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/ 
I , 
~iiilFeaD 
Psicoterapia fenomenologico-existencial: 
fundamentos filosofico-antropologicos 
Jose Paulo Giovanetti 
FEAD 
Bela Harizante 
2012 
20('"00 
Publicado por FEAD 
Copyright©2012 FEAD 
Diretoria Geral 
Jose Roberto Franco Tavares Paes 
Capa 
FEADVISUAL 
Todos os direitos reservados ao 
Sistema Integrado de Ensino de Minas Gerais - SIEMG 
Rua Claudio Manoel, 1.162 - Savassi - Belo Horizonte - MG 
Nenhuma parte deste material podera ser reproduzida, armazenada ou 
transmitida de qualquer forma ou por qualquer meio, seja ele eletronico, 
mecanico, fotoc6pia ou grava9iio, sem autoriza9ao do SIEMG. 
Aten9iio: pode acontecer de algum desses sites indicados nao estar mais disponlvel 
devido ao dinamismo que caracteriza essa fonte de informa9iio. 
Giovanetti, Jose Paulo 
i342p Psicoterapia fenomenoI6gica-existencial: fundamentos filos6fico-
; antropol6gicos I Jose Paulo Giovanetti. - Belo Horizonte: FEAD, 2012. 
~ . 12Cp. 
r 
~ 
R I Titulo 1- Psicologia 2- Fenomenologia 3- Antropologia 
I,c. i CDU:159.9 
~ 
I 
iN DICE 
la Parte: 
BASES FILOSOFICAS PARA A CLiNICA 
Impactos das Ideias Humanistas, Fenomenol6gicas e Existenciais na Psicoterapia ..... 11 
2 Diferencial psicoterapeutico na fenomenologia existencial ........................................... 37 
3 Fundamenta980 antropologica da pratica psicoterapica ............................................... 49 
4 0 existir humane na obra de Ludwig Binswanger ......................................................... 59 
II a Parte: 
QUESTOES DE PSICOTERAPIA EXISTENCIAL 
5 A rela980 terapeutica na perspectiva fenomenoI6gico-existencial ................................ 81 
6 0 encontro na perspectiva terapeutica existencial. .................................................... ..101 
7 P6s-modernidade e 0 vazio existencial. ............... · ................................................. · ...... 111 
Publicado por FEAD 
Copyright©2012 FEAD 
Diretoria Geral 
Jose Roberto Franco Tavares Paes 
Capa 
FEADVISUAL 
Todos os direitos reservados ao 
Sistema Integrado de Ensino de Minas Gerais - SIEMG 
Rua Claudio Manoel, 1.162 - Savassi - Belo Horizonte - MG 
Nenhuma parte deste material podera ser reproduzida, armazenada ou 
transmitida de qualquer forma ou por qualquer meio, seja ele eletronico, 
mecanico, fotoc6pia ou grava9iio, sem autoriza9ao do SIEMG. 
Aten9iio: pode acontecer de algum desses sites indicados nao estar mais disponlvel 
devido ao dinamismo que caracteriza essa fonte de informa9iio. 
Giovanetti, Jose Paulo 
i342p Psicoterapia fenomenoI6gica-existencial: fundamentos filos6fico-
; antropol6gicos I Jose Paulo Giovanetti. - Belo Horizonte: FEAD, 2012. 
~ . 12Cp. 
r 
~ 
R I Titulo 1- Psicologia 2- Fenomenologia 3- Antropologia 
I,c. i CDU:159.9 
~ 
I 
iN DICE 
la Parte: 
BASES FILOSOFICAS PARA A CLiNICA 
Impactos das Ideias Humanistas, Fenomenol6gicas e Existenciais na Psicoterapia ..... 11 
2 Diferencial psicoterapeutico na fenomenologia existencial ........................................... 37 
3 Fundamenta980 antropologica da pratica psicoterapica ............................................... 49 
4 0 existir humane na obra de Ludwig Binswanger ......................................................... 59 
II a Parte: 
QUESTOES DE PSICOTERAPIA EXISTENCIAL 
5 A rela980 terapeutica na perspectiva fenomenoI6gico-existencial ................................ 81 
6 0 encontro na perspectiva terapeutica existencial. .................................................... ..101 
7 P6s-modernidade e 0 vazio existencial. ............... · ................................................. · ...... 111 
" ,-
... ~ .. 
APRESENTACAO 
Ja h8 algum tempo queria reunir em um livro alguns artigos 
que escrevi ao longo dos ultimos anos e que foram apresentados 
em varios congressos e se encontram espalhados em muiflplas re-
vistas. Os artigos aqui reunidos abordam 0 tema da Psicoterapia, 
principalmente de seus fundamentos filos6ficos, especialmente 
aqueles base ados em uma antropologia filos6fica. Por isso, 0 titulo 
escolhido foi "Psicoterapia fenomenoI6gico-existencial: fundamen-
tos filos6fico-antropoI6gicos". 
Um dos grandes desafios da Psico!ogia Clinica e explicitar 
uma concepgao de ser humane que Ihe sirva de parametro para 
o trabalho clinico. A ciencia que possibilita lan9ar as bases para 
esse trabalho e a Filosofia. Entre as diversas abordagens te6ricas 
da atividade clinica, aPsicologia Existencial vai buscar na reflex80 
filos6fica sua inspira980 para compreender melhor 0 ser humano 
e, com isso, ajuda-Io a enfrentar os percal90s da existencia e os 
sofrimentos que podem advir de seu caminhar. 
A perspectiva aqui adotada, dentre as diversas intervengoes 
clinicas, e a Psicoterapia FenomenoI6gico-existencic::, que tem 
como ponto de partida uma antropologia filos6fica, a qual pretende 
compreender as diversas dimensoes que compoem a vida huma-
na e suas articula90es intrinsecas. 0 livro e apresentado em duas 
partes. A primeira, intitulada "Bases flIos6ficas para a clinica", com-
posta pel os quatro primeiros textos, visa a explicitar a perspectiva 
filos6fica que 0 embasa, destacando as teorias de sustenta980 das 
intervengoes clinicas, a Fenomenologia e 0 Existencialismo, cor-
rentes filos6ficas com bergo na Europa. A segunda parte do livro, 
intitulada "Quest6es de PSicoterapia Existencial", que se comp6e 
de tres capitulos, mostra a nossa compreens80 do que seja um 
"encontro humano", condig80 sine qua non para 0 trabalho tera-
peutico. 
" ,-
... ~ .. 
APRESENTACAO 
Ja h8 algum tempo queria reunir em um livro alguns artigos 
que escrevi ao longo dos ultimos anos e que foram apresentados 
em varios congressos e se encontram espalhados em muiflplas re-
vistas. Os artigos aqui reunidos abordam 0 tema da Psicoterapia, 
principalmente de seus fundamentos filos6ficos, especialmente 
aqueles base ados em uma antropologia filos6fica. Por isso, 0 titulo 
escolhido foi "Psicoterapia fenomenoI6gico-existencial: fundamen-
tos filos6fico-antropoI6gicos". 
Um dos grandes desafios da Psico!ogia Clinica e explicitar 
uma concepgao de ser humane que Ihe sirva de parametro para 
o trabalho clinico. A ciencia que possibilita lan9ar as bases para 
esse trabalho e a Filosofia. Entre as diversas abordagens te6ricas 
da atividade clinica, aPsicologia Existencial vai buscar na reflex80 
filos6fica sua inspira980 para compreender melhor 0 ser humano 
e, com isso, ajuda-Io a enfrentar os percal90s da existencia e os 
sofrimentos que podem advir de seu caminhar. 
A perspectiva aqui adotada, dentre as diversas intervengoes 
clinicas, e a Psicoterapia FenomenoI6gico-existencic::, que tem 
como ponto de partida uma antropologia filos6fica, a qual pretende 
compreender as diversas dimensoes que compoem a vida huma-
na e suas articula90es intrinsecas. 0 livro e apresentado em duas 
partes. A primeira, intitulada "Bases flIos6ficas para a clinica", com-
posta pel os quatro primeiros textos, visa a explicitar a perspectiva 
filos6fica que 0 embasa, destacando as teorias de sustenta980 das 
intervengoes clinicas, a Fenomenologia e 0 Existencialismo, cor-
rentes filos6ficas com bergo na Europa. A segunda parte do livro, 
intitulada "Quest6es de PSicoterapia Existencial", que se comp6e 
de tres capitulos, mostra a nossa compreens80 do que seja um 
"encontro humano", condig80 sine qua non para 0 trabalho tera-
peutico. 
Ocampo da Psicologia Existencial e muito vasto e diversifrcado 
e tem como inspiraryao varias correntes de pensamento. Por isso, 
procuraremos explicitar as diferentes fontes dessas abordagens. 0 
primeiro texto, "Impacto das ideias humanistas, fenomenol6gicas e 
existenciais na psicoterapia", pretende mostrar de forma sucinta as 
tres fontes que inspiram as abordagens da Psicologia de orienta-
ryao Existencial, distinguindo-a da Psicologia Humanista, cuja base 
se refere ao contexte americano, diferente do contexto europeu.o segundo texto, "0 diferencial fenomenol6gico na psicotera-
pia", procura lanryar algumas luzes sobre a especificidade do me-
todo fenomenol6gico para 0 trabalho cllnico, lembrando que esse 
metodo pode ser frutifero em varios dominios da Psicologia, mas 
que 0 psicoterapeuta pode muito bem utiliza-Io no seu trabalho. 
Uma vez destacada a perspectiva da Psicologia Existencial por 
n6s utilizada, e necessario mostrar que, ap6s elegermos uma cor-
rente frlos6frca, torna-se imprescindfvel falar da importancia de 
uma antropologia frlos6fica como ponto de sustcntary80 de todo 0 
desenrolar do trabalho. Esse e 0 sentido do terceiro texto, "Funda-
mentaryao antropol6gica da pratica psicoterapica". 
Ludwig Binswanger foi um psiquiatra-frI6sofo sufryo que vislum-
brou a necessidade de sedimentar seu trabalho medico em uma 
, ViS80 de homem mais abrangente do que aquela oferecida pelas 
;. ciencias medicas. Em uma grande obra de 1942, Grundformen 
to f und Erkenntnis menschlichen Daseins, explicitou as bases de sua 
(, 
r, antropologia filos6fica. 0 quarto texto, "0 existir humano na obra 
rde Ludwig Binswanger", e um resumo das lin has de sustentag80 
i:~e sua compreens80 do ser humano. 
" t Com 0 titulo "Questoes de psicoterapia existencial", a segunda 
~arte do Iivro, trata de alguns temas especfficos da pSicoterapia 
f~xistencial, principalmente a relag80 terapeutica entendida como 
f 
ium' encontro inter-humano. 
o texto "A relay80 terapeutica na perspectiva fenomenol6gico-
-existencial", que abre a segunda parte do livro, procura definir a 
relag80 terapeutica na perspectiva fenomenol6gico-existencial, 
partindo da explicitaryao dos elementos que compoem uma relagao 
humana, para, em seguida, destacar a especifrcidade da. relary80 
terapeutica. Sob a perspectiva existencial, a relaryao entre 0 ser 
humano que sofre e busca uma ajuda e 0 terapeuta e vivida na 
diregao de um encontro intersubjetivo, em que as duas pessoas 
crescem no seu caminho existencial. 0 titulo dessa reflex80 e "0 
encontro na perspectiva terapeutica existencial". 
o ultimo texto, "P6s-modernidade e vazio existencial", procura 
abordar um dos grandes problemas do homem contemporaneo, 
que vive mergulhado em uma sociedade cada vez mais comple-
xa, a qual gera formas de adoecimentos tipicos da globalizag80 
a que somos submetidos. 0 vazio existencial e uma das formas 
mais tipicas de sofrimento humano, neste novo comeryo de seculo 
em uma sociedade dita p6s-moderna ou, como denominada por 
alguns, hipermoderna. 
Esperamos que os textos aqui apresentados possam contribuir 
para despertar no psic610go c1inico 0 desejo de buscar na filosofra 
uma base s61ida para 0 seu trabalho do dia-a-dia. 
Ocampo da Psicologia Existencial e muito vasto e diversifrcado 
e tem como inspiraryao varias correntes de pensamento. Por isso, 
procuraremos explicitar as diferentes fontes dessas abordagens. 0 
primeiro texto, "Impacto das ideias humanistas, fenomenol6gicas e 
existenciais na psicoterapia", pretende mostrar de forma sucinta as 
tres fontes que inspiram as abordagens da Psicologia de orienta-
ryao Existencial, distinguindo-a da Psicologia Humanista, cuja base 
se refere ao contexte americano, diferente do contexto europeu. 
o segundo texto, "0 diferencial fenomenol6gico na psicotera-
pia", procura lanryar algumas luzes sobre a especificidade do me-
todo fenomenol6gico para 0 trabalho cllnico, lembrando que esse 
metodo pode ser frutifero em varios dominios da Psicologia, mas 
que 0 psicoterapeuta pode muito bem utiliza-Io no seu trabalho. 
Uma vez destacada a perspectiva da Psicologia Existencial por 
n6s utilizada, e necessario mostrar que, ap6s elegermos uma cor-
rente frlos6frca, torna-se imprescindfvel falar da importancia de 
uma antropologia frlos6fica como ponto de sustcntary80 de todo 0 
desenrolar do trabalho. Esse e 0 sentido do terceiro texto, "Funda-
mentaryao antropol6gica da pratica psicoterapica". 
Ludwig Binswanger foi um psiquiatra-frI6sofo sufryo que vislum-
brou a necessidade de sedimentar seu trabalho medico em uma 
, ViS80 de homem mais abrangente do que aquela oferecida pelas 
;. ciencias medicas. Em uma grande obra de 1942, Grundformen 
to f und Erkenntnis menschlichen Daseins, explicitou as bases de sua 
(, 
r, antropologia filos6fica. 0 quarto texto, "0 existir humano na obra 
rde Ludwig Binswanger", e um resumo das lin has de sustentag80 
i:~e sua compreens80 do ser humano. 
" t Com 0 titulo "Questoes de psicoterapia existencial", a segunda 
~arte do Iivro, trata de alguns temas especfficos da pSicoterapia 
f~xistencial, principalmente a relag80 terapeutica entendida como 
f 
ium' encontro inter-humano. 
o texto "A relay80 terapeutica na perspectiva fenomenol6gico-
-existencial", que abre a segunda parte do livro, procura definir a 
relag80 terapeutica na perspectiva fenomenol6gico-existencial, 
partindo da explicitaryao dos elementos que compoem uma relagao 
humana, para, em seguida, destacar a especifrcidade da. relary80 
terapeutica. Sob a perspectiva existencial, a relaryao entre 0 ser 
humano que sofre e busca uma ajuda e 0 terapeuta e vivida na 
diregao de um encontro intersubjetivo, em que as duas pessoas 
crescem no seu caminho existencial. 0 titulo dessa reflex80 e "0 
encontro na perspectiva terapeutica existencial". 
o ultimo texto, "P6s-modernidade e vazio existencial", procura 
abordar um dos grandes problemas do homem contemporaneo, 
que vive mergulhado em uma sociedade cada vez mais comple-
xa, a qual gera formas de adoecimentos tipicos da globalizag80 
a que somos submetidos. 0 vazio existencial e uma das formas 
mais tipicas de sofrimento humano, neste novo comeryo de seculo 
em uma sociedade dita p6s-moderna ou, como denominada por 
alguns, hipermoderna. 
Esperamos que os textos aqui apresentados possam contribuir 
para despertar no psic610go c1inico 0 desejo de buscar na filosofra 
uma base s61ida para 0 seu trabalho do dia-a-dia. 
/ ,-
la PARTE 
BASES FILOSOFICAS PARA A 
CLiNICA 
/ ,-
la PARTE 
BASES FILOSOFICAS PARA A 
CLiNICA 
. ) 
IMPACTOS DAS IDEIAS HUMANISTAS, 
FENOMENOL6GICAS E EXISTENCIAIS NA 
PSICOTERAPIA 
I - INTRODUCAO 
Estamos assistindo a um ressurgimento das terapias ditas 
humanista-existenciais. Pequenos grupos espalhados por varias 
lugares comegam a se organizar para sistematizarem seus estu-
dos. Como exemplo deste revigoramento do que ja foi chamada a 
3a. forga da PSicologia em algumas decadas passadas, tivemos, 
em setembro de 1993, 0 1\ Congresso Brasileiro de Psicoterapia 
Existencial; em setembro de 1994, a Segunda Conferencia Inter-
nacional de Psicologia y Psiquiatria Fenomenologica; em outubro 
de 1994, 10. Encontro Latino Americano da abordagem centrada 
na pessoa e, hoje, estamos iniciando 0 1\ Encontro Mineiro de Psi-
cologia Humanista, que tem como objetivo reunir reflexoes de pro-
fissionais para que possam explicitar melhor as caracterfsticas do 
ser humano, e, assim, compreenderem 0 homem como pessoa. 
o desafio diante do qual nos deparamos e de vermos agrupa-
dos sob 0 nome da Psicologia Humanista, e mais especificamente, 
Psicoterapia humananista-existencial as mais diversas praticas de 
psicoterapais, algumas meras tecnicas que nao tem nada aver 
com a Psicologia Humanista ou Fenomenol6gico-existencial. Este 
desafio se manifesta de uma dupla maneira. Em primeiro lugar, se-
ria necessario separarmos as praticas terapeuticas de orientagao 
humanista-existencial das meras praticas alternativas que se proli-
feram no mundo moderno. Em segundo lugar, dentro das praticas 
humanista-existenciais, separamos as diversas orientagoes que, 
• Texto publicado pela primeira vez nos Anais dos Encontros Mineiros de Psiciologia 
Humanista 1993-1995, p. 41-53. Em uma segunda vez, 0 texto foi editado pela 
Revista Cafe de Flore, Rio de Janeiro. Bo/etim nO 6, out.-nov. 95, p. 25-43 .. 
11 
. ) 
IMPACTOS DAS IDEIAS HUMANISTAS, 
FENOMENOL6GICAS E EXISTENCIAISNA 
PSICOTERAPIA 
I - INTRODUCAO 
Estamos assistindo a um ressurgimento das terapias ditas 
humanista-existenciais. Pequenos grupos espalhados por varias 
lugares comegam a se organizar para sistematizarem seus estu-
dos. Como exemplo deste revigoramento do que ja foi chamada a 
3a. forga da PSicologia em algumas decadas passadas, tivemos, 
em setembro de 1993, 0 1\ Congresso Brasileiro de Psicoterapia 
Existencial; em setembro de 1994, a Segunda Conferencia Inter-
nacional de Psicologia y Psiquiatria Fenomenologica; em outubro 
de 1994, 10. Encontro Latino Americano da abordagem centrada 
na pessoa e, hoje, estamos iniciando 0 1\ Encontro Mineiro de Psi-
cologia Humanista, que tem como objetivo reunir reflexoes de pro-
fissionais para que possam explicitar melhor as caracterfsticas do 
ser humano, e, assim, compreenderem 0 homem como pessoa. 
o desafio diante do qual nos deparamos e de vermos agrupa-
dos sob 0 nome da Psicologia Humanista, e mais especificamente, 
Psicoterapia humananista-existencial as mais diversas praticas de 
psicoterapais, algumas meras tecnicas que nao tem nada aver 
com a Psicologia Humanista ou Fenomenol6gico-existencial. Este 
desafio se manifesta de uma dupla maneira. Em primeiro lugar, se-
ria necessario separarmos as praticas terapeuticas de orientagao 
humanista-existencial das meras praticas alternativas que se proli-
feram no mundo moderno. Em segundo lugar, dentro das praticas 
humanista-existenciais, separamos as diversas orientagoes que, 
• Texto publicado pela primeira vez nos Anais dos Encontros Mineiros de Psiciologia 
Humanista 1993-1995, p. 41-53. Em uma segunda vez, 0 texto foi editado pela 
Revista Cafe de Flore, Rio de Janeiro. Bo/etim nO 6, out.-nov. 95, p. 25-43 .. 
11 
num primeiro momento, podem parecer iguais, mas apresentam 
fundamentayoes teoricas divergentes. 
o objetivo desta conferencia, sem querer esgotar 0 assunto 
e muito menos julga-Ia completa, pretende trayar algumas linhas 
gerais das diversas terapias contemporaneas ditas humanista-
-existenciais, a partir de suas fontes e de suas ideias chaves, res-
pondendo, assim, ao segundo aspecto do desafio proposto. Para 
levarmos a contento 0 proposito estabelecido, dividi~emos a expo-
siyao em dois momentos: 
a) Analise das diferentes fontes do movimeilto psicoterapico 
humanista-existencial. 
b) Impacto destas ideias na pratica clfnica denominada psico-
terapia. 
II - AS FONTES DA PSICOTERAPIA HUMANISTA -
EXISTENCIAL 
Para entendermos as diversas foryas que vaG moldar as psi-
coterapias de cunho humanista-existencial, comecemos a distin-
guir as ideias humanistas das ideias fenomenoiogicas e das ideias 
existenciais. Em determinados mementos da historia, estas ideias 
se intercruzam, mas e necessario distinguirmos suas origens. 
2.1. CONTEXTO HISTORICO DAS FONTES 
a) HUMANISMO INDIVIDUAL 
o conceito historico-cultural de humanismo se refere a epoca 
'do Renascimento e tinha como objetivo uma volta aos estudos dos 
; auto res classicos greco-Iatinos. Dessa maneira, a recuperayao 
fdoS grandes modelos de sabedoria do pensamento antigo pos-
i~ siqilitava 0 crescimento do homem. Por outro lado, 0 humanismo, 
:' enquanto possuidor de um significado ideal, designa uma concep-
. 12 
yao do mundo e da existencia que tem por centro 0 homem. As-
sim temos tantos humanismos quantas concepyoes de homem. E 
nesta perspectiva que devemos entender 0 movimento humanista 
que surgiu na sociedade americana e que foi responsavel pelo 
aparecimento da Psicologia humanista que se apresentou como 
a terceira fon;a da Psicologia e como ~Iternativa a psicanalise de 
Freud, que tinha como preocupayao central 0 estudo do incons-
ciente, e a Psicologia behaviorista, que tinha como objeto de es-
tudo 0 comportamento. A psicologia humanista e um retorno ao 
estudo da experiencia consciente. "Esta psic%gia constitui-se em 
OpOSiC;80 a objetividade do behaviorismo, e, em bora em acordo 
com a enfase subjetiva da psicana/ise, op6e-se ao reducionismo 
do comporiamento a defesas e pu/s6es".1 
o movimento cultural que sustentou esta transformayao foi 
chamado por Gomes (1986) de humanismo individual e 
"sua histaria esta associada com a desempenho da 
economia. Com a economia em ascensao, cecorren-
te das transformagoes sociais pas-guerra, va/ores tais 
como, independencia, hedonismo, dissidencia, to/eran-
cia, permissividade, auto-expressao, ganham proemi-
nencia. Todo este movimento /ibera/izante e permissivo 
a/canga seu pica no governo Kennedy onde ;was qua-
/ida des anunciam mudangas rapidas e significativas".2 
Nos assistimos a invasao da sociedade pelo Eu, onde tudo, 
a partir dos anos 60, se estruturou tendo nas preocupayoes pes-
soais seu lugar privilegiado. A lei, a seguir, formou-se depois da 
percepyao de que a polftica nao leva a nada: Sentir e viver plena-
mente suas emocoes. 0 impacto desta maneira de viver pode se 
sentir tambem na psicologia e e descrita por Gomes assim: 
1 Gomes. William. Movimentos Humanistas; Psicologia Humanista e Abordagem 
centrad a na Pessoa. In: Psicologia, Reflexao e Crftica. Porto Alegre. vol. 1, no. 1, 
1986, p. 44. 
2 Idem, p. 44-45 . 
13 
num primeiro momento, podem parecer iguais, mas apresentam 
fundamentayoes teoricas divergentes. 
o objetivo desta conferencia, sem querer esgotar 0 assunto 
e muito menos julga-Ia completa, pretende trayar algumas linhas 
gerais das diversas terapias contemporaneas ditas humanista-
-existenciais, a partir de suas fontes e de suas ideias chaves, res-
pondendo, assim, ao segundo aspecto do desafio proposto. Para 
levarmos a contento 0 proposito estabelecido, dividi~emos a expo-
siyao em dois momentos: 
a) Analise das diferentes fontes do movimeilto psicoterapico 
humanista-existencial. 
b) Impacto destas ideias na pratica clfnica denominada psico-
terapia. 
II - AS FONTES DA PSICOTERAPIA HUMANISTA -
EXISTENCIAL 
Para entendermos as diversas foryas que vaG moldar as psi-
coterapias de cunho humanista-existencial, comecemos a distin-
guir as ideias humanistas das ideias fenomenoiogicas e das ideias 
existenciais. Em determinados mementos da historia, estas ideias 
se intercruzam, mas e necessario distinguirmos suas origens. 
2.1. CONTEXTO HISTORICO DAS FONTES 
a) HUMANISMO INDIVIDUAL 
o conceito historico-cultural de humanismo se refere a epoca 
'do Renascimento e tinha como objetivo uma volta aos estudos dos 
; auto res classicos greco-Iatinos. Dessa maneira, a recuperayao 
fdoS grandes modelos de sabedoria do pensamento antigo pos-
i~ siqilitava 0 crescimento do homem. Por outro lado, 0 humanismo, 
:' enquanto possuidor de um significado ideal, designa uma concep-
. 12 
yao do mundo e da existencia que tem por centro 0 homem. As-
sim temos tantos humanismos quantas concepyoes de homem. E 
nesta perspectiva que devemos entender 0 movimento humanista 
que surgiu na sociedade americana e que foi responsavel pelo 
aparecimento da Psicologia humanista que se apresentou como 
a terceira fon;a da Psicologia e como ~Iternativa a psicanalise de 
Freud, que tinha como preocupayao central 0 estudo do incons-
ciente, e a Psicologia behaviorista, que tinha como objeto de es-
tudo 0 comportamento. A psicologia humanista e um retorno ao 
estudo da experiencia consciente. "Esta psic%gia constitui-se em 
OpOSiC;80 a objetividade do behaviorismo, e, em bora em acordo 
com a enfase subjetiva da psicana/ise, op6e-se ao reducionismo 
do comporiamento a defesas e pu/s6es".1 
o movimento cultural que sustentou esta transformayao foi 
chamado por Gomes (1986) de humanismo individual e 
"sua histaria esta associada com a desempenho da 
economia. Com a economia em ascensao, cecorren-
te das transformagoes sociais pas-guerra, va/ores tais 
como, independencia, hedonismo, dissidencia, to/eran-
cia, permissividade, auto-expressao, ganham proemi-
nencia. Todo este movimento /ibera/izante e permissivo 
a/canga seu pica no governo Kennedy onde ;was qua-
/ida des anunciam mudangasrapidas e significativas".2 
Nos assistimos a invasao da sociedade pelo Eu, onde tudo, 
a partir dos anos 60, se estruturou tendo nas preocupayoes pes-
soais seu lugar privilegiado. A lei, a seguir, formou-se depois da 
percepyao de que a polftica nao leva a nada: Sentir e viver plena-
mente suas emocoes. 0 impacto desta maneira de viver pode se 
sentir tambem na psicologia e e descrita por Gomes assim: 
1 Gomes. William. Movimentos Humanistas; Psicologia Humanista e Abordagem 
centrad a na Pessoa. In: Psicologia, Reflexao e Crftica. Porto Alegre. vol. 1, no. 1, 
1986, p. 44. 
2 Idem, p. 44-45 . 
13 
"Exemplos da atmosfera dominante podem ser vistas 
em frases que fica ram celebres como a ora~ao da Ges-
talt: 'Voce cuide da sua vida que eu cuido da minha. Eu 
estou aqui para nao viver as suas expectativas e nem 
voce esta aqui para viver as minhas'. Ou como Marlow 
(1968) costumava dizer que uma pessoa e valorizada 
nao pelo que ela produziu mas pelo que pode vir a ser. 
Ou ainda, na teoria rogeriana da confian~a irrestrita na 
pessoa".3 
Este clima de centramento no sujeito e a matriz de varios mo-
vimentos terapicos e, hoje, a exacerbac;ao do eu como centro, em 
tudo que se faz, provoca a onda de tecnicas de auto-ajuda que 
assistimos proliferarem na sociedade contemporanea. 
b) FENOMENOLOGIA 
Ao contrario do humanismo individual, a fenomenologia e um 
movimento filosofico que se estruturou no inicio do seculo XX 
atraves de Husser!. A palavra Fenomenologia foi utilizada pel~ 
primeira vez pelo medico frances J.H. Lambert em meados do 
seculo XVIII, para designar 0 estudo ou a "descric;ao da aparencia", 
na quarta parte do seu livro intitulado New Organon (1764). Este 
sentido pre-husserliano e recolhido por Kant e retomado por Hegel 
na Fenomenologia do Espirito ja para designar a sucessao, por . 
necessidade dialetica, dos fenomenos da consciencia, desde as 
t simples aparencias sensiveis ate 0 saber absoluto. Sem se esquecer 
~ ,que 0 termo foi tambem utilizado por Hartmann, Pierce e Stumpf, 
~ . chegamos ao sentido husserliano, anunciado na obra Logische 
; Untersuchungen (1900-1901) onde Fenomenologia e entendida 
r ·como um metodo para fundar a logica pura, e, posteriormente, 
tPens~d~ por Husserl para fundamentar a totalidade dos objetos 
r posslvels. 
\' 
!~.,-----
k 3· Idem, p. 45. 
14 
E necessario lembrar que a concepc;ao da Fenomenologia nao 
foi' colocada por Husserl de maneira acabada na referida obra. Ela 
sofre uma evoluc;ao ao longo do pensamento husserliano. Como 
nos mostra Van Breda no seu excelente artigo Phenomenologie, 
existe, em Husserl, duas grandes concepc;oes de Fenom~nologia. 
Na primeira, Husserl "define Fenomen%gia como uma ciencia 
filos6fica propedeutica, que tem como objeto a descriC;80 das es-
sencias fundamentais para uma prob/ematica fifos6fica dada".4 A 
segunda concepc;ao, que se desenvolveu a parti'r do escrito de 
1907, "Ideias para uma fenomenologia pura", proclama a feno-
menologia possuidora da seguinte tarefa: "redescobrir a genese 
intenciona/ da consciencia e os passos constitutivos que a consci-
encia c%ca am movimento". 5 
Hoje, quando falamos que um pensador e influenciado pela 
fenomenologia, devemos ter 0 cuidado de detectar qual e a sua 
concepc;ao de fenomenologia subjacente ao seu trabalho teorico, 
pois a primeira concepc;ao de fenomenologia influenciou um gran-
de numero de psicologos, psiquiatras, critico de artes dos quais 
podemos citar Jagers como 0 primeiro que trouxe esta concepc;ao 
para 0 dominio da psicopatologia. Ja a segunda concepc;ao foi uti-
lizada mais pelos filosofos nas suas investigac;oes. No pensamen-
to frances, podemos citar Sartre, Merleau-Ponty e Ricoeur. 
Cad a um dos inspirados pela fenomenologia vai, porem, tri-
Ihar um caminho proprio. E por esta razao que teremos diversas 
concepc;oes de fenomenologia ao longo da historia do pensamen-
to psicologico.6 Uma observaC;80 se faz necessaria no sentido de 
~ Van Breda, H.L. La Phenomenologie em Les courrants philosophiques, vol. III, p. 
423, infelizmente sem data e referencia editorial. 
5 Idem, p. 421. 
6 Para 0 acompanhamento de impacto da fenomenologia nas suas diversas variaveis 
no campo da psicologia e da psiquiatria, consultar 0 excelente livro de Spiegelberger, 
H., Phenomenology in Psychology and Psychiatry: A Historical Introduction, 
Northwestern University Press, 1972 
15 
"Exemplos da atmosfera dominante podem ser vistas 
em frases que fica ram celebres como a ora~ao da Ges-
talt: 'Voce cuide da sua vida que eu cuido da minha. Eu 
estou aqui para nao viver as suas expectativas e nem 
voce esta aqui para viver as minhas'. Ou como Marlow 
(1968) costumava dizer que uma pessoa e valorizada 
nao pelo que ela produziu mas pelo que pode vir a ser. 
Ou ainda, na teoria rogeriana da confian~a irrestrita na 
pessoa".3 
Este clima de centramento no sujeito e a matriz de varios mo-
vimentos terapicos e, hoje, a exacerbac;ao do eu como centro, em 
tudo que se faz, provoca a onda de tecnicas de auto-ajuda que 
assistimos proliferarem na sociedade contemporanea. 
b) FENOMENOLOGIA 
Ao contrario do humanismo individual, a fenomenologia e um 
movimento filosofico que se estruturou no inicio do seculo XX 
atraves de Husser!. A palavra Fenomenologia foi utilizada pel~ 
primeira vez pelo medico frances J.H. Lambert em meados do 
seculo XVIII, para designar 0 estudo ou a "descric;ao da aparencia", 
na quarta parte do seu livro intitulado New Organon (1764). Este 
sentido pre-husserliano e recolhido por Kant e retomado por Hegel 
na Fenomenologia do Espirito ja para designar a sucessao, por . 
necessidade dialetica, dos fenomenos da consciencia, desde as 
t simples aparencias sensiveis ate 0 saber absoluto. Sem se esquecer 
~ ,que 0 termo foi tambem utilizado por Hartmann, Pierce e Stumpf, 
~ . chegamos ao sentido husserliano, anunciado na obra Logische 
; Untersuchungen (1900-1901) onde Fenomenologia e entendida 
r ·como um metodo para fundar a logica pura, e, posteriormente, 
tPens~d~ por Husserl para fundamentar a totalidade dos objetos 
r posslvels. 
\' 
!~.,-----
k 3· Idem, p. 45. 
14 
E necessario lembrar que a concepc;ao da Fenomenologia nao 
foi' colocada por Husserl de maneira acabada na referida obra. Ela 
sofre uma evoluc;ao ao longo do pensamento husserliano. Como 
nos mostra Van Breda no seu excelente artigo Phenomenologie, 
existe, em Husserl, duas grandes concepc;oes de Fenom~nologia. 
Na primeira, Husserl "define Fenomen%gia como uma ciencia 
filos6fica propedeutica, que tem como objeto a descriC;80 das es-
sencias fundamentais para uma prob/ematica fifos6fica dada".4 A 
segunda concepc;ao, que se desenvolveu a parti'r do escrito de 
1907, "Ideias para uma fenomenologia pura", proclama a feno-
menologia possuidora da seguinte tarefa: "redescobrir a genese 
intenciona/ da consciencia e os passos constitutivos que a consci-
encia c%ca am movimento". 5 
Hoje, quando falamos que um pensador e influenciado pela 
fenomenologia, devemos ter 0 cuidado de detectar qual e a sua 
concepc;ao de fenomenologia subjacente ao seu trabalho teorico, 
pois a primeira concepc;ao de fenomenologia influenciou um gran-
de numero de psicologos, psiquiatras, critico de artes dos quais 
podemos citar Jagers como 0 primeiro que trouxe esta concepc;ao 
para 0 dominio da psicopatologia. Ja a segunda concepc;ao foi uti-
lizada mais pelos filosofos nas suas investigac;oes. No pensamen-
to frances, podemos citar Sartre, Merleau-Ponty e Ricoeur. 
Cad a um dos inspirados pela fenomenologia vai, porem, tri-
Ihar um caminho proprio. E por esta razao que teremos diversas 
concepc;oes de fenomenologia ao longo da historia do pensamen-
to psicologico.6 Uma observaC;80 se faz necessaria no sentido de 
~ Van Breda, H.L. La Phenomenologie em Les courrants philosophiques, vol. III, p. 
423, infelizmente sem data e referencia editorial. 
5 Idem, p. 421. 
6 Para 0 acompanhamento de impacto da fenomenologianas suas diversas variaveis 
no campo da psicologia e da psiquiatria, consultar 0 excelente livro de Spiegelberger, 
H., Phenomenology in Psychology and Psychiatry: A Historical Introduction, 
Northwestern University Press, 1972 
15 
precisar que todos os qu.e adotam 0 metodo fenomenol6gico se 
opoem ao metodo cientificc classico e a analise central dos feno-
men os psiquicos. Desta maneira, a fenomenologia e uma nova 
maneira de se abordar os fenomenos psiquicos. 
c) EXISTENCIALISMO 
Enquanto a Fenomenologia e compreendida pelos disci pulos 
como um metodo, 0 Existencialismo e entendido como uma dou-
trina filos6fica sobre 0 homem. As filosofias da Existencia surgirao 
como uma oposi<;ao a toda filosofia c\assica a qual e entendida 
como 0 estudo das essencias, cuja ideia principal seria a compre-
en sao das dimensoes estaveis. Os fil6sofos da existencia vao re-
direcionar as perguntas sobre 0 homem. Em vez de se perguntar: 
o que e 0 homem, se perguntara: quem e 0 homem? 
Evidentemente a palavra existencialismo come<;ou a ser usa-
da depois da primeira guerra mundial para designar justa mente 
o movimento de alguns pensadores e de alguns Iiteratos sobre a 
investiga<;ao de quem e 0 homem. Este movimento, que se estru-
turou com mais for<;a no entreguerras, isto e, entre 1918 e 1945, 
teve suas raizes hist6ricas no pensamento de Kierkegaard quan-
do 0 fil6sofo dinamarques se opos ao pensamento p6s-hegeliano 
dominante do seu tempo. A ideia central de luta de Kierkegaard 
~era reagir contra 0 carater universal, intelectual e determinista do 
t:: 
r: ,hegelianismo, afirmando 0 interese pelo singular e pela vontade. 
f: Segundo os historiadores, 0 movimento existencialista se inicou na 
f Alemanha, em 1919, quando Barth publicou urn comentario sabre 
it 
r a epistola aos Romanos e Jaspers publicou A Psicologia da Mun-
~ 
!i dividencia. De um lado, 0 movimento ex:stencialista ganha for<;as 
r justamente a partir da decada de 20, uma vez que 0 entreguerras 
k foi um periodo de muito sofrimento, desespero e angustias. Estes 
1'· 
:i temas se tornaram os temas preferidos dos existencialistas, po is 
16 
estes se preocupavam em falar e refletir sobre 0 que 0 homem 
estava vivendo naquele instante. Por outro lado, este movimento 
s6 veio a se expandir fora do contexte europeu a partir do tim da 
segunda guerra mundial. A decada de 50 foi, talvez, a decada de 
divulga<;ao do movimento existencialista. 
E necessario observar que, embora encontramos um numero 
muito grande de escritores ditos existencialistas, Buber, Bultmann, 
Guardin:, Camus, Dostoievski, entre outros, s6 sao considerados 
classicos fil6sofos existencialistas Heidegger, Jaspers, Sartre e 
Marcel. E uma segunda observa<;ao e que todos estes quatro fi-
16sofos, que passaram para os anais da hist6ria da filosofia como 
os fil6sofos da existencia7 , utilizaram, cada um a partir de uma 
inspira<;ao pessoal, 0 metodo fenomenol6gico para concretizarem 
as suas reflexoes sobre 0 homem. 
A Filosofia da existencia pode ser concretizada atraves de 
duas grandes caracteristicas. A primeira e que todos os fil6sofos 
e escritores procuram valorizar 0 homem. A segunda e que todos 
procuram descrever e explicitar 0 modo concreto do homE'm viver, 
isto e, refletindo sobre a angustia, a liberdade. 
Salientamos que 0 desenvolvido ate aqui visa explicitar a ne-
cessidade de um cuidado de se detectar as diversas fontes da 
psicoterapia e, mais ainda, observar que os tres movimentos, que 
ora analisamos, possuem as origens mais diversas e ideias for<;as 
diretrizes muito diferentes. 
2.2. AS IDEIAS FORCAS DE CADA MOVIMENTO 
, Gostaria, agor2, de desenvolver as ideias chaves ou for<;as de 
cada um dos movimentos. Visto que 0 tempo de exposi<;ao nao 
permite uma analise exaustiva, escolherei uma id$ia chave de 
cada uma das fontes das pSicoterapias humanistas-existenciais. A 
escolha nao reflete nenhuma escala de valores, mas procura des-
7 Warl, Jean. As Filosofias da Existencia, Lisboa, Publicat,:oes Europa-America sId. 
17 
precisar que todos os qu.e adotam 0 metodo fenomenol6gico se 
opoem ao metodo cientificc classico e a analise central dos feno-
men os psiquicos. Desta maneira, a fenomenologia e uma nova 
maneira de se abordar os fenomenos psiquicos. 
c) EXISTENCIALISMO 
Enquanto a Fenomenologia e compreendida pelos disci pulos 
como um metodo, 0 Existencialismo e entendido como uma dou-
trina filos6fica sobre 0 homem. As filosofias da Existencia surgirao 
como uma oposi<;ao a toda filosofia c\assica a qual e entendida 
como 0 estudo das essencias, cuja ideia principal seria a compre-
en sao das dimensoes estaveis. Os fil6sofos da existencia vao re-
direcionar as perguntas sobre 0 homem. Em vez de se perguntar: 
o que e 0 homem, se perguntara: quem e 0 homem? 
Evidentemente a palavra existencialismo come<;ou a ser usa-
da depois da primeira guerra mundial para designar justa mente 
o movimento de alguns pensadores e de alguns Iiteratos sobre a 
investiga<;ao de quem e 0 homem. Este movimento, que se estru-
turou com mais for<;a no entreguerras, isto e, entre 1918 e 1945, 
teve suas raizes hist6ricas no pensamento de Kierkegaard quan-
do 0 fil6sofo dinamarques se opos ao pensamento p6s-hegeliano 
dominante do seu tempo. A ideia central de luta de Kierkegaard 
~era reagir contra 0 carater universal, intelectual e determinista do 
t:: 
r: ,hegelianismo, afirmando 0 interese pelo singular e pela vontade. 
f: Segundo os historiadores, 0 movimento existencialista se inicou na 
f Alemanha, em 1919, quando Barth publicou urn comentario sabre 
it 
r a epistola aos Romanos e Jaspers publicou A Psicologia da Mun-
~ 
!i dividencia. De um lado, 0 movimento ex:stencialista ganha for<;as 
r justamente a partir da decada de 20, uma vez que 0 entreguerras 
k foi um periodo de muito sofrimento, desespero e angustias. Estes 
1'· 
:i temas se tornaram os temas preferidos dos existencialistas, po is 
16 
estes se preocupavam em falar e refletir sobre 0 que 0 homem 
estava vivendo naquele instante. Por outro lado, este movimento 
s6 veio a se expandir fora do contexte europeu a partir do tim da 
segunda guerra mundial. A decada de 50 foi, talvez, a decada de 
divulga<;ao do movimento existencialista. 
E necessario observar que, embora encontramos um numero 
muito grande de escritores ditos existencialistas, Buber, Bultmann, 
Guardin:, Camus, Dostoievski, entre outros, s6 sao considerados 
classicos fil6sofos existencialistas Heidegger, Jaspers, Sartre e 
Marcel. E uma segunda observa<;ao e que todos estes quatro fi-
16sofos, que passaram para os anais da hist6ria da filosofia como 
os fil6sofos da existencia7 , utilizaram, cada um a partir de uma 
inspira<;ao pessoal, 0 metodo fenomenol6gico para concretizarem 
as suas reflexoes sobre 0 homem. 
A Filosofia da existencia pode ser concretizada atraves de 
duas grandes caracteristicas. A primeira e que todos os fil6sofos 
e escritores procuram valorizar 0 homem. A segunda e que todos 
procuram descrever e explicitar 0 modo concreto do homE'm viver, 
isto e, refletindo sobre a angustia, a liberdade. 
Salientamos que 0 desenvolvido ate aqui visa explicitar a ne-
cessidade de um cuidado de se detectar as diversas fontes da 
psicoterapia e, mais ainda, observar que os tres movimentos, que 
ora analisamos, possuem as origens mais diversas e ideias for<;as 
diretrizes muito diferentes. 
2.2. AS IDEIAS FORCAS DE CADA MOVIMENTO 
, Gostaria, agor2, de desenvolver as ideias chaves ou for<;as de 
cada um dos movimentos. Visto que 0 tempo de exposi<;ao nao 
permite uma analise exaustiva, escolherei uma id$ia chave de 
cada uma das fontes das pSicoterapias humanistas-existenciais. A 
escolha nao reflete nenhuma escala de valores, mas procura des-
7 Warl, Jean. As Filosofias da Existencia, Lisboa, Publicat,:oes Europa-America sId. 
17 
tacar as categorias mais significativas no nosso entender. Do pen·· 
samento humanista,escolhemos 0 conceito de auto-realiza<;80, da 
fenomenologia, 0 da intencionalidade da consciencia, e da filosofia 
existencial 0 conceito de Existencia. 
a) Auto-realiza<;80 e Autodesenvolvimento 
A psicologia humanista procura entender a vida humana na 
sua totalidade e, assim, a compreens80 do homem pelos psicolo-
g05 humanistas 8 entende-Io como um ser que, em primeiro lugar, 
possui uma unidade. A diferen<;a entre as diversas abordagens 
esta em que cada uma, ao descrever as caracteristicas principais 
do homem, sublinhara pontos diferentes. Como exernplo podemos 
citar MaslowB, que coloca 0 acento sobre 0 projeto humane e na 
supera<;80 de si, quando fala das experiencias culminantes. 
A enfase sobre 0 cicio da vida 8 outra caracteristica da Psico-
logia Humanista. Seus representantes tem enfatizado que a vida 
humana possui uma dinamica na qual, em cada fase da vida, 0 ser 
humane deve alcan<;ar um certo grau de realiza<;80, a fim de que 
possa, ao longo da vida, se estruturar como uma pessoa plena, 
integrada. Ora, essa enfase dos humanistas nos faz perceber que 
o homem 8 compreendido, em primeiro lugar, como processo·e 
evoluc80. Somente a partir deste processo 8 que pod em os com-
preender a sua estrutura. Assim, Poelman, no seu livro "0 homem 
a caminho de si mesmo", afirma que esse processo da evolu<;80 8 
inerente a propria vida e que "essa evolu<;80 n80 ocorre ao acaso, 
mas segue uma certa dire<;80, tem um certo fim em vista; n808 um 
, 
~. processo que ocorre somente por acertos e erros ou por tentativas 
desconexas, n80 8 um veo no escuro".9 
8 Maslow, Abraham. Introdu<;<ao a Psicologia do Ser, RJ, Ed. Edltorado, sId, 2a. ed. 
9 Poelman, Johannes. 0 Homem a caminho de si mesmo. SP. Ed. Paulinas, 1993, 
p. 13. A primeira parte do livro coloca com clareza as ideias mestras da psicologia 
humanista e desenvolve as posir;:oes te6ricas de alguns dos seus principais 
representantes. 
18 
Encontrar as categorias fundamentais que traduziriam estas 
duas caracteristicas principais do pensamento humanista 8 0 de-
safio do intelectual. Penso, por8m, que, sob os conceitos de auto-
-realiza<;flO e autodesenvolvimento, poderiamos agrupar as diver-
sas contribuir;oes :lumanistas. 
o conceito de auto-realiza<;80 quer acentuar que esse proces-
so de crescimento inerente a dinamica da vida deve ser entendido 
na sua globalidade, isto 8, no desenvolvimento de todas as dimen-
soes humanas, sejam elas biologicas, psicologicas, espirituais e 
sociais. Gostaria de citar Rogers e Maslow como os representantes 
mais significativos da explicita<;80 das fases do processo de auto-
-realiza<;80 do homem. Rogers, no seu livro "Tornar-se Pessoa"
10
, 
na quarta parte, quando trata da Filosofia da Pessoa, tra<;a carac-
teristicas deste processo de auto-realiza<;80. Por outro lado, Mas-
low, no seu livro "Motivation and Personality"11, na parte que trata 
da Teoria da Motiva<;80 humana, desenvolve as dimensoes do ser 
humano que devem ser atingidas no processo de auto-realiza<;80. 
o conceito de autodesenvolvimento nos ajuda a entender a 
evolu<;80 do cicio da vida do homem. Entre os humanistas citaria 
BOhler e um neoculturalista que traduz bem este processo, Erikson. 
Enquanto BOhler mostra que 0 ser humano deve passar por cinco 
fases, Erikson enumera oito fases, destacando sempre, em cada 
uma del as, uma dial8tica entre dois polos opostoS.
12 
As duas 
interpreta<;oes est80 baseadas no fato de que a vida 8 vivida como 
urn todo por uma pessoa que atinge seu pleno desenvolvimento no 
instante em que percorre as diversas fases, cada uma com uma 
conquista integrativa, retratadas atrav8s de seus sucessos e de 
seus fracassos. 
10 Rogers, Carl. Tornar-se Pessoa. Lisboa, Moraes Editora, 1970. 
11 Maslow, Abraham N. Motivation and Personality. NY. Harper and Row, 1970, 2a. ed. 
12 Buhler, Charlotte. Oer menschliche Lebenslauf as psychologisches Problem (0 
curso de vida humana como problema psicoI6gico). Leipzig, Hirzel, 1933. Eriks~n, 
Eric.H.ldentity and the life cycle. N.Y. International Universities Press, 1959. 
19 
tacar as categorias mais significativas no nosso entender. Do pen·· 
samento humanista, escolhemos 0 conceito de auto-realiza<;80, da 
fenomenologia, 0 da intencionalidade da consciencia, e da filosofia 
existencial 0 conceito de Existencia. 
a) Auto-realiza<;80 e Autodesenvolvimento 
A psicologia humanista procura entender a vida humana na 
sua totalidade e, assim, a compreens80 do homem pelos psicolo-
g05 humanistas 8 entende-Io como um ser que, em primeiro lugar, 
possui uma unidade. A diferen<;a entre as diversas abordagens 
esta em que cada uma, ao descrever as caracteristicas principais 
do homem, sublinhara pontos diferentes. Como exernplo podemos 
citar MaslowB, que coloca 0 acento sobre 0 projeto humane e na 
supera<;80 de si, quando fala das experiencias culminantes. 
A enfase sobre 0 cicio da vida 8 outra caracteristica da Psico-
logia Humanista. Seus representantes tem enfatizado que a vida 
humana possui uma dinamica na qual, em cada fase da vida, 0 ser 
humane deve alcan<;ar um certo grau de realiza<;80, a fim de que 
possa, ao longo da vida, se estruturar como uma pessoa plena, 
integrada. Ora, essa enfase dos humanistas nos faz perceber que 
o homem 8 compreendido, em primeiro lugar, como processo·e 
evoluc80. Somente a partir deste processo 8 que pod em os com-
preender a sua estrutura. Assim, Poelman, no seu livro "0 homem 
a caminho de si mesmo", afirma que esse processo da evolu<;80 8 
inerente a propria vida e que "essa evolu<;80 n80 ocorre ao acaso, 
mas segue uma certa dire<;80, tem um certo fim em vista; n808 um 
, 
~. processo que ocorre somente por acertos e erros ou por tentativas 
desconexas, n80 8 um veo no escuro".9 
8 Maslow, Abraham. Introdu<;<ao a Psicologia do Ser, RJ, Ed. Edltorado, sId, 2a. ed. 
9 Poelman, Johannes. 0 Homem a caminho de si mesmo. SP. Ed. Paulinas, 1993, 
p. 13. A primeira parte do livro coloca com clareza as ideias mestras da psicologia 
humanista e desenvolve as posir;:oes te6ricas de alguns dos seus principais 
representantes. 
18 
Encontrar as categorias fundamentais que traduziriam estas 
duas caracteristicas principais do pensamento humanista 8 0 de-
safio do intelectual. Penso, por8m, que, sob os conceitos de auto-
-realiza<;flO e autodesenvolvimento, poderiamos agrupar as diver-
sas contribuir;oes :lumanistas. 
o conceito de auto-realiza<;80 quer acentuar que esse proces-
so de crescimento inerente a dinamica da vida deve ser entendido 
na sua globalidade, isto 8, no desenvolvimento de todas as dimen-
soes humanas, sejam elas biologicas, psicologicas, espirituais e 
sociais. Gostaria de citar Rogers e Maslow como os representantes 
mais significativos da explicita<;80 das fases do processo de auto-
-realiza<;80 do homem. Rogers, no seu livro "Tornar-se Pessoa"
10
, 
na quarta parte, quando trata da Filosofia da Pessoa, tra<;a carac-
teristicas deste processo de auto-realiza<;80. Por outro lado, Mas-
low, no seu livro "Motivation and Personality"11, na parte que trata 
da Teoria da Motiva<;80 humana, desenvolve as dimensoes do ser 
humano que devem ser atingidas no processo de auto-realiza<;80. 
o conceito de autodesenvolvimento nos ajuda a entender a 
evolu<;80 do cicio da vida do homem. Entre os humanistas citaria 
BOhler e um neoculturalista que traduz bem este processo, Erikson. 
Enquanto BOhler mostra que 0 ser humano deve passar por cinco 
fases, Erikson enumera oito fases, destacando sempre, em cada 
uma del as, uma dial8tica entre dois polos opostoS.
12 
As duas 
interpreta<;oes est80 baseadas no fato de que a vida 8 vivida como 
urn todo por uma pessoa que atinge seu pleno desenvolvimento no 
instante em que percorre as diversas fases, cada uma com uma 
conquista integrativa, retratadas atrav8s de seus sucessos e de 
seus fracassos. 
10 Rogers, Carl. Tornar-se Pessoa. Lisboa, Moraes Editora, 1970. 
11 Maslow, AbrahamN. Motivation and Personality. NY. Harper and Row, 1970, 2a. ed. 
12 Buhler, Charlotte. Oer menschliche Lebenslauf as psychologisches Problem (0 
curso de vida humana como problema psicoI6gico). Leipzig, Hirzel, 1933. Eriks~n, 
Eric.H.ldentity and the life cycle. N.Y. International Universities Press, 1959. 
19 
b) Teoria da Intencionalidade 
8em querer fazer urn estudo exaustivo sobre a fenomenolo-
gia, os psicologos devem se interrogar sobre quais conceitos fun-
damentais da Fenomenologia sao uteis para seu trabalho. Assim, 
nao se trata de fazer Filosofia Fenomenologica, mas captar os 
conceitos que nos ajudariam a entender melhor os fenomenos psi-
cologicos. 
De urn modo geral, utilizamos uma compreensao do metodo 
fenomenologico para nossos estudos. Este metodo tem, porem, 
alguns fundamentos e procedimentos que podem sar tematizados 
atraves da explicitac;ao de suas e;aracteristicas. 
Para urn certo dominic da fenomenologia, sera necessaria a 
compreensao do retorno "as coisas mesmas", 0 conceito de redu-
c;ao eidetica e a reduc;ao transcendental, a teo ria da intencionalida-
de, a intuic;ao das essencias, 0 mundo da vida a intersubjetividade. 
Diante do tempo limitado desta conferencia, destacaremos 0 que 
nos parece ser a descoberta mais significativa de Husserl, que e a 
teoria da intencionalidade. 
A afirmac;:ao de Husserl e que a consciencia e intencionalida-
de, isto e, que ela e sempre consciencia de alguma coisa. Hus-
serl avanc;a 0 conceito de intencionalidade dos escolasticos re-
tomado por Brentano, pois "a intencionalidade husserfiana nao e· 
apenas uma propriedade do ato ou vivencia, como em Brentano 
que nao (ala ainda de consciencia intencional. Segundo Husseri, 
.. a intencionalidade vivifica a vivencia, tomando-a designativa do 
objeto, em virlude de um processo mais radical, inerente a propria 
consciencia",13 "A novidade, aqui, e que a consciencia se esgota 
. em visar algo que nao e ela mesma: ela se define pelo objeto que 
visa.14 
13 F~aga.ta, Julio. A Fenomenologia de Husserl como fundamento da Filosofia. Braga 
.. ,Llvrana Cruz, 1959, p. 131. ' 
14 Tav~res~ Hugo C. da Silva. A Fenomenologia de Husserl em Kriterion, vol. XXV no. 
72, Jan.lJun. 1984, p. 39. ' 
20 
Assirn, a ideia de intencionalidade que comec;:ou a ser desen-
volvida por Brentano e retomada por Husserl, vai se articular inde-
pendentemente da ideia que 0 sujeito e 0 objeto sao duas subs-
tancias separadas, justamente 0 contrario da filosofia cartesiana 
onde 0 Cog ito separa radicalmente 0 mundo do pensamento e a 
realidade do corpo. Podemos concluir c~m Forghieri dizendo que a 
intencionalidade e, essencialmente, 0 ate de atribuir urn sentido: e 
ela que unifica a consciencia e 0 objeto, 0 sujeito e 0 mundo. "Com 
a intencionalidade ha 0 reconhecimento de que 0 mundo nao e 
pura exterioridade e 0 sujeito nao e pura interioridade, mas a saida 
desi para um mundo que tern uma significar;ao para ele".15 
c) a conceito de Existencia 
8e tambem percorrermos os principais existencialistas, como 
citamos os principais humanistas, vamos destacar os temas mais 
relevantes para a Psicologia Existencial. Antes de destacar as 
principais categorias da Filosofia da Existencia, faria duas obser-
vac;oes. A primeira e que os ditos filosofos oficiais do existencialis-
mo - 8artre, Jaspers, Heidegger, Marcel - cada um, a seu modo, 
utilizou 0 metodo fenomenologico para elaborar a sua filosofia da 
existencia, unido assim os dois conceitos - fenomenologia e exis-
tencialismo. A segunda observac;ao e que a Psicologia Existen-
cial nao se baseia so nas filosofias "oficiais" do Existencialismo, 
mas utiliza tam bern os conceitos elaborados pelos outros escrito-
res existencialistas supracitados. 8em corrermos 0 riscn de, sob 0 
nome de Existencialismo, abrigarmos todo tipo de pensamento an-
ti-racionalista, e necessario procurarmos explicitar os fundamentos 
teoricos, isto e, analisar e esclarecer nossas proprias pressuposi-
goes de entendermos a existencia humana. 
15 Forghieri, Yolanda. C. Psicologia Fenomenologia. SP. Ed. Pioneira, 1993, p. 15. 
21 
b) Teoria da Intencionalidade 
8em querer fazer urn estudo exaustivo sobre a fenomenolo-
gia, os psicologos devem se interrogar sobre quais conceitos fun-
damentais da Fenomenologia sao uteis para seu trabalho. Assim, 
nao se trata de fazer Filosofia Fenomenologica, mas captar os 
conceitos que nos ajudariam a entender melhor os fenomenos psi-
cologicos. 
De urn modo geral, utilizamos uma compreensao do metodo 
fenomenologico para nossos estudos. Este metodo tem, porem, 
alguns fundamentos e procedimentos que podem sar tematizados 
atraves da explicitac;ao de suas e;aracteristicas. 
Para urn certo dominic da fenomenologia, sera necessaria a 
compreensao do retorno "as coisas mesmas", 0 conceito de redu-
c;ao eidetica e a reduc;ao transcendental, a teo ria da intencionalida-
de, a intuic;ao das essencias, 0 mundo da vida a intersubjetividade. 
Diante do tempo limitado desta conferencia, destacaremos 0 que 
nos parece ser a descoberta mais significativa de Husserl, que e a 
teoria da intencionalidade. 
A afirmac;:ao de Husserl e que a consciencia e intencionalida-
de, isto e, que ela e sempre consciencia de alguma coisa. Hus-
serl avanc;a 0 conceito de intencionalidade dos escolasticos re-
tomado por Brentano, pois "a intencionalidade husserfiana nao e· 
apenas uma propriedade do ato ou vivencia, como em Brentano 
que nao (ala ainda de consciencia intencional. Segundo Husseri, 
.. a intencionalidade vivifica a vivencia, tomando-a designativa do 
objeto, em virlude de um processo mais radical, inerente a propria 
consciencia",13 "A novidade, aqui, e que a consciencia se esgota 
. em visar algo que nao e ela mesma: ela se define pelo objeto que 
visa.14 
13 F~aga.ta, Julio. A Fenomenologia de Husserl como fundamento da Filosofia. Braga 
.. ,Llvrana Cruz, 1959, p. 131. ' 
14 Tav~res~ Hugo C. da Silva. A Fenomenologia de Husserl em Kriterion, vol. XXV no. 
72, Jan.lJun. 1984, p. 39. ' 
20 
Assirn, a ideia de intencionalidade que comec;:ou a ser desen-
volvida por Brentano e retomada por Husserl, vai se articular inde-
pendentemente da ideia que 0 sujeito e 0 objeto sao duas subs-
tancias separadas, justamente 0 contrario da filosofia cartesiana 
onde 0 Cog ito separa radicalmente 0 mundo do pensamento e a 
realidade do corpo. Podemos concluir c~m Forghieri dizendo que a 
intencionalidade e, essencialmente, 0 ate de atribuir urn sentido: e 
ela que unifica a consciencia e 0 objeto, 0 sujeito e 0 mundo. "Com 
a intencionalidade ha 0 reconhecimento de que 0 mundo nao e 
pura exterioridade e 0 sujeito nao e pura interioridade, mas a saida 
desi para um mundo que tern uma significar;ao para ele".15 
c) a conceito de Existencia 
8e tambem percorrermos os principais existencialistas, como 
citamos os principais humanistas, vamos destacar os temas mais 
relevantes para a Psicologia Existencial. Antes de destacar as 
principais categorias da Filosofia da Existencia, faria duas obser-
vac;oes. A primeira e que os ditos filosofos oficiais do existencialis-
mo - 8artre, Jaspers, Heidegger, Marcel - cada um, a seu modo, 
utilizou 0 metodo fenomenologico para elaborar a sua filosofia da 
existencia, unido assim os dois conceitos - fenomenologia e exis-
tencialismo. A segunda observac;ao e que a Psicologia Existen-
cial nao se baseia so nas filosofias "oficiais" do Existencialismo, 
mas utiliza tam bern os conceitos elaborados pelos outros escrito-
res existencialistas supracitados. 8em corrermos 0 riscn de, sob 0 
nome de Existencialismo, abrigarmos todo tipo de pensamento an-
ti-racionalista, e necessario procurarmos explicitar os fundamentos 
teoricos, isto e, analisar e esclarecer nossas proprias pressuposi-
goes de entendermos a existencia humana. 
15 Forghieri, Yolanda. C. Psicologia Fenomenologia. SP. Ed. Pioneira, 1993, p. 15. 
21 
Dentre a vasta tematica das filosofiasda Existemcia, podemos 
destacar as categorias de Existencia, ser-no-mundo, liberdade, 0 
outro, a Angustia, Temporalidade, 0 Amor etc. Escolhemos falar 
sobre a Existencia pois 6 ela que nos explicita melhor as dimen-
soes do ser humano. A pergunta inicial seria a seguinte: 6 posslvel 
definir 0 conceito de Existencia? A palavra Existencia, diz Jaspers, 
"e um dos sin6nimos da palavra realidade", mas, gra<;as a maneira 
de como Kierkegaard a acentua, ela tomou um aspecto novo: "ela 
designa 0 que eu sou fundamentalmente por mim".16 
Existencia nao deve ser entendida no sentido trivial de ser-
-no-mundo, como simplemente um ente no meio de outros entes. 
Ex-sistere deve ser compreendida como ex = fora de e sistere = ter 
sua postura. Existir 6, pois, ter sua postura fora. A existencia di-
fere radicalmente do comportamento de todo os outros entes. Nos 
somos 0 destino de nos mesmo. Esta postura, que esta sempre 
em construc;ao, nunca acabada nos permite captar algumas carac-
teristicas do existir humano. Em primeiro lugar, existir e ir sendo, 
o que se tara atraves da escolha e da decisao. Em segundo lugar, 
e estar em conflito consigo mesmo, e uma preocupac;ao infinita 
de si proprio. Em terceiro lugar, ela nao 6 definlvel. Ela nao pode 
tornar-se objeto.17 
Cada filosofo, atraves de seus escritos, procura precisar as ca-
racterfsticas de Existencia. Heidegger deve ser lembrado como, 
talvez, 0 que fez um esfor<;o gigantesco na sua obra Ser e Tem-
po para analisar a estrutura da Existencia, mostrando a estrutura 
. Dasein, 0 estar fora de si e estar-no-mundo. Por iS30, vai falar de 
existencia autentica e existencia manteutica. No aprofundamento 
do pensamento de Heidegger, vamos encontrar Binswanger que, 
mostrando 0 limite das analises heideggerianas, quando compre-
en de 0 Dasein como cuidado (Sorge), mostra que 0 amor (Liebe) 
1/1 Citac;ao de Jaspers retirada do livro de Wahl, Jean, op. cit, p. 41. 
H Wahl, Jean. Op. cit, p. 42-43. 
22 
e uma outra dimensao do Dasein (de Existencia) que nao fll~receu 
aten<;ao dos fil6sofos . 
. Depois destas breves consderac;oes, passemos a lnalise da 
repercussao destas ideias na psicoterapia. 
III - IMPACTO NAS PSICOTERAPIAS 
o pas so agora 6 estarmos atentos a qual destas fontes anali-
sadas acima lanc;ar os alicerces para a pratica clinica denominada 
psicoterapia. Sem querer esgotar 0 assunto, tentaremos mostrar, 
em linhas gerais, quais as bases das mais significativas psi cote-
rapias humanista-existenciais e fenomenol6gico-existencial. A di-
visao agora nao e arbitraria, mas tern sua razao de ser e 6 0 que 
tentarei mostrar. 
Creio, pon§m, ser necessario destacar que tanto as terapias 
humanistas, as terapias existenciais, quanto as terapias fenome-
nologico-existenciais, possuem uma concepC;ao mais ou menos 
homogenea do que seja Psicoterapia. Sem medo de errar, pode-
mos dizer que, para todas as principais tendencias do mesmo solo 
epistemol6gico, a psicoterapia 6 entendida como um encontro in-
terpessoal entre 0 cliente e 0 terapeuta. Encontro que s6 tem sen-
tido se 0 tipo de relac;ao estabelecida entre os dois seres humanos 
fo~ vivid a como uma rela<;ao pessoal intersubjetiva, isto e, quando 
os dois protagonistas tabalharem juntos a um nivel subjetivo, nivel 
este que deixa aflorar as vivencias mais intensas do cliente.18 
Desta maneira, descartamos, de uma vez por todas, que nao 
entendemos psicoterapia como uma aplica<;ao de tecnica. Ela 6 
lima rela<;ao pessoal intersubjetiva. 
Para melhor entendermos 0 vasto panorama das diversas te-
rapias, dividi-Io-ei em dois grandes grupos. No inicio, estes grupos 
se estruturam independentemente um do outr~, mas, com 0 pas-
sar do tempo, os contactos vaG se estreitando, e as influencias 
18 Burcher, Richard. A Psicoterapia pela Fala. EPU, 1989, p. 117. 
23 
Dentre a vasta tematica das filosofias da Existemcia, podemos 
destacar as categorias de Existencia, ser-no-mundo, liberdade, 0 
outro, a Angustia, Temporalidade, 0 Amor etc. Escolhemos falar 
sobre a Existencia pois 6 ela que nos explicita melhor as dimen-
soes do ser humano. A pergunta inicial seria a seguinte: 6 posslvel 
definir 0 conceito de Existencia? A palavra Existencia, diz Jaspers, 
"e um dos sin6nimos da palavra realidade", mas, gra<;as a maneira 
de como Kierkegaard a acentua, ela tomou um aspecto novo: "ela 
designa 0 que eu sou fundamentalmente por mim".16 
Existencia nao deve ser entendida no sentido trivial de ser-
-no-mundo, como simplemente um ente no meio de outros entes. 
Ex-sistere deve ser compreendida como ex = fora de e sistere = ter 
sua postura. Existir 6, pois, ter sua postura fora. A existencia di-
fere radicalmente do comportamento de todo os outros entes. Nos 
somos 0 destino de nos mesmo. Esta postura, que esta sempre 
em construc;ao, nunca acabada nos permite captar algumas carac-
teristicas do existir humano. Em primeiro lugar, existir e ir sendo, 
o que se tara atraves da escolha e da decisao. Em segundo lugar, 
e estar em conflito consigo mesmo, e uma preocupac;ao infinita 
de si proprio. Em terceiro lugar, ela nao 6 definlvel. Ela nao pode 
tornar-se objeto.17 
Cada filosofo, atraves de seus escritos, procura precisar as ca-
racterfsticas de Existencia. Heidegger deve ser lembrado como, 
talvez, 0 que fez um esfor<;o gigantesco na sua obra Ser e Tem-
po para analisar a estrutura da Existencia, mostrando a estrutura 
. Dasein, 0 estar fora de si e estar-no-mundo. Por iS30, vai falar de 
existencia autentica e existencia manteutica. No aprofundamento 
do pensamento de Heidegger, vamos encontrar Binswanger que, 
mostrando 0 limite das analises heideggerianas, quando compre-
en de 0 Dasein como cuidado (Sorge), mostra que 0 amor (Liebe) 
1/1 Citac;ao de Jaspers retirada do livro de Wahl, Jean, op. cit, p. 41. 
H Wahl, Jean. Op. cit, p. 42-43. 
22 
e uma outra dimensao do Dasein (de Existencia) que nao fll~receu 
aten<;ao dos fil6sofos . 
. Depois destas breves consderac;oes, passemos a lnalise da 
repercussao destas ideias na psicoterapia. 
III - IMPACTO NAS PSICOTERAPIAS 
o pas so agora 6 estarmos atentos a qual destas fontes anali-
sadas acima lanc;ar os alicerces para a pratica clinica denominada 
psicoterapia. Sem querer esgotar 0 assunto, tentaremos mostrar, 
em linhas gerais, quais as bases das mais significativas psi cote-
rapias humanista-existenciais e fenomenol6gico-existencial. A di-
visao agora nao e arbitraria, mas tern sua razao de ser e 6 0 que 
tentarei mostrar. 
Creio, pon§m, ser necessario destacar que tanto as terapias 
humanistas, as terapias existenciais, quanto as terapias fenome-
nologico-existenciais, possuem uma concepC;ao mais ou menos 
homogenea do que seja Psicoterapia. Sem medo de errar, pode-
mos dizer que, para todas as principais tendencias do mesmo solo 
epistemol6gico, a psicoterapia 6 entendida como um encontro in-
terpessoal entre 0 cliente e 0 terapeuta. Encontro que s6 tem sen-
tido se 0 tipo de relac;ao estabelecida entre os dois seres humanos 
fo~ vivid a como uma rela<;ao pessoal intersubjetiva, isto e, quando 
os dois protagonistas tabalharem juntos a um nivel subjetivo, nivel 
este que deixa aflorar as vivencias mais intensas do cliente.18 
Desta maneira, descartamos, de uma vez por todas, que nao 
entendemos psicoterapia como uma aplica<;ao de tecnica. Ela 6 
lima rela<;ao pessoal intersubjetiva. 
Para melhor entendermos 0 vasto panorama das diversas te-
rapias, dividi-Io-ei em dois grandes grupos. No inicio, estes grupos 
se estruturam independentemente um do outr~, mas, com 0 pas-
sar do tempo, os contactos vaG se estreitando, e as influencias 
18 Burcher, Richard. A Psicoterapia pela Fala. EPU, 1989, p. 117. 
23 
redprocas ajudam a enriql:lecer ambas as partes. Porem, no meu 
entender, e possivel ver, com grande nitidez, duas grandes esco-
las. A primeira escola chamarei de escola americana, a segunda, 
de escola europeia. 
3.1. A ESCOLA AMERICANA 
o Humanismoindividual e fruto da sociedade americana e foi 
este momenta cultural juntamente com as peocupa96es do exis-
tencialismo de Kierkegaard os responsaveis pel a primeira fase das 
terapias ditas humanista-existenciais. May diz 0 seguinte: "No pen-
samento e nas atitudes americanas tambem e muito importante a 
desconfianc;a em relac;ao as categorias abstratas ou a teorizac;ao 
'per se', uma desconfianc;a tao veementemente manifestada por 
Kierkegaard, assim como a rejeic;ao da dicotomia sujeito-objeto".19 
A primeira tendencia da escola americana e 0 que chamaremos 
Psicoterapia humanista-existencial. 
3.1.1. Psicoterapia H umanista-Existencial 
a) Terapia centrada na Pessoa de Carl Rogers. 
E impossivel, aqui, no contexto desta apresenta9ao, analisar-
mos com profundidade os desdobramentos de cada teoria. Oes-
tacaremos so os pontos mais significativos que mere9am a nossa 
aten<;ao. 
o pensamento terapeutico de Rogers passa por tres grandes 
fases: a nao-diretiva (1940-1950), a fase reflexiva (1950-1957) e a 
, fase experiencial (1957-1970). No ambito geral, a fundamenta9ao 
t' 
de Rogers e mais no pensamento de Kierkegaard e Buber, ten-i, 
t, 
~ 
Ii. 
r' 
do 0 contacto com a fenomenologia ocorrido mais tade, em dois 
momentos distintos. 0 primeiro, atraves de Suygs e Combs e 0 
~, '-'-----
, 19 May Rollo. Terapia Existencial e a CenaAmericana e.m Psicologia e Dilema Humano. 
RJ, Zahar Editores, 1973, p. 136 
24 
segundo, p~r intermedio de seu discipulo Gendlin, que influenciou 
napassagem da segunda para a terceira fase de sua teoria. 
Como 0 proprio Rogers escreve, "a identificac;ao com a pSico-
logia humanista esta baseada na sua advocacia pela dignidade e 
valor da p,essoa individual na sua busca pelo crescimento".2o Sua 
teoria da Personalidade, que sustenta toda a pratica terapica, vai 
apresentar uma interliga9ao entre esta e a experiencia que sera 
feita pelo organismo. Esta afirma9ao retrata um dualismo que, aos 
olhos da fenomenologia, trara problemas. 
o fato de Rogers ter uma confian<;a nas for9as positivas do 
organismo, que sao utilizadas de forma exata, ajudara 0 indivfduo 
a ter uma vivencia mais plena. Ele diz que em cada organismo "ha 
um fluxo subjacente de movimento em direc;ao a realizac;ao cons-
trutiva das possibilidades que Ihe sao inerentes".21 Este posicion a-
mento rogeriano 0 coloca mais proximo das ideias humanistas do 
que das ideias fenomenologicas. 
b) Psicoterapia existencial de Whitaker e Malone 
Outra abordagem de psicoterapia, que se alinha tendo as 
ideias humanistas como inspiradoras, e a psicoterapia existencial 
de Whitaker e Malone. 0 livro Metas de Psicoterapias22 , escrito pe-
los dois clfnicos em 1953 e reeditado em 1981, traduz as ideias de 
que 0, indivfduo esta inserido num meio cultural e deve ser enten-
dido como uma pessoa, isto e, deve, ser percebido no Jinamismo 
filosofico e na sua inser9ao como ser social. 
20 Meador, Betty e Rogers, Carl, Person - Centered Therapy em Corsiri (ed) Current 
Psychotherapies, Elasca. Peacock Publishers, 1979, 2a. ed" p. 134, 
21 Rogers Carl. Um jeito de ser. SP, EPU, 1983, p, 40. 
22 Whitaker, Carl e Malone, Thomas, The Roots of Psychotherapy, NY, Brunner/Mazel, 
1981, 2a. ed. 
25 
redprocas ajudam a enriql:lecer ambas as partes. Porem, no meu 
entender, e possivel ver, com grande nitidez, duas grandes esco-
las. A primeira escola chamarei de escola americana, a segunda, 
de escola europeia. 
3.1. A ESCOLA AMERICANA 
o Humanismo individual e fruto da sociedade americana e foi 
este momenta cultural juntamente com as peocupa96es do exis-
tencialismo de Kierkegaard os responsaveis pel a primeira fase das 
terapias ditas humanista-existenciais. May diz 0 seguinte: "No pen-
samento e nas atitudes americanas tambem e muito importante a 
desconfianc;a em relac;ao as categorias abstratas ou a teorizac;ao 
'per se', uma desconfianc;a tao veementemente manifestada por 
Kierkegaard, assim como a rejeic;ao da dicotomia sujeito-objeto".19 
A primeira tendencia da escola americana e 0 que chamaremos 
Psicoterapia humanista-existencial. 
3.1.1. Psicoterapia H umanista-Existencial 
a) Terapia centrada na Pessoa de Carl Rogers. 
E impossivel, aqui, no contexto desta apresenta9ao, analisar-
mos com profundidade os desdobramentos de cada teoria. Oes-
tacaremos so os pontos mais significativos que mere9am a nossa 
aten<;ao. 
o pensamento terapeutico de Rogers passa por tres grandes 
fases: a nao-diretiva (1940-1950), a fase reflexiva (1950-1957) e a 
, fase experiencial (1957-1970). No ambito geral, a fundamenta9ao 
t' 
de Rogers e mais no pensamento de Kierkegaard e Buber, ten-i, 
t, 
~ 
Ii. 
r' 
do 0 contacto com a fenomenologia ocorrido mais tade, em dois 
momentos distintos. 0 primeiro, atraves de Suygs e Combs e 0 
~, '-'-----
, 19 May Rollo. Terapia Existencial e a CenaAmericana e.m Psicologia e Dilema Humano. 
RJ, Zahar Editores, 1973, p. 136 
24 
segundo, p~r intermedio de seu discipulo Gendlin, que influenciou 
napassagem da segunda para a terceira fase de sua teoria. 
Como 0 proprio Rogers escreve, "a identificac;ao com a pSico-
logia humanista esta baseada na sua advocacia pela dignidade e 
valor da p,essoa individual na sua busca pelo crescimento".2o Sua 
teoria da Personalidade, que sustenta toda a pratica terapica, vai 
apresentar uma interliga9ao entre esta e a experiencia que sera 
feita pelo organismo. Esta afirma9ao retrata um dualismo que, aos 
olhos da fenomenologia, trara problemas. 
o fato de Rogers ter uma confian<;a nas for9as positivas do 
organismo, que sao utilizadas de forma exata, ajudara 0 indivfduo 
a ter uma vivencia mais plena. Ele diz que em cada organismo "ha 
um fluxo subjacente de movimento em direc;ao a realizac;ao cons-
trutiva das possibilidades que Ihe sao inerentes".21 Este posicion a-
mento rogeriano 0 coloca mais proximo das ideias humanistas do 
que das ideias fenomenologicas. 
b) Psicoterapia existencial de Whitaker e Malone 
Outra abordagem de psicoterapia, que se alinha tendo as 
ideias humanistas como inspiradoras, e a psicoterapia existencial 
de Whitaker e Malone. 0 livro Metas de Psicoterapias22 , escrito pe-
los dois clfnicos em 1953 e reeditado em 1981, traduz as ideias de 
que 0, indivfduo esta inserido num meio cultural e deve ser enten-
dido como uma pessoa, isto e, deve, ser percebido no Jinamismo 
filosofico e na sua inser9ao como ser social. 
20 Meador, Betty e Rogers, Carl, Person - Centered Therapy em Corsiri (ed) Current 
Psychotherapies, Elasca. Peacock Publishers, 1979, 2a. ed" p. 134, 
21 Rogers Carl. Um jeito de ser. SP, EPU, 1983, p, 40. 
22 Whitaker, Carl e Malone, Thomas, The Roots of Psychotherapy, NY, Brunner/Mazel, 
1981, 2a. ed. 
25 
3.1.2. Psicoterapia fenomenoI6~ico-existencial 
o movimento fenomenologico surgido na Europa teve tam-
bem suas ramificagoes nas Americas, porem, a nosso ver, ainda 
se estruturou de uma forma academica ou escolar, tanto assim 
que Spigelberg23, historiudor do impacto das ideias fenomenologi-
cas na Psicologia e Psiquiatria, divide em duas epocas distintas a 
vinculagao das ideias fenomenologicas nos EUA. A publicagao de 
Existencia em 1958, um livro organizado por Rollo May e outros, 
tornou-se 0 marco divisorio das ideias fenomenologicas. E nesse 
livro que se tem, pela primeira vez, uma divulgagao das ideias de 
Binswanger, Strauss, Minkowsky e Kuhn, teoricos da fenomenolo-
gia no campo da psiquiatria 
Um ana depois, na Convengao Anual da Associagao America-
na de Psicologia, Maslow, numa conferencia, diz 0 seguinte: "A 
fenomen%gia tem uma certa historia no pensamento psic%gico 
america no, mas, no todo, pense tem enfraquecido. Os fenome-
n%gos europe us, com suas demonstraqoes torturantemente cui-
dadosas e laboriosas, podem nos re-ensinar que 0 me/h~r modo 
de compreendermos outro ser humane ou, pelo menos, um modo 
necessario para algumas finalidades e penetrar em seu weltans-
chamung e ser capaz de ver seu mundoatraves de seus olhos".24 
Este revigoramento vai se traduzir com 0 aparecimento de variAs 
revistas de cunho fenomenologico e existencial.25 
a) Psicoterapia Existencial de Rollo May 
May tem se tornado 0 porta-voz, nos Estados Unidos, das 
i· ideias fenomenologico-existenciais. May e mais conhecido como 
, 
r. 23 May, RAngel, E. e Ellenberger, H. Existence: A new Dimension in Psychiatry and 
r Psychology. NY, Basic Books, 1958. 
f: 24 Maslow, A. P~icologia Existencial: 0 que ha nela para n6s? em May, Rollo (org.) 
i:7 ~slcologla EXlstenclal, P. A., Ed. Globo, 1976, p. 62. 
R • Em 1960 • The Journal of Existencial Psychiatry, em 1961. Review of Existencial 
I,: . PsycholollY and Psychiatry, etc. 
l'" 
existencialista, pois sua enfase na fenomenologia tem sica recen-
teo No seu artigo "Uma abordagem fenomenologica da Psicotera-
pia", ele nos diz: "Nos, psicoterapeutas, esperamos que a fenome-
nologia nos indique um caminho para a compreensao aa natureza 
fundamental do homem".26 
A trajetoria de May em seu contacto primeiro com 0 existen-
cialismo se deve ao fato de ter convivido com dois refugiados ale-
maes: Goldstein e Tillich, tendo, assim, acesso ao pensamento de 
Kierkegaard e Heidegger.27 
Roilo May nao escreveu muito explicitamente sobre a conduta 
do terapeuta nesta perspectiva fenomenologica. 0 que temos e a 
explicitagao de conceitos centrais no IIvro Existencia, e retomados 
posteriormente, no livro A descoberta do Ser28 , como Ser e nao-
-ser, Ser-no-mundo, que servem para fundamentagao do trabalho 
terapeutico na linha fenomenologico-existencial. 
b) Psicoterapia Existencial de Eugene Gendlin 
o Psicologo e filosofo Gendlin e 0 responsavel pela reorien-
tagao da obra de Rogers, transformando-a em fenomenologia e 
existencia. E tambem 0 criador da psicoterapia experiencial, "que 
constitui-se, basicamente, numa fusao das terapias centradas no 
cliente e existencia/. Contudo, e uma fusao criativa que vai alem 
destes dois sistemas, invertendo as regras da Terapia centrada no 
cliente e ampliando a Terapia Existencial".29 
Eugene, no artigo onde da uma visao geral da sua terapia, 
enumera os principais pensadores que constituem as raizes de 
23 May Rollo. Uma abordagem Fenomenol6gica da Psicoterapia em Psicologia e 
Dilema Humano, op. cit, p. 122. 
27 Spigelberg, H. op. cit., p. 159. 
28 May Rollo. A descoberta do Ser. RJ., ed. Rocco, 1988. 
29 Gomes, William. A Psicoterapia experiencial de Eugene Gendlin e suas rela¢es com 
a fenomenologia em Psicologia: Reflexao e Critica, P. Alegre, 1988, v. 3, no. 112, p. 
38-48. 
27 
3.1.2. Psicoterapia fenomenoI6~ico-existencial 
o movimento fenomenologico surgido na Europa teve tam-
bem suas ramificagoes nas Americas, porem, a nosso ver, ainda 
se estruturou de uma forma academica ou escolar, tanto assim 
que Spigelberg23, historiudor do impacto das ideias fenomenologi-
cas na Psicologia e Psiquiatria, divide em duas epocas distintas a 
vinculagao das ideias fenomenologicas nos EUA. A publicagao de 
Existencia em 1958, um livro organizado por Rollo May e outros, 
tornou-se 0 marco divisorio das ideias fenomenologicas. E nesse 
livro que se tem, pela primeira vez, uma divulgagao das ideias de 
Binswanger, Strauss, Minkowsky e Kuhn, teoricos da fenomenolo-
gia no campo da psiquiatria 
Um ana depois, na Convengao Anual da Associagao America-
na de Psicologia, Maslow, numa conferencia, diz 0 seguinte: "A 
fenomen%gia tem uma certa historia no pensamento psic%gico 
america no, mas, no todo, pense tem enfraquecido. Os fenome-
n%gos europe us, com suas demonstraqoes torturantemente cui-
dadosas e laboriosas, podem nos re-ensinar que 0 me/h~r modo 
de compreendermos outro ser humane ou, pelo menos, um modo 
necessario para algumas finalidades e penetrar em seu weltans-
chamung e ser capaz de ver seu mundo atraves de seus olhos".24 
Este revigoramento vai se traduzir com 0 aparecimento de variAs 
revistas de cunho fenomenologico e existencial.25 
a) Psicoterapia Existencial de Rollo May 
May tem se tornado 0 porta-voz, nos Estados Unidos, das 
i· ideias fenomenologico-existenciais. May e mais conhecido como 
, 
r. 23 May, RAngel, E. e Ellenberger, H. Existence: A new Dimension in Psychiatry and 
r Psychology. NY, Basic Books, 1958. 
f: 24 Maslow, A. P~icologia Existencial: 0 que ha nela para n6s? em May, Rollo (org.) 
i:7 ~slcologla EXlstenclal, P. A., Ed. Globo, 1976, p. 62. 
R • Em 1960 • The Journal of Existencial Psychiatry, em 1961. Review of Existencial 
I,: . PsycholollY and Psychiatry, etc. 
l'" 
existencialista, pois sua enfase na fenomenologia tem sica recen-
teo No seu artigo "Uma abordagem fenomenologica da Psicotera-
pia", ele nos diz: "Nos, psicoterapeutas, esperamos que a fenome-
nologia nos indique um caminho para a compreensao aa natureza 
fundamental do homem".26 
A trajetoria de May em seu contacto primeiro com 0 existen-
cialismo se deve ao fato de ter convivido com dois refugiados ale-
maes: Goldstein e Tillich, tendo, assim, acesso ao pensamento de 
Kierkegaard e Heidegger.27 
Roilo May nao escreveu muito explicitamente sobre a conduta 
do terapeuta nesta perspectiva fenomenologica. 0 que temos e a 
explicitagao de conceitos centrais no IIvro Existencia, e retomados 
posteriormente, no livro A descoberta do Ser28 , como Ser e nao-
-ser, Ser-no-mundo, que servem para fundamentagao do trabalho 
terapeutico na linha fenomenologico-existencial. 
b) Psicoterapia Existencial de Eugene Gendlin 
o Psicologo e filosofo Gendlin e 0 responsavel pela reorien-
tagao da obra de Rogers, transformando-a em fenomenologia e 
existencia. E tambem 0 criador da psicoterapia experiencial, "que 
constitui-se, basicamente, numa fusao das terapias centradas no 
cliente e existencia/. Contudo, e uma fusao criativa que vai alem 
destes dois sistemas, invertendo as regras da Terapia centrada no 
cliente e ampliando a Terapia Existencial".29 
Eugene, no artigo onde da uma visao geral da sua terapia, 
enumera os principais pensadores que constituem as raizes de 
23 May Rollo. Uma abordagem Fenomenol6gica da Psicoterapia em Psicologia e 
Dilema Humano, op. cit, p. 122. 
27 Spigelberg, H. op. cit., p. 159. 
28 May Rollo. A descoberta do Ser. RJ., ed. Rocco, 1988. 
29 Gomes, William. A Psicoterapia experiencial de Eugene Gendlin e suas rela¢es com 
a fenomenologia em Psicologia: Reflexao e Critica, P. Alegre, 1988, v. 3, no. 112, p. 
38-48. 
27 
seu trabalho. Dos filosofo.s, ele e devedor a Kierkegaard, Husserl, 
Heidegger, Buber, Sartre e Merleau-Ponty; dos psicologos, ele 
destaca Whitaker e Malone, Rank, Rogers, Binswanger, Boss e 
May. Seu pensamento se traduz num esfon;:o gigantesco de en-
contrar um metodo que fosse adequado para estudar 0 fenomeno 
da subjetividade. 
Gendlin estrutura a terapia experiencial em torno de quatro 
conceitos basicos: 
a) sentir experiencias (experiential felt sense) 
b) diferent;as (differentiation) 
c) 0 ir adiante (carrying forward) 
d) interagir (interactionpo 
o processo de experiencias se da atraves dos tres primeiros 
conceitos. "No sentir experiencial", descreve este contato imediato 
com 0 todo situacional. Esta consciencia pre-reflexiva e possivel 
quando 0 individuo esta, interiormente, quieto e preparado para 
interagir com 0 proprio corpo. No "diferenciar", define os elementos 
emergentes da informat;ao organistica e e, portanto, uma reflexao. 
o "ir adiante" indica 0 movimento resultante da ten sao dialetica , 
que ocorre quando a informat;ao organistica e diferenciada e cada 
sentimento e nomeado".31 Porem, para Gendlin, este processo so 
ocorr6 se 0 ser humane possui um corpo, que esta em continua 
interat;ao com 0 seu meio ambiente. Nota-se aqui a grande influ-
encia do pensamento de Merleau-Ponty. 
Assim, Gendlin estrutura toda a sua tecnica terapeutica numa 
&. condit;ao fenomenologica da teoria e consegue atingir a subjetivi-
~ dade ao ser humano, objeto de abordagem das teorias fenomeno-
ffi logico-existenciais.r 
I; 
It-
1° Gendlin, Eugene. Experiential Psychotherapy, 
Psychoterapies, op. cit, p. 340-373. 
. 31 Gomes, William, op. cit., p. 45. 
28 
em Corsini (ed.). Curent 
3.1.3. Terapias Existenciais dos anos 80-90. 
o mundo contemporaneo esta passando por grandes transfor-
mat;oes, e temos assistido a um questionamento de que os para-
metros antigos nao sao suficientemente claros para se entender 
determinados fenomenos. E 0 que se chama a "crise dos pata-
digmas". No bojo desta problematica, tem surgido um novo eixo 
de organizat;ao da ciencia, onde, para se entender um fenomeno, 
nao basta hipotese simplista, pois 0 fen6meno e extremamente 
complexo. Fala-se tambemque a referencia nao e mais a objetivi-
dade pura e simples, mas ela deve ser compreendida a partir da 
intersubjetividade. E 0 novo conceito de ciencia e de homem que 
deve emergir neste final de milenio. 
As praticas terapeuticas devem se estruturar nao mais dentro 
do paradigma newtoniano-cartesiano (Determinismo, Reducionis-
mo, Fragmentat;ao e Separat;aO radical do sujeito-objeto), mas 
dentro de um novo quadro referencial que seja sistemico, lingOisti-
co, fenomenol6gico, existencial e transcendental.32 
Dentro desta perspectiva desafiante, e que gostaria de citar 
dois estudos, em psicoterapia existencial que devem nos motivar 
e buscar 0 dialogo com 0 que ha de mais novo no pens8mento 
contemporaneo. A psicoterapia existencial de Irvin Yalon e a de 
Salvatori Maddj33. 
3.2. A ESCOLA EUROPEIA 
A Europa, pela sua tradit;ao filosofica, sera 0 bert;o das princi-
pais ideias fenomenologicas e existenciais. Esta em s'.a maneira 
de ser uma busca rigorosa na estruturat;aO dos conceitos, e nao 
32 Para 0 desenvolvimentc, deste novo paradigma em Psicoterapia, consultar Oiniz Neto, 
Orestes. Um experimento sobre os efeitos de dissonancia-consonancia cognitiva em 
Psicoterapia breve de grupo. Tese de mestrado em Psicologia na UFMG, 1993, p. 
50-88. 
33 Yalom, Irvin. 'Existential Psychotherapy, N.Y., Basic Books, sId Maddi, Salvatore . 
Psicoterapia existencial. 
29 
seu trabalho. Dos filosofo.s, ele e devedor a Kierkegaard, Husserl, 
Heidegger, Buber, Sartre e Merleau-Ponty; dos psicologos, ele 
destaca Whitaker e Malone, Rank, Rogers, Binswanger, Boss e 
May. Seu pensamento se traduz num esfon;:o gigantesco de en-
contrar um metodo que fosse adequado para estudar 0 fenomeno 
da subjetividade. 
Gendlin estrutura a terapia experiencial em torno de quatro 
conceitos basicos: 
a) sentir experiencias (experiential felt sense) 
b) diferent;as (differentiation) 
c) 0 ir adiante (carrying forward) 
d) interagir (interactionpo 
o processo de experiencias se da atraves dos tres primeiros 
conceitos. "No sentir experiencial", descreve este contato imediato 
com 0 todo situacional. Esta consciencia pre-reflexiva e possivel 
quando 0 individuo esta, interiormente, quieto e preparado para 
interagir com 0 proprio corpo. No "diferenciar", define os elementos 
emergentes da informat;ao organistica e e, portanto, uma reflexao. 
o "ir adiante" indica 0 movimento resultante da ten sao dialetica , 
que ocorre quando a informat;ao organistica e diferenciada e cada 
sentimento e nomeado".31 Porem, para Gendlin, este processo so 
ocorr6 se 0 ser humane possui um corpo, que esta em continua 
interat;ao com 0 seu meio ambiente. Nota-se aqui a grande influ-
encia do pensamento de Merleau-Ponty. 
Assim, Gendlin estrutura toda a sua tecnica terapeutica numa 
&. condit;ao fenomenologica da teoria e consegue atingir a subjetivi-
~ dade ao ser humano, objeto de abordagem das teorias fenomeno-
ffi logico-existenciais. 
r 
I; 
It-
1° Gendlin, Eugene. Experiential Psychotherapy, 
Psychoterapies, op. cit, p. 340-373. 
. 31 Gomes, William, op. cit., p. 45. 
28 
em Corsini (ed.). Curent 
3.1.3. Terapias Existenciais dos anos 80-90. 
o mundo contemporaneo esta passando por grandes transfor-
mat;oes, e temos assistido a um questionamento de que os para-
metros antigos nao sao suficientemente claros para se entender 
determinados fenomenos. E 0 que se chama a "crise dos pata-
digmas". No bojo desta problematica, tem surgido um novo eixo 
de organizat;ao da ciencia, onde, para se entender um fenomeno, 
nao basta hipotese simplista, pois 0 fen6meno e extremamente 
complexo. Fala-se tambemque a referencia nao e mais a objetivi-
dade pura e simples, mas ela deve ser compreendida a partir da 
intersubjetividade. E 0 novo conceito de ciencia e de homem que 
deve emergir neste final de milenio. 
As praticas terapeuticas devem se estruturar nao mais dentro 
do paradigma newtoniano-cartesiano (Determinismo, Reducionis-
mo, Fragmentat;ao e Separat;aO radical do sujeito-objeto), mas 
dentro de um novo quadro referencial que seja sistemico, lingOisti-
co, fenomenol6gico, existencial e transcendental.32 
Dentro desta perspectiva desafiante, e que gostaria de citar 
dois estudos, em psicoterapia existencial que devem nos motivar 
e buscar 0 dialogo com 0 que ha de mais novo no pens8mento 
contemporaneo. A psicoterapia existencial de Irvin Yalon e a de 
Salvatori Maddj33. 
3.2. A ESCOLA EUROPEIA 
A Europa, pela sua tradit;ao filosofica, sera 0 bert;o das princi-
pais ideias fenomenologicas e existenciais. Esta em s'.a maneira 
de ser uma busca rigorosa na estruturat;aO dos conceitos, e nao 
32 Para 0 desenvolvimentc, deste novo paradigma em Psicoterapia, consultar Oiniz Neto, 
Orestes. Um experimento sobre os efeitos de dissonancia-consonancia cognitiva em 
Psicoterapia breve de grupo. Tese de mestrado em Psicologia na UFMG, 1993, p. 
50-88. 
33 Yalom, Irvin. 'Existential Psychotherapy, N.Y., Basic Books, sId Maddi, Salvatore . 
Psicoterapia existencial. 
29 
poderia ser de outra maneira. Ass;m, as mais fecundas e 0 apare-
cimento dos primeiros disci pulos dos mestres filosofos no campo 
da pratica clfnica se da com mais fon;a naAlemanha, sem,eviden-
temente, esquecermos as contribui90es do pensamento frances. 
3.2.1. PSicoterapia Fenomenologico-Existencial 
a) Daseinsanalyse de Ludwig Binswanger 
Podemos resumir em duas as contribuir;oes de Binswanger 
para a pratica clfnica. A primeira sao os estudos fenomenologicos 
no campo da psicopatologia onde sua abordagem, a partir dos es-
tudos de Husserl, marca urn passe a mais nos estudos iniciados 
por Jaspers. A segunda e a constru9ao da teoria terapeutica intitu-
lad a Daseinsanalyse. Porem, estas duas contribui90es devem ser 
entendidas dentro de uma preocupa9ao mais ampla que pautou 
todo 0 seu trabalho clinico, que foi a de encontrar uma fundamen-
ta9ao "cientifica" para a Psiquiatria do seu tempo. 
Binswanger foi diretor da clfnica "Bellevue", fundada por seu 
avo, em Kreuzilnig, e de promoveu muitos encontros com intele-
cutais e mestres da epoca. Estas jornadas de estudos contaram 
com a presen9a de Husserl, Scheller, Heidegger, Buber e muitos 
outros que marcaram 0 pensamento binswangeriano. No campo 
da psicologia, Binswanger fez sua tese de doutorado sob a dire9ao 
de Carl Jung e foi atraves deste que, em 1907, conheceu Freud do 
qual iria se tomar amigo, permanecendo psicanalista ate 0 tim da 
vida, m~smo depois do rompimento intelectual com Freud. 
Foi, no ana de 1930, com 0 lan9amento de Sonho e Existen-
I :i::~:~:,,~:n::~~: :,:~::: :e:::~:: R::::,:e,:~::i:::~ 
I;; p. 766-799. Existe uma tradu\ilo francesa com uma introdu\ilo de Michel Foucault. 
II' . Reve et Existence. Paris, Desclee de Brouwer, 1954.Recentemente, veio a publico \ l uma tradu<;:ao brasileira que foi editada pela revista Natureza Humana, vol. IV, nO 2, 
:~: Sao Paulo, dez, 2002 
~i,' 
30 
nalyse que tern seus fundamentos filosoficos e antropolol]icos ex-
plicitados em 1942 na obra Grundformen.35 Sua compreensao do 
Dasein vai alem da heideggeriana no sentido que este nao deve 
ser entendido so como Sorge (cuidado), mas tambem <.;omo Liebe 
(Amor). Estas duas dimensoes do Dasein possibilitam que ele nao 
seja s6 entendido como ser-no-mundo (in-der-welt-sein),mas, 
tambem, como urn ser-que-ultrapasse-o-mundo (uber-die-welt-
-hinaus-sein). 
b) Analise Existencial de Medard Boss 
Boss funda, em Zurick, urn Instituto de Psicoterapia chamado 
Daseinsanalyse, mesmo nome do trabano de Binswanger, e que 
tem como principal inspirador Martin Heidegger. Porem, antes de 
se iniciar ao pensamento de Heidegger, Boss foi muito influenciado 
por Jung. 
As analises do ser-no-mundo introduzidas por Heidegger vao 
ajudar Boss, que nao estava contente com as analises freudia-
nas, a encontrar alternativas de uma concep9ao nao-naturalista 
do homem como aberto ao ser. Assim, a fun9ao da terapia seria a 
completa Iibera9ao do paciente atraves da experiencia fenomenal, 
a qual 0 terapeuta tera acesso atraves das analises dos sonhos 
que Boss desenvolveu em alguns dos seus mais importantes es-
critos.36 
Boss pontua suas divargencias com a Psicanalise e poderfa-
mos citar duas. Em primeiro lugar, enfatiza que os conflitos indivi-
duais nao estao na mente; eles sao conflitos entre os diferentes 
modos de rela9ao do nosso mundo e do mundo dos outros. Em 
segundo lugar, Boss ressalta que expressoes de sentimento dos 
pacientes estao diretamente ligados a situa9ao presente. 
35 Binswanger, L. Grundformen und Erkenntnis menschlichen Daseins. Munchen, 
Reinhart, 1973, 5a. ed. 
36 Boss, Medard. Trad. port. Na Noite Passada, eu sonhei, SP, Editorial Summus, 1979. 
31 
poderia ser de outra maneira. Ass;m, as mais fecundas e 0 apare-
cimento dos primeiros disci pulos dos mestres filosofos no campo 
da pratica clfnica se da com mais fon;a naAlemanha, sem,eviden-
temente, esquecermos as contribui90es do pensamento frances. 
3.2.1. PSicoterapia Fenomenologico-Existencial 
a) Daseinsanalyse de Ludwig Binswanger 
Podemos resumir em duas as contribuir;oes de Binswanger 
para a pratica clfnica. A primeira sao os estudos fenomenologicos 
no campo da psicopatologia onde sua abordagem, a partir dos es-
tudos de Husserl, marca urn passe a mais nos estudos iniciados 
por Jaspers. A segunda e a constru9ao da teoria terapeutica intitu-
lad a Daseinsanalyse. Porem, estas duas contribui90es devem ser 
entendidas dentro de uma preocupa9ao mais ampla que pautou 
todo 0 seu trabalho clinico, que foi a de encontrar uma fundamen-
ta9ao "cientifica" para a Psiquiatria do seu tempo. 
Binswanger foi diretor da clfnica "Bellevue", fundada por seu 
avo, em Kreuzilnig, e de promoveu muitos encontros com intele-
cutais e mestres da epoca. Estas jornadas de estudos contaram 
com a presen9a de Husserl, Scheller, Heidegger, Buber e muitos 
outros que marcaram 0 pensamento binswangeriano. No campo 
da psicologia, Binswanger fez sua tese de doutorado sob a dire9ao 
de Carl Jung e foi atraves deste que, em 1907, conheceu Freud do 
qual iria se tomar amigo, permanecendo psicanalista ate 0 tim da 
vida, m~smo depois do rompimento intelectual com Freud. 
Foi, no ana de 1930, com 0 lan9amento de Sonho e Existen-
I :i::~:~:,,~:n::~~: :,:~::: :e:::~:: R::::,:e,:~::i:::~ 
I;; p. 766-799. Existe uma tradu\ilo francesa com uma introdu\ilo de Michel Foucault. 
II' . Reve et Existence. Paris, Desclee de Brouwer, 1954.Recentemente, veio a publico \ l uma tradu<;:ao brasileira que foi editada pela revista Natureza Humana, vol. IV, nO 2, 
:~: Sao Paulo, dez, 2002 
~i,' 
30 
nalyse que tern seus fundamentos filosoficos e antropolol]icos ex-
plicitados em 1942 na obra Grundformen.35 Sua compreensao do 
Dasein vai alem da heideggeriana no sentido que este nao deve 
ser entendido so como Sorge (cuidado), mas tambem <.;omo Liebe 
(Amor). Estas duas dimensoes do Dasein possibilitam que ele nao 
seja s6 entendido como ser-no-mundo (in-der-welt-sein), mas, 
tambem, como urn ser-que-ultrapasse-o-mundo (uber-die-welt-
-hinaus-sein). 
b) Analise Existencial de Medard Boss 
Boss funda, em Zurick, urn Instituto de Psicoterapia chamado 
Daseinsanalyse, mesmo nome do trabano de Binswanger, e que 
tem como principal inspirador Martin Heidegger. Porem, antes de 
se iniciar ao pensamento de Heidegger, Boss foi muito influenciado 
por Jung. 
As analises do ser-no-mundo introduzidas por Heidegger vao 
ajudar Boss, que nao estava contente com as analises freudia-
nas, a encontrar alternativas de uma concep9ao nao-naturalista 
do homem como aberto ao ser. Assim, a fun9ao da terapia seria a 
completa Iibera9ao do paciente atraves da experiencia fenomenal, 
a qual 0 terapeuta tera acesso atraves das analises dos sonhos 
que Boss desenvolveu em alguns dos seus mais importantes es-
critos.36 
Boss pontua suas divargencias com a Psicanalise e poderfa-
mos citar duas. Em primeiro lugar, enfatiza que os conflitos indivi-
duais nao estao na mente; eles sao conflitos entre os diferentes 
modos de rela9ao do nosso mundo e do mundo dos outros. Em 
segundo lugar, Boss ressalta que expressoes de sentimento dos 
pacientes estao diretamente ligados a situa9ao presente. 
35 Binswanger, L. Grundformen und Erkenntnis menschlichen Daseins. Munchen, 
Reinhart, 1973, 5a. ed. 
36 Boss, Medard. Trad. port. Na Noite Passada, eu sonhei, SP, Editorial Summus, 1979. 
31 
3.2.2. Psicoterapias Antropologicas 
Entendemos por psicoterapias antropol6gicas as praticas tera-
peuticas que partem de uma elabora<;:ao exp\icita do ser humane 
trabalhado. Todos os procedimentos serao decorrentes da concep-
<;:130 de homem explicitada. 
a) Logoterapia de Viktor Frankl 
Frankl viveu situa<;:oes dramaticas existenciais como prisioneiro 
no campo de concentra<;:ao de Auschwitz, as quais sao retratadas 
no livro 0 homem em busca do sentido.37 Sua teoria terapeutica 
estaria r.1uito influenciada pel as experienc;as limite mais terriveis 
do totalitarismo, vividas durante tres anos, como prisioneiro. 
Ap6s a segunda guerra, ele quis estudar filosofia e defendeu 
sua tese de doutorado aos 44 anos sobre a presen<;:a inconsciente 
de Deus. Assim, a s6lida base filos6fica veio apoiar suas experien-
cias existenciais e medicas. 
A concep<;:ao de homem explicita de Frankl pode ser resumi-
da no sentido de que 0 homem deve ser entendido como um ser 
biopsicoespiritual, isto e, como uma totalidade. Desta antropologia 
tripartida, Frankl dara maior enfase a dimensao noetica, isto e, a 
dimensao do espirito, onde 0 homem sera entendido como um ser 
em busca do sentido. Ele diz que 0 homem "no final das contas, 
o qUe procura mais e a felicidade em si, mais uma razao para ser 
feliz. Com efeito, no dia-a-dia da clinica, vemos que e precisamen-
fe por nao contar com uma "razao para ser feliz" que 0 neur6tico 
sexualmente perturbado, impotente ou frigido, encontra-se impos-
~. sibilitado de obter a fe/icidade".38 
r n A diferenc;a fundamental entre a Logoterapia e a Analise Exis-
f: tencial e que a primeira tem como finalidade incluir 0 logos na psico-
~ .. ':: Frankl, Viktor. Man's Searsch for meanig. Boston, Beacon Press, 1959. 
". Frankl, Vlktor. Fundamentos antropol6gicos da FSicoterapia, RJ. Zahar Ed. 1978. 
32 
terapia e a segunda e incluir a existencia na psicoterapia. Segundo 
Frankl, "a ref/ex.ao regressiva psicoterapeutica sobre 0 logos signi-
fica 0 mesmo que ref/exao regressiva sobre 0 sentido e os valores. 
A auto-ref/exao regressiva psicoterapeutica sobre a existencia e 
igual a auto-ref/exao sobre a liberdade e a responsabilidf!ge".39 
b) Psicoterapia Antropol6gico-fenonienol6gica 
A escola de Heidelberg que desenvolveu a aplica<;:ao da fe-
nomenologia da psicopatologia atraves, primeiro, de Jaspers e, 
posteriormente, atraves de Tellenbach, que faleceu no ultimo se-
tembro, foi tambem a responsavel pelo desenvolvimento de uma 
antropologia fenomenol6gica aplicada ao campo da medicina psi-
cossomatica. 
Viktor Von Weizsacker4° foi 0 responsavel pel a elaborac;ao da 
antropologia, que desenvolveu uma nova compreens80 da rela<;:ao 
medico-paciente, trazendo, assim, novas luzes para uma relaC;80 
terapeutica mais libertadora. Weizsacker diz que a pessoa est a 
determinada pel ascategorias do devir, do encontro, do sucesso, 
da confiima<;:80 e da responsabilidade. 
Esta antropologia teve seus disdpulos dos quais podemos 
destacar Paul Christian, que faz uma analise da compreens80 da 
pessoa no moderno pensamento medico, e Walter Brautigam41 
que desenvolve a dimens80 antropol6gica da psicoterapia. 
3.2.3. Psicoterapia Antropologica dos anos 80-90. 
Temos assistido, na Europa, a uma efervescencia de novas 
ideias que provaram um repensar de algumas posi<;:o:.s defendi-
das pelas terapias apresentadas anteriormente. E necessario en-
39 Frankl. Idem, p. 197. 
40 Christian, Paul. Das Personenverstandnis im modernen medizinischen Durken. 
Tubigen, 1952. 
41 Brautigam, Walter. La psicoterapia en su aspectos antropol6gicos. Madrid. Ed. 
Gredos, 1964. 
33 
3.2.2. Psicoterapias Antropologicas 
Entendemos por psicoterapias antropol6gicas as praticas tera-
peuticas que partem de uma elabora<;:ao exp\icita do ser humane 
trabalhado. Todos os procedimentos serao decorrentes da concep-
<;:130 de homem explicitada. 
a) Logoterapia de Viktor Frankl 
Frankl viveu situa<;:oes dramaticas existenciais como prisioneiro 
no campo de concentra<;:ao de Auschwitz, as quais sao retratadas 
no livro 0 homem em busca do sentido.37 Sua teoria terapeutica 
estaria r.1uito influenciada pel as experienc;as limite mais terriveis 
do totalitarismo, vividas durante tres anos, como prisioneiro. 
Ap6s a segunda guerra, ele quis estudar filosofia e defendeu 
sua tese de doutorado aos 44 anos sobre a presen<;:a inconsciente 
de Deus. Assim, a s6lida base filos6fica veio apoiar suas experien-
cias existenciais e medicas. 
A concep<;:ao de homem explicita de Frankl pode ser resumi-
da no sentido de que 0 homem deve ser entendido como um ser 
biopsicoespiritual, isto e, como uma totalidade. Desta antropologia 
tripartida, Frankl dara maior enfase a dimensao noetica, isto e, a 
dimensao do espirito, onde 0 homem sera entendido como um ser 
em busca do sentido. Ele diz que 0 homem "no final das contas, 
o qUe procura mais e a felicidade em si, mais uma razao para ser 
feliz. Com efeito, no dia-a-dia da clinica, vemos que e precisamen-
fe por nao contar com uma "razao para ser feliz" que 0 neur6tico 
sexualmente perturbado, impotente ou frigido, encontra-se impos-
~. sibilitado de obter a fe/icidade".38 
r n A diferenc;a fundamental entre a Logoterapia e a Analise Exis-
f: tencial e que a primeira tem como finalidade incluir 0 logos na psico-
~ .. ':: Frankl, Viktor. Man's Searsch for meanig. Boston, Beacon Press, 1959. 
". Frankl, Vlktor. Fundamentos antropol6gicos da FSicoterapia, RJ. Zahar Ed. 1978. 
32 
terapia e a segunda e incluir a existencia na psicoterapia. Segundo 
Frankl, "a ref/ex.ao regressiva psicoterapeutica sobre 0 logos signi-
fica 0 mesmo que ref/exao regressiva sobre 0 sentido e os valores. 
A auto-ref/exao regressiva psicoterapeutica sobre a existencia e 
igual a auto-ref/exao sobre a liberdade e a responsabilidf!ge".39 
b) Psicoterapia Antropol6gico-fenonienol6gica 
A escola de Heidelberg que desenvolveu a aplica<;:ao da fe-
nomenologia da psicopatologia atraves, primeiro, de Jaspers e, 
posteriormente, atraves de Tellenbach, que faleceu no ultimo se-
tembro, foi tambem a responsavel pelo desenvolvimento de uma 
antropologia fenomenol6gica aplicada ao campo da medicina psi-
cossomatica. 
Viktor Von Weizsacker4° foi 0 responsavel pel a elaborac;ao da 
antropologia, que desenvolveu uma nova compreens80 da rela<;:ao 
medico-paciente, trazendo, assim, novas luzes para uma relaC;80 
terapeutica mais libertadora. Weizsacker diz que a pessoa est a 
determinada pel as categorias do devir, do encontro, do sucesso, 
da confiima<;:80 e da responsabilidade. 
Esta antropologia teve seus disdpulos dos quais podemos 
destacar Paul Christian, que faz uma analise da compreens80 da 
pessoa no moderno pensamento medico, e Walter Brautigam41 
que desenvolve a dimens80 antropol6gica da psicoterapia. 
3.2.3. Psicoterapia Antropologica dos anos 80-90. 
Temos assistido, na Europa, a uma efervescencia de novas 
ideias que provaram um repensar de algumas posi<;:o:.s defendi-
das pelas terapias apresentadas anteriormente. E necessario en-
39 Frankl. Idem, p. 197. 
40 Christian, Paul. Das Personenverstandnis im modernen medizinischen Durken. 
Tubigen, 1952. 
41 Brautigam, Walter. La psicoterapia en su aspectos antropol6gicos. Madrid. Ed. 
Gredos, 1964. 
33 
trar em dialogo com as ?iencias desta segunda parte do sec. xx, 
para r,ao correr 0 risco de se perder 0 bonde da hist6ria. 
Dentro deste esfon;o, quero citar a Psicoterapia Dialytica de 
Luis Cencillo na Espanha. Dialysis. hologenica que, literalmente, 
significa dissolu~ao gerada pela totalidade, isto e, gerada pela 
compulsao da totalidade de todos os dados, elementos e regis-
tros disponiveis e verificaveis. "Dialysis conota processo, urn pro-
cesso translaborativo que vai dissolvendo fixac;oes, barreiras, blo-
queios e as vai canalizando integralmente na totalidade funcional 
(hologfmesis)".42 0 autor parte, portanto, de uma explicita<;ao da 
totalidade do ser humane para gerar a sua pratica clinica. 
o segundo exemplo e 0 de Wyss43, que tem elaborado uma 
Psicoterapia antropologica integrativa, na qual define a psicote-
rapia como um encontro intersubjetivo da comunica<;ao. 0 autor 
desenvolve tambem toda uma reflexao sobre 0 que seja a comuni-
ca<;:ao e as suas implica~6es na rela~ao terapeutica. 
IV - CONCLUSAO 
Neste final de seculo, permeado por grandes transforma~6es, 
as psicoterapias humanistas, existenciais e as psicoterapias feno-
menol6gico-existenciais se encontram diante de desafios novos e 
nunca pensados. Citarei so dois. 
Q primeiro grande desafio, no nosso entender, e a neessidade 
de se explicitar de maneira rigorosa os fundamentos da atividade 
terapeutica para tirarmos, de uma vez por todas, a ideia de que 
terapia humanista e uma mera aplica<;ao ou tecnica ou conversa 
livre (amigavel). A pn3tica terapeutica deve se fundamentar numa 
t.: . coerente visao de homem, isto e, numa antropologia filosofica, e 
E na explicita<;ao dos fundamentos filos6ficos, psicologicos, antropo-
~... 16gicos e epistemol6gicos. 
It ... ,42 Cencillo Ramirez L. Transferencia y sistema de Psicoterapia, Madrid Ediciones 
!F Ruamide, 1977 . 
. 43 Wyss Dieter. Der Kranke als Partner. 2 vols. Gottigen, Vandenhoeck e Ruporeckt, 1982. 
34 
o segundo desafio e a busca de um dialogo com outro dominio 
da psicologia a fim de que uma visao mais abrangente possibilite 
um trabalho clinico mais consistente. Aqui, refiro-me a bucca de 
integra<;ao dos conhecimentos gerados pelas teorias da comuni-
ca~ao, pela cibernetica, e tambem pelas novas pesquif'1S da psi-
cologia cognitiva entre outras. 
Almejamos que 0 ressurgimento das terapias existenciais bus-
que um aprofundarnento do seu referencial teorico e nao seja rnais 
urn rnodisrno dentro da psicologia. 
35 
trar em dialogo com as ?iencias desta segunda parte do sec. xx, 
para r,ao correr 0 risco de se perder 0 bonde da hist6ria. 
Dentro deste esfon;o, quero citar a Psicoterapia Dialytica de 
Luis Cencillo na Espanha. Dialysis. hologenica que, literalmente, 
significa dissolu~ao gerada pela totalidade, isto e, gerada pela 
compulsao da totalidade de todos os dados, elementos e regis-
tros disponiveis e verificaveis. "Dialysis conota processo, urn pro-
cesso translaborativo que vai dissolvendo fixac;oes, barreiras, blo-
queios e as vai canalizando integralmente na totalidade funcional 
(hologfmesis)".42 0 autor parte, portanto, de uma explicita<;ao da 
totalidade do ser humane para gerar a sua pratica clinica. 
o segundo exemplo e 0 de Wyss43, que tem elaborado uma 
Psicoterapia antropologica integrativa, na qual define a psicote-
rapia como um encontro intersubjetivo da comunica<;ao. 0 autor 
desenvolve tambem toda uma reflexao sobre 0 que seja a comuni-
ca<;:ao e as suas implica~6es na rela~ao terapeutica. 
IV - CONCLUSAONeste final de seculo, permeado por grandes transforma~6es, 
as psicoterapias humanistas, existenciais e as psicoterapias feno-
menol6gico-existenciais se encontram diante de desafios novos e 
nunca pensados. Citarei so dois. 
Q primeiro grande desafio, no nosso entender, e a neessidade 
de se explicitar de maneira rigorosa os fundamentos da atividade 
terapeutica para tirarmos, de uma vez por todas, a ideia de que 
terapia humanista e uma mera aplica<;ao ou tecnica ou conversa 
livre (amigavel). A pn3tica terapeutica deve se fundamentar numa 
t.: . coerente visao de homem, isto e, numa antropologia filosofica, e 
E na explicita<;ao dos fundamentos filos6ficos, psicologicos, antropo-
~... 16gicos e epistemol6gicos. 
It ... ,42 Cencillo Ramirez L. Transferencia y sistema de Psicoterapia, Madrid Ediciones 
!F Ruamide, 1977 . 
. 43 Wyss Dieter. Der Kranke als Partner. 2 vols. Gottigen, Vandenhoeck e Ruporeckt, 1982. 
34 
o segundo desafio e a busca de um dialogo com outro dominio 
da psicologia a fim de que uma visao mais abrangente possibilite 
um trabalho clinico mais consistente. Aqui, refiro-me a bucca de 
integra<;ao dos conhecimentos gerados pelas teorias da comuni-
ca~ao, pela cibernetica, e tambem pelas novas pesquif'1S da psi-
cologia cognitiva entre outras. 
Almejamos que 0 ressurgimento das terapias existenciais bus-
que um aprofundarnento do seu referencial teorico e nao seja rnais 
urn rnodisrno dentro da psicologia. 
35 
DIFERENCIAL PSICOTERAPEUTICO NA 
FENOMENOLOGIA EXISTENCIAL 
A Fenomenologia e urna corrente filosofica que tem fecunda-
do a Psicologia ja ha alguns anos. Essa presen<;a, usando como 
ponto de partida a data que nos parece mais significativa, co-
me<;ou no dominio da Psicopatologia quando, em 1913, 0 psi-
quiatra e filosofo KARL JASPERS (1883-1969) escreveu a sua 
Psicopatologia Geral. De la ate hoje, esse impacto tem crescido 
e provocado uma grande fecundidade, atingindo varios dominios, 
como 0 a Psicologia Experimental (ALBERT MICHOTTE 1881-
1965), 0 a Psicologia Comparada e 0 a Fisiologia Antropologica 
(FJ.J. BUYTENDIJK, 1887-1974),0 a concep<;ao holistica do or-
ganismo (KURT GOLDSTEIN, 1978-1965).0 impacto maior tem 
sido entre os psiquiatras como, para nos atermos apenas a dois 
expoentes, LUDWIG BINSWANGWER (1881-1956) e M:=DARD 
BOSS (1903- ), que fundaram seus pr6prios metodos de analise 
terapeutica. 
Do outro lade do Atlantico, a influencia da fenomenologia tem 
sido grande, com destaque para a Universidade de Duquene de 
Pittsburgh, Centro de Pesquisa em Psicologia Fenomenol6gi-
ca, sob 0 impulso de AMADEU GIORGI que publicou um livro 
"Psychology as a human science", em 1970, no qual defende a 
ideia de uma renova<;ao radical da psicologia, sobre bases feno-
menol6gicas. 
E necessario notar que ROLLO MAY, em 1958, ao organizar 
um livro intitulado "Existence: a new dimension in Psychiatry and 
Psychology", desencadeou, nos Estados Unidos, uma influencia 
marcante da Fenomenologia, pois apresentou ao publico ameri-
cano alguns dos principais representantes europeus da aplica-
<;ao da fenomenologia a Psicologia. Ainda nos USA, e importante 
37 
DIFERENCIAL PSICOTERAPEUTICO NA 
FENOMENOLOGIA EXISTENCIAL 
A Fenomenologia e urna corrente filosofica que tem fecunda-
do a Psicologia ja ha alguns anos. Essa presen<;a, usando como 
ponto de partida a data que nos parece mais significativa, co-
me<;ou no dominio da Psicopatologia quando, em 1913, 0 psi-
quiatra e filosofo KARL JASPERS (1883-1969) escreveu a sua 
Psicopatologia Geral. De la ate hoje, esse impacto tem crescido 
e provocado uma grande fecundidade, atingindo varios dominios, 
como 0 a Psicologia Experimental (ALBERT MICHOTTE 1881-
1965), 0 a Psicologia Comparada e 0 a Fisiologia Antropologica 
(FJ.J. BUYTENDIJK, 1887-1974),0 a concep<;ao holistica do or-
ganismo (KURT GOLDSTEIN, 1978-1965).0 impacto maior tem 
sido entre os psiquiatras como, para nos atermos apenas a dois 
expoentes, LUDWIG BINSWANGWER (1881-1956) e M:=DARD 
BOSS (1903- ), que fundaram seus pr6prios metodos de analise 
terapeutica. 
Do outro lade do Atlantico, a influencia da fenomenologia tem 
sido grande, com destaque para a Universidade de Duquene de 
Pittsburgh, Centro de Pesquisa em Psicologia Fenomenol6gi-
ca, sob 0 impulso de AMADEU GIORGI que publicou um livro 
"Psychology as a human science", em 1970, no qual defende a 
ideia de uma renova<;ao radical da psicologia, sobre bases feno-
menol6gicas. 
E necessario notar que ROLLO MAY, em 1958, ao organizar 
um livro intitulado "Existence: a new dimension in Psychiatry and 
Psychology", desencadeou, nos Estados Unidos, uma influencia 
marcante da Fenomenologia, pois apresentou ao publico ameri-
cano alguns dos principais representantes europeus da aplica-
<;ao da fenomenologia a Psicologia. Ainda nos USA, e importante 
37 
destacar, 0 surgimento d9 Journal of Phenomenological Psycho-
logy dirigido por A. GIORGI (Pittsburgh), K. GRAUMANN (Hei-
delberg) e G. THINES (Louvain), representantes dos principais 
centr~s nascentes da Fenomenologia. 
A partir desse inicio, que alguns pesquisadores olhavam com 
uma certa desconfian<;a, a Fenomenologia tem side uma corrente 
filos6fica de grande fecundidade na psicologia. Para ter-se uma 
ideia da amplitude desse impacto, cito 0 livro de H. SPEIGELBERG 
"Phenomenology in the Psychiatrie and Psychology". 
Diante desse breve quadro, gostaria agora de destacar e 
salientar nesta apresenta<;80, 0 impacto da Fenomenologia na 
Psicoterapia, destacando 0 diferencial psicoterapico na Fenome-
nologia Existencial. Assim, dividirei 0 trabalho em tres partes: A 
rela<;80 entre a Fenomenologia e a Psicologia; A especificidade 
da psicoterapia; a atitude fenomenol6gica na Psicoterapia. 
I - FENOMENOLOGIA E PSICOLOGIA 
A Fenomenologia surge no inicio do seculo com HUSSERL 
(1859-1938), cujo grande ideal era de encontrar uma base s61ida 
para a ciencia, fazendo para isso uma critica ao psicologismo 
que veio a constituir um poderoso metodo de investiga<;80. Ri-
coeur explicita que "a fenomenologia e um vasto projeto que se 
fecha sobre uma obra ou um grupo de obras precisas; ela e me-
nos uma doutrina e mais um metodo, capaz de encarna<;oes mul-
~" tiplas, e, dela, HUSSERL explorou somente um pequeno numero 
~' 
f 
de possibilidades".44 Dai a necessidade de observar, as vezes, 0 
modo como certos autores aplicaram 0 metodo fenomenologico a 
[ , diversos temas e problemas humanos - como fizeram os filosofos I existencialistas - para captarmos a especificidade da abordagem 
t; fenomenol6gica. 
t,------
I,,
:":', ' .4 RICOEUR, p, Husserl (1859-1938) em L"I~cole de la PhenomEmologie. Paris, Librairie 
Urui, 1986, p.8. 
38 
Muitas vezes, aprendemos 0 que e a Fenomenologia, obser-
vando a maneira pala qual alguns autores e pesquisadores utili-
zam 0 seu metodo de investiga<;80. 
A Fenomenologia apresenta-se como um metodo de abordar 
a realidade diferente do metodo das ciencias naturais, qu~ visam 
a entender 0 seu objeto por meio de explica<;oes forma is. Aqui, a 
novidade esta, em que 0 fenomenologo busca compreender as ra-
zoes que suscitam determinada atitude. DARTIGUES define, com 
precis80, que "compreender um comportamento e percebe-Io, por 
assim dizer, do interior, do ponto de vista da inten<;80 que 0 anun-
cia, logo, naquilo que 0 torna propriamente humane e 0 distingue 
deum movimento fisico".45 
Ora, a Fenomenologia e um metodo compreensivo, pois busca 
explicitar a inten<;80 especifica do "visada" ( a maneira de como 
o homem dirige sua aten<;80 implicada na percep<;80 ) que cada 
ser humano tem ao entender algo. Como exemplo, podemos dizer 
que duas pessoas, um viajante e um madeireiro olham de maneira 
diferente uma mesma arvore. 0 primeiro mira a arvore como algo 
que Ihe servirc~ como alivio para 0 cansa<;o da caminhada fatigan-
te, enquanto 0 segundo olhara a arvore na perspectiva de que ela 
possa oferecer-Ihe umamadeira de qualidade para a fabrica<;80 
de um m6ve!. A inten<;80, ao abordar a arvore, e completamente 
diferente e, e a capta<;80 dessa intencionalidade, desse sentido 
orientador, que e a tarefa da fenomenologia. 
Captar, na sua profundidade, a re!a<;80 especifica entre 0 ob-
jeto "visto" e 0 sujeito que visa ao objeto e 0 desafio primordial 
de uma abordagem fenomenologica. VAN DER LEEUW explicita 
que a Fenomenologia procura captar 0 fenomeno, definindo-o da 
seguinte maneira: "fenomeno e, por sua vez, urn objeto que se 
refere ao sujeito e um sujeito em rela<;80 ao objeto. Com isso, nao 
s~ quer dizer que 0 sujeito sofreria alguma apropria<;80 por parte 
45 DARTIGUES,A. 0 que e fenomenologia? Sao Paulo: Editora Morais, 1992, 33 ed., p. 51. 
39 
destacar, 0 surgimento d9 Journal of Phenomenological Psycho-
logy dirigido por A. GIORGI (Pittsburgh), K. GRAUMANN (Hei-
delberg) e G. THINES (Louvain), representantes dos principais 
centr~s nascentes da Fenomenologia. 
A partir desse inicio, que alguns pesquisadores olhavam com 
uma certa desconfian<;a, a Fenomenologia tem side uma corrente 
filos6fica de grande fecundidade na psicologia. Para ter-se uma 
ideia da amplitude desse impacto, cito 0 livro de H. SPEIGELBERG 
"Phenomenology in the Psychiatrie and Psychology". 
Diante desse breve quadro, gostaria agora de destacar e 
salientar nesta apresenta<;80, 0 impacto da Fenomenologia na 
Psicoterapia, destacando 0 diferencial psicoterapico na Fenome-
nologia Existencial. Assim, dividirei 0 trabalho em tres partes: A 
rela<;80 entre a Fenomenologia e a Psicologia; A especificidade 
da psicoterapia; a atitude fenomenol6gica na Psicoterapia. 
I - FENOMENOLOGIA E PSICOLOGIA 
A Fenomenologia surge no inicio do seculo com HUSSERL 
(1859-1938), cujo grande ideal era de encontrar uma base s61ida 
para a ciencia, fazendo para isso uma critica ao psicologismo 
que veio a constituir um poderoso metodo de investiga<;80. Ri-
coeur explicita que "a fenomenologia e um vasto projeto que se 
fecha sobre uma obra ou um grupo de obras precisas; ela e me-
nos uma doutrina e mais um metodo, capaz de encarna<;oes mul-
~" tiplas, e, dela, HUSSERL explorou somente um pequeno numero 
~' 
f 
de possibilidades".44 Dai a necessidade de observar, as vezes, 0 
modo como certos autores aplicaram 0 metodo fenomenologico a 
[ , diversos temas e problemas humanos - como fizeram os filosofos I existencialistas - para captarmos a especificidade da abordagem 
t; fenomenol6gica. 
t,------
I,,
:":', ' .4 RICOEUR, p, Husserl (1859-1938) em L"I~cole de la PhenomEmologie. Paris, Librairie 
Urui, 1986, p.8. 
38 
Muitas vezes, aprendemos 0 que e a Fenomenologia, obser-
vando a maneira pala qual alguns autores e pesquisadores utili-
zam 0 seu metodo de investiga<;80. 
A Fenomenologia apresenta-se como um metodo de abordar 
a realidade diferente do metodo das ciencias naturais, qu~ visam 
a entender 0 seu objeto por meio de explica<;oes forma is. Aqui, a 
novidade esta, em que 0 fenomenologo busca compreender as ra-
zoes que suscitam determinada atitude. DARTIGUES define, com 
precis80, que "compreender um comportamento e percebe-Io, por 
assim dizer, do interior, do ponto de vista da inten<;80 que 0 anun-
cia, logo, naquilo que 0 torna propriamente humane e 0 distingue 
deum movimento fisico".45 
Ora, a Fenomenologia e um metodo compreensivo, pois busca 
explicitar a inten<;80 especifica do "visada" ( a maneira de como 
o homem dirige sua aten<;80 implicada na percep<;80 ) que cada 
ser humano tem ao entender algo. Como exemplo, podemos dizer 
que duas pessoas, um viajante e um madeireiro olham de maneira 
diferente uma mesma arvore. 0 primeiro mira a arvore como algo 
que Ihe servirc~ como alivio para 0 cansa<;o da caminhada fatigan-
te, enquanto 0 segundo olhara a arvore na perspectiva de que ela 
possa oferecer-Ihe uma madeira de qualidade para a fabrica<;80 
de um m6ve!. A inten<;80, ao abordar a arvore, e completamente 
diferente e, e a capta<;80 dessa intencionalidade, desse sentido 
orientador, que e a tarefa da fenomenologia. 
Captar, na sua profundidade, a re!a<;80 especifica entre 0 ob-
jeto "visto" e 0 sujeito que visa ao objeto e 0 desafio primordial 
de uma abordagem fenomenologica. VAN DER LEEUW explicita 
que a Fenomenologia procura captar 0 fenomeno, definindo-o da 
seguinte maneira: "fenomeno e, por sua vez, urn objeto que se 
refere ao sujeito e um sujeito em rela<;80 ao objeto. Com isso, nao 
s~ quer dizer que 0 sujeito sofreria alguma apropria<;80 por parte 
45 DARTIGUES,A. 0 que e fenomenologia? Sao Paulo: Editora Morais, 1992, 33 ed., p. 51. 
39 
do objeto, ou vice-versa. 0 fenomeno nao e produzido pelo sujei-
to; muito menos corroborado ou demonstrado p~r ele. Toda a sua 
essencia consiste em se mostrar, em se mostrar a "alguem". Logo 
que esse alguem come9a a falar daquilo que se mostra, tem-se a 
fenomenologia".46 
A Fenomenologia apresenta-se, dessa maneira, como urn me-
todo de abordar 0 fenomeno, como uma metodologia da compre-
ensao, e nao da explica9ao. Nao nos interessa, aqui, descrever 
quais sao os procedimentos para se atingir esse objetivo. Isso nos 
levaria muito longe da nossa inten9ao. Queremos, outrossim, des-
tacar que aquilo a que se visa, 0 fenomeno que se mostra, e me-
ramente, 0 entrela9amento do sujeito com urn objeto, por meio da 
intencionalidade. 0 que, em terminologia mais especffica, seria a 
descri9ao direta da diversidade das estruturas noetico-noematicas. 
JEANSON, no seu estudo sobre Fenomenologia, conclui, de 
maneira brilhante, dizendo que 0 "metodo e, em primeiro lugar, urn 
caminho que se abre dentro de uma certa dire9ao, e uma certa 
maneira que se tern de pesquisar, de colocar os problemas, de in-
terrogar 0 mundo e de se interrogar" Y Assim, esse caminho, deve 
ser fecundo, pois nos leva a compreender as coisas. E mais do 
que isso, JEANSON completa um "metodo e, antes de tudo, uma 
atitude ao olhar 0 objeto estudado".4B Assirn seguir os pass os do 
metodo fenomenol6gico e incorporar uma atitude fenomenol6gica. 
Resta-nos, agora, a pergunta: qual e a possibilidade de essa 
postura fenomenol6gica ajudar as ciencias psicol6gicas, estabele-
t cendo um la90 de interliga9ao? 
Essa colabora9ao pode vir de varias maneiras. Uma primeira 
~.' colabora9ao ocorre quando 0 fenomen610go debru9a-se sobre um 
~ 46 VAN DER LEEWW, G. Epilogo do livro "La religion dans son essence et ses 
1(:: manifestations - phenmenologie de la religion". Paris: Payot, 1970, traduc;ao de Erika 
t Louren~ (mimeo). 
[ ,17 JEANSON, F. La phenomenologie. Paris: Editora Tequi, sId., p. 67. 
i:', .8 Ibidem, p. 67. 
~o 
fenomeno, descrevendo-o em sua mais completa concretude, e 0 
psic6!ogo entao verificara quais sao os componentes psicol6gicos 
do fenomeno descrito. Por exemplo, na Psicologia religiosa, pode-
mos ter !.Jma descri9ao do fenomeno da fe, destacando todos os 
elementos observaveis num ate de fe. Num segundo momento, 0 
psic610go destacara os componentes psicol6gicos que daO intellgi-
bilidade ao fenomeno descrito. 
Uma segundacolabora9ao da Fenomenologia e que ela faz 
aparecer, com a sua maneira de ver 0 mundo, categorias novas 
(como, por exemplo, a n09ao de que a consciencia e sempre cons-
ciencia de alguma coisa), e temas novos, por exemplo, quando 
Heidegger aplicou 0 metodo fenomenol6gico no desvelamento do 
DASEIN. Ele, em "Ser e Tempo", mostra 0 processo de desvela-
men~o do ser que nao pode ser estabelecido dedutivamente. Ao 
analisar as caracteristicas do Dasein, 0 seus existenciais, ele vai 
revelando a estrutura profunda, ontol6gica, que constitui 0 homem. 
Com esse trabalho de HEIDEGGER chamado de "Analitica Exis-
tencial", surgem novos temas que podem ajudar os psicologos na 
sua pratica. 
, Existe uma terceira maneira de percebermos a contribui9ao 
da Fenomenologia para a Psicologia, quando essa nova maneira 
de compreender a realidade traz uma nova luz sobre determina-dos problemas enfocados tradicionalmente pela psicologia. Como 
exemplo, podemos citar a n09ao de comportamento. nao mais 
compreendido como uma simples cadeia de reflexo, mas como 
algo que brota de uma intencionalidade, ou seja, "uma maneira 
pela qual 0 homem realiza-se como subjetividade encarnada, um 
projeto em dire9ao ao mundo a partir de uma situa9ao".49 0 autor 
49 DONDEYNE, A. Psychologie et Phenomenologie em, Recherche- et Debats -
Psychologie Moderne et Reflexion chretienne - Cahiers n° 3, Janvier, 1953, Paris, 
Libraire Artheme, Fayard, p. 193. Para 0 referido autor, 0 "comportamento humano 
mesmo que ele se desenrola sobre 0 plano da vida irrefletida (nao consciente) 
apresenta uma estrutur3 noetico-noematica, caracterizada pela imbricatyi30 da noese 
e do noema". 
41 
do objeto, ou vice-versa. 0 fenomeno nao e produzido pelo sujei-
to; muito menos corroborado ou demonstrado p~r ele. Toda a sua 
essencia consiste em se mostrar, em se mostrar a "alguem". Logo 
que esse alguem come9a a falar daquilo que se mostra, tem-se a 
fenomenologia".46 
A Fenomenologia apresenta-se, dessa maneira, como urn me-
todo de abordar 0 fenomeno, como uma metodologia da compre-
ensao, e nao da explica9ao. Nao nos interessa, aqui, descrever 
quais sao os procedimentos para se atingir esse objetivo. Isso nos 
levaria muito longe da nossa inten9ao. Queremos, outrossim, des-
tacar que aquilo a que se visa, 0 fenomeno que se mostra, e me-
ramente, 0 entrela9amento do sujeito com urn objeto, por meio da 
intencionalidade. 0 que, em terminologia mais especffica, seria a 
descri9ao direta da diversidade das estruturas noetico-noematicas. 
JEANSON, no seu estudo sobre Fenomenologia, conclui, de 
maneira brilhante, dizendo que 0 "metodo e, em primeiro lugar, urn 
caminho que se abre dentro de uma certa dire9ao, e uma certa 
maneira que se tern de pesquisar, de colocar os problemas, de in-
terrogar 0 mundo e de se interrogar" Y Assim, esse caminho, deve 
ser fecundo, pois nos leva a compreender as coisas. E mais do 
que isso, JEANSON completa um "metodo e, antes de tudo, uma 
atitude ao olhar 0 objeto estudado".4B Assirn seguir os pass os do 
metodo fenomenol6gico e incorporar uma atitude fenomenol6gica. 
Resta-nos, agora, a pergunta: qual e a possibilidade de essa 
postura fenomenol6gica ajudar as ciencias psicol6gicas, estabele-
t cendo um la90 de interliga9ao? 
Essa colabora9ao pode vir de varias maneiras. Uma primeira 
~.' colabora9ao ocorre quando 0 fenomen610go debru9a-se sobre um 
~ 46 VAN DER LEEWW, G. Epilogo do livro "La religion dans son essence et ses 
1(:: manifestations - phenmenologie de la religion". Paris: Payot, 1970, traduc;ao de Erika 
t Louren~ (mimeo). 
[ ,17 JEANSON, F. La phenomenologie. Paris: Editora Tequi, sId., p. 67. 
i:', .8 Ibidem, p. 67. 
~o 
fenomeno, descrevendo-o em sua mais completa concretude, e 0 
psic6!ogo entao verificara quais sao os componentes psicol6gicos 
do fenomeno descrito. Por exemplo, na Psicologia religiosa, pode-
mos ter !.Jma descri9ao do fenomeno da fe, destacando todos os 
elementos observaveis num ate de fe. Num segundo momento, 0 
psic610go destacara os componentes psicol6gicos que daO intellgi-
bilidade ao fenomeno descrito. 
Uma segundacolabora9ao da Fenomenologia e que ela faz 
aparecer, com a sua maneira de ver 0 mundo, categorias novas 
(como, por exemplo, a n09ao de que a consciencia e sempre cons-
ciencia de alguma coisa), e temas novos, por exemplo, quando 
Heidegger aplicou 0 metodo fenomenol6gico no desvelamento do 
DASEIN. Ele, em "Ser e Tempo", mostra 0 processo de desvela-
men~o do ser que nao pode ser estabelecido dedutivamente. Ao 
analisar as caracteristicas do Dasein, 0 seus existenciais, ele vai 
revelando a estrutura profunda, ontol6gica, que constitui 0 homem. 
Com esse trabalho de HEIDEGGER chamado de "Analitica Exis-
tencial", surgem novos temas que podem ajudar os psicologos na 
sua pratica. 
, Existe uma terceira maneira de percebermos a contribui9ao 
da Fenomenologia para a Psicologia, quando essa nova maneira 
de compreender a realidade traz uma nova luz sobre determina-
dos problemas enfocados tradicionalmente pela psicologia. Como 
exemplo, podemos citar a n09ao de comportamento. nao mais 
compreendido como uma simples cadeia de reflexo, mas como 
algo que brota de uma intencionalidade, ou seja, "uma maneira 
pela qual 0 homem realiza-se como subjetividade encarnada, um 
projeto em dire9ao ao mundo a partir de uma situa9ao".49 0 autor 
49 DONDEYNE, A. Psychologie et Phenomenologie em, Recherche- et Debats -
Psychologie Moderne et Reflexion chretienne - Cahiers n° 3, Janvier, 1953, Paris, 
Libraire Artheme, Fayard, p. 193. Para 0 referido autor, 0 "comportamento humano 
mesmo que ele se desenrola sobre 0 plano da vida irrefletida (nao consciente) 
apresenta uma estrutur3 noetico-noematica, caracterizada pela imbricatyi30 da noese 
e do noema". 
41 
quer dizer que, para compreendermos a rela<;ao do homem e de 
seu mundo, sera neces~ario abandonar as categorias base ad as 
na caL.:salidade natural e ate mesmo a perspectiva do paralelismo 
psicofisiol6gico. E necessario urn outro olhar sobre a realidade. 
Para uma melhor compreensao do impacto da fenomenologia 
na psicologia e necessario lembrar que a concep<;ao de Fenome-
nologia nao foi colocada por HUSSERL, de maneira acabada, em 
sua obra Investiga<;oes L6gicas (1900-1901). 0 termo sofre uma 
evolu9ao ao longo do pensamento husserliano. Os estudiosos de 
HUSSERL, especial mente VAN BREDA, responsavel por haver le-
vado os escritos de HUSSERL para LOllvain, a salvo da ascensao 
nazista, distingue duas grandes concep90es de Fenomenologia no 
pensamento deste. A primeira concep9ao define a "Fenomenolo-
gia como uma ciencia filos6fica propedeutica, que tern como objeto 
a descri9ao das essencias fundamentais para uma problematica 
filos6fica dada".50 A segunda concep9ao, que se desenvolveu a 
partir dos escritos de 1907 "Ideias para uma Fenomenologia" e de 
1013 "Ideias diretrizes para uma fenomenologia pura e uma filo-
sofia fenomenol6gica", proclama a Fenomenologia incumbida da 
seguinte tarefa: "redescobrir a genese intencional da consciencia 
e os passos constitutivos que esta poe em movimento".51 
HOje, quando falamos que um pensador e influenciado pel a 
Fenomenologia, devemos ter 0 cuidado de detectar qual e a con-
cep9ao fenomenol6gica que tem como ponto de partida e que esta 
subjacente a todo 0 seu trabalho te6rico, pois nao se pode exigir, 
de urn estudo, algo que ele nao pode dar, de vez que seu ponto 
de partida esta limitado a uma concep9ao ainda precaria, e nao 
~. . total mente desenvolvida. Como exemplo, podemos dizer que a 
~ primeira concep9ao influenciou um grande numero de psic610gos, 
t~,:".'.;.' psiquiatras e criticos de artes, entre os quais podemos citar JAS-
. ,50 VAN BREDA, H.L. La phenomE!nologie, em Les Courrants Philosophiques, v. III, p. 
423. Infelizmente sem data e referencia editorial. 
. 51 Idem, p. 421. 
42 
PERS, 0 primeiro que trouxe essa concep<;ao para 0 dominic da 
psicopatologia. A segunda concep<;30, mais fecunda, tern influen-
ciado muitos fil6sofos e psiquiatras, e podemos citar, no pensa-
mento frances, SARTRE, MERLEAU-PONTY e RICOEU~. Entre 
os psiquiatras, talvez os mais conhecidos do publico brasileiro, 
podemos citar VAN DEN BERG, com 0 seu livro "0 Paciente Psi-
quiatrico" e Binswanger, com 0 livro "As tres formas de Existencia 
malograda". 
II - A ESPECIFICIDADE DA PSICOTERAPIA 
o segundo ponto da nossa reflexao e clarearmos a especifici-
dade de um trabalho terapeutico para no ultimo momento, mostrar 
como a Fenomenologia pode Ian gar uma nova luz na tarefa sem-
pre ardua do clinico-terapeuta. 
A explicita9ao do que seja psicoterapia com ega com a caracte-
rizagao de que essa atividade do psic610go e uma pratica clinica, e 
que tern como objeto 0 ser humano. 0 objeto que se impoe a aten-
9ao do terapeuta eo sofrimento do ser humano.0 que sustentara 
a pratica clinica serao os conflitos e os problemas que a pessoa 
humana trouxer para a psicoterapia. As questoes existenciais sub-
jacentes aos conflitos e que devem alimentar a a9ao do terapeuta. 
Por outr~ lado, essa a9ao terapeutica tern muitas especifici-
dades e caracteristicas que a diferenciam de outra atividade do 
psicologo, constituindo-a como uma atividade profissional, isto e, 
uma atividade que exige uma forma9ao, seja ela de cunho te6rico 
ou pratico. A primeira especificidade dessa interven<;ao e que ela 
e .curativa e nao preventiva, uma vez que quando alguem busca 
terapia, e para tratar de urn determinado problema ou questao que 
esta gerando urn sofrimento do qual a pessoa nao e capaz de sair 
sozinha. E curativa no sentido de proporcionar ao "cliente" instru-
mentos capazes de enfrentar 0 conflito que esta vivendo. Seria 
preventiva se a interven9ao ocorresse antes do conflito manifestar-
43 
quer dizer que, para compreendermos a rela<;ao do homem e de 
seu mundo, sera neces~ario abandonar as categorias base ad as 
na caL.:salidade natural e ate mesmo a perspectiva do paralelismo 
psicofisiol6gico. E necessario urn outro olhar sobre a realidade. 
Para uma melhor compreensao do impacto da fenomenologia 
na psicologia e necessario lembrar que a concep<;ao de Fenome-
nologia nao foi colocada por HUSSERL, de maneira acabada, em 
sua obra Investiga<;oes L6gicas (1900-1901). 0 termo sofre uma 
evolu9ao ao longo do pensamento husserliano. Os estudiosos de 
HUSSERL, especial mente VAN BREDA, responsavel por haver le-
vado os escritos de HUSSERL para LOllvain, a salvo da ascensao 
nazista, distingue duas grandes concep90es de Fenomenologia no 
pensamento deste. A primeira concep9ao define a "Fenomenolo-
gia como uma ciencia filos6fica propedeutica, que tern como objeto 
a descri9ao das essencias fundamentais para uma problematica 
filos6fica dada".50 A segunda concep9ao, que se desenvolveu a 
partir dos escritos de 1907 "Ideias para uma Fenomenologia" e de 
1013 "Ideias diretrizes para uma fenomenologia pura e uma filo-
sofia fenomenol6gica", proclama a Fenomenologia incumbida da 
seguinte tarefa: "redescobrir a genese intencional da consciencia 
e os passos constitutivos que esta poe em movimento".51 
HOje, quando falamos que um pensador e influenciado pel a 
Fenomenologia, devemos ter 0 cuidado de detectar qual e a con-
cep9ao fenomenol6gica que tem como ponto de partida e que esta 
subjacente a todo 0 seu trabalho te6rico, pois nao se pode exigir, 
de urn estudo, algo que ele nao pode dar, de vez que seu ponto 
de partida esta limitado a uma concep9ao ainda precaria, e nao 
~. . total mente desenvolvida. Como exemplo, podemos dizer que a 
~ primeira concep9ao influenciou um grande numero de psic610gos, 
t~,:".'.;.' psiquiatras e criticos de artes, entre os quais podemos citar JAS-
. ,50 VAN BREDA, H.L. La phenomE!nologie, em Les Courrants Philosophiques, v. III, p. 
423. Infelizmente sem data e referencia editorial. 
. 51 Idem, p. 421. 
42 
PERS, 0 primeiro que trouxe essa concep<;ao para 0 dominic da 
psicopatologia. A segunda concep<;30, mais fecunda, tern influen-
ciado muitos fil6sofos e psiquiatras, e podemos citar, no pensa-
mento frances, SARTRE, MERLEAU-PONTY e RICOEU~. Entre 
os psiquiatras, talvez os mais conhecidos do publico brasileiro, 
podemos citar VAN DEN BERG, com 0 seu livro "0 Paciente Psi-
quiatrico" e Binswanger, com 0 livro "As tres formas de Existencia 
malograda". 
II - A ESPECIFICIDADE DA PSICOTERAPIA 
o segundo ponto da nossa reflexao e clarearmos a especifici-
dade de um trabalho terapeutico para no ultimo momento, mostrar 
como a Fenomenologia pode Ian gar uma nova luz na tarefa sem-
pre ardua do clinico-terapeuta. 
A explicita9ao do que seja psicoterapia com ega com a caracte-
rizagao de que essa atividade do psic610go e uma pratica clinica, e 
que tern como objeto 0 ser humano. 0 objeto que se impoe a aten-
9ao do terapeuta eo sofrimento do ser humano. 0 que sustentara 
a pratica clinica serao os conflitos e os problemas que a pessoa 
humana trouxer para a psicoterapia. As questoes existenciais sub-
jacentes aos conflitos e que devem alimentar a a9ao do terapeuta. 
Por outr~ lado, essa a9ao terapeutica tern muitas especifici-
dades e caracteristicas que a diferenciam de outra atividade do 
psicologo, constituindo-a como uma atividade profissional, isto e, 
uma atividade que exige uma forma9ao, seja ela de cunho te6rico 
ou pratico. A primeira especificidade dessa interven<;ao e que ela 
e .curativa e nao preventiva, uma vez que quando alguem busca 
terapia, e para tratar de urn determinado problema ou questao que 
esta gerando urn sofrimento do qual a pessoa nao e capaz de sair 
sozinha. E curativa no sentido de proporcionar ao "cliente" instru-
mentos capazes de enfrentar 0 conflito que esta vivendo. Seria 
preventiva se a interven9ao ocorresse antes do conflito manifestar-
43 
-se, 0 que, em alguns ca~os, pode ocorrer, mas nao e habitual na 
psicoterapia. 
Uma segunda caracteristica que mostra a especificidade da 
psicoterapia e 0 fato de que a interven9ao do profissional chamado 
a atuar e uma interven9ao psicologica, e nao medi::;a. Normalmen-
te, 0 medico usa de agentes quimicos para sustentar a sua a9ao, 
e sua interven9ao acaba sendo feita no organismo, com conse-
qO€mcias para a vida do paciente. A interven9ao do psicologo deve 
ser uma interven9ao nao medicamentosa e no nivel psicologico. A 
questao que fica e: 0 que e 0 psicologico no ser humane para po-
dermos delimitar sua area especifica de a9ao? Essa e uma ques-
tao complexa, que exigiria a explicit9ao dos dois eixos constituin-
tes do psiquismo. 
A terceira caracteristica e que a interven9ao da-se numa rela-
9aO de intimidade, isto e, numa rela9ao intersubjetiva. BUCHER 
diz 0 seguinte: "Na rela9ao psicoterapica, nao ha instrumentos ou 
agentes: esta rela9ao nao e mediatizada p~r nenhum intermedia-
rio. Seu unico meio e 0 ambiente humane em si, numa configura-
9ao muito especial que e aquela do dialogo humano, da conversa, 
onde nao intervem outras for9as alem da linguagem".52 0 dialogo 
e 0 caminho p~r meio do qual se cria a intimidade entre duas pes-
soas, para que 0 trabalho terapeutico seja desenvolvido. BUCHER 
completa: "so existe compreensao intersubjetiva se, nos dialogos 
ou "comunica90es" que travamos, 0 sentido das palavras, n090es 
e locu90es utilizadas for esclarecido, a respeito das suas implica-
90es, pressupostos e alcances".53 
Finalmente, a ultima caracteristica que nos ajuda a entender 
o que seja a psicoterapia, enos perguntarmos quais sao os ins-
g trumentos que 0 psicologo possui para construir a rela9ao de in-
t· timidade e ajudar 0 hornem a encontrar um alivio para os seus 
R W. 52 BUCHER, R. A psicoterapia pela fala. Sao Paulo: EPU, 1989, p. 27. 
53 Idem, p. 32. 
44 
sofrimentos. E somente a fala que 0 terapeuta tem ao seu alcance. 
Assim, BUCHER diz: "Psicoterapia refere-se, portanto, a um modo 
muito particular de encarar 0 ser humane e, por conseguinte, os 
processos de interven9ao terapeutica, possibilitados entre duas 
(ou mais) pessoas pela mera a9ao da fala".54 
Aqui, quando explicitamos essas ca~acteristicas, tlnhamos em 
mente um tipo de psicoterapia. E a abordagem intitulada Dasein-
sana/yse, ou Analise Existencial, desenvolvida por BINSWANGER, 
um psiquiatra SUi90, que define 0 fundarT1ento ultimo da psicotera-
pia da seguinte maneira: "A possibilidade da psicoterapia nao re-
pousa sobre um segredo ou um misterio, como se poderia pensar, 
nem sobre nada de novo ou inabitual, mas, ao contrario, sobre 
um tra90 fundamental da estrutura do ser humane como ser-no-
-mundo (Heidegger) ser com e para 0 outre".55 
Essa abordagem criada por BINSWANGER tem como base a 
fenomenologia e a analitica existencial de HEIDEGGER, no seu 
livre "Ser e Tempo", e a psicoterapia, dentre dessa perspectiva, 
deve ajudar a compreender a estruturaexistencial. BUCHER co-
mentando BINSWANGER, diz 0 seguinte: "A "estrutura existencial" 
(Daseins-Struktur) nao deve ser entendida num sentido estatico, 
mas como uma realidade em permanente transforma9ao. Uma 
psicoterapia de base daseinsana/itica, insiste BINSWANGER, in-
vestiga a historia de vida do paciente "como qualquer outr~ metodo 
psicoterapico, porem de um modo total mente proprio", pelo fato de 
nao explica-Ia nas suas altera90es patologicas, segundo a doutri-
na de uma escola psicoterapica particular: ela a entende "como a 
muta9ao da estrutura global do ser-no-mundo".56 
Essa nova abordagem em psicoterapia prova haver uma nova 
luz nos metodos ate entao vigentes na psicologia clini--: 3. Embora 
54 Idem, p. 27 
55 BINSWANGER, L. De la Psychotherapie in Introduction it i'analyse existencielie. 
Paris: Editions de Minuit, 1971, p. 122. 
56 BUCHER, R., op. cit., p. 31. 
45 
-se, 0 que, em alguns ca~os, pode ocorrer, mas nao e habitual na 
psicoterapia. 
Uma segunda caracteristica que mostra a especificidade da 
psicoterapia e 0 fato de que a interven9ao do profissional chamado 
a atuar e uma interven9ao psicologica, e nao medi::;a. Normalmen-
te, 0 medico usa de agentes quimicos para sustentar a sua a9ao, 
e sua interven9ao acaba sendo feita no organismo, com conse-
qO€mcias para a vida do paciente. A interven9ao do psicologo deve 
ser uma interven9ao nao medicamentosa e no nivel psicologico. A 
questao que fica e: 0 que e 0 psicologico no ser humane para po-
dermos delimitar sua area especifica de a9ao? Essa e uma ques-
tao complexa, que exigiria a explicit9ao dos dois eixos constituin-
tes do psiquismo. 
A terceira caracteristica e que a interven9ao da-se numa rela-
9aO de intimidade, isto e, numa rela9ao intersubjetiva. BUCHER 
diz 0 seguinte: "Na rela9ao psicoterapica, nao ha instrumentos ou 
agentes: esta rela9ao nao e mediatizada p~r nenhum intermedia-
rio. Seu unico meio e 0 ambiente humane em si, numa configura-
9ao muito especial que e aquela do dialogo humano, da conversa, 
onde nao intervem outras for9as alem da linguagem".52 0 dialogo 
e 0 caminho p~r meio do qual se cria a intimidade entre duas pes-
soas, para que 0 trabalho terapeutico seja desenvolvido. BUCHER 
completa: "so existe compreensao intersubjetiva se, nos dialogos 
ou "comunica90es" que travamos, 0 sentido das palavras, n090es 
e locu90es utilizadas for esclarecido, a respeito das suas implica-
90es, pressupostos e alcances".53 
Finalmente, a ultima caracteristica que nos ajuda a entender 
o que seja a psicoterapia, enos perguntarmos quais sao os ins-
g trumentos que 0 psicologo possui para construir a rela9ao de in-
t· timidade e ajudar 0 hornem a encontrar um alivio para os seus 
R W. 52 BUCHER, R. A psicoterapia pela fala. Sao Paulo: EPU, 1989, p. 27. 
53 Idem, p. 32. 
44 
sofrimentos. E somente a fala que 0 terapeuta tem ao seu alcance. 
Assim, BUCHER diz: "Psicoterapia refere-se, portanto, a um modo 
muito particular de encarar 0 ser humane e, por conseguinte, os 
processos de interven9ao terapeutica, possibilitados entre duas 
(ou mais) pessoas pela mera a9ao da fala".54 
Aqui, quando explicitamos essas ca~acteristicas, tlnhamos em 
mente um tipo de psicoterapia. E a abordagem intitulada Dasein-
sana/yse, ou Analise Existencial, desenvolvida por BINSWANGER, 
um psiquiatra SUi90, que define 0 fundarT1ento ultimo da psicotera-
pia da seguinte maneira: "A possibilidade da psicoterapia nao re-
pousa sobre um segredo ou um misterio, como se poderia pensar, 
nem sobre nada de novo ou inabitual, mas, ao contrario, sobre 
um tra90 fundamental da estrutura do ser humane como ser-no-
-mundo (Heidegger) ser com e para 0 outre".55 
Essa abordagem criada por BINSWANGER tem como base a 
fenomenologia e a analitica existencial de HEIDEGGER, no seu 
livre "Ser e Tempo", e a psicoterapia, dentre dessa perspectiva, 
deve ajudar a compreender a estrutura existencial. BUCHER co-
mentando BINSWANGER, diz 0 seguinte: "A "estrutura existencial" 
(Daseins-Struktur) nao deve ser entendida num sentido estatico, 
mas como uma realidade em permanente transforma9ao. Uma 
psicoterapia de base daseinsana/itica, insiste BINSWANGER, in-
vestiga a historia de vida do paciente "como qualquer outr~ metodo 
psicoterapico, porem de um modo total mente proprio", pelo fato de 
nao explica-Ia nas suas altera90es patologicas, segundo a doutri-
na de uma escola psicoterapica particular: ela a entende "como a 
muta9ao da estrutura global do ser-no-mundo".56 
Essa nova abordagem em psicoterapia prova haver uma nova 
luz nos metodos ate entao vigentes na psicologia clini--: 3. Embora 
54 Idem, p. 27 
55 BINSWANGER, L. De la Psychotherapie in Introduction it i'analyse existencielie. 
Paris: Editions de Minuit, 1971, p. 122. 
56 BUCHER, R., op. cit., p. 31. 
45 
todo 0 esfon/o de BINSWANGER tenha side 0 de dar uma base 
cienUfica a Psiquiatria, sua contribuic;ao extrapolou 0 mundo da 
medicina e fecundou 0 campo da psicoterapia. Assim, podemos 
dizer, a Daseinsanalyse busca superar a antiga separac;ao que ha-
via na medicina entre 0 medico e 0 c1iente. "A Fenomenologia, bem 
como a terapia existencial, prop6e-se a superar a dicotomia que 
impregna 0 racionalismo da filosofia ocidental com respeito a cisao 
entre sujeito e objeto". 57 
III - A atitude fenomenol6gica em psicoterapia 
Nessa parte de nosso trabalho, e necessario reafirmar, como 
dissemos acima, que, ao seguir 0 metodo fenomenol6gico, 0 psi-
coterapeuta esta-se imbuindo de uma atitude, pois assume os 
pressupostos do metodo. Assim, nao vai explicitar todos os passos 
do metodo fenomenol6gico, mas tirar algumas conseqOencias do 
que significa uma adesao a abordagem fenomenol6gica. 
A primeira observac;ao de que se utiliza a Fenomenologia no 
seu trabalho c1inico pode ser expressa pelas palavrns de RUDIO, 
quando afirma que a base do processo terapeutico e 0 fenomeno. 
"A base que 0 fenomenologista realiza como terapeuta nao se en-
contra nos "fatos", mas nos "fenomenos" que Ihe sao transmitidos 
pelo relato do c1iente. Conhecer e compreender 0 "mundo interior" 
do c1iente e conhecer e compreender os fenomenos que povoam a 
sua consciencia, tal como ele os conhece, compreende e sente".58 
Isto quer dizer que a Fenomenologia estuda os fenomenos, e que 
a atitude do terapeuta de inspirac;ao fenomenologista e de buscar 
compreender 0 fenomeno. 
Outra consequencia: 0 terapeuta fenomenol6gico deve ficar 
atento aos fenomenos da consciencia, que se produzem na cons-
ciencia do c1iente, pois este esta implicado na produc;ao do feno-
meno, ele e 0 autor do fenomeno da consciencia. RUDIO define 
. ,------
~1 Idem, p, 30, 
~. RUDIO, F.v. Dialogo MaiI!Jutico e psicoterapia existencial. Sao Jose dos Campos, 
Novos Horizontes Editora, 1998, p. 130. 
46 
fenomeno dizendo que "a palavra "fen6meno". de origem grega. 
quer dizer etimologicamente "0 que aparece". Significa aquilo que 
e percebido pelos sentidos e que se revela (aparece) a conscien-
cia quando esta entra em contato com a realidade. Consiste, e ver-
dade, na apreensao imediata, nao-reflexiva, da realidade, mas in-
clui tambem, nela, as significac;6es e avaliac;6es que sao atribuidas 
naturalmente pelo individuo ao que apreende".59 Assirr" entender 
os fenomenos produzidos pelo cliente e desvelar 0 sentido que ele 
atribui quando entra em contato com a realidade. Se tal contato e 
sofrivel e me faz sentir um certo incomodo, eu 0 experimento como 
doloroso. ° sentido de doloroso e, portanto, a inten9ao segundo a 
qual eu vivo 0 doloroso. Nessa perspectiva, podemos entender a 
observac;ao de RUDIO, quando diz: "Um ponto fundamental para 0 
fenomenologista e que 0 comportamento do individuo nao e uma 
reac;ao a realidade como tal, mas sim ao significado que ele atri-
bui a ela. Quer dizer, 0 individuo se comporta como resposta ao 
significado que ele da ao que existe".60 Assim, "explicitar um com-
portamento e desvelar a maneirade ser do sujeito, isto e, possibi-
litar que esse sujeito reviva 0 sentido que esta subjacente ao seu 
comportamento" .61 
Surge, entao, a seguinte pergunta: 0 que um terapeuta feno-
menol6gico deve fazer com 0 material que emerge na relac;ao te-
rapeutica? "Tudo 0 que ele pode e deve fazer e explorar 0 material 
tao profundamente e cuidadosamente quanto possivel por meio 
da abertura que 0 paciente Ihe deu".62 Para aprofundar 0 material, 
entrariamos, ai, na aplicabilidade dos procedimentos terapeuticos 
de inspirac;ao fenomenol6gica, 0 que nos distanciaria do objetivo 
deste nosso ensaio. 
59 Idem, p. 130. 
60 Idem, p.131 . 
61 JEANSON, F., op. cit., p. 73. 
62 MARTINS, J. Contribuic;ao da Fenomenologia a Psicologia Clinica, em Forshieri, Y.C. 
(Orgs.). Fenomenologia e Psicologia. Sao Paulo: Cortez e Morais, 1984, p. 141. 
47 
todo 0 esfon/o de BINSWANGER tenha side 0 de dar uma base 
cienUfica a Psiquiatria, sua contribuic;ao extrapolou 0 mundo da 
medicina e fecundou 0 campo da psicoterapia. Assim, podemos 
dizer, a Daseinsanalyse busca superar a antiga separac;ao que ha-
via na medicina entre 0 medico e 0 c1iente. "A Fenomenologia, bem 
como a terapia existencial, prop6e-se a superar a dicotomia que 
impregna 0 racionalismo da filosofia ocidental com respeito a cisao 
entre sujeito e objeto". 57 
III - A atitude fenomenol6gica em psicoterapia 
Nessa parte de nosso trabalho, e necessario reafirmar, como 
dissemos acima, que, ao seguir 0 metodo fenomenol6gico, 0 psi-
coterapeuta esta-se imbuindo de uma atitude, pois assume os 
pressupostos do metodo. Assim, nao vai explicitar todos os passos 
do metodo fenomenol6gico, mas tirar algumas conseqOencias do 
que significa uma adesao a abordagem fenomenol6gica. 
A primeira observac;ao de que se utiliza a Fenomenologia no 
seu trabalho c1inico pode ser expressa pelas palavrns de RUDIO, 
quando afirma que a base do processo terapeutico e 0 fenomeno. 
"A base que 0 fenomenologista realiza como terapeuta nao se en-
contra nos "fatos", mas nos "fenomenos" que Ihe sao transmitidos 
pelo relato do c1iente. Conhecer e compreender 0 "mundo interior" 
do c1iente e conhecer e compreender os fenomenos que povoam a 
sua consciencia, tal como ele os conhece, compreende e sente".58 
Isto quer dizer que a Fenomenologia estuda os fenomenos, e que 
a atitude do terapeuta de inspirac;ao fenomenologista e de buscar 
compreender 0 fenomeno. 
Outra consequencia: 0 terapeuta fenomenol6gico deve ficar 
atento aos fenomenos da consciencia, que se produzem na cons-
ciencia do c1iente, pois este esta implicado na produc;ao do feno-
meno, ele e 0 autor do fenomeno da consciencia. RUDIO define 
. ,------
~1 Idem, p, 30, 
~. RUDIO, F.v. Dialogo MaiI!Jutico e psicoterapia existencial. Sao Jose dos Campos, 
Novos Horizontes Editora, 1998, p. 130. 
46 
fenomeno dizendo que "a palavra "fen6meno". de origem grega. 
quer dizer etimologicamente "0 que aparece". Significa aquilo que 
e percebido pelos sentidos e que se revela (aparece) a conscien-
cia quando esta entra em contato com a realidade. Consiste, e ver-
dade, na apreensao imediata, nao-reflexiva, da realidade, mas in-
clui tambem, nela, as significac;6es e avaliac;6es que sao atribuidas 
naturalmente pelo individuo ao que apreende".59 Assirr" entender 
os fenomenos produzidos pelo cliente e desvelar 0 sentido que ele 
atribui quando entra em contato com a realidade. Se tal contato e 
sofrivel e me faz sentir um certo incomodo, eu 0 experimento como 
doloroso. ° sentido de doloroso e, portanto, a inten9ao segundo a 
qual eu vivo 0 doloroso. Nessa perspectiva, podemos entender a 
observac;ao de RUDIO, quando diz: "Um ponto fundamental para 0 
fenomenologista e que 0 comportamento do individuo nao e uma 
reac;ao a realidade como tal, mas sim ao significado que ele atri-
bui a ela. Quer dizer, 0 individuo se comporta como resposta ao 
significado que ele da ao que existe".60 Assim, "explicitar um com-
portamento e desvelar a maneira de ser do sujeito, isto e, possibi-
litar que esse sujeito reviva 0 sentido que esta subjacente ao seu 
comportamento" .61 
Surge, entao, a seguinte pergunta: 0 que um terapeuta feno-
menol6gico deve fazer com 0 material que emerge na relac;ao te-
rapeutica? "Tudo 0 que ele pode e deve fazer e explorar 0 material 
tao profundamente e cuidadosamente quanto possivel por meio 
da abertura que 0 paciente Ihe deu".62 Para aprofundar 0 material, 
entrariamos, ai, na aplicabilidade dos procedimentos terapeuticos 
de inspirac;ao fenomenol6gica, 0 que nos distanciaria do objetivo 
deste nosso ensaio. 
59 Idem, p. 130. 
60 Idem, p.131 . 
61 JEANSON, F., op. cit., p. 73. 
62 MARTINS, J. Contribuic;ao da Fenomenologia a Psicologia Clinica, em Forshieri, Y.C. 
(Orgs.). Fenomenologia e Psicologia. Sao Paulo: Cortez e Morais, 1984, p. 141. 
47 
Gostaria, ainda de ~izer que a psicoterapia e um lugar muito 
especial onde se da um encontro entre pessoas, entre um terapeu-
ta que se abre para escutar 0 cliente, e um cliente que, sofrendo, 
abre-se, verbalizando 0 que 0 incomoda. A "fenomenologia propi-
cia-nos uma compreens13o mais pertinente desses processos, a 
partir da sua analise do Dasein (ou ser-no-mundo), da intersubje-
tividade, da linguagem e das significa90es especificamente huma-
nas da existemcia".63 
E, para finalizar, gostaria de dizer que uma PSicoterapia Exis-
tencial de inspira9130 fenomenol6gica n130 deve ser, em nenhuma 
hip6tese, uma teoria sobre 0 ser humano, mas, muito pelo contra-
rio, deve ser um estudo aprofundado sobre 0 seu existir concreto. 
63 BUCHER, R., op. cit., pp. 27-28. 
48 
FUNDAMENTA<;AO ANTROPOLOGICA DA 
pRA TICA PSICOTEAAPICA64 
INTRODUC;AO 
Quando pensamos em pratica cllnica, vem-nos ao pensamen-
to um tipo de interven9130 "curativa", ist6 e, na maioria das vezes, 
imaginamos uma a9130 de tratamento que visa "reparar" algo no 
ser humano. Esse tipo de raciocfnio e sustentado pelo fato de que, 
por um lado, a pessoa busca, no psicoterapeuta, uma ajuda que 
Ihe possibilite sair do impasse existencial em sua vida pessoal. A 
expectativa e de que 0 psic610go, com uma interveng130 "magica", 
vai apresentar uma "Iuz no tim do tunel". Por outro lado, 0 terapeu-
ta pensa que, com a aplicag130 de uma "tecnica", a demand a do 
cliente sera prontamente atendida e, mais do que isso, sua ag80 
tera 0 efeito de provocar um "ajustamento" na personalidade pes-
soal, ajustamento esse que provocara uma adaptag130 quase ime-
diata do cliente ao seu contexto social. 
Podemos afirmar que tanto um lado como 0 outr~ partem da 
suposi9130 de que uma interveng80 rapida e cirurgica seria 0 sufi-
ciente para restabelecer 0 equillbrio perdido, 0 qual se manifesta 
por meio do sintoma do cliente. Convem dizer que 0 mais impor-
tante, no tratamento do problema apresentado pelo cliente, me-
diante uma psicoterapia, sera 0 estabelecimento de uma relag130 
inter-humana capaz de ajuda-Io a reestruturar sua vida. 0 tipo de 
intera9130 necessaria para sua terapia fenomenol6gico-existencial 
sera uma rela980 interpessoal subjetiva,65 num contexte em que 
~ Esse artigo foi publicado pela primeira vez em Coletaneas da ANPEPP, v. 1, n. 9, set. 
1996. 
65 Explicitaremos mais tarde a definic;:ao e as caracteristicas dessa relac;:ao, porem 
gostariamos de indicar 0 cap. 4 do livro de BOCHER, R. Psico/erbpia pe/a Fa/a, 
SP, EPU, 1989, em que, mediante uma analise fenomenol6gica, 0 autor apresenta 
os diversos tipos de relac;:oes psicol6gicas e destaca a especialidade da relac;:ao 
terapeutica. 
49 
Gostaria, ainda de ~izer que a psicoterapia e um lugar muito 
especial onde se da um encontro entre pessoas, entre um terapeu-
ta que se abre para escutar 0 cliente, e um cliente que, sofrendo, 
abre-se, verbalizando 0 que 0 incomoda. A "fenomenologia propi-
cia-nos uma compreens13o mais pertinente desses processos, a 
partir da sua analise do Dasein (ou ser-no-mundo), da intersubje-
tividade, da linguagem e dassignifica90es especificamente huma-
nas da existemcia".63 
E, para finalizar, gostaria de dizer que uma PSicoterapia Exis-
tencial de inspira9130 fenomenol6gica n130 deve ser, em nenhuma 
hip6tese, uma teoria sobre 0 ser humano, mas, muito pelo contra-
rio, deve ser um estudo aprofundado sobre 0 seu existir concreto. 
63 BUCHER, R., op. cit., pp. 27-28. 
48 
FUNDAMENTA<;AO ANTROPOLOGICA DA 
pRA TICA PSICOTEAAPICA64 
INTRODUC;AO 
Quando pensamos em pratica cllnica, vem-nos ao pensamen-
to um tipo de interven9130 "curativa", ist6 e, na maioria das vezes, 
imaginamos uma a9130 de tratamento que visa "reparar" algo no 
ser humano. Esse tipo de raciocfnio e sustentado pelo fato de que, 
por um lado, a pessoa busca, no psicoterapeuta, uma ajuda que 
Ihe possibilite sair do impasse existencial em sua vida pessoal. A 
expectativa e de que 0 psic610go, com uma interveng130 "magica", 
vai apresentar uma "Iuz no tim do tunel". Por outro lado, 0 terapeu-
ta pensa que, com a aplicag130 de uma "tecnica", a demand a do 
cliente sera prontamente atendida e, mais do que isso, sua ag80 
tera 0 efeito de provocar um "ajustamento" na personalidade pes-
soal, ajustamento esse que provocara uma adaptag130 quase ime-
diata do cliente ao seu contexto social. 
Podemos afirmar que tanto um lado como 0 outr~ partem da 
suposi9130 de que uma interveng80 rapida e cirurgica seria 0 sufi-
ciente para restabelecer 0 equillbrio perdido, 0 qual se manifesta 
por meio do sintoma do cliente. Convem dizer que 0 mais impor-
tante, no tratamento do problema apresentado pelo cliente, me-
diante uma psicoterapia, sera 0 estabelecimento de uma relag130 
inter-humana capaz de ajuda-Io a reestruturar sua vida. 0 tipo de 
intera9130 necessaria para sua terapia fenomenol6gico-existencial 
sera uma rela980 interpessoal subjetiva,65 num contexte em que 
~ Esse artigo foi publicado pela primeira vez em Coletaneas da ANPEPP, v. 1, n. 9, set. 
1996. 
65 Explicitaremos mais tarde a definic;:ao e as caracteristicas dessa relac;:ao, porem 
gostariamos de indicar 0 cap. 4 do livro de BOCHER, R. Psico/erbpia pe/a Fa/a, 
SP, EPU, 1989, em que, mediante uma analise fenomenol6gica, 0 autor apresenta 
os diversos tipos de relac;:oes psicol6gicas e destaca a especialidade da relac;:ao 
terapeutica. 
49 
esta se fortalecera por intermedio de um encontro profundo e exis-
tencial, e nao por meio da aplicagao de uma tecnica. 
Assim, 0 presente estudo visa, num primeiro momento, expli-
citar a fundamentagao antropo:6gica desse tipo de relagao, para 
num segundo momenta mostrar as especificidades pr6prias desse 
encontro terapeutico. 
o que e 0 Encontro Inter-Humano? 
Fundamenta~ao Antropologica do Encontro 
"0 ser-com e um constituinte do ser-no-mundo" (Ser e Tem-
po). Assim, HEIOEGGER chama a ater,<;ao para 0 fato de que 0 
homem e, na sua estrutura mais fundamental, um ser com os ou-
tros. Ele nao se pode compreender sem estar em relag80 com os 
outros homens. Para designar esses aspectos, utilizamos 0 termo 
co-existencia, dizendo com iSso, 
... que 0 homem nao esta total mente s6 em nenhum 
nfvel da existencia. Nenhum aspecto do ser-homem eo 
que e sem que nele outros homens estejam presentes. 
o ser-presente de outros em minha existencia implica 
que meu ser-homem e um ser-por-outros.66 
Sempre nos constituimos pela via da relag80 com os outros· 
homens. 
A fenomenologia existencial nos ensina que 0 homem e um 
ser-no-mundo, que ele 1180 pode ser compreendido sem 0 mundo. 
Nao e possivel pensar 0 homem dentro do mundo, como se pensa 
o giz dentro de uma caixa-de-giz. E da estrutura do eu a sua in-
serg80 no mundo. Oai podermos dizer que 0 Eu, por meio do qual 
nomeamos 0 homem, nao e uma realidade em si, mas relacional. 
Isso implica 0 fato de que n80 se pode falar do Eu sem falar do 
66 LUIJPEN, W. /ntrodur;ao a Fenomen%gia, SP, EPU, 1973, p. 260. 
50 
mundo. Essa unidade e instrumental do homem e, assim, a rela-
gao e 0 elemento anterior a constitui<;ao do homem como subjetivi-
dade. tF\ relaqao entre duas pessoas esta dada em uma esfera na 
qual ambas as constituiq6es atuam significativamente antes que 
surjam como pessoas e individua/idades bem /imitadas".67 
A consequElncia dessa posiyao na psicologia clfnica, que 
se baseia em tradiyao filos6fica de Max SCHELLER, Mar-
tin BUBER, Martin HEIOEGGER e Karl LOWITH, E.. que, ao 
contrario da posiyao psicanalftica segundo a qual 0 "Eu" e 
entendido como surgindo dos estados de animo e das neces-
sidades impulsivas, aqui, 0 Eu e entendido como possuindo 
uma vinculayao primaria, "como um testar' em uma mutua 
vinculac;ao".68 Oesse modo, os sentimentos sao matizes da 
vinculayao primordial. 
A Psicanalise da muita importancia a afetividade no es-
tabelecimento das relayoes interpessoais, pois 0 contato do 
bebe com a mae e vivenciado pela via da atualizayao da 
pulsao. Na perspectiva existencial, 0 que conta, em primeiro 
lugar, e 0 tipo de relay80 que se estabelece entre a mae e 
o seu bebe. A afetividade, que entendemos como um dos 
eixos de organizayao do psiquismo humano, manifesta-se 
mediante a ressonancia interna dos contactos que 0 eu es-
tabelece com 0 mundo. Oessa maneira, podemos concordar 
com BRAUTIGAM quando nos diz: "As ressonancias afeti-
vas surgem, entre outras coisas, do ex ito ou do fracasso da 
vinculac;ao, da confianc;a e do sentimento de seguranc;a que 
desperta, ou de seus contrarios".69 Assim, 0 fato desencade-
ador da estruturayao do ser humane nao esta na atualizayao, 
em si, de nenhuma forya interna do indivfduo que busca uma 
67 BRAUTIGAM, W. La psicoterapia en su aspecto antropol6gico, Madrid, Ed. Gredos, 
1964,p.131. 
6f Idem, op. cit., p. 132. 
69 Idem, op. cit., p. 137. 
51 
esta se fortalecera por intermedio de um encontro profundo e exis-
tencial, e nao por meio da aplicagao de uma tecnica. 
Assim, 0 presente estudo visa, num primeiro momento, expli-
citar a fundamentagao antropo:6gica desse tipo de relagao, para 
num segundo momenta mostrar as especificidades pr6prias desse 
encontro terapeutico. 
o que e 0 Encontro Inter-Humano? 
Fundamenta~ao Antropologica do Encontro 
"0 ser-com e um constituinte do ser-no-mundo" (Ser e Tem-
po). Assim, HEIOEGGER chama a ater,<;ao para 0 fato de que 0 
homem e, na sua estrutura mais fundamental, um ser com os ou-
tros. Ele nao se pode compreender sem estar em relag80 com os 
outros homens. Para designar esses aspectos, utilizamos 0 termo 
co-existencia, dizendo com iSso, 
... que 0 homem nao esta total mente s6 em nenhum 
nfvel da existencia. Nenhum aspecto do ser-homem eo 
que e sem que nele outros homens estejam presentes. 
o ser-presente de outros em minha existencia implica 
que meu ser-homem e um ser-por-outros.66 
Sempre nos constituimos pela via da relag80 com os outros· 
homens. 
A fenomenologia existencial nos ensina que 0 homem e um 
ser-no-mundo, que ele 1180 pode ser compreendido sem 0 mundo. 
Nao e possivel pensar 0 homem dentro do mundo, como se pensa 
o giz dentro de uma caixa-de-giz. E da estrutura do eu a sua in-
serg80 no mundo. Oai podermos dizer que 0 Eu, por meio do qual 
nomeamos 0 homem, nao e uma realidade em si, mas relacional. 
Isso implica 0 fato de que n80 se pode falar do Eu sem falar do 
66 LUIJPEN, W. /ntrodur;ao a Fenomen%gia, SP, EPU, 1973, p. 260. 
50 
mundo. Essa unidade e instrumental do homem e, assim, a rela-
gao e 0 elemento anterior a constitui<;ao do homem como subjetivi-
dade. tF\ relaqao entre duas pessoas esta dada em uma esfera na 
qual ambas as constituiq6es atuam significativamente antes que 
surjam como pessoas e individua/idades bem /imitadas".67 
A consequElncia dessa posiyao na psicologia clfnica, que 
se baseia em tradiyao filos6fica de Max SCHELLER, Mar-
tin BUBER, Martin HEIOEGGER e Karl LOWITH, E.. que, ao 
contrario da posiyao psicanalftica segundo a qual 0 "Eu" e 
entendido como surgindo dos estados de animo e das neces-
sidades impulsivas, aqui, 0 Eu e entendido como possuindo 
uma vinculayaoprimaria, "como um testar' em uma mutua 
vinculac;ao".68 Oesse modo, os sentimentos sao matizes da 
vinculayao primordial. 
A Psicanalise da muita importancia a afetividade no es-
tabelecimento das relayoes interpessoais, pois 0 contato do 
bebe com a mae e vivenciado pela via da atualizayao da 
pulsao. Na perspectiva existencial, 0 que conta, em primeiro 
lugar, e 0 tipo de relay80 que se estabelece entre a mae e 
o seu bebe. A afetividade, que entendemos como um dos 
eixos de organizayao do psiquismo humano, manifesta-se 
mediante a ressonancia interna dos contactos que 0 eu es-
tabelece com 0 mundo. Oessa maneira, podemos concordar 
com BRAUTIGAM quando nos diz: "As ressonancias afeti-
vas surgem, entre outras coisas, do ex ito ou do fracasso da 
vinculac;ao, da confianc;a e do sentimento de seguranc;a que 
desperta, ou de seus contrarios".69 Assim, 0 fato desencade-
ador da estruturayao do ser humane nao esta na atualizayao, 
em si, de nenhuma forya interna do indivfduo que busca uma 
67 BRAUTIGAM, W. La psicoterapia en su aspecto antropol6gico, Madrid, Ed. Gredos, 
1964,p.131. 
6f Idem, op. cit., p. 132. 
69 Idem, op. cit., p. 137. 
51 
'I 
i' ,. 
satisfa<;ao do meio, mps, como 0 homem e sempre um ser 
mergulhado em um determinado meio, e a qualidade da re-
la<;ao com esse meio que marcarc~ a atualiza<;ao de qualquer 
for<;a interna do individuo. 
o ser humane concretiza sua dimensao relacional por in-
termedio de tn3s esferas: a rela<;ao de objetividade com a 
Natureza, na qual ele se experimenta como sujeito situado; 
a rela<;ao com os outros homens que podemos caracterizar 
como uma rela<;ao de intersubjetividade, e, finalmente, a re-
la<;ao de transcend€mcia, que designa 
"a forma de uma relay80 entre 0 sujeito situado en-
quanta pensado no movimento da sua auto-afirmay8o 
e uma realidade da qual ele se distingue ou que esta 
para ah~m (trans) da realidade que Ihe e imediatamente 
acessivel".70 
Oas tres rela<;6es acima citadas, Martin BUBER da maior enfa-
se a segunda, pois e nela que 0 carater de reciprocidade e desta-
cado e buscado para ser concretizado de maneira mais plena. itA 
relac;ao de maior valor existencial e 0 encontro dial6gico, a relac;ao 
inter-humana em que a invocac;ao encontra sua verdadeira e plena 
resposta".71 
Assim, 0 dialogico nao e 0 dialogo concreto que ocorre 
entre duas pessoas, mas a condi<;ao para que haja 0 dialogo. 
o Eu nao e uma realidade em si, mas relacional. 
Podemos concluir, dizendo que 0 homem a) nao e um ser 
como uma monada, que se encerra em si mesma, muito pelo 
70 V,AZ, H.C.L. Antropologia Filos6fica, vol. II, SP, Loyola, 1942, p. 93. 0 referido 
hvr~ d,esenvolve nos tn3s primeiros capitulos desse volume a explica~o sobre 
o Slg~lfi.cado de cada uma dessas relac;:oes que dao ao homem 0 seu carater de 
constltulr um ser por exceh§ncia relacional. 
71 VON ZUBEN, NA Introduq80 a obra de Martin Buber. Eu e Tu, SP, Cortez e Moraes 
1979,2. ed., p. LV. ' 
52 
contrario; b) e urn ser que tern como trayo fundamental a co-
-Gxist€mcia; c) e urn individuo veiculado a urn semelhante.72 
Dessa maneira, os estudos da Psicologia do Desenvol-
vimento, principalmente os de SPITZ, tern mostrado que a 
vincula~ao primaria se apresenta como 0 ponto de parti-
da para todo 0 desenvolvimento da personalidade,'send6 
que 0 Eu e 0 Tu vao-se estruturar a partir dessa vincula<;ao, 
que "nao se fundamenta nas osci/ac;oes corporais, nem nas 
emoc;oes, nein na transferencia de significac;oes magicas ou 
simb6Iicas".73 Assim, podemos dizer que e a partir do Nos 
que se estruturam 0 Eu e 0 Tu. 0 Eu do bebe come<;a a se 
estruturar a partir do ~Utro, isto e do Tu, tendo, porem, como 
base essa vincula<;ao primaria, que nada mais e do que 0 
Nos, que se apresenta como condi<;ao de possibilidade para 
a diferencia<;ao dos dois palos. 
o Encontro 
A concretiza<;ao da rela<;ao de intersubjetividade se da, 
das mais variadas formas, na facticidade, como, por exem-
plo, pela via de uma rela<;ao de ajuda, de uma rela<;ao psi-
coterapica etc. Quando, em qualquer uma dessas rela<;oes, 
acontece a vivencia da reciprocidade, havera 0 encontro in-
terpessoal. Assim, reservaremos a palavra encontro para de-
signar uma situa<;ao em que 0 outro afeta de alguma maneira 
a minha existencia, principal mente na dimensao em que ele 
(0 outro) me faz crescer.74 Dessa maneira, a palavra encontro 
concretiza-se por meio de uma rela<;80 intersubjetiva em que 
72 BRAUTIGAM, W. op. cit., p, 133. 
73 Idem, op, cit., p. 129. 
74 GIOVANETTI, J.P. "0 encontro na perspectiva terapeutica existencial", Cadernos 
de Psicologia da PUC-MG, ana 1, nO. 1, 1993, p. 31-4, 0 artigo citado descreve, 
de forma sucinta, 0 que seja um encontro psicoterapico e alguns procedimentos 
clinicos para 0 estabelecimento do encontro existencial terapeuticu. 0 presente 
estudo tem como objetivo explicitar os fundamentos antropol6gicos do encontro e 
dos procedimentos clinicos des&nvolvidos no artigo citado. 
53 
'I 
i' ,. 
satisfa<;ao do meio, mps, como 0 homem e sempre um ser 
mergulhado em um determinado meio, e a qualidade da re-
la<;ao com esse meio que marcarc~ a atualiza<;ao de qualquer 
for<;a interna do individuo. 
o ser humane concretiza sua dimensao relacional por in-
termedio de tn3s esferas: a rela<;ao de objetividade com a 
Natureza, na qual ele se experimenta como sujeito situado; 
a rela<;ao com os outros homens que podemos caracterizar 
como uma rela<;ao de intersubjetividade, e, finalmente, a re-
la<;ao de transcend€mcia, que designa 
"a forma de uma relay80 entre 0 sujeito situado en-
quanta pensado no movimento da sua auto-afirmay8o 
e uma realidade da qual ele se distingue ou que esta 
para ah~m (trans) da realidade que Ihe e imediatamente 
acessivel".70 
Oas tres rela<;6es acima citadas, Martin BUBER da maior enfa-
se a segunda, pois e nela que 0 carater de reciprocidade e desta-
cado e buscado para ser concretizado de maneira mais plena. itA 
relac;ao de maior valor existencial e 0 encontro dial6gico, a relac;ao 
inter-humana em que a invocac;ao encontra sua verdadeira e plena 
resposta".71 
Assim, 0 dialogico nao e 0 dialogo concreto que ocorre 
entre duas pessoas, mas a condi<;ao para que haja 0 dialogo. 
o Eu nao e uma realidade em si, mas relacional. 
Podemos concluir, dizendo que 0 homem a) nao e um ser 
como uma monada, que se encerra em si mesma, muito pelo 
70 V,AZ, H.C.L. Antropologia Filos6fica, vol. II, SP, Loyola, 1942, p. 93. 0 referido 
hvr~ d,esenvolve nos tn3s primeiros capitulos desse volume a explica~o sobre 
o Slg~lfi.cado de cada uma dessas relac;:oes que dao ao homem 0 seu carater de 
constltulr um ser por exceh§ncia relacional. 
71 VON ZUBEN, NA Introduq80 a obra de Martin Buber. Eu e Tu, SP, Cortez e Moraes 
1979,2. ed., p. LV. ' 
52 
contrario; b) e urn ser que tern como trayo fundamental a co-
-Gxist€mcia; c) e urn individuo veiculado a urn semelhante.72 
Dessa maneira, os estudos da Psicologia do Desenvol-
vimento, principalmente os de SPITZ, tern mostrado que a 
vincula~ao primaria se apresenta como 0 ponto de parti-
da para todo 0 desenvolvimento da personalidade,'send6 
que 0 Eu e 0 Tu vao-se estruturar a partir dessa vincula<;ao, 
que "nao se fundamenta nas osci/ac;oes corporais, nem nas 
emoc;oes, nein na transferencia de significac;oes magicas ou 
simb6Iicas".73 Assim, podemos dizer que e a partir do Nos 
que se estruturam 0 Eu e 0 Tu. 0 Eu do bebe come<;a a se 
estruturar a partir do ~Utro, isto e do Tu, tendo, porem, como 
base essa vincula<;ao primaria, que nada mais e do que 0 
Nos, que se apresenta como condi<;ao de possibilidade para 
a diferencia<;ao dos dois palos. 
o Encontro 
A concretiza<;ao da rela<;ao de intersubjetividade se da, 
das mais variadas formas, na facticidade, como, por exem-
plo, pela via de uma rela<;ao de ajuda, de uma rela<;ao psi-
coterapica etc. Quando, em qualquer uma dessas rela<;oes, 
acontece a vivencia da reciprocidade, havera 0 encontro in-
terpessoal. Assim, reservaremos a palavra encontropara de-
signar uma situa<;ao em que 0 outro afeta de alguma maneira 
a minha existencia, principal mente na dimensao em que ele 
(0 outro) me faz crescer.74 Dessa maneira, a palavra encontro 
concretiza-se por meio de uma rela<;80 intersubjetiva em que 
72 BRAUTIGAM, W. op. cit., p, 133. 
73 Idem, op, cit., p. 129. 
74 GIOVANETTI, J.P. "0 encontro na perspectiva terapeutica existencial", Cadernos 
de Psicologia da PUC-MG, ana 1, nO. 1, 1993, p. 31-4, 0 artigo citado descreve, 
de forma sucinta, 0 que seja um encontro psicoterapico e alguns procedimentos 
clinicos para 0 estabelecimento do encontro existencial terapeuticu. 0 presente 
estudo tem como objetivo explicitar os fundamentos antropol6gicos do encontro e 
dos procedimentos clinicos des&nvolvidos no artigo citado. 
53 
a troca de experiencias, de vivencias mobiliza a existencia 
do outr~. 
o encontro humano, seja na Psicoterapia ou fora dela, 
por um lado, fara ressurgir antigas vivencias, que serao tra-
balhadas ao longo do processo, e, por outro lado, provocara 
novas vivencias, que desencadearao uma nova reorganiza-
<;ao da vida. Entendemos vivencia como tudo 0 que e "experi-
encia interna vivida", isto e, 0 que transcorre, a cada instante, 
no ambito da consciencia individual. Assim, por exemplo, na 
vincula<;ao primaria que se estabelece entre 0 bebe e sua 
mae a dura<;ao e a regularidade de como a mae aparece 
para 0 bebe provocarao nele vivencias de familiaridade e de 
vincula<;ao. Esse ponto de partida na vida e fundamental, 
pois a vincula<;ao da pessoa concreta com 0 "outr~" tem im-
portancia na ontogenese das rela<;oes inter-humanas, como 
tambem joga um papel decisive na genese atual do estabe-
lecimento de rela<;oes entre dois seres humanos adultos.75 
Tambem em uma rela<;ao amorosa, 0 encontro com 0 
outro fara surgir antigas vivencias e possibilitara, mediante 
novas vivencias, a constru<;ao do projeto que surge da vida 
a dois. De modo semelhante, na constru<;ao do espa<;o tera-
peutico, surgira uma dinamica parecida. 
o Encontro Psicoterapeutico 
o encontro psicoterapico desenvolve-se mediante uma 
intera<;ao, que nao tem nada de magico ou extraordinario. 
o encontro e uma rela<;ao psicol6gica entre dois seres que 
apresentam somente algumas caracterlsticas especiais. 
A especificidade do encontro terapeutico pode ser defi-
nida como uma rela<;ao interpessoal subjetiva,76 isto e, deve 
75 BRAUTIGAM, W. op. cit., p.·129. 
) 76 BOCHER, R. A psicoterapia pela fala. SP, EPU, 1989, p. 116 ss. 0 autor aponta a 
especificidade de varios tipos de rela90es pSicol6gicas e mostra quais os tipos que 
poderiam ser denominadas rela90es psicoterapicas. 
54 
ser uma relac;ao em que as veiculac;oes do material subjetivo 
se fazem necessarias. 0 cliente deve trazer, para esse en-
contro, 0 conteudo significativ~ de suas vivencias. 0 que nao 
nos interessa, agora, e discutir como fazer. surgir esse mate-
rial, ou seja, que tipo de tecnica deve ser usada. 0 terapeuta 
deve penetrar na esfera vital de seq cliente, mas isso deve 
ser feito dentro de certos limites, isto e, de forma a respeitar 0 
outro. 0 terapeuta nao deve for<;ar 0 surgimento d(l material 
nem, para tanto, desrespeitar 0 ritmo e 0 desvelamento da 
vida Intima de seu cliente. 0 que ele pode fazer e analisar, 
junto com 0 cliente, as for<;as que impedem 0 material de se 
revelar, mas nunca "agredir" 0 cliente com pressoes psicol6-
gicas de "desmascaramentos". 
Do processo terapeutico, 0 cliente espera cura, e nao 
amizade; ajuda, e nao am or. 0 cliente pode ter claro isso em 
termos.de racionalidade, porem, no momenta em que come-
<;a a sofrer com 0 desvelamento de suas verdades, ele busca 
amizade e amor, para compensar a sua angustia e 0 seu 
sofrimento. E a esse jogo sutil cheio de ambigOidades que 0 
terapeuta deve estar atento, e em que algumas vezes 0 te-
rapeuta principiante se embara<;a, provocando um desfecho 
catastr6fico da terapia, pois ele passa de um relacionamento 
profission~1 para um relacionamento afetivo. 
A ajuda que 0 terapeuta se propoe a oferecer ao seu 
cliente - ou seja - buscar, junto com ele, esclarecer suas 
vivencias - se dara por meio da experiencia da solidariedade 
e do apoio.77 As atitudes do terapeuta que provocam essas 
experie:1cias talvez desencadeiem 0 processo como tal. 
Passemos, agora, a destacar algumas caracterlsticas do 
encontro psicoterapico vivenciado por intermedio de uma re-
la<;ao interpessoal subjetiva como mostramos acima. 
77 BRAUTIGAM, W. op. cit., p. 138. 
55 
a troca de experiencias, de vivencias mobiliza a existencia 
do outr~. 
o encontro humano, seja na Psicoterapia ou fora dela, 
por um lado, fara ressurgir antigas vivencias, que serao tra-
balhadas ao longo do processo, e, por outro lado, provocara 
novas vivencias, que desencadearao uma nova reorganiza-
<;ao da vida. Entendemos vivencia como tudo 0 que e "experi-
encia interna vivida", isto e, 0 que transcorre, a cada instante, 
no ambito da consciencia individual. Assim, por exemplo, na 
vincula<;ao primaria que se estabelece entre 0 bebe e sua 
mae a dura<;ao e a regularidade de como a mae aparece 
para 0 bebe provocarao nele vivencias de familiaridade e de 
vincula<;ao. Esse ponto de partida na vida e fundamental, 
pois a vincula<;ao da pessoa concreta com 0 "outr~" tem im-
portancia na ontogenese das rela<;oes inter-humanas, como 
tambem joga um papel decisive na genese atual do estabe-
lecimento de rela<;oes entre dois seres humanos adultos.75 
Tambem em uma rela<;ao amorosa, 0 encontro com 0 
outro fara surgir antigas vivencias e possibilitara, mediante 
novas vivencias, a constru<;ao do projeto que surge da vida 
a dois. De modo semelhante, na constru<;ao do espa<;o tera-
peutico, surgira uma dinamica parecida. 
o Encontro Psicoterapeutico 
o encontro psicoterapico desenvolve-se mediante uma 
intera<;ao, que nao tem nada de magico ou extraordinario. 
o encontro e uma rela<;ao psicol6gica entre dois seres que 
apresentam somente algumas caracterlsticas especiais. 
A especificidade do encontro terapeutico pode ser defi-
nida como uma rela<;ao interpessoal subjetiva,76 isto e, deve 
75 BRAUTIGAM, W. op. cit., p.·129. 
) 76 BOCHER, R. A psicoterapia pela fala. SP, EPU, 1989, p. 116 ss. 0 autor aponta a 
especificidade de varios tipos de rela90es pSicol6gicas e mostra quais os tipos que 
poderiam ser denominadas rela90es psicoterapicas. 
54 
ser uma relac;ao em que as veiculac;oes do material subjetivo 
se fazem necessarias. 0 cliente deve trazer, para esse en-
contro, 0 conteudo significativ~ de suas vivencias. 0 que nao 
nos interessa, agora, e discutir como fazer. surgir esse mate-
rial, ou seja, que tipo de tecnica deve ser usada. 0 terapeuta 
deve penetrar na esfera vital de seq cliente, mas isso deve 
ser feito dentro de certos limites, isto e, de forma a respeitar 0 
outro. 0 terapeuta nao deve for<;ar 0 surgimento d(l material 
nem, para tanto, desrespeitar 0 ritmo e 0 desvelamento da 
vida Intima de seu cliente. 0 que ele pode fazer e analisar, 
junto com 0 cliente, as for<;as que impedem 0 material de se 
revelar, mas nunca "agredir" 0 cliente com pressoes psicol6-
gicas de "desmascaramentos". 
Do processo terapeutico, 0 cliente espera cura, e nao 
amizade; ajuda, e nao am or. 0 cliente pode ter claro isso em 
termos.de racionalidade, porem, no momenta em que come-
<;a a sofrer com 0 desvelamento de suas verdades, ele busca 
amizade e amor, para compensar a sua angustia e 0 seu 
sofrimento. E a esse jogo sutil cheio de ambigOidades que 0 
terapeuta deve estar atento, e em que algumas vezes 0 te-
rapeuta principiante se embara<;a, provocando um desfecho 
catastr6fico da terapia, pois ele passa de um relacionamento 
profission~1 para um relacionamento afetivo. 
A ajuda que 0 terapeuta se propoe a oferecer ao seu 
cliente - ou seja - buscar, junto com ele, esclarecer suas 
vivencias - se dara por meio da experiencia da solidariedade 
e do apoio.77 As atitudes do terapeuta que provocam essas 
experie:1cias talvez desencadeiem0 processo como tal. 
Passemos, agora, a destacar algumas caracterlsticas do 
encontro psicoterapico vivenciado por intermedio de uma re-
la<;ao interpessoal subjetiva como mostramos acima. 
77 BRAUTIGAM, W. op. cit., p. 138. 
55 
De um modo geral, a relayao entre 0 terapeuta e 0 
cliente passara por' varias fases, segundo 0 andamento 
do processo terapeutico. E evidente que a relayao inieial 
tera nuanyas distintas de quando a fase del terapia estiver 
no seu termino, ou na fase de trabalho, Contudo, essa re-
layao inter-humana deve eompreender, em si, 0 euidado, 
a assistencia e 0 tratamento,7B 0 euidado signifiea que 0 
terapeuta deve ter uma atenyao no sentido de respeitar 0 
ritmo do eliente, tendo sempre uma atitude de aguardar 
as revelayoes deste. Muitas vezes, "foryar a barra" leva 0 
cliente a abandonar a terapia. A assistencia signifiea que 0 
terapeuta deve estar bem preparado para entender 0 que 
se passa na relayao. 0 eneontro terapeutico nao e uma 
eonversa entre amigos, mas 0 terapeuta, alE§m de viver a 
relayao, deve, com seu areabouyo inteleetual, sua prepa-
rayao profissional, entender 0 que se passa na relayao. 
o trabalho profissional de um tera(1euta fenomenol6gieo 
existeneial exige uma preparayao metieulosa na funda-
mentayao de sua pratiea. 0 tratamento signifiea que 0 te-
rapeuta deve ter sempre em vista os objetivos da Psieote-
rapia, ja que esta e entendida nao como uma ayao cliniea 
preventiva, mas como uma intervenyao de tratamento, ou 
seja, ela e uma ayao "eurativa" que ajuda 0 cliente a se 
reorganizar no seu modo de existir. 
A segunda earaeterfstica brota justamente do objetivo 
de querer levar 0 eliente a uma outra norma maior. A te-
rapia e vista como uma relayao que vai auxiliar 0 cliente 
nessa busca de autonomia. Assim, a natureza da relayao 
impliea que um dia ela tera um fim, isto e, havera um rom-
pimento. 
78 BRAUTIGAM, W. op. cit., p. 123. 
56 
Para que consiga assim "andar com as pr6prias p~r­
nas" e necessario romper, num certo momento, 0 '110-
cUlo'terapeutico, e devolver 0 paciente ~ si mesmo, a 
sua pr6pria responsabilidade em assumlr-se naquelas 
dimensoes que Ihe foram desabrolhadas pelo trabalho 
da psicoterapia.79 
Isto quer dizer que a relac;ao terapeytica e limitada no temp,o 
e completamente diferente da relac;ao amorosa, em que os do IS 
parceiros, mesmo que venham a se separar, no momento do en-
gajamento naovisam a essa separac;ao. A separac;ao pode acon-
tecer na relac;ao amorosa, mas nao e planejada desde 0 seu ponto 
de partida. Aqui, a separac;ao e colocada como sen do 0 elemento 
essencial da relac;ao terapeutica. 
A terceira caracteristica manifesta-se mediante 0 posicion a-
mento dos dois personagens, 0 terapeuta e 0 cliente. 0 terapeuta 
e alguem que possui uma forma<;.ao profissional para entende~ ~ 
que se passa na relac;ao. 0 cliente, por sua vez, tem u~a partlcl~ 
pac;ao ativa no sentido de trazer, para a relac;ao, 0 matenal que val 
ser trabalhado. Assim, podemos dizer que 0 terapeuta se encontra 
numa posic;ao de autoridade, embora nao tenha poder para exer-
cer a autoridade, como um governante. Diz BOCHER: "0.3 argu-
mentos de autoridade nao tem valor quando se trata de descobrir 
as verdades secretas do sujeito, Soterrados nos reconditos de sua 
alma, de tal forma que nenhuma autoridade, a nao ser ele mes-
rna, possa desvenda-/as".Bo Assim, a partir da elucid~yao dos 
papeis diferentes de cada personagem de~s~ rel~y.ao, pode-
mos nomear a assimetria como outra eondlyao baslca para a 
existencia de uma relayao terapeutica. E de extrema impor-
taneia que, na terapia, essa assimetria seja instalada para 0 
bom desenvolvimento daquela, uma vez que nao se trata de 
uma relay80 amorosa, em que ambos os pareeiros devem ter 
79 BOCHER, R. op. cit., p.78. 
80 BOCHER, R. op. cit., p.79. 
57 
De um modo geral, a relayao entre 0 terapeuta e 0 
cliente passara por' varias fases, segundo 0 andamento 
do processo terapeutico. E evidente que a relayao inieial 
tera nuanyas distintas de quando a fase del terapia estiver 
no seu termino, ou na fase de trabalho, Contudo, essa re-
layao inter-humana deve eompreender, em si, 0 euidado, 
a assistencia e 0 tratamento,7B 0 euidado signifiea que 0 
terapeuta deve ter uma atenyao no sentido de respeitar 0 
ritmo do eliente, tendo sempre uma atitude de aguardar 
as revelayoes deste. Muitas vezes, "foryar a barra" leva 0 
cliente a abandonar a terapia. A assistencia signifiea que 0 
terapeuta deve estar bem preparado para entender 0 que 
se passa na relayao. 0 eneontro terapeutico nao e uma 
eonversa entre amigos, mas 0 terapeuta, alE§m de viver a 
relayao, deve, com seu areabouyo inteleetual, sua prepa-
rayao profissional, entender 0 que se passa na relayao. 
o trabalho profissional de um tera(1euta fenomenol6gieo 
existeneial exige uma preparayao metieulosa na funda-
mentayao de sua pratiea. 0 tratamento signifiea que 0 te-
rapeuta deve ter sempre em vista os objetivos da Psieote-
rapia, ja que esta e entendida nao como uma ayao cliniea 
preventiva, mas como uma intervenyao de tratamento, ou 
seja, ela e uma ayao "eurativa" que ajuda 0 cliente a se 
reorganizar no seu modo de existir. 
A segunda earaeterfstica brota justamente do objetivo 
de querer levar 0 eliente a uma outra norma maior. A te-
rapia e vista como uma relayao que vai auxiliar 0 cliente 
nessa busca de autonomia. Assim, a natureza da relayao 
impliea que um dia ela tera um fim, isto e, havera um rom-
pimento. 
78 BRAUTIGAM, W. op. cit., p. 123. 
56 
Para que consiga assim "andar com as pr6prias p~r­
nas" e necessario romper, num certo momento, 0 '110-
cUlo'terapeutico, e devolver 0 paciente ~ si mesmo, a 
sua pr6pria responsabilidade em assumlr-se naquelas 
dimensoes que Ihe foram desabrolhadas pelo trabalho 
da psicoterapia.79 
Isto quer dizer que a relac;ao terapeytica e limitada no temp,o 
e completamente diferente da relac;ao amorosa, em que os do IS 
parceiros, mesmo que venham a se separar, no momento do en-
gajamento naovisam a essa separac;ao. A separac;ao pode acon-
tecer na relac;ao amorosa, mas nao e planejada desde 0 seu ponto 
de partida. Aqui, a separac;ao e colocada como sen do 0 elemento 
essencial da relac;ao terapeutica. 
A terceira caracteristica manifesta-se mediante 0 posicion a-
mento dos dois personagens, 0 terapeuta e 0 cliente. 0 terapeuta 
e alguem que possui uma forma<;.ao profissional para entende~ ~ 
que se passa na relac;ao. 0 cliente, por sua vez, tem u~a partlcl~ 
pac;ao ativa no sentido de trazer, para a relac;ao, 0 matenal que val 
ser trabalhado. Assim, podemos dizer que 0 terapeuta se encontra 
numa posic;ao de autoridade, embora nao tenha poder para exer-
cer a autoridade, como um governante. Diz BOCHER: "0.3 argu-
mentos de autoridade nao tem valor quando se trata de descobrir 
as verdades secretas do sujeito, Soterrados nos reconditos de sua 
alma, de tal forma que nenhuma autoridade, a nao ser ele mes-
rna, possa desvenda-/as".Bo Assim, a partir da elucid~yao dos 
papeis diferentes de cada personagem de~s~ rel~y.ao, pode-
mos nomear a assimetria como outra eondlyao baslca para a 
existencia de uma relayao terapeutica. E de extrema impor-
taneia que, na terapia, essa assimetria seja instalada para 0 
bom desenvolvimento daquela, uma vez que nao se trata de 
uma relay80 amorosa, em que ambos os pareeiros devem ter 
79 BOCHER, R. op. cit., p.78. 
80 BOCHER, R. op. cit., p.79. 
57 
( . 
um posicionamento de igua\ para igua\ na constrUy80 do seu 
projeto comum. 
Conclusao 
A exposiCf80 da necessidade de se explicitar as bases antropo-
16gicas vem mostrar que a compreensao da Psicoterapia deve fun-
dar-se numa Antropologia Filos6fica, que tem como uma de suas 
metas a reflexao sobre as estruturas do ser humano. Esse obje-
tivo, fixado no primeiro momento, quando aplicado a Psicologia 
Clinica, sobretudo na PSicoterapia, ajudara no esclarecimento das 
possibilidades, dos fundamentos e das metas da ayao terapeutica. 
Neste estudo, tambem pretendemos ressaltarque a Psicotera-
pia nao e uma mera aplicaCfaO de tecnicas, que ate poderiam, num 
primeiro momento, ajudar 0 C\iente, mas exige um embasamento 
te6rico suficientemente consistente para sustentar um tipo de re-
laCfao inter-humana que, com as caracteristicas apresentadas no 
corpo do trabalho, receberia 0 nome de relaCfao psicoterapeutica. 
58 
o EXISTIR HUMANO NA OBRA DE LUDWIG 
BINSWANGER81 
A busca de uma base antropol6gica para 0 trabalho cli-
nico e 0 grande desafio de nossa epoca para evitar a 
fragmentagao no estudo do homem. 0 artigo analisa 0 
esfon;o de L. Binswanger na construyao de um metodo 
de analise empirico-fenomenol6gica dos modos de es-
truturas factuais do ser humano. Na primeira parte es-
b09a os passos intelectuais de Binswanger na concreti-
zagao do referido projeto; na segunda, traga as grandes 
linhas de sua antropologia fenomenol6gica, base de 
sua analise da presen9a humana (Oaseinsana/yse). 
The search for an anthropological base for clinical 
work is the great challenge of our epoch in order to 
avoid a fragmentation in the study of human being. 
This paper analysis the effort of L. Binswanger in 
the construction of an empirical- phenomenological 
analysis method of the modes of factual structures of 
the human being outlining in the first part, the intellec-
tual steps of Binswanger in the concretization of the 
referred project, and, in the second part, the principle 
lines of his phenomenological anthropology, which 
serves as the base for his human presence analysis 
(Daseinsanalyse) . 
Ludwig Binswanger e um pensador um pouco - para nao di-
zer total mente - desconhecido do grande publico brasileiro, talvez 
porque suas ideias sejam mais conhecidas no meio psiquiatrico. 
81 Sfntese Nova Fase 50 (1990): 87-99. 0 presente texto resulta da comunica~o 
apresentada no I Encontro Brasileiro de Analise Existencial Terapeutica, realizado 
no Rio de Janeiro, nos dias 10 e 11 de junho de 1989, tendo sofrido pequenas 
aiteray6es. 
59 
( . 
um posicionamento de igua\ para igua\ na constrUy80 do seu 
projeto comum. 
Conclusao 
A exposiCf80 da necessidade de se explicitar as bases antropo-
16gicas vem mostrar que a compreensao da Psicoterapia deve fun-
dar-se numa Antropologia Filos6fica, que tem como uma de suas 
metas a reflexao sobre as estruturas do ser humano. Esse obje-
tivo, fixado no primeiro momento, quando aplicado a Psicologia 
Clinica, sobretudo na PSicoterapia, ajudara no esclarecimento das 
possibilidades, dos fundamentos e das metas da ayao terapeutica. 
Neste estudo, tambem pretendemos ressaltar que a Psicotera-
pia nao e uma mera aplicaCfaO de tecnicas, que ate poderiam, num 
primeiro momento, ajudar 0 C\iente, mas exige um embasamento 
te6rico suficientemente consistente para sustentar um tipo de re-
laCfao inter-humana que, com as caracteristicas apresentadas no 
corpo do trabalho, receberia 0 nome de relaCfao psicoterapeutica. 
58 
o EXISTIR HUMANO NA OBRA DE LUDWIG 
BINSWANGER81 
A busca de uma base antropol6gica para 0 trabalho cli-
nico e 0 grande desafio de nossa epoca para evitar a 
fragmentagao no estudo do homem. 0 artigo analisa 0 
esfon;o de L. Binswanger na construyao de um metodo 
de analise empirico-fenomenol6gica dos modos de es-
truturas factuais do ser humano. Na primeira parte es-
b09a os passos intelectuais de Binswanger na concreti-
zagao do referido projeto; na segunda, traga as grandes 
linhas de sua antropologia fenomenol6gica, base de 
sua analise da presen9a humana (Oaseinsana/yse). 
The search for an anthropological base for clinical 
work is the great challenge of our epoch in order to 
avoid a fragmentation in the study of human being. 
This paper analysis the effort of L. Binswanger in 
the construction of an empirical- phenomenological 
analysis method of the modes of factual structures of 
the human being outlining in the first part, the intellec-
tual steps of Binswanger in the concretization of the 
referred project, and, in the second part, the principle 
lines of his phenomenological anthropology, which 
serves as the base for his human presence analysis 
(Daseinsanalyse) . 
Ludwig Binswanger e um pensador um pouco - para nao di-
zer total mente - desconhecido do grande publico brasileiro, talvez 
porque suas ideias sejam mais conhecidas no meio psiquiatrico. 
81 Sfntese Nova Fase 50 (1990): 87-99. 0 presente texto resulta da comunica~o 
apresentada no I Encontro Brasileiro de Analise Existencial Terapeutica, realizado 
no Rio de Janeiro, nos dias 10 e 11 de junho de 1989, tendo sofrido pequenas 
aiteray6es. 
59 
Dentre a vasta obra filos6fica e psiquiatrica de Binswanger, te-
mos, em portugues, somente 0 seu penultimo livro, Tres form as 
de existencia ma/ograda. Esse desconhecimento se deve a dois 
fatores preponderantes. De um lado, a dificuldade de se penetrar 
no cerne de sua filosofia, pelo fato de sua obra principal ser eY.1:re-
mamente densa. De outr~, pel a natureza mesma de seu trabalho, 
ou seja, a tarefa ardua de aplicar, na pratica psicoterapica, suas 
concepc;6es acerca da ciencia psiquiatrica. 
Com 0 objetivo de nos familiarizar com seu pensamento, dividi-
rei esta exposic;ao em duas partes: num primeiro momento, tratarei 
de esboc;ar os grandes passos de seu trajeto intelectual, para, num 
segundo momento, explicitar as lin has de forc;a de sua antropolo-
gia fenomenol6gica, base de toda sua Daseinsanalyse. 
I. A OBRA DE L. BINSWANGER 
1. Binswanger: urn psiquiatra-fiI6sofo 
Ludwig Binswanger, psiquiatra sui90 nascido em 1881, em 
Kreuzlingen, desempenhou um papel preponde~ante no desenvol-
vimento da Psiquiatria. Desde a intancia teve contato com doentes 
mentais, uma vez que seu tio tinha fundado a clfnica particular de 
"Bellevue" em Kreuzlingen. Com a morte de seu pai, em 1910, ele 
se tornou diretor da mesma com apenas 29 anos. Recusou varios 
convites para tornar-se professor universitario, a fim de permane-
cer como diretor da clinica, cargo que exerceria ate 1956, dez anos 
antes de sua morte. Assim, podemos dizer que Ludwig Binswan-
ger se orientou, dentro de uma tradic;ao familiar, para a Psiquiatria. 
Seu interesse pela Filosofia come90u cedo, isto e, aos 18 
I: . anos, quando foi introduzido a leitura de Kant por seu professor 
. 1 de Humanidades82. Desde esse momento, a Filosofia 0 atraiu 
82 H. Speigelberg, Phenomelogy in Psychology and Psichiatry. A Historical Introduction, 
Evanston, North-western University Press, 1972, p. 200. 
60 
cada vez mais, e 0 contato como pensamento de Husserl 
Ihe mostrou que a Fenomenologia era a via real para pensar 
toda a sua pratica psiquiatrica. Foi tambem urn homem que 
estabeleceu uma ponte entre os filosofos de seu tempo e os 
psiquiatras, pelo simples fato de haver recebido eminentes 
intelectuais - E. Husserl, M. Heidegger, M. Buber, M. Sche-
Ier, S. Freud, K. L6with - na sua cHnica, fazendo de Bellevue 
LIm centro natural de encontros entre filosofos, psiquiatras, 
psicologos e artistas. 
Podernos reunir seu trabalho intelectual83 em torno de 
quatro dire90es: os escritos que explicitam a Fenomenolo-
gia, os estudos sobre a Psicanalise, os trabalhos clinicos que 
caminhavam na dire980 de uma antropologia e os estudos 
sobre artistas. 
Se afirmamos que Binswanger era urn filosofo-psiquiatra, 
e necessario reconhecer, todavia, que a Filosofia 0 interes-
sava a medida que podia fornecer-Ihe as bases para 0 seu 
trabalho cHnico. Durante toda a sua vida, Binswanger foi, an-
tes de tudo, urn psiquiatra. Toda a sua existencia pode ser 
considerada como dedicada ao trabalho de cura dos doentes 
mentais. Ele percebeu que, para fazer a Psiquiatria progredir 
como ciencia do psiquismo, seria necessario dar-Ihe estatuto 
cientffico. Seu projeto intelectual era, pois, a constitui980 da 
Psiquiatria cientifica. Para ele, a Psiquiatria vivia dentro de 
urn dilema do qual ela deveria sair: "Eia (a Psiquiatria) deve 
decidir se quer simplesmente permanecer uma ciencia apli-
cada,urn aglomerado de Psicopatologia, de Neurologia e de 
83 Falaremos mais tarde de seu caminho intelectual, cujo percurso fenomenologico ele 
explicita no artigo "Dank an Edmund Husserl" in Edmund Husserl (1859-1959, ed. N . 
L. Van Breda, The Hague Nighoff, 1959, pp. 64-72, e sua relar;:ao com a Psicam31ise 
no artigo "Mein Weg zu Freud" in Der Mensch in der Psychiatrie, Pfullingen, Gunther 
Neske, 1957. 
61 
Dentre a vasta obra filos6fica e psiquiatrica de Binswanger, te-
mos, em portugues, somente 0 seu penultimo livro, Tres form as 
de existencia ma/ograda. Esse desconhecimento se deve a dois 
fatores preponderantes. De um lado, a dificuldade de se penetrar 
no cerne de sua filosofia, pelo fato de sua obra principal ser eY.1:re-
mamente densa. De outr~, pel a natureza mesma de seu trabalho, 
ou seja, a tarefa ardua de aplicar, na pratica psicoterapica, suas 
concepc;6es acerca da ciencia psiquiatrica. 
Com 0 objetivo de nos familiarizar com seu pensamento, dividi-
rei esta exposic;ao em duas partes: num primeiro momento, tratarei 
de esboc;ar os grandes passos de seu trajeto intelectual, para, num 
segundo momento, explicitar as lin has de forc;a de sua antropolo-
gia fenomenol6gica, base de toda sua Daseinsanalyse. 
I. A OBRA DE L. BINSWANGER 
1. Binswanger: urn psiquiatra-fiI6sofo 
Ludwig Binswanger, psiquiatra sui90 nascido em 1881, em 
Kreuzlingen, desempenhou um papel preponde~ante no desenvol-
vimento da Psiquiatria. Desde a intancia teve contato com doentes 
mentais, uma vez que seu tio tinha fundado a clfnica particular de 
"Bellevue" em Kreuzlingen. Com a morte de seu pai, em 1910, ele 
se tornou diretor da mesma com apenas 29 anos. Recusou varios 
convites para tornar-se professor universitario, a fim de permane-
cer como diretor da clinica, cargo que exerceria ate 1956, dez anos 
antes de sua morte. Assim, podemos dizer que Ludwig Binswan-
ger se orientou, dentro de uma tradic;ao familiar, para a Psiquiatria. 
Seu interesse pela Filosofia come90u cedo, isto e, aos 18 
I: . anos, quando foi introduzido a leitura de Kant por seu professor 
. 1 de Humanidades82. Desde esse momento, a Filosofia 0 atraiu 
82 H. Speigelberg, Phenomelogy in Psychology and Psichiatry. A Historical Introduction, 
Evanston, North-western University Press, 1972, p. 200. 
60 
cada vez mais, e 0 contato como pensamento de Husserl 
Ihe mostrou que a Fenomenologia era a via real para pensar 
toda a sua pratica psiquiatrica. Foi tambem urn homem que 
estabeleceu uma ponte entre os filosofos de seu tempo e os 
psiquiatras, pelo simples fato de haver recebido eminentes 
intelectuais - E. Husserl, M. Heidegger, M. Buber, M. Sche-
Ier, S. Freud, K. L6with - na sua cHnica, fazendo de Bellevue 
LIm centro natural de encontros entre filosofos, psiquiatras, 
psicologos e artistas. 
Podernos reunir seu trabalho intelectual83 em torno de 
quatro dire90es: os escritos que explicitam a Fenomenolo-
gia, os estudos sobre a Psicanalise, os trabalhos clinicos que 
caminhavam na dire980 de uma antropologia e os estudos 
sobre artistas. 
Se afirmamos que Binswanger era urn filosofo-psiquiatra, 
e necessario reconhecer, todavia, que a Filosofia 0 interes-
sava a medida que podia fornecer-Ihe as bases para 0 seu 
trabalho cHnico. Durante toda a sua vida, Binswanger foi, an-
tes de tudo, urn psiquiatra. Toda a sua existencia pode ser 
considerada como dedicada ao trabalho de cura dos doentes 
mentais. Ele percebeu que, para fazer a Psiquiatria progredir 
como ciencia do psiquismo, seria necessario dar-Ihe estatuto 
cientffico. Seu projeto intelectual era, pois, a constitui980 da 
Psiquiatria cientifica. Para ele, a Psiquiatria vivia dentro de 
urn dilema do qual ela deveria sair: "Eia (a Psiquiatria) deve 
decidir se quer simplesmente permanecer uma ciencia apli-
cada, urn aglomerado de Psicopatologia, de Neurologia e de 
83 Falaremos mais tarde de seu caminho intelectual, cujo percurso fenomenologico ele 
explicita no artigo "Dank an Edmund Husserl" in Edmund Husserl (1859-1959, ed. N . 
L. Van Breda, The Hague Nighoff, 1959, pp. 64-72, e sua relar;:ao com a Psicam31ise 
no artigo "Mein Weg zu Freud" in Der Mensch in der Psychiatrie, Pfullingen, Gunther 
Neske, 1957. 
61 
Biologia, mantidas juntas simplesmente pel a sua tarefa pra-
tica, ou se quer tornar-se uma cielncia psiquiMrica unitaria". 84 
Encontrar um caminho novo para a Psiquiatria de sua 
epoca, tal era a tarefa de Binswa~ger. Foi por isso que de-
dicou uma grande parte de seu tempo ao estudo da Filoso-
fia. Ele caracterizou a Psiquiatria de sua epoca como uma 
ciencia que se encontrava diante de tres vias, as quais nao 
podariam dar-Ihe um estatuto cientffico. "Existem, na psiquia-
tria atual (de seu tempo e ainda hoje)85, tres caminhos pelos 
quais chegaremos a unidades que merecem, a mais ou me-
nos justo tftulo, 0 nome de unidades de doenga86. 0 primeiro 
caminho segue 0 metodo naturalista. A essencia da doenga e 
apreendida no momento em que n6s detectamos as manifes-
tagoes anormais, de tal sorte que elas expoem um processo 
biol6gico determinado, no qual conseguimos perceber 0 co-
mego, 0 desenvolvimento e 0 fim. Dentro dessa perspectiva, 
as doengas mentais sao doengas do cerebro"B7. 
o segundo caminho e aquele que utiliza a explicaC(ao 
psicobiol6gica: "A essen cia da doenga residiria na predispo-
sigao do organismo psfquico, predisposigao que ate 0 pre-
sente nao foi anda elucidada"BB. Dessa maneira, a essen cia 
da doenga e concebida como alguma coisa que esta fora da 
personalidade: e a perspectiva da sind rome. 
A terceira via e a tentativa de explicar a doenga a partir de 
transformagoes primarias da personalidade, isto e, 0 modo 
pelo qual a personalidade elabora psicologicamente certas 
experiencias vivid as no seu percurso hist6rico. Aqui reina 0 
modo de observagao puramente psicol6gicOB9. Esse tipo de 
84 l. ~inswanger, "Psych analise et psichiatrie clinique" in Discaurs, parcours et Freud, 
Pans, Ed. Galiimard, 1970, pp. 152-153. 
f . 85 As palavras entre parenteses sao nossas. 
. 86 l. Binswanger, "Psychanalyse et psichiatrie clinique", op. cit., p. 125. 
, 87 Idem, ibidem, p. 125. 
88 Idem, ibidem, pp. 125-126. 
89 Idem, ibidem, p. 127. 
62 
abordagem constr6i uma infra-estrutura conceptual a partir 
da qual se podem explicar todas as agoes da pessoa. To-
davia, para Binswanger, esse caminho e tambem um cami-
nho do exterior, como os dois outros anteriores, que buscam 
compreender a dimensao psicopatol6gica do homem -como 
alguma coisa que vem do exterior ao organismo, sendo 0 
psiquismo normal. Para Binswanger, essa perspectiva nao 
capta a essencia da doenga. 
Quando escreveu sobre a situagao critica da Psiquiatria, 
em 1920, Binswanger tinha diante de si 0 modelo de Psica-
nalise que trazia uma outra luz para a Psiquiatria, ext->Iicando 
a doenga a partir da hist6ria pessoal de cada um. Ele 0 fez, 
entao, inspirado na Psicanalise, para a qual a doenga nao e 
alguma coisa estranha a pessoa, po is nao se pode perder de 
vista 0 todo da personalidade, devendo-se assim, compreen-
der a doenga dentro de um fluxo continuo da vida"90. 
Com 0 aparecimento do livro Sein urn Zeit de Heidegger, 
em 1927, Binswanger vislumbrou um novo caminho para a 
Psiquiatria. Aparecia, diante dele, a nova diregao da pesquisa 
antropol6gica na Psiquiatria, que nao quer reduzir 0 homem 
a categorias bioI6gico-naturalistas, nem a categorias tiradas 
das ciencias do espirito, mas quer compreender 0 homem a 
partir do seu ser mais intimo - 0 humane - e descrever as 
diregoes fundamentais, originais, desse Ser: "A doenga men-
tal e retirada do campo simplesmente natural, ela e tambem 
retirada do campo de um assunto mental, para ser compre-
end ida e descrita a partir das possibilidades originais do ser 
homem"91. 
Essa perspectiva antropol6gica tomaria sua fonte de ins-
piragao no pensamento de M. Heidegger e no de K. Lowith, 
90 Idem, ibic1em, p. 134. 
91 l. Binswanger, "Freud et la constitution de la psychiatrie"in Discours, parcours et 
Freud, p. 187. 
63 
Biologia, mantidas juntas simplesmente pel a sua tarefa pra-
tica, ou se quer tornar-se uma cielncia psiquiMrica unitaria". 84 
Encontrar um caminho novo para a Psiquiatria de sua 
epoca, tal era a tarefa de Binswa~ger. Foi por isso que de-
dicou uma grande parte de seu tempo ao estudo da Filoso-
fia. Ele caracterizou a Psiquiatria de sua epoca como uma 
ciencia que se encontrava diante de tres vias, as quais nao 
podariam dar-Ihe um estatuto cientffico. "Existem, na psiquia-
tria atual (de seu tempo e ainda hoje)85, tres caminhos pelos 
quais chegaremos a unidades que merecem, a mais ou me-
nos justo tftulo, 0 nome de unidades de doenga86. 0 primeiro 
caminho segue 0 metodo naturalista. A essencia da doenga e 
apreendida no momento em que n6s detectamos as manifes-
tagoes anormais, de tal sorte que elas expoem um processo 
biol6gico determinado, no qual conseguimos perceber 0 co-
mego, 0 desenvolvimento e 0 fim. Dentro dessa perspectiva, 
as doengas mentais sao doengas do cerebro"B7. 
o segundo caminho e aquele que utiliza a explicaC(ao 
psicobiol6gica: "A essen cia da doenga residiria na predispo-
sigao do organismo psfquico, predisposigao que ate 0 pre-
sente nao foi anda elucidada"BB. Dessa maneira, a essen cia 
da doenga e concebida como alguma coisa que esta fora da 
personalidade: e a perspectiva da sind rome. 
A terceira via e a tentativa de explicar a doenga a partir de 
transformagoes primarias da personalidade, isto e, 0 modo 
pelo qual a personalidade elabora psicologicamente certas 
experiencias vivid as no seu percurso hist6rico. Aqui reina 0 
modo de observagao puramente psicol6gicOB9. Esse tipo de 
84 l. ~inswanger, "Psych analise et psichiatrie clinique" in Discaurs, parcours et Freud, 
Pans, Ed. Galiimard, 1970, pp. 152-153. 
f . 85 As palavras entre parenteses sao nossas. 
. 86 l. Binswanger, "Psychanalyse et psichiatrie clinique", op. cit., p. 125. 
, 87 Idem, ibidem, p. 125. 
88 Idem, ibidem, pp. 125-126. 
89 Idem, ibidem, p. 127. 
62 
abordagem constr6i uma infra-estrutura conceptual a partir 
da qual se podem explicar todas as agoes da pessoa. To-
davia, para Binswanger, esse caminho e tambem um cami-
nho do exterior, como os dois outros anteriores, que buscam 
compreender a dimensao psicopatol6gica do homem -como 
alguma coisa que vem do exterior ao organismo, sendo 0 
psiquismo normal. Para Binswanger, essa perspectiva nao 
capta a essencia da doenga. 
Quando escreveu sobre a situagao critica da Psiquiatria, 
em 1920, Binswanger tinha diante de si 0 modelo de Psica-
nalise que trazia uma outra luz para a Psiquiatria, ext->Iicando 
a doenga a partir da hist6ria pessoal de cada um. Ele 0 fez, 
entao, inspirado na Psicanalise, para a qual a doenga nao e 
alguma coisa estranha a pessoa, po is nao se pode perder de 
vista 0 todo da personalidade, devendo-se assim, compreen-
der a doenga dentro de um fluxo continuo da vida"90. 
Com 0 aparecimento do livro Sein urn Zeit de Heidegger, 
em 1927, Binswanger vislumbrou um novo caminho para a 
Psiquiatria. Aparecia, diante dele, a nova diregao da pesquisa 
antropol6gica na Psiquiatria, que nao quer reduzir 0 homem 
a categorias bioI6gico-naturalistas, nem a categorias tiradas 
das ciencias do espirito, mas quer compreender 0 homem a 
partir do seu ser mais intimo - 0 humane - e descrever as 
diregoes fundamentais, originais, desse Ser: "A doenga men-
tal e retirada do campo simplesmente natural, ela e tambem 
retirada do campo de um assunto mental, para ser compre-
end ida e descrita a partir das possibilidades originais do ser 
homem"91. 
Essa perspectiva antropol6gica tomaria sua fonte de ins-
piragao no pensamento de M. Heidegger e no de K. Lowith, 
90 Idem, ibic1em, p. 134. 
91 l. Binswanger, "Freud et la constitution de la psychiatrie" in Discours, parcours et 
Freud, p. 187. 
63 
como tambem no d~ M. Buber. Assim, s6 atraves de uma 
base antropol6gica e que Binswanger poderia tentar restau-
rar a unidade da Psiquiatria. 
2. 0 DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO 
BINSWANGERIANO 
o pensamento de Binswanger esteve sempre em evolu-
yao: ele era um homem que se interrogava continuamente 
para melhor compreender as coisas. Assim, 0 encontro com 
Husserl Ihe deu uma nova direyao ao pensamento; a des-
coberta de Heidegger reorientou sua preocupayao filos6fica. 
Queremos demarcar aqui duas fases no caminho intelec-
tual de Binswanger. A primeira fase e sua tentativa de trazer 
para a Psiquiatria algo de novo, que poderia fazer dele uma 
ciemcia mais s6lida, onde a compreensao da doenya mental 
viria do interior mesmo da Presenya '(Oasein), e nao de uma 
construyao te6rica que se acrescenta a pessoa. A segunda 
fase e a constru9ao de um metodo que permite uma penetra-
yao no modo de vida do doente. 
Durante toda a sua vida, seus contatos com os intelec-
tuais foram inumeros, como ja dissemos anteriormente, e 
a esses contatos pessoais podemos acrescentar os conta-
tos indiretos, pela leitura da filosofia grega (Heraclito), de 
Shakespeare, de Goethe, de Kant etc. E justamente a partir 
desse dialogo que Binswanger vai desenvolver seu pr6prio 
caminho, que se pode resumir como a pesquisa da constitui-
yao de uma Psiquiatria cientifica. 
Binswanger I pode ser caracterizado como jovem 
Binswanger que pesquisava, mas nao tinha ainda claro no 
espirito 0 modo de realizar seu ambicioso projeto. Essa pes-
quisa era possivel porque (' jovem intelectual sempre mos-
trou uma abertura de espirito para acolher toda contribuiyao 
64 
nova e fecunda. Esse caminho filos6fico. que 0 vai conduzir 
ate Husserl, sera mediatizado pelo neokantismo. 0 pr6prio 
Binswanger, em um artigo escrito em homenagem a Husserl, 
reconhece como ele esta presente em todo 0 seu pensamen-
t092. Essa trajet6ria pode ser seguida em pormenores atra"-
ves de seu escrito de 1922 - EinfOhrung in das Problem der 
Allgemeinpsychologie -, pois e a partir desse ana que sua 
adesao a Fenomenologia como metodo de investigayao sera 
definitiva e marcara seu pensamento de maneira decisiva. 
A segunda figura importante dessa primeira fase do seu 
pensamento foi Freud, com quem teve um encontro pesso-
al em 1907, em Viena. 0 resultado desse encontro foi sua 
adesao a Psicanalise e a sedimentayao de uma longa ami-
zade com seu criador, amizade que perdurara mesmo depois 
de sua ruptura intelectual com Frel,ld. Se no inicio, porem, 
Binswanger ficara encantado com a Psicanalise, reconhe-
ceu, mais tarde, ser impossivel fundar cientificamente a Psi-
quiatria a partir da Psicanalise. Mesmo assim, essa decep-
gao nao 0 impediu de mostrar uma grande admirayao pelo 
pensamento freudiano, e a preocupayao de um dialogo com 
a Psicanalise sera algo que ele nunca afastara de suas con-
vicyoes mais profundas. 
o terceiro contato decisive desse periodo foi 0 encontro 
com Heidegger, especialmente com suas obras Sein und Zeit 
eVan Wesen des Grundes, que forneceram a base ontol6gi-
ca da antropologia fenomenol6gica de Binswanger. A analise 
do Oasein, explicitada por Heidegger, revelou a Binswanger 
que 0 homem e um ser-no-mundo. Essa hermeneutica do 
Dasein como cuidado (Sorge) fez ver a Binswanger dimen-
92 L. Binswanger, "Dank an Edmund Husserl" ir. Edmund Husserl (1859-1959, ed. N. 
L. Van Breda, The Hague Nighoff, 1959. Na p. 64, ele afirma: "Mein Weg von Kant 
zu Hu~serl ging Ober den Neukantianismus, und nie zuvorderst Ober Palll Natorp 
desglelchen aber auch Ober Dilthey, Stumpf, Bergson, Scheler, Pfander, u.C:". 
65 
como tambem no d~ M. Buber. Assim, s6 atraves de uma 
base antropol6gica e que Binswanger poderia tentar restau-
rar a unidade da Psiquiatria. 
2. 0 DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO 
BINSWANGERIANO 
o pensamento de Binswanger esteve sempre em evolu-
yao: ele era um homem que se interrogava continuamente 
para melhor compreender as coisas. Assim, 0 encontro com 
Husserl Ihe deu uma nova direyao ao pensamento; a des-
coberta de Heidegger reorientou sua preocupayao filos6fica. 
Queremos demarcar aqui duas fasesno caminho intelec-
tual de Binswanger. A primeira fase e sua tentativa de trazer 
para a Psiquiatria algo de novo, que poderia fazer dele uma 
ciemcia mais s6lida, onde a compreensao da doenya mental 
viria do interior mesmo da Presenya '(Oasein), e nao de uma 
construyao te6rica que se acrescenta a pessoa. A segunda 
fase e a constru9ao de um metodo que permite uma penetra-
yao no modo de vida do doente. 
Durante toda a sua vida, seus contatos com os intelec-
tuais foram inumeros, como ja dissemos anteriormente, e 
a esses contatos pessoais podemos acrescentar os conta-
tos indiretos, pela leitura da filosofia grega (Heraclito), de 
Shakespeare, de Goethe, de Kant etc. E justamente a partir 
desse dialogo que Binswanger vai desenvolver seu pr6prio 
caminho, que se pode resumir como a pesquisa da constitui-
yao de uma Psiquiatria cientifica. 
Binswanger I pode ser caracterizado como jovem 
Binswanger que pesquisava, mas nao tinha ainda claro no 
espirito 0 modo de realizar seu ambicioso projeto. Essa pes-
quisa era possivel porque (' jovem intelectual sempre mos-
trou uma abertura de espirito para acolher toda contribuiyao 
64 
nova e fecunda. Esse caminho filos6fico. que 0 vai conduzir 
ate Husserl, sera mediatizado pelo neokantismo. 0 pr6prio 
Binswanger, em um artigo escrito em homenagem a Husserl, 
reconhece como ele esta presente em todo 0 seu pensamen-
t092. Essa trajet6ria pode ser seguida em pormenores atra"-
ves de seu escrito de 1922 - EinfOhrung in das Problem der 
Allgemeinpsychologie -, pois e a partir desse ana que sua 
adesao a Fenomenologia como metodo de investigayao sera 
definitiva e marcara seu pensamento de maneira decisiva. 
A segunda figura importante dessa primeira fase do seu 
pensamento foi Freud, com quem teve um encontro pesso-
al em 1907, em Viena. 0 resultado desse encontro foi sua 
adesao a Psicanalise e a sedimentayao de uma longa ami-
zade com seu criador, amizade que perdurara mesmo depois 
de sua ruptura intelectual com Frel,ld. Se no inicio, porem, 
Binswanger ficara encantado com a Psicanalise, reconhe-
ceu, mais tarde, ser impossivel fundar cientificamente a Psi-
quiatria a partir da Psicanalise. Mesmo assim, essa decep-
gao nao 0 impediu de mostrar uma grande admirayao pelo 
pensamento freudiano, e a preocupayao de um dialogo com 
a Psicanalise sera algo que ele nunca afastara de suas con-
vicyoes mais profundas. 
o terceiro contato decisive desse periodo foi 0 encontro 
com Heidegger, especialmente com suas obras Sein und Zeit 
eVan Wesen des Grundes, que forneceram a base ontol6gi-
ca da antropologia fenomenol6gica de Binswanger. A analise 
do Oasein, explicitada por Heidegger, revelou a Binswanger 
que 0 homem e um ser-no-mundo. Essa hermeneutica do 
Dasein como cuidado (Sorge) fez ver a Binswanger dimen-
92 L. Binswanger, "Dank an Edmund Husserl" ir. Edmund Husserl (1859-1959, ed. N. 
L. Van Breda, The Hague Nighoff, 1959. Na p. 64, ele afirma: "Mein Weg von Kant 
zu Hu~serl ging Ober den Neukantianismus, und nie zuvorderst Ober Palll Natorp 
desglelchen aber auch Ober Dilthey, Stumpf, Bergson, Scheler, Pfander, u.C:". 
65 
soes constitucionais do homem que nenhum outro pensa-
mento explicitara com tamanha sutileza. Essa admira9ao 
antropol6gica, no sentido filos6fico, permitiu a grande revolu-
9ao no pensamento binswangeriano, e e justa mente a partir 
dessa inspira9ao que ele come90u a construir seu modelo de 
analise na Psiquiatria. 
2.2. BINSWANGER II (1930-1966): A CONSTRUCAO DA 
DASEINSANALYSE 
A explicita9ao da Oaseinsanalyse, que se constitui como 
metodo de investiga9ao, permite 0 conhecimento da hist6ria 
existencial de uma pessoa. Podemos dizer que, a partir de 
1930, com a publica9ao de Traum und Existenz, assistimos 
a constru9ao de algo revolucionario em Psiquiatria. A partir 
desse escrito, que mostra que 0 sonho deve ser compreendi-
do a partir da existencia, Binswanger reorienta sua pesquisa, 
explicitando que 0 fundamento da Psiquiatria nao pode ser 
fornecido pela reflexao metodol6gica sobre os instrumentos, 
mas deve oscilar em dire9ao ao problema do que e 0 ho-
mem, isto e, uma reflexao sobre 0 homem como existente. 
Urn segundo trabalho vern confirmar a nova via aberta por 
Binswanger: Ideenflucht e uma analise do mundo maniaco. 
A estrutura essencial e explicitada pel a analisl3 da fuga das 
ideias atraves das categorias de espa90, tempo, consistencia 
etc. 
Todavia, s6 em 1942 Binswanger publica sua obra filos6-
fica mais importante: Grundformen und Erkenntnis menschli-
chen Oasein, que sera a sua antropologia fenomenol6gica, 
base da Oaseinsanalyse. Essa antropologia e uma interroga-
! . 9aO sobre os modos segundo os quais se revela a Presen9a 
. , humana. Ele quer completar a analise feita por Heidegger, 
pois 0 Oasein nao deve ser s6 compreendido como cuidado 
66 
(Sorge), mas tambem como amor (Liebe). A obra to~na-se 
uma fenomenologia do amor, na qual 0 modo dual na sua 
manifesta9ao amorosa aparece como 0 modo de se~ mais 
fundaml3ntal do ser humano. A antropologia desenvolvlda na 
primeira parte do livro e completada por uma seg.unda par-
te epistemol6gica sobre 0 conhecimento do Oas:tn. R~la~d 
Kuhn, discfpulo direto de Binswanger, destaca a Importancla 
dessa obra: "A partir de 1942, as pesquisas de Binswanger 
nao podem mais simplesmente se inscrever sob 0 titulo d.e 
uma antropologia, mesmo fenomenol6gica. Cad a vez mals 
definido com liberdade, autentica ou desfalecida, 0 ser ho-
mem e fundamentalmente presen9a, em que 0 ser em causa 
e sua pr6pria possibilidade de ser"93. 
A aplica9aO de sua teoria vai-se concretizar com os traba-
Ihos clinicos reunidos, em 1957, no livro Schizophrenie94 , que 
contem cinco casos analisados logo ap6s a publica9aO de 
Grundformen. Sao eles: 0 caso de Ellen West (1944-1945),0 
caso lise (1945), 0 caso JOrg Zund (1946-1947), 0 caso Lola 
Voss (1949), 0 caso Suzan Urban (1952-1953). Quase no 
mesmo periodo da reedi9ao desses casos clinicos, surgem 
outros tres estudos no livro Orei Formen missgliickten Oa-
seins: Vertiegenheit, Versschrobenheit, Manieriertheif95. 
Nesse periodo aparecem diversos artigos sobre a Oa-
seinsanalyse e a Psicoterapia, em que se pode detectar a im-
portancia de Heidegger na constitui9ao do referid? ~etodo .. 
Nao poderiamos deixar passar em branco os ultlmos dOls 
livros de sua vida: Melancholie und Manie: Phanomenologis-
che Studien, em que a melancolia e a mania nao sao abor-
dadas atraves do estudo clinico, mas estudadas segundo 0 
93 R. Kuhn; H. Maldiney, Prefacio a edi~o frances.a de. um conj~nto de a~~gos de 
Binswanger intitulado Introduction a /'analyse eXlstentlelle, Pans, Les Editions de 
Minuit, 1971, p. 16 . 
94 L. Blnswanger, Schizophrenie, Pfullingen, Gunther Neske, 1957. 
95 L. Binswanger, Drei Formen ... , TObigen, Niemeyer, 1956. 
67 
soes constitucionais do homem que nenhum outro pensa-
mento explicitara com tamanha sutileza. Essa admira9ao 
antropol6gica, no sentido filos6fico, permitiu a grande revolu-
9ao no pensamento binswangeriano, e e justa mente a partir 
dessa inspira9ao que ele come90u a construir seu modelo de 
analise na Psiquiatria. 
2.2. BINSWANGER II (1930-1966): A CONSTRUCAO DA 
DASEINSANALYSE 
A explicita9ao da Oaseinsanalyse, que se constitui como 
metodo de investiga9ao, permite 0 conhecimento da hist6ria 
existencial de uma pessoa. Podemos dizer que, a partir de 
1930, com a publica9ao de Traum und Existenz, assistimos 
a constru9ao de algo revolucionario em Psiquiatria. A partir 
desse escrito, que mostra que 0 sonho deve ser compreendi-
do a partir da existencia, Binswanger reorienta sua pesquisa, 
explicitando que 0 fundamento da Psiquiatria nao pode ser 
fornecido pela reflexao metodol6gica sobre os instrumentos, 
mas deve oscilar em dire9ao ao problema do que e 0 ho-
mem, isto e, uma reflexao sobre 0 homem como existente. 
Urn segundo trabalho vern confirmar a nova via aberta por 
Binswanger: Ideenflucht e uma analise do mundo maniaco. 
A estrutura essencial e explicitada pel a analisl3 dafuga das 
ideias atraves das categorias de espa90, tempo, consistencia 
etc. 
Todavia, s6 em 1942 Binswanger publica sua obra filos6-
fica mais importante: Grundformen und Erkenntnis menschli-
chen Oasein, que sera a sua antropologia fenomenol6gica, 
base da Oaseinsanalyse. Essa antropologia e uma interroga-
! . 9aO sobre os modos segundo os quais se revela a Presen9a 
. , humana. Ele quer completar a analise feita por Heidegger, 
pois 0 Oasein nao deve ser s6 compreendido como cuidado 
66 
(Sorge), mas tambem como amor (Liebe). A obra to~na-se 
uma fenomenologia do amor, na qual 0 modo dual na sua 
manifesta9ao amorosa aparece como 0 modo de se~ mais 
fundaml3ntal do ser humano. A antropologia desenvolvlda na 
primeira parte do livro e completada por uma seg.unda par-
te epistemol6gica sobre 0 conhecimento do Oas:tn. R~la~d 
Kuhn, discfpulo direto de Binswanger, destaca a Importancla 
dessa obra: "A partir de 1942, as pesquisas de Binswanger 
nao podem mais simplesmente se inscrever sob 0 titulo d.e 
uma antropologia, mesmo fenomenol6gica. Cad a vez mals 
definido com liberdade, autentica ou desfalecida, 0 ser ho-
mem e fundamentalmente presen9a, em que 0 ser em causa 
e sua pr6pria possibilidade de ser"93. 
A aplica9aO de sua teoria vai-se concretizar com os traba-
Ihos clinicos reunidos, em 1957, no livro Schizophrenie94 , que 
contem cinco casos analisados logo ap6s a publica9aO de 
Grundformen. Sao eles: 0 caso de Ellen West (1944-1945),0 
caso lise (1945), 0 caso JOrg Zund (1946-1947), 0 caso Lola 
Voss (1949), 0 caso Suzan Urban (1952-1953). Quase no 
mesmo periodo da reedi9ao desses casos clinicos, surgem 
outros tres estudos no livro Orei Formen missgliickten Oa-
seins: Vertiegenheit, Versschrobenheit, Manieriertheif95. 
Nesse periodo aparecem diversos artigos sobre a Oa-
seinsanalyse e a Psicoterapia, em que se pode detectar a im-
portancia de Heidegger na constitui9ao do referid? ~etodo .. 
Nao poderiamos deixar passar em branco os ultlmos dOls 
livros de sua vida: Melancholie und Manie: Phanomenologis-
che Studien, em que a melancolia e a mania nao sao abor-
dadas atraves do estudo clinico, mas estudadas segundo 0 
93 R. Kuhn; H. Maldiney, Prefacio a edi~o frances.a de. um conj~nto de a~~gos de 
Binswanger intitulado Introduction a /'analyse eXlstentlelle, Pans, Les Editions de 
Minuit, 1971, p. 16 . 
94 L. Blnswanger, Schizophrenie, Pfullingen, Gunther Neske, 1957. 
95 L. Binswanger, Drei Formen ... , TObigen, Niemeyer, 1956. 
67 
1· 
i I . 1 
\, 
1: 
r 
metodo da fenomenologia pura e transcendental husserliana, 
destacando-se mais a dimensao epistemol6gica do que a cli-
nica. 0 ultimo livro, sobre 0 dellrio - Wahn -, contem uma 
analise fenomenol6gica e uma analise deseinsanalitica des-
sa maneira de ser do homem no mundo. 
II. A ANTROPOLOGIA FENOMENOLOGICA DE L. 
BINSWANGER 
Tendo side um dos responsaveis pela introdu9ao da pesquisa 
fen::>menologica da Psicopatologia atraves da cria9ao da Dasein-
sanalyse, um metodo de analise da maneira pela qual 0 ser hu-
mano esta no mundo, Binswanger estruturou toda uma antropo-
logia fenomenologica que permitiu a analise de diversos tipos de 
psicopatologia,: A esquizofrenia recebeu maior aten9ao nas suas 
analises. 
Sobre essa pesquisa antropologica e sua rela9ao com 0 pen-
samento de Heidegger, Binswanger afirma: "A analitica existen-
cial (Daseinsanalytik) de Martin Heidegger representa uma ampla 
significa9ao para Psiquiatria: de um lado, apontando os limites 
atuais, ela da a pesquisa empfrica psicopatologica uma nova base 
objetiva e metodologica e, de outr~ lado, explicitando 0 conceito 
existencial da ciencia, da a Psiquiatria condi90es de avaliar a 
realidade, a possibilidade e os limites de seu projeto cientffico do 
mundo ou de seu hori?:onte de compreensao transcendental"96. 
Em face da crise da Psiquiatria que nao encontra sua uni-
dade, Binswanger espera, do pensamento heideggeriano, um 
meio de ultrapassagem de suas divisoes: "A analftica existencial 
fenomenologico-filosofica de Heidegger foi um elemento muito 
importante para a Psiquiatria, porque ela nao se inquieta com 
96 l. Binswanger. "Importance et signification de I'analytique existentielle de Martin 
Heidegger pour I'accessicn de la psychiatrie a la comprehension d'elle-m€!me", in 
Introduction a /'analyse existentielle, Paris, Les Editions de Minuit, 1971, p. 247. 
68 
I , 
certos territorios dos fenomenos ou objetos que 'no homem' de-
vem ser delimitados ou explicitados, mas com 0 ser do homem 
na sua totalidade"97. 
Podemos perceber que 0 caminho para 0 estudo psicopato-
logico, para Binswanger, deve passar, ou melhor, estruturar-sea 
partir de uma analise global da existencia humana. 
A Daseinsanalyse busca compreender a doen9a como um 
modo de expressao do ser-no-mundo. Assim, Binswanger vai 
afirmar que aquilo a que se deve visar com a Daseinsanalyse 
nao e compreender a estrutura do delirio, mas a do homem que 
delira, isto e, a estrutura de seu novo ser-no-mundo98 • 
Nessa perspectiva, 0 metodo desenvolvido por Binswanger 
tem como ponto de partida 0 Sein und Zeit. A analise existencial 
se edifica sobre a analftica existencial, que e, de alguma manei-
ra, 0 seu fundamento, pois "como explora9ao empfrico-fenome-
nologica dos mod os e das estruturas determinadas do Dasein , 
a analise existencial toma emprestados da analftica existencial 
filosofica seus fios condutores"99. 
A Daseinsanalyse se apresenta como um esfor90 para me-
Ihor compreender 0 comportamento e a experiencia humanos. 0 
proprio Binswanger nos diz: "A analise existencial satisfaz tam-
bem exigencia psiquiatrica de uma inteligencia mais profunda da 
essencia e da origem dos sintomas psicopatologicos"100 a medida 
que, com esse novo metodo, 0 psiquiatra consegue "se comuni-
car de maneira inesperada com seus doentes, penetrar na sua 
97 Idem, ibidem, pp. 252-253. 
98 l. Binswanger, "La Daseinsanalyse en Psychiatrie" in L'encephale no. 1, 1951, p. 
112. 
99 l. Binswanger, "Analytique Existentielle et Psychiatrie" in Discours, parcours et 
Freud, Paris, Ed. Gallimard, 1970, p. 106. 
.DOL. Binswanger, "Sur la direction de recherche analitico-existentielle en Psyquiatrie" in 
Discours, parcours et Freud, p. 83. 
69 
1· 
i I . 1 
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1: 
r 
metodo da fenomenologia pura e transcendental husserliana, 
destacando-se mais a dimensao epistemol6gica do que a cli-
nica. 0 ultimo livro, sobre 0 dellrio - Wahn -, contem uma 
analise fenomenol6gica e uma analise deseinsanalitica des-
sa maneira de ser do homem no mundo. 
II. A ANTROPOLOGIA FENOMENOLOGICA DE L. 
BINSWANGER 
Tendo side um dos responsaveis pela introdu9ao da pesquisa 
fen::>menologica da Psicopatologia atraves da cria9ao da Dasein-
sanalyse, um metodo de analise da maneira pela qual 0 ser hu-
mano esta no mundo, Binswanger estruturou toda uma antropo-
logia fenomenologica que permitiu a analise de diversos tipos de 
psicopatologia,: A esquizofrenia recebeu maior aten9ao nas suas 
analises. 
Sobre essa pesquisa antropologica e sua rela9ao com 0 pen-
samento de Heidegger, Binswanger afirma: "A analitica existen-
cial (Daseinsanalytik) de Martin Heidegger representa uma ampla 
significa9ao para Psiquiatria: de um lado, apontando os limites 
atuais, ela da a pesquisa empfrica psicopatologica uma nova base 
objetiva e metodologica e, de outr~ lado, explicitando 0 conceito 
existencial da ciencia, da a Psiquiatria condi90es de avaliar a 
realidade, a possibilidade e os limites de seu projeto cientffico do 
mundo ou de seu hori?:onte de compreensao transcendental"96. 
Em face da crise da Psiquiatria que nao encontra sua uni-
dade, Binswanger espera, do pensamento heideggeriano, um 
meio de ultrapassagem de suas divisoes: "A analftica existencial 
fenomenologico-filosofica de Heidegger foi um elemento muito 
importante para a Psiquiatria, porque ela nao se inquieta com 
96 l. Binswanger. "Importance et signification de I'analytique existentielle de Martin 
Heideggerpour I'accessicn de la psychiatrie a la comprehension d'elle-m€!me", in 
Introduction a /'analyse existentielle, Paris, Les Editions de Minuit, 1971, p. 247. 
68 
I , 
certos territorios dos fenomenos ou objetos que 'no homem' de-
vem ser delimitados ou explicitados, mas com 0 ser do homem 
na sua totalidade"97. 
Podemos perceber que 0 caminho para 0 estudo psicopato-
logico, para Binswanger, deve passar, ou melhor, estruturar-sea 
partir de uma analise global da existencia humana. 
A Daseinsanalyse busca compreender a doen9a como um 
modo de expressao do ser-no-mundo. Assim, Binswanger vai 
afirmar que aquilo a que se deve visar com a Daseinsanalyse 
nao e compreender a estrutura do delirio, mas a do homem que 
delira, isto e, a estrutura de seu novo ser-no-mundo98 • 
Nessa perspectiva, 0 metodo desenvolvido por Binswanger 
tem como ponto de partida 0 Sein und Zeit. A analise existencial 
se edifica sobre a analftica existencial, que e, de alguma manei-
ra, 0 seu fundamento, pois "como explora9ao empfrico-fenome-
nologica dos mod os e das estruturas determinadas do Dasein , 
a analise existencial toma emprestados da analftica existencial 
filosofica seus fios condutores"99. 
A Daseinsanalyse se apresenta como um esfor90 para me-
Ihor compreender 0 comportamento e a experiencia humanos. 0 
proprio Binswanger nos diz: "A analise existencial satisfaz tam-
bem exigencia psiquiatrica de uma inteligencia mais profunda da 
essencia e da origem dos sintomas psicopatologicos"100 a medida 
que, com esse novo metodo, 0 psiquiatra consegue "se comuni-
car de maneira inesperada com seus doentes, penetrar na sua 
97 Idem, ibidem, pp. 252-253. 
98 l. Binswanger, "La Daseinsanalyse en Psychiatrie" in L'encephale no. 1, 1951, p. 
112. 
99 l. Binswanger, "Analytique Existentielle et Psychiatrie" in Discours, parcours et 
Freud, Paris, Ed. Gallimard, 1970, p. 106. 
.DOL. Binswanger, "Sur la direction de recherche analitico-existentielle en Psyquiatrie" in 
Discours, parcours et Freud, p. 83. 
69 
historia de vida, descrever e compreender seus projetos-de-mun-
do, ali onde isso pareceria, ate 0 presente, impossivel"101. 
1. A perspectiva antropologica da Daseinsanalyse 
Os primeiros problemas com respeito a compreensao da pers-
pectiva antropologica do pensamento de L. Binswanger surgem 
quando se procura uma tradu9aO para a palavra Dasein. Em fran-
ces, por exemplo, a palavra existencia foi proposta para traduzir 0 
Dasein no pensamento de Binswanger, porem 0 proprio Binswan-
ger102 questiona essa tradu9aO, dizendo que, na Fran9a, 0 termo 
existencia e ligado ao existencialismo, no qual a ideia de consci-
encia tem lugar privilegiado com rela9aO ao ~onceito de Dasein, 
que tem uma conota9aO ontologica proveniente do pensamento 
de Heidegger. Binswanger diz que Dasein compreende a alma e 
o corpo, 0 voluntario e 0 involuntario, 0 pensamento e a a9aO, a 
emotividade, a afetividade e 0 instinto, e que a ideia mais adequa-
da para englobar tudo isso e aquela do Ser, porem Ser nao como 
substantiv~, mas como verbo, tal como etre, to be, esse103 • 
N6s pensamos que a COnCep9aO de Binswanger de Dasein 
como ser tomado a maneira verbal traz a luz 0 movimento como 
caracteristica essencial do homem. Assim, nas suas analises 
psicopatol6gicas, Binswanger vai procurar mostrar que e neces-
sario compreender nao as atitudes isoladas do paciente, mas 0 
101 Idem, ibidem, p. 84. 
lOll. Binswanger, "La 08seins8n8/yse in Psychi8trie" in L'Encepha/o no. 1, 1951, pp. 
108-113. 
'03Idem, ibidem, p. 109. Apesar dessa contesta~o de Binswanger, a palavra exist€mcia 
prevaleceu na traduc;ao francesa. Walter Biemel precisa melhor esse problema, 
quando diz que "0 Oa e 0 espac;o aberto pela irrupc;ao do homem. 0 homem 
compreendido como Oasein nao e um simples objeto presente no espac;o, como 
uma presa ou pedra, mas 0 ser que revel a (abre) 0 espac;o, e que e, ele mesmo, 
espacial, no sentido de que ele se espacializa. 0 Oa nao e, portanto, na tenminologia 
heideggeriana, um simples ai, nem um lugar determinado no seio do espac;o, 
mas, como Heidegger diz, uma zona desvelada (devoilee), a atividade desvelante 
(devoi/ante) do homem". W. Biemel, Le concept de monde chez Heidegger, Louvain, 
Ed. Nauwelaerts, 1950, pp. 81-82. 
70 I 
movimento de sua vida. atraves da capta<;:ao da vivencia espacial 
e temporal. Para guardar a significa980 plena do significado de 
Binswanger, a tradU9aO mais conveniente seria Presenya, como 
termo que captaria 0 movimento pr6prio da constitui9aO do homem. 
Aqui, a conCeP9ao de Binswanger se aproxima de uma. maneira 
mais estreita do pensamento de M. Heidegger. A preOCUpa9ao de 
ambos sera a de fazer uma analise do Dasein, mas a sua maneira 
de trazer a luz 0 proprio Dasein se concretiza de maneira diferente. 
A analise heideggeriana e ontologica, e a analise binswangeriana 
e antropologica. Escutemos 0 pr6prio Binswanger: "P~r ana/itiea 
do Dasein eu entendo a classifica9aO filosofico-fenomenol6gica 
da estrutura a priori ou transcendental do Dasein, a analise em pi-
rico-fenomenoI6gica, cientffica, dos modos de estruturas factuais 
do Dasein. Porem esta segunda so e possivel sobre a base da 
primeira"104 
2. Os principais eixos da Analise da Presenc;a Humana 
A Daseinsana/yse, que e uma analise empirico-fenomenol6gica 
dos modos do Dasein, faz-se a partir de sua antropologia fenome-
nol6gica, explicitada no Grundformen. 0 que interessa ao analista 
antrop610go-fenomen610go sao os modos de ser a partir dos quais 
se revela a Presenya Humana, e que se exprimem, para Binswan-
ger, atraves dos temas fundamentais, denominados: dualidade, 
pluralidade e singularidade. 0 conjunto dessas formas constitui as 
maneiras atraves das quais se articulam 0 ser-no-mundo (In-der-
-We/t-Sein) e 0 ser-alem-do-mundo (Ober-die-We/t-hinau3-Sein), 
compreendidos antropologicamente, e nao como formas que im-
plicam uma escolha preferencial de uma sobre a outra, ou que 
uma deva ser explicitada antes da outra. A analise dessas formas 
constitui a antropologia fenomenologica de Binswanger. 
104L. Binswanger, "Analytique Existentielle et Psychiatrie" in Oiscours, parcours et 
Freud, Paris, Ed. Gallimard, 1970, p. 86. 
71 
historia de vida, descrever e compreender seus projetos-de-mun-
do, ali onde isso pareceria, ate 0 presente, impossivel"101. 
1. A perspectiva antropologica da Daseinsanalyse 
Os primeiros problemas com respeito a compreensao da pers-
pectiva antropologica do pensamento de L. Binswanger surgem 
quando se procura uma tradu9aO para a palavra Dasein. Em fran-
ces, por exemplo, a palavra existencia foi proposta para traduzir 0 
Dasein no pensamento de Binswanger, porem 0 proprio Binswan-
ger102 questiona essa tradu9aO, dizendo que, na Fran9a, 0 termo 
existencia e ligado ao existencialismo, no qual a ideia de consci-
encia tem lugar privilegiado com rela9aO ao ~onceito de Dasein, 
que tem uma conota9aO ontologica proveniente do pensamento 
de Heidegger. Binswanger diz que Dasein compreende a alma e 
o corpo, 0 voluntario e 0 involuntario, 0 pensamento e a a9aO, a 
emotividade, a afetividade e 0 instinto, e que a ideia mais adequa-
da para englobar tudo isso e aquela do Ser, porem Ser nao como 
substantiv~, mas como verbo, tal como etre, to be, esse103 • 
N6s pensamos que a COnCep9aO de Binswanger de Dasein 
como ser tomado a maneira verbal traz a luz 0 movimento como 
caracteristica essencial do homem. Assim, nas suas analises 
psicopatol6gicas, Binswanger vai procurar mostrar que e neces-
sario compreender nao as atitudes isoladas do paciente, mas 0 
101 Idem, ibidem, p. 84. 
lOll. Binswanger, "La 08seins8n8/yse in Psychi8trie" in L'Encepha/o no. 1, 1951, pp. 
108-113. 
'03Idem, ibidem, p. 109. Apesar dessa contesta~o de Binswanger, a palavra exist€mcia 
prevaleceu na traduc;ao francesa. Walter Biemel precisa melhor esse problema, 
quando diz que "0 Oa e 0 espac;o aberto pela irrupc;ao do homem. 0 homem 
compreendido como Oasein nao e umsimples objeto presente no espac;o, como 
uma presa ou pedra, mas 0 ser que revel a (abre) 0 espac;o, e que e, ele mesmo, 
espacial, no sentido de que ele se espacializa. 0 Oa nao e, portanto, na tenminologia 
heideggeriana, um simples ai, nem um lugar determinado no seio do espac;o, 
mas, como Heidegger diz, uma zona desvelada (devoilee), a atividade desvelante 
(devoi/ante) do homem". W. Biemel, Le concept de monde chez Heidegger, Louvain, 
Ed. Nauwelaerts, 1950, pp. 81-82. 
70 I 
movimento de sua vida. atraves da capta<;:ao da vivencia espacial 
e temporal. Para guardar a significa980 plena do significado de 
Binswanger, a tradU9aO mais conveniente seria Presenya, como 
termo que captaria 0 movimento pr6prio da constitui9aO do homem. 
Aqui, a conCeP9ao de Binswanger se aproxima de uma. maneira 
mais estreita do pensamento de M. Heidegger. A preOCUpa9ao de 
ambos sera a de fazer uma analise do Dasein, mas a sua maneira 
de trazer a luz 0 proprio Dasein se concretiza de maneira diferente. 
A analise heideggeriana e ontologica, e a analise binswangeriana 
e antropologica. Escutemos 0 pr6prio Binswanger: "P~r ana/itiea 
do Dasein eu entendo a classifica9aO filosofico-fenomenol6gica 
da estrutura a priori ou transcendental do Dasein, a analise em pi-
rico-fenomenoI6gica, cientffica, dos modos de estruturas factuais 
do Dasein. Porem esta segunda so e possivel sobre a base da 
primeira"104 
2. Os principais eixos da Analise da Presenc;a Humana 
A Daseinsana/yse, que e uma analise empirico-fenomenol6gica 
dos modos do Dasein, faz-se a partir de sua antropologia fenome-
nol6gica, explicitada no Grundformen. 0 que interessa ao analista 
antrop610go-fenomen610go sao os modos de ser a partir dos quais 
se revela a Presenya Humana, e que se exprimem, para Binswan-
ger, atraves dos temas fundamentais, denominados: dualidade, 
pluralidade e singularidade. 0 conjunto dessas formas constitui as 
maneiras atraves das quais se articulam 0 ser-no-mundo (In-der-
-We/t-Sein) e 0 ser-alem-do-mundo (Ober-die-We/t-hinau3-Sein), 
compreendidos antropologicamente, e nao como formas que im-
plicam uma escolha preferencial de uma sobre a outra, ou que 
uma deva ser explicitada antes da outra. A analise dessas formas 
constitui a antropologia fenomenologica de Binswanger. 
104L. Binswanger, "Analytique Existentielle et Psychiatrie" in Oiscours, parcours et 
Freud, Paris, Ed. Gallimard, 1970, p. 86. 
71 
2.1. A modalidade dual 
A primeira modalidade que sera examinada por Binswanger e 
a forma dual, que possui duas expressoes: 0 amor e a amizade. A 
questao que deve ser posta e: como se manifestara 0 existir huma-
no nessa forma de ser? 
A maneira de ser a dois no mundo dual deve ser compreendida 
a partir do fato de que um nao esta simplesmente ao lado do outro, 
como, por exemplo, numa torcida num campo de futebol, mas que 
deve existir uma relagao entre eles. Essa relagao deve ser de reci-
procida de , tanto de um com relagao ao outro, como do outro com 
relagao ao primeiro. E por isso que Binswanger usa a expressao 
Miteinandersein para caracterizar essa relagao, cujo significado 
mais proprio seria "ser-em relaqao-de-reciprocidade". Essa manei-
ra de ser pode ser caracterizada como uma unidade na dualidade. 
Assim, "0 sentido da dualidade, 0 fato de ser dois a maneira do n6s 
do amor, e totalmente diferente do sentido de ser dois no qual um 
esta em oposigao ao outro, aos quais se pod em juntar, dos dois 
lados, um terceiro, um quarto, um quinto, ate urn numero x, sem 
que ai exista uma mudan9a de estrutura do ser-com"105. 
Existe no ser-em-relaqao-de-reciprccidade, tanto no amor 
como na amizade, uma penetragao de um no outro, e nao somente 
L;ma postura de urn ao lado do outro. 
Essa unidade na dualidade e possivel porque 0 princlpio or-
ganizador que rege a relagao entre um e outro e 0 encontro (8e-
gegnung). A perspectiva de uma compreensao antropologica 
desse principio organizador e que nos possibilita afirmar que a 
compreensao do ser-em-relaq80-de-reciprocidade, tanto na forma 
de amizade como na forma do amor, nao pode ser "mostrada" e 
discutida numa concepgao categorial, mas somente numa "ex-
10SL. Binswanger, Grundformen und Erkenntnis menschlichen Daseins Munique-
Basileia, Ernest Reinhardt Verlag, 5. ed., 1973, p. 382. • 
72 
pressao antropologica"106. 0 ser-em-relaqao-de-reciprocidade nas 
formas do amor de da amizade sao duas manifesta90es diferentes 
do encontro. "0 amor e a amizade mostram a mesma estrutura 
fundamental antropologica"107, cada urn com suas caracterfsticas 
proprias. 
Assim, 0 amor e a amizade nao podem ser concebidos como 
"objeto de julgamento psicologico", dos quais se poderiam citar as 
caracterlsticas comuns e as que os distinguem. Nos so chegare-
mos ao "fundamento" a medida que guardarmos, em nossa pers-
pectiva, a estrutura antropologica comum do amor e da amizade, e 
a medida que procurarmos as particularidades de sua maneira de 
ser que nos impulsionam a falar da manelra de ser amorosa e da 
"maneira de ser amical do encontro"10B. 
Justamente para marcar essa perspectiva antropologica e que 
Binswanger, num artigo publicado em 1941, um ana antes da pu-
blicagao do Grundformen, Flfirmava: "0 amor e a amizade sao uma 
relagao originaria primaria, isto e, uma relagao originaria primaria 
antropologica que nao pode ser derivada mais longe"109. 0 proble-
ma seria, agora, desenvolver as nuangas de cada uma das formas 
da dualidade, tarefa imposslvel neste breve artigo. 
2.2. A modalidade plural 
As manifestagoes da modalidade dual - 0 amor e a amizade 
- sao os mod os da Presenga em que se exprime 0 autentico en-
contro interumano, ou seja, em que, de uma forma total ou parcial, 
a relagao entre 0 Eu e 0 Tu atingem sua plenitude. 
106ldem, ibidem, p. 227. 
107ldem, ibidem, p. 222. 
108ldem, ibidem, p. 222. 
109l. Binswanger, "Sprache, Liebe und Bildung" in Confinia Psychiatrica, vol. II, (1959) 
no. 3-4, pp. 139-140. Essa conferencia foi pronunciada pela primeira vez em lucerna, 
em 1941. 
73 
2.1. A modalidade dual 
A primeira modalidade que sera examinada por Binswanger e 
a forma dual, que possui duas expressoes: 0 amor e a amizade. A 
questao que deve ser posta e: como se manifestara 0 existir huma-
no nessa forma de ser? 
A maneira de ser a dois no mundo dual deve ser compreendida 
a partir do fato de que um nao esta simplesmente ao lado do outro, 
como, por exemplo, numa torcida num campo de futebol, mas que 
deve existir uma relagao entre eles. Essa relagao deve ser de reci-
procida de , tanto de um com relagao ao outro, como do outro com 
relagao ao primeiro. E por isso que Binswanger usa a expressao 
Miteinandersein para caracterizar essa relagao, cujo significado 
mais proprio seria "ser-em relaqao-de-reciprocidade". Essa manei-
ra de ser pode ser caracterizada como uma unidade na dualidade. 
Assim, "0 sentido da dualidade, 0 fato de ser dois a maneira do n6s 
do amor, e totalmente diferente do sentido de ser dois no qual um 
esta em oposigao ao outro, aos quais se pod em juntar, dos dois 
lados, um terceiro, um quarto, um quinto, ate urn numero x, sem 
que ai exista uma mudan9a de estrutura do ser-com"105. 
Existe no ser-em-relaqao-de-reciprccidade, tanto no amor 
como na amizade, uma penetragao de um no outro, e nao somente 
L;ma postura de urn ao lado do outro. 
Essa unidade na dualidade e possivel porque 0 princlpio or-
ganizador que rege a relagao entre um e outro e 0 encontro (8e-
gegnung). A perspectiva de uma compreensao antropologica 
desse principio organizador e que nos possibilita afirmar que a 
compreensao do ser-em-relaq80-de-reciprocidade, tanto na forma 
de amizade como na forma do amor, nao pode ser "mostrada" e 
discutida numa concepgao categorial, mas somente numa "ex-
10SL. Binswanger, Grundformen und Erkenntnis menschlichen Daseins Munique-
Basileia, Ernest Reinhardt Verlag, 5. ed., 1973, p. 382. • 
72 
pressao antropologica"106. 0 ser-em-relaqao-de-reciprocidadenas 
formas do amor de da amizade sao duas manifesta90es diferentes 
do encontro. "0 amor e a amizade mostram a mesma estrutura 
fundamental antropologica"107, cada urn com suas caracterfsticas 
proprias. 
Assim, 0 amor e a amizade nao podem ser concebidos como 
"objeto de julgamento psicologico", dos quais se poderiam citar as 
caracterlsticas comuns e as que os distinguem. Nos so chegare-
mos ao "fundamento" a medida que guardarmos, em nossa pers-
pectiva, a estrutura antropologica comum do amor e da amizade, e 
a medida que procurarmos as particularidades de sua maneira de 
ser que nos impulsionam a falar da manelra de ser amorosa e da 
"maneira de ser amical do encontro"10B. 
Justamente para marcar essa perspectiva antropologica e que 
Binswanger, num artigo publicado em 1941, um ana antes da pu-
blicagao do Grundformen, Flfirmava: "0 amor e a amizade sao uma 
relagao originaria primaria, isto e, uma relagao originaria primaria 
antropologica que nao pode ser derivada mais longe"109. 0 proble-
ma seria, agora, desenvolver as nuangas de cada uma das formas 
da dualidade, tarefa imposslvel neste breve artigo. 
2.2. A modalidade plural 
As manifestagoes da modalidade dual - 0 amor e a amizade 
- sao os mod os da Presenga em que se exprime 0 autentico en-
contro interumano, ou seja, em que, de uma forma total ou parcial, 
a relagao entre 0 Eu e 0 Tu atingem sua plenitude. 
106ldem, ibidem, p. 227. 
107ldem, ibidem, p. 222. 
108ldem, ibidem, p. 222. 
109l. Binswanger, "Sprache, Liebe und Bildung" in Confinia Psychiatrica, vol. II, (1959) 
no. 3-4, pp. 139-140. Essa conferencia foi pronunciada pela primeira vez em lucerna, 
em 1941. 
73 
A segunda modalidade segundo a qual se articula a Pre-
senya humana, e que constitui 0 segundo eixo da antropologia 
binswangeriana, e a modalidade plural. A pluralidade e a forma 
fundamental ou 0 modo do ser humano em que duas ou mais 
pessoas estao em oposiyao a dualidade do Eu e TU110. Em todas 
as formas da pluralidade, 0 Tu nao se manifestara com toda a sua 
autenticidade. Aqui, 0 Dasein cai nas manifestayoes limitativas, 
de quantidade. Ele vai deixar-se somar (ser captado) nas rela-
yoes em que 0 Tu sera absorvido pelas relayoes de utilidade e de 
instrumentalidade111 , no sentido heideggeriano do termo. 
Se namodalidade dual e 0 encontro que rege todas as ma-
nifestayoes dessa modalidade, aqui, e a partir do principio de 
Discursividade que se articulam todas as formas da modalidade 
plural. A Discursividade e entendida por Binswanger como "fun-
damento do ser-no-mundo, tomado principal mente como um ser 
determinado pel a situayao final"112. A discursividade eo principio 
organizador que se estende sobre 0 ser humano limitado a fini-
tude. 
A modalidade plural sera percebida a partir dos diferentes 
modos do ser-com um outr~ ou muitos outros, isto e, as re/agoes 
que no cotidiano visam a desintegrar a verdadeira relayao entre 0 
Eu e 0 Tu. As formas de modalidade plural podem articular-se em 
duas direyoes: primeiro, a relayao do ser hUr.1ano com qualquer 
coisa, ou seja, com fenomenos que constituem 0 mundo circun-
dante (Umwelt); segundo, a relayao do ser humano com os ou-
tros seres humanos, ou seja, com fenomenos que constituem 0 
mundo social (Mitwelt). Resumindo, podemos dizer que 0 Mitsein 
se manifesta no Umwelt e no Mitwelt. 
110L. Binswanger. Grundformen .... p. 382. 
111 A utilidade (Zuhandenheit) e a instrumentalidade (Zeughaftigkeit) sao compreendidas 
como modos de apreensao de um ser. 
III L. Binswanger. Grundformen .... p. 347. 
74 
1 
j 
~ 
l 
lj , 
. ~ 
1 
'1 
1 
Cada modo de ser-com e uma maneira antropologica espe-
cifica de a Presenya se manifestar e revela a especificidade do 
ser-no-mundo cotidiano, isto e, a experiemcia da estrutura do ser 
e, com isso, da sua diferenciayao do ser, da multiplicidade do ser 
ou da determinayao do ser. Segundo Binswanger, 0 modo plural 
apresentara formas de manifestayoes, tanto no Umwelt como no 
Mitwe/t, impossiveis de serem aqui analisadas. 
2.3. A modalidade singular 
A singularidade e 0 terceiro eixo da antropologia binswangeria-
na. Ela revela 0 modo segundo 0 qual 0 Dasein (Presenya) esta 
em rela9ao consigo mesmo, ela e 0 ser-em-si-mesmo. Como os 
modos precedentes, a singularidade deve ser compreendida como 
uma dimensao do Dasein que esta sempre em relayao com as ou-
tras duas modalidades. Assim, a singularidade nao e um elemento 
numerico da pluralidade, porque a singularidade significa postura 
propria no mundo, qualquer coisa de excepcional113. 
Podemos encontrar duas manifestayoes da singularidade, ou 
melhor, duas maneiras diferentes de ela se explicitar. A primeira 
forma e 0 ser-em-diregao-de-si-mesmo (Das Zu-Sich-Selbst-Sein), 
isto e, ele se refere a suas manifestayoes concretas finitas, e por 
isso esta em estreita relayao com 0 modo da pluralidade. A segun-
da forma e 0 ser como tendencia a seu pr6prio fundamento (Sein-
-zum-Grunde). Cada uma dessas duas formas vai ter implicayoes 
diferentes. 
Aqui, tambern, como aconteceu no modo dual e no modo plu-
ral, existe um principio organizador antropologico que possibilita a 
explicitay80 das diferentes maneiras concretas do ser-no-mundo. 
1I3ldem. ibidem. p. 382. 
75 
A segunda modalidade segundo a qual se articula a Pre-
senya humana, e que constitui 0 segundo eixo da antropologia 
binswangeriana, e a modalidade plural. A pluralidade e a forma 
fundamental ou 0 modo do ser humano em que duas ou mais 
pessoas estao em oposiyao a dualidade do Eu e TU110. Em todas 
as formas da pluralidade, 0 Tu nao se manifestara com toda a sua 
autenticidade. Aqui, 0 Dasein cai nas manifestayoes limitativas, 
de quantidade. Ele vai deixar-se somar (ser captado) nas rela-
yoes em que 0 Tu sera absorvido pelas relayoes de utilidade e de 
instrumentalidade111 , no sentido heideggeriano do termo. 
Se namodalidade dual e 0 encontro que rege todas as ma-
nifestayoes dessa modalidade, aqui, e a partir do principio de 
Discursividade que se articulam todas as formas da modalidade 
plural. A Discursividade e entendida por Binswanger como "fun-
damento do ser-no-mundo, tomado principal mente como um ser 
determinado pel a situayao final"112. A discursividade eo principio 
organizador que se estende sobre 0 ser humano limitado a fini-
tude. 
A modalidade plural sera percebida a partir dos diferentes 
modos do ser-com um outr~ ou muitos outros, isto e, as re/agoes 
que no cotidiano visam a desintegrar a verdadeira relayao entre 0 
Eu e 0 Tu. As formas de modalidade plural podem articular-se em 
duas direyoes: primeiro, a relayao do ser hUr.1ano com qualquer 
coisa, ou seja, com fenomenos que constituem 0 mundo circun-
dante (Umwelt); segundo, a relayao do ser humano com os ou-
tros seres humanos, ou seja, com fenomenos que constituem 0 
mundo social (Mitwelt). Resumindo, podemos dizer que 0 Mitsein 
se manifesta no Umwelt e no Mitwelt. 
110L. Binswanger. Grundformen .... p. 382. 
111 A utilidade (Zuhandenheit) e a instrumentalidade (Zeughaftigkeit) sao compreendidas 
como modos de apreensao de um ser. 
III L. Binswanger. Grundformen .... p. 347. 
74 
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1 
'1 
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Cada modo de ser-com e uma maneira antropologica espe-
cifica de a Presenya se manifestar e revela a especificidade do 
ser-no-mundo cotidiano, isto e, a experiemcia da estrutura do ser 
e, com isso, da sua diferenciayao do ser, da multiplicidade do ser 
ou da determinayao do ser. Segundo Binswanger, 0 modo plural 
apresentara formas de manifestayoes, tanto no Umwelt como no 
Mitwe/t, impossiveis de serem aqui analisadas. 
2.3. A modalidade singular 
A singularidade e 0 terceiro eixo da antropologia binswangeria-
na. Ela revela 0 modo segundo 0 qual 0 Dasein (Presenya) esta 
em rela9ao consigo mesmo, ela e 0 ser-em-si-mesmo. Como os 
modos precedentes, a singularidade deve ser compreendida como 
uma dimensao do Dasein que esta sempre em relayaocom as ou-
tras duas modalidades. Assim, a singularidade nao e um elemento 
numerico da pluralidade, porque a singularidade significa postura 
propria no mundo, qualquer coisa de excepcional113. 
Podemos encontrar duas manifestayoes da singularidade, ou 
melhor, duas maneiras diferentes de ela se explicitar. A primeira 
forma e 0 ser-em-diregao-de-si-mesmo (Das Zu-Sich-Selbst-Sein), 
isto e, ele se refere a suas manifestayoes concretas finitas, e por 
isso esta em estreita relayao com 0 modo da pluralidade. A segun-
da forma e 0 ser como tendencia a seu pr6prio fundamento (Sein-
-zum-Grunde). Cada uma dessas duas formas vai ter implicayoes 
diferentes. 
Aqui, tambern, como aconteceu no modo dual e no modo plu-
ral, existe um principio organizador antropologico que possibilita a 
explicitay80 das diferentes maneiras concretas do ser-no-mundo. 
1I3ldem. ibidem. p. 382. 
75 
, . 
. , 
Na singularidade, esse principio organizador e 2 Existencia114• As-
sim, 0 Dasein se refere, aqui, a uma outra parte de si, isto e, a 
um outr~ papel que ele pode explicitar no mundo. A singularidade 
corresponde a revelag80 do mundo pr6prio (Eigenwelt) do ser hu-
mano. Segundo Binswanger, a Psicanalise e 0 metodo cientifico-
-empirico que nos ajuda a analisar 0 mundo pr6prio da Presenga. 
Conclusao 
o psiquiatra-fil6sofo deixa perceber, ao longo de toda a sua 
trajet6ria de vida, 0 esforgo que empregou para dar a Psiquiatria 
uma unidade e um status cientifico. Assim, 0 esforgo sobre-huma-
no travado com a ajuda do dialogo com as correntes do pensa-
mento filos6fico, psiquiatrico e psicol6gico de sua epoca 0 levou a 
se inspirar na Fenomenologia para realizar sua ambiciosa tarefa. 
Dessa maneira, Binswanger esta convencido de que s6 na 
reflex80 antropol6gica de inspirag80 fenomenol6gica existencial 
sera possivel repenSar a doenga mental. A pergunta sobre 0 modo 
de existir do homem sera capaz de fornecer a base s61ida para 
compreender 0 homem na sua cotidianidade. 
Assim, a elaborag80 da Daseinsanalyse, que nada mais e do 
que um metodo puramente antropol6gico de investigag80 que se 
traduz pelo exame e pela elucidag80 fenomenol6gica da essencia 
da Presenga humana, possibilita perceber 0 homem para alem da 
disting80 entre 0 S80 e 0 doente. 
A elaborag80 de sua antropologia fenomenol6gica existencial 
abre as portas para as analises psicopatol6gicas, e a doenga pode 
'14 Idem, ibidem, p, 383, Aqui, 0 sentido de existemcia e totalmente diferente daquele 
d~ Heidegger, porque, para Heidegger, a existencia e um principio ontol6gico. Em 
~In~~anger, 0 sentido d~ existencia deve ser compreendido na perspectiva antropol6gica: 
EXlstlren helsst dass sich Dasein als endliches, als je meines, stetig erstreckt, in der 
Existenz we~de ich der, der ich - als in das Sein Geworfener - je schon bin, namlich Ich-
Selbst, 1m relfendem, entschlossenen, fragenden Bodenfassem im Grunde", 
76 
ser compreendida como um modo-de-ser do homem, como uma 
postura que engaja toda a sua Presenga, superando uma concep-
g80 biol6gico-mecanicista da doenga mental. Esta aberto um novo 
caminho para 0 trabalho dos psiquiatras e psic610gos do nosso 
tempo. 
77 
, . 
. , 
Na singularidade, esse principio organizador e 2 Existencia114• As-
sim, 0 Dasein se refere, aqui, a uma outra parte de si, isto e, a 
um outr~ papel que ele pode explicitar no mundo. A singularidade 
corresponde a revelag80 do mundo pr6prio (Eigenwelt) do ser hu-
mano. Segundo Binswanger, a Psicanalise e 0 metodo cientifico-
-empirico que nos ajuda a analisar 0 mundo pr6prio da Presenga. 
Conclusao 
o psiquiatra-fil6sofo deixa perceber, ao longo de toda a sua 
trajet6ria de vida, 0 esforgo que empregou para dar a Psiquiatria 
uma unidade e um status cientifico. Assim, 0 esforgo sobre-huma-
no travado com a ajuda do dialogo com as correntes do pensa-
mento filos6fico, psiquiatrico e psicol6gico de sua epoca 0 levou a 
se inspirar na Fenomenologia para realizar sua ambiciosa tarefa. 
Dessa maneira, Binswanger esta convencido de que s6 na 
reflex80 antropol6gica de inspirag80 fenomenol6gica existencial 
sera possivel repenSar a doenga mental. A pergunta sobre 0 modo 
de existir do homem sera capaz de fornecer a base s61ida para 
compreender 0 homem na sua cotidianidade. 
Assim, a elaborag80 da Daseinsanalyse, que nada mais e do 
que um metodo puramente antropol6gico de investigag80 que se 
traduz pelo exame e pela elucidag80 fenomenol6gica da essencia 
da Presenga humana, possibilita perceber 0 homem para alem da 
disting80 entre 0 S80 e 0 doente. 
A elaborag80 de sua antropologia fenomenol6gica existencial 
abre as portas para as analises psicopatol6gicas, e a doenga pode 
'14 Idem, ibidem, p, 383, Aqui, 0 sentido de existemcia e totalmente diferente daquele 
d~ Heidegger, porque, para Heidegger, a existencia e um principio ontol6gico. Em 
~In~~anger, 0 sentido d~ existencia deve ser compreendido na perspectiva antropol6gica: 
EXlstlren helsst dass sich Dasein als endliches, als je meines, stetig erstreckt, in der 
Existenz we~de ich der, der ich - als in das Sein Geworfener - je schon bin, namlich Ich-
Selbst, 1m relfendem, entschlossenen, fragenden Bodenfassem im Grunde", 
76 
ser compreendida como um modo-de-ser do homem, como uma 
postura que engaja toda a sua Presenga, superando uma concep-
g80 biol6gico-mecanicista da doenga mental. Esta aberto um novo 
caminho para 0 trabalho dos psiquiatras e psic610gos do nosso 
tempo. 
77 
2a PARTE 
QUESTOES DE PSICOTERAPIA 
EXISTENCIAL 
2a PARTE 
QUESTOES DE PSICOTERAPIA 
EXISTENCIAL 
I , 
A RELA<;AO TERAPEUTICA NA PERSPECTIVA 
FENOMENOLOGICO-EXISTENCIAL 
A relayao entre 0 doente e 0 medico e uma questao que sem-
pre foi problematica, uma vez que sua dificuldade e seus impas-
ses transcorrem por todo 0 percurso,desse relacionamento ao 
longo da hist6ria da humanidade e que se estendeu na ciencia 
psicol6gica para a diade terapeuta-cliente. Na Psicologia clinica, 
a relay80 entre 0 cliante e 0 terapeuta e um dos pontos mais 
cruciais do tratamento psicol6gico, Esse esta no centro das pre-
ocupayoes dos te6ricos da PSicologia clinica, embora cada abor-
dagem psicol6gica 0 trate de forma diferenciada. As vezes uma 
perspectiva te6rica da Psicologia enfatiza mais a questao da re-
layao em detrimento do processo. Outras abordagens nao privi-
legiam a relayao terapeutica (RT), deixando-a em segundo plano, 
ate mesmo em ultimo lugar, na organizayao te6rica do sistema 
terapeutico. No caso da abordagem fenomenoI6gico-existencial, 
a qualidade da relayao e essencial para 0 sucesso ou nao do 
tratamento psicol6gico. E 0 ponto nodal com base no qual se 
constr6i todo 0 trabalho clfnico. 
Assim, 0 nosso objetivo aqui e refletir sobre a especificida-
de dessa relayao humana, visto que toda relayao terapeutica 
e humana, construida por meio da dialetizayao do profissional 
de Psicologia e da pessoa que sofre e vem buscar ajuda desse 
profissional. Temos que admitir, porem, que essa relayao e um 
pouco especial, ja que ocorrera dentro de determinadas circuns-
tfmcias e com algumas caracteristicas especificas. 
Oesse modo, uma definiyao preliminar seria a de que a rela-
yao terapeutica e um encontro entre duas pessoas, no qual um 
profissional qualificado ajuda outro ser humane a se conhecer, a 
se desvencilhar de suas dificuldades e a encontrar um caminho 
melhor para a sua vida. 
81 
I , 
A RELA<;AO TERAPEUTICA NA PERSPECTIVA 
FENOMENOLOGICO-EXISTENCIAL 
A relayao entre 0 doente e 0 medico e uma questao que sem-
pre foi problematica, uma vez que sua dificuldade e seus impas-
ses transcorrem por todo 0 percurso,desse relacionamento ao 
longo da hist6ria da humanidade e que se estendeu na ciencia 
psicol6gica para a diade terapeuta-cliente. Na Psicologia clinica, 
a relay80 entre 0 cliante e 0 terapeuta e um dos pontos mais 
cruciais do tratamento psicol6gico, Esse esta no centro das pre-
ocupayoes dos te6ricos da PSicologiaclinica, embora cada abor-
dagem psicol6gica 0 trate de forma diferenciada. As vezes uma 
perspectiva te6rica da Psicologia enfatiza mais a questao da re-
layao em detrimento do processo. Outras abordagens nao privi-
legiam a relayao terapeutica (RT), deixando-a em segundo plano, 
ate mesmo em ultimo lugar, na organizayao te6rica do sistema 
terapeutico. No caso da abordagem fenomenoI6gico-existencial, 
a qualidade da relayao e essencial para 0 sucesso ou nao do 
tratamento psicol6gico. E 0 ponto nodal com base no qual se 
constr6i todo 0 trabalho clfnico. 
Assim, 0 nosso objetivo aqui e refletir sobre a especificida-
de dessa relayao humana, visto que toda relayao terapeutica 
e humana, construida por meio da dialetizayao do profissional 
de Psicologia e da pessoa que sofre e vem buscar ajuda desse 
profissional. Temos que admitir, porem, que essa relayao e um 
pouco especial, ja que ocorrera dentro de determinadas circuns-
tfmcias e com algumas caracteristicas especificas. 
Oesse modo, uma definiyao preliminar seria a de que a rela-
yao terapeutica e um encontro entre duas pessoas, no qual um 
profissional qualificado ajuda outro ser humane a se conhecer, a 
se desvencilhar de suas dificuldades e a encontrar um caminho 
melhor para a sua vida. 
81 
Para abordar a especificidadf: da rela<;ao human a na pers-
pectiva fenomenologico-existencial, dividiremos nossa exposi-
<;130 em tres partes. Em primeiro lugar, vamos procurar refletir 
sobre 0 que e uma rela<;13o humana e quais os elementos que 
compoem uma rela<;13o tipicamente humana. Oai, surgira a dis-
cuss130 da intersubjetividade, vivenciada por meio do encontro 
interpessoal, que e a caracteristica central da relaC;13o terapeuti-
ca na perspectiva existencial. Assim, 0 segundo momenta cons-
tituir-se-a na explicita<;13o das caracteristicas do que seja um 
encontro interpessoal. Finalmente, abordaremos a especificida-
de da RT, mostrando quais as caracteristicas principais dessa 
relaC;13o. 
1 0 QUE E UMA RELACAO HUMANA? 
A primeira questao que surge e a seguinte: 0 que caracteriza 
uma rela<;13o humana? E possivel definirmos 0 que vema ser 
uma relaC;ao humana? A reposta pode parecer simples, mas e 
mais complexa do que podemos imaginar. 0 obvio nem sempre 
e simples. De modo geral, uma rela<;13o humana, estabelecida 
entre dois seres livres que buscam explicitar 0 especifico do ser 
humano, pode ser definida como uma Iiga<;13o em que ocorra 
uma troca de conteudos humanos e na qual a comunica<;ao en-
tre essas duas pessoas possibilita 0 desvelamento de significa-
dos colocados por ambas as partes. 
Assim, para caracterizar, de forma bem explicita, 0 que vem 
a ser uma rela<;13o humana, temos que responder a duas ques-
toes. A primeira e sobre as condi<;oes previas para que se possa 
falar de uma rela<;13o humana. A segunda seria elencar e refletir 
sobre os elementos estruturais da rela<;13o. 
Como condi<;oes previas para que uma rela<;13o entre duas 
pessoas possa ser compreendida como humana, podemos des-
tacar tres pontos. 
82 
o conhecimento do outro como sujeito. Cada um de nos e 
dono de sua pr6pria vida, isto e, funda a pr6pria existencia e e res-
ponsavel pelos seus atos. Em palavras corriqueiras, dizemos que 
e "dono do seu nariz". Ora, isso implica que devemos dar rumo a 
nossa vida, e nao eo outro que devera ditar essa dire<;13o~Re­
conhecer 0 outro como sujeito dos proprios atos significa que nao 
somos n6s que devemos dizer ao outro 0 que ele deve fazer; pelo 
contrario, toda a busca e a concretiza<;ao da dire<;ao de vida passa 
pela capacidade de decisao de cada um de n6s. 
Assim, uma mae deve ajudar 0 filho para que ele possa, ao 
longo a vida, ir se desapegando e ser responsavel pel os seus 
proprios atos .. Os pais n130 devem assumir a vida de seus filhos, 
mas, sim, ajuda-Ios a que, pouco a pouco, encontrem 0 significado 
e 0 sentido de seus atos e, dessa forma, construam a propria exis-
tencia. Muitas vezes, queremos palpitar na vida de nossos filhos, 
esquecendo-nos de que 0 melhor e que eles por si s6s encontrem 
a dire<;13o de sua vida. Reconhecer 0 outr~ como sujeito e reco-
nhecer que cada ser humano e capaz de encontrar e definir 0 seu 
proprio rumo. 0 sentido da vida nao pode ser imposto ou colocado 
pelo outr~. Cada urn deve construi-Io, valendo-se de suas mais 
simples op<;oes do dia-a-dia. 
A aceita<;13o do outr~ como ele se apresenta e a segunda con-
di<;13o previa para podermos construir uma rela<;80 humana. Reco-
nhecer 0 outr~ e aceitar 0 diferente na nossa vida. Isso s6 acon-
tece se somos capazes de abrir-nos ao novo, as novidades do 
cotidiano. Se temos sempre a postura de impor a alguem 0 que 
pensamos, muitas vezes determinando sua maneira de ser, nao 
possuimos a abertura para acolher 0 diferente de n6s, a novidade 
que esse outro possa trazer em uma rela<;80. 
No dia-a-dia, na educa<;13o familiar, com as melhores inten-
<;oes, os pais muitas vezes querem obrigar que 0 filho, principal-
mente 0 adolescente, pense e aja de acordo com os seus valores. 
83 
Para abordar a especificidadf: da rela<;ao human a na pers-
pectiva fenomenologico-existencial, dividiremos nossa exposi-
<;130 em tres partes. Em primeiro lugar, vamos procurar refletir 
sobre 0 que e uma rela<;13o humana e quais os elementos que 
compoem uma rela<;13o tipicamente humana. Oai, surgira a dis-
cuss130 da intersubjetividade, vivenciada por meio do encontro 
interpessoal, que e a caracteristica central da relaC;13o terapeuti-
ca na perspectiva existencial. Assim, 0 segundo momenta cons-
tituir-se-a na explicita<;13o das caracteristicas do que seja um 
encontro interpessoal. Finalmente, abordaremos a especificida-
de da RT, mostrando quais as caracteristicas principais dessa 
relaC;13o. 
1 0 QUE E UMA RELACAO HUMANA? 
A primeira questao que surge e a seguinte: 0 que caracteriza 
uma rela<;13o humana? E possivel definirmos 0 que vema ser 
uma relaC;ao humana? A reposta pode parecer simples, mas e 
mais complexa do que podemos imaginar. 0 obvio nem sempre 
e simples. De modo geral, uma rela<;13o humana, estabelecida 
entre dois seres livres que buscam explicitar 0 especifico do ser 
humano, pode ser definida como uma Iiga<;13o em que ocorra 
uma troca de conteudos humanos e na qual a comunica<;ao en-
tre essas duas pessoas possibilita 0 desvelamento de significa-
dos colocados por ambas as partes. 
Assim, para caracterizar, de forma bem explicita, 0 que vem 
a ser uma rela<;13o humana, temos que responder a duas ques-
toes. A primeira e sobre as condi<;oes previas para que se possa 
falar de uma rela<;13o humana. A segunda seria elencar e refletir 
sobre os elementos estruturais da rela<;13o. 
Como condi<;oes previas para que uma rela<;13o entre duas 
pessoas possa ser compreendida como humana, podemos des-
tacar tres pontos. 
82 
o conhecimento do outro como sujeito. Cada um de nos e 
dono de sua pr6pria vida, isto e, funda a pr6pria existencia e e res-
ponsavel pelos seus atos. Em palavras corriqueiras, dizemos que 
e "dono do seu nariz". Ora, isso implica que devemos dar rumo a 
nossa vida, e nao eo outro que devera ditar essa dire<;13o~Re­
conhecer 0 outro como sujeito dos proprios atos significa que nao 
somos n6s que devemos dizer ao outro 0 que ele deve fazer; pelo 
contrario, toda a busca e a concretiza<;ao da dire<;ao de vida passa 
pela capacidade de decisao de cada um de n6s. 
Assim, uma mae deve ajudar 0 filho para que ele possa, ao 
longo a vida, ir se desapegando e ser responsavel pel os seus 
proprios atos .. Os pais n130 devem assumir a vida de seus filhos, 
mas, sim, ajuda-Ios a que, pouco a pouco, encontrem 0 significado 
e 0 sentido de seus atos e, dessa forma, construam a propria exis-
tencia. Muitas vezes, queremos palpitar na vida de nossos filhos, 
esquecendo-nos de que 0 melhor e que eles por si s6s encontrem 
a dire<;13o de sua vida. Reconhecer 0 outr~ como sujeito e reco-
nhecer que cada ser humanoe capaz de encontrar e definir 0 seu 
proprio rumo. 0 sentido da vida nao pode ser imposto ou colocado 
pelo outr~. Cada urn deve construi-Io, valendo-se de suas mais 
simples op<;oes do dia-a-dia. 
A aceita<;13o do outr~ como ele se apresenta e a segunda con-
di<;13o previa para podermos construir uma rela<;80 humana. Reco-
nhecer 0 outr~ e aceitar 0 diferente na nossa vida. Isso s6 acon-
tece se somos capazes de abrir-nos ao novo, as novidades do 
cotidiano. Se temos sempre a postura de impor a alguem 0 que 
pensamos, muitas vezes determinando sua maneira de ser, nao 
possuimos a abertura para acolher 0 diferente de n6s, a novidade 
que esse outro possa trazer em uma rela<;80. 
No dia-a-dia, na educa<;13o familiar, com as melhores inten-
<;oes, os pais muitas vezes querem obrigar que 0 filho, principal-
mente 0 adolescente, pense e aja de acordo com os seus valores. 
83 
.. , 
Esquecem que 0 mundo esta em continuas transforma<;:oes, e que 
algumas posturas diante da vida se modificam, porem nao aceitam 
as transforma<;:oes. Um exemplo tipico sao as posi<;:oes dos jovens 
com respeito a sexualidade. 0 fenomeno do "ficar" e tfpico da 
epoca atual. Muitos pais criticam com preconceito esse fenomeno 
contemporaneo, desprezando-o, sem ver como que 0 jovem vive 
esse momento, isto e, a viv€mcia de sua sexualidade. Em outras 
palavras, isso significa que os pais querem impor ao jovem a sua 
maneira de viver a sexualidade, pr6pria de seu tempo. Assim, acei-
tar 0 outro como ele e implica profundo respeito por ele. A pessoa 
pode n80 concordar com a pOSi<;:80 do outro, mas deve respeita-Ia 
como diferente da sua. Como dissemos, aceitar 0 outro e respeitar 
o diferente, mesmo que com isso nao consinta. 
A terceira condi<;:80 previa para que possamos caracterizar uma 
rela<;:80 humana e a percepg30 de que na rela<;:ao esteja presente 
certa mobilizag80 dos afetos. A dimens80 afetiva e a responsavel 
pela criag80 do vinculo entre duas pessoas, aspectos que vamos 
analisar mais adiante. Toda representa<;:80 da realidade deve vir 
acompanhada de um registro afetivo, isto e, de uma ressonancia 
afetiva. Assim, a captag80 do outro envolve sempre um registro 
de como o· outro esta sendo acolhido dentro de n6s, de como 0 
estamos sentindo no nosso corag80. A esse movimento de sentir 
o outro e que chamamos mobiliza<;8o dos afetos. 
Quando somos criangas, expressamcs com mais naturalidade 
essa "afetag80", visto sermos mais espontaneos. Com 0 passar 
dos anos, vamos aprendendo que nem sempre podemos ex pres-
sar 0 que sentimos, e comegamos a esconder nossas emogoes e 
nossos sentimentos. Numa relagao humana aut€mtica, e neces-
sario que percebamos quais os afetos que est80 circulando. Uma 
relag80 humana sem registro afetivo nao e uma relagao humana, 
e uma relag80 entre do is computadores, na qual a ressonancia do 
outro nao faz parte da relag80. Mobilizag80 dos afetos e deixar que 
84 
o outro repercuta dentro de n6s, procurando compreender 0 que 
esse movimento esta significando. 
A segunda questao que nos ajudara a entender 0 que seja uma 
relagao humana e explicitarmos os elementos estruturais da rela-
gao, que sao quatro, a saber: 0 encontro, 0 dialogo, a reciprocida-
de e 0 vinculo. 
Nem toda relagao humana se da na forma do encontro. Este s6 
sera possivel se urn dos sujeitos da rel~gao perceber, de maneira 
clara e inequivoca, que esta diante de outro sujeito. 0 encontro 
caracterizar-se-a como uma dialetica entre as pessoas que com-
poem a relag80, isto e, que pelo men os um dos participantes se 
abra a experiencia do outro. Somente com base na disponibilidade 
de aceitag80 e de respeito, aspectos aqui ja analisados, e que os 
participantes podem vivenciar 0 encontro inter-humano. 
o encontro e a experiencia em que, valendo-nos da relagao 
com outro humano, aprendemos algo e crese;emos existencial-
mente. Ao Ion go da vida, podemos distinguir varios tip03 de en-
c~ntro, nos quais 0 elemento da percepgao do outro e do tipo de 
resposta determinam a qualidade e a especificidade d::. encontro. 
Entralgo (1988) desenvolve, de forma brilhante, no seu livro Teo-
ria y realidad del outro, essas caracteristicas que especificam 0 
encontro. 
o segundo elemento estrutural de uma relag80 humana e 0 
dialogo. Este especifica 0 tipo de comunicag80 que se vincula en-
tre as pessoas que estabelecem 0 encontro, mas nem sempre um 
encontro ou uma relag80 humana se fundamenta nele. 0 dialogo, 
para acontecer, exige que um dos sujeitos esteja aberto ao que 
o outro possa trazer para essa relag80. Podemos acolher 0 ou-
tro, mas, em vez de estarmos atentos ao que ele vai nos dizer, 
acabamos impondo 0 nosso ponto de vista. Fundamentalmente 
o dialogo tem como fruto uma posigao nova a partir do encontro. 
Dialogar com alguem e estar aberto ao que esse tem a contribuir 
na situag80 que se apresenta. 
85 
.. , 
Esquecem que 0 mundo esta em continuas transforma<;:oes, e que 
algumas posturas diante da vida se modificam, porem nao aceitam 
as transforma<;:oes. Um exemplo tipico sao as posi<;:oes dos jovens 
com respeito a sexualidade. 0 fenomeno do "ficar" e tfpico da 
epoca atual. Muitos pais criticam com preconceito esse fenomeno 
contemporaneo, desprezando-o, sem ver como que 0 jovem vive 
esse momento, isto e, a viv€mcia de sua sexualidade. Em outras 
palavras, isso significa que os pais querem impor ao jovem a sua 
maneira de viver a sexualidade, pr6pria de seu tempo. Assim, acei-
tar 0 outro como ele e implica profundo respeito por ele. A pessoa 
pode n80 concordar com a pOSi<;:80 do outro, mas deve respeita-Ia 
como diferente da sua. Como dissemos, aceitar 0 outro e respeitar 
o diferente, mesmo que com isso nao consinta. 
A terceira condi<;:80 previa para que possamos caracterizar uma 
rela<;:80 humana e a percepg30 de que na rela<;:ao esteja presente 
certa mobilizag80 dos afetos. A dimens80 afetiva e a responsavel 
pela criag80 do vinculo entre duas pessoas, aspectos que vamos 
analisar mais adiante. Toda representa<;:80 da realidade deve vir 
acompanhada de um registro afetivo, isto e, de uma ressonancia 
afetiva. Assim, a captag80 do outro envolve sempre um registro 
de como o· outro esta sendo acolhido dentro de n6s, de como 0 
estamos sentindo no nosso corag80. A esse movimento de sentir 
o outro e que chamamos mobiliza<;8o dos afetos. 
Quando somos criangas, expressamcs com mais naturalidade 
essa "afetag80", visto sermos mais espontaneos. Com 0 passar 
dos anos, vamos aprendendo que nem sempre podemos ex pres-
sar 0 que sentimos, e comegamos a esconder nossas emogoes e 
nossos sentimentos. Numa relagao humana aut€mtica, e neces-
sario que percebamos quais os afetos que est80 circulando. Uma 
relag80 humana sem registro afetivo nao e uma relagao humana, 
e uma relag80 entre do is computadores, na qual a ressonancia do 
outro nao faz parte da relag80. Mobilizag80 dos afetos e deixar que 
84 
o outro repercuta dentro de n6s, procurando compreender 0 que 
esse movimento esta significando. 
A segunda questao que nos ajudara a entender 0 que seja uma 
relagao humana e explicitarmos os elementos estruturais da rela-
gao, que sao quatro, a saber: 0 encontro, 0 dialogo, a reciprocida-
de e 0 vinculo. 
Nem toda relagao humana se da na forma do encontro. Este s6 
sera possivel se urn dos sujeitos da rel~gao perceber, de maneira 
clara e inequivoca, que esta diante de outro sujeito. 0 encontro 
caracterizar-se-a como uma dialetica entre as pessoas que com-
poem a relag80, isto e, que pelo men os um dos participantes se 
abra a experiencia do outro. Somente com base na disponibilidade 
de aceitag80 e de respeito, aspectos aqui ja analisados, e que os 
participantes podem vivenciar 0 encontro inter-humano. 
o encontro e a experiencia em que, valendo-nos da relagao 
com outro humano, aprendemos algo e crese;emos existencial-
mente. Ao Ion go da vida, podemos distinguir varios tip03 de en-
c~ntro, nos quais0 elemento da percepgao do outro e do tipo de 
resposta determinam a qualidade e a especificidade d::. encontro. 
Entralgo (1988) desenvolve, de forma brilhante, no seu livro Teo-
ria y realidad del outro, essas caracteristicas que especificam 0 
encontro. 
o segundo elemento estrutural de uma relag80 humana e 0 
dialogo. Este especifica 0 tipo de comunicag80 que se vincula en-
tre as pessoas que estabelecem 0 encontro, mas nem sempre um 
encontro ou uma relag80 humana se fundamenta nele. 0 dialogo, 
para acontecer, exige que um dos sujeitos esteja aberto ao que 
o outro possa trazer para essa relag80. Podemos acolher 0 ou-
tro, mas, em vez de estarmos atentos ao que ele vai nos dizer, 
acabamos impondo 0 nosso ponto de vista. Fundamentalmente 
o dialogo tem como fruto uma posigao nova a partir do encontro. 
Dialogar com alguem e estar aberto ao que esse tem a contribuir 
na situag80 que se apresenta. 
85 
· , 
Numa rela«ao familiar, dialogar com 0 filho e buscar um con-
senso entre a pr6pria posi«ao e a posi«ao as vezes conflitante do 
outro. Um pai que entra em acordo com 0 filho sobre 0 que deve 
ser feito no fim de semana, por exemplo, permite que se decida se 
todos vaG viajar juntos, ou separados, para atender aos desejos de 
cada um, 0 que deve ser fruto da conversa entre ambos e do acer-
to entre si. Nem 0 pai imp6e que todos devam viajar juntos, como 
tambem 0 horario da viagem, nem 0 filho radicaliza que nao vai 
viajar em momento algum. Pode ser que todos iraQ viajar, porem 
cada um 0 fara em dias e horarios diferentes. Essa flexibilidade de 
ambas as partes e que exemplifica 0 que seja 0 dialogo. 
o terceiro elemento e a reciprocidade. Talvez possamos dizer 
que ela seja a base para 0 dialogo, mas entendemos que recipro-
cidade em rela«ao com 0 outro nao e estarmos somente ao lado 
desse ~Utro, mas sermos envolvidos por ele. Podemos estar junto 
com 0 ~Utro, ao seu lado, como em um campo de futebol, sem 
estarmos vivenciando a reciprocidade. Esta se expressa no mo-
mento que envolvemos e somos envolvidos. 
Binswanger, querendo mostrar que a reciprocidade e algo es-
sencial na rela«80 e partindo das analises de Heidegger sobre 0 
MITSEIN, isto e, 0 ser com 0 outro, cunhou uma expressao mais 
significativa, ou seja, 0 termo MITEINANDERSEIN, que, numa tra-
du«ao ao pe da letra, significaria estar com 0 outro lado a lado. Ele 
queria, porem, que isso significasse mais, isto e, mostrar que nao 
basta estar ao lado do outro, mas e necessario entrar na intimi-
dade desse outro, participar da sua vida . A tradu«ao deveria ser 
desta forma: ser-em-relac;8o-de-reciprocidade. 
Assim, reciprocidade e participar da existencia do outro. N6s 
nao s6 tomamos conhecimento da vida do outro, mas nos pre-
ocupamos com ele. Se isso for feito pelos dois componentes da 
rela«80, temos a explicita«ao no mais alto grau do que seja entrar 
em rela«ao com 0 outro. Viver em reciprocidade e estar sempre 
86 
! 
1 
:; 
participando da vida do outro. Participar. porem, nao e dirigir a vida 
desse outro. Um pai que participa da vida do filho e alguem que 
sa be 0 que 0 filho esta fazendo e as vezes pondera com ele qual 
o melhor caminho a seguir, mas nao dirige ou determina 0 que 0 
ele deva ou nao fazer. 
Se a reciprocidade for vivenciada na sua pura autenticidade, 
ela gerara 0 vinculo, nosso quarto elemento estrutural da rela«ao 
humana. 0 vinculo afetivo serve para sedimentar a rela«ao. E ele 
que dara a qualidade dessa rela«ao, uma vez que a afetividade e 
responsavel pela intensidade e pela qualidade do relacionamento. 
Podemos dizer que a afetividade na vida psiquica e como 0 sal na 
comida e "comida sem sal e comida sem gosto". Rela«ao humana 
sem vinculo afetivo e como uma rela«8o entre duas maquinas, ob-
viamente sem sentimentos. 
o filme frances "Rela«ao Pornografica" expressa, de forma 
bem clara e nitida, 0 que e 0 surgimento do afeto dentro de uma 
rela«ao e 0 vinculo que vai se estabelecendo entre os parceiros. 
No inicio do filme, os dois protagonistas se encontram s6 para vi-
venciar suas fantasias sexuais. Com 0 tempo, e com a continui-
dade dos encontros, vai surgindo um sentimento que sedimenta a 
liga«ao. Embora eles nao quisessem revelar os nomes nem saber 
onde cada um morava, etc., 0 surgimento do sentimento vai crian-
do 0 vinculo que eles nao estavam querendo gerar, e lidar com 
esse vinculo passa a ser profundamente problematico. 
Por exemplo, na rela«ao com uma prostituta, nao se coloca a 
questao do vinculo, porque 0 afeto geraria essa condi«ao, e isso 
trair!a a natureza da rela«ao. E uma rela«ao que se prima por nao 
se fundamentar em sentimentos, na afetividade. 0 que queremos 
dizer e que 0 que caracterizaria uma rela«ao humana e 0 estabele-
cimento do vinculo como 0 elemento de liga«ao entre dois sujeitos. 
A afetividade e a aspecto da vida humana que possibilita a vincu-
la«ao e a sedimenta«ao dessa entre os parceiros. 
87 
· , 
Numa rela«ao familiar, dialogar com 0 filho e buscar um con-
senso entre a pr6pria posi«ao e a posi«ao as vezes conflitante do 
outro. Um pai que entra em acordo com 0 filho sobre 0 que deve 
ser feito no fim de semana, por exemplo, permite que se decida se 
todos vaG viajar juntos, ou separados, para atender aos desejos de 
cada um, 0 que deve ser fruto da conversa entre ambos e do acer-
to entre si. Nem 0 pai imp6e que todos devam viajar juntos, como 
tambem 0 horario da viagem, nem 0 filho radicaliza que nao vai 
viajar em momento algum. Pode ser que todos iraQ viajar, porem 
cada um 0 fara em dias e horarios diferentes. Essa flexibilidade de 
ambas as partes e que exemplifica 0 que seja 0 dialogo. 
o terceiro elemento e a reciprocidade. Talvez possamos dizer 
que ela seja a base para 0 dialogo, mas entendemos que recipro-
cidade em rela«ao com 0 outro nao e estarmos somente ao lado 
desse ~Utro, mas sermos envolvidos por ele. Podemos estar junto 
com 0 ~Utro, ao seu lado, como em um campo de futebol, sem 
estarmos vivenciando a reciprocidade. Esta se expressa no mo-
mento que envolvemos e somos envolvidos. 
Binswanger, querendo mostrar que a reciprocidade e algo es-
sencial na rela«80 e partindo das analises de Heidegger sobre 0 
MITSEIN, isto e, 0 ser com 0 outro, cunhou uma expressao mais 
significativa, ou seja, 0 termo MITEINANDERSEIN, que, numa tra-
du«ao ao pe da letra, significaria estar com 0 outro lado a lado. Ele 
queria, porem, que isso significasse mais, isto e, mostrar que nao 
basta estar ao lado do outro, mas e necessario entrar na intimi-
dade desse outro, participar da sua vida . A tradu«ao deveria ser 
desta forma: ser-em-relac;8o-de-reciprocidade. 
Assim, reciprocidade e participar da existencia do outro. N6s 
nao s6 tomamos conhecimento da vida do outro, mas nos pre-
ocupamos com ele. Se isso for feito pelos dois componentes da 
rela«80, temos a explicita«ao no mais alto grau do que seja entrar 
em rela«ao com 0 outro. Viver em reciprocidade e estar sempre 
86 
! 
1 
:; 
participando da vida do outro. Participar. porem, nao e dirigir a vida 
desse outro. Um pai que participa da vida do filho e alguem que 
sa be 0 que 0 filho esta fazendo e as vezes pondera com ele qual 
o melhor caminho a seguir, mas nao dirige ou determina 0 que 0 
ele deva ou nao fazer. 
Se a reciprocidade for vivenciada na sua pura autenticidade, 
ela gerara 0 vinculo, nosso quarto elemento estrutural da rela«ao 
humana. 0 vinculo afetivo serve para sedimentar a rela«ao. E ele 
que dara a qualidade dessa rela«ao, uma vez que a afetividade e 
responsavel pela intensidade e pela qualidade do relacionamento. 
Podemos dizer que a afetividade na vida psiquica e como 0 sal na 
comida e "comida sem sal e comida sem gosto". Rela«ao humana 
sem vinculo afetivo e como uma rela«8o entre duas maquinas, ob-
viamente sem sentimentos. 
o filme frances "Rela«ao Pornografica" expressa, de forma 
bem clara e nitida, 0 que e 0 surgimento do afeto dentro de umarela«ao e 0 vinculo que vai se estabelecendo entre os parceiros. 
No inicio do filme, os dois protagonistas se encontram s6 para vi-
venciar suas fantasias sexuais. Com 0 tempo, e com a continui-
dade dos encontros, vai surgindo um sentimento que sedimenta a 
liga«ao. Embora eles nao quisessem revelar os nomes nem saber 
onde cada um morava, etc., 0 surgimento do sentimento vai crian-
do 0 vinculo que eles nao estavam querendo gerar, e lidar com 
esse vinculo passa a ser profundamente problematico. 
Por exemplo, na rela«ao com uma prostituta, nao se coloca a 
questao do vinculo, porque 0 afeto geraria essa condi«ao, e isso 
trair!a a natureza da rela«ao. E uma rela«ao que se prima por nao 
se fundamentar em sentimentos, na afetividade. 0 que queremos 
dizer e que 0 que caracterizaria uma rela«ao humana e 0 estabele-
cimento do vinculo como 0 elemento de liga«ao entre dois sujeitos. 
A afetividade e a aspecto da vida humana que possibilita a vincu-
la«ao e a sedimenta«ao dessa entre os parceiros. 
87 
2 A RELACAo INTERPESSOAL 
Se num primeiro momenta analisamos 0 que constitui uma re-
la<;ao humana, temos que destacar que existem varias possibilida-
des existenciais e formas diferentes de se concretizar uma rela<;ao 
humana. A questao que nos interessa, aqui, e saber se algumas 
dessas formas de expressividade do encontro humano podem ser 
compreendidas como uma rela<;ao terapeutica. Pois, 0 que nos 
move agora e verificarmos se existe um tipo especial, uma forma 
especifica que poderia ser pr6pria de uma RT. 
Bucher (1989), em um dos capitulos de seu livro A psicoterapia 
pe/a fa/a, analisa nove tipos de rela<;ao psicol6gica, destacando 
que somente a rela<;ao de apoio e a rela<;ao interpessoal subjetiva 
poderiam ser consideradas como rela<;6es terapeuticas. Sua ana-
lise pode ser entendida como uma fenomenologia das rela<;6es 
psicol6gicas e terapeuticas, ja que origina (OU principia) da rela-
<;ao na qual a formalidade esta mais presente, indo ate 0 tipo de 
rela<;ao em que 0 engajamento subjetivo e 0 elemento essencial. 
Na perspectiva fenomenoI6gico-existencial, quanto maior for 0 en-
volvimento subjetivo de urn dos parceiros, isto e, do cliente, mais a 
rela<;ao sera considerada terapeutica. Por outr~ lado, quanto maior 
for 0 grau de formalidade, mais longe estaremos de uma rela<;ao 
terapeutica. A rela<;ao medica, que nao entra em conteudos subje-
tivos e que s6 fique na analise da doen<;a com a respectiva prescri-
<;ao dos medicamentos, deve ser considerada uma rela<;ao formal 
ou "cientffica". 
Segundo 0 mesmo autor, uma rela<;ao pedag6gica construida 
em cima de mera transmissao do conhecimento deve ser com-
preendida, tambem, como uma rela<;ao nao-subjetiva, visto que 
ai nao se entra nas quest6es existenciais de qualquer membro 
da diade, fixando-se somente na transmissao do saber. A rela<;ao 
terapeutica devera por excelencia apoiar-se em conteudos subje-
tivos. Essa, sim, segundo Bucher (1989, p. 117), sera uma rela<;ao 
88 
psicoterapeutica propriamente dita, uma vez que "esquadrinha 0 
material subjetivo do paciente" para ajuda-Io a tomar consciencia e 
posse desse material e, logo, redirecionar a sua existencia. 
Embora 0 conteudo subjetivo, aqui presente, seja s6 de um 
dos membros da rela<;ao, caso haja troca em um mesmo'nivel'dos 
conteudos subjetivos, teremos nao mais uma rela<;ao propriamen-
te psicoterapeutica, mas, em muitos casos, uma rela<;ao amorosa, 
que pode ser terapeutica, mas nao em rela<;ao psicoterapica, com 
as caracterfsticas que iremos desenvolver mais adiante. Falar dos 
elementos tecnicos envolvidos numa rela<;ao pSicoterapica e tra-
tar de aspectos estrategicos e das tecnicas de interven<;ao, 0 que 
foge um pouco de nossa reflexao, que e 56 a de explicitar a origi-
nalidade da rela<;ao terapeutica na perspectiva fenomenol6gico-
-existencial. 
A pergunta que surge agora e: sera possivel encontrar na exis-
tencia alguma rela<;ao humana que possLla caracteristicas pr6prias 
de uma rela<;ao psicoterapica? A nosso ver, a rela<;ao interpessoal 
estrutu~ada entre a mae e 0 bebe pode nos ajudar a entender al-
gumas- das dimens6es necessarias, quando falarmos da rela<;ao 
psicoterapica. A rela<;ao da mae com 0 seu bebe aponta para pos-
turas e vivencias muito pr6prias, porem muito semelhantes com 0 
que se passa em uma rela<;ao psicoterapica. 
Em primeiro lugar, na rela<;ao mae-bebe, a mae se caracte-
riza como 0 ambiente facilitador, pois e por meio da adapta<;ao 
das necessidades do bebe que ela aparece como a facilitadora do 
processo de amadurecimento que pertence a ele. "Ela e suficiente 
boa porque atende, ao bebe, na medida exata das necessidades 
deste, e nao de suas pr6prias necessidades, como, por exemplo, 
a de ser boa ou muito boa" (DIAS, 2003, p. 133). Veja que a pers-
pectiva de Winnicott, ao falar do relacionamento dessa diade, e a 
de que se "trata de "adapta<;ao a necessidade" e nao de satisfa<;ao 
de desejos" (DIAS, 2003, p. 133). E toda uma perspectiva de aju-
89 
2 A RELACAo INTERPESSOAL 
Se num primeiro momenta analisamos 0 que constitui uma re-
la<;ao humana, temos que destacar que existem varias possibilida-
des existenciais e formas diferentes de se concretizar uma rela<;ao 
humana. A questao que nos interessa, aqui, e saber se algumas 
dessas formas de expressividade do encontro humano podem ser 
compreendidas como uma rela<;ao terapeutica. Pois, 0 que nos 
move agora e verificarmos se existe um tipo especial, uma forma 
especifica que poderia ser pr6pria de uma RT. 
Bucher (1989), em um dos capitulos de seu livro A psicoterapia 
pe/a fa/a, analisa nove tipos de rela<;ao psicol6gica, destacando 
que somente a rela<;ao de apoio e a rela<;ao interpessoal subjetiva 
poderiam ser consideradas como rela<;6es terapeuticas. Sua ana-
lise pode ser entendida como uma fenomenologia das rela<;6es 
psicol6gicas e terapeuticas, ja que origina (OU principia) da rela-
<;ao na qual a formalidade esta mais presente, indo ate 0 tipo de 
rela<;ao em que 0 engajamento subjetivo e 0 elemento essencial. 
Na perspectiva fenomenoI6gico-existencial, quanto maior for 0 en-
volvimento subjetivo de urn dos parceiros, isto e, do cliente, mais a 
rela<;ao sera considerada terapeutica. Por outr~ lado, quanto maior 
for 0 grau de formalidade, mais longe estaremos de uma rela<;ao 
terapeutica. A rela<;ao medica, que nao entra em conteudos subje-
tivos e que s6 fique na analise da doen<;a com a respectiva prescri-
<;ao dos medicamentos, deve ser considerada uma rela<;ao formal 
ou "cientffica". 
Segundo 0 mesmo autor, uma rela<;ao pedag6gica construida 
em cima de mera transmissao do conhecimento deve ser com-
preendida, tambem, como uma rela<;ao nao-subjetiva, visto que 
ai nao se entra nas quest6es existenciais de qualquer membro 
da diade, fixando-se somente na transmissao do saber. A rela<;ao 
terapeutica devera por excelencia apoiar-se em conteudos subje-
tivos. Essa, sim, segundo Bucher (1989, p. 117), sera uma rela<;ao 
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psicoterapeutica propriamente dita, uma vez que "esquadrinha 0 
material subjetivo do paciente" para ajuda-Io a tomar consciencia e 
posse desse material e, logo, redirecionar a sua existencia. 
Embora 0 conteudo subjetivo, aqui presente, seja s6 de um 
dos membros da rela<;ao, caso haja troca em um mesmo'nivel'dos 
conteudos subjetivos, teremos nao mais uma rela<;ao propriamen-
te psicoterapeutica, mas, em muitos casos, uma rela<;ao amorosa, 
que pode ser terapeutica, mas nao em rela<;ao psicoterapica, com 
as caracterfsticas que iremos desenvolver mais adiante. Falar dos 
elementos tecnicos envolvidos numa rela<;ao pSicoterapica e tra-
tar de aspectos estrategicos e das tecnicas de interven<;ao, 0 que 
foge um pouco de nossa reflexao, que e 56 a de explicitar a origi-
nalidade da rela<;ao terapeutica na perspectiva fenomenol6gico-
-existencial. 
A pergunta que surge agora e: sera possivel encontrar na exis-
tencia algumarela<;ao humana que possLla caracteristicas pr6prias 
de uma rela<;ao psicoterapica? A nosso ver, a rela<;ao interpessoal 
estrutu~ada entre a mae e 0 bebe pode nos ajudar a entender al-
gumas- das dimens6es necessarias, quando falarmos da rela<;ao 
psicoterapica. A rela<;ao da mae com 0 seu bebe aponta para pos-
turas e vivencias muito pr6prias, porem muito semelhantes com 0 
que se passa em uma rela<;ao psicoterapica. 
Em primeiro lugar, na rela<;ao mae-bebe, a mae se caracte-
riza como 0 ambiente facilitador, pois e por meio da adapta<;ao 
das necessidades do bebe que ela aparece como a facilitadora do 
processo de amadurecimento que pertence a ele. "Ela e suficiente 
boa porque atende, ao bebe, na medida exata das necessidades 
deste, e nao de suas pr6prias necessidades, como, por exemplo, 
a de ser boa ou muito boa" (DIAS, 2003, p. 133). Veja que a pers-
pectiva de Winnicott, ao falar do relacionamento dessa diade, e a 
de que se "trata de "adapta<;ao a necessidade" e nao de satisfa<;ao 
de desejos" (DIAS, 2003, p. 133). E toda uma perspectiva de aju-
89 
dar 0 outro a encontrar 0 seu rumo, e nao a perspectiva de que 0 
outr~ e objeto de satisfac;ao do nosso desejo. Diriamos que a mae 
coloca a servic;o do desenvolvimento do bebe sua pessoalidade e 
sua existencia. 
De modo semelhante, podemos dizer que 0 terapeuta tambem 
se posta para servir 0 c1iente, no sentido de que vai dispor de toda 
a sua inteligencia e de toda a sua preparac;ao profissional para 
ajuda-Io a se encontrar no seu modo de ser. A rr.ae, que simboli-
za 0 ambiente, adapta-se as necessidades do bebe. 0 terapeuta 
tambem se adapta as demandas do cliente, ja que e ele, terapeu-
ta, 0 ambiente facilitador. 
Winnicott expressa que a "mae suficiente boa torna a adapta-
c;ao cada vez menos absoluta e, desse modo, permite que ele, gra-
dualmente, caminhe na direc;ao da dependencia relativa ... " (DIAS, 
2003, p. 137). Ora, podemos dizer que 0 papel do terapeuta e 
muito semelhante, visto que, no processo de ajuda psicol6gica, ele 
vai, pouco a pouco, permitindo que 0 cliente, no seu processo de 
crescimento e amadurecimento, cada vez menos dependa dele e 
seja capaz de "caminhar com as pr6prias pernas". 
Evidentemente que, para 0 desenvolvimento do processo de 
crescimento, temos de ter um ponto de partida seguro. Esse e 
semelhante tanto para 0 bebe como para 0 cliente em processo 
terapeutico. Tal porto segura para ambos e a experiencia da con-
fianc;a. Fica, portanto, a pergunta de como se constr6i esse ponto 
de partida. 
No inicio, a atitude necessaria para que a mae instaure a sua 
postura de adaptac;ao e desenvolvendo a atitude de acolhimen-
to. Acolher e aceitar 0 outr~ do jeito que ele e, mas aqui e mais 
radical, ja que acolher as necessidades do bebe e inclinar-se as 
suas demandas. No caso de psicoterapias, a situayao e muito se-
melhante, uma vez que 0 terapeuta, no primeiro momento, acolhe 
as necessidades do c1iente. Isso e muito significativo no sentido 
90 
de que, se 0 bebe sera afetado pelo tipo de cuidado que recebe, 
o c1iente tambem sera afetado pela forma com que sera recebido 
pelo psicoterapeuta. Quanto mais espontaneo for 0 acolhimento, 
maior impacto tera no processo de transformayao. 
Assim, acolher nao e somente, nesse inicio de terapia; aceitar 
o outr~ como ele e, mas, mais do que isso, e adaptar-se as ne-
cessidades apresentadas pelo ser humano que sofre, e nao sabe 
como lidar com esse sofrimento. Em termos simples, acolher a 
queixa do c1iente e saber explorar ao maximo 0 motive da con-
sulta. Ao mesmo tempo, porem, e deixar 0 c1iente dizer 0 que ele 
quer dizer, e nao 0 que desejamos que ele diga. Isso se faz por 
meio de perguntas abertas, e nao pelo desenvolvimento de uma 
anamnesia. 
o segundo movimento para a instaurac;ao de uma relayao in-
terpessoal e possibilitar 0 surgimento do vinculo. No caso do bebe, 
e fundamental que a mae seja extremamente sensivel as necessi-
dades dale De modo semelhante, 0 terapeuta e alguem que gosta 
de atender ao cliente, escutando a sua queixa, e alguem que tem 
grande sensibilidade para 0 humano. Estara, pois, ligado nas de-
mandas desse cliente. 
Esse vinculo e 0 elemento que podera desencadear 0 pro-
cesso de harmonia na relayao. Queremos dizer que, tanto para 
o desenvolvimento emocional do bebe como para 0 crescimento 
existencial do cliente, a qualidade do vinculo e fundamental. Quan-
to mais 0 vinculo for estruturado, mais seguranya sentira 0 bebe 
no seu caminhar rumo a autonomia, e 0 cliente, na busca de sua 
liberdade. A qualidade do vinculo e responsavel pela qualidade da 
relayao, na medida em que ele fortalece a Iigayao entre os dois p6-
los. Quanto mais s61ido e 0 vinculo afetivo, mais a relayao tende a 
perdurar, permitindo ao lade mais fragil fortalecer-se. Por exemplo, 
numa relayao amorosa, quanto mais forte for 0 vinculo gerado pela 
afetividade, 0 sentimento de amor, mais chances tem a relayao de 
91 
dar 0 outro a encontrar 0 seu rumo, e nao a perspectiva de que 0 
outr~ e objeto de satisfac;ao do nosso desejo. Diriamos que a mae 
coloca a servic;o do desenvolvimento do bebe sua pessoalidade e 
sua existencia. 
De modo semelhante, podemos dizer que 0 terapeuta tambem 
se posta para servir 0 c1iente, no sentido de que vai dispor de toda 
a sua inteligencia e de toda a sua preparac;ao profissional para 
ajuda-Io a se encontrar no seu modo de ser. A rr.ae, que simboli-
za 0 ambiente, adapta-se as necessidades do bebe. 0 terapeuta 
tambem se adapta as demandas do cliente, ja que e ele, terapeu-
ta, 0 ambiente facilitador. 
Winnicott expressa que a "mae suficiente boa torna a adapta-
c;ao cada vez menos absoluta e, desse modo, permite que ele, gra-
dualmente, caminhe na direc;ao da dependencia relativa ... " (DIAS, 
2003, p. 137). Ora, podemos dizer que 0 papel do terapeuta e 
muito semelhante, visto que, no processo de ajuda psicol6gica, ele 
vai, pouco a pouco, permitindo que 0 cliente, no seu processo de 
crescimento e amadurecimento, cada vez menos dependa dele e 
seja capaz de "caminhar com as pr6prias pernas". 
Evidentemente que, para 0 desenvolvimento do processo de 
crescimento, temos de ter um ponto de partida seguro. Esse e 
semelhante tanto para 0 bebe como para 0 cliente em processo 
terapeutico. Tal porto segura para ambos e a experiencia da con-
fianc;a. Fica, portanto, a pergunta de como se constr6i esse ponto 
de partida. 
No inicio, a atitude necessaria para que a mae instaure a sua 
postura de adaptac;ao e desenvolvendo a atitude de acolhimen-
to. Acolher e aceitar 0 outr~ do jeito que ele e, mas aqui e mais 
radical, ja que acolher as necessidades do bebe e inclinar-se as 
suas demandas. No caso de psicoterapias, a situayao e muito se-
melhante, uma vez que 0 terapeuta, no primeiro momento, acolhe 
as necessidades do c1iente. Isso e muito significativo no sentido 
90 
de que, se 0 bebe sera afetado pelo tipo de cuidado que recebe, 
o c1iente tambem sera afetado pela forma com que sera recebido 
pelo psicoterapeuta. Quanto mais espontaneo for 0 acolhimento, 
maior impacto tera no processo de transformayao. 
Assim, acolher nao e somente, nesse inicio de terapia; aceitar 
o outr~ como ele e, mas, mais do que isso, e adaptar-se as ne-
cessidades apresentadas pelo ser humano que sofre, e nao sabe 
como lidar com esse sofrimento. Em termos simples, acolher a 
queixa do c1iente e saber explorar ao maximo 0 motive da con-
sulta. Ao mesmo tempo, porem, e deixar 0 c1iente dizer 0 que ele 
quer dizer, e nao 0 que desejamos que ele diga. Isso se faz por 
meio de perguntas abertas, e nao pelo desenvolvimento de uma 
anamnesia. 
o segundo movimento para a instaurac;ao de uma relayao in-
terpessoal e possibilitar 0 surgimento do vinculo. No caso do bebe, 
e fundamental que a mae seja extremamente sensivel as necessi-
dades dale De modo semelhante, 0 terapeuta e alguem que gosta 
de atender ao cliente, escutandoa sua queixa, e alguem que tem 
grande sensibilidade para 0 humano. Estara, pois, ligado nas de-
mandas desse cliente. 
Esse vinculo e 0 elemento que podera desencadear 0 pro-
cesso de harmonia na relayao. Queremos dizer que, tanto para 
o desenvolvimento emocional do bebe como para 0 crescimento 
existencial do cliente, a qualidade do vinculo e fundamental. Quan-
to mais 0 vinculo for estruturado, mais seguranya sentira 0 bebe 
no seu caminhar rumo a autonomia, e 0 cliente, na busca de sua 
liberdade. A qualidade do vinculo e responsavel pela qualidade da 
relayao, na medida em que ele fortalece a Iigayao entre os dois p6-
los. Quanto mais s61ido e 0 vinculo afetivo, mais a relayao tende a 
perdurar, permitindo ao lade mais fragil fortalecer-se. Por exemplo, 
numa relayao amorosa, quanto mais forte for 0 vinculo gerado pela 
afetividade, 0 sentimento de amor, mais chances tem a relayao de 
91 
I 
I 
I -
sobreviver as dificuldades da vida e aos obstaculos do cotidiano. 
o sentimento amoroso e a pedra angular para a sedimentac;ao de 
uma relaC;ao, seja ela de mae e filho, seja de marido e mulher, seja 
do terapeuta e de seu cliente. 
Esses dois elementos, 0 acolhimento e 0 estabelecimento do 
vinculo afetivo, ajudam 0 aparecimento do terceiro elemento que 
surge na interaC;ao interpessoal e que sera a base para todas as 
outras formas de relac;ao: a experiencia da confianc;a. 
Essa experiencia que acontece no inicio da vida da crianc;a 
e a base para toda as outras relac;oes, uma vez que, justamente 
quando 0 bebe vivencia a confianc;a, ele esta tendo 0 ponto de 
apoio para 0 desenvolvimento de sua vida emocional. Isso e tao 
significativ~ para 0 be be que, quando ele passa por essa experi-
encia, ele se sente relaxado diante da mae. A experiencia de que 
podemos confiar em alguem, de que esse quer 0 nosso bem e faz 
tudo para que isso acontec;a, coloca-nos num estado de descon-
trac;ao e de despreocupac;ao com a vida. Essa e a vivencia de um 
bebe diante de sua mae extre~amente dedicada. 
Na psicoterapia, talvez a grande conquista do terapeuta seja 
proporcionar ao seu cliente uma experiencia de confianc;a, ja que, 
com base nessa experiencia, 0 processo terapeutico pode se colo-
car em marcha. Evidentemente que, muitas vezes, alguns clientes 
ja chegam para a terapia com esse sentimento. Podemos revelar 
os nossos segredos a pessoa que esta diante de n6s, como muitas 
vezes os pacientes fazem com os seus medicos, mas a experien-
cia de confianc;a sera construida na r8la~ao que se inicia. Se ela 
foi bem vivid a na infancia, possibilitara que a relac;ao do terapeuta 
com 0 cliente seja construida mais rapidamente e ajude 0 proces-
so terapeutico a ser instaurado. Aqueles que nao vivenciaram isso 
na infancia terao mais dificuldades de se soltar, e a primeira con-
quista da terapia sera a construc;ao da confianc;a. Um sinal de que 
ela esta na base do processo e quando 0 paciente, por meio de 
92 
I 
/ 
I 
sua postura corporal, da mostras de que esta relaxado, tratando 
de seus problemas, ou quando, com 0 passar do tempo, 0 cliente 
fala sem resistencia. 
o que dizemos ate agora foi que esses elementos analisados 
nos permitem constatar que a relac;ao construida entre 0 tera-
peuta e 0 seu cliente possibilitara uma experiencia intersubjetiva, 
com trocas de conteudos subjetivos. Agora, a questao e saber em 
que tipo de espac;o essa relac;ao se efetiva. Sera no espac;o inter-
-humano, que e m,uito mais amplo que a dimensao psicol6gica ge-
radora do espac;o intrapsiquico? Da mesma maneira que para 0 
bebe 0 "ambito onde se da 0 amadurecimento nao e um espac;o 
intrapsiquico, mas inter-humano, um entre a mae e 0 bebe" (DIAS, 
2003, p. 131), reforc;amos que 0 espac;o da relac;ao terapeuta-
-cliente sera tambem 0 inter-humano, um espac;o construido para a 
troca de conteudos subjetivos. A dimensao psicol6gica faz parte da 
interac;ao, visto que e 0 espac;:o inter-humano que abarca 0 psico-
16gico. Assim, pod em os dizer que e esse espac;o que possibilita a 
experiencia de estar-no-mundo-com-os-outros. Nao se pode isolar 
o individual do contexte intersubjetivo. A psicoterapia fenomeno-
16gico-existencial privilegia a constru<;:ao do espac;o inter-humano 
em detrimento do espac;o intrapsiquico, as vezes valorizado por 
outras abordagens. Essa oosic;ao, porem, nao significa que haja 
uma negaC;ao do espac;o intrapsiquico, s6 que nao e ele 0 priorita-
rio para que 0 cliente encontre seu processo de desenvolvimento. 
3 A ESPECIFICIDADE DA RELACAO TERAPEUTICA 
Depois de apresentarmos uma reflexao sobre 0 que vem a ser 
uma relac;ao e os principais elementos de uma relac;ao interpesso-
ai, destacando que uma relac;ao psicoterapeutica tem de possuir 
essas caracteristicas, nessa terceira parte, explicitaremos as ca-
racteristicas da relac;ao psicoterapeutica. Para isso, abordaremos 
dois aspetos: as dimensoes psicol6gicas da relac;ao terapeutica e 
93 
I 
I 
I -
sobreviver as dificuldades da vida e aos obstaculos do cotidiano. 
o sentimento amoroso e a pedra angular para a sedimentac;ao de 
uma relaC;ao, seja ela de mae e filho, seja de marido e mulher, seja 
do terapeuta e de seu cliente. 
Esses dois elementos, 0 acolhimento e 0 estabelecimento do 
vinculo afetivo, ajudam 0 aparecimento do terceiro elemento que 
surge na interaC;ao interpessoal e que sera a base para todas as 
outras formas de relac;ao: a experiencia da confianc;a. 
Essa experiencia que acontece no inicio da vida da crianc;a 
e a base para toda as outras relac;oes, uma vez que, justamente 
quando 0 bebe vivencia a confianc;a, ele esta tendo 0 ponto de 
apoio para 0 desenvolvimento de sua vida emocional. Isso e tao 
significativ~ para 0 be be que, quando ele passa por essa experi-
encia, ele se sente relaxado diante da mae. A experiencia de que 
podemos confiar em alguem, de que esse quer 0 nosso bem e faz 
tudo para que isso acontec;a, coloca-nos num estado de descon-
trac;ao e de despreocupac;ao com a vida. Essa e a vivencia de um 
bebe diante de sua mae extre~amente dedicada. 
Na psicoterapia, talvez a grande conquista do terapeuta seja 
proporcionar ao seu cliente uma experiencia de confianc;a, ja que, 
com base nessa experiencia, 0 processo terapeutico pode se colo-
car em marcha. Evidentemente que, muitas vezes, alguns clientes 
ja chegam para a terapia com esse sentimento. Podemos revelar 
os nossos segredos a pessoa que esta diante de n6s, como muitas 
vezes os pacientes fazem com os seus medicos, mas a experien-
cia de confianc;a sera construida na r8la~ao que se inicia. Se ela 
foi bem vivid a na infancia, possibilitara que a relac;ao do terapeuta 
com 0 cliente seja construida mais rapidamente e ajude 0 proces-
so terapeutico a ser instaurado. Aqueles que nao vivenciaram isso 
na infancia terao mais dificuldades de se soltar, e a primeira con-
quista da terapia sera a construc;ao da confianc;a. Um sinal de que 
ela esta na base do processo e quando 0 paciente, por meio de 
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sua postura corporal, da mostras de que esta relaxado, tratando 
de seus problemas, ou quando, com 0 passar do tempo, 0 cliente 
fala sem resistencia. 
o que dizemos ate agora foi que esses elementos analisados 
nos permitem constatar que a relac;ao construida entre 0 tera-
peuta e 0 seu cliente possibilitara uma experiencia intersubjetiva, 
com trocas de conteudos subjetivos. Agora, a questao e saber em 
que tipo de espac;o essa relac;ao se efetiva. Sera no espac;o inter-
-humano, que e m,uito mais amplo que a dimensao psicol6gica ge-
radora do espac;o intrapsiquico? Da mesma maneira que para 0 
bebe 0 "ambito onde se da 0 amadurecimento nao e um espac;o 
intrapsiquico, mas inter-humano, um entre a mae e 0 bebe" (DIAS, 
2003, p. 131), reforc;amos que 0 espac;o da relac;ao terapeuta-
-cliente sera tambem 0 inter-humano, um espac;o construido para a 
troca de conteudos subjetivos. A dimensao psicol6gica faz parte da 
interac;ao,visto que e 0 espac;:o inter-humano que abarca 0 psico-
16gico. Assim, pod em os dizer que e esse espac;o que possibilita a 
experiencia de estar-no-mundo-com-os-outros. Nao se pode isolar 
o individual do contexte intersubjetivo. A psicoterapia fenomeno-
16gico-existencial privilegia a constru<;:ao do espac;o inter-humano 
em detrimento do espac;o intrapsiquico, as vezes valorizado por 
outras abordagens. Essa oosic;ao, porem, nao significa que haja 
uma negaC;ao do espac;o intrapsiquico, s6 que nao e ele 0 priorita-
rio para que 0 cliente encontre seu processo de desenvolvimento. 
3 A ESPECIFICIDADE DA RELACAO TERAPEUTICA 
Depois de apresentarmos uma reflexao sobre 0 que vem a ser 
uma relac;ao e os principais elementos de uma relac;ao interpesso-
ai, destacando que uma relac;ao psicoterapeutica tem de possuir 
essas caracteristicas, nessa terceira parte, explicitaremos as ca-
racteristicas da relac;ao psicoterapeutica. Para isso, abordaremos 
dois aspetos: as dimensoes psicol6gicas da relac;ao terapeutica e 
93 
os pressupostos para 0 desenvolvimento de uma relac;:ao psicote-
rapeutica. 
3.1 DIMENSOES PSICOLOG!CAS DA RELACAO 
TERAPEUTICA 
Poderiamos enumerar varios aspectos psicol6gicos em jogo 
na relac;:ao terapeutica, contudo nos interessa abordar so os mais 
significativos. 0 primeiro deles e 0 que Bucher (1989) chama de 
dimensao da temporalidade. Com isso, ele quer dizer que a pers-
pectiva do rompimento esta presente desde 0 inicio da terapia. 0 
cliente, ao se engajar em uma relac;:ao terapeutica, sabe que um 
dia essa acabara, diferentemente de uma relac;:ao amorosa. Em-
bora uma relac;:ao amorosa possa acabar, ninguem a comec;:a ima-
ginando quando isso ocorrera. Na relac;:ao terapeutica, as vezes na 
psicoterapia breve, ja sabemos de antemao quando a relac;:ao fin-
dara. Esse aspecto de transitoriedade apontado por Bucher (~989, 
p. 128) influencia toda a dinamica da terapia: Pode as vezes ser 
positiv~ na perspectiva que leva 0 cliente a um engajamento maior, 
ja que ele percebe que tem pouco tempo para tratar suas questoes 
existenciais, ou pode tambem gerar um momenta de nao-compro-
misso mais radical. Do lado do terapeuta, essa perspectiva pode 
gerar certo acomodamento. Assim, os do is deverao ter presentes, 
e nao querer minimizar a perspectiva do rompimento, porque essa 
"pode incomodar a perda de investimentos afetivos carregados e 
gratificantes" (BUCHER, 1989, p. 128). 
o rompimento e algo essencial na perspectiva terapeutica, uma 
vez que se espera do cliente que um dia ele nao fac;:a mais usa do 
auxilio do terapeuta. Dizemos que a terapia e uma muleta que um 
dia 0 cliente jogara fora, isto e, quando conseguir "andar com as 
proprias pernas"e vamos ajudar 0 cliente a caminhar na direc;:ao da 
independencia, 0 rompimento sera essencial para 0 levantar vao. 
94 
Outra origin<=llidac!e da relac;ao psicoterapeutica P. que 0 envol-
vimento da esfera da subjetividade e diferente. 0 cliente tem por 
meta revelar tudo 0 que se passa na sua subjetividade, todas as 
questoes que 0 fazem sofrer. Nao deve ter receio de explicitar todo 
o seu conteudo subjetivo para 0 terapeuta. Alias, quanto maior ·for 
o envolvimento de sua subjetividade, mais chance ele tem de en-
trar num processo de crescimento. Por outr~ lado, 0 terapeuta nao 
deve falar para 0 cliente de suas questoes ou interrogac;:oes pesso-
ais. 0 cliente nao pode fiear a par dos problemas e dos conflitos de 
seu terapeL!ta. Assim, a abertura da subjetividade do cliente deve 
ser total, ao passe que a do terapeuta e extrema mente limitada; 
ele nao deve revelar ao seu paciente nada da sua vida privada. 
Isso implica que a relac;:ao terapeutica e assimetriea. Ja 0 nivel de 
comprometimento de eonteudos pessoais e radical mente oposto. 
Dessa forma, na medida em que a assimetria diminui, a carac-
teristica da relac;:ao terapeutica desapareee. 0 easo e diferente em 
uma relac;:ao amorosa, em que a simetria deve ser buscada, uma 
vez que, quanta mais envolvimento subjetivo houver de ambas as 
partes, mais transparente e mais saud~vel sera essa relac;:ao. Na 
relac;:ao amorosa, quanto mais existir assimetria, mais a relac;:ao 
pode ser dita "capenga". Aqui, nao. A assimetria e condic;:ao para 0 
bom desenvolvimento da terapia. 
A terceira dimensao psicologica da relac;:ao terapeutiea e 0 que 
Bucher denornina a dimensao do conteudo psico/6gico (BUCHER, 
1989, p. 130,). E extremamente importante para 0 bom funciona-
mento de uma terapia que 0 eonteudo psicologico aparec;:a com 
abundancia. Numa relac;:ao formal e as vezes dita estritamente 
profissional, as pessoas nao revelam conteudos psicologicos (os 
medos, os sentimentos de amor ou odio, etc.), ja que nao cabe no 
trabalho falar de suas angustias, antes, pelo contrario, deve ser 0 
mais objetivo e eficiente possivel. Esse talvez seja um grande pro-
blema do mundo atual, que reduz cada vez mais os espac;:os para 
95 
os pressupostos para 0 desenvolvimento de uma relac;:ao psicote-
rapeutica. 
3.1 DIMENSOES PSICOLOG!CAS DA RELACAO 
TERAPEUTICA 
Poderiamos enumerar varios aspectos psicol6gicos em jogo 
na relac;:ao terapeutica, contudo nos interessa abordar so os mais 
significativos. 0 primeiro deles e 0 que Bucher (1989) chama de 
dimensao da temporalidade. Com isso, ele quer dizer que a pers-
pectiva do rompimento esta presente desde 0 inicio da terapia. 0 
cliente, ao se engajar em uma relac;:ao terapeutica, sabe que um 
dia essa acabara, diferentemente de uma relac;:ao amorosa. Em-
bora uma relac;:ao amorosa possa acabar, ninguem a comec;:a ima-
ginando quando isso ocorrera. Na relac;:ao terapeutica, as vezes na 
psicoterapia breve, ja sabemos de antemao quando a relac;:ao fin-
dara. Esse aspecto de transitoriedade apontado por Bucher (~989, 
p. 128) influencia toda a dinamica da terapia: Pode as vezes ser 
positiv~ na perspectiva que leva 0 cliente a um engajamento maior, 
ja que ele percebe que tem pouco tempo para tratar suas questoes 
existenciais, ou pode tambem gerar um momenta de nao-compro-
misso mais radical. Do lado do terapeuta, essa perspectiva pode 
gerar certo acomodamento. Assim, os do is deverao ter presentes, 
e nao querer minimizar a perspectiva do rompimento, porque essa 
"pode incomodar a perda de investimentos afetivos carregados e 
gratificantes" (BUCHER, 1989, p. 128). 
o rompimento e algo essencial na perspectiva terapeutica, uma 
vez que se espera do cliente que um dia ele nao fac;:a mais usa do 
auxilio do terapeuta. Dizemos que a terapia e uma muleta que um 
dia 0 cliente jogara fora, isto e, quando conseguir "andar com as 
proprias pernas"e vamos ajudar 0 cliente a caminhar na direc;:ao da 
independencia, 0 rompimento sera essencial para 0 levantar vao. 
94 
Outra origin<=llidac!e da relac;ao psicoterapeutica P. que 0 envol-
vimento da esfera da subjetividade e diferente. 0 cliente tem por 
meta revelar tudo 0 que se passa na sua subjetividade, todas as 
questoes que 0 fazem sofrer. Nao deve ter receio de explicitar todo 
o seu conteudo subjetivo para 0 terapeuta. Alias, quanto maior ·for 
o envolvimento de sua subjetividade, mais chance ele tem de en-
trar num processo de crescimento. Por outr~ lado, 0 terapeuta nao 
deve falar para 0 cliente de suas questoes ou interrogac;:oes pesso-
ais. 0 cliente nao pode fiear a par dos problemas e dos conflitos de 
seu terapeL!ta. Assim, a abertura da subjetividade do cliente deve 
ser total, ao passe que a do terapeuta e extrema mente limitada; 
ele nao deve revelar ao seu paciente nada da sua vida privada. 
Isso implica que a relac;:ao terapeutica e assimetriea. Ja 0 nivel de 
comprometimento de eonteudos pessoais e radical mente oposto. 
Dessa forma, na medida em que a assimetria diminui, a carac-
teristica da relac;:ao terapeutica desapareee. 0 easo e diferente em 
uma relac;:ao amorosa, em que a simetria deve ser buscada, uma 
vez que, quanta mais envolvimento subjetivo houver deambas as 
partes, mais transparente e mais saud~vel sera essa relac;:ao. Na 
relac;:ao amorosa, quanto mais existir assimetria, mais a relac;:ao 
pode ser dita "capenga". Aqui, nao. A assimetria e condic;:ao para 0 
bom desenvolvimento da terapia. 
A terceira dimensao psicologica da relac;:ao terapeutiea e 0 que 
Bucher denornina a dimensao do conteudo psico/6gico (BUCHER, 
1989, p. 130,). E extremamente importante para 0 bom funciona-
mento de uma terapia que 0 eonteudo psicologico aparec;:a com 
abundancia. Numa relac;:ao formal e as vezes dita estritamente 
profissional, as pessoas nao revelam conteudos psicologicos (os 
medos, os sentimentos de amor ou odio, etc.), ja que nao cabe no 
trabalho falar de suas angustias, antes, pelo contrario, deve ser 0 
mais objetivo e eficiente possivel. Esse talvez seja um grande pro-
blema do mundo atual, que reduz cada vez mais os espac;:os para 
95 
. > 
as pessoas f~larem 0 que sentem. Isso nos leva ao isolamento e 
a busca de espa<;os onde podemos expressar nossos dilemas e 
conflitos. A rela<;ao terapeutica e 0 lugar por excelencia para essas 
quest6es. Assim, quanta menos envolvimento em ambito psicolo-
gico, mais formal sera a rela<;ao. 
o que difere, as vezes, nas diversas abordagens terapeuticas 
e que algumas buscam trabalhar os conteudos psicologicos atuais, 
ao passo que outras dao mais valor ou enfase aos conteudos do 
passado. Nao importa; 0 que tem de estar presente sao os confli-
tos e dilemas do cliente, para que, ao longo do processo, ele possa 
ter uma nova luz sobre suas quest6es existef1ciais. Trabalhar os 
conteudos psicologicos e a tarefa primordial de um psicoterapeuta. 
Com isso, queremos dizer que esse profissional, com toda a sua 
forma((ao, ajuda 0 cliente a elaborar suas quest6es, isto e, a traba-
Ihar a sua problematica. 
3.2 PRESSUPOSTOS PARA 0 DESENVOLVIMENTO DA 
RELACAo PSICOLOGICA 
Alem das dimens6es psicol6gicas que caracterizam uma rela-
((ao terapeutica, algumas posturas serao necessarias para 0 de-
senvolvimento da rela((ao. Isso quer dizer que tanto 0 terapeuta 
como 0 cliente devem "trabalhar" algumas posturas para que esse 
tipo de rela((ao se estruture. 
Um primeiro pressuposto e a humildade para 0 novo que vai 
surgir no espa<;o inter-humano. Esse pressuposto deve ser busca-
do pelos dois participantes da rela((ao, isto e, pelo terapeuta, que 
vai adentrar a problematica singular do paciente, e pelo cliente, 
que, ao falar sobre suas angustias, estara entrando em contato 
com algo novo. Tudo 0 que aflora da rela((ao e algo produzido nes-
se espa((o espedfico, fruto do encontro das pessoas. 
o terapeuta, embora esteja escutando algo, como, por exem-
plo, a angustia de morte narrada pelo seu cliente, deve demonstrar, 
96 
I 
I 
! 
nesse momento, ser novidade a narrativa, mesmo que ja tenha 
ouvido isso de outro paciente, porque a mem6ria singular de viver 
a angustia de morte e propria daquele cliente e de mais ninguem. A 
postura de humildade para com 0 novo e, por parte do terapeuta, a 
sua abertura a experiencia pessoal daquele cliente que·esta asua 
frente. Buscar a compreensao especftica daquele problema e es-
tar atento para algo deferente, ja que as variaveis da narrativa sao 
unicas e intransferfveis. Abrir-se para 0 novo e tentar compreender 
a especificidade daquela problematica. 
Para 0 cliente, a humildade para 0 novo e deixar rt~percutir 
para si mesmo 0 que acaba de verbalizar, ja que, cada vez que fala 
de algo, vivencia a questao naquele momento. Estarmos atentos 
ao que esta se passando conosco, no momenta que estamos nar-
rando a situa((ao, e mostrarmos abertura para a novidade. 
Outro pressuposto que deve ser mais desenvolvido pelo tera-
peuta e a postura de respeito para com a questao que 0 paciente 
esta trazendo. Muitas vezes, uma coloca<;ao de um problema pode 
parecer simples e banal, so que, para 0 cliente em questao, aquele 
problema e 0 tormento de sua vida. Por exemplo, voce, t~rapeuta, 
ja trabalhou ao longo de sua vida a capacidade de dizer nao dian-
te de uma situa<;ao que nao Ihe agrada, mas 0 cliente nao sabe 
dizer nao, mesmo quando ele nao esta a fim de fazer aquilo que 
Ihe pedem. Portanto, respeito implica acolher com toda a aten((ao 
a narrativa que 0 cliente esta colocando naquele momento. 
Respeito tambem pode se manifestar numa situa<;ao terapeu-
tica, como a atitude de nao interromper a narrativa do cliente, uma 
vez que e necessario dispensar aten((ao a todo 0 desenrolar da ex-
posi<;ao do paciente. E primordial que tenhamos a maxima consi-
dera((ao ao fluxo pulsante da narrativa da pessoa. Estarmos aten-
tos ao ritmo e estarmos sintonizados com a realidade apresentada 
pelo paciente. E a melhor maneira de compreender a problematlca 
do outro e respeitar a cadencia de narra((ao, ja que e por meio dela 
97 
. > 
as pessoas f~larem 0 que sentem. Isso nos leva ao isolamento e 
a busca de espa<;os onde podemos expressar nossos dilemas e 
conflitos. A rela<;ao terapeutica e 0 lugar por excelencia para essas 
quest6es. Assim, quanta menos envolvimento em ambito psicolo-
gico, mais formal sera a rela<;ao. 
o que difere, as vezes, nas diversas abordagens terapeuticas 
e que algumas buscam trabalhar os conteudos psicologicos atuais, 
ao passo que outras dao mais valor ou enfase aos conteudos do 
passado. Nao importa; 0 que tem de estar presente sao os confli-
tos e dilemas do cliente, para que, ao longo do processo, ele possa 
ter uma nova luz sobre suas quest6es existef1ciais. Trabalhar os 
conteudos psicologicos e a tarefa primordial de um psicoterapeuta. 
Com isso, queremos dizer que esse profissional, com toda a sua 
forma((ao, ajuda 0 cliente a elaborar suas quest6es, isto e, a traba-
Ihar a sua problematica. 
3.2 PRESSUPOSTOS PARA 0 DESENVOLVIMENTO DA 
RELACAo PSICOLOGICA 
Alem das dimens6es psicol6gicas que caracterizam uma rela-
((ao terapeutica, algumas posturas serao necessarias para 0 de-
senvolvimento da rela((ao. Isso quer dizer que tanto 0 terapeuta 
como 0 cliente devem "trabalhar" algumas posturas para que esse 
tipo de rela((ao se estruture. 
Um primeiro pressuposto e a humildade para 0 novo que vai 
surgir no espa<;o inter-humano. Esse pressuposto deve ser busca-
do pelos dois participantes da rela((ao, isto e, pelo terapeuta, que 
vai adentrar a problematica singular do paciente, e pelo cliente, 
que, ao falar sobre suas angustias, estara entrando em contato 
com algo novo. Tudo 0 que aflora da rela((ao e algo produzido nes-
se espa((o espedfico, fruto do encontro das pessoas. 
o terapeuta, embora esteja escutando algo, como, por exem-
plo, a angustia de morte narrada pelo seu cliente, deve demonstrar, 
96 
I 
I 
! 
nesse momento, ser novidade a narrativa, mesmo que ja tenha 
ouvido isso de outro paciente, porque a mem6ria singular de viver 
a angustia de morte e propria daquele cliente e de mais ninguem. A 
postura de humildade para com 0 novo e, por parte do terapeuta, a 
sua abertura a experiencia pessoal daquele cliente que·esta asua 
frente. Buscar a compreensao especftica daquele problema e es-
tar atento para algo deferente, ja que as variaveis da narrativa sao 
unicas e intransferfveis. Abrir-se para 0 novo e tentar compreender 
a especificidade daquela problematica. 
Para 0 cliente, a humildade para 0 novo e deixar rt~percutir 
para si mesmo 0 que acaba de verbalizar, ja que, cada vez que fala 
de algo, vivencia a questao naquele momento. Estarmos atentos 
ao que esta se passando conosco, no momenta que estamos nar-
rando a situa((ao, e mostrarmos abertura para a novidade. 
Outro pressuposto que deve ser mais desenvolvido pelo tera-
peuta e a postura de respeito para com a questao que 0 paciente 
esta trazendo. Muitas vezes, uma coloca<;ao de um problema pode 
parecer simples e banal, so que, para 0 cliente em questao, aquele 
problema e 0 tormento de sua vida. Por exemplo, voce, t~rapeuta, 
ja trabalhou ao longo de sua vidaa capacidade de dizer nao dian-
te de uma situa<;ao que nao Ihe agrada, mas 0 cliente nao sabe 
dizer nao, mesmo quando ele nao esta a fim de fazer aquilo que 
Ihe pedem. Portanto, respeito implica acolher com toda a aten((ao 
a narrativa que 0 cliente esta colocando naquele momento. 
Respeito tambem pode se manifestar numa situa<;ao terapeu-
tica, como a atitude de nao interromper a narrativa do cliente, uma 
vez que e necessario dispensar aten((ao a todo 0 desenrolar da ex-
posi<;ao do paciente. E primordial que tenhamos a maxima consi-
dera((ao ao fluxo pulsante da narrativa da pessoa. Estarmos aten-
tos ao ritmo e estarmos sintonizados com a realidade apresentada 
pelo paciente. E a melhor maneira de compreender a problematlca 
do outro e respeitar a cadencia de narra((ao, ja que e por meio dela 
97 
-------- . 
que se capta 0 ritmo de como se encara a vida e os obstaculos. Ai 
percebemos como que os obstaculos se tornam ou nao urn proble-
ma para 0 outro. 
o terceiro pressuposto deve ser cultivado mais pelo pacien-
te, visto que se caracteriza como a abertura para a mudan9a. 
Muitas vezes, 0 paciente diz que quer agir de outra maneira, 
mas, quando come9a a explicitar sua problematica e ve que 
a (mica safda seria uma inova9ao, ele come9a, de forma in-
consciente, a boicotar as posi90es que, uma vez tomadas, 0 
levariam a essa mudan9a. Portanto, a atitude existencial da mu-
dan9a nao e algo tao simples, mas provoca uma abertura para 
se perder os privilE~gios ja alcan9ados com a atitude atual. Por 
exemplo, alguem que na terapia passa a vislumbrar a possibili-
dade de terminar uma rela9ao conjugal, em razao das multiplas 
insatisfa90es vivenciadas ao longo da vida, come9a a criar difi-
culdades para com as posi90es a ser tomadas, ja que perderia 
os privih§gios de viver a custa do outro. E rna is diffcil assumir 
a propria vida do que viver, mesmo frustrado, dependendo do 
outr~. A mudan9a e algo que nos tira do lugar enos lan9a no 
desconhecido; para isso, temos de abrir mao da estabilidade. 
Assim, a rela9ao terapeutica e uma rela9ao humana que 
deve ser construida no espa90 especifico do encontro entre 
duas pessoas, no qual uma, 0 terapeuta, preparado profissio-' 
nalmente, acolhe com todo 0 respeito a problematica do outro, 
e a outra, 0 cliente, entrega-se na rela9ao, para que, por meio 
dela, possa deparar-se com sua problematica e ressignifica-Ia, 
e, assim, encontrar urn caminho mais desoprimido para sua 
vida. 
BIBLIOGRAFIA: 
BUCHER, Richard., (1989) A Psicoterapia pela fala. Funda-
mentos, principios, questionamentos. Sao Paulo, E.P.U. 
98 
DIAS, Elsa Oliveira, (2003) A teoria do amadurecimento de D. 
W. Winnicott. , Rio de Janeiro, Imago 
ENTRALGO, Laim, (1988), Teoria y realidad del otro. Madrid, 
Alianza Editorial 
GIOVANETTI, Jose Paulo, (1996), Fundamenta9ao antropol6-
gica da pratica psicoterapica. In Repensando a forma9ao do 
pSicologo: Da informa9aO a descoberta'., Cadernos Coletanea 
da ANPEPP, N 9 , setembro/1996, pp.127-134 
99 
-------- . 
que se capta 0 ritmo de como se encara a vida e os obstaculos. Ai 
percebemos como que os obstaculos se tornam ou nao urn proble-
ma para 0 outro. 
o terceiro pressuposto deve ser cultivado mais pelo pacien-
te, visto que se caracteriza como a abertura para a mudan9a. 
Muitas vezes, 0 paciente diz que quer agir de outra maneira, 
mas, quando come9a a explicitar sua problematica e ve que 
a (mica safda seria uma inova9ao, ele come9a, de forma in-
consciente, a boicotar as posi90es que, uma vez tomadas, 0 
levariam a essa mudan9a. Portanto, a atitude existencial da mu-
dan9a nao e algo tao simples, mas provoca uma abertura para 
se perder os privilE~gios ja alcan9ados com a atitude atual. Por 
exemplo, alguem que na terapia passa a vislumbrar a possibili-
dade de terminar uma rela9ao conjugal, em razao das multiplas 
insatisfa90es vivenciadas ao longo da vida, come9a a criar difi-
culdades para com as posi90es a ser tomadas, ja que perderia 
os privih§gios de viver a custa do outro. E rna is diffcil assumir 
a propria vida do que viver, mesmo frustrado, dependendo do 
outr~. A mudan9a e algo que nos tira do lugar enos lan9a no 
desconhecido; para isso, temos de abrir mao da estabilidade. 
Assim, a rela9ao terapeutica e uma rela9ao humana que 
deve ser construida no espa90 especifico do encontro entre 
duas pessoas, no qual uma, 0 terapeuta, preparado profissio-' 
nalmente, acolhe com todo 0 respeito a problematica do outro, 
e a outra, 0 cliente, entrega-se na rela9ao, para que, por meio 
dela, possa deparar-se com sua problematica e ressignifica-Ia, 
e, assim, encontrar urn caminho mais desoprimido para sua 
vida. 
BIBLIOGRAFIA: 
BUCHER, Richard., (1989) A Psicoterapia pela fala. Funda-
mentos, principios, questionamentos. Sao Paulo, E.P.U. 
98 
DIAS, Elsa Oliveira, (2003) A teoria do amadurecimento de D. 
W. Winnicott. , Rio de Janeiro, Imago 
ENTRALGO, Laim, (1988), Teoria y realidad del otro. Madrid, 
Alianza Editorial 
GIOVANETTI, Jose Paulo, (1996), Fundamenta9ao antropol6-
gica da pratica psicoterapica. In Repensando a forma9ao do 
pSicologo: Da informa9aO a descoberta'., Cadernos Coletanea 
da ANPEPP, N 9 , setembro/1996, pp.127-134 
99 
o ENCONTRO NA PERSPECTIVA TERAPEUTICA 
EXISTENCIAL 115 
Resumo 
A exposi<;ao se divide em dois momentos distintos. A primeira p'ar-
te visa explicitar algumas reflex6es de nfvel filos6fico sobre 0 que e 
um encontro inter-humano, destacando sua dimens80 ontol6gica. 
Na segunda parte, apresentam-se algumas posturas do terapeuta 
no encontro psicoterapico que e por excelencia um encontro com 
caracterfsticas muito pr6prias. 
Escrever sobre 0 Encontro interpessoal na perspectiva feno-
menol6gico-existencial pode parecer facH, e ate num certo sentido 
dizer coisas que todo mundo ja sabe, mas explicitar a especificida-
de da relag80 terapeutica e um grande desafio. Assim, tentaremos 
colocar algumas ideias sobre a dimensao antropol6gica do encon-
tro inter-humano, para em seguida destacarmos algumas -- e n80 
todas, pois seria uma tarefa imensa e que extrapolaria nossa con-
tribuig80 - das atitudes, ou melhor, da atengao que um terapeuta 
deve ter para com seu "cliente". 
I REFLEXAO FILOSa FICA SOBRE 0 ENCONTRO 
Se examinarmos com ateng80 aquilo que mais salta aos olhos 
na realidade do encontro entre duas pessoas, verificaremos que 
a categoria ontol6gica da relagao 0 constitui. Entre todos os seres 
vivos, 0 homem talvez seja aquele que busca e se encontra na re-
lag80 com 0 outr~ ser116. Ele se constitui atraves dessa rela980. 
115Cadernos de Psicologia, PUC Minas, v. 1, n. 1, jun. 1993, p. 31-34. Texto elaborado 
a partir de participac;ao em mesa-redonda: "Elementos para uma Teoria da Tecnica 
Psicoterapica Fenomenol6gica e Existencial", no II Encontro Brasileiro de Analise 
Existencial Terapeutica, realizado em Belo Horizonte, nos dias 3 a 5 de julho de 
1992. 
116ENTRALGO, Pedro Lain. Teoria y Realidad del Otro. Revista de Occidente, Madrid, 
v. 2, p. 70, 1968. 
101 
o ENCONTRO NA PERSPECTIVA TERAPEUTICA 
EXISTENCIAL 115 
Resumo 
A exposi<;ao se divide em dois momentos distintos. A primeira p'ar-
te visa explicitar algumas reflex6es de nfvel filos6fico sobre 0 que e 
um encontro inter-humano, destacando sua dimens80 ontol6gica. 
Na segunda parte, apresentam-se algumas posturas do terapeuta 
no encontro psicoterapico que e por excelencia um encontro com 
caracterfsticas muito pr6prias. 
Escrever sobre 0 Encontro interpessoal na perspectiva feno-
menol6gico-existencial pode parecer facH, e ate num certo sentido 
dizer coisas que todo mundo ja sabe, mas explicitar a especificida-
de da relag80 terapeutica e um grande desafio. Assim, tentaremos 
colocar algumas ideias sobre a dimensao antropol6gica do encon-
tro inter-humano, para em seguida destacarmos algumas -- e n80 
todas, pois seria uma tarefa imensa e que extrapolaria nossa con-
tribuig80 - das atitudes, ou melhor, da atengaoque um terapeuta 
deve ter para com seu "cliente". 
I REFLEXAO FILOSa FICA SOBRE 0 ENCONTRO 
Se examinarmos com ateng80 aquilo que mais salta aos olhos 
na realidade do encontro entre duas pessoas, verificaremos que 
a categoria ontol6gica da relagao 0 constitui. Entre todos os seres 
vivos, 0 homem talvez seja aquele que busca e se encontra na re-
lag80 com 0 outr~ ser116. Ele se constitui atraves dessa rela980. 
115Cadernos de Psicologia, PUC Minas, v. 1, n. 1, jun. 1993, p. 31-34. Texto elaborado 
a partir de participac;ao em mesa-redonda: "Elementos para uma Teoria da Tecnica 
Psicoterapica Fenomenol6gica e Existencial", no II Encontro Brasileiro de Analise 
Existencial Terapeutica, realizado em Belo Horizonte, nos dias 3 a 5 de julho de 
1992. 
116ENTRALGO, Pedro Lain. Teoria y Realidad del Otro. Revista de Occidente, Madrid, 
v. 2, p. 70, 1968. 
101 
... ) 
Porem, no desenrolar de nossa vida cotidiana, vamos viven-
ciar os mais diferentes tipos de rela<;ao, que podem ser nomeados 
como rela<;ao pedagogica, rela<;ao de ajuda, etc., mas reservare-
mos a palavra Encontro para uma situa<;ao onde 0 OUTRO (aquele 
com 0 qual entro em rela<;ao) afeta de alguma maneira 0 curso de 
minha existencia, principalmente na dimensao em que ele (0 outro) 
me faz crescer. E assim que, na perspectiva existencial, a rela<;ao 
entre 0 terapeuta e 0 "cliente" deve ser vista como um encontro, 
pois ela traz no seu bojo, com todas as suas especificidades, 0 
questionamento do status quo do meu dia-a-dia, e desenvolveria 
um numero imenso de comunica<;6es que provavelmente vao mu-
dar 0 rumo da minha vida. 
o Encontro e, assim, entendido como uma rela<;ao intersubjeti-
va onde a troca entre as pessoas - embora assimetrica na rela<;ao 
psicoterapeutica - provoca uma coloca<;ao em movimento de sua 
existencia. 
De uma maneira geral, podemos observar que existem no en-
contro dois elementos que se auto-implicam. Uma dimensao ffsica 
e uma dimensao pessoal. 0 momenta ffsico do encontro, que me 
da a real existencia do outro, pode ser entendido como a Percep-
980 da existencia do outro. Por outro lado, a dimensao pessoal, 
que e a Resposta a existencia do outro, e 0 aspecto que junto com 
o primeiro polo constituira a essen cia do encontro. A maneira como 
se dialetizam estes dois polos sera a maneira como vou vivenciar 
o encontro. 
Dos dois elementos acima mencionados, 0 segundo polo e 0 
mais importante, uma vez que as formas de dialetiza<.;:ao dos dois 
elementos dependem de como e vivenciada por mim a dimensao 
pessoal, que e a minha res posta pessoal. 
102 
A partir do tipo de res posta pessoal, posso ter duas maneiras 
de vivenciar um encontro: 
1. Se, com minha res posta , 0 outro vai ser para mim um simples 
objeto de meu desejo, a rela<;ao sera objetal. 
2. Se, por outro lado, com a minha res posta 0 outro vai ser para 
mim - e eu vou ser para 0 outro - uma pessoa, 0 tipo de rela-
<;130 sera 0 que chamamos rela<;ao pessoal117• 
Na primeira forma de encontro, reduzo 0 outro a um objeto 
compreendido como urn conjunto de caracteres e propriedades 
perfeitamente abarcaveis, como por exemplo pessoa de tal cor, 
com nivel de inteligencia x ou com uma memoria boa ou mao Neste 
caso, sempre rotulo as qualidades ou problemas de uma pessoal. 
Trata-se de um tipo de rela<;ao muito comum em uma abordagem 
biologica, onde 0 outro e visto nao na sua estrutura existencial, 
mas como alguem cheio de rotulos, de caracteristicas que eu ana-
liso e Ihe imponho. Este e 0 perigo da rela<;ao profissional que ve 
o outro como objeto de uma interven<;ao transformadora, seja ela 
cirurgica, educativa ou terapeutica. 
Na segunda forma de encontro, minha res posta de ver 0 ou-
tro como uma pessoa dialetiza dos dois polos em uma dina mica 
diferente, em que se percebe 0 outro como alguem que at raves 
de uma rela<;ao nova podera tambem ter uma percep<;ao de mim 
como um ser humane igual e nao como alguem que se situa alem 
da rela((ao. Neste segundo tipo de encontro, estabelece-se uma 
rela<;ao interpessoal onde 0 outro e uma pessoa inacabada, sem-
pre criadora e originalmente projetada para 0 futuro, justamente 0 
contrario da primeira postura, onde outro e visto como acabado e 
finito. 
A questao que nos abre para a segunda parte da exposi<;ao e 
a seguinte: qual a vi sao que um terapeuta deve ter do outro quan-
117ENTRALGO, op. cit., nota 2, p. 132. 
103 
... ) 
Porem, no desenrolar de nossa vida cotidiana, vamos viven-
ciar os mais diferentes tipos de rela<;ao, que podem ser nomeados 
como rela<;ao pedagogica, rela<;ao de ajuda, etc., mas reservare-
mos a palavra Encontro para uma situa<;ao onde 0 OUTRO (aquele 
com 0 qual entro em rela<;ao) afeta de alguma maneira 0 curso de 
minha existencia, principalmente na dimensao em que ele (0 outro) 
me faz crescer. E assim que, na perspectiva existencial, a rela<;ao 
entre 0 terapeuta e 0 "cliente" deve ser vista como um encontro, 
pois ela traz no seu bojo, com todas as suas especificidades, 0 
questionamento do status quo do meu dia-a-dia, e desenvolveria 
um numero imenso de comunica<;6es que provavelmente vao mu-
dar 0 rumo da minha vida. 
o Encontro e, assim, entendido como uma rela<;ao intersubjeti-
va onde a troca entre as pessoas - embora assimetrica na rela<;ao 
psicoterapeutica - provoca uma coloca<;ao em movimento de sua 
existencia. 
De uma maneira geral, podemos observar que existem no en-
contro dois elementos que se auto-implicam. Uma dimensao ffsica 
e uma dimensao pessoal. 0 momenta ffsico do encontro, que me 
da a real existencia do outro, pode ser entendido como a Percep-
980 da existencia do outro. Por outro lado, a dimensao pessoal, 
que e a Resposta a existencia do outro, e 0 aspecto que junto com 
o primeiro polo constituira a essen cia do encontro. A maneira como 
se dialetizam estes dois polos sera a maneira como vou vivenciar 
o encontro. 
Dos dois elementos acima mencionados, 0 segundo polo e 0 
mais importante, uma vez que as formas de dialetiza<.;:ao dos dois 
elementos dependem de como e vivenciada por mim a dimensao 
pessoal, que e a minha res posta pessoal. 
102 
A partir do tipo de res posta pessoal, posso ter duas maneiras 
de vivenciar um encontro: 
1. Se, com minha res posta , 0 outro vai ser para mim um simples 
objeto de meu desejo, a rela<;ao sera objetal. 
2. Se, por outro lado, com a minha res posta 0 outro vai ser para 
mim - e eu vou ser para 0 outro - uma pessoa, 0 tipo de rela-
<;130 sera 0 que chamamos rela<;ao pessoal117• 
Na primeira forma de encontro, reduzo 0 outro a um objeto 
compreendido como urn conjunto de caracteres e propriedades 
perfeitamente abarcaveis, como por exemplo pessoa de tal cor, 
com nivel de inteligencia x ou com uma memoria boa ou mao Neste 
caso, sempre rotulo as qualidades ou problemas de uma pessoal. 
Trata-se de um tipo de rela<;ao muito comum em uma abordagem 
biologica, onde 0 outro e visto nao na sua estrutura existencial, 
mas como alguem cheio de rotulos, de caracteristicas que eu ana-
liso e Ihe imponho. Este e 0 perigo da rela<;ao profissional que ve 
o outro como objeto de uma interven<;ao transformadora, seja ela 
cirurgica, educativa ou terapeutica. 
Na segunda forma de encontro, minha res posta de ver 0 ou-
tro como uma pessoa dialetiza dos dois polos em uma dina mica 
diferente, em que se percebe 0 outro como alguem que at raves 
de uma rela<;ao nova podera tambem ter uma percep<;ao de mim 
como um ser humane igual e nao como alguem que se situa alem 
da rela((ao. Neste segundo tipo de encontro, estabelece-se uma 
rela<;ao interpessoal onde 0 outro e uma pessoa inacabada, sem-
pre criadora e originalmente projetada para 0 futuro, justamente 0 
contrario da primeira postura, onde outro e visto como acabado e 
finito. 
A questao que nos abre para a segunda parte da exposi<;ao e 
a seguinte: qual a vi sao que um terapeuta deve ter do outro quan-
117ENTRALGO, op. cit., nota2, p. 132. 
103 
do este 0 procura no consultorio? A res posta parece obvia, mas 
dependendo da minha atitude de onipresenga ou de autoritarismo 
fica caracterizada a primeira formula em vez da segunda. 
II 0 ENCONTRO PSICOTERAplCO 
A relagao terapeutica e, em primeiro lugar, um contacto huma-
no onde ambos os personagens aprendem algo sobre a vida hu-
mana. Alias, D. Winnicott dedicou 0 livro "Playing and Reality" aos 
seus pacientes com belas palavras que traduziam uma sabedoria: 
"To my patients who have paid to teach me" -"Aos meus pacientes 
que pagaram para me instruir". Sao palavras que mostram como 
um terapeuta aprende no contacto com urn cliente, que nao e 0 
unico a colocar-se em movimento na vida; 0 terapeuta tambem 
entra em um processo de desenvolvimento pessoal. 
o encontro psicoterapico se desenrolara atraves de uma inte-
ragao, isto e, at raves de algo que circula entre 0 psicoterapeuta e 
o seu paciente e, por isto, nao e fundado em algo fora do comum, 
mas na existencia cotidiana. 
L. Binswanger, em um artigo sobre a Psicoterapia118 , diz 0 se-
guinte: "A possibilidade da pSicoterapia nao repousa sobre urn 
grande segredo ou um misterio, como se pode pensar num pri-
meiro momento, e muito menos sobre nada de novo e de natural, 
maR, ao contrario, sobre um trago fundamental da estrutura do ser 
humane enquanto ser dentro do mundo, ser com e para 0 outro". 
o fundamento da relagao terapeutica esta na propria dinamica da 
existencia humana. Mais tarde, numa obra filosofica, Binswanger 
afirma que a relagao por excelencia sera explicitada atraves da 
experiencia da amizade e do amor. Aqui a relagao terapeutica e 
diferente destas duas vivencias humanas e possui caracteristicas 
proprias. Ela implica uma reciprocidade, mas de maneira assime-
118BINSWANGER, L. Ausgewahlte Vortrage und Aufsatze. Bern: Francke Verlag, 
1961, v. 1, p. 136: Ober Psychotherapie. 
104 
trica e nao como seria de se desejar no caso da experiencia amo-
rosa e da amizade. 
o passo seguinte enos perguntarmos qual deve ser a atitude 
do terapeuta para que esta relagao possa ser interpessoal e guar-
dar as caracteristicas terapeuticas? 
1. Sedimentar a confianc;a 
Podemos dizer que 0 que se descortina no horizonte do en con-
tro terapeutico e a confianga, condigao humana fundamental para 
o bom desenvolvimento da terapia. Alias, e dentro de um espirito 
de confianga que um cliente procura um medico ou um terapeuta, 
pois acredita que este possui 0 saber e.os meios para "curar" sua 
doenga ou tira-Io da crise em que se encontra na relagao consigo 
mesmo e com 0 seu ambiente. L. Binswanger acena par2 a im-
portancia deste "pan~ de fundo" do processo interpessoal que se 
instala entre 0 cliente e 0 terapeuta quando diz: "A confianl(a e 0 
presente que 0 doente faz ao medico como condil(ao sine qua non 
de todo 0 ate psicoterapeutico"119. 
Como 0 encontro sera uma relal(ao intersubjetiva de signifi-
car;oes e nao uma relal(ao objetiva ou causal, a terapeuta deve 
poder responder a canfianl(a do cliente, trazenda-Ihe par sua vez 0 
presente de uma confianl(a que se expressa na atitude terapeutica 
de acreditar que a outro tem possibilidades de se organizar na sua 
existencia humana. 0 terapeuta se coloca numa atitude df! dispo-
nibilidade para ~ escuta. 
2. A Escuta 
Talvez esta seja a atitude basica do terapeuta e por ista mesmo 
a mais dificil de ser vivenciada. 
A lingua francesa faz uma distint;ao entre entendre e econ-
ter, que nos em portugues podemas traduzir por ouvir e escutar, 
119BINSWANGER, op. cit., nota 4, p. 138. 
105 
do este 0 procura no consultorio? A res posta parece obvia, mas 
dependendo da minha atitude de onipresenga ou de autoritarismo 
fica caracterizada a primeira formula em vez da segunda. 
II 0 ENCONTRO PSICOTERAplCO 
A relagao terapeutica e, em primeiro lugar, um contacto huma-
no onde ambos os personagens aprendem algo sobre a vida hu-
mana. Alias, D. Winnicott dedicou 0 livro "Playing and Reality" aos 
seus pacientes com belas palavras que traduziam uma sabedoria: 
"To my patients who have paid to teach me" -"Aos meus pacientes 
que pagaram para me instruir". Sao palavras que mostram como 
um terapeuta aprende no contacto com urn cliente, que nao e 0 
unico a colocar-se em movimento na vida; 0 terapeuta tambem 
entra em um processo de desenvolvimento pessoal. 
o encontro psicoterapico se desenrolara atraves de uma inte-
ragao, isto e, at raves de algo que circula entre 0 psicoterapeuta e 
o seu paciente e, por isto, nao e fundado em algo fora do comum, 
mas na existencia cotidiana. 
L. Binswanger, em um artigo sobre a Psicoterapia118 , diz 0 se-
guinte: "A possibilidade da pSicoterapia nao repousa sobre urn 
grande segredo ou um misterio, como se pode pensar num pri-
meiro momento, e muito menos sobre nada de novo e de natural, 
maR, ao contrario, sobre um trago fundamental da estrutura do ser 
humane enquanto ser dentro do mundo, ser com e para 0 outro". 
o fundamento da relagao terapeutica esta na propria dinamica da 
existencia humana. Mais tarde, numa obra filosofica, Binswanger 
afirma que a relagao por excelencia sera explicitada atraves da 
experiencia da amizade e do amor. Aqui a relagao terapeutica e 
diferente destas duas vivencias humanas e possui caracteristicas 
proprias. Ela implica uma reciprocidade, mas de maneira assime-
118BINSWANGER, L. Ausgewahlte Vortrage und Aufsatze. Bern: Francke Verlag, 
1961, v. 1, p. 136: Ober Psychotherapie. 
104 
trica e nao como seria de se desejar no caso da experiencia amo-
rosa e da amizade. 
o passo seguinte enos perguntarmos qual deve ser a atitude 
do terapeuta para que esta relagao possa ser interpessoal e guar-
dar as caracteristicas terapeuticas? 
1. Sedimentar a confianc;a 
Podemos dizer que 0 que se descortina no horizonte do en con-
tro terapeutico e a confianga, condigao humana fundamental para 
o bom desenvolvimento da terapia. Alias, e dentro de um espirito 
de confianga que um cliente procura um medico ou um terapeuta, 
pois acredita que este possui 0 saber e.os meios para "curar" sua 
doenga ou tira-Io da crise em que se encontra na relagao consigo 
mesmo e com 0 seu ambiente. L. Binswanger acena par2 a im-
portancia deste "pan~ de fundo" do processo interpessoal que se 
instala entre 0 cliente e 0 terapeuta quando diz: "A confianl(a e 0 
presente que 0 doente faz ao medico como condil(ao sine qua non 
de todo 0 ate psicoterapeutico"119. 
Como 0 encontro sera uma relal(ao intersubjetiva de signifi-
car;oes e nao uma relal(ao objetiva ou causal, a terapeuta deve 
poder responder a canfianl(a do cliente, trazenda-Ihe par sua vez 0 
presente de uma confianl(a que se expressa na atitude terapeutica 
de acreditar que a outro tem possibilidades de se organizar na sua 
existencia humana. 0 terapeuta se coloca numa atitude df! dispo-
nibilidade para ~ escuta. 
2. A Escuta 
Talvez esta seja a atitude basica do terapeuta e por ista mesmo 
a mais dificil de ser vivenciada. 
A lingua francesa faz uma distint;ao entre entendre e econ-
ter, que nos em portugues podemas traduzir por ouvir e escutar, 
119BINSWANGER, op. cit., nota 4, p. 138. 
105 
· . 
termos que revelam atitudes bem diferentes diante da vida. Por 
exemplo, posso dizer que ou<;o 0 barulho dos carros que passam 
na rua e, por outro lado, escuto 0 barulho de um carro que me e 
familiar chegando. Entre todos os barulhos distingo 0 barulho do 
carro de um amigo, ou de urn parente. A mesma coisa posso dizer 
a respeito da musica. As vezes estou estudando com fundo mu-
sical, ouvindo uma musica classica ou popular, e em determinado 
momenta identifico dentre as que estao sendo tocadas no radio 
uma musica de Bach ou uma canc;ao de Chico Buarque. Escuto 
com atenc;ao 0 que esta sendo tocado no radio. 
Os exemplos apresentados nos possibilitam refletir sobre as 
atitudes de ouvir e escutar. Ouvir e relativo a uma rotina, a urn au-
tomatismo e nao constitui uma relac;ao. 0 som passa distante na 
minha vida e sem significac;aoprofunda para mim. 0 ate de ouvir 
revela uma passividade pela qual aquilo que e OUvidO nao e enten-
dido. Por outro lado, a atitude de escutar revela uma postura mais 
dinamica que exige uma atenc;ao para aquilo que se passa, uma 
interrogac;ao sobre 0 significado rna is profundo do que e dito e, ao 
mesmo tempo, uma certa humildade, pois estarei tentando com-
preender 0 que esta sendo veiculado. Nao e uma atitude passiva 
mas, pelo contrario, uma atitude de saida de si mesmo para captar 
o que se pass a ao redor. Escutar, na relac;ao terapeutica, exige 
que eu seja sensivel as diferenc;as de todas as ordens que se es-
tabelecem entre 0 outro e eu como terapeuta. Assim, gostaria de 
colocar aqui as palavras de Claire Kebers sobre 0 que vern a ser 
uma escuta: "escutar de maneira terapeutica e convidar 0 outro a 
se livrar de tudo 0 que 0 habita, portanto, e ser voce mesmo capaz 
de tudo ouvir deste outro, ser capaz de indagar seus sentimentos 
criticos sem se deixar voce mesmo se misturar".120 
12°KEBERS, Claire. De I'urn a I'outre ... la parole. Louvain-Ia-Neuve: Ciaco, 1985, 
p.45. 
106 
o proximo passo que nos levara a aprofundar 0 que seja a es-
cuta consiste em saber que atitude devemos ter para escutar bem, 
po is nao basta querer passar de uma atitude de ouvir para uma de 
escutar; e necessario escutar bem. Destacarei a seguir ':!Igumas 
caracteristicas de uma boa escuta: 
a) Tomar distancia de si mesmo 
A questao que se coloca agora se refere ao que e tomar dis-
tancia de si mesmo para poder entrar no mundo do outr~. Entrar 
no lugar do outro, investigar 0 que 0 outro esta vivendo exige que 
eu tome distancia das minhas vivencias. Porem, isto nao significa 
uma total indiferenc;a de mim mesmo para entrar na vida do ou-
tro. Pelo contrario, entrar no mundo do outro nao e negar a mim 
mesmo. A atitude de penetrar na vivencia do outro so e possivel 
se tenho um conhecimento dos meus pontos fracos e uma com-
preensao dos meus desejos mais profundos121 . E necessario que 
eu me conhec;a bem, meus limites, minha capacidade, para que eu 
possa escutar 0 outro. So desta maneira posso me abrir ao outr~ 
para escuta-Io. 
A distancia de si mesmo e pois, em primeiro lugar, a escuta de 
si mesmo que se faz atraves de um longo caminhar reflexivo sobre 
a propria historia. 
b) A humildade de nao-saber 
o perigo maior de uma atitude de nao humildade e que nos 
escutamos no outro aquilo que queremos escutar; por isto, 0 que 0 
outro diz nos escapa, ou melhor, nada compreendemos do que 0 
outro esta nos dizendo. Portanto, escutar e em primeiro lugar "re-
nunciar nas palavras do outro aquilo que nos pensamos entender 
ou que nos queremos entender"122. 
121 KEBERS, op. Cit., nota 6, p. 28. 
122KEBERS, op. Cit., nota 6, p. 28. 
107 
· . 
termos que revelam atitudes bem diferentes diante da vida. Por 
exemplo, posso dizer que ou<;o 0 barulho dos carros que passam 
na rua e, por outro lado, escuto 0 barulho de um carro que me e 
familiar chegando. Entre todos os barulhos distingo 0 barulho do 
carro de um amigo, ou de urn parente. A mesma coisa posso dizer 
a respeito da musica. As vezes estou estudando com fundo mu-
sical, ouvindo uma musica classica ou popular, e em determinado 
momenta identifico dentre as que estao sendo tocadas no radio 
uma musica de Bach ou uma canc;ao de Chico Buarque. Escuto 
com atenc;ao 0 que esta sendo tocado no radio. 
Os exemplos apresentados nos possibilitam refletir sobre as 
atitudes de ouvir e escutar. Ouvir e relativo a uma rotina, a urn au-
tomatismo e nao constitui uma relac;ao. 0 som passa distante na 
minha vida e sem significac;ao profunda para mim. 0 ate de ouvir 
revela uma passividade pela qual aquilo que e OUvidO nao e enten-
dido. Por outro lado, a atitude de escutar revela uma postura mais 
dinamica que exige uma atenc;ao para aquilo que se passa, uma 
interrogac;ao sobre 0 significado rna is profundo do que e dito e, ao 
mesmo tempo, uma certa humildade, pois estarei tentando com-
preender 0 que esta sendo veiculado. Nao e uma atitude passiva 
mas, pelo contrario, uma atitude de saida de si mesmo para captar 
o que se pass a ao redor. Escutar, na relac;ao terapeutica, exige 
que eu seja sensivel as diferenc;as de todas as ordens que se es-
tabelecem entre 0 outro e eu como terapeuta. Assim, gostaria de 
colocar aqui as palavras de Claire Kebers sobre 0 que vern a ser 
uma escuta: "escutar de maneira terapeutica e convidar 0 outro a 
se livrar de tudo 0 que 0 habita, portanto, e ser voce mesmo capaz 
de tudo ouvir deste outro, ser capaz de indagar seus sentimentos 
criticos sem se deixar voce mesmo se misturar".120 
12°KEBERS, Claire. De I'urn a I'outre ... la parole. Louvain-Ia-Neuve: Ciaco, 1985, 
p.45. 
106 
o proximo passo que nos levara a aprofundar 0 que seja a es-
cuta consiste em saber que atitude devemos ter para escutar bem, 
po is nao basta querer passar de uma atitude de ouvir para uma de 
escutar; e necessario escutar bem. Destacarei a seguir ':!Igumas 
caracteristicas de uma boa escuta: 
a) Tomar distancia de si mesmo 
A questao que se coloca agora se refere ao que e tomar dis-
tancia de si mesmo para poder entrar no mundo do outr~. Entrar 
no lugar do outro, investigar 0 que 0 outro esta vivendo exige que 
eu tome distancia das minhas vivencias. Porem, isto nao significa 
uma total indiferenc;a de mim mesmo para entrar na vida do ou-
tro. Pelo contrario, entrar no mundo do outro nao e negar a mim 
mesmo. A atitude de penetrar na vivencia do outro so e possivel 
se tenho um conhecimento dos meus pontos fracos e uma com-
preensao dos meus desejos mais profundos121 . E necessario que 
eu me conhec;a bem, meus limites, minha capacidade, para que eu 
possa escutar 0 outro. So desta maneira posso me abrir ao outr~ 
para escuta-Io. 
A distancia de si mesmo e pois, em primeiro lugar, a escuta de 
si mesmo que se faz atraves de um longo caminhar reflexivo sobre 
a propria historia. 
b) A humildade de nao-saber 
o perigo maior de uma atitude de nao humildade e que nos 
escutamos no outro aquilo que queremos escutar; por isto, 0 que 0 
outro diz nos escapa, ou melhor, nada compreendemos do que 0 
outro esta nos dizendo. Portanto, escutar e em primeiro lugar "re-
nunciar nas palavras do outro aquilo que nos pensamos entender 
ou que nos queremos entender"122. 
121 KEBERS, op. Cit., nota 6, p. 28. 
122KEBERS, op. Cit., nota 6, p. 28. 
107 
· , 
Assim, aquele que se apresenta como 0 "salvador" do clien-
te, que e capaz ou tem 0 poder de encontrar a soluc;ao para 0 
outr~, ou ate mesmo ser seu conselheiro, no fundo possui a 
atitude da onipresenc;a completamente oposta a da humildade, 
que e capaz de dizer que foi incapaz de compreender tudo 0 
que 0 outr~ disse. A humildade do nao saber passa pelo simples 
fato de que, como terapeuta, nao tenho 0 monopolio do saber, 
do poder e da mudanc;a. 
c) Renuncia de seus projetos 
Talvez esta seja uma atitude muito falada, porem muito diff-
cil de ser vivida. Na maioria das vezes, quando entr~ em relac;ao 
com um parente ou amigo, amito jufzos e apresento possfveis 
soluc;oes para um problema familiar. A escuta e interpretac;ao 
que se da no ambiente familiar sao as vezes transferidas para 
o ambito da psicoterapia; e tenho a ideia de que a minha inter-
venc;ao e a melhor considerac;ao possfvel sobre 0 que 0 cliente 
esta apresentando, esquecendo de permitir que 0 outr~ mesmo 
considere a minha interpretac;ao. Devo fazer uma renuncia de 
meus proprios desejos quanta a um projeto de solw;ao ou de 
"cura" do outr~. 
o nao querer jogar sobre 0 outr~ 0 meu conhecimento e 
que abrira a via de libertac;ao do outr~. No momenta em que eu 
renuncio aos meus afeitos e desejos, 0 outr~ pode tornar-se 0 
que ele e nele mesmo123. 0 outro desabrocha quando deixo de 
projetar nele a minha sabedoria. 
Como conclusao, diria que a relac;ao terapeutica, sendo inter-
subjetiva e com caracterfsticas muito peculiares, exigeuma aten-
c;ao sempre vigilante do terapeuta para criar e desenvolver um 
clima de confianc;a onde 0 cliente se sinta aceito. Por outr~ lado, 
123KEBERS, op. cit., nota 6, p. 29. 
108 
para que a sua escuta seja cad a vez mais autentica. e necessario 
livrar-se de preconceitos e, principal mente, de pre-julgamentos. 0 
ser humane e por natureza aberto ao outr~, a relac;ao e a desco-
berta das proprias potencialidades. Para 0 seu cresci mento, con-
vem que eu nao coloque minhas ideias sobre ele. 
Referencias Bibliogrilficas 
ENTRALGO, Pedro Lain. Teorfa y Realidad del Otro. Revista 
de Occidente, Madrid, v. 2, p. 70,1968. 
BINSWANGER, L. Ausgewahlte Vortrage und Aufsatze. 
Bern: Francke Verlag, 1961, v. 1, p. 136: Ober Psychotherapie. 
KEBERS, Claire. De I'urn a !'outre ... la parole. Louvain-Ia-
-Neuve: Ciaco, 1985, p. 45. 
109 
· , 
Assim, aquele que se apresenta como 0 "salvador" do clien-
te, que e capaz ou tem 0 poder de encontrar a soluc;ao para 0 
outr~, ou ate mesmo ser seu conselheiro, no fundo possui a 
atitude da onipresenc;a completamente oposta a da humildade, 
que e capaz de dizer que foi incapaz de compreender tudo 0 
que 0 outr~ disse. A humildade do nao saber passa pelo simples 
fato de que, como terapeuta, nao tenho 0 monopolio do saber, 
do poder e da mudanc;a. 
c) Renuncia de seus projetos 
Talvez esta seja uma atitude muito falada, porem muito diff-
cil de ser vivida. Na maioria das vezes, quando entr~ em relac;ao 
com um parente ou amigo, amito jufzos e apresento possfveis 
soluc;oes para um problema familiar. A escuta e interpretac;ao 
que se da no ambiente familiar sao as vezes transferidas para 
o ambito da psicoterapia; e tenho a ideia de que a minha inter-
venc;ao e a melhor considerac;ao possfvel sobre 0 que 0 cliente 
esta apresentando, esquecendo de permitir que 0 outr~ mesmo 
considere a minha interpretac;ao. Devo fazer uma renuncia de 
meus proprios desejos quanta a um projeto de solw;ao ou de 
"cura" do outr~. 
o nao querer jogar sobre 0 outr~ 0 meu conhecimento e 
que abrira a via de libertac;ao do outr~. No momenta em que eu 
renuncio aos meus afeitos e desejos, 0 outr~ pode tornar-se 0 
que ele e nele mesmo123. 0 outro desabrocha quando deixo de 
projetar nele a minha sabedoria. 
Como conclusao, diria que a relac;ao terapeutica, sendo inter-
subjetiva e com caracterfsticas muito peculiares, exige uma aten-
c;ao sempre vigilante do terapeuta para criar e desenvolver um 
clima de confianc;a onde 0 cliente se sinta aceito. Por outr~ lado, 
123KEBERS, op. cit., nota 6, p. 29. 
108 
para que a sua escuta seja cad a vez mais autentica. e necessario 
livrar-se de preconceitos e, principal mente, de pre-julgamentos. 0 
ser humane e por natureza aberto ao outr~, a relac;ao e a desco-
berta das proprias potencialidades. Para 0 seu cresci mento, con-
vem que eu nao coloque minhas ideias sobre ele. 
Referencias Bibliogrilficas 
ENTRALGO, Pedro Lain. Teorfa y Realidad del Otro. Revista 
de Occidente, Madrid, v. 2, p. 70,1968. 
BINSWANGER, L. Ausgewahlte Vortrage und Aufsatze. 
Bern: Francke Verlag, 1961, v. 1, p. 136: Ober Psychotherapie. 
KEBERS, Claire. De I'urn a !'outre ... la parole. Louvain-Ia-
-Neuve: Ciaco, 1985, p. 45. 
109 
POS-MODERNIDADE E 0 VAliD 
EXISTENCIAL 124 
o fim do seculo XX e 0 inicio de um novo milenio revelam-nos 
uma serie de transforma<;oes jamais vistas na historia da Humani-
dade. A Civiliza<;80 Ocidental neste fim de milenio, afirma-ve como 
o modelo da primeira ciyiliza<;ao universal, impondo ao resto do 
mundo sua maneira de organizar a sociedade, seu estilo de vida 
e seus valores. Esse modelo de viver expressa-se no chamado 
projeto da modernidade que, tendo-se iniciado no final do seculo 
XVIII, enfrenta, hoje, sua mais profunda crise. 0 modo de ser que 
surge da crise instalada a partir dos anos 60, vem sendo denomi-
nado de vida "Pos-Moderna". 
Ora, os problemas que os homens (;ontemportmeos est80 vi-
venda, sao diferentes dos que vivia ate entao, isto e, a profundi-
dade da crise gerou um tipo de questao que 0 homem ja se havia 
colocado no passado, mas que nao havia enfrentado com tanta di-
ficuldade. Assim, para entender os problemas que enfrenta no seu 
consultorio, 0 psicologo precisa entender melhor 0 tempo atual, 
po is as interroga<;oes de seus clientes refletem muito as interroga-
<;oes do seu tempo, de sua sociedade. As questoes contempora-
neas sao a expressao da maneira como 0 homem se engaja na 
vida deste final de seculo. 
Nestas ultimas decadas assistimos a passagem de uma cons-
ciencia politica, propria dos anos 60, para uma consciencia nar-
cfsica, reflexo dos anos 80-90, na qual a preocupa<;80 pelo outro 
cede lugar a anticonsciemda, a substituindo-se a esfera publica 
pela esfera privada. Assim, as desordens neuroticas que foram 
tratadas pelos terapeutas do inicio ate os meados deste seculo, 
foram substitufdas pel as desordens narcfsicas que se caracteri-
124Texto editado no Livro Existencia e Saude, organizado por Dagmar Silva e outros, 
Sao Bernardo do Campo, UMESP - Sobraphe, 202, paginas 92-100. 
111 
POS-MODERNIDADE E 0 VAliD 
EXISTENCIAL 124 
o fim do seculo XX e 0 inicio de um novo milenio revelam-nos 
uma serie de transforma<;oes jamais vistas na historia da Humani-
dade. A Civiliza<;80 Ocidental neste fim de milenio, afirma-ve como 
o modelo da primeira ciyiliza<;ao universal, impondo ao resto do 
mundo sua maneira de organizar a sociedade, seu estilo de vida 
e seus valores. Esse modelo de viver expressa-se no chamado 
projeto da modernidade que, tendo-se iniciado no final do seculo 
XVIII, enfrenta, hoje, sua mais profunda crise. 0 modo de ser que 
surge da crise instalada a partir dos anos 60, vem sendo denomi-
nado de vida "Pos-Moderna". 
Ora, os problemas que os homens (;ontemportmeos est80 vi-
venda, sao diferentes dos que vivia ate entao, isto e, a profundi-
dade da crise gerou um tipo de questao que 0 homem ja se havia 
colocado no passado, mas que nao havia enfrentado com tanta di-
ficuldade. Assim, para entender os problemas que enfrenta no seu 
consultorio, 0 psicologo precisa entender melhor 0 tempo atual, 
po is as interroga<;oes de seus clientes refletem muito as interroga-
<;oes do seu tempo, de sua sociedade. As questoes contempora-
neas sao a expressao da maneira como 0 homem se engaja na 
vida deste final de seculo. 
Nestas ultimas decadas assistimos a passagem de uma cons-
ciencia politica, propria dos anos 60, para uma consciencia nar-
cfsica, reflexo dos anos 80-90, na qual a preocupa<;80 pelo outro 
cede lugar a anticonsciemda, a substituindo-se a esfera publica 
pela esfera privada. Assim, as desordens neuroticas que foram 
tratadas pelos terapeutas do inicio ate os meados deste seculo, 
foram substitufdas pel as desordens narcfsicas que se caracteri-
124Texto editado no Livro Existencia e Saude, organizado por Dagmar Silva e outros, 
Sao Bernardo do Campo, UMESP - Sobraphe, 202, paginas 92-100. 
111 
zam por um mal-estar difuso e indefinido, ou seja, um "sentimento 
de vazio interior e de absurdidade da vida, uma incapacidade de 
sentir as coisas e os seres. Os pacientes nao sofrem mais de sin-
tomas fix~s, mas de desordens vagas e difusas; a patologia men-
tal obedece a lei do tempo, na qual a tendencia e a redugao da 
rigidez, como a IiqOefagao das referencias estaveis".125 Para U-
POVETSKY, a era contemporanea apresenta como sintoma mais 
significativ~ dos problemas existenciais do homem pas-moderno 
o vazio emotiv~, que se manifesta na impossibilidade de sentir a 
vida, e na desubstancializagao dos valores, isto 6, no esvaziamen-
to dos significados das coisas. 
Nossa reflexao procurara, em um primeiro momento, explici-
tar as caracteristicas dessa nossa epoca denominada por alguns 
de pas-modernidade, para, num segundo momento, destacar al-
guns dos problemas existenciais desse homem contemporaneo. 
No nosso entender, merecem a atengao do psicalogo 0 problemado vazio, 0 do tedio e 0 da apatia, que sao os mais freqOentes no 
consultario. 
I - POS-MODERNIDADE 
A maneira como a sociedade contemporanea organiza-se e to-
talmente diferente daquela de alguns seculos atras. Antes, nao ha-
via um modelo padrao para todos os individuos. Hoje, 0 pluralismo 
de nossa epoca substituiu a monotonia e 0 dogmatismo da epoca 
passada. Encontrar um conceito que expresse de maneira univo-
ca essa situagao nao e facil, e, por isso mesmo, os estudiosos de 
nosso tempo nao estao de acordo quanto ao termo que melhor 
possa retratar a fragmenta9ao contemporanea. Uns denominam 0 
periodo atual de modernidade tardia, outros de neomodernidade 
e, outros ainda, de pas-modernidade. Embora a expressao pas-
125L1POVETSKY, G. L'ere du vide. Essais sur I' individualisme contemporain. Paris: 
Gallimard, - folio essais - 1983, pp. 108-109. 
112 
-modernidade n80 seja a mais adequada, pois que pas sugere um 
ultrapassamento da modernidade, e ele 0 que se tem se fixado 
como 0 que representa melhor a situagao contemporanea.126 
A sociedade atual e fruto de um processo denominado mo-
dernidade, que comegou a se estruturar no final do seculo_XVIJI e 
no inicio do seculo XIX, quando a Revolugao Francesa apareceu 
como um momenta histarico de instauragao da racionalidade ilus-
trada. 0 paradigma triunfante da razao, capaz de apreender tudo 
dentro de sua racionalidade, isto e, s6 tem existencia aquilo que 
pode ser explicado pela razao. 0 projeto de sociedade baseado 
nesse modo de pensar e de organizar a vida humana chegou a 
alguns impasses no seculo XX; como a deflagrag80 da Primeira 
Guerra Mundial e a explosao da bomba at6mica, como exemplo. 
D;ante de tao grandes incoerencias observadas na sociedade 
dita racional, surgiu uma corrente de pensadores que, inspirados 
no pensamento romantico, e tendo NIETSZSCHE e HEIDEGGER 
como inspiradores, instauraram a oposig80 aos modernos, recha-
9ando a razao ilustrada como a organizadora da vida humana. 
Assim, "no debate da pas-modernidade, discute-se nao so mente 
um paradigma de racionalidade e humanismo, mas tambem uma 
concepgao sociopolitica e econ6mica da sociedade de hoje e de 
amanha".127 
Um dos setores em que essa problematica aparece com mais 
fOl9a e 0 cultural e nele a crise dos valores tem um destaque fun-
damental. A perda da religiao como principio unificador da vida 
humana vai gerar 0 aparecimento de varios focos inspiradores da 
atividade cotidiana do homem contemporaneo, tendo, como carac-
teristica principal, a marca da desilusao. Ha um desencantamento 
126Vamos utilizar no nosso trabalho 0 termo P6s-Modernidade para ":escrever 0 
conjunto das caracterfsticas da sociedade atual, embora, estejamos convictos de 
que 0 conceito de Modernidade Tardia fosse 0 mais apropriado, discussao que nao 
cabe neste momento. 
127MARDONES, J.M. Mode:nidad y Posmodernidad (I), em Razon y Fe 1056 (1986), 
pp. 204-217, aquip. 206. 
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zam por um mal-estar difuso e indefinido, ou seja, um "sentimento 
de vazio interior e de absurdidade da vida, uma incapacidade de 
sentir as coisas e os seres. Os pacientes nao sofrem mais de sin-
tomas fix~s, mas de desordens vagas e difusas; a patologia men-
tal obedece a lei do tempo, na qual a tendencia e a redugao da 
rigidez, como a IiqOefagao das referencias estaveis".125 Para U-
POVETSKY, a era contemporanea apresenta como sintoma mais 
significativ~ dos problemas existenciais do homem pas-moderno 
o vazio emotiv~, que se manifesta na impossibilidade de sentir a 
vida, e na desubstancializagao dos valores, isto 6, no esvaziamen-
to dos significados das coisas. 
Nossa reflexao procurara, em um primeiro momento, explici-
tar as caracteristicas dessa nossa epoca denominada por alguns 
de pas-modernidade, para, num segundo momento, destacar al-
guns dos problemas existenciais desse homem contemporaneo. 
No nosso entender, merecem a atengao do psicalogo 0 problema 
do vazio, 0 do tedio e 0 da apatia, que sao os mais freqOentes no 
consultario. 
I - POS-MODERNIDADE 
A maneira como a sociedade contemporanea organiza-se e to-
talmente diferente daquela de alguns seculos atras. Antes, nao ha-
via um modelo padrao para todos os individuos. Hoje, 0 pluralismo 
de nossa epoca substituiu a monotonia e 0 dogmatismo da epoca 
passada. Encontrar um conceito que expresse de maneira univo-
ca essa situagao nao e facil, e, por isso mesmo, os estudiosos de 
nosso tempo nao estao de acordo quanto ao termo que melhor 
possa retratar a fragmenta9ao contemporanea. Uns denominam 0 
periodo atual de modernidade tardia, outros de neomodernidade 
e, outros ainda, de pas-modernidade. Embora a expressao pas-
125L1POVETSKY, G. L'ere du vide. Essais sur I' individualisme contemporain. Paris: 
Gallimard, - folio essais - 1983, pp. 108-109. 
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-modernidade n80 seja a mais adequada, pois que pas sugere um 
ultrapassamento da modernidade, e ele 0 que se tem se fixado 
como 0 que representa melhor a situagao contemporanea.126 
A sociedade atual e fruto de um processo denominado mo-
dernidade, que comegou a se estruturar no final do seculo_XVIJI e 
no inicio do seculo XIX, quando a Revolugao Francesa apareceu 
como um momenta histarico de instauragao da racionalidade ilus-
trada. 0 paradigma triunfante da razao, capaz de apreender tudo 
dentro de sua racionalidade, isto e, s6 tem existencia aquilo que 
pode ser explicado pela razao. 0 projeto de sociedade baseado 
nesse modo de pensar e de organizar a vida humana chegou a 
alguns impasses no seculo XX; como a deflagrag80 da Primeira 
Guerra Mundial e a explosao da bomba at6mica, como exemplo. 
D;ante de tao grandes incoerencias observadas na sociedade 
dita racional, surgiu uma corrente de pensadores que, inspirados 
no pensamento romantico, e tendo NIETSZSCHE e HEIDEGGER 
como inspiradores, instauraram a oposig80 aos modernos, recha-
9ando a razao ilustrada como a organizadora da vida humana. 
Assim, "no debate da pas-modernidade, discute-se nao so mente 
um paradigma de racionalidade e humanismo, mas tambem uma 
concepgao sociopolitica e econ6mica da sociedade de hoje e de 
amanha".127 
Um dos setores em que essa problematica aparece com mais 
fOl9a e 0 cultural e nele a crise dos valores tem um destaque fun-
damental. A perda da religiao como principio unificador da vida 
humana vai gerar 0 aparecimento de varios focos inspiradores da 
atividade cotidiana do homem contemporaneo, tendo, como carac-
teristica principal, a marca da desilusao. Ha um desencantamento 
126Vamos utilizar no nosso trabalho 0 termo P6s-Modernidade para ":escrever 0 
conjunto das caracterfsticas da sociedade atual, embora, estejamos convictos de 
que 0 conceito de Modernidade Tardia fosse 0 mais apropriado, discussao que nao 
cabe neste momento. 
127MARDONES, J.M. Mode:nidad y Posmodernidad (I), em Razon y Fe 1056 (1986), 
pp. 204-217, aquip. 206. 
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com a maneira de viver que vinha sendo proposta, uma fragmen-
ta9ao das coisas que tinham como ponto de incisao na vida, 0 hu-
mano, e uma ruptura da unidade psiquica. Surge, dessa maneira, 
uma visao de imensa riqueza e heterogeneidade da vida, na qual 
cada indivfduo deve pautar-se e ter como (mica referencia, a sua 
propria existencia. Como exemplo pod em os citar a etica, tida como 
o conjunto dos principios universais que regiam a vida de todos, 
e que foi substitufda por uma etica pessoal e individualista, na 
qual a consciencia sir.gular e a referencia ultima da organiza9ao 
da dinamica pessoal. 0 centro da vida passa a nao ser mais a 
racionalidade, mas os sentimentos, isto e, aquilo que se sente e se 
experimenta internamente. Assim, 0 desejo sera 0 grande motor 
da vida. 
Essa nova maneira de encarar a existencia provocara uma 
trai1sforma<;ao radical, em que 0 "ideal moderno de subordina<;ao 
do individual as regras coletivas foi pulverizado, e 0 processo de 
personaliza<;ao atual tem um valor fundamental, aquele da realiza-
<;ao cabal,pessoal, aquele do respeito a singularidade subjetiva".128 
o estilo de vida, defendido pela pos-modernidade, passa a ser 
o do questionamento de qualquer controle ou homogeneiza<;ao, 
dando lugar a maxima de que, 0 importante e ser absolutamente 
voce-mesmo, e a vida deve ser vivida com a maxima intensidade e 
emo<;ao, deixando de lade a razao, simbolo do controle. 
Essa nova maneira de estruturar a vida, originaria do projeto 
da modernidade, gera por sua vez uma mentalidade que se propa-
ga com for<;a e envolve a maioria dos seus membros. 0 individua-
lismo passa a ser 0 motor da sociedade moderna, porem, ao longo 
de quatro seculos, ele toma formas diferentes, e, hoje, vivemos um 
individualismo extremamente exacerbado, adjetivado como narci-
sista. Assim, 0 "novo estagio do individualismo coloca-se de pe: 0 
j . narcisismo designa 0 suryimento de um perfil inedito do indivfduo 
. , 
128L1POVETSKY, G. op. cit., p. 13. 
114 
~'----- - - - - -
nas suas rela<;oes consigo mesmo e seu corpo, com 0 outro, 0 
mundo e 0 tempo, justamente no momenta em que 0 capitalismo 
autoritario cede lugar a um capitalismo hedonista e narcisista".129 
Ora, 0 centramento sobre 0 eu passa a ditar a 0~ienta9ao de todas 
as a<;oes do homem modemo, 0 fechamento sobre si me~mo, ao 
ponto de excluir 0 outr~ de sua vida, passa a ser a maxima de vida 
da maio ria das pessoas. 
Esse individualismo narcisico, expressado na ideia de que 
tudo deve passar pelo crivo do eu, vai derrubar os ultimos valores 
sociais e morais que marcaram as gera90es anteriores, quando 
a uniao familiar era mais importante do que a vida privada. Hoje, 
pelo contrario, busca-se primeiro tudo 0 que satisfa9a aos proprios 
desejos e expresse as propias emo<;oes, so depois pensa-se na 
comunidade. E necessario curtir 0 instante para depois pensar no 
futuro. Viver 0 presente pass a a ser a lei maxima dos tempos atu-
ais. Essa tirania do individualismo inaugura a pos-modemidade. 
A propaga<;ao dessa mentalidade vai caracterizar a cultura 
contemporanea como a cultura do narcisismo, que faz "do desa-
brochamento de si 0 principal valor da vida e que parece reco-
nhecer pouco as exigencias morais exteriores ou os engajamentos 
profundos em face dos outros".130 Esse egocentrismo orienta nao 
so os atos de nosso dia-a-dia, como os grandes objetivos de nos-
sa existencia. Existir em fun<;ao de si, nao mais em fun<;ao da 
rela<;ao com 0 outro e 0 que passa a orientar todas as atitudes do 
ser humano. A logica da emancipa<;ao individual reina por detras 
de todes os nossos atos. Se em decadas passadas falava-se de 
aliena<;ao - anos 60 e 70 - hoje, fala-se de emancipa<;ao; isto quer 
dizer que nosses atos s6 tern sentido se sao entendidos como atos 
que nos Iibertam enos fazem sentir-nos mais sujeitos da pr6pria 
existencia. 
129L1POVETSKY, G. op. cit., p. 71 . 
130TAYLOR, C. Le malaise de la modernite. Paris, Cef. 1994, p. 63. 
115 
com a maneira de viver que vinha sendo proposta, uma fragmen-
ta9ao das coisas que tinham como ponto de incisao na vida, 0 hu-
mano, e uma ruptura da unidade psiquica. Surge, dessa maneira, 
uma visao de imensa riqueza e heterogeneidade da vida, na qual 
cada indivfduo deve pautar-se e ter como (mica referencia, a sua 
propria existencia. Como exemplo pod em os citar a etica, tida como 
o conjunto dos principios universais que regiam a vida de todos, 
e que foi substitufda por uma etica pessoal e individualista, na 
qual a consciencia sir.gular e a referencia ultima da organiza9ao 
da dinamica pessoal. 0 centro da vida passa a nao ser mais a 
racionalidade, mas os sentimentos, isto e, aquilo que se sente e se 
experimenta internamente. Assim, 0 desejo sera 0 grande motor 
da vida. 
Essa nova maneira de encarar a existencia provocara uma 
trai1sforma<;ao radical, em que 0 "ideal moderno de subordina<;ao 
do individual as regras coletivas foi pulverizado, e 0 processo de 
personaliza<;ao atual tem um valor fundamental, aquele da realiza-
<;ao cabal, pessoal, aquele do respeito a singularidade subjetiva".128 
o estilo de vida, defendido pela pos-modernidade, passa a ser 
o do questionamento de qualquer controle ou homogeneiza<;ao, 
dando lugar a maxima de que, 0 importante e ser absolutamente 
voce-mesmo, e a vida deve ser vivida com a maxima intensidade e 
emo<;ao, deixando de lade a razao, simbolo do controle. 
Essa nova maneira de estruturar a vida, originaria do projeto 
da modernidade, gera por sua vez uma mentalidade que se propa-
ga com for<;a e envolve a maioria dos seus membros. 0 individua-
lismo passa a ser 0 motor da sociedade moderna, porem, ao longo 
de quatro seculos, ele toma formas diferentes, e, hoje, vivemos um 
individualismo extremamente exacerbado, adjetivado como narci-
sista. Assim, 0 "novo estagio do individualismo coloca-se de pe: 0 
j . narcisismo designa 0 suryimento de um perfil inedito do indivfduo 
. , 
128L1POVETSKY, G. op. cit., p. 13. 
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nas suas rela<;oes consigo mesmo e seu corpo, com 0 outro, 0 
mundo e 0 tempo, justamente no momenta em que 0 capitalismo 
autoritario cede lugar a um capitalismo hedonista e narcisista".129 
Ora, 0 centramento sobre 0 eu passa a ditar a 0~ienta9ao de todas 
as a<;oes do homem modemo, 0 fechamento sobre si me~mo, ao 
ponto de excluir 0 outr~ de sua vida, passa a ser a maxima de vida 
da maio ria das pessoas. 
Esse individualismo narcisico, expressado na ideia de que 
tudo deve passar pelo crivo do eu, vai derrubar os ultimos valores 
sociais e morais que marcaram as gera90es anteriores, quando 
a uniao familiar era mais importante do que a vida privada. Hoje, 
pelo contrario, busca-se primeiro tudo 0 que satisfa9a aos proprios 
desejos e expresse as propias emo<;oes, so depois pensa-se na 
comunidade. E necessario curtir 0 instante para depois pensar no 
futuro. Viver 0 presente pass a a ser a lei maxima dos tempos atu-
ais. Essa tirania do individualismo inaugura a pos-modemidade. 
A propaga<;ao dessa mentalidade vai caracterizar a cultura 
contemporanea como a cultura do narcisismo, que faz "do desa-
brochamento de si 0 principal valor da vida e que parece reco-
nhecer pouco as exigencias morais exteriores ou os engajamentos 
profundos em face dos outros".130 Esse egocentrismo orienta nao 
so os atos de nosso dia-a-dia, como os grandes objetivos de nos-
sa existencia. Existir em fun<;ao de si, nao mais em fun<;ao da 
rela<;ao com 0 outro e 0 que passa a orientar todas as atitudes do 
ser humano. A logica da emancipa<;ao individual reina por detras 
de todes os nossos atos. Se em decadas passadas falava-se de 
aliena<;ao - anos 60 e 70 - hoje, fala-se de emancipa<;ao; isto quer 
dizer que nosses atos s6 tern sentido se sao entendidos como atos 
que nos Iibertam enos fazem sentir-nos mais sujeitos da pr6pria 
existencia. 
129L1POVETSKY, G. op. cit., p. 71 . 
130TAYLOR, C. Le malaise de la modernite. Paris, Cef. 1994, p. 63. 
115 
.. ) 
Como diz RENAUT: "De fato, a logica do individualismo e, segu-
ramente, ada independencia, da "libertagao dos entraves", tendo 
como horizonte a maneira como 0 individuo tende a preocupar-se 
apenas consigo mesmo".131 Essa tendencia, no cotidiano, coloca 
os "indivfduos de acordo com um social pulverizado, glorificando 0 
reino do desabrochamento do ego puro".132 
Tragamos de uma forma geral 0 principio que rege nosso com-
portamento. 0 que nos intriga, agora, e tentar delinear algumas 
caracterfsticas desse-rndividualismo narcisico, isto e, explicitar sua 
fisionomia na nossa cultura. 
o primeiro trago dessa cultura do narcisismo e que 0 homem 
contemporaneo da mais valor ao presente do que ao futuro, isto 
e, viver 0 presente, 0 momento, sem preocupar-se com 0 ama-
nha. "Hoje, vivemos para nos mesmos, sem nos preocupar com 
nossas tradigoes e nossa posteridade".133 Centrar-se no presente, 
ignorando 0 passado e nao se preocupando com 0 futuro, este e 
o fenomeno que LASCH chama perda dosentido da continuidade 
historica. Or~, 0 investimento no presente faz-nos perder de vista· 
os valores da tradigao e as finalidades propostas pela dimensao 
do futuro. E como dizer que a vida deve ser desfrutada e construi-
da so em cima do momento, do instantaneo, do fugaz. 
o segundo trago pode ser detectado no momento em que a 
sensibilidade polftica dos anos 60 - que mobilizou varios questio- . 
namentos socia is em diversos regimes politicos, como, por exem-
plo, a explosao da luta armada em varios pafses da America Latina 
- perde seu espago no meio dos jovens, e e, hoje, substitufda 
pela sensibilidade terapeutica. A liberagao do eu governa as nos-
sas agoes, e e dentro dessa perspectiva que podemos entender 
a proliferagao dos livros de auto-ajuda. Ha alguns anos atras, as 
131 RENAUT, A. 0 Individuo. Reflexoes acerca da filosofia do sujeito. Rio de Janeiro: 
Difel, 1998, p. 60. 
132L1POVETSKY, G. op. cit., p. 79 . 
133L1POVETSKY, G. opo cit., p. 730 
116 
livrarias nao possufam um espago tao grande para esse tipo de Ii-
teratura. Hoje, nao so e um tema obrigatorio, mas tem um lugar de 
destaque na organizagao da loja. 0 homo psychologicus substitui 
o homo politicus. Pratica-se com muita intensidade, principalmente 
nos Estados Unidos, "a gestalt-terapia, a bioenergeticar as mas-
sagens, 0 jogging, fai chi, a danga moderna, a meditagao, etc".134 
Tudo isso como sfmbolo dessa nova era que se descortina no hori-
zonte de uma sociedade hedonista e extremamente individualista. 
Outro trago tfpico de uma sociedade centrada no eu e 0 culto 
do corpo, levado ao extremo com 0 fenomeno denominado corpo-
latria, uma valorizagao sem precedentes do corpo. E bem verdade 
que 0 corpo representa nossa identidade, isto e, ele e 0 nosso 
cartao de visita, ele expressa 0 que somos. E por meio dele que 
marcamos nossa presenga no mundo, mas 0 que fica patente e 0 
investimento macigo no corpo mediante varias atitudes e praticas 
cotidianas: "angustia da idade e das rugas, obsessoes de saude, 
de "Iinha", de higiene, rituais de controle (check-up) e de manu-
tengoes (massagens, sauna, esportes, regimes), cultos solares e 
terapeuticos, etc.".135 Nunca em outro tempo da historia humana 0 
corpo foi tao valorizado, sendo que ja se fala que 0 grande mito 
do seculo XXI sera 0 mito da saude perfeita, ocupando 0 corpo 
um lugar de destaque. Atualmente, as grandes figuras femininas 
da mfdia estao procurando apresentar sempre a imagem de que 
possuem um corpo perfeito e, por isto, a era do silicone instalou-se 
com tamanho sucesso. 
Ainda podemos destacar, como expressao da presenga dessa 
ideologia individualista no nosso quotidiano, 0 desaparecimento 
da consciencia de classe e, conseqOentemente, 0 do s~ntimen­
to de solidariedade, dando lugar a tirania da intimidade. 0 que 
tem importancia, agora, e 0 eu intimo em detrimento dos papeis 
134L1POVETSKY, G. opo cit., p. 77. 
135L1POVETSKY, G. op. cit., pp. 86-87. 
117 
.. ) 
Como diz RENAUT: "De fato, a logica do individualismo e, segu-
ramente, ada independencia, da "libertagao dos entraves", tendo 
como horizonte a maneira como 0 individuo tende a preocupar-se 
apenas consigo mesmo".131 Essa tendencia, no cotidiano, coloca 
os "indivfduos de acordo com um social pulverizado, glorificando 0 
reino do desabrochamento do ego puro".132 
Tragamos de uma forma geral 0 principio que rege nosso com-
portamento. 0 que nos intriga, agora, e tentar delinear algumas 
caracterfsticas desse-rndividualismo narcisico, isto e, explicitar sua 
fisionomia na nossa cultura. 
o primeiro trago dessa cultura do narcisismo e que 0 homem 
contemporaneo da mais valor ao presente do que ao futuro, isto 
e, viver 0 presente, 0 momento, sem preocupar-se com 0 ama-
nha. "Hoje, vivemos para nos mesmos, sem nos preocupar com 
nossas tradigoes e nossa posteridade".133 Centrar-se no presente, 
ignorando 0 passado e nao se preocupando com 0 futuro, este e 
o fenomeno que LASCH chama perda do sentido da continuidade 
historica. Or~, 0 investimento no presente faz-nos perder de vista· 
os valores da tradigao e as finalidades propostas pela dimensao 
do futuro. E como dizer que a vida deve ser desfrutada e construi-
da so em cima do momento, do instantaneo, do fugaz. 
o segundo trago pode ser detectado no momento em que a 
sensibilidade polftica dos anos 60 - que mobilizou varios questio- . 
namentos socia is em diversos regimes politicos, como, por exem-
plo, a explosao da luta armada em varios pafses da America Latina 
- perde seu espago no meio dos jovens, e e, hoje, substitufda 
pela sensibilidade terapeutica. A liberagao do eu governa as nos-
sas agoes, e e dentro dessa perspectiva que podemos entender 
a proliferagao dos livros de auto-ajuda. Ha alguns anos atras, as 
131 RENAUT, A. 0 Individuo. Reflexoes acerca da filosofia do sujeito. Rio de Janeiro: 
Difel, 1998, p. 60. 
132L1POVETSKY, G. op. cit., p. 79 . 
133L1POVETSKY, G. opo cit., p. 730 
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livrarias nao possufam um espago tao grande para esse tipo de Ii-
teratura. Hoje, nao so e um tema obrigatorio, mas tem um lugar de 
destaque na organizagao da loja. 0 homo psychologicus substitui 
o homo politicus. Pratica-se com muita intensidade, principalmente 
nos Estados Unidos, "a gestalt-terapia, a bioenergeticar as mas-
sagens, 0 jogging, fai chi, a danga moderna, a meditagao, etc".134 
Tudo isso como sfmbolo dessa nova era que se descortina no hori-
zonte de uma sociedade hedonista e extremamente individualista. 
Outro trago tfpico de uma sociedade centrada no eu e 0 culto 
do corpo, levado ao extremo com 0 fenomeno denominado corpo-
latria, uma valorizagao sem precedentes do corpo. E bem verdade 
que 0 corpo representa nossa identidade, isto e, ele e 0 nosso 
cartao de visita, ele expressa 0 que somos. E por meio dele que 
marcamos nossa presenga no mundo, mas 0 que fica patente e 0 
investimento macigo no corpo mediante varias atitudes e praticas 
cotidianas: "angustia da idade e das rugas, obsessoes de saude, 
de "Iinha", de higiene, rituais de controle (check-up) e de manu-
tengoes (massagens, sauna, esportes, regimes), cultos solares e 
terapeuticos, etc.".135 Nunca em outro tempo da historia humana 0 
corpo foi tao valorizado, sendo que ja se fala que 0 grande mito 
do seculo XXI sera 0 mito da saude perfeita, ocupando 0 corpo 
um lugar de destaque. Atualmente, as grandes figuras femininas 
da mfdia estao procurando apresentar sempre a imagem de que 
possuem um corpo perfeito e, por isto, a era do silicone instalou-se 
com tamanho sucesso. 
Ainda podemos destacar, como expressao da presenga dessa 
ideologia individualista no nosso quotidiano, 0 desaparecimento 
da consciencia de classe e, conseqOentemente, 0 do s~ntimen­
to de solidariedade, dando lugar a tirania da intimidade. 0 que 
tem importancia, agora, e 0 eu intimo em detrimento dos papeis 
134L1POVETSKY, G. opo cit., p. 77. 
135L1POVETSKY, G. op. cit., pp. 86-87. 
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·.' I 
socia is. Dessa maneira, 0 narcisismo "nao designa somente a pai-
xao pelo conhecimento de si, mas tambem a paixao da revelagao 
intima do eu que e testemunhado pel a inflagao atual de biografias 
e autobiografias ou pela psicologizagao da linguagem poHtica".136 
o homem nao se identifica com as marcas da vida social mas ao , 
contrario, com a sua verdade psicologica. 
Finalmente, nao no senti do de que esgotamos todas as carac-
teristicas dessa nova maneira de ser, mas, para resumir esse novo 
estilo de vida, diremos que 0 homem moderno busca uma vida 
"light". ROJAS parte de uma definigao do terma, dizendo que a 
palavra "light, carrega impHcita uma mensagem forte: tudo e leve, 
suave, descafeinado, ligeiro, aereo, fraco, e tudo tern baixo conte-
udo calorico; poderiamos dizer que estamos diante de um retrato 
de novo tipo humano, cujo lema e comer e beber tudo sem nenhu-
ma caloria" .137 0 autor quer mostrar que, embora 0 termo na sua 
origem tivesse um significado positiv~, agoraele "constitui um sinal 
dOG tempos que correm, refletindo claramente um modelo de vida . ' 
muito pobre. A vida light caracteriza-se pelo fato de que tudo esta 
sem calorias, sem gosto ou sem interesse; a essencia das coisas 
nao importa, s6 e quente 0 superficial".138 
Viver na superficialidade - sem buscar construir relagoes inter-
pessoais profundas, que exijam para a sua construgao uma saida 
de si e a renuncia a algumas coisas - passou a ser a marca regis-
trada da maioria das pessoas. Em nenhum momento, pensa-e em 
abrir mao de alguma coisa pessoal em beneficio do outro. S6 vale 
o comodismo de cad a um. Nao se faz esforgo para participar de 
algum debate mais significativo para a vida humana. Vamos fazer 
de conta que os problemas estao longe de n6s, e, 0 que e mais 
facil e comodo, nao vamos encara-Ios. 
,36L1POVETSKY. G. op. cit., pp. 91-92. 
'37 ROJAS. E. 0 homem moderno. A luta contra 0 vazio. Sao Paulo: Ed. Mandarim, 
1996, p. 69. 
'38ROJAS, E. op. cit., p. 70. 
118 
Ora, 0 tipo de conc/usao que se impoe, para caracterizar 0 
tipo de vida atual, pode ser bem expresso no titulo do livro de L/-
POVETSKY, chamado a Era do Vazio. Talvez 0 grande sintoma 
do momenta atual possa ser bem simbolizado com a questao do 
vazio. Nao se encontra rumo para uma sociedade que .vivecada 
vez mais no individualismo e que tem como princfpio a exc/usao 
sistematica do outro. 
11- PROBLEMAS EXISTENCIAS 
CONTEMPORANEOS 
o quadro desenhado acima explicita uma gama de transforma-
goes na estrutura existencial do homem. 0 que captamos, em pri-
meiro lugar, sao os sintomas do impacto desse tipo de organizagao 
da sociedade sobre a vida psicologica do sujeito. Podemos enu-
merar uma infinidade de sintomas como depressao, stress, angus-
tia, desespero, etc., que refletem uma desorganizac;ao na estrutu-
ra da Existencia. Interessa-nos refletir sobre a questao que esta 
subjacente a esses sintomas, pois permanecer neles, ou trata-Ios 
de forma "objetiva", seria passar longe do problema existencial do 
homem contemporaneo. 
A pergunta que salta aos olhos e: existe um problema maior, 
subjacente, se nao a todos os sintomas, mas a maioria deles, ou 
isto e uma pseudoquestao? Essa ordenag80 da sociedade, base-
ada no efemero e no superficial, atinge algo mais profundo na vida 
humana, ou nos, como seres human os, seremos capazes de viver 
esse tipo de realidade sem sofrer nenhuma consequencia, isto e, 
somos chamados a viver na banalidade? 
A nosso ver, a vida humana tem uma significa980 tao profunda 
que, quando impedimos sua manifestagao, aparecem varios tipos 
de incomodos. 0 homem, diferentemente do animal, tem necessi-
dade de dar um sentido a sua vida. Essa capacidade e que nos faz 
diferentes dos outros seres. Ninguem vive sem sentido. Acontece 
119 
·.' I 
socia is. Dessa maneira, 0 narcisismo "nao designa somente a pai-
xao pelo conhecimento de si, mas tambem a paixao da revelagao 
intima do eu que e testemunhado pel a inflagao atual de biografias 
e autobiografias ou pela psicologizagao da linguagem poHtica".136 
o homem nao se identifica com as marcas da vida social mas ao , 
contrario, com a sua verdade psicologica. 
Finalmente, nao no senti do de que esgotamos todas as carac-
teristicas dessa nova maneira de ser, mas, para resumir esse novo 
estilo de vida, diremos que 0 homem moderno busca uma vida 
"light". ROJAS parte de uma definigao do terma, dizendo que a 
palavra "light, carrega impHcita uma mensagem forte: tudo e leve, 
suave, descafeinado, ligeiro, aereo, fraco, e tudo tern baixo conte-
udo calorico; poderiamos dizer que estamos diante de um retrato 
de novo tipo humano, cujo lema e comer e beber tudo sem nenhu-
ma caloria" .137 0 autor quer mostrar que, embora 0 termo na sua 
origem tivesse um significado positiv~, agora ele "constitui um sinal 
dOG tempos que correm, refletindo claramente um modelo de vida . ' 
muito pobre. A vida light caracteriza-se pelo fato de que tudo esta 
sem calorias, sem gosto ou sem interesse; a essencia das coisas 
nao importa, s6 e quente 0 superficial".138 
Viver na superficialidade - sem buscar construir relagoes inter-
pessoais profundas, que exijam para a sua construgao uma saida 
de si e a renuncia a algumas coisas - passou a ser a marca regis-
trada da maioria das pessoas. Em nenhum momento, pensa-e em 
abrir mao de alguma coisa pessoal em beneficio do outro. S6 vale 
o comodismo de cad a um. Nao se faz esforgo para participar de 
algum debate mais significativo para a vida humana. Vamos fazer 
de conta que os problemas estao longe de n6s, e, 0 que e mais 
facil e comodo, nao vamos encara-Ios. 
,36L1POVETSKY. G. op. cit., pp. 91-92. 
'37 ROJAS. E. 0 homem moderno. A luta contra 0 vazio. Sao Paulo: Ed. Mandarim, 
1996, p. 69. 
'38ROJAS, E. op. cit., p. 70. 
118 
Ora, 0 tipo de conc/usao que se impoe, para caracterizar 0 
tipo de vida atual, pode ser bem expresso no titulo do livro de L/-
POVETSKY, chamado a Era do Vazio. Talvez 0 grande sintoma 
do momenta atual possa ser bem simbolizado com a questao do 
vazio. Nao se encontra rumo para uma sociedade que .vivecada 
vez mais no individualismo e que tem como princfpio a exc/usao 
sistematica do outro. 
11- PROBLEMAS EXISTENCIAS 
CONTEMPORANEOS 
o quadro desenhado acima explicita uma gama de transforma-
goes na estrutura existencial do homem. 0 que captamos, em pri-
meiro lugar, sao os sintomas do impacto desse tipo de organizagao 
da sociedade sobre a vida psicologica do sujeito. Podemos enu-
merar uma infinidade de sintomas como depressao, stress, angus-
tia, desespero, etc., que refletem uma desorganizac;ao na estrutu-
ra da Existencia. Interessa-nos refletir sobre a questao que esta 
subjacente a esses sintomas, pois permanecer neles, ou trata-Ios 
de forma "objetiva", seria passar longe do problema existencial do 
homem contemporaneo. 
A pergunta que salta aos olhos e: existe um problema maior, 
subjacente, se nao a todos os sintomas, mas a maioria deles, ou 
isto e uma pseudoquestao? Essa ordenag80 da sociedade, base-
ada no efemero e no superficial, atinge algo mais profundo na vida 
humana, ou nos, como seres human os, seremos capazes de viver 
esse tipo de realidade sem sofrer nenhuma consequencia, isto e, 
somos chamados a viver na banalidade? 
A nosso ver, a vida humana tem uma significa980 tao profunda 
que, quando impedimos sua manifestagao, aparecem varios tipos 
de incomodos. 0 homem, diferentemente do animal, tem necessi-
dade de dar um sentido a sua vida. Essa capacidade e que nos faz 
diferentes dos outros seres. Ninguem vive sem sentido. Acontece 
119 
que, se nos nao damos um sentido a nossa vida, os outro, a socie-
dade, ou alguem imprimira para nos esse sentido. Assim, 0 sentido 
da vida passa a ser 0 problema central do homem moderno, pois 
essa efemeridade da vida impede que olhemos, com clareza, 0 
sentido mais profundo de nossa exist€mcia. 
A perda do sentido aparece no momenta em que comeyamos 
a perder contato com a vida, no momento em que 0 contato com 
os outros seres humanos deixa de ser primordial, e passa a ocu-
par um lugar secundario na nossa existemcia.1~9 YALOM, ao ana-
lisar os quatro elementos que compoem a dinamica existencial 
do homem, mostra que a carencia de um sentido vital e uma das 
vivencias fundamentais do ser humane e e constitutiva da psicodi-
namica existencial. A crise da falta de sentido vital configura varios 
quadros neur6ticos e, quando ainda nao cristalizados, provoca as 
mais diversas manifestayoes. 
Outro psic610go que da uma importancia muito grande a essa 
questao e FRANKL, chegando a dizer que a falta de sentido vital e 
a tensao existencial fundamental. 140 Isto quer dizer que a questao 
do sentido e algo constitutivo da natureza humana, e, uma vez que 
nao seja levada em conta, acarretara grandes prejuizos no desen-
volvimento e no processo de individuayao da pessoa humana. 
o sentido pode expressar-se por meio do significado que seda c uma ayao, ou por meio da direyao, do rumo que se da a vida. 
As metas, os valores ou os ideais expressam a direyao dada a 
vida. Toda vida deve ter um rumo, 0 que sustenta os significados 
dos atos que pratico no dia-a-dia. As vezes, 0 desespero huma.no 
pode ser a expressao da falta dessa direyao, e podelevar ao sui-
cidio como uma ultima tentativa de dar um sentido a existencia. A , 
falta de rumo e como viver dentro de um barco sem direyao, que e 
139Tratei desse problema da perda do contato com a vida no meu artigo: "Desafios do 
terapeuta hoje", em A pratica da pSicoterapia, org. por eamon, Editora Pioneira, Sao 
Paulo, 1999, pp. 169-172. 
140 Essa e a analise que YALOM faz da obra de FRANKL, em Psicoterapia existencial. 
Barcelona, Herder, 1983, p. 503. 
120 
levado pelo movimento das ondas, e que nao se sabe se poderc~ 
chegar a algum lugar. Assim, 0 ser humane tem necessidade de 
dar um significado a vida, 0 que FRANKL chamou de vontade de 
sentido. 
o mundo contemporaneo, porem, esta cheio de situayoes em 
que a meta, a orientayao e neg ada. REALE diz que a raiz de todos 
os problemas e 0 niilismo, que e a perda das grandes metas e dos 
grandes valores. 0 questionamento dos valores que davam refe-
rencia ao homem e que foram jogados por terra, 0 viver sem rumo, 
e a posiyao do homem ao momento presente, fugaz e superficial, 
passaram a ser a tonica desse final de milenio. 
Passemos, agora a analisar urn dos tres grandes problemas 
que atingem 0 homem moderno e que, no nosso entender, tern sua 
raiz comum na perda do sentido de vida. Esse dilema existencial 
contemporaneo e 0 vazio. 
III - VAZIO EXISTENCIAL 
As pessoas apresentam uma variedade de sintomas que, no 
fundo, sao 0 resultado de uma confrontayao do sujeito com 0 real 
e consigo mesmo, e deparam-se com a falta de perspectiva de 
vida. Quase todas as palavras usadas, como, por exemplo, fim, 
fracasso, derrota, cansayo, mal-estar, sao conceitos para exprimir, 
de uma forma ou de outra, 0 vazio diante da existencia. 0 proble-
ma que esta por baixo dessas questoes e 0 vazio, a vida perde 0 
seu encanto, 0 seu significado. 
Para entendermos 0 vazio e necessario verificar 0 seu compo-
nente antropol6gico e 0 seu componente social. 0 primeiro, surge 
de um mal-estar pessoal, que decorre rnuitas vezes da situayao 
que se esta vivendo, 0 segundo, surge do contexte mc:cro, isto 
e, do tipo de sociedade e dos valores que essa sociedade impoe 
a vida e que, juntamente com a questao antropol6gica, provoca 0 
surgimento do vazio. 
121 
que, se nos nao damos um sentido a nossa vida, os outro, a socie-
dade, ou alguem imprimira para nos esse sentido. Assim, 0 sentido 
da vida passa a ser 0 problema central do homem moderno, pois 
essa efemeridade da vida impede que olhemos, com clareza, 0 
sentido mais profundo de nossa exist€mcia. 
A perda do sentido aparece no momenta em que comeyamos 
a perder contato com a vida, no momento em que 0 contato com 
os outros seres humanos deixa de ser primordial, e passa a ocu-
par um lugar secundario na nossa existemcia.1~9 YALOM, ao ana-
lisar os quatro elementos que compoem a dinamica existencial 
do homem, mostra que a carencia de um sentido vital e uma das 
vivencias fundamentais do ser humane e e constitutiva da psicodi-
namica existencial. A crise da falta de sentido vital configura varios 
quadros neur6ticos e, quando ainda nao cristalizados, provoca as 
mais diversas manifestayoes. 
Outro psic610go que da uma importancia muito grande a essa 
questao e FRANKL, chegando a dizer que a falta de sentido vital e 
a tensao existencial fundamental. 140 Isto quer dizer que a questao 
do sentido e algo constitutivo da natureza humana, e, uma vez que 
nao seja levada em conta, acarretara grandes prejuizos no desen-
volvimento e no processo de individuayao da pessoa humana. 
o sentido pode expressar-se por meio do significado que se 
da c uma ayao, ou por meio da direyao, do rumo que se da a vida. 
As metas, os valores ou os ideais expressam a direyao dada a 
vida. Toda vida deve ter um rumo, 0 que sustenta os significados 
dos atos que pratico no dia-a-dia. As vezes, 0 desespero huma.no 
pode ser a expressao da falta dessa direyao, e podelevar ao sui-
cidio como uma ultima tentativa de dar um sentido a existencia. A , 
falta de rumo e como viver dentro de um barco sem direyao, que e 
139Tratei desse problema da perda do contato com a vida no meu artigo: "Desafios do 
terapeuta hoje", em A pratica da pSicoterapia, org. por eamon, Editora Pioneira, Sao 
Paulo, 1999, pp. 169-172. 
140 Essa e a analise que YALOM faz da obra de FRANKL, em Psicoterapia existencial. 
Barcelona, Herder, 1983, p. 503. 
120 
levado pelo movimento das ondas, e que nao se sabe se poderc~ 
chegar a algum lugar. Assim, 0 ser humane tem necessidade de 
dar um significado a vida, 0 que FRANKL chamou de vontade de 
sentido. 
o mundo contemporaneo, porem, esta cheio de situayoes em 
que a meta, a orientayao e neg ada. REALE diz que a raiz de todos 
os problemas e 0 niilismo, que e a perda das grandes metas e dos 
grandes valores. 0 questionamento dos valores que davam refe-
rencia ao homem e que foram jogados por terra, 0 viver sem rumo, 
e a posiyao do homem ao momento presente, fugaz e superficial, 
passaram a ser a tonica desse final de milenio. 
Passemos, agora a analisar urn dos tres grandes problemas 
que atingem 0 homem moderno e que, no nosso entender, tern sua 
raiz comum na perda do sentido de vida. Esse dilema existencial 
contemporaneo e 0 vazio. 
III - VAZIO EXISTENCIAL 
As pessoas apresentam uma variedade de sintomas que, no 
fundo, sao 0 resultado de uma confrontayao do sujeito com 0 real 
e consigo mesmo, e deparam-se com a falta de perspectiva de 
vida. Quase todas as palavras usadas, como, por exemplo, fim, 
fracasso, derrota, cansayo, mal-estar, sao conceitos para exprimir, 
de uma forma ou de outra, 0 vazio diante da existencia. 0 proble-
ma que esta por baixo dessas questoes e 0 vazio, a vida perde 0 
seu encanto, 0 seu significado. 
Para entendermos 0 vazio e necessario verificar 0 seu compo-
nente antropol6gico e 0 seu componente social. 0 primeiro, surge 
de um mal-estar pessoal, que decorre rnuitas vezes da situayao 
que se esta vivendo, 0 segundo, surge do contexte mc:cro, isto 
e, do tipo de sociedade e dos valores que essa sociedade impoe 
a vida e que, juntamente com a questao antropol6gica, provoca 0 
surgimento do vazio. 
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Assim, 0 componente antropologico e a perda de sentido de 
vida, analisada acima. A pessoa, na maioria das vezes de forma 
inconsciente, deixa de ter um projeto de vida. As coisas que preen-
chiam 0 seu cotidiano VaG se esfacelando ou esfumagando-se, e a 
vida comega a desmoronar. Isto deve-se ao fato de que 0 sentido foi 
colocado nos objetos e nao na finalidade da vida, na maneira com 
que as coisas eram experienciadas. Como 0 sentido expressa-se 
na diregao que se imprime ao viver algo, assim, colocar sentido nas 
coisas e falsear 0 problema. E necessario desvelar a orientagao que 
sustem os atos concretos. A perda de sentido manifesta a deficien-
cia entre a ideia de diregao, que sustenta 0 ato, e a realizagao do 
proprio ato. A ausencia de rumo que de significado ao ate e a perda 
do sentido. 
A esse componente antropologico, a pos-modernidade acres-
centa um tipo de fenomeno que nos chamaremos de componente 
sociologico do problema do vazio da vida humana. Essa sociedade 
individualista, centrada no eu, provoca a exclusao do outro do ce-
nario de nossa existencia. Isso vem esvaziar as relagoes interpes-
soais, provocando um desaparecimento de lagos pessoais entre os 
homens. Estamos vivendo uma revolugao silenciosa, com respeito 
as relagoes interpessoais: "0 que importa no presente e a pessoa 
ser absolutamente ela mesmo, e desabrochar independentemen-. 
te do outro".141 Essa quase aniquilagao das relagoes interpesso-
ais, restringe 0 contato com 0 outro apenas ao aspecto funcional.

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