação o universo e os fenômenos da natureza. Em 
seus ensaios filosóficos, buscavam explicar tudo por 
meio da razão e do conhecimento particular das coi-
sas. O matemático Pitágoras fez parte desse grupo e 
desenvolveu seu pensamento a partir da ideia de que 
em tudo preexiste a alma, já que esta é imortal. Outros 
filósofos pré-socráticos são Demócrito e Leucipo, que 
defendiam a formação de todas as coisas a partir da 
existência dos átomos.
2.2.2 Pensadores socráticos
Entre os séculos V e IV a.C. a Grécia viveu um 
grande desenvolvimento cultural, político e cientí-
fico. Entre os pensadores desse momento destacaram-
-se os sofistas, como Górgias, Leontinos e Abdera, 
que defendiam uma educação cujo objetivo máximo 
seria a formação de um cidadão pleno, preparado para 
atuar politicamente para o crescimento da cidade. Os 
jovens deveriam ser preparados para falar bem (retó-
rica), pensar e manifestar suas qualidades artísticas. 
Diferente dos sofistas, Sócrates começa a pensar e a 
refletir sobre o homem, buscando entender o funcio-
namento do universo dentro de uma concepção cien-
tífica. Para ele, a verdade está ligada ao bem moral do 
ser humano. Ele também acreditava que os pensadores 
teriam a função de entender o mundo da realidade, 
separando-o das aparências. Sócrates não deixou tex-
tos ou outros documentos escritos. O pensamento de 
Sócrates só foi conhecido por meio dos relatos dei-
xados por Platão, seu discípulo, que defendia que as 
ideias formavam o foco do conhecimento intelec-
tual. Outro pensador de destaque foi Aristóteles, que 
desenvolveu os estudos de Platão e de Sócrates. Ele 
desenvolveu a lógica dedutiva clássica como forma de 
chegar ao conhecimento científico. A sistematização e 
os métodos devem ser desenvolvidos para se chegar ao 
conhecimento pretendido, partindo sempre dos con-
ceitos gerais para os específicos.
2.2.3 Pensadores pós-socráticos
Essa época vai do fim do período clássico (320 
a.C.) até o fim da hegemonia política e militar da 
Grécia e início do Período Medieval na Europa. Sob 
a influência do pensamento de Sócrates, formaram-se 
várias correntes de pensamento:
a) ceticismo – para os céticos, a dúvida deve 
estar sempre presente, pois o ser humano 
não consegue conhecer nada de modo exato 
e seguro.
b) epicurismo – os epicuristas, seguidores do 
pensador Epicuro, defendiam que o bem era 
originário da prática da virtude. O corpo e a 
alma não deveriam sofrer para, dessa forma, 
chegar-se ao prazer.
c) estoicismo – os sábios estoicos, como Marco 
Aurélio e Sêneca, defendiama razão a qual-
quer preço. Para eles os fenômenos exteriores 
à vida deviam ser deixados de lado, como a 
emoção, o prazer e o sofrimento.
2.2.4 Pensamento medieval
Na Idade Média, o pensamento europeu foi 
muito influenciado pela Igreja Católica, que assumiu 
considerável poder, uma vez que os reis tornaram-
-se cristãos. O teocentrismo, doutrina filosófica da 
igreja, definiu as formas de sentir, ver e também de 
pensar da população. Entre os filósofos dessa vertente 
destaca-se o teólogo romano Santo Agostinho (354-
430), que acreditava que o conhecimento e as ideias 
eram de origem divina. Segundo esse pensamento, 
as verdades sobre o mundo e sobre todas as coisas 
deviam ser buscadas nas palavras de Deus. A partir 
do século V até o século XIII, uma nova linha de 
pensamento ganhou importância na Europa – era a 
escolástica, conjunto de ideias que visava unir a fé 
com o pensamento racional de Platão e Aristóteles. 
Teorias do Pensamento Contemporâneo
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O principal representante dessa linha de pensamento 
foi São Tomás de Aquino (1225-1274).
O teocentrismo definiu 
as formas de sentir, ver e 
também de pensar da
população durante a Idade 
Média.
2.3 Renascimento e 
conhecimento científico
A partir do século XIV, um grande movimento 
no pensamento humano passou a operar na Europa 
– o renascimento ou renascença. Nesse período, os 
impérios europeus ampliaram o comércio e a diversi-
ficação dos produtos de consumo que eram vendidos 
para a Ásia. O aumento do comércio gerou acumula-
ção de riquezas nas mãos da burguesia mercantil. Isso 
gerou condições de se investir na produção artística 
e intelectual.
Com a proteção e o apoio financeiro dos gover-
nantes e do clero na forma de mecenato, os intelectu-
ais, artistas e pensadores tiveram condições para pro-
duzir novos conhecimentos e, por consequência, uma 
grande transformação no conhecimento. Exemplos 
desse período são encontrados na península itálica, 
região em que o comércio mais se desenvolveu nesse 
período e gerou uma grande quantidade de locais de 
produção artística, como Veneza, Florença e Gênova.
Nesse processo de revitalização do conhecimento, 
houve grande valorização da cultura greco-romana 
clássica, pois acreditava-se que esta possuía uma visão 
completa e humana da natureza, ao contrário dos 
homens medievais; a inteligência, o conhecimento e o 
dom artístico passaram a ser as qualidades mais valo-
rizadas no ser humano; o homem passou a ser con-
siderado o principal personagem (antropocentrismo), 
em lugar de Deus (teocentrismo). Nesse período tam-
bém a razão e a natureza passam a ser valorizadas com 
grande intensidade, e os métodos experimentais e de 
observação da natureza e universo ganharam destaque.
Entre os pensadores preocupados com o desenvol-
vimento científico, pode-se citar Nicolau Copérnico 
(1473-1543) e seus estudos astronômicos sobre o Sis-
tema Solar e os movimentos das constelações. Foram 
também importantes os estudos de Galileu Galilei 
(1564-1642), que desenvolveu instrumentos ópticos, 
além de construir telescópios para aprimorar o estudo 
celeste. Galileu defendeu a ideia de que a Terra girava 
em torno do Sol e, por isso, teve de enfrentar a inqui-
sição da Igreja Católica.
3 EMPIRISMO: A EXPERIÊNCIA 
E O CONHECIMENTO
3.1 Concepções e métodos empíricos
Os empiristas procuravam argumentos nas ciên-
cias experimentais, na evolução do pensamento e do 
conhecimento humanos para justificar suas posições 
diante do que buscavam conhecer. Para eles, o conhe-
cimento resultava da observação dos fatos, na qual 
a experiência desempenha um papel fundamental. 
Por isso privilegiavam a experiência em detrimento 
da razão humana. Esses estudiosos afirmavam que o 
“sujeito cognoscente” é uma espécie de “tábula rasa”, 
na qual são gravadas as impressões decorrentes da 
“experiência” com o mundo exterior.
Por isso, essa corrente desconsidera o inatismo 
(doutrina que se entrelaça com o racionalismo), que 
admite a existência de um sujeito cognoscente (a mente, 
o espírito) dotado de ideias inatas, isentas de qualquer 
dado da experiência. Ainda que o termo “empirismo” 
tenha sido atribuído a um grande número de posições 
filosóficas, a tradição prefere aceitar como “empiristas” 
aqueles pensadores que afirmam ser o conhecimento 
derivado exclusivamente da experiência dos sentidos, 
da sensação ou da emperia.
Admitamos que, na origem, a 
alma é como que uma tábula rasa, 
sem quaisquer caracteres, vazia de 
ideia alguma: como adquire ideias? 
Por que meio recebe essa imensa 
quantidade que a imaginação do 
homem, sempre activa e ilimitada, 
lhe apresenta com uma variedade 
quase infinita? Onde vai ela bus-
car todos esses materiais que fun-
damentam os seus raciocínios e 
os seus conhecimentos? Respondo 
com uma palavra: à experiência. 
É essa a base de todos os nossos 
conhecimentos e é nela que assenta 
a sua origem. As observações que 
fazemos no que se refere a objec-
tos exteriores e sensíveis ou as que 
dizem respeito às operações interio-
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res da nossa alma, que nós aperce-
bemos e sobre as quais reflectimos, 
dão ao espírito os materiais dos 
seus pensamentos. São essas as duas 
fontes em que se baseiam todas as 
ideias que, de um ponto de vista 
natural, possuímos ou podemos vir 
a possuir (LOCKE, [s.d.], p. 68).
De acordo com a teoria de que o espírito, a mente, 
seja uma tábula rasa, uma superfície maleável às 
impressões da experiência externa, o empirismo pode 
ser estimado sob um prisma psicológico e sob outro 
gnosiológico. À medida em que a fonte do conheci-
mento não é a razão ou o pensamento, mas a experiên-
cia, a origem temporal de conhecer é concebida como 
resultado da experiência externa e interna – aspecto 
psicológico – e, por conseguinte, só o conhecimento 
empírico é válido – o aspecto gnosiológico.
3.2 Bases históricas do Empirismo
Entre os primeiros pensadores europeus que 
defenderam a ideia de que todos os conhecimentos são 
provenientes de experiências, encontra-se Aristóteles, 
que considerava a observação do mundo como base 
para a indução ou que, a partir da obtenção de dados 
particulares, no caso, a observação empírica, seria pos-
sível tirar conclusões (ou conhecimentos) de verdades 
mais absolutas. A partir de suas considerações, os filó-
sofos estoicos, epicuristas e ceticistas formularam teo-
rias empiristas mais explícitas acerca da formação das 
ideias e dos conceitos.
Os estoicos acreditavam que a mente humana era 
uma tábula rasa que seria marcada pelas ideias advin-
das da experiência sensível. Os epicuristas tiveram 
uma visão empirista mais forte, afirmando que a ver-
dade provinha apenas da sensação. Para eles, as coisas 
são conhecidas por meio de imagens em miniatura, 
os chamados fantasmas, que se desprendem do ser e 
chegam até aos sujeitos, indo diretamente à alma ou, 
indiretamente, por meio dos sentidos. O ceticismo 
teve como maior representante o filósofo Sexto, que 
ficou conhecido como O Empírico. Segundo ele, as 
verdades sobre o universo seriam inacessíveis ao ser; os 
sentidos eram a base do conhecimento, mas possuíam 
limitações que distorciam a imagem do mundo real, 
criando as ilusões.
A Idade Média europeia foi dominada pelo pen-
samento cristão que subordinava os demais pensa-
mentos à religião. Assim, a experiência sensível ou as 
ideias humanas não poderiam ser comprovadas e/ou 
refutadas senão pelo interesse de Deus e sua Trindade. 
Tomás de Aquino, célebre teórico da escolástica, 
defendia que o conhecimento opera em duas fases: 
sensível e intelectual, sendo que a segunda depende 
da primeira, mas ultrapassa-a: o intelecto vê a natu-
reza das coisas (intus legit) mais profundamente do 
que os sentidos, sobre os quais exerce a sua atividade. 
Por meio da observação, o conhecimento intelectual 
abstrai de cada objeto individual a sua essência, a 
forma universal das coisas. Portanto, Deus é cognos-
cível pelas experiências sensível e racional.Baseado 
nisso, Aquino propõe as chamadas “cinco provas da 
existência de Deus” (quinquae viae), das quais proce-
dem demonstrações igualmente racionais.
Na Idade Moderna europeia, o empirismo assu-
miu a forma de método sistemático tal como se 
conhece atualmente, e se difundiu como conheci-
mento nos meios acadêmicos emergentes. Entre seus 
formuladores principais destaca-se Francis Bacon, 
estudioso das ciências do mundo físico. Para ele, o 
método utilizado por empiristas anteriores não era 
sistemático: embora recolhessem dados da experiên-
cia, essas informações eram “capturadas” ao acaso, sem 
o auxílio de um método que classificasse e sistemati-
zasse as várias experiências e as orientasse no sentido 
de dar ao homem uma ciência útil, em oposição ao 
conhecimento produzindo. Pelo método da indução, 
se relacionaria o conhecimento sensível, que fornece-
ria material para a inteligência, e a racionalidade, que 
manipularia e daria sentido aos dados dos sentidos.
O filósofo inglês Thomas Hobbes (1558-1603) 
aplicou o método nos estudos da sociedade e da polí-
tica. Segundo ele, a verdade resulta de raciocínios cor-
retos, fundamentados pelas sensações. Hobbes criou 
um método rigoroso de controle das deduções lógicas 
provenientes da experiência, representada pelos acon-
tecimentos passados na história e da situação política 
do momento.
O método empírico de Francis Bacon e de Tho-
mas Hobbes influenciou toda uma geração de filóso-
fos britânicos, com destaque para John Locke (1632-
1704) que, em seu livro Ensaio sobre o entendimento 
humano, descreve a mente humana como uma tábula 
rasa (literalmente, uma “ardósia em branco”), na 
qual, por meio da experiência, são gravadas as ideias. 
A partir dessa análise empirista da Epistemologia, ele 
diferencia dois tipos de ideias: as ideias simples, sobre 
as quais não se poderia estabelecer distinções, como 
a de amarelo, duro etc., e as ideias complexas, que 
Teorias do Pensamento Contemporâneo
9Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 
seriam associações de ideias simples (por exemplo o 
ouro – que é uma substância dura e de cor amare-
lada). Com isso, seria formado um conceito abstrato 
da substância material.
Os estoicos acreditavam que a 
mente humana era uma tábula 
rasa que seria marcada pelas 
ideias advindas da experiência 
sensível.
Do ponto de vista político e filosófico, os pensa-
dores ingleses lançaram as raízes das ideias que, talvez, 
mais profundamente influenciaram a transformação 
da sociedade europeia. O empirismo que se desenvol-
veu na Inglaterra adquiriu características próprias, dos 
fatos e fenômenos do século XVI ao XVIII. Os pen-
sadores apresentaram uma preocupação menor pelas 
questões rigorosamente metafísicas, voltando-se bem 
mais para os problemas do conhecimento (que não 
deixam de incluir uma metafísica).
Seu método a posteriori, utilizando as ciências 
positivas, estabelece uma psicologia e uma gnosiolo-
gia sensistas, baseadas essencialmente nos sentidos, 
na sensação (sensus). Historicamente, o Empirismo se 
opõe à escola conhecida como Racionalismo, segundo 
a qual o homem nasceria com certas ideias inatas, as 
quais “aflorariam” à consciência e constituiriam as 
verdades acerca do universo. A partir dessas ideias, o 
homem poderia entender os fenômenos particulares 
apresentados pelos sentidos. O conhecimento da ver-
dade, portanto, independeria dos sentidos físicos.
3.3 Empirismo e modernidade
O empirismo de John Locke recebeu novas inter-
pretações no século XVIII nas formulações de George 
Berkeley (1685-1753). Segundo ele, uma substância 
material não pode ser conhecida em si mesma. O que 
se conhece, na verdade, resume-se às qualidades revela-
das durante o processo perceptivo. Assim, o que existe 
realmente não passa de um feixe de sensações. Daí sua 
famosa frase: “ser é ser percebido”. Berkeley postulava 
a existência de uma mente cósmica, a qual seria uni-
versal e superior à mente dos homens individuais. No 
entanto, apesar de existir, o mundo seria impossível 
de ser conhecido verdadeiramente pelo homem, pois 
esse conhecimento só é acessível a Deus. Ao assumir 
esse empirismo radical, esse pensador criou a corrente 
conhecida como idealismo subjetivo.
O escocês David Hume (1711-1776), seguindo 
a linha de Berkeley, identificou dois tipos de conhe-
cimento: matérias de fato e relação de ideias. O 
primeiro está relacionado com a percepção imediata 
e seria a única forma verdadeira de conhecimento. As 
relações de ideias se referem a coisas que não podem 
ser percebidas, que não têm correspondência na reali-
dade e seriam pura imaginação. Dessa forma, os pró-
prios conceitos abstratos utilizados pela ciência para 
analisar os dados dos sentidos não seriam verdadeiros.
Baseado nisso, Hume refutou a própria causali-
dade, a noção de causa e efeito, fundamental para a 
ciência. Para ele, o simples fato de um fenômeno ser 
sempre seguido de outro faz com que eles se relacio-
nem entre si de tal forma que um é encarado como 
causa do outro. Causa e efeito, como impressões sen-
síveis, não seriam mais do que um evento seguido de 
outro. A noção de causalidade seria, portanto, uma 
“criação” humana, uma acumulação de hábitos desen-
volvidos em resposta às sensações.
O pensamento de Hume e Berkeley influenciou 
várias escolas empíricas do século XIX, com destaque 
para o positivismo e a fenomenologia. Entre algumas 
correntes que tentaram aproximar o empirismo do 
racionalismo destacou-se o empirismo lógico (tam-
bém conhecido como positivismo ou neopositivismo 
lógico, embora alguns não concordem com essa sinoní-
mia), uma tentativa de sintetizar as ideias essenciais do 
empirismo britânico (por exemplo, a forte ênfase na 
experiência sensorial como base para o conhecimento) 
com a lógica matemática, a exemplo dos trabalhos de 
Ludwig Wittgenstein, Gottlob Frege, Bertrand Rus-
sell, George Mooro, Rudolf Carnap, Jonh Austin e 
Karl Popper e outros que aplicaram o empirismo em 
seus trabalhos.
Nem o racionalismo nem o empirismo são res-
postas totais aos problemas que pretendem resolver. 
O racionalismo opõe-se ao empirismo, e a doutrina 
empírico-racionalista representa uma tentativa de esta-
belecer a mediação entre essas duas escolas, afirmando 
que o conhecimento se deve à coparticipação da expe-
riência e da razão. O maior representante dessa cor-
rente é Emanuel Kant (1724-1804), filósofo alemão 
do século XVIII que abordou a questão da origem do 
conhecimento procurando conciliar as duas doutrinas 
– de fato, para Kant, todo o conhecimento começa na 
e pela experiência, mas não se limita a ela. Os elemen-
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tos múltiplos, diversos e contingentes fornecidos pela 
experiência são integrados em conceitos que o próprio 
entendimento possui a priori. Desse modo, a experi-
ência fornece a matéria, o conteúdo do conhecimento, 
enquanto o entendimento lhe dá certa forma; o que 
significa que o conhecimento é sempre o resultado da 
junção de uma forma e uma matéria.
A doutrina 
empírico‑racionalista afirma 
que o conhecimento se deve à 
coparticipação da experiência 
e da razão.
Kant analisa criticamente ambas as doutrinas – o 
racionalismo e o empirismo –, concluindo a insufi-
ciência de cada uma delas, se perspectivadas de um 
ponto de vista disjuntivo. Entretanto, se se concilia-
rem, talvez resolvam mais satisfatoriamente os pro-
blemas. Kant considera, pois, que o conhecimento 
não pode se fundamentar unicamente na razão, como 
pretendiam os racionalistas, mas também não pode se 
reduzir unicamente aos dados da experiência.
Esta é antes fonte dos dados recebidos pela nossa 
sensibilidade, mas devidamente organizados por 
determinados conceitos existentes no nosso conhe-
cimento, os quais não derivam da experiência, pois 
são-lhe independentes os anteriores – são os concei-
tos puros do entendimento a priori, daí chama aprio-
rismo a doutrina desenvolvida por Kant. Então, para 
esse pensador, o conhecimento é como o resultado de 
um processode transformação de uma matéria-prima 
dada pela experiência e apreendida pelo entendimento 
como tendo determinada significação.
4 RACIONALISMO: A FACULDADE 
AUTÔNOMA DO CONHECIMENTO
4.1 A razão como base do conhecimento
Sabe-se que a idade Moderna europeia foi inau-
gurada com o Renascimento, o qual se estabeleceu de 
fato nos séculos XVII e XVIII. Os dois grandes movi-
mentos filosóficos dos séculos XVII e XVIII são o 
empirismo, tendência positiva e prática, expresso pela 
cultura anglo-saxônica, conforme foi visto anterior-
mente, e o racionalismo, corrente vinculada ao pen-
samento francês.
Ainda que a razão seja um componente básico de 
todas as manifestações da filosofia ocidental, é no pen-
samento moderno que ela adquire novas característica 
e importância. Enquanto na Antiguidade era consi-
derada propriedade inteligível da natureza e, na Idade 
Média, uma luz cedida por Deus ao homem para que 
bem a utilize, na filosofia moderna a “razão” é deter-
minada como uma faculdade autônoma, que possui 
finalidade própria.
Em outras palavras, a razão torna-se, por excelên-
cia, veículo de análise e de entendimento do real, que 
caracteriza, de modo específico, o ser ou a substância 
racional, isto é, o homem. E, se por um lado se afirma 
veículo cognitivo do real, por outro se estabelece como 
órgão experimental da mesma realidade. Quer dizer, 
as construções racionais (racionalismo) se aliam aos 
dados da experiência (empirismo).
O racionalismo, tomado apenas etimologica-
mente, pode ser entendido como uma perspectiva cul-
tural pela qual o homem chega a verdades absolutas 
apenas com o uso da faculdade da razão. Seja a partir 
de fatos, os quais, ultrapassando a mera força dos sen-
tidos, permitem ao homem, com a força da razão, abs-
trair e atingir condições transcendentais do mundo; 
seja a partir da pura intuição, que prescinde dos fatos.
O racionalismo buscava conhecer a essência. Por 
isso, não se prendia aos fatos e ao mundo sensível, mas 
afirmava que a razão humana poderia transcender e 
chegar ao conhecimento de realidades suprassensíveis 
pela força da abstração e das concatenações racionais. 
Ao caráter naturalista que apresentava “a razão” no 
renascimento, é acrescentado, assim, um antropolo-
gismo. Por tais motivos, é possível afirmar que as filo-
sofias antiga e medieval preocupam-se mais com o ser, 
enquanto a filosofia moderna com o conhecer.
O racionalismo dos séculos XVII e XVIII é a dou-
trina que afirma ser a razão o único órgão adequado e 
completo do saber, de modo que todo conhecimento 
verdadeiro tem origem racional. Por tal motivo, essa 
corrente filosófica é conhecida como racionalismo 
gnosiológico ou epistemológico. A importância con-
ferida à razão por Descartes e pelos cartesianos, seus 
seguidores, é um modo de racionalizar a realidade, um 
lastro “metafísico” de cunho racional.
4.2 Pensamento e método cartesiano
Descartes propôs um desprendimento cosmoló-
gico da visão do homem, ou seja, deixar uma visão de 
Teorias do Pensamento Contemporâneo
11Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 
mundo centralizada na autoridade e no poder da reli-
gião e passar para a certeza do conhecimento, dando, 
assim, origem ao chamado racionalismo. Assume, de 
certa forma, o espírito iluminista de sua época, cen-
tralizando na capacidade racional humana da busca 
do conhecimento. Descartes preocupou-se fundamen-
talmente em construir um modo para que se pudesse 
chegar a um conhecimento que fosse seguro.
[...] criei um método que, parece-
-me, proporcionou-me os meios 
para o gradativo aumento de meu 
conhecimento, e a levá-lo, gradu-
almente, ao máximo de grau que 
a mediocridade de meu espírito e 
a breve duração de minha vida lhe 
permitirem atingir (DESCARTES, 
2000, p. 15).
Ele distingue o universo das ideias duvidosas do 
universo das ideias claras e distintas. As ideias claras 
e distintas são as ideias inatas, verdadeiras, não sujei-
tas ao erro, pois não vêm de fora, mas do próprio 
sujeito pensante. Em sua mais conhecida, O discurso 
do método, Descartes enumera quatro regras básicas 
capazes de conduzir o espírito na busca da verdade:
 2 regras de evidência – só aceitar algo como 
verdadeiro desde que seja evidente (ideias 
claras e distintas) – ideias inatas.
 2 regras de análise – dividir as dificuldades em 
quantas partes forem necessárias à resolução 
do problema.
 2 regras de síntese – ordenar o raciocínio (pro-
blemas mais simples aos mais complexos).
 2 regras de enumeração – realizar verificações 
completas e gerais para garantir que nenhum 
aspecto do problema foi omitido.
Descartes via o mundo como uma máquina, 
como um relógio. A natureza, segundo essa visão, é 
um conjunto de peças que deve estar em perfeito fun-
cionamento. Com essa obra, ele pretendia partilhar 
com o leitor o método que encontrou para si, a fim 
de alcançar uma ciência universal que pudesse elevar a 
nossa natureza ao seu mais alto grau de perfeição. Seu 
método é o da dúvida.
Para a razão adquirir seu pleno funcionamento, é 
necessário limpar o terreno da mente de todo precon-
ceito; é preciso, em um primeiro momento, duvidar 
de tudo, principalmente do que já se tem estabelecido 
como verdade absoluta, como dogma. Ele resume e 
enumera apenas quatro regras, quatro passos a serem 
dados no caminho de seu método:
 2 Jamais acolher coisa alguma como verdadeira 
que não conheça evidentemente como tal; 
isto é, evitar cuidadosamente a precipitação 
e a prevenção. E de nada incluir nos juízos 
que não se apresente tão clara e tão distinta-
mente a meu espírito que não tenha ocasião 
de pô-lo em dúvida.
 2 Dividir cada uma das dificuldades para que 
se examine em tantas parcelas quantas possí-
veis forem para melhor resolvê-las.
 2 Conduzir por ordem os pensamentos, 
começando pelos objetos mais simples e mais 
fáceis de conhecer, para subir, pouco a pouco, 
como por degraus, até o conhecimento 
dos mais compostos e supondo mesmo 
uma ordem entre os que não se precedem 
naturalmente uns aos outros.
 2 Fazer em toda parte enumerações tão com-
pletas e revisões tão gerais que se tenha a cer-
teza de nada omitir.
O cartesianismo também pode ser definido em 
uma perspectiva de senso comum como a primeira 
filosofia moderna, tendo estabelecido as bases da ciên-
cia moderna e contemporânea. O fundamento princi-
pal da filosofia cartesiana consiste na pesquisa da ver-
dade, com relação à existência dos “objetos” dentro de 
um universo de coisas reais.
O cartesianismo também 
pode ser definido em uma 
perspectiva de senso comum 
como a primeira filosofia 
moderna, tendo estabelecido 
as bases da ciência moderna e 
contemporânea.
O objetivo de Descartes é a pesquisa de um 
método adaptado para a conquista do saber, descobre 
esse método que tem como objetivo a clareza e a dis-
tinção, ou seja, com isso quer ser mais objetivo pos-
sível, imparcial, quer fundamentar o seu pensamento 
em verdades claras e distintas. Para isso, de acordo 
com o seu método, devem ser eliminadas quaisquer 
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influências de ideias que muitas vezes não são verda-
deiras, mas que são tidas como mitológicas, e por fim 
frequentemente acabamos aceitando tais mitos sem 
que os tenhamos comprovado de fato.
4.3 O Racionalismo Científico e Aplicado
A influência do racionalismo sobre o método 
científico alimentou a ideia de muitos pensadores dos 
séculos XIX e XX de que a ciência é obra da razão 
humana, uma espécie de máquina gerada por ela, cujas 
estruturas e leis internas é preciso descobrir.
O principal expoente dessa interpretação episte-
mológica é Gaston Bachelard (1844-1962). Esse autor 
afirma que a filosofia da ciência contemporânea não 
pode aceitar nem a solução realista nem a idealista. 
Segundo ele, deve colocar-se em um meio termo entre 
ambos, no qual sejam retomados e superados. Em sua 
gnosiologia, Bachelard põe o binômio experiência-ra-
zão na base de todo o conhecimento humano. Entre-
tanto, não se trata de um condomínio de potênciasiguais, pois o elemento teórico é que desempenha o 
papel normativo.
Bachelard (1977) indica a maneira segundo a 
qual o racionalismo, em seu diálogo permanente com 
o empirismo, constrói a estrutura de apreensão e de 
criação do conhecimento científico. O racionalismo 
aplicado de Bachelard procura mostrar a interdepen-
dência desses dois modos de pensar, os quais estariam 
disseminados por toda a ciência. Para ele, o conheci-
mento humano possui dois polos – idealismo e rea-
lismo – e nenhuma atividade se fixa somente em um 
desses polos.
A partir dessa premissa, esse pensador afirma ser 
possível, então, atribuir um caráter realista ao raciona-
lismo e um caráter idealista ao Empirismo, devido ao 
modo como estes se relacionam respectivamente com 
a instância empírica e com o plano das ideias.
5 PARADIGMAS DO PENSAMENTO 
CIENTÍFICO DO SÉCULO XX
5.1 Positivismo: pensamento 
e paradigma monista
O positivismo emerge no progresso das ciências 
naturais, particularmente das biológicas e fisiológicas, 
as quais buscavam resolver os problemas da Europa do 
século XIX. Esse paradigma científico se preocupou 
em aplicar os princípios e os métodos das ciências à 
filosofia como resolvedora do problema do mundo e 
da vida, com resultados. Edmund Leach descreveu o 
positivismo em 1966 como “a visão de que o inquérito 
científico sério não deveria procurar causas últimas 
que derivem de alguma fonte externa, mas sim, confi-
nar-se ao estudo de relações existentes entre fatos que 
são diretamente acessíveis pela observação”. Essa cor-
rente buscava explicar fatos mais práticos e presentes 
na vida do homem, como no caso das leis, das relações 
sociais e da ética.
Entre seus principais formuladores, encontra-
mos o francês Auguste Comte (1798-1857). Em seus 
ensaios, atribui fatores humanos às explicações dos 
diversos assuntos, contrariando o primado da razão, 
da teologia e da metafísica. Para Comte, o método 
positivista consistia na observação dos fenômenos, 
subordinando a imaginação à observação. Ele sinte-
tizou seu ideal em sete palavras: real, útil, certo, pre-
ciso, relativo, orgânico e simpático e preocupou-se 
com a elaboração de um sistema de valores adaptado 
à realidade que o mundo vivia na época da Revolu-
ção Industrial.
Para Comte, o espírito humano, em seu esforço 
para explicar o universo, passa sucessivamente por 
três estados:
5.1.1 Estado teológico ou “fictício”
Que explica os fatos por meio de vontades análo-
gas à nossa (a tempestade, por exemplo, será explicada 
por um capricho do deus dos ventos, Éolo). Esse estado 
evolui do fetichismo ao poli- teísmo e ao monoteísmo.
5.1.2 Estado metafísico 
Que substitui os deuses por princípios abstratos 
como “o horror ao vazio”, por longo tempo atribuído 
à natureza.
A tempestade, por exemplo, será explicada pela 
“virtude dinâmica” do ar. Esse estado é no fundo tão 
antropomórfico quanto o primeiro (a natureza tem 
“horror” do vazio exatamente como a senhora baro-
nesa tem horror de chá). O homem projeta esponta-
neamente sua própria psicologia sobre a natureza. A 
explicação dita teológica ou metafísica é uma explica-
ção ingenuamente psicológica. Ela tem, para Comte, 
importância sobretudo histórica como crítica e nega-
ção da explicação teológica precedente. Desse modo, 
Teorias do Pensamento Contemporâneo
13Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 
os revolucionários de 1789 são “metafísicos” quando 
evocam os “direitos” do homem – reivindicação crítica 
contra os deveres teológicos anteriores, mas sem con-
teúdo real.
5.1.3 Estado positivo
Que é aquele em que o espírito renuncia a pro-
curar os fins últimos e a responder aos últimos “por-
quês”. A noção de causa (transposição abusiva de 
nossa experiência interior do querer para a natureza) 
é por ele substituída pela noção de lei. Iremos nos 
contentar em descrever como os fatos se passam, em 
descobrir as leis (exprimíveis em linguagem matemá-
tica) segundo as quais os fenômenos se encadeiam 
uns nos outros. Tal concepção do saber desemboca 
diretamente na técnica: o conhecimento das leis posi-
tivas da natureza nos permite, com efeito, quando 
um fenômeno é dado, prever o fenômeno que se 
seguirá e, eventualmente, agindo sobre o primeiro, 
transformar o segundo (“ciência donde previsão, pre-
visão donde ação”).
Gnosiologicamente, o positivismo desenvolvido 
por Comte admite, como fonte única de conheci-
mento e critério de verdade, a experiência, os fatos 
positivos, os dados sensíveis. Não aceita qualquer 
metafísica, portanto, como interpretação, justificação 
transcendente ou imanente da experiência.
O positivismo do século XIX buscou bases meto-
dológicas no empirismo e no naturalismo inglês, redu-
zindo o conhecimento humano ao conhecimento sen-
sível; a metafísica, à ciência e o espírito, à natureza, 
com as relativas consequências práticas. Por meio de 
um conflito mecânico de seres e de forças, mediante a 
luta pela existência, determina-se uma seleção natural, 
uma eliminação do organismo mais imperfeito, sobre-
vivendo o mais perfeito.
Como teoria do pensamento, o positivismo vin-
cula-se ao monismo (do grego monis, “um”), às teo-
rias filosóficas que defendem a unidade da realidade 
como um todo (em metafísica) ou a identidade entre 
mente e corpo (em filosofia da mente) por oposição 
ao dualismo ou ao pluralismo, à diversidade da rea-
lidade em geral. No monismo, um oposto se reduz a 
outro, em detrimento de uma unidade maior e abso-
luta. As raízes do monismo na filosofia ocidental estão 
nos filósofos pré-socráticos, como Zenão e Parmênides 
de Eleia. Já Spinoza é o filósofo monista por excelên-
cia, pois defende que se deve considerar a existência 
de uma única coisa, a substância, da qual tudo o mais 
são modos.
5.2 Marxismo: materialismo e dialética
O marxismo é o conjunto de ideias filosóficas, 
econômicas, políticas e sociais elaboradas primaria-
mente por Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels 
(1820-1895). A concepção materialista e dialética da 
história interpreta a vida social conforme a dinâmica 
da base produtiva das sociedades e das lutas de classes 
daí consequentes.
O paradigma marxista compreende o homem 
como um ser social histórico que possui a capacidade 
de trabalhar e desenvolver a produtividade do traba-
lho, o que o diferencia dos outros animais e possibilita 
o progresso de sua emancipação da escassez da natu-
reza, proporcionando o desenvolvimento das poten-
cialidades humanas.
O método dialético influenciou os mais diversos 
setores da atividade humana ao longo do século XX, 
desde a política e a prática sindical até a análise e a 
interpretação de fatos sociais, morais, artísticos, his-
tóricos e econômicos. Marx criticou o sistema filo-
sófico idealista de Georg Wilhelm Friedrich Hegel 
(17701831), no qual a realidade se faz filosofia, pois 
para Marx esta precisa incidir sobre aquela. Pode-se 
dizer que o pensamento de Karl Marx se originou 
fundamentalmente a partir de seus estudos sobre três 
tradições intelectuais já bem desenvolvidas na Europa 
do século XIX: a filosofia idealista alemã de Hegel e 
dos neo-hegelianos, o pensamento da economia-polí-
tica britânica e a teoria política socialista utópica dos 
autores franceses.
O núcleo do pensamento de Marx é sua inter-
pretação do homem, que começa com a necessidade 
de sobrevivência humana. A história se inicia com o 
próprio homem que, na busca da satisfação de necessi-
dades, trabalha sobre a natureza. À medida que realiza 
esse trabalho, o homem se descobre como ser produ-
tivo e passa a ter consciência de si e do mundo pelo 
desenvolvimento do aprimoramento da produtivi-
dade do trabalho, da ciência sobre a realidade. Perce-
be-se então que “a história é o processo de criação do 
homem pelo trabalho humano”.
Hegel enunciou as características fundamentais 
da dialética, e Marx e Engels tomaram desse ensaio 
apenas o núcleo racional de sua dialética. O filósofo 
alemão Ludwig Andreas Feuerbach (1804-1872) rein-
Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 14tegrou o materialismo ao seu devido lugar, e Marx e 
Engels, assim como no caso de Hegel, tomaram apenas 
o núcleo central do materialismo de Feuerbach. Dessa 
maneira, podemos organizar o pensamento marxista 
nas seguintes estruturas:
5.2.1 O método dialético marxista
a) Olha a natureza como um conjunto de 
elementos ligados que dependem uns dos 
outros e são condicionados reciprocamente. 
Nada pode ser considerado ou entendido 
isoladamente, para se entender determinado 
fenômeno é necessário estudar o ambiente 
como um todo.
b) Olha a natureza como um estado de movi-
mentos constante. Como diz Engels, toda a 
natureza das partículas mais ínfimas aos cor-
pos maiores. Está empenhada em um pro-
cesso de aparecimento e desaparecimento, 
em um fluxo incessante, em movimento e 
em transformação perpétuos.
c) A dialética considera o processo de desen-
volvimento como o que passa das mudanças 
quantitativas e latentes a mudanças evidentes 
e radicais, às mudanças qualitativas.
d) A dialética entende que os objetos e os fenô-
menos da natureza encerram contradições 
internas, pois têm um lado negativo e um 
lado positivo, um passado e um futuro, todos 
eles têm elementos que desaparecem ou que 
se desenvolvem, a luta entre o velho e o novo. 
Lênin diz que a dialética no verdadeiro sen-
tido da palavra é o estudo das contradições 
na própria essência das coisas.
5.2.2 O Materialismo Filosófico Marxista
a) Marx parte do princípio de que o mundo, 
pela sua natureza, é material e que os múlti-
plos fenômenos do universo são diferentes da 
matéria em movimento.
b) O materialismo filosófico marxista parte do 
princípio de que a matéria, a natureza, o ser, 
são uma realidade objetiva existindo fora e 
independente da consciência.
c) Para o materialismo filosófico marxista, 
o mundo e as suas leis são perfeitamente 
conhecíveis. Não há de forma alguma no 
mundo coisas que não podem ser conheci-
das, mas unicamente coisas desconhecidas, 
as quais serão descobertas e conhecidas pela 
ciência e pela prática.
5.2.3 O Materialismo Histórico
a) O materialismo histórico considera que a 
força é o método de obtenção dos meios de 
existência necessários à vida dos homens, o 
modo de produção de bens materiais.
A primeira particularidade da produ-
ção, é a de que nunca se mantém em um 
dado ponto por muito tempo; está sem-
pre a transformar-se e desenvolver-se; além 
disso, mudança do modo de produção pro-
voca inevitavelmente a mudança de todo o 
regime social, as ideias sociais, as opiniões e 
instituições políticas; a mudança do modo 
de produção provoca a modificação de todo 
o sistema social e político.
b) A segunda particularidade da produção é a 
de que as transformações e o seu desenvolvi-
mento começam sempre pela transformação 
e desenvolvimento das forças produtivas. As 
forças produtivas são por consequência, o 
elemento mais móvel e mais revolucionário 
da produção.
c) A terceira particularidade de produção é que 
as novas forças produtivas e as relações de 
produção que lhes correspondem não apare-
cem fora do antigo regime, aparecem no ceio 
do velho regime.
5.3 Fenomenologia: a intencionalidade 
da consciência humana
A fenomenologia foi empregada em várias acep-
ções, por vários pensadores, ao longo da história da 
filosofia. O termo aparece na obra de Jean Lambert, 
em 1734, com o sentido de “doutrina da aparência”. 
Ele denomina fenomenologia a investigação que visa 
a distinção entre verdade e aparência, de modo a des-
truir as ilusões que com frequência se apresentam ao 
pensamento. Essa investigação é afirmada como o 
fundamento de todo saber empírico. Foi, em seguida, 
retomada por Kant e, sobretudo, por Hegel, que 
publica Fenomenologia do espírito, em 1807.
O método fenomenológico que emergiu na 
segunda metade do século XIX teve entre seus formu-
Teorias do Pensamento Contemporâneo
15Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 
ladores Franz Clemens Brentano (1838-1917), um 
filósofo alemão que, em suas análises, buscava a inten-
cionalidade da consciência humana, em sua intenção 
de descrever, compreender e interpretar os fenôme-
nos que se apresentam à percepção. Em oposição ao 
positivismo, a fenomenologia busca a volta às coisas 
mesmas, isto é, aos fenômenos, àquilo que aparece à 
consciência, que se dá como objeto intencional. Seu 
objetivo é chegar à intuição das essências, isto é, ao 
conteúdo inteligível e ideal dos fenômenos, captado 
de maneira imediata. No século XX, vários filósofos 
desenvolveram o método fenomenológico, entre eles: 
Edmund Husserl, Martin Heidegger, Jean-Paul Sartre 
e Maurice Merleau-Ponty.
O método fenomenológico consiste em mos-
trar o que é apresentado e esclarecer esse fenômeno. 
O objeto é como o sujeito o percebe, e tudo tem de 
ser estudado tal como é para ele, sem interferência de 
qualquer regra de observação. Um objeto, uma sensa-
ção, uma recordação, enfim, tudo deve ser estudado 
tal como é para o espectador. Toda consciência é cons-
ciência de alguma coisa. Assim sendo, a consciência 
não é uma substância, mas uma atividade constituída 
por atos (percepção, imaginação, especulação, volição, 
paixão etc.) com os quais visa algo.
Segundo Kant, o fenômeno deve caracterizar-se 
no tempo e no espaço por meio da aplicação das cate-
gorias do entendimento a priori (uma dedução lógica 
da coisa) e em seguida a posteriori (o que pode ser iden-
tificado “positivamente” quanto a esse objeto). Com 
a coisa inserida em um contexto temporal e espacial, 
está apta a receber todos os componentes da ciência 
afim de estudá-la. E, para a aplicação dos diversos juí-
zos da ciência (sintético/a priori; analítico/a posteriori), 
deve existir o ser que transcenda a ciência, o objeto e a 
terra. Segundo ele, a fenomenologia estuda a matéria 
como objeto possível da experiência.
Para Charles Sanders Peirce (1839-1914), filó-
sofo, cientista e matemático americano, a Fenome-
nologia constitui parte da filosofia e compreende o 
estudo do fenômeno que se apresenta de qualquer 
modo à mente, independentemente de qualquer cor-
respondência com a realidade. Essa escola de pensa-
mento, contudo, ganhou um novo e rigoroso dire-
cionamento no pensamento de Edmund Husserl, de 
maneira tal que o sentido atualmente vigente desse 
termo liga-se, por princípio, ao significado que lhe 
outorgou esse autor.
A fenomenologia, segundo Edmund Husserl 
(1859-1938), é um método que visa encontrar as leis 
puras da consciência intencional. A intencionalidade 
é o modo próprio de ser da consciência, uma vez que 
não há consciência que não esteja em ato, dirigida 
para um determinado objeto. Por sua vez, todo objeto 
somente existe enquanto apropriado por uma consci-
ência. Sujeito e objeto constituem, para essa concep-
ção, dois polos de uma mesma realidade.
6 CONFLITO DE PARADIGMAS E 
ABORDAGENS CONTEMPORÂNEAS
6.1 Cartesianismo: crise humana e ambiental
O físico Fritjof Capra, no seu livro O ponto de 
mutação, busca identificar os dois grandes paradigmas 
que se confrontam no fim do século XX: o mecani-
cista e o sistêmico. Segundo ele, o paradigma meca-
nicista agrupa todos os paradigmas que aceitaram a 
visão de mundo de René Descartes, segundo a qual o 
mundo natural é uma máquina carente de espiritua-
lidade e, portanto, deve ser dominada pela inteligên-
cia humana e ser colocada a seu serviço. Nessa visão, 
o mundo opera a partir de leis matemáticas, igual a 
qualquer máquina, o que permitiria que, ao serem 
estabelecidas rigorosamente, o homem teria uma 
cópia fiel do mundo. Essa visão agrupa o positivismo, 
o neopositivismo e a dialética materialista. Em suma, 
agrupam-se aqui as escolas de pensamento monista e 
algumas dualistas.
A fenomenologia busca a 
volta às coisas mesmas, isto 
é, aos fenômenos, àquilo que 
aparece à consciência, que se 
dá como objeto intencional.
Capra (1995) descreve como o mecanicismo car-
tesiano foi incorporado por todas as ciências tradicio-
nais, levando à crise individual, social e ambiental de 
caráter global que se vive hoje.A visão mecanicista 
adota a ideia de que o mundo natural é regido deter-
ministicamente por leis matemáticas em contraposi-
ção ao mundo humano, no qual há o livre-arbítrio.
O paradigma mecanicista privilegia a individuali-
dade, a luta e a competição. Ele transformou o mundo 
Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 16
medieval no mundo moderno de hoje. A tecnologia 
aplicada a todos os campos da vida cotidiana, indus-
trial e científica é fundamentada nas descobertas da 
ciência mecanicista, positivista, e as sociedades, ins-
tituições, bem como a individualidade e a subjetivi-
dade, funcionam de acordo com os modelos dialéti-
cos, materialistas. O que significa que, de fato, a crise 
vivida hoje em todas as áreas, desde a ecológica, pas-
sando pela social até a individual e espiritual, é respon-
sabilidade do paradigma cartesiano.
Max Horkheimer (1895-1973), filósofo e soció-
logo alemão, fez críticas ao racionalismo de Descartes. 
Segundo ele, o pensamento nascido com Descartes e, 
posteriormente, transformado em um dos princípios 
fundamentais da ciência moderna, privilegiou sem 
qualquer restrição uma racionalidade abstrata e voltada 
para a dominação da natureza, colocando assim o pen-
samento e a especulação filosófica em uma via de cres-
cente degradação. Com a separação do pensamento e 
da realidade concreta promovida pelo Cartesianismo, 
a razão transformou-se em um mero instrumento de 
dominação, perdendo sua força esclarecedora e o seu 
poder libertador. A racionalidade técnica, desprezando 
a objetividade em favor de regras (método) lógicas 
internalizadas, levou aos homens a possibilidade de 
domínio efetivo sob a natureza externa.
Ao lado do progresso da ciência e da indústria, 
a razão lógica e abstrata impôs uma dinâmica cega e 
irracional no que diz a respeito à condição humana.
Morin (1996) lembra que presenciamos a der-
rubada da ciência clássica cujos expoentes, Descartes 
e Newton, concebiam o mundo como perfeito. Para 
esse autor, essa perfeição é inexistente, o que ficou 
provado quando percebeu-se que o mundo era cons-
tituído por átomos, em um sistema formado de par-
tículas altamente complexas. Nesse aspecto, a ciência 
clássica é uma ciência limitada, presa a uma realidade 
determinista mecânica, que considera a subjetividade 
como fonte de erro, ao mesmo tempo em que exclui 
o observador e sua observação – mundo dos objetos, 
mundo dos sujeitos.
Segundo Kuhn (1975), essa crise faz surgir um 
novo paradigma, uma nova estrutura de pressupos-
tos que vão alicerçar uma comunidade científica. Um 
olhar em nova direção passa a dar corpo ao paradigma 
emergente, enquanto uma teoria capaz de abarcar a 
riqueza da ciência e do espírito.
Para Heisenberg (1995), a realidade é indeter-
minada, uma probabilidade na qual tudo pode acon-
tecer. A incerteza passa a ser rotulada subjetiva na 
medida em que se refere ao conhecimento do mundo 
de cada um. A única coisa que pode ser prevista é a 
probabilidade. A probabilidade, portanto, assume o 
lugar da certeza.
Segundo Bohm (1995), aquilo que se vê de ime-
diato é na verdade superficial, e as ideias devem cor-
relacionar-se ao que se vê de imediato. Ele define, 
portanto, que o holograma é o ponto de partida para 
uma nova descrição da realidade: a ordem dobrada em 
que a realidade é sempre inteira, total e essencialmente 
independente do tempo, em que o todo se manifesta. 
Desdobra simplicidade até abranger a complexidade 
do universo. Bohm afirma que o manifesto está dentro 
do não manifesto, e que este é maior e move aquele, 
captado pela armadilha do pensamento.
6.2 As teorias sistêmicas
A Teoria Geral dos Sistemas foi proposta em mea-
dos de 1950 pelo biólogo Ludwig von Bertalanffy. Suas 
pesquisas foram baseadas em uma visão diferente do 
reducionismo científico, até então aplicado pela ciên-
cia convencional. Bertalanffy compreendeu o sistema 
como um conjunto de elementos interdependentes 
que interagem com objetivos comuns formando um 
todo, no qual cada um dos elementos componen-
tes comporta-se, por sua vez, como um sistema cujo 
resultado é maior do que o resultado que as unidades 
poderiam ter se funcionassem independentemente. 
Qualquer conjunto de partes unidas entre si pode ser 
considerado um sistema, desde que as relações entre 
as partes e o comportamento do todo sejam o foco de 
atenção. Sistema é um conjunto de partes coordena-
das, formando um todo complexo ou unitário.
Os sistemas podem ser abertos ou fechados: os 
abertos sofrem interações com o ambiente em que 
estão inseridos. A interação gera realimentações que 
podem ser positivas ou negativas, criando uma autor-
regulação regenerativa, a qual, por sua vez, cria novas 
propriedades que podem ser benéficas ou maléficas 
para o todo independentemente das partes; os siste-
mas fechados são aqueles que não sofrem influência do 
meio ambiente no qual estão inseridos, de tal forma 
que ele se alimenta dele mesmo.
Segundo Bertalanffy (1975), os organismos (ou 
sistemas orgânicos) em que as alterações benéficas são 
absorvidas e aproveitadas sobrevivem, e os sistemas em 
que as qualidades maléficas ao todo resultam em difi-
Teorias do Pensamento Contemporâneo
17Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 
culdade de sobrevivência tendem a desaparecer, caso 
não haja outra alteração de contrabalanço que neutra-
lize aquela primeira mutação. A evolução permanece 
ininterrupta enquanto os sistemas se autorregulam. 
Um sistema realimentado se reorganiza e autogerencia 
isso é a autorregulação em que o todo assume as tarefas 
da parte que falhou.
Os parâmetros que compõem qualquer sistema 
são:
 2 entrada (input), sendo os impulsos recebidos 
de fora na forma de matéria e/ou energia;
 2 saídas (output), resultados ou produtos do 
sistema na forma de matéria e energia;
 2 processamento, transformação ou operação;
 2 retroação (feedback) em forma de retroali-
mentação;
 2 ambiente, sendo o meio que envolve o sistema.
Entre as várias vertentes que deram origem ao 
atual pensamento sistêmico, inclui-se a cibernética ou 
ciência dos sistemas de controle. A cibernética surgiu 
nos EUA e se consolidou durante uma série de confe-
rências patrocinadas pela Fundação Josiah Macy Jr. A 
partir de 1942, pesquisadores de várias procedências 
e diferentes áreas de interesse começaram a se reunir 
com regularidade. Entre eles, o biólogo chileno Hum-
berto Maturana tem se apresentado como grande crí-
tico do realismo matemático. Ele é o criador da teoria 
da autopoiese e da biologia do conhecer, e junto de 
Francisco Varela, faz parte dos propositores do pensa-
mento sistêmico e do construtivismo radical.
Dizem que nós, seres humanos, 
somos animais racionais. Nossa 
crença nessa afirmação nos leva a 
menosprezar as emoções e a enal-
tecer a racionalidade, a ponto de 
querermos atribuir pensamento 
racional a animais não humanos, 
sempre que observamos neles com-
portamentos complexos. Nesse 
processo, fizemos com que a noção 
de realidade objetiva, se tornasse 
referência a algo que supomos ser 
universal e independente do que 
fazemos, e que usamos como argu-
mento visando a convencer alguém, 
quando não queremos usar a força 
bruta (MATURANA, 1997).
A abordagem sistêmica de Maturana deriva de 
seu conceito fundamental: a autopoiese. Poiesis é um 
termo grego que significa “produção”. Autopoiese quer 
dizer autoprodução. A palavra surgiu pela primeira 
vez na literatura internacional em 1974, em um artigo 
publicado por Varela, Maturana e uribe para definir os 
seres vivos como sistemas que produzem a si mesmos 
de modo incessante. Esses são sistemas autopoiéticos 
por definição, porque sempre recompõem seus com-
ponentes desgastados. Assim, um sistema autopoiético 
é ao mesmo tempo produtor e produto.
De um modo geral, as principais ideias de Matu-
rana e sua contribuição ao pensamento sistêmico 
podem ser assim resumidas:
a) enquanto não entendermos o caráter sistê-
mico da célula, não conseguiremos compre-
ender os organismos;
b) a autopoiese define comclareza os fenôme-
nos biológicos;
c) os fenômenos sociais podem ser considera-
dos biológicos, porque a sociedade é formada 
por seres vivos;
d) a noção de que os sistemas são determinados 
por sua estrutura é de fundamental importân-
cia para muitas áreas da atividade humana.
Para Maturana, o termo “autopoiese” traduz o 
centro da dinâmica constitutiva dos seres vivos. Para 
exercê-la, esses seres precisam de recursos do ambiente. 
Portanto, são sistemas ao mesmo tempo autônomos e 
dependentes. Maturana e Varela utilizaram uma metá-
fora didática para falar dos sistemas autopoiéticos. 
Para eles, tais sistemas são máquinas que produzem 
a si próprias. Nenhuma outra espécie de máquina é 
capaz de fazer isso, pois todas elas produzem sempre 
algo diferente de si mesmas.
6.3 A teoria da complexidade
Segundo uma importante dimensão ou pres-
suposto epistemológico emergente na ciência é o da 
complexidade. Esse tema não é novo, ele surge de 
maneira mais efetiva nos anos 1980. Sabe-se que as 
ciências biológicas e sociais há muito se defrontam 
com a dificuldade de adotar o paradigma tradicional 
de ciência, enquanto as ciências físicas, por obterem 
sucesso em sua forma de trabalhar com esse para-
digma, eram vistas como modelo de cientificidade 
(VASCONCELLOS, 2002).
Segundo Morin (1990), a palavra “complexi-
dade” tem origem no latim complexus, que significa 
o que está tecido em conjunto. Refere-se a um con-
Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 18
junto cujos constituintes heterogêneos estão insepa-
ravelmente associados e integrados, sendo ao mesmo 
tempo uno e múltiplo. Para que se possa perceber o 
complexo, é preciso ampliar o foco, em vez de acre-
ditar que o objeto de estudo será o elemento, ou o 
indivíduo, e que será preciso delimitá-lo muito bem, 
deve-se passar a acreditar que o objeto será estudado 
ou trabalhado em seu contexto.
Segundo Frederic Munné (1995), a Teoria da 
Complexidade mostra que a realidade é não linear, 
caótica, fractal, catastrófica e fuzzy (difusa) e deve ser 
vista de forma não somente quantitativa, mas, princi-
palmente, qualitativa. A realidade é inacabada, é um 
eterno e caótico fluir. Ela engloba várias teorias recen-
tes – Teoria do Caos, dos Fractais, das Catástrofes, da 
Lógica/Conjuntos Fuzzy (difusos) e outras proceden-
tes das ciências exatas que se dirigem, explícita e impli-
citamente, para uma visão cada vez mais aproximada 
da realidade, sem simplificação, sem reducionismo. 
Paradoxalmente, essas teorias aproximam-se das ciên-
cias naturais e das ciências humanas, sendo aplicadas 
para entender as estruturas e os processos organizacio-
nais complexos que transcendem as teorias clássicas 
sobre organizações humanas.
Os diferentes pensadores da complexidade reco-
nheceram que ela não é como se acreditava inicial-
mente, uma propriedade específica dos fenômenos 
biológicos e sociais, tornando-se, portanto, um pressu-
posto epistemológico transdisciplinar que surge sobre 
três aspectos:
 2 1 o “problema lógico” – no início do século 
XX, no campo da microfísica defrontavam-
 2 -se duas concepções, a da partícula subatô-
mica concebida de um lado como onda e 
de outro como partícula, obrigando os pes-
quisadores a fazer uma das opções. Até que 
Niels Bohr afirmou que “essas proposições 
contraditórias eram de fato complementares 
[e que] logicamente se deveriam associar os 
dois termos que se excluem mutuamente” 
(MORIN, 1991, p. 422). Esses princípios 
foram também analisados por Max Plank 
(1990), que percebeu que a luz parecia auto-
contraditória, consistindo, ao mesmo tempo, 
em ondas e em partículas, fato que elimina 
a dualidade. Essa dualidade levou ao desen-
volvimento da teoria quântica para a mecâ-
nica quântica, ao descobrimento do funcio-
namento do átomo e ao reconhecimento do 
mundo subatômico como espaço-tempo em 
que predomina o “princípio da incerteza” e 
“princípio da complementaridade”.
 2 o “problema da desordem” – remete-se à 
dimensão da instabilidade. A física constatou 
também o problema da tendência à desor-
dem, que veio para derrubar um dogma cen-
tral da física, a ordem. Segundo esse dogma 
o mundo é estável, funciona como uma 
máquina mecânica absolutamente perfeita, 
em que a desordem não seria mais que uma 
ilusão ou uma aparência. Um tipo de desor-
dem veio das pesquisas da termodinâmica. 
Segundo Prigogine (1980), a descoberta de 
que o calor corresponde à agitação desorde-
nada das moléculas por Boltzmann permitiu 
que se notasse que a entropia corresponde a 
uma medida da desordem molecular. O reco-
nhecimento da desordem exigiu uma nova 
forma de pensar, que incluísse a indetermi-
nação e a imprevisibilidade dos fenômenos.
Os diferentes pensadores da 
complexidade reconheceram 
que ela não é como se 
acreditava inicialmente – 
uma propriedade específica 
dos fenômenos biológicos e 
sociais.
 2 o “problema da incerteza” – remete-se à 
dimensão da intersubjetividade. Morin 
(1983) ensina a complexidade da relação de 
conhecimento, da relação entre sujeito que 
conhece e o objeto que é conhecido já é tema 
a muito discutido pelos pensadores e filó-
sofos. Entretanto, essa relação só foi trazida 
formalmente para o âmbito da ciência pela 
física, quando Heisenberg formulou o “prin-
cípio da incerteza” no qual “não se pode ter, 
simultaneamente, valores bem determinados 
para a posição e para a velocidade, em mecâ-
nica quântica”. Com isso, demonstrou que 
nem mesmo a mensuração poderia produzir 
certeza e que “ao se lançar sobre um elétron, 
a fim de poder ‘vê-lo’, isso inevitavelmente o 
Teorias do Pensamento Contemporâneo
19Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 
colocava fora de curso, afetando sua veloci-
dade ou sua posição”.
Essas descobertas provocaram a eclosão do pen-
samento complexo e, por consequência, o avanço 
de diversas ciências. Nas ciências humanas, deu-se 
início a uma visão mais integradora para o conhe-
cimento do seu objeto de estudo, o ser humano, e 
assim a busca de uma ciência que pudesse atender 
a demanda da crise socioambiental. Para se ter uma 
melhor percepção do que se concebe no âmbito do 
pensamento científico como complexidade, é preciso 
conhecer suas bases epistemológicas.
6.4 Abordagem cultural e conhecimento
O termo “cultura” em latim significa os cuidados 
prestados aos campos e ao gado. No século XVI, essa 
palavra definia a ação de cultivar a terra; e no fim do 
século XVII passou a ser usado no sentido de uma 
faculdade ou o trabalho para desenvolver uma facul-
dade. Mas foi no século XVIII que a palavra assumiu 
seu sentido figurado, como nas expressões “cultura das 
artes”, “cultura das letras”, “cultura das ciências”. O 
termo “cultura” também se associa às expressões “for-
mação”, “educação do espírito”. É associada à ideia de 
progresso, educação (uma pessoa “culta”).
Pierre Bourdieu (1930-2002) foi um sociólogo 
francês que analisou diferenças culturais entre grupos 
sociais e desenvolveu o conceito de habitus: sistemas 
de disposições duradouras e transponíveis, estruturas 
adquiridas por meio de conhecimentos próprios de 
modos de vida particulares. Ele caracteriza uma 
classe ou um grupo social por comparação com 
outros que não partilham das mesmas condições 
sociais. O habitus funciona como a materialização 
ou a incorporação da memória coletiva.
Franz Boas (1858-1942) mostra que a aplicação 
desse método recusa as determinações do meio físico e 
as determinações raciais como responsáveis pela diver-
sidade dos modos de vida humanos. É na cultura e no 
particularismo histórico que ele vai buscar as fontes 
dessa diversidade. Boas, ao criticar o evolucionismo, 
lançou as bases do culturalismo, cujo objeto de refle-
xão eram as sociedades ditas primitivas, espalhadas 
sobre o globo terrestre, consideradas na sua especifici-
dade, na sua originalidade.
Segundo Consorte (1997), o culturalismo emerge 
como esforço de compreensão da diversidade humana, 
“constitui-se no processo de crítica ao evolucionismo, 
caracterizando-se, fundamentalmente,por duas rup-
turas uma com o Determinismo Geográfico e outra 
com o Determinismo Biológico”. No campo da psico-
logia, o Culturalismo atribui à cultura o papel deter-
minante no desenvolvimento do caráter e da persona-
lidade, enquanto nas ciências sociais em geral ele se 
traduz no destaque do papel da cultura na organização 
das condutas e dos fenômenos coletivos.
Entre os conceitos mais importantes que ganha-
ram força no culturalismo está o de identidade, que 
se remete para o sentido de pertença, influenciando 
o comportamento dos indivíduos em modalidade de 
categorização na distinção eu-você e nós-eles. Desse 
conceito deriva a identidade social, na qual a coleti-
vidade pode perfeitamente funcionar admitindo no 
seu interior certa pluralidade cultural. O que cria a 
separação, a fronteira, é a vontade de diferenciação e a 
utilização de certos traços culturais como marcadores 
da sua identidade específica.
No campo da psicologia, o 
culturalismo atribui à cultura 
o papel determinante no 
desenvolvimento do caráter e 
da personalidade.
7 A COMPLEXIDADE HUMANA: 
LIMITES E DESAFIOS EDUCACIONAIS
7.1 Novos paradigmas e 
conhecimento científico
Na primeira década deste século, as preocupa-
ções com os sistemas naturais e humanos adquiriram 
suprema importância. Veio à tona com toda uma série 
de problemas globais que estão danificando a biosfera 
e a vida humana de uma maneira alarmante, em um 
cenário de degradação próximo de ser irreversível. 
Existe ampla documentação científica a respeito da 
extensão e da importância desses problemas. Quanto 
mais se conhece os principais problemas da atuali-
dade, mais percebe-se que eles não podem ser enten-
didos isoladamente. São problemas sistêmicos, o que 
significa que estão interligados e são interdependentes.
Em última análise, esses problemas precisam ser 
vistos, exatamente, como diferentes facetas de uma 
Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 20
única crise, que é, em grande medida, uma crise de 
percepção. Ela deriva do fato de que a maioria das 
pessoas, e em especial grandes instituições sociais, 
concordam com os conceitos de uma visão de mundo 
obsoleta, uma percepção da realidade inadequada para 
lidar com as questões culturais e naturais deste século.
Thomas Kuhn (1962) aponta que esse movimento 
ocorre sob a forma de rupturas descontínuas e revo-
lucionárias denominadas mudanças de paradigma. 
Segundo ele, há um “paradigma” científico, que pode 
ser definido como “uma constelação de realizações – 
concepções, valores, técnicas etc. – compartilhada por 
uma comunidade científica e utilizada por ela para 
definir problemas e soluções legítimos. O paradigma 
que está agora retrocedendo dominou a cultura por 
várias centenas de anos, durante as quais modelou a 
moderna sociedade ocidental e influenciou significati-
vamente o restante do mundo.
Segundo Chizzotti (2005), as concepções de 
mundo denominam-se paradigmas e estes represen-
tam uma concepção teórica, uma crença que direciona 
a leitura do mundo, ou que faz que se enxergue o 
mundo de um determinado modo. Por conseguinte, 
as teorias que orientam as investigações podem ser 
definidas também como paradigmas, modelos ou pos-
turas dos investigadores.
Boaventura Santos, apresentando as teses de um 
paradigma emergente e argumentando que todo o 
conhecimento científico visa constituir-se em senso 
comum, diz:
[...] a ciência pós-moderna sabe que 
nenhuma forma de conhecimento 
é, em si mesma, racional; só 
a configuração de todas elas é 
racional. Tenta, pois, dialogar com 
outras formas de conhecimento 
deixando-se penetrar por elas. 
A mais importante de todas é o 
conhecimento do senso comum, 
o conhecimento vulgar e prático 
com que no quotidiano orientamos 
as nossas acções e damos sentido 
à nossa vida. [...] É certo que o 
conhecimento do senso comum 
tende a ser um conhecimento 
mistificado e mistificador mas, 
apesar disso e apesar de ser 
conservador, tem uma dimensão 
utópica e libertadora que pode ser 
ampliada através do diálogo com o 
conhecimento científico” (2002, p. 
55-56)
Reconhecer a falência das certezas é tomar consci-
ência da crise paradigmática que se vive. Os parâmetros 
de verdade – aqueles transmitidos de geração em gera-
ção – não são os mesmos e não conseguimos mais agir 
como nossos pais, como pensava o músico e o poeta.
Os novos paradigmas e modelos de saber cientí-
fico que emergem trazem consigo uma nova visão de 
mundo para a sociedade. Nessa nova visão o conhe-
cimento que necessita ser sustentado em princípios, 
tais como:
 2 o conhecimento científico-natural é cientí-
fico social sem ruptura entre o ser humano e 
natureza, o orgânico e o inorgânico, a consci-
ência e a realidade física externa, o que leva a 
um saber sem distinção entre ciências exatas 
e humanas. O ser humano está no centro do 
conhecimento, mas a natureza está no centro 
do ser humano;
 2 o conhecimento é local e total, sem fragmen-
tação do saber. O saber se constitui multidisci-
plinarmente por meio de uma síntese de várias 
fontes, métodos, vivências e percepções;
 2 o conhecimento é autoconhecimento, sem 
distinção entre observador e fenômeno, 
sujeito e objeto, subjetivo e objetivo. O pen-
samento científico não descobre, cria conhe-
cimentos, e não é a única explicação possível;
 2 o conhecimento científico deixa de ser hermé-
tica e reservada a poucos eleitos capacitados, 
para ganhar o domínio público e tornar-se um 
saber popular.
7.2 A formação do cidadão complexo
Morin (2003), ao analisar as bases da educação do 
futuro, aponta que ela deverá ser o ensino primeiro e 
universal na condição humana. Vive-se na era plane-
tária; uma aventura comum conduz seres humanos, 
onde quer que se encontrem. Estes devem reconhecer-
-se em sua humanidade comum e ao mesmo tempo 
reconhecer a diversidade cultural inerente a tudo que 
é humano.
Conhecer o humano é, antes de 
mais nada, situá-lo no universo, e 
não separá-lo dele. Todo o conhe-
cimento deve contextualizar seu 
objeto, para ser pertinente. “Quem 
somos?” é inseparável de “Onde 
estamos?”, “De onde viemos?”, 
Teorias do Pensamento Contemporâneo
21Faculdade Educacional da Lapa - FAEL 
“Para onde vamos?” Interrogar 
nossa condição humana implica 
questionar primeiro nossa posição 
no mundo. O fluxo de conheci-
mentos, no final do século XX, traz 
luz sobre a situação do ser humano 
no universo. Os progressos con-
comitantes da cosmologia, das 
ciências da Terra, da ecologia, da 
biologia, da pré-história, nos anos 
60-70, modificaram as ideias sobre 
o universo, a Terra, a Vida e sobre o 
próprio Homem. Mas estas contri-
buições permaneceram ainda desu-
nidas. O humano continua esquar-
tejado, partido como pedaços de 
um quebra-cabeça ao qual falta 
uma peça. Aqui se apresenta um 
problema epistemológico: é impos-
sível conceber a unidade complexa 
do ser humano pelo pensamento 
disjuntivo, que concebe nossa 
humanidade de maneira insular, 
fora do cosmos que nos rodeia, 
da matéria física e do espírito do 
qual somos constituídos, bem 
como pelo pensamento redutor, 
que restringe a unidade humana a 
um substrato puramente bioana-
tômico. As ciências humanas são 
elas próprias fragmentadas e com-
partimentadas. Assim, a comple-
xidade humana torna-se invisível 
e o homem desvanece “como um 
rastro na areia”. Além disso, o novo 
saber, por não ter sido religado, 
não é assimilado nem integrado. 
Paradoxalmente assiste-se ao agra-
vamento da ignorância do todo, 
enquanto avança o conhecimento 
das partes. Disso decorre que, para 
a educação do futuro, é necessário 
promover grande remembramento 
dos conhecimentos oriundos das 
ciências naturais, a fim de situar 
a condição humana no mundo, 
dos conhecimentos derivados das 
ciências humanas para colocar em 
evidência a multidimensionalidade 
e a complexidade humana, bem 
como integrar (na educação do 
futuro) a contribuição inestimável 
das humanidades, não somente a 
filosofia e história, mas também 
a literatura, a poesia, as artes [...]

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