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BACHARELADO EM 
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 
 
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ANOTAÇÕES 
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GOVERNO FEDERAL 
 
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL 
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO 
 
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE 
MINISTÉRIO DE EDUCAÇÃO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
INICIAÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Ministério 
da Educação República de Moçambique 
Ministério de Educação 
3 
 
 
ANOTAÇÕES 
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ANOTAÇÕES 
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SUMÁRIO 
 
APRESENTAÇÃO........................................................................................................................ 00 
 
UNIDADE 01 - SURGIMENTO E DESENVOLVIMENTO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS.................................... 00 
O CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS....................................................................... 00 
PRINCIPAIS FATORES QUE CONTRIBUIRAM PARA O SURGIMENTO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS....................................... 00 
AS DIFERENTES FORMAS DE CONHECIMENTO DA REALIDADE SOCIAL................................................................... 00 
 RESUMINDO..................................................................................................................................................... 00 
 
UNIDADE 02 - A UNIDADE DO SOCIAL E A PLURALIDADE DAS CIÊNCIAS SOCIAIS........................ 00 
A UNIDADE DO SOCIAL E A PLURALIDADE DAS CIÊNCIAS SOCIAIS.......................................................................... 00 
A UNIDADE DO SOCIAL – FENÓMENO SOCIAL TOTAL ........................................................................................... 00 
 RESUMINDO..................................................................................................................................................... 00 
 
UNIDADE 03 – A SINGULARIDADE DO ESTUDO DO SOCIAL.......................................................... 00 
A SINGULARIDADE DO ESTUDO DO SOCIAL.......................................................................................................... 00 
RUPTURA COM O SENSO COMUM NAS CIÊNCIAS SOCIAIS..................................................................................... 00 
SIGNIFICADO DA RUPTURA COM O SENSO COMUM NAS CIÊNCIAS SOCIAIS............................................................. 00 
 RESUMINDO..................................................................................................................................................... 00 
 
UNIDADE 04 - SURGIMENTO E DESENVOLVIMENTO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS................................. 00 
OBJECTIVIDADE E IMPARCIALIDADE NAS CIÊNCIAS SOCIAIS................................................................................... 00 
A RESPOSTA DE ÉMILE DURKHEIM...................................................................................................................... 00 
A RESPOSTA DE MAX WEBER............................................................................................................................ 00 
RESUMINDO..................................................................................................................................................... 00 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................................. 00 
SOBRE O AUTOR....................................................................................................................... 00 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
 
ANOTAÇÕES 
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APRESENTAÇÃO 
 
 
Caro(a) estudante, 
 
Bem-vindo(a) à disciplina de Introdução às Ciências Sociais! 
 
Esta disciplina está entre várias outras que você vai ter ao longo do seu 
curso de Licenciatura em Administração Pública. Muito provavelmente você deve 
estar agora a colocar, entre outras, as seguintes perguntas? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Estas perguntas são muito importantes e, por isso mesmo, devem ser 
respondidas antes de entrarmos nos conteúdos da disciplina. Isso vai permitir que 
você tire melhor proveito dos temas que serão apresentados ao longo da disciplina. 
 
Administração Pública é uma das áreas da Ciência Política. Por sua vez, a 
Ciência Política, juntamente com outras disciplinas tais como a Sociologia e a 
Antropologia, constitui aquilo que se chama, de uma forma genérica, Ciências 
Sociais, que estuda a realidade social. Portanto, como você pode constatar, 
Administração Pública é uma área de conhecimento que se situa dentro das 
Ciências Sociais. 
 
Sendo assim, a disciplina de Introdução às Ciências Sociais é muito 
importante num curso de Licenciatura em Administração Pública, na medida em que 
é nesta disciplina que você vai tomar o primeiro contacto com as grandes 
preocupações e questionamentos sobre o processo de conhecimento da realidade 
social. A disciplina de Introdução às Ciências Sociais vai lhe dar uma visão global 
sobre as Ciências Sociais procurando apresentar as principais questões teórico-
Por que razão estudar Introdução às Ciências 
Sociais num curso de Licenciatura em 
Administração Pública? 
Qual é a mais-valia que esta 
disciplina pode trazer para a 
minha formação? 
6 
 
 
ANOTAÇÕES 
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metodológicas no processo da construção do conhecimento da realidade social. De 
uma maneira específica, a disciplina de Introdução às Ciências Sociais visa: 
 
 Contextualizar historicamente o surgimento das Ciências Sociais; 
 
 Diferenciar as diversas formas de conhecimento da realidade social; 
 
 Fornecer ao estudante instrumentos de natureza filosófica e epistemológica 
que lhe permitam problematizar a construção do conhecimento em Ciências 
Sociais e poder, desta forma, melhor analisar os fenómenos e processos 
administrativos. 
 
Esta disciplina está dividida em quatro unidades. 
 
Na Unidade 1, você vai estudar o contexto histórico do surgimento e 
desenvolvimento das Ciências Sociais. Nesta unidade você vai também estudar as 
diferentes formas de conhecimento da realidade social. 
 
Na Unidade 2, você vai estudar a pluralidade das Ciências Sociais. O 
facto de existirem várias Ciências Sociais não significa que existem várias 
realidades sociais. A realidade social é só uma. As diferentes Ciências Sociais são 
maneiras diferentes de olhar para a mesma realidade social. 
 
Na Unidade 3, você vai estudar a questão da singularidade do estudo do 
social. Nesta Unidade você vai saber quais são os principais problemas inerentes 
ao conhecimento da realidade social. 
 
Por fim, na Unidade 4, você vai estudar o problema da objectividade e 
imparcialidade no processo da construção do conhecimento em Ciências Sociais. 
No final da Unidade você vai ficar a saber como é que autores importantes em 
Ciências Sociais, tais como Émile Durkheim e Max Weber responderam ao 
problema da objectividade e imparcialidade na produção do conhecimento sobre a 
realidade social. 
 
Quando chegar ao fim desta disciplina, você deverá ter adquirido e 
desenvolvido conhecimentos necessários para a análise do fenómeno burocrático 
em geral, com particular destaque para a Administração Pública, enquanto 
fenómeno social. 
 
 
 
Bom trabalho! 
 
 
 
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ANOTAÇÕES 
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UNIDADE 1 
SURGIMENTO E DESENVOLVIMENTO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
 
 
 
 
OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE APRENDIZAGEM 
 
 
No final desta Unidade, você deverá ser capaz de: 
 
 Contextualizar historicamente o surgimento 
das Ciências Sociais; 
 Identificar os principais aspectos 
económicos, sociais, políticos e filosóficos que 
contribuiram para o surgimento das Ciências 
Sociais; 
 Compreender a importância do saber 
filosófico para o processo da construção do 
conhecimento em Ciências Sociais; 
 Diferenciar as formas de conhecimento da 
realidade social; 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8 
 
 
ANOTAÇÕES 
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© ImageZoo/Corbis 
O CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
 
Caro (a) Estudante, 
 
 
As Ciências Sociais são um campo do saber 
científico que se dedica à reflexão sobre a 
natureza da vida em sociedade. Neste sentido 
(enquanto um campo do saber científico), as 
Ciências Sociais são uma criação recente, isto 
é, elas datam apenas dos meados do século 
XIX d. C. Isso não quer dizer, de forma alguma, 
que antes do surgimento das Ciências Sociais 
não houvesse uma reflexão sobre a natureza 
da vida em sociedade. Na realidade, essa 
reflexão sempre existiu. Ela existiu sob 
diferentes formas do saber, particularmente a 
Filosofia e o Mito. A novidade que as Ciências 
Sociais trazem para a reflexão da natureza da 
vida em sociedade é o seu carácter científico. 
Mas, que factores contribuiram para que isso 
acontecesse? Em que momento histórico isso 
aconteceu e por quê? Para respondermos a 
estas perguntas vamos começar por 
contextualizar historicamente o surgimento das 
Ciências Sociais. 
 
 
O surgimento das Ciências Sociais é um fenómeno situado no tempo e no 
espaço. Situado no tempo, no sentido de que as Ciências Sociais surgem numa 
época histórica específica, a saber, os meados do século XIX d.C. E situado no 
espaço, na medida em que as Ciências Sociais surgem na sociedade europeia, 
marcada por aspectos particulares do ponto de vista social, económico, polítco e 
cultural. Mas, como você pode imaginar as Ciências Sociais não surgiram de um dia 
para o outro. O seu surgimento é o resultado de um longo processo marcado por 
grandes acontecimentos que ocorreram na própria sociedade europeia daquela 
época. Que acontecimentos foram esses? Os principais acontecimentos foram: 
 
 Os descobrimentos; 
 A revolução industrial; 
 A revolução francesa; 
 As novas formas de pensar: 
 
Os acontecimentos que acabamos de mencionar, na verdade, podem ser 
considerados como fatores que contribuiram para o surgimento das Ciências 
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Sociais. Por isso, vejamos agora, ainda que resumidamente, cada um destes 
factores. 
 
 
PRINCIPAIS FATORES QUE CONTRIBUIRAM PARA O SURGIMENTO 
DAS CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
 
Os descobrimentos 
 
Os descobrimentos foi um grande 
movimento constituído por uma série de 
viagens e explorações marítimas feitas pelos 
europeus a partir do século XV d.C. Os 
descobrimentos resultaram na expansão 
europeia e colonização – fenómenos que 
tiveram um grande impacto para a história da 
humanidade. Mas, para aquilo que nos 
interessa aqui, os descobrimentos foram muito 
importantes na medida em que representaram 
a saída dos europeus ao encontro do “Outro”. 
O “Outro” significa aqui simplesmente outros 
povos diferentes do povo europeu, com outras 
religiões, outros usos e costumes, outros 
hábitos, enfim, povos com outras culturas. A 
partir do momento em que os europeus 
“descobriram” o “Outro”, eles tiveram a 
necessidade de conhecer melhor esse “Outro” 
e, por essa via, se foi constituindo uma área de 
saber que veio resultar numa das importantes 
Ciências Sociais, hoje conhecida por Antropologia. Na realidade, Antropologia é, em 
grande medida, o resultado de todo este movimento que iniciou com os 
descobrimentos. 
 
 
A revolução industrial 
 
A revoluçao indistrial foi um acontecimento de extrema importância que 
trouxe transformações profundas na sociedade europeia. Enaquanto fenómeno 
social e económico, a revolução industrialé o culminar de um longo processo, que 
encontra o seu ponto mais alto no aperfeiçoamento da técnica e no aparecimento 
de duas classes sociais importantes no processo produtivo: os operários (também 
conhecidos por proletariado urbano) e a burguesia. Estas duas classes eram 
diferentes, na medida em que equanto os operários eram assalriados e sem acesso 
aos meios de produção, a burguesia era a classe que detinha os meios de 
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produção e organizava todo o processo produtivo. Na realidade, os operários eram 
apenas trabalhadores que iam vender a sua força de trabalho aos burgueses. Estes 
últimos eram os patrões, donos das fábricas. Em geral, os historiadores situam 
entre 1750 e 1850 o pico da revolução industrial, tendo começado na Grã-Bretanha, 
depois na França e generalizando-se, mais tarde, para a Europa Ocidental e os 
Estados Unidos da América. 
 
Mas, você deve estar agora a perguntar-se qual foi a importância da 
revolução industrial para o surgimento das Ciências Sociais? Esta pergunta é muito 
importante, na medida em que nos ajuda a perceber a relevância das próprias 
Ciências Sociais no estudo da realidade social. Na verdade a importância aqui não 
está tanto na revolução industrial em si mesma, mas sim nas suas consequências, 
que trouxeram uma nova ordem social, cuja análise e compreensão exigiam 
também um novo tipo de saber, ou seja, uma nova ciência. Que consequências 
foram essas? Essas consequências se resumem nas crises sociais e económicas 
do capitalismo liberal, que tem suas raízes justamente na revolução industrial. 
 
Falando das consequências da revolução industrial, Quintaneiro, Barbosa e 
De Oliveira (2010), dizem o seguinte: 
 
“A partir da segunda metade do século XVIII, com a primeira revolução 
industrial e o nascimento do proletariado, cresceram as pressões por uma maior 
participação política, e a urbanização intensificou-se, recriando uma paisagem 
social muito distinta da que antes existia. Os céus dos grandes centros industriais 
começaram a cobrir-se da fumaça despejada pelas chaminés de fábricas que se 
multiplicavam em ritmo acelerado [...]. A capitalização e modernização da 
agricultura provocaram o êxodo de milhares de famílias que, expulsas de seu 
habitat ancestral, vagavam à procura de trabalho. As cidades, receptoras desses 
fluxos contínuos, foram crescendo acelerada e desordenadamente [...]. A cidade 
acenava a todos com a possibilidade de maior liberdade, protecção, ocupação e 
melhores ganhos, embora para muitos tais promessas não chegassem a cumprir-
se. No carregado ambiente urbano, a pobreza, o alcoolismo, os nascimentos 
ilegítimos, a violência e a promiscuidade tornavam-se notáveis e atingiam os 
membros mais frágeis do novo sistema, particularmente os que ficavam fora da 
cobertura das leis e instituições sociais. A aglomeração, conjugada a outros 
factores como as condições sanitárias, tinha outras consequências deletérias sobre 
a população urbana, especialmente sobre os mais miseráveis [...] As condições de 
trabalho que caracterizam o início da revolução industrial eram assutadoras...os 
operários labutavam em turnos diários de 12 a 16 horas, ampliados para até 18 
horas quando a iluminação a gás tornou-se disponível [...] A luta por melhores 
condições de trabalho, na Europa como na América, foi árdua, e novos direitos 
foram sendo aos poucos conquistados e acrescentados à legislação social e 
trabalhista em diversos países [...]”(Quintaneiro, Barbosa e De Oliveira, 2010, p. 
10). 
Como você pode perceber, a partir do extrato do texto que acabamos de 
citar, a revolução industrial trouxe mudanças profundas para a sociedade europeia 
11 
 
 
ANOTAÇÕES 
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no seu todo. Ora, nessa altura uma das perguntas, a nível do saber científico, era 
como explicar essas mudanças? As áreas do saber existentes, nomeadamente a 
Filosofia, a Teologia, as Ciências Naturais não apresentavam explicações sobre 
essas mudanças, que pudessem reivindicar o estatuto de “Ciência”. Foi assim que 
alguns pensadores, muitos deles ligados à Filosofia, como por exemplo Auguste 
Comte, começaram a propor uma forma diferente de explicar as consequências da 
revolução industrial. Essa forma diferente de explicar as consequências da 
revolução industrial, que Auguste Comte chamou “física social”, contribuiu 
decisivamente para a constituição das Ciências Sociais. 
 
 
 
 
 
Saiba Mais 
 
Auguste Comte nasceu em Montpellier, França em 19 de 
Janeiro de 1798. A sua família era monárquica e católica 
e o pai um funcionário de categoria média. Ainda jovem, 
Comte adere às convicções liberais e revolucionárias 
que dominavam o seu tempo. Entre 1814 e 1816 
frequenta a Escola Politécnica, em Paris. Devido ao 
encerramento da escola… regressa durante alguns 
meses a Montpellier onde estuda medicina e fisiologia. A 
formação em ciências naturais e matemática que então 
inicia são importantes, pois desde cedo proporá a 
aplicação do método científico utilizado naquelas 
disciplinas à nova “ciência social”. (Ferreira et al, 1995, p. 
74). 
 
 
 
 
 
 
Revolução francesa 
 
À semelhança da revolução industrial, a revolução francesa foi um outro 
acontecimento extremamente importante, que trouxe mudanças profundas não só 
para a sociedade francesa, como também para a sociedade europeia em geral. 
Com efeito, datada de 1789, tendo resultado na queda do antigo regime 
representado pela nobreza e o clero, a revolução francesa se desencadeou sob o 
lema liberdade, igualdade e fraternidade. Neste contexto, a revolução francesa 
trouxe ideias muito importantes que vão marcar as sociedades contemporâneas, 
Algumas dessas ideias são: soberania do povo, estado de direito, assembleias 
eleitas e soberanas. Estas ideias vão desempenhar um papel importante na 
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ANOTAÇÕES 
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© ImageZoo/Corbis – Kari Lehr 
maneira como o poder político estará organizado e será exercido em muitos 
Estados contemporâneos. Tudo isto vai também exigir uma nova forma de 
conhecimento e explicação do próprio fenómeno político, fato que vai, igualmente, 
contribuir de uma maneira significativa no surgimento das Ciências Sociais. 
 As novas formas de pensar 
 
 
As novas formas de pensar foram outro 
acontecimento que contribuiu para o 
surgimento das Ciências Sociais. De que 
forma? Pois bem. As novas formas de pensar a 
que nos referimos aqui estão profundamente 
relacionadas com as correntes filosóficas, que 
defendiam a autonomia da razão no processo 
de produção do conhecimento, rompendo, 
deste modo, com a tradição da Idade Média.Com o movimento do Renascimento, 
particularmente a partir do século XV d. C., vão-se constituindo correntes filosóficas, 
que exaltam a razão no processo de produção do conhecimento. Para aquilo que 
nos interessa nesta Unidade, vamos destacar duas correntes filosóficas, 
nomeadamente o racionalismo e o positivismo. 
 
Do racionalismo, as Ciências Sociais vão, sobretudo, ser influenciadas por 
duas ideias importantes: 
 
 “deve-se afastar, no estudo da realidade objectiva, toda e qualquer ideia 
preconcebida, toda a noção apriorística sobre os factos que se estudam; 
 o espírito deve ser conduzido à pesquisa pela dúvida, dúvida metódica e 
construtiva, que analisa e investiga, único meio de retirar a verdade dos 
factos e não deformar os factos para ajustá-los a uma verdade revelada”. 
 
Relativamente ao positivismo, as Ciências Sociais, no seu período inicial, 
vão reter particularmente a ideia da descoberta das leis de funcionamento das 
sociedades humanas. Tal como fizemos referência nesta Unidade, Auguste Comte 
– um dos autores mais representativos do positivismo – inventou a expressão “física 
social” para designar um novo saber científico inteiramente dedicado ao estudo das 
sociedades humanas. Alguns autores consideram que “a ambição de Comte era 
fundar uma ciência naturalista da sociedade capaz de explicar o passado da 
espécie humana e predizer o seu futuro aplicando os mesmos métodos de 
investigação que tinham provado ser tão bem sucedidos no estudo da natureza, a 
saber, observação, experimentação e comparação” (Outhwaite e Bottomore, 1996, 
p. 593). 
 
Como você pode constatar, as Ciências Sociais têm uma relação muito 
forte com a Filosofia. Na verdade, a Filosofia serviu de base muito importante para 
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ANOTAÇÕES 
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o surgimento da Ciência em geral e, de uma maneira particular, as Ciências 
Sociais. Em que sentido? No sentido de que as Ciências Sociais herdaram da 
Filosofia o espírito de questionamento, interrogação da realidade social. Por 
conseguinte, assim como a Filosofia começa com perguntas, questiona, interroga, a 
pesquisa em Ciências Sociais também sempre começa com perguntas. À 
semelhança do que acontece em Filosofia, em Ciências Sociais é fundamental 
questionar, colocar perguntas sobre a realidade social. 
 
Mas, você provavelmente deve estar a perguntar-se, será a Filosofia 
mesma coisa que Ciências Sociais? Com base no que você já estudou 
até aqui, tente responder a esta pergunta nas linhas que se seguem: 
 
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Que tal? Foi difícil responder à pergunta? Se sim, não se preocupe, pois 
esta pergunta é mesmo complexa. Por isso, vamos tentar esclarecê-la nas linhas 
que se seguem. 
 
 
A resposta à pergunta é claramente não. Porquê? 
 
Não, porque enquanto a Filosofia se preocupa com “o que deve ser”, ou 
seja as essências das coisas (como deve ser um bom governo, como deve ser uma 
boa sociedade, como devem ser os usos e costumes, etc., as Ciências Sociais se 
preocupam com a compreensão “do que é”, ou seja, daquilo que é dado observar (a 
compreensão de como funciona uma sociedade, como funciona um Estado, que 
razões explicam as diferenças, por exemplo, entre o Estado Americano e o Estado 
Moçambicano ou ainda o Estado Brasileiro?, etc). 
 
Tendo dito isso, podemos afirmar que, na realidade, as Ciências Sociais 
são apenas uma forma de conhecimento que se produz sobre a realidade social, o 
que não quer dizer que seja a única forma. Na verdade, existem diferentes formas 
14 
 
 
ANOTAÇÕES 
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© ImageZoo/Corbis – Rob Colvin 
de conhecimento da realidade social. Algumas dessas formas de conhecimento 
são: conhecimento filosófico, conhecimento religioso e conhecimento do senso 
comum. Você agora deve estar perguntando, qual é a diferença entre todos estes 
tipos de conhecimento. Isso é o que vamos ver na secção a seguir. 
 
AS DIFERENTES FORMAS DE CONHECIMENTO DA REALIDADE 
SOCIAL 
 
O que distingue o conhecimento científico de outros tipos de conhecimento 
não é nem a veracidade, nem o objecto conhecido, mas é, sobretudo, a FORMA de 
Conhecer, O METODO e os ISNTRUMENTOS usados para conhecer. 
 
A ciência moderna é o culminar de todo um processo histórico liderado pelo 
conhecimento filosófico na busca do saber, da verdade. Todavia, a ciência moderna 
é um saber diferente do conhecimento filosófico, como, aliás, explicámos acima. 
 
A ciência moderna foi-se construindo numa espécie de movimento 
emancipatório relativamente ao conhecimento filosófico, na medida em que a 
ciência, diferentemente da filosofia, ela visa conhecer o fenómeno, aquilo que 
aparece e não as essências, que caem no campo do conhecimento filosófico. 
 
Só no sec. XVI, Galileu Galilei foi o autor que inaugura a atitude científica 
ao rejeitar um conhecimento baseado nas essências propondo um conhecimento 
baseado nos factos, na experimentação. 
 
A experimentação segue basicamente um procedimento indutivo: partindo 
de casos particulares procura, através da observação, chegar a enunciados gerais, 
teorias. O método experimental de Galileu segue assim os seguintes passos: 
 
 Observação dos fenómenos; 
 Análise dos elementos constitutivos 
desses fenómenos; 
 Indução de certo número de hipóteses; 
 Verificação das hipóteses; 
 Generalização do resultado; 
 Confirmação das hipóteses e formulação 
de leis gerais. 
 
 
Francis Bacon, um pensador inglês apresenta um método semelhante, que 
também é um procedimento indutivo: 
 
 Formulação de hipóteses; 
 Repetição; 
 Testagem de hipóteses; 
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 Formulação de generalizações e leis 
 
Voltemos, de uma forma resumida e comparada, às principais características 
dos diferentes tipos de conhecimento: 
 
Conhecimento do Senso Comum é: 
 
 Superficial: Fica nas aparências sem questionamento profundo sobre a 
própriarealidade; 
 Sensitivo: faz referência às vivências do dia a dia, às experiências do 
quotidiano; 
 Subjectivo: está dependente da maneira como o próprio sujeito (individual 
ou colectivo) organiza a sua própria experiência; 
 Assistemático: não se preocupa com a sistematização das ideias; 
 Acrítico: a questão da verdade ou falsidade não é submetida à crítica, 
questionamento, experimentação, verificação; 
 
 
Conhecimento Filosófico é: 
 
 Valorativo: baseia-se em juízos valorativos sublinhando o como deveria ser: 
bom, mau, …; é normativo; 
 Não verificável: As hipóteses, enunciados filosóficos não podem ser 
verificados: confirmados ou refutados, através da experimentação; 
 Racional: baseado na razão e consiste num conjunto de enunciados 
logicamente correlacionados; 
 Sistemático: as suas hipóteses e enunciados pretendem ser uma 
representação coerente sobre a realidade conhecida; 
 
 
Conhecimento Religioso é: 
 
 Baseia-se em verdades reveladas; 
 Sistemático; 
 Não verificável; 
 Infalível, indiscutível 
 
 
Conhecimento Científico (das Ciências Sociais) é: 
 
 Real, factual: tudo aquilo que se manifesta e põe de lado tudo aquilo que 
tem a ver com essências; 
 Contingente: A falsidade ou veracidade das hipóteses é baseada na 
experimentação, situada no tempo e no espaço; 
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 Sistemático: constituído por um corpus, conjunto coerente de ideias, 
enunciados (teorias) e não conhecimento disperso; 
 Verificável: tudo aquilo que não pode ser comprovado cai fora do âmbito da 
ciência; 
 Falível: o conhecimento científico não é definitivo. Ele é sempre provisório: 
novas proposições e técnicas podem reformular as teorias. 
 
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Resumindo 
 
Nesta Unidade você estudou o contexto histórico do surgimento das 
Ciências Sociais. Você agora já deve ter uma noção clara sobre os principais 
factores ou acontecimentos que contribuíram de uma maneira significativa para o 
surgimento das Ciências Sociais. Além disso, você já deve também ser capaz de : 
 
 Compreender a importância do saber filosófico para o processo da 
construção do conhecimento em Ciências Sociais; 
 Diferenciar as formas de conhecimento da realidade social; 
 
O que acha da matéria estudada nesta Unidade? Está clara para você? Se 
sim, vamos passar para a Unidade 2 da nossa disciplina de Introdução às Ciências 
Sociais. Mas, se a matéria que tratámos nesta Unidade 1 não está clara para você, 
por favor, volte a ler novamente os principais pontos deste texto e converse com o 
seu tutor e consulte a principal bibliografia sobre o assunto, que é fornecida nesta 
disciplina. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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UNIDADE 2 
A UNIDADE DO SOCIAL E A PLURALIDADE DAS CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
 
 
 
 
OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE APRENDIZAGEM 
 
No final desta Unidade, você deverá ser capaz de: 
 
 
 Explicar por que razão, sendo a 
realidade social uma só, temos várias 
Ciências Sociais; 
 Explicar o conceito de “fenómeno 
social total”; e 
 Compreender a importância da 
interdisciplinaridade no estudo dos 
fenómenos sociais. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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A UNIDADE DO SOCIAL E A PLURALIDADE DAS CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
 
Caro (a) estudante, 
 
Com base no que vimos na Unidade 1, 
podemos dizer que as Ciências Sociais 
são produto da história, no sentido de 
que o seu surgimento dependeu de uma 
série de acontecimentos históricos, 
particularmente os descobrimentos, a 
revolução industrial, a revolução 
francesa, o desenvolvimento de 
correntes filosóficas tais como o 
racionalismo e o positivismo. Quando 
falamos de Ciências Sociais estamos a 
referirmo-nos a um conjunto de áreas de 
conhecimento que estudam diferentes 
fenómenos da realidade social. Algumas 
dessas áreas de conhecimento são a 
sociologia, a antropologia, a ciência 
política, a história, etc. Apesar de 
semelhanças, cada uma destas Ciências 
Sociais tem o seu próprio objecto de 
estudo e tem a sua particularidade. Mas, 
isso não quer dizer que cada Ciência 
Social estuda uma realidade social diferente da estudada por outras Ciências Sociais. A 
realidade estudada por todas as Ciências Sociais é a mesma: realidade social. Cada 
Ciência Social olha para a realidade social de uma maneira particular. Como é que isso se 
explica? Que factores determinam a existência de várias Ciências Sociais? Que relação 
existe entre as diferentes Ciências Sociais? Todas estas perguntas são muito importantes, 
na medida em que nos ajudam a perceber melhor a complexidade de qualquer fenómeno 
social, como por exemplo, o Estado, a administração pública, a governação, a cultura, etc. 
Para responder às perguntas que acabámos de colocar, vamos começar por falar daquilo 
que chamamos “a unidade do social”. Vamos a isso… 
 
 
No período inicial do surgimento das Ciências Sociais havia uma ideia 
aceite, com alguma facilidade, segundo a qual, a cada Ciência Social cabe 
investigar uma realidade social diferente daquela que é investigada por outras 
Ciências Sociais (Nunes, 2005). Quer dizer, de acordo com essa ideia, haveria uma 
realidade política investigada apenas pela Ciência Política, uma realidade 
económica investigada pela Economia, uma realidade cultural investigada pela 
Antropologia, uma realidade sociológica investigada pela Sociologia, assim por 
diante. Ora, para se opor a esta ideia (de várias realidades sociais), no início do 
século XX d.C, um sociólogo e antropólogo francês chamado Marcel Mauss trouxe 
um conceito revolucionário: o conceito de “Fenómeno Social Total”. 
 
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Google Imagens: Tor Aarestad 
 
Saiba Mais 
 
Marcel Mauss foi um sociólogo e antropólogo francês. Ele 
nasceu em 10 de Maio de 1872 em Epinal, França e era 
sobrinho do sobejamente conhecido sociólogo francês 
chamado Émile Durkheim. Marcel Mauss estudou fiolosofia na 
Universidade de Bordeaux e história da religião na Escola 
Prática de Altos Estudos, em Paris. Foi aqui onde ele começou 
a sua carreira como professor de religião primitiva. Ele também 
ensinou no prestigiado Colégio de França e foi co-fundador do 
Instituto de Etnologia, na Universidade de Paris (Fonte: 
http://fr.wikipedia.org/wiki/Marcel_Mauss. Consultado em 18 de 
Janeiro de 2011). 
 
 
 
A UNIDADE DO SOCIAL – FENÓMENO SOCIAL TOTAL 
 
Comecemos por colocar a seguinte pergunta: o que é isso de “Fenómeno 
Social Total”? Você tem alguma ideia?... Tente! 
 
Que tal, conseguiu? Se não conseguiu, não faz mal. “Fenómeno Social 
Total” é um conceito complexo. Para aquilo que nos interessa nesta Unidade, 
definimos o conceito de “Fenómeno Social Total” como um “ conjunto de fenómenos 
que – seja na sua estrutura própria, seja nas suas relações e determinações – têm 
implicações simultaneamente em vários níveis e em diferentes dimensões do real-
social, sendo portanto susceptíveis, pelo menos potencialmente, de interessar a 
várias, senão a todas as Ciências Sociais” (Nunes, 2005, p. 24). 
 
Parece complicado, não é? Na verdade, o que acabámos de citar acima quer 
simplesmente dizer o seguinte: a realidade social é composta por fenómenos 
sociais, que transportam consigo várias dimensões e, por isso mesmo, podem ser 
objecto de estudo de várias Ciências Sociais. Por outras palavras, um fenómeno 
social pode ser estudado sob várias perspectivas, o que equivale dizer que um 
mesmo fenómeno social pode ser estudado por várias Ciências Sociais, na medida 
em que encerra em si várias dimensões. Peguemos num exemplo concreto para 
ilustrar o que estamos a tentar explicar. Por exemplo, Adérito Sedas Nunes (2005), 
um autor português importante na área das Ciências Sociais, ao exemplificar um 
“Fenómeno Social Total” tomou o exemplo de Classes Sociais. Segundo Adérito 
Sedas Nunes, as Classes Sociais são um “Fenómeno Social Total”, na medida em 
que interessam à: 
 
 Sociologia: classes sociais são vistas como elementos estruturais e 
estruturantes basilares; 
http://fr.wikipedia.org/wiki/Marcel_Mauss
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 Economia: no sentido de que a estrutura das actividades e das relações 
económicas constituem elementos fundamentais para a constituição da 
“situação de classe”; 
 Ciência Política: uma vez constituídas, as classes sociais são portadoras 
de interesses antagónicos, o que gera relações de poder, que é o foco 
da Ciência Política; 
 Psicologia Social: as actividades, opiniões, preconceitos colectivos, que 
se manifestam nos indivíduos são em grande medida determinados pela 
classe social. 
 
Poderíamos mencionar mais áreas das Ciências Sociais que se interessam 
às Classes Sociais. Mas, também poderíamos pegar em “pobreza”, “lobolo” ou 
ainda a “função pública” como fenómenos sociais totais, no sentido de que cada um 
destes fenómenos encerra em si mesmo uma multiplicidade de dimensões. Assim, 
a “pobreza”, o “lobolo”, a “função pública” podem ser analisados a partir de 
diferentes perspectivas: sociológica, antropológica, económica, da ciência política, 
etc. Portanto, como sublinha Adérito Sedas Nunes (2005), o campo da realidade 
social sobre o qual as Ciências Sociais se debruçam é só um e todos os fenómenos 
que compõem esse campo são “fenómenos sociais totais”. Um fenómeno social 
encerra em si uma multiplicidade de dimensões e, por isso mesmo, pode ser 
analisado a partir de diferentes perspectivas. 
 
Mas, você, provavelmente, deve estar agora a colocar a seguinte 
pergunta: se diferentes Ciências Sociais podem se interessar a um 
mesmo fenómeno, o que é que faz a diferença entre uma e outra 
Ciência Social? Quer dizer, quando a Sociologia, a Antropologia, a 
Ciência Política se interessam ao fenómeno burocrático, por exemplo, 
será que todas elas o fazem da mesma maneira? Com base no que 
você já estudou até aqui, procure responder a esta pergunta nas linhas 
que se seguem: 
 
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© ImageZoo/Corbis – Darren Pryce 
Que tal, foi difícil responder à pergunta? Se sim, não se preocupe… porque 
a resposta é complexa e você vai ter mais subsídios para a resposta, à medida que 
for avançando nesta disciplina. Seja como for, esta pergunta é extremamente 
importante, na medida em que nos ajuda a perceber a razão da existência das 
diferentes Ciências Sociais, ou seja, a questão da pluralidade das Ciências Sociais. 
Este é o tópico de que nos vamos ocupar a seguir. Você vai ver que ao 
desenvolvermos este tópico, nós estaremos respondendo à pergunta feita acima. 
 
 
A PLURALIDADE DAS CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
A existência de diferentes 
Ciências Sociais não provem do facto de 
estas se ocuparem de diferentes 
fenómenos ou realidades sociais. Dito 
de uma maneira muito simples, a 
diferença entre Sociologia e 
Antropologia não provem do facto de 
que uma estuda a realidade sociológica 
e outra a realidade antropológica; a 
diferença entre a Ciência Política e a 
História não provem do facto de que 
uma estuda a realidade política e outra a 
realidade histórica… Não. Todas as Ciências Sociais se ocupam da mesma 
realidade: a realidade social. 
 
Então, de onde vem a diferença? A diferença entre as várias Ciências 
Sociais vem das próprias Ciências Sociais. Parece um jogo de palavras, não é?... 
Na realidade não se trata de um jogo de palavras, na medida em que ao afirmarmos 
que a diferença entre as várias Ciências Sociais provem das próprias Ciências 
Sociais significa que cada uma das disciplinas encara, aborda, analisa de forma 
diferente a mesma realidade social. Segundo Nunes (2005), existem quatro níveis 
principais, nos quais as Ciências Sociais se diferenciam: 
 
 Os fins ou objectivos que comandam a investigação: em cada disciplina das 
Ciências Sociais, os investigadores se propõem fins e objectivos 
específicos. Assim, por exemplo, enquanto em Sociologia os investigadores 
se interessem mais pela estruturação das relações sociais, em Ciência 
Política,os investigadores estão mais interessados pelas relações de 
poder; 
 Os problemas sobre os quais a pesquisa deve incidir. Como veremos mais 
em diante, em Ciências Sociais os problemas de investigação são 
construídos, através de um processo que passa pela elaboração de 
perguntas, questionamentos da própria realidade social. Assim, cada 
Ciência Social constrói os seus problemas de investigação de uma forma 
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diferente, o que equivale dizer que levanta suas próprias e específicas 
questões, perguntas de investigação. 
 Os critérios usados pelos investigadores a fim de seleccionar as variáveis 
relevantes para o estudo dos problemas construídos. Os sociólogos, os 
antropólogos, os politólogos, os historiadores têm, cada um, critérios 
diferentes para privilegiar este ou aquele aspecto a analisar. 
 Os métodos e técnicas de pesquisa empírica e de interpretação teórica. 
Embora hoje em dia haja cada vez mais empréstimo de técnicas de 
pesquisa entre as diferentes disciplinas das Ciências Sociais, cada 
disciplina das Ciências Sociais possuem seus métodos e técnicas de 
pesquisa empírica que lhe são próprios. Assim, por exemplo, o que se 
chama observação participante é uma técnica de pesquisa, que até se 
confunde com o próprio método antropológico. 
 
Mas, quando olhamos para os quatro níveis acima mencionados, existe 
uma espécie de encadeamento entre si. Em que sentido? No sentido de que os fins 
ou objectivos de uma disciplina das Ciências Sociais determinam a definição dos 
problemas; esta determina a selecção das variáveis relevantes que conduzem à 
adopção de métodos e técnicas adequados para se trabalhar sobre as variáveis 
seleccionadas e assim se resolver os problemas previamente definidos e se atingir 
os fins da disciplina (Nunes 2005). 
 
Além dos níveis acima mencionados, ao quais contribuem 
significativamente para a diferenciação entre as várias Ciências Sociais, pode-se 
também considerar que o que uma determinada Ciência Social é como produto, o 
seja o que a Sociologia, a Antropologia ou ainda a Ciência Política são, cada uma 
delas na sua especificidade, depende daquilo que cada uma dessas Ciências 
Sociais é como sistema de produção (Nunes 2005). Concretamente, isso quer dizer 
que depende de: 
 
 Quem são os investigadores, seus interesses científicos, suas posições 
relativamente à dinâmica social, cultural, política, etc.; 
 Os meios de produção que os investigadores manipulam; métodos, 
conceitos, teorias, recursos financeiros, recursos humanos, etc.; 
 As organizações onde se realiza a investigação: quem as financia, qual é o 
seu grau de liberdade, independência, etc.; 
 Objecto de estudo construído: como mencionado acima, cada Ciência 
Social constrói o seu próprio objecto científico. 
 
Como você pode perceber, a questão da pluralidade das Ciências Sociais 
encontra sua explicação na dinâmica de desenvolvimento das próprias Ciências 
Sociais. Assim, o facto de a realidade estudada pelas Ciências Sociais ser uma só 
implica que as diferentes Ciências Sociais não podem ser vistas como 
compartimentos estanques ou gavetas. Quer dizer, não podemos ver a Sociologia, 
a Antropologia, a Ciência Política, a História, a Demografia, etc. como Ciências 
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completamente separadas uma das outras. A consequência disso é a ideia de 
interdisciplinaridade em Ciências Sociais. 
 
 
Saiba Mais 
A interdisciplinaridade, nas Ciências Sociais, significa o intercâmbio de saberes com vista 
à complementaridade do conhecimento, para melhor explicar os fenómenos sociais na sua 
totalidade.0 real social é pluridimensional e, por isso, susceptível de ser abordado de 
diferentes maneiras pelas diversas Ciências Sociais. Estas mantêm entre si relações de 
interdependência na abordagem aos 
fenómenos sociais. As diferentes ciências 
analisam as mesmas realidades, os mesmos 
fenómenos "sociais totais", embora privile-
giando cada uma delas uma perspectiva 
própria de análise. Este intercâmbio entre 
disciplinas leva a que as investigações 
realizadas numa disciplina qualquer possam 
ser fundamentais para outra. "Assim, é 
precisamente a mesma realidade humana e 
social que vai interessar às diversas Ciências Sociais [...]. Temos, portanto, que o social é 
único; as maneiras de o abordar, as dimensões a privilegiar é que variam consoante os 
interesses que orientam e a partir dos quais se situa o investigador em Ciências Sociais, 
com a sua específica abordagem da realidade social [...]". (Fonte: 
http://www.esas.pt/dfa/sociologia/interdisciplinaridade.htm Consultado em 18 de Janeiro de 
2011) 
 
 
 
http://www.esas.pt/dfa/sociologia/interdisciplinaridade.htm
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Resumindo 
 
Nesta Unidade você estudou a unidade do social e a pluralidade em Ciências 
Sociais. Você agora já deve ter uma noção clara sobre as razões que explicam a 
existência de várias Ciências Sociais, sendo a realidade social uma e única. Além 
disso, você já deve também ser capaz de : 
 
 Explicar o conceito de “Fenómeno Social Total” em Ciências Sociais; 
 Explicar e perceber a importância do conceito de interdisciplinaridade em 
Ciências Sociais; 
 
O que acha da matéria estudada nesta Unidade? Está clara para você? Se sim, 
vamos passar para a Unidade 3 da nossa disciplina de Introdução às Ciências 
Sociais. Mas, se a matéria que tratámos nesta Unidade 2 não está clara para você, 
por favor, volte a ler novamente os principais pontos deste texto e converse com o 
seu tutor e consulte a principal bibliografia sobre o assunto, que é fornecida nesta 
disciplina. 
 
 
 
 
 
 
 
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UNIDADE 3 
A SINGULARIDADE DO ESTUDO DO SOCIAL 
 
 
 
 
 
OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE APRENDIZAGEM 
 
 
No final desta Unidade, você deverá ser capaz de: 
 
 Explicar por que razão o processo 
de construção do conhecimento nas Ciências 
Sociais passa pela ruptura com o senso 
comum; 
 Compreender o significado da 
ruptura com o senso comum nas CiênciasSociais; e 
 Compreender a diferença entre as 
Ciências Sociais e as Ciências Naturais 
 
 
 
 
 
 
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© Lawrence Manning/Corbis - Corbis Yellow 
© ImageZoo/Corbis - Alloy 
A SINGULARIDADE DO ESTUDO DO SOCIAL 
 
Caro (a) estudante, 
 
Tal como vimos na Unidade 1, as Ciências Sociais são um ramo do saber científico que se 
dedica ao estudo da vida em sociedade. Quando as Ciências Sociais surgem nos meados 
do séc. XIX d.C., elas tiveram que ir conquistando o estatuto de Ciência, através da 
construção de um objecto e método de estudo próprios. Portanto, as Ciências Sociais 
tiveram que construir o seu próprio objecto de estudo, diferente do objecto de estudo das 
Ciências Naturais, pois as Ciências 
Sociais não estudam a mesma realidade 
que as Ciências Naturais. Assim, 
enquanto nas Ciências Naturais, como 
por exemplo, em Física, Química, 
Astronomia etc., o cientista estuda algo 
que ele próprio pode isolar, manipular e 
submeter ao processo de 
experimentação em laboratório (como 
por exemplo a água, o metal, os astros, 
etc.), nas Ciências Sociais, o cientista 
não tem as mesmas possibilidades. De facto, sendo a vida em sociedade o objecto de 
estudo das Ciências Sociais, resulta que o cientista social é ele próprio parte do seu objecto 
de estudo. Ora, que implicações este facto tem para a construção do objecto de estudo em 
Ciências Sociais? Como é que o cientista social pode estudar uma realidade da qual ele 
próprio faz parte? Enfim, qual é a singularidade do estudo do social? As respostas a estas 
perguntas são muito importantes, na medida em que elas nos permitem perceber melhor a 
particularidade do processo de construção do objecto de estudo nas Ciências Sociais e, por 
isso mesmo, a singularidade do estudo do social. Nas linhas que se seguem, nós vamos 
procurar trazer respostas às perguntas que fizemos há pouco. Vamos a isso... 
 
Vamos começar com dois exemplos simples: 
 
O primeiro exemplo é “família 
enquanto objecto de estudo”. Quando um 
cientista social está a estudar a família como um 
facto social, é evidente que ele próprio, no seu dia 
a dia, está envolvido em algum tipo de relação 
familiar como, por 
exemplo, uma relação 
de pai, mãe, filho, ou irmão, etc. O segundo exemplo é 
“Administração Pública, enquanto objecto 
de estudo”. Quando um cientista social está a 
estudar o desempenho da Administração Pública na 
prestação de serviços aos cidadãos, é claro que ele próprio, no seu dia a dia, de 
alguma forma, tem experiência dos serviços prestados pela Administração Pública 
do seu próprio país ou de outro país qualquer. 
 
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Como você pode perceber, quer num quer no outro exemplo, o cientista 
social é parte do seu próprio objecto de estudo. Isto quer dizer que quando um 
sociólogo, um antropólogo ou ainda um politólogo vai estudar, por exemplo, a 
qualidade dos serviços prestados por uma instituição do Estado, ele já traz consigo 
uma ideia sobre o assunto, fruto da sua experiência do dia a dia. Mas, há um risco 
muito grande de o próprio cientista social confundir essa ideia que tem da realidade 
social com a própria realidade social. A este propósito, vejamos o que Émile 
Durkheim diz: 
 
“O homem não pode viver no meio das coisas sem fazer delas ideia segundo 
as quais regula o seu comportamento. Mas, como essas noções estão mais 
próximas de nós e mais ao nosso alcance do que as realidades a que 
correspondem, tendemos naturalmente a substitui-las a estas últimas e a 
fazer delas a própria matéria das nossas especulações. Em vez de observar 
as coisas, de as descrever, de as comparar, contentamo-nos em tomar 
consciência das nossas ideias, em analisá-las, em combiná-las. Em vez de 
uma ciência de realidades, não fazemos senão uma mera análise ideológica” 
(Durkheim 2007, p. 49). 
 
Portanto, como você pode constatar, com base na citação de Durkheim que 
acabámos de fazer, a nossa experiência do dia a dia nos leva a produzir ideias 
sobre o mundo que nos rodeia, sobre o grupo, a sociedade, o Estado em que 
vivemos. Isso quer dizer que nós temos uma certa familiaridade com o social. De 
facto, qualquer pessoa, com base na sua experiência do dia a dia, pode produzir e 
tem um certo conhecimento sobre como funcionam as instituições do Estado, como 
funcionam as instituições sociais, tais como a família, o lobolo, os ritos de iniciação 
etc. 
 
Mas, este conhecimento produzido com base na experiência do dia a dia 
não pode ser confundido, de maneira nenhuma, com o conhecimento científico 
sobre o social. Ora, justamente por causa desta familiaridade que o investigador em 
Ciências Sociais tem com o social, o processo de produção de conhecimento 
científico na área das Ciências Sociais passa pela ruptura com aquilo que alguns 
autores chamam pré-noções ou senso comum. 
 
Provavelmente você deve estar agora a perguntar o que é isso de pré-
noções? o que é isso de senso comum? Pois bem... Você lembra-se do que 
falámos na Unidade 1 sobre os diferentes tipos de conhecimento e mencionámos o 
senso comum como sendo um dos tipos de conhecimento? Lembra-se também que 
dissemos que uma das características do senso comum é ser um conhecimento 
superficial e acrítico? Se não se lembra, por favor, volte a consultar a Unidade 1. 
 
Na realidade, pré-noções e senso comum significam a mesma coisa. Trata-
se de ideias que vamos construindo como resultado da experiência quotidiana. Por 
exemplo, ideias como “homem não chora...”; “há corrupção na função pública 
porque os funcionários são mal pagos...”; “chefe é chefe, não pode ser 
questionado”, etc., podem ser consideradas como sendo senso comum ou pré-
noções. Vejamos o que Emile Durkheim diz sobre so senso comum ou pré-noções: 
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ANOTAÇÕES 
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“ (...) as noções que acabámos de referir são as notiones vulgares ou 
prenotiones... que tomam o lugar dos factos. São os idola, espécies de 
fantasmas que desfiguram o verdadeiro aspecto das coisas e que, no 
entanto, nós confundimos com as verdadeiras coisas... Ora, é sobretudo em 
sociologia [entenda-se Ciências Sociais] que estas pré-noções... são 
susceptíveis de dominar os espíritos e de se substituir à realidade... A 
organização da família, do contrato, da repressão, do Estado, da sociedade, 
aparecem, assim, como um simples desenvolvimento das ideias que temos 
sobre a sociedade, o Estado, a justiça, etc. (...)” (Durkheim 2007, p. (51 – 52). 
 
Depois desta citação de Durkheim que acabámos de fazer, imagino quevocê esteja agora a colocar-se muitas questões... Isso é muito bom. Uma das 
questões que você, provavelmente, neste momento, deve estar a colocar-se é a 
questão de saber o que é preciso fazer para que o conhecimento produzido nas 
Ciências Sociais não se confunda com as pré-noções, com o senso comum? Esta 
questão é muito importante e extremamente discutida nas Ciências Sociais. Muitos 
autores, como por exemplo, Émile Durkheim, consideram que o primeiro passo a 
dar é a ruptura com as pré-noções, com o senso comum. Mas, na realidade, o que 
significa romper com o senso comum? Esta é a discussão que vamos fazer na 
secção a seguir. 
 
 
Saiba Mais 
Émile Durkheim foi um sociólogo francês 
muito famoso. Ele, juntamente com Karl 
Marx e Max Weber, é considerado como 
o arquitecto principal da Ciência Social 
moderna. Émile Durkheim nasceu em 
Épinal, em França a 15 de Abril de 1858. 
Ele fundou o primeiro departamento de 
Sociologia na Europa, na Universidade 
de Bordeaux, em França, em 1895. Ele 
refinou o positivismo originalmente 
estabelecido por Auguste Comte... Para 
Durkheim, Sociologia era a Ciência das 
Instituições, cujo objectivo era descobrir a 
estrutura dos “factos sociais”. Durkheim 
tem uma vastíssima obra, com destaque 
para livros que contribuíram de uma 
maneira significativa para o 
desenvolvimento das Ciências Sociais, 
nomeadamente “As Regras do Método 
Sociológico”, “O Suicídio”, “A Divisão 
Social do Trabalho”, etc. (Fonte: http://en.wikipedia.org/%89mile_Durkheim. 
Consultado a 9 de Fevereiro de 2011) 
 
http://en.wikipedia.org/%89mile_Durkheim
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ANOTAÇÕES 
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RUPTURA COM O SENSO COMUM NAS CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
Se você se lembra do que falámos sobre o processo de surgimento das 
Ciências Sociais, na Unidade 1, você vai perceber que as Ciências Sociais surgem 
como o resultado de um processo de busca de explicações (diferentes da Filosofia, 
da Teologia, do senso comum) sobre o funcionamento das sociedades humanas. 
Essas explicações reivindicavam a qualificação de Ciência, quer dizer, um saber 
sistematizado e objectivo sobre a realidade social. Mas, isso foi possível porque os 
primeiros sociólogos, antropólogos, politólogos, historiadores, etc., perceberam que 
a ordem social, a realidade social não é algo determinado por alguma vontade 
divina ou uma força que esteja fora da própria sociedade. Dito de outra maneira, os 
primeiros cientistas sociais perceberam que, por exemplo, as causas do 
funcionamento deficiente das instituições de um Estado só podem ser encontradas 
na própria sociedade e não numa vontade divina ou ordem sobrenatural. Ora, 
explicar o funcionamento das instituições sociais, políticas, económicas, enfim o 
funcionamento das sociedades humanas usando os cânones da Ciência, implica 
um exercício de ruptura com o senso comum. 
 
Assim, no início do sec. XX d.C, Émile Durkheim insistiu, em várias das 
suas obras, particularmente na sua famosa obra “As Regras do Método 
Sociológico”, na ideia segundo a qual a investigação científica nas Ciências Sociais 
deve começar pela ruptura com as pré-noções. Isso porquê? Porque o senso 
comum nos traz a ilusão do saber imediato, um saber sem questionamento. 
Tomado neste sentido, o senso comum pode ser considerado um obstáculo à 
construção do conhecimento científico. Vejamos, ainda que resumidamente, como o 
senso comum pode ser um obstáculo à construção do conhecimento científico. 
 
O senso comum, muitas vezes, procura construir interpretações 
naturalistas, individualistas e etnocentristas sobre a realidade 
social (Silva 1986). Isto quer dizer o quê, concretamente? Você 
seria capaz de responder a esta pergunta? Tente nas linhas que se 
seguem: 
 
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Que tal, conseguiu? Se não conseguiu, não se preocupe... porque você vai 
perceber que à medida que formos avançando, a questão das interpretações do 
senso comum vai ficando mais clara. 
 
O senso comum tende a produzir interpretações naturalistas da 
realidade social, no sentido de que a explicação da realidade social é feita com 
base em factores de ordem natural ou biológica. Por exemplo, o senso comum 
explica que a divisão de tarefas no forum doméstico entre homem e mulher é fruto 
da natureza... o homem não pode fazer tarefas domésticas tais como limpar a casa, 
confeccionar os alimentos, lavar a roupa porque estas são tarefas reservadas à 
mulher, porque a natureza é assim mesmo... Como você pode constatar, a partir 
deste exemplo, o senso comum evoca “causas naturais” (a natureza é assim 
mesmo, isso foi sempre assim, etc...) para explicar a divisão de tarefas entre 
homem e mulher. 
 
Dizemos que o senso comum tende a produzir interpretações 
individualistas da realidade social, no sentido de que o senso comum 
tende a explicar o comportamento de indivíduos singulares, isolando-os dos grupos, 
das sociedades, a que pertencem. Quer dizer, nas suas interpretações 
individualistas, o senso comum não percebe que o comportamento dos indivíduos 
singulares é fruto da sua interacção com os grupos, sociedades a que pertencem. 
Por exemplo, para explicar o fraco desempenho de um funcionário público numa 
determinada instituição do Estado, o senso comum vê unicamente o individuo,... 
isolado do seu meio, do seu grupo, da sua instituição, da sua sociedade. Como 
consequência, o senso comum vai explicar o comportamento desse funcionário 
público, neste caso o seu fraco desempenho, com base em “causas individuais”, ou 
seja, o individuo tomado como algo de isolado do grupo, do Estado, da sociedade 
em que vive. 
 
E, por último, dizemos que o senso comum tende a produzir 
interpretações etnocentristas da realidade social, no sentido de que, 
muitas vezes, procura explicar comportamentos de grupos, sociedades, com base 
em critérios etnocentristas. Etnocentrismo é uma atitude segundo a qual um sujeito 
explica a realidade que o rodeia ou a realidade do outro, com base nos critérios da 
sua própria cultura, do seu próprio grupo. Por exemplo, os usos e costumes dos 
outros serão “bons” ou “maus” em função de como esses usos e costumes são 
vistos na minha própria cultura. Assim por exemplo, o lobolo será coisa “boa” ou 
“má” em função decomo ele é visto na minha própria cultura. 
 
Mas, se por um lado, o senso comum é muitas vezes apresentado como 
sendo um obstáculo para a construção do conhecimento científico, ele, por outro 
lado, é também importante. Sim... parece paradoxal, não é? Sim, o senso comum é 
importante no processo de construção de conhecimento científico. Em que sentido? 
No sentido de que ele constitui um ponto de partida para uma pesquisa científica. 
Nas Ciências Sociais, uma pesquisa científica, muitas vezes, começa com algo 
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ANOTAÇÕES 
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ligado à experiência do dia a dia. A motivação para uma pesquisa começa sempre 
com um problema, que é vivido ou pelo pesquisador ou por um determinado grupo. 
Esse problema vivido é que vai estar na origem do interesse pela pesquisa e, 
consequentemente, o ponto de partida para as perguntas da própria pesquisa. Por 
exemplo, se um sociólogo, um antropólogo ou ainda um politólogo quer investigar o 
impacto da reforma do sector público na melhoria da provisão de serviços por parte 
das instituições do Estado, ele vai sempre partir de uma experiência e, por isso 
mesmo, já traz consigo uma ideia sobre o assunto (como por exemplo, a reforma 
não tem nenhum impacto porque ele percebe no seu dia a dia que os serviços 
prestados pelas instituições do Estado não melhoraram ou o contrário). 
 
Ora, essa ideia que o pesquisador traz 
consigo é uma ideia que resulta da sua 
experiência prática do dia a dia e, por 
isso mesmo, é senso comum. Apesar 
disso, é importante que ele tenha essa ideia, 
porque é a partir dessa ideia que ele vai começar 
o seu processo de construção de conhecimento 
científico, no âmbito da sua pesquisa. Mas, à 
medida que a pesquisa vai avançando, vai sendo 
construída, o pesquisador vai também rompendo 
com a sua ideia inicial sobre o assunto, o que 
equivale dizer aue o pesquisador vai rompendo com o senso comum. Você 
provavelmente esteja agora a perguntar se isso é fácil. A resposta é não. De facto, 
para um pesquisador nas Ciências Sociais, a ruptura com o senso é um processo 
contínuo. E é por esta razão que alguns autores, como por exemplo, Bourdieu, 
falam em vigilância epistemológica – uma atitude que um investigador nas Ciências 
Sociais tem que construir permanentemente (Bourdieu, Chamboredon & Passeron 
1999). Mas, o que realmente significa a ruptura com o senso comum? Vamos 
responder a esta pergunta na secção a seguir. 
 
 
 
SIGNIFICADO DA RUPTURA COM O SENSO COMUM NAS CIÊNCIAS 
SOCIAIS 
 
A questão da ruptura com o senso comum nas Ciências Sociais é um 
assunto complexo. Quer dizer, nas Ciências Sociais, a ruptura com o senso comum 
não significa que existe uma fronteira intransponível, rígida, que separa o senso 
comum do conhecimento científico... Parece difícil entender isso, não acha? Na 
realidade não é. Talvez seja importante aqui recorrer ao que José Madureira Pinto 
diz sobre este assunto: 
 
“ (...) Aceitemos a ideia, que ao longo do número anterior se foi consolidando, 
de que a expressão „ruptura com o senso comum pode incentivar uma visão 
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ANOTAÇÕES 
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deturpada e dogmática do que são o trabalho e o progresso científicos, ao 
sugerir a existência de uma fronteira rígida entre, de um lado, o espaço da 
ignorância e do erro (em que a aprendizagem social e espontânea nos 
encerra) e, do outro, o do saber e verdade impolutos (a que só acederíamos 
através de uma conversão aos valores da ciência” (Pinto 1994, p. 122 – 123). 
 
Como você pode perceber, senso comum e conhecimento científico não 
são dois tipos de conhecimento que se opõem, sendo um (senso comum) falso/mau 
e outro (conhecimento científico) verdadeiro/bom. Não... Na realidade se trata de 
dois tipos de conhecimento simplesmente diferentes, o que não quer dizer opostos. 
Cada um deles obedece a lógicas específicas de construção. Assim, enquanto o 
senso comum se constrói com base na experiência prática do dia a dia, o 
conhecimento científico se constrói usando técnicas e instrumentos teórico-
metodológicos específicos. E por serem tipos diferentes de conhecimento, o senso 
comum não pode ser confundido com conhecimento científico. Portanto, apesar de 
não se tratar de tipos de conhecimento que se opõem e se excluem mutuamente, o 
senso comum e o conhecimento científico são tipos de conhecimento diferentes. 
Assim, como insiste José Madureira Pinto, quando falamos de ruptura com o senso 
comum no processo de construção de conhecimento científico nas Ciências 
Sociais, é importante reter cinco aspectos importantes (Pinto 1994) 
 
 
 O primeiro aspecto é entender que o senso comum e o 
conhecimento científico são dois tipos de conhecimento diferentes. A 
diferença entre estes dois tipos de conhecimento provem do facto de 
que cada um deles possui lógicas diferentes de construção e validação; 
 
 O segundo aspecto tem a ver com o facto de que o senso comum 
não é algo de homogéneo e muito menos imutável. Com efeito, o 
conhecimento do senso comum pode variar em função do contexto e, 
por isso mesmo, ele não permanece o mesmo em todos os tempos, 
culturas e sociedades. Além disso, é importante referir, assim como 
mencionámos nesta Unidade, que o existe uma relação entre o senso 
comum e o conhecimento científico. 
 
 O terceiro aspecto se refere ao facto de que, na sua relação com o 
senso comum, o conhecimento científico desenvolve uma abordagem 
crítica, o que permite marcar uma certa diferença entre os dois tipos de 
conhecimento; 
 
 O quarto aspecto tem a ver com o facto de que considerar algumas 
interpretações do senso comum como obstáculos para o processo de 
construção do conhecimento científico nas Ciências Sociais não implica 
qualquer juízo de valor relativamente ao senso comum. Quer dizer, não 
implica olhar para o senso comum como algo de mau. Aliás, se você se 
lembra, dissemos acima que senso comum e conhecimento científico 
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ANOTAÇÕES 
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não são dois tipos de conhecimento que se opõem, sendo um mau e 
outro bom. São apenas dois tipos de conhecimento com lógicas de 
construção diferentes; 
 
 O quinto e último aspecto se refere ao facto de que qualquer 
estudo da realidade social com pretenções de conhecimento científico 
tem que tomar o senso comum como ponto de partida, uma vez que o 
senso comum é uma componente indissolúvel das práticas humanas. 
 
 
Estes cinco aspectos acima mencionados constituem, na realidade, o que 
podemos chamar o significado da ruptura com o senso comum no processo de 
construção