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RIO GRANDE DO SUL EPISTEMOLOGIA DA CIÊNCIA E O AMBIENTE ESCOLAR CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO – DOM ALBERTO 1 SUMÁRIO 1 A CIÊNCIA DO PONTO DE VISTA EPISTEMOLÓGICO ........................... 3 1.1 Os Princípios de Impotência da Epistemologia .................................... 6 1.2 O que a ciência não pode ser ............................................................... 6 1.3 Critérios de demarcação entre ciência e não-ciência ........................... 7 1.4 Uma concepção não proibitiva da ciência ............................................ 8 2 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE EPISTEMOLOGIA .................... 11 3 EPISTEMOLOGIA E ENSINO DE CIÊNCIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL 18 3.1 A ciência e a epistemologia ................................................................ 18 3.2 A Educação Infantil e seu Delineamento ............................................ 22 3.3 O Ensino de Ciências e a Educação Infantil: uma análise a partir dos referenciais, das diretrizes e da BNCC ................................................................. 25 4 ENSINAR CIÊNCIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: REPENSAR O CURRÍCULO ............................................................................................................. 29 5 O QUE ENSINAR EM CIÊNCIAS ............................................................. 33 5.1 Teoria e prática juntas no processo de investigação .......................... 35 5.2 O valor didático da experiência depende da forma como é feita ........ 37 5.3 Linha do tempo do ensino de Ciências no Brasil ................................ 38 5.4 Metodologias mais comuns no ensino de Ciências ............................ 40 6 MANIFESTAÇÕES SOBRE FATORES QUE INTERFEREM NO DESEMPENHO ESCOLAR DE ESTUDANTES DA EDUCAÇÃO BÁSICA............... 43 6.1 As atividades de pesquisa e o Ensino de Ciências: alguns achados . 45 6.2 O papel da interação e diálogo no processo de ensino e aprendizagem 48 6.3 Algumas considerações e novos apontamentos ................................ 52 2 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 54 3 1 A CIÊNCIA DO PONTO DE VISTA EPISTEMOLÓGICO Fonte:ethosufmg.files.wordpress.com A questão da natureza da própria ciência pode ser respondida de vários pontos de vista. Um deles é o da Filosofia da Ciência. Dentro desse enfoque é necessário esclarecer se é possível responder a essa pergunta. E isso depende como se interpreta a própria questão. Pergunta: “O que é Ciência?” – pode ser compreendida de maneiras diferentes: a) “O que é Ciência?” - pode ser uma pergunta sobre uma questão de fato (questão empírica), equivalente a perguntarmos: “o que tem sido a ciência? ” b) “O que é Ciência?” - pode ser uma pergunta de natureza normativa (questão axiológica), equivalente a perguntarmos: “o que deveria ser a ciência? ” c) “O que é Ciência?” - pode ser uma pergunta sobre o modo como se define um termo (questão analítica), equivalente a perguntarmos: “o que poderia ser a ciência? “O que não poderia ser a ciência? ” Explicando melhor as diferenças: a) Se quisermos saber o que tem sido a ciência (uma questão empírica), a resposta deve partir de fatos, ou seja, de descrições sobre o que tem sido chamado POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar 4 de ciência ao longo do tempo (ou em uma época determinada, como hoje). Nesse caso, é necessário recorrer àquilo que foi investigado pelos historiadores das ciências, sociólogos das ciências e outros pesquisadores que se interessam pelas práticas científicas (atual ou antiga). É claro, que nesse caso, a resposta não será uma única, pois as práticas científicas mudam ao longo do tempo e são diferentes nas diversas disciplinas científicas. De qualquer forma, esse tipo de investigação sobre o que a ciência tem sido não cabe à Filosofia, mas a outras disciplinas meta-científicas. b) Ao invés de procurar saber o que a ciência tem sido, podemos nos perguntar sobre o que ela deveria ser (uma questão axiológica). Isso levanta uma questão sobre o que é correto (ou errado) na ciência, e remete à avaliação (julgamento de valores) dos procedimentos ou dos resultados das pesquisas científicas. A questão se torna axiológica, ou seja, da mesma natureza das questões éticas (como um cidadão deveria se comportar?), das questões estéticas (como deve ser uma boa música?) e outras semelhantes. Nesse caso, qualquer tentativa de resposta não pode se basear em fatos, pois deve-se admitir que talvez a prática científica não seja a melhor possível, ou a desejável. A resposta será baseada em determinados valores, que podem ser externos ou internos à ciência. Por exemplo: Quando se quer saber como a ciência deveria ser para beneficiar a humanidade, utiliza-se um enfoque externo à ciência, pois o critério de valor é social (esta é uma questão da ética da ciência). Por outro lado, quando se quer saber como a ciência deveria ser, para permitir um melhor conhecimento da natureza, o enfoque é interno e a pergunta cabe dentro de uma discussão da própria metodologia da ciência. Nos dois casos, cabe à Filosofia tentar responder a essas questões, pois o estudo de valores é um domínio propriamente filosófico. c) O terceiro modo de compreender a pergunta é no sentido daquilo que pode ou não, ser a ciência (uma questão analítica). Nesse caso, parte-se do pressuposto de que é possível conceber-se vários tipos de conceitos de ciência, e que eles podem ser investigados. Mas para se esclarecer esse tipo de questão, é necessário ainda fazer uma subdivisão, pois ela ainda pode ser entendida em vários sentidos. POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar 5 c1) Quais as diferentes concepções de ciências que já existiram? Pensadores de diferentes épocas e civilizações pensaram e propuseram diversas concepções. Trata-se de uma questão de fato (histórica) que cabe à História da Filosofia (e da Ciência) investigar. Nesse caso, não se busca saber como os cientistas realmente agem, ou como deveriam agir, mas como a ciência poderia ser, de acordo com algum pensador (por exemplo Popper, Bacon ou Feyerabend). Não cabe à Filosofia, propriamente dita, investigar isso. c2) Quais as concepções da ciência que se podem inventar? Em certo sentido, as definições são arbitrárias e podemos chamar de “ciências” qualquer coisa que quisermos denominar dessa maneira. No entanto, é claro que não se pode, na prática, utilizar uma palavra que já existe, sendo empregada por bilhões de pessoas, de um modo totalmente arbitrário. As palavras devem ser empregadas para comunicar alguma coisa a outras pessoas e se cada pessoa utilizasse as palavras em sentidos diferentes, a comunicação seria impossível. Há, portanto, alguns critérios de adequação que uma concepção de ciência deve ter: - O conceito proposto deve coincidir, pelo menos em parte, com o uso que se faz normalmente dessa palavra; - Deve ser coerente e claro; - Deve defender um conceito de ciência que seja possível de ser atingido pelos seres humanos. c3) O que é filosoficamente possível (ou impossível) na ciência sob o ponto de vista do conhecimento humano? Essa é uma questão filosófica do domínio da Teoria do Conhecimento. Há certos critérios básicos, sobre o que pode ou não ser feito, a priori, e cabe à Filosofia investigar esse tipo de questão. Como é de saber notório, é muito difícil alcançar uma unanimidade em questões filosóficas. Roberto Martins afirma existirem pontos sólidos na Filosofia. No entanto, esses “pontos sólidos” não sejam o exatamente o que se poderia esperar. Que o mais sólido na Filosofia da Ciência é a percepção deque certas coisas são 6 impossíveis. Ou seja: Ao longo da história da Filosofia, sucessivos fracassos levaram ao estabelecimento de sólidos “princípios de impotência”. 1.1 Os Princípios de Impotência da Epistemologia “Princípio da Impotência” pode parecer uma coisa negativa ou indesejável, mas possui um aspecto positivo. Algumas das mais importantes leis da Física são princípios que estabelecem que alguma coisa é impossível na natureza. Por exemplo, a lei da conservação da massa é equivalente à informação de que é impossível criar ou destruir a matéria; a lei da conservação da energia equivale à afirmação de que é impossível criar um moto contínuo de primeira espécie. Seria muito bom, em certos casos, se fosse possível criar matéria ou energia, mas infelizmente, somos impotentes nesse sentido. Essa limitação não parece mesmo temporária, mas permanente. E conhecer essas limitações é um avanço da ciência. De forma análoga, creio que a Filosofia estabeleceu, com o passar do tempo, alguns “princípios de impotência” epistemológicos que mostram limites do pensamento humano. Por exemplo: “O ser humano não possui a capacidade de reconhecer, intuitivamente, a verdade”. Seria ótimo se tivéssemos um órgão ultra sensorial que distinguisse a verdade da falsidade, assim como distinguimos o verde do amarelo. Mas isso não existe. Todos os filósofos que tentaram edificar sistemas sobre verdades “intuitivas” falharam. Por isso, seria ingenuidade propor um conceito de ciência baseado em verdades “intuitivas” ou “evidentes”. 1.2 O que a ciência não pode ser Com base nos princípios de impotência, é possível dizer o que a ciência não pode ser (por se tratar de algo inacessível ao conhecimento humano). Por exemplo: a 7 ciência não pode ser uma teoria verdadeira, provada através de observações e experimentos. Não estamos falando do que é desejável ou não, e sim o que é impossível ou impossível. Seria ótimo se a ciência pudesse ser algo provado por observações e experimentos. Infelizmente não é possível. Talvez essas afirmações produzam uma mal-estar. Afinal, em muitos manuais de ciências encontramos muitas afirmações equivalentes às que estão sendo negadas aqui. De fato: em sua maioria (ou talvez totalidade), os conceitos de ciência que são colocados nos manuais de ciências são, filosoficamente, impossíveis 1.3 Critérios de demarcação entre ciência e não-ciência Qualquer que seja o critério de demarcação entre ciência e não-ciência que se proponha, ele deverá ser ou restritivo (apenas algumas coisas são admitidas como ciência, e outras são excluídas) ou não-discriminativo (“vale tudo”, isso é, tudo é ciência). No primeiro caso – isto é, se for imposta alguma restrição àquilo que é científico – o critério prejudicará o desenvolvimento da ciência, proibindo coisas que podem eventualmente se mostrar úteis; além disso, esse critério irá excluir do campo científico alguma coisa que foi apresentada como científica (por exemplo: o critério de demarcação de Popper exclui da ciência a psicanálise). O grupo cujo trabalho foi excluído da ciência pelo critério de demarcação não irá aceita-lo. Na verdade, esse critério servirá apenas como instrumento de humilhação para um grupo de pessoas, por afirmar que o que elas fazem não possui valor científico. Por outro lado, qualquer que seja o critério proposto, ele terá grande dificuldade em ser fundamentado. Como se pode mostrar que um critério é correto? Pode-se tentar recorrer à história (a fatos) ou recorrer apenas ao raciocínio (a piori). Mas é impossível justificar normas e valores a partir da história: mesmo se todos os cientistas fossem unânimes em aceitar certas coisas como científicas e outras como não- científicas, isto não quer dizer que essa opinião é correta. Ou seja: dizer que um critério é correto porque Newton e Einstein ou qualquer grupo dizia que ele era correto, não é um argumento (falácia histórica). Sob o ponto de vista filosófico, unanimidade ou aceitação popular não possuem nenhuma importância. 8 Negar a possibilidade de uma demarcação entre ciência e não ciência pode levar a um relativismo (ou anarquismo) epistemológico, tal como proposto por Feyerabend. De fato: ele defende que não é possível nem útil distinguir um método próprio da ciência: tudo é permitido e não se pode fazer nenhuma diferença entre a astronomia e a astrologia, entre a medicina e o curandeirismo. No entanto, é possível atacar os conceitos atacar os conceitos de demarcação sem cair nesse extremo relativista. 1.4 Uma concepção não proibitiva da ciência Para que serve qualquer análise sobre o que é ou não é ciência? Se o objetivo dessas análises for distinguir os “bons” dos “maus” e dizer que a ciência é algo totalmente distinto de outras formas de conhecimento, então é necessário um critério de demarcação – mas, como vimos, isso não poderá ser atingido. Por outro lado, pode-se desenvolver um outro tipo de concepção epistemológica, que tenha uma outra finalidade: orientar e avaliar as pesquisas, mas sem partir do pressuposto de que a ciência é algo totalmente distinto de outros campos de estudo. E, como tentaremos mostrar rapidamente, é possível dispor de uma concepção de ciência que não estabeleça um critério de demarcação, mas que permita orientar e avaliar a pesquisa. As bases desse tipo de concepção de ciência são as seguintes: I- Admite-se como ciência tudo o que se queira chamar de ciência. Mas, II- É possível estabelecer comparações de valor científico e avaliar e orientar a pesquisa. Para explicar esse tipo de concepção tomemos como exemplo a concepção popular de “alto”. O que é uma pessoa alta? Posso ser considerado alto, ou sou baixo? De maneira geral, a sociedade valoriza as pessoas altas e desvaloriza as baixas. Ser chamado de “baixinho” é humilhante, de “alto” não é. Se distinguirmos de modo absoluto os baixos dos altos, estaremos separando as pessoas “fisicamente corretas”, das “fisicamente incorretas”, ou seja, estabelecendo uma espécie de critério de demarcação entre as pessoas que possuem uma boa altura e as que possuem uma altura “errada”. 9 Mas qual o ponto de separação entre eles? Pode-se dizer que adulto de um metro e meio de altura é baixo e um adulto com dois metros é alto. Mas, e um adulto com um metro e setenta e cinco? E um adulto com um metro e sessenta e cinco? Onde está o limite? Na verdade, qualquer distinção absoluta entre altos e baixos é convencional: pode-se escolher um ponto qualquer da escala de alturas e decidir que aquele que está abaixo daquele limite é baixo e quem está acima é alto. Mas essa decisão é arbitrária e não tem muito significado. Pelo contrário, pode-se estabelecer uma distinção objetiva e significativa dizendo que uma pessoa é mais alta (ou mais baixa) do que uma outra. Para isso, não é preciso saber qual a distinção entre altos e baixos, é apenas necessário colocar uma pessoa do lado da outra e compará-las (ou saber suas alturas e compará-las). Ao invés de um conceito absoluto, temos agora um conceito relativo, comparativo. Pode-se fazer algo semelhante na análise do conceito de ciência. Ao invés de uma distinção absoluta entre científico e não-científico, é mais conveniente introduzir uma comparação de valores científicos, sem estabelecer uma diferença absoluta qualitativa, mas apenas quantitativa e comparativa. Dessa forma, pode-se introduzir a ideia de que certo tipo de trabalho tem maior valor científico do que um outro, sem que isso signifique que o outro não tem valor ou não é científico. Não é necessário, nesse caso, um critério de demarcação. Não é mais necessário negar o direito de chamar alguma coisa de ciência. De acordo com essa concepção não proibitiva, a ciência passa a ser vista como um processo pelo qual se procura obter elementos com maior valor científico.Fica sem sentido discutir se uma teoria é científica ou não: pode-se dar o nome de “científico” a qualquer coisa que se queira, pois, o objetivo da epistemologia deixa de ser o de rotular e classificar as coisas de forma absoluta. Assim, se alguém quiser dizer que a astrologia é uma ciência, não é necessário discutir essa concepção. Que seja, admitimos que se chame a astrologia ou qualquer outra coisa de ciência. Mas a questão central não é essa, e sim saber se a astrologia obedece a todos os critérios de valor científicos, que são obedecidos, por exemplo pela astronomia; e saber o que precisaria ser feito para aumentar o valor científico da astrologia. Por exemplo, se a astrologia dispusesse de estudos estatísticos mostrando que as pessoas nascidas sob 10 tal signo (ou ascendente, ou ambos) possuem em geral tais e tais características, isso aumentaria muito o valor científico da astrologia. Também se fossem feitos testes controlados, em grande escala, de previsões astrológicas para muitas pessoas, sobre fatos objetivos, que fossem depois controlados, isso aumentaria muito o valor científico da astrologia. E quando ela realmente se tornaria uma ciência? A pergunta não tem sentido nesse tipo de enfoque. Nessa abordagem não proibitiva, ao invés de discutir se uma coisa é ou não ciência, a contribuição relevante da Filosofia é a de indicar o que fazer para aumentar o valor científico de cada estudo. Podemos dar uma ideia geral como regras amplas, dizer que um elemento da ciência possui maior valor científico do que outro quando ele tem: - maior poder; - maior harmonia com outros elementos. Vamos dar um exemplo: desde a Antiguidade, os pitagóricos já defendiam a ideia de um conhecimento matemático no mundo. Mas demorou muito para que fossem descobertas leis quantitativas na Física, Química e outras áreas. Sempre que foram sendo obtidas leis matemáticas, quantitativas, isso aumentou o poder daqueles ramos de estudo, pois tornou-se possível fazer previsões claras e testá-las de forma precisa. Isso não quer dizer que todos os ramos de estudo precisem ter leis quantitativas. Não é critério para incluir ou excluir da ciência algum estudo. Mas, se em algum estudo, for possível obter tal tipo de lei, isso aumentará o poder e o valor científico desse estudo. Há muitos outros exemplos de modos de aumentar o valor científico de um estudo: quando é possível introduzir instrumentos de medida, ou realizar experimentos controlados, por exemplo, isso aumentar o seu valor. Nem sempre isso é possível (não podemos mediar a temperatura do interior de uma estrela), mas sempre que for possível, isso será isso será um aumento de poder e valor científico. Outro exemplo. Na ciência, dá-se maior valor a uma hipótese, teoria ou ideia quanto ela é relacionada e integrada a outras partes da ciência. Quanto mais harmonioso o corpo de conhecimentos, mais valor científico ele tem. No caso da Homeopatia, um dos motivos pelo qual muitas pessoas a rejeitam é porque não se 11 consegue conciliar a ideia de remédios em doses infinitesimais com os conhecimentos físicos e químicos. Mesmo se forem acumulados testes estatísticos e for verificada a eficácia dos tratados homeopáticos, isso não vai satisfazer a muitas pessoas. Falta integrar harmoniosamente a Homeopatia a outros domínios científicos. Embora na abordagem não-proibitiva isso não seja um motivo para rejeitar a Homeopatia, é claro que se deve afirmar que, se for possível harmonizar a Homeopatia aos conhecimentos físicos e químicos, isso aumentará o seu valor científico. Agora, podemos esboçar uma resposta a nossa pergunta inicial: afinal de contas, o que a Filosofia pode nos dizer sobre o que é ciência? Ela pode nos dizer que certas concepções são absurdas, pois propõem coisas inatingíveis ao conhecimento humano. Ela pode também nos dizer que há diferentes modos de atacar a questão e que existe pelo menos uma abordagem que elimina muito dos problemas das outras. Nessa abordagem, ciência não é um resultado final, mas é um processo contínuo, pelo qual se aumenta o valor científico dos conhecimentos através de um aumento de poder e de uma maior harmonia dos elementos do conhecimento. É fundamental que o ensino das ciências transmita uma visão sobre o próprio processo de conhecimento científico, ao invés de se limitar a ensinar os resultados atualmente aceitos. 2 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE EPISTEMOLOGIA Fonte:universoracionalista.org 12 A epistemologia é um termo que se faz presente nas discussões acerca da ciência. Segundo Japiassu (1992) de forma etimológica a epistemologia pode ser definida como o estudo da ciência, sendo ainda uma crítica ao conhecimento da ciência, estudo filosófico da sua origem, sua natureza e seus limites. Logo, seu desafio é responder “o que é” e “como” chegamos ao conhecimento. A reflexão filosófica está na base da ciência, tornando-se posteriormente uma disciplina separada da ciência. Entretanto, a epistemologia como disciplina da filosofia trabalha com a reflexão sobre ciência. A partir do estudo da epistemologia é possível lançar um olhar crítico e reflexivo sobre a ciência. A epistemologia encontra na filosofia os princípios e na ciência o objeto para o estudo, compreendendo assim o processo de interações entre Sujeito e Objeto como parte fundamental da produção científica (JAPIASSU, 1992). De acordo com Lalande (1989 citado em Japiassu 1992, p.25), a filosofia das ciências, em sua concepção “original”, apresenta três funções clássicas: A filosofia teria com a ciência uma relação puramente interesseira, explorando- a para seus próprios fins. Isto se torna manifesto nas três funções clássicas atribuídas à filosofia das ciências: Situar o lugar do conhecimento científico dentro do domínio do saber. [...] Estabelecer os limites do conhecimento científico: este não pode tudo conhecer. [...] Buscar a natureza da ciência. (LALANDE, apud JAPIASSU, 1992, p.25). A epistemologia encontra-se na intersecção de preocupações e de disciplinas diversas, tanto por seus objetivos quanto por seus métodos. As denominadas epistemologias “metacientíficas” visam estabelecer a relação que o sujeito e o objeto mantêm entre si no ato do conhecer. Porém, as grandes epistemologias continuam associadas a uma filosofia que quando não possui referência a uma epistemologia torna toda teoria do conhecimento uma mediação sobre o vazio, e [...] compete à epistemologia fornecer à história das ciências o princípio de um juízo, pois é ela que lhe ensina a última linguagem falada por tal ciência, permitindo- lhe, assim, recuar no tempo até o momento em que esta linguagem deixa de ser inteligível. É a epistemologia que nos permite discernir a história dos conhecimentos 13 científicos que já estão superados e a dos que permanecem atuais (ou sancionados), porque atuantes e colocando em marcha o processo científico. (JAPIASSU, 1992, p. 32). Desta maneira, a epistemologia age de forma que o objeto da história da ciência seja compreendido como algo inacabado e que se encontra sempre em reconstrução. Seguindo essa linha de discussão, sociólogos como Marx, Dürkheim, M. Weber e Manheim entendem o conhecimento como fruto das interações sociais em que “[...] para eles, os conhecimentos não são considerados como construções autônomas e individuais, mas como atividades sociais, inseridas num determinado contexto sociocultural” (JAPIASSU, 1992, p. 35). Japiassu (1992) apresenta algumas considerações a respeito da “natureza” da epistemologia: 1. O simples fato de ainda hesitarmos entre duas denominações: filosofia das ciências e epistemologia (aliás, há várias denominações: filosofia das ciências, teoria do conhecimento, lógica das ciências, epistemologia, etc.), já é revelador da impossibilidade de estabelecermos um estatutopreciso e definitivo para a epistemologia. 2. o conceito de epistemologia não tem uma significação rigorosa e unívoca, 3. Não é, pois, inútil que cada especialista se interrogue, antes de tudo, sobre a ideia que ele faz de sua disciplina. 4. O conceito de epistemologia é, pois, empregado de modo bastante flexível. A epistemologia bacherladiana tenta não comungar da ideia que epistemologia é a “ciência da ciência”. Segundo Oliveira (2000), Bacherlard defende que ao epistemólogo cabe à função de refletir sobre os fatores que podem vir a influenciar o cientista no cotidiano de suas atividades e ao cientista a consciência de que a partir das críticas é possível chegar a um novo conhecimento. Pode-se dizer que a epistemologia segundo Bacherlard apresenta um caráter histórico no qual defende a noção de ruptura (a descontinuidade entre conhecimento comum e conhecimento científico), racionalismo setorial e de recorrência histórica. Neste momento, as questões que envolvem as noções de ruptura caracterizada pela filosofia do não, será ponto de referência das discussões a seguir. 14 Segundo Aranha e Martins (1993) compreende-se que o conhecimento é algo constituído de saber adquirido e acumulado por meio da relação estabelecida entre Sujeito que conhece e o Objeto a ser conhecido, e que pode ser oriundo do senso comum e estar implícito em crenças e preconceitos. É um conhecimento ingênuo (não crítico), fragmentário (porque difuso, assistemático e muitas vezes sujeito à incoerência) e conservador (resiste a mudanças). Diferentemente, o conhecimento da ciência “moderna” prevalece-se da utilização de métodos que constrói um conhecimento dito sistemático, preciso e objetivo, proporcionando uma estreita relação entre ciência e conhecimento científico. (ARANHA e MARTINS, 1993). Desta maneira, o caminho a ser percorrido entre o conhecimento comum e o conhecimento científico pode proporcionar obstáculos: O conhecimento comum lida com um mundo dado, constituído por fenômenos; o conhecimento científico trabalha em um mundo recomeçado, estruturado em uma fenomenotécnica. É nesse sentido que o conhecimento comum acaba por se constituir em um obstáculo epistemológico ao conhecimento científico, exigindo que efetuemos o que Bachelard denomina de psicanálise do conhecimento objetivo. (LOPES, 1999, p.123). De acordo com Heller (2004) não é possível estabelecer um limite claro entre comportamento/conhecimento cotidiano ou não cotidiano, pois “O homem nasce já inserido em sua cotidianidade” (HELLER, 2004, p. 18). A vida cotidiana apresenta algumas características, dentre elas a heterogeneidade, através da qual o homem expressa características que lhe são próprias, A vida cotidiana é a vida do indivíduo. O indivíduo é sempre, simultaneamente, ser particular e ser genérico. Considerado em sentido naturalista, isso não o distingue de nenhum outro ser vivo. Mas, no caso do homem, a particularidade expressa não apenas seu ser “isolado”, mas também seu ser “individual”. Basta uma folha de árvore para lermos nela as propriedades essenciais de todas as folhas pertencentes ao mesmo gênero; mas um homem não pode jamais representar ou expressar a essência da humanidade. (HELLER, 2004, p. 20). Todavia a característica mais marcante da vida cotidiana é a espontaneidade que “é a tendência de toda e qualquer forma de atividade cotidiana” (HELLER, 2004, 15 p.30). Que muitas vezes leva a pensamentos fragmentários, nos quais o conhecimento científico não é tão relevante, prevalecendo o realce ao senso comum. Segundo Lopes (1999, p.104) “Dentre os diferentes saberes sociais, o conhecimento científico e o conhecimento cotidiano se mostram como dois campos que diretamente se inter-relacionam com o conhecimento escolar nas ciências físicas, mas não sem contradições”. Ao iniciar o desenvolvimento do conhecimento escolar, o conhecimento científico toma um lugar de maior destaque, já que o primeiro se propõe a construir no aluno o conhecimento científico. Por outro lado, o conhecimento cotidiano mostra sua importância quando é considerado a forte influência que as concepções prévias têm no aprendizado dos alunos. Lopes (1999) destaca a ideia de controvérsia entre os diferentes conhecimentos, pois tanto o conhecimento científico quanto o cotidiano apresentam forte influência no desenvolvimento escolar, mas em sentidos diferenciados – diferentes saberes sociais possuem diferentes instâncias de produção de significados. Ambos, conhecimento científico e conhecimento cotidiano, são históricos, sofrem interações mútuas, mas interpretar a ciência com os pressupostos da vida cotidiana é incorrer em erros, assim como é impossível, em cada ação cotidiana, tomarmos decisões científicas, ao invés de decidirmos com base na espontaneidade e no pragmatismo. Por outro lado, entender como nítida essa descontinuidade não significa ver no cientista um ser acima da esfera cotidiana e, por isso mesmo, capaz de superar completamente o obstáculo do senso comum. O senso comum não é a forma das classes populares, destituídas de capital econômico e cultural, compreenderem o mundo. Quando me refiro ao senso comum, entendo sua difusão por todo o tecido social, o que torna indispensável seu questionamento, cotidianamente, por todos nós, sejamos operários ou intelectuais, artistas ou cientistas. (LOPES, 1999, p.157). Nesse sentido faz-se necessário uma clara diferenciação epistemológica refletindo sobre as divisões acerca do conhecimento e questionar a homogeneidade dos saberes e em especial o poder exercido na sociedade, a qual geralmente não leva em consideração o conhecimento que é fruto da cotidianidade, principalmente no âmbito escolar, 16 Defende-se que é preciso compreender os saberes escolares como produtos sociais e a estrutura do currículo acadêmico como a principal fonte de distribuição desigual de educação na sociedade. [...] Tanto maior é a função ideológica de um currículo, quanto maior a sua capacidade de se fazer ser compreendido como o único possível, legítimo e correto. Como argumenta Bernstein, a forma como uma sociedade seleciona, classifica, distribui, transmite e avalia os saberes escolares reflete a distribuição de poder no interior desta mesma sociedade e os mecanismos que asseguram o controle social dos comportamentos individuais. (LOPES, 1999, p.161). Logo, pode-se dizer que o conhecimento escolar é fruto do trabalho de alguns estudiosos, o qual é transposto em linguagem acessível à comunidade escolar que de certa forma acabou dando a este o status de inteligibilidade da experiência humana. Os conhecimentos mesmo quando não são capazes de solucionar problemas humanos e/ou científicos, ainda assim conservam sempre seu caráter de validade único e irredutível (LOPES, 1999). Entretanto, de acordo com Matthews (1995, p. 164) “o ensino de ciências desenvolveu-se completamente dissociado da história e da filosofia da ciência”. Neste sentido é necessário não só uma reflexão, como também a inclusão de componentes de história, filosofia e sociologia da ciência nos conteúdos que serão trabalhados durante a construção do conhecimento escolar, normalmente organizado na forma de disciplinas. Desta maneira, A tradição contextualista assevera que a história da ciência contribui para o seu ensino por que: (1) motiva e atrai os alunos; (2) humaniza a matéria; (3) promove uma compreensão melhor dos conceitos científicos por traçar seu desenvolvimento e aperfeiçoamento; (4) há um valor intrínseco em se compreender certos episódios fundamentais na história da ciência – a Revolução Científica, o darwinismo, etc.; (5) demonstra que a ciência é mutável e instável e que, por isso, o pensamento científico atual está sujeito a transformações que (6) se opõem a ideologia cientificista; e, finalmente,17 (7) a história permite uma compreensão mais profícua do método científico e apresenta os padrões de mudança na metodologia vigente. (MATTHEWS, 1995, p.172). O que estabelece a possibilidade de um currículo que ofereça conceitos importantes para uma rica compreensão da epistemologia da ciência. Os pontos apresentados auxiliam na reflexão de conceitos presentes na filosofia e na ciência, tornando-se importante as discussões pela comunidade que usufrui de tais entendimentos. A epistemologia precisa ser compreendida de maneira a facilitar o entendimento e discussões dos conceitos principais que compõe a natureza da ciência. Faz-se necessário uma visão mais crítica acerca do ensino de ciências, a qual deve estar pautada em aspectos históricos, filosóficos e sociológicos proporcionando uma visão mais abrangente da construção do conhecimento. É importante destacar que este processo de construção é contínuo, ocorre de diversas formas e que por isso é imprescindível romper com a visão de homogeneidade do conhecimento científico e que este é detentor da verdade. Como também, os conhecimentos cotidianos e científicos estão em constante interação para a consolidação do conhecimento escolar. É neste sentido que a epistemologia pode contribuir na compreensão destas distinções e informações descritas, por buscar um estudo crítico acerca da construção do conhecimento. 18 3 EPISTEMOLOGIA E ENSINO DE CIÊNCIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL Fonte:3.bp.blogspot.com O foco do artigo de Sandra Pietrobon, Nájela Ujiie, Antonio C. Frasson, Nilcéia Pinheiro e Edson Jacinski é voltado a identificar a epistemologia que sustenta o ensino de ciências na educação infantil, e tem como premissa que, existe uma epistemologia subjacente aos documentos oficiais, que norteia e/ou direciona práticas pedagógicas e concepções de ensino. A área do ensino de ciências, enquanto espaço de aprendizado sobre a relação do homem com os seres vivos e o ambiente torna-se, então, objeto de discussão, tendo como questão norteadora: Que epistemologia embasa os documentos oficiais que orientam as práticas pedagógicas na área de ciências na educação infantil? 3.1 A ciência e a epistemologia Como visto, a ciência desenvolve-se por meio de questionamentos, ensaios e erros sobre objetos cognoscentes, envolvendo processos investigativos que possam dar suporte ao entendimento e análise de conceitos e teorias. Nesse processo, a epistemologia enquanto teoria do conhecimento é uma disciplina ou área filosófica. 19 [...] a filosofia é antes de mais nada autorreflexão do espírito sobre seu comportamento valorativo teórico e prático. Enquanto reflexão sobre o comportamento teórico, sobre aquilo que chamamos de ciência, a filosofia é teoria do conhecimento científico, teoria da ciência. Enquanto reflexão sobre o comportamento prático do espírito, sobre o que chamamos de valor no sentido estrito, a filosofia é teoria do valor. A autorreflexão do espírito, porém, não é fim em si, mas meio para atingir uma visão de mundo. O campo da filosofia divide-se, portanto em três partes: teoria da ciência, teoria do valor e teoria da visão de mundo (HESSEN, 1999, p. 12). Este autor coloca que uma teoria do conhecimento diz respeito a explicações e interpretações acerca do que deriva do conhecimento humano. É um caminho que segue pela via da observação, experimentação, descrições, comparações, análises. Assim, o conhecimento deriva dessa relação sujeito-objeto, numa correlação; e, por parte de quem conhece, há sempre um trabalho cognoscitivo. Contudo, a forma como se estabelece essa relação sujeito-objeto trará formas diferenciadas de explicação ou composições teóricas. Em Japiassu (1992, p. 27), observa-se que este define o conhecimento enquanto processo possível e não como um estado consolidado, e afirma que a tarefa da epistemologia se tangencia “em analisar todas as etapas de sua estruturação chegando sempre a um conhecimento provisório, jamais acabado ou definitivo”. E, quanto aos sujeitos e o objeto nesse processo elaborativo, Gamboa (2012, p. 45) comenta: Nas ciências sociais como na educação, tanto o investigador quanto os investigados (grupo de alunos, comunidade ou povo) são sujeitos; o objeto é a realidade. A realidade é um ponto de partida e serve como elemento mediador entre os sujeitos. Numa relação dialógica e simpática, como é o caso do processo da pesquisa, esses sujeitos se encontram juntos ante uma realidade que lhes é comum e que os desafia para ser conhecida e transformada. Ao abordar os conceitos de sujeito e objeto, Becker (1999) explica que o sujeito é parte ativa no processo de pesquisa, possui um aspecto cognoscente, o qual reflete e toma decisões acerca do que vislumbra num contexto de aprendizado, auto organiza-se e amplia suas capacidades a partir do que vivencia. “O sujeito esconde- se e revela-se ao mesmo tempo. Revela-se porque, ao agir sobre o mundo, sobre o 20 outro, sobre o diferente, sobre o oposto - sobre o objeto -, busca, aí, o alimento de sua transformação”(BECKER, 1999, p. 74). Em relação ao objeto, este refere-se a uma situação, a um fato, ao que não é sujeito, embora constitua-o. “O objeto desafia o sujeito a constituir-se; é ao constituir o objeto que o sujeito se constitui e é ao constituir-se que ele se revela” (BECKER, 1999, p. 74). No campo das pesquisas na área da educação e do ensino, a epistemologia, enquanto teoria do conhecimento, trará a luz à relação sujeito-objeto, explicitando seus contornos, nuances, limites e possibilidades. Sobre a epistemologia, Gamboa (2012, p. 29) explicita que: “O discurso epistemológico encontra na filosofia seus princípios e na ciência seu objeto. Tem como função não só resolver o problema geral das relações entre a filosofia e as ciências, mas também servir de ponto de encontro entre elas”. E, o autor ressalta ainda que a epistemologia “[...] é parte da filosofia que se ocupa especialmente do estudo crítico da ciência em seu detalhamento prático, isto é, da ciência como produto e como processo [...]” (GAMBOA, 2012, p. 29). A epistemologia também é tomada como um estudo de cunho reflexivo e mais aprofundado sobre o saber ou conhecimento (JAPIASSU, 1992), que envolvem o processo, o desenvolvimento e os resultados. Dessa maneira, ora se situa como primado do objeto ora como primado do sujeito, ora na interação entre ambos; isto denota que, a mesma caminha desde uma perspectiva tradicional clássica a uma perspectiva interdisciplinar. Becker (1994) ao explicitar a relação existente entre modelo epistemológico e modelo pedagógico é contundente e perspicaz ao elucidar as facetas e relações instituídas, bem como sua oscilação dentre os polos sujeito-objeto, aluno-professor, individuo-meio social. O que é plausível de ser compreendido via três correntes epistemológicas e/ou pedagógica distintas: 1. Empirismo / Transmissão - a origem do conhecimento é exógena (externa); a ênfase está na aprendizagem, na experiência, no objeto como propagador do conhecimento (S→O) e/ou Pedagogia Diretiva – o professor é o centro de todo o 21 processo pedagógico o aluno é uma folha em branco, o conhecimento se forja de modo vertical, na transmissão do professor ao aluno (P→A); 2. Apriorismo / Inatismo - a origem do conhecimento é endógena (interna), inata; a ênfase está no sujeito e no seu desenvolvimento (S←O) e/ou Pedagogia não- diretiva – o aluno é o centro de todo o processo pedagógico (P←A); 3. Construtivismo / Interacionismo - a origem do conhecimento é uma construção, endógena e exógena; a ênfase está no desenvolvimento e na aprendizagem, sujeito e objeto (S↔O) e/ou Pedagogia relacional – não existe uma relação polarizada, tanto o aluno como o professor têm importância durante o processo ensino-aprendizagem, estabelecem uma relaçãode troca, dialógica e horizontal (P↔A) Frente ao exposto, tem-se a ciência e/ou conhecimento científico, de acordo com Hessen (1999), como correlação da tríade sujeito, objeto e conhecimento; o qual é determinante e determinada a depender do momento e contexto de pertencimento. Dessa maneira, para Japiassu (1992) a epistemologia situa a si mesma e a outras disciplinas que lhe são afins. Considerando que, [...] as epistemologias atualmente vivas e significativas estão centradas sobre as interações do Sujeito e do Objeto: a epistemologia fenomenológica, ilustrada por Husserl; a epistemologia construtivista e estruturalista, ilustrada por Piaget; a epistemologia histórica, ilustrada por Bachelard; a epistemologia “arqueológica”, ilustrada por Foucault; a epistemologia “racionalista-crítica”, ilustrada por Popper (JAPIASSU, 1992, p. 29). Nesse sentido, a epistemologia situa-se num campo múltiplo e com diferentes vieses, e sua construção deu-se em função do objeto cognoscente, do olhar do sujeito que o analisa e os suportes teóricos que amparam essa relação. Dando prosseguimento ao debate na seção que segue, evidenciam-se os contornos da Educação Infantil como primeira etapa da Educação Básica e seu delineamento legal. 22 3.2 A Educação Infantil e seu Delineamento A educação infantil brasileira teve seu maior impulso a partir da Constituição Federal de 1988, que foi ponto de partida para que a educação de crianças menores de 6 anos fosse reconhecida como foco de políticas e considerada primeira etapa da educação básica. Na década de 1990, leis, decretos e diretrizes para o trabalho com as crianças, as quais encontram-se no período denominado infância (FREITAS; KUHLMANN Jr, 2002), foram “olhadas” em termos legislativos, dando continuidade ao previsto na Constituição Federal de 1988. Como exemplo, tem-se o Estatuto da Criança e do Adolescente (lei federal nº 8.069 de 1990), que especifica os direitos dessas categorias e define a criação dos Conselhos da Criança e do Adolescente e dos Conselhos Tutelares (CRAIDY, 2012). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394/1996) reafirma o direito das crianças à educação infantil e consolida-a como primeira etapa da educação básica: A LDB que regulamentou a educação infantil definiu-a como a primeira etapa da educação básica (art. 21/I) e afirmou que estas instituições têm por finalidade o desenvolvimento integral da criança até cinco anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (art. 29). A creche e a pré-escola têm, portanto, uma função de complementação e não de substituição da família como muitas vezes foi entendido (CRAIDY, 2012, p. 25). Assim como destaca a necessidade da formação mínima para a atuação nesse nível de ensino e a necessidade das instituições construírem suas propostas pedagógicas: A LDB determina ainda que cada instituição do sistema escolar (portanto, também as instituições da educação infantil) deverá ter um plano pedagógico elaborado pela própria instituição com a participação dos educadores e que os educadores deverão ter sempre que possível o curso superior e como formação mínima o curso normal com especialização em educação infantil (CRAIDY, 2012, p. 25). 23 Nesse viés de discussão, acerca das propostas pedagógicas, surgem os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 1998), documento este implementado para um direcionamento no quesito organização de áreas de conhecimento, o que norteia, em certa medida, propostas pedagógicas para o trabalho pedagógico com crianças de 0 a 5 anos. O documento estabelece como áreas prioritárias, no volume que aborda sobre conhecimento de mundo: Movimento, Música, Artes Visuais, Linguagem Oral e Escrita, Natureza e Sociedade, e, Matemática. Mas, ressalta-se: [...] que a formação do sujeito-criança, sua compreensão e relação com as diferentes áreas do conhecimento, ficarão sob a responsabilidade de uma proposta pedagógica que alie uma concepção de criança, como sujeito de direitos, cidadã, a qual é um ser que pensa, age, reflete e está situado em uma cultura; como também, sob a responsabilidade do professor, o qual fará a mediação com a criança do que se tenha planejado (PIETROBON, 2014, p. 116). Em 1999 são definidas pelo Conselho Nacional de Educação as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Mas, “[...]em 2009, no conjunto da revisão das diretrizes de toda a educação básica, foi aprovada a resolução n. 5 da CEB/CNE que fixa as novas Diretrizes Nacionais da Educação Infantil” (CRAIDY, 2012, p. 25). Estas novas diretrizes destacam o caráter lúdico das práticas pedagógicas com crianças de 0 a 5 anos, por meio de diferentes linguagens, materiais e recursos, o que necessita ser pensado de acordo à faixa etária e contexto sociocultural. Nas Diretrizes Curriculares para a Educação Infantil (BRASIL, 2009), as propostas pedagógicas devem ter como fio condutor as interações e as brincadeiras no trabalho com variados temas e experiências, como expresso no art. 9º. Além disso, o desenvolvimento da autonomia da criança, a aliança entre cuidado-educação, a participação das famílias, a interação entre escola e comunidade, bem como o respeito à dignidade da criança, são todos aspectos pontuados no referido documento. Ainda em 2009, o Ministério da Educação reedita um material chamado Critérios para um Atendimento em Creches que Respeite os Direitos Fundamentais das Crianças, no qual estabelecem-se direitos das crianças, e que servem, também, 24 de balizador para a avaliação, pelos profissionais, da proposta pedagógica e do espaço que oferecem em instituições, nessa primeira etapa da educação básica. E, recentemente, vem se discutindo uma unidade em termos de conhecimentos e saberes para a educação básica, o que se evidencia na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), um documento preliminar para análise de entidades, instituições educacionais, professores, entre outros. No que se refere aos direitos das crianças, estes estão expressos na BNCC, como conviver democraticamente, brincar, participar, explorar, comunicar e conhecer-se. A BNCC organiza a educação infantil em campos de experiência, com viés interdisciplinar, divididas em: O Eu, o Outro e o Nós; Corpo, Gestos e Movimentos; Escuta, Fala, Pensamento e Imaginação; Traços, Sons, Cores e Imagens; Espaços, Tempos, Quantidades, Relações e Transformações. A BNCC preconiza que estes campos de experiência e seus objetivos sejam articulados e tenham desdobramentos no ensino fundamental. Estes campos de experiência, ao serem trabalhados, devem ter a possibilidade de construir capacidades a partir da participação das crianças. No documento está expresso que as instituições de educação infantil necessitam pensar em maneiras de acompanhar e registrar o progresso das crianças, de modo que a avaliação se configure, o que dá a entender, que a avaliação é um processo. A ideia de uma base comum de conteúdos, organizada em campos de experiência, de certa forma, diz respeito ao mínimo de saberes e conhecimentos a serem desenvolvidos com crianças pequenas. Todavia, o currículo não se restringe apenas ao programa, mas encaminhasse pela experiência das crianças, pelas situações vividas nas instituições, pelas famílias e a comunidade (BARBOSA; RICHTER, 2015). A organização do currículo por campos de experiência é oriunda da Itália, onde se teve, desde o século XX proposições para a educação da infância. Na década de 1990, “As Novas orientações para a Nova Escola da Infância” já davam relevo à necessidade de se considerar as experiências da vida das crianças, com enfoque dos 3 aos 6 anos, tendo como proposta o desenvolvimento da autonomia das crianças e sua criticidade (FINCO; BARBOSA;FARIA, 2015). Em 2012, foram organizadas na Itália novas indicações curriculares, de 3 a 10 anos, que engloba desde a educação infantil aos anos iniciais, realizando um 25 paralelismo com o sistema brasileiro, tendo a criança como foco. E, assim, ao tomar como base a experiência italiana, Finco, Barbosa e Faria (2015) destacam que é necessário olhar as propostas de campos de experiência como uma possibilidade de ter a criança como ator central, o que pode contribuir na construção curricular, e que possa primar pela construção do conhecimento. 3.3 O Ensino de Ciências e a Educação Infantil: uma análise a partir dos referenciais, das diretrizes e da BNCC Ao se tentar definir ou conceituar o ensino de ciências e suas possibilidades significantes, evidencia-se que numa dimensão ampla: O ensino de Ciências [...] tem por função colaborar para a compreensão do mundo e suas transformações, situando o homem como indivíduo participativo e parte integrante do universo, compreendendo os fenômenos da natureza, bem como as mais variadas formas de utilização de recursos naturais e interferências no meio. Tendo assim, como objeto de estudo o ambiente enquanto tema gerador e unificador. Desta forma, o ensino de ciências se dá pela curiosidade sistêmica e pela busca de informações em fontes variadas (UJIIE, 2011, p. 1). O processo de mediação dos conhecimentos na área de ciências pode oportunizar às crianças/alunos o desenvolvimento de seus saberes, por meio de experimentações e questionamentos buscando respostas para compreensão do desconhecido, ampliando, assim, seus horizontes. O ensino de ciências aborda assuntos articulados com a realidade, meio ambiente, desenvolvimento do ser humano, transformações tecnológicas, dentre outros temas. No sentido apresentado, Bizzo (2009) corrobora que o ensino de ciências deve, sobretudo, proporcionar aos educandos oportunidades para desenvolver suas capacidades, despertando inquietações e possibilitando a construção de explicações lógicas. Vizentin e Franco (2009, p.11) afirmam que: Ao adquirir conhecimentos de ciências, as crianças estarão construindo uma base sólida e uma estrutura lógica que as auxiliarão a construir e adquirir outros conhecimentos essenciais para o seu desenvolvimento. Ao oportunizar, ao aluno, a 26 descoberta e a interação do mundo em que vive, as portas do conhecimento são abertas isso permite-lhes o desenvolvimento de todo o seu potencial não só cognitivo como também emocional. As contribuições do ensino de ciências são amplas, mas para efetivá-las, Barros et al (1998) enfatizam que há a necessidade do trabalho do professor, e este direcionando sua ação totalmente para a aprendizagem dos educandos, oportunizando o acesso ao conhecimento, instigando-os a questionamentos para a compreensão do mundo. De acordo com os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 1998, p. 175), o eixo que focaliza o ensino de ciências nomina-se “Natureza e Sociedade” e estabelece os objetivos seguintes: 0 a 3 anos - explorar o ambiente, para que possa se relacionar com pessoas, estabelecer contato com pequenos animais, com plantas e com objetos diversos, manifestando curiosidade e interesse; 4 a 5 anos e 11 meses - interessar-se e demonstrar curiosidade pelo mundo social e natural, formulando perguntas, imaginando soluções para compreendê-lo, manifestando opiniões próprias sobre os acontecimentos, buscando informações e confrontando ideias; - estabelecer algumas relações entre o modo de vida característico de seu grupo social e de outros grupos; estabelecer algumas relações entre o meio ambiente e as formas de vida que ali se estabelecem, valorizando sua importância para a preservação das espécies e para a qualidade da vida humana. Na educação infantil é fundamental que as crianças sejam estimuladas a observar os fenômenos naturais e sociais, questionar, participar de experiências mediadas pelos docentes, a fim de ampliar os conhecimentos de maneira eficiente e mergulhar nas aprendizagens voltadas ao ensino de ciências. Conforme Kramer et al (2009), as crianças participam da construção de seu próprio conhecimento, por meio de estímulos e interações com o contexto de vivências e experiências em meio à sociedade. A criança passa maior parte de seu tempo no ambiente educacional e este deve oferecer atividades propícias, para que haja maior interação dos alunos com novas situações de aprendizagem; oportunizando criar, recriar, transformar e construir significados e novos saberes. Isto sinaliza uma 27 dinâmica interacionista, dialógica e dialética, como norteadora da ação pedagógica para a primeira infância. É importante evidenciar que as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (2009, p. 18) consideram que: O currículo da Educação Infantil é concebido como um conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento integral de crianças de 0 a 5 anos. Frente ao exposto é plausível afirmar que, as aprendizagens voltadas ao campo da alfabetização científica e que contemplem a formação integral da criança comparecem como norteamento intrínseco e entrelaçado no âmbito das diretrizes para educação da primeira infância. Considerando as nuances tanto presentes nos referenciais como nas diretrizes, observa-se um cunho epistemológico em defesa do interacionismo, relação sujeito- objeto e professor-aluno em conformidade de ação à construção do conhecimento e da consolidação do processo ensino-aprendizagem, articulado ao ensino de ciências naturais e sociais, em congruência, uma vez que o eixo articulador focaliza natureza e sociedade de modo não hierárquico. A BNCC, conforme já mencionado anteriormente, em sua proposição direcionada à educação infantil, sistematiza-se a partir da concepção de “campos de experiências de aprendizagens”, ressaltando que os conhecimentos da linguagem, da matemática, das ciências humanas e da natureza se anunciam em todos os campos de experiências da educação infantil, com importância equilibrada e de modo interdisciplinar. Cada um deles oferece às crianças a oportunidade de interagir com pessoas, com objetos, com situações, atribuindo-lhes um sentido pessoal. Os conhecimentos aí elaborados, reconhecidos pelo/a professor/a como fruto das experiências das crianças, são por ele/a mediados para qualificar e para aprofundar as aprendizagens feitas (BRASIL, 2015, p. 21). Na concepção de Barbosa e Campos (2015, p. 362), com a qual coaduna-se a BNCC “conseguiu ratificar o currículo das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil e definir de modo mais propositivo a organização das atividades 28 cotidianas a partir dele”. E, dentro deste âmbito demostrou em sua tessitura alinhamento à epistemologia interacionista, dialética e dialógica, amplificando o debate de um currículo teórico e metodologicamente mais definido, como pode-se concluir perante a análise documental efetivada. A BNCC articula ação interativa via seis verbos conviver, brincar, explorar, participar, comunicar e conhecer, os quais interagem como enunciadores de objetivos em cada um dos cinco campos de experiência destinados à educação Infantil, sendo cada um deles: 1. O eu, o outro e nós; 2. Corpo, gestos e movimentos; 3. Traços, sons, cores e imagens; 4. Escuta, Fala, Pensamento e Imaginação; 5. Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações. O conhecimento, as ciências e seu processo de construção de aprendizagens são, pois, integrativos ao tomar por foco a educação infantil, num movimento que se identifica com a epistemologia interacionista e prima por congregar dialogicamenteos sujeitos envolvidos na seara educacional. A ação docente, desde a educação infantil, perpassa situações nas quais as relações entre sujeitos, objetos de conhecimento e contexto de realização estarão se entrecruzando. Os sujeitos – professores e alunos/crianças – constituem-se, pela sua racionalidade e capacidade de observação, como aqueles que irão questionar a realidade e relacionar conhecimentos científicos livrescos com seu entorno. Para tanto, o professor é o mediador nesse processo elaborativo e construtivo. Então, na organização das propostas para o ensino de ciências na educação infantil, os professores orientam-se por meio de documentos oficiais, diretrizes, teorias específicas que dão suporte à sua prática, nos quais encontram-se uma epistemologia que embasa a mesma. A pergunta inicial que se tinha - Que epistemologia embasa os documentos oficiais que orientam as práticas pedagógicas na área de ciências na educação infantil? - Trouxe a necessidade de refletir-se sobre o conceito de epistemologia, a relação sujeito-objeto e, realizar leitura analítica dos Referenciais Curriculares para a Educação Infantil (BRASIL, 1998), das Diretrizes Curriculares Nacionais para a 29 Educação Infantil (BRASIL, 2009) e o documento preliminar da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2015) para a área. Do estudo empreendido, conclui-se que há uma tendência para uma epistemologia interacional, com proposição dialógica de trabalho dos conteúdos que se relacionam ao ensino de ciências, tendo a criança como sujeito que participa desse processo de constituição dos conhecimentos científicos. O professor, nesse caso, atua como sujeito que media, dialoga e propõe as problematizações, articulando conceitos já elaborados com as percepções e saberes das crianças/alunos. 4 ENSINAR CIÊNCIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: REPENSAR O CURRÍCULO Fonte: centrodeestudoseformacao.com.br O ensino de ciências na Educação Infantil (EI) tem o objetivo de possibilitar uma formação científica que leve devidamente em conta as necessidades e possibilidades de desenvolvimento cognitivo, o estado atual e as perspectivas de evolução do conhecimento científico. Com o avanço da tecnologia, a ciência torna-se importante no cotidiano, assim, uma formação adequada desde a EI, passou a ser um requisito indispensável da educação das novas gerações (FREITAS, 2016). O currículo na EI se caracteriza por um conjunto de práticas, em que as experiências e os saberes das crianças se articulam com os conhecimentos construídos. É necessário pensar sobre os conteúdos ensinados na escola, 30 principalmente se estes são transmitidos de forma empírica e reduzidos a uma coleção de fatos, conceitos, leis e teorias, apresentados aos alunos de forma tradicional. Assim, a proposta desse trabalho surgiu de uma disciplina de mestrado das autoras com o objetivo de compreender através de uma discussão teórica o currículo de Educação Infantil quanto ao ensino de Ciências. Para alcançar tal objetivo, emerge um questionamento que norteou o desenvolvimento deste trabalho, a saber: Como tem sido pensado o currículo para o ensino de Ciências na Educação Infantil, visto que a inserção de conceitos científicos tem sido uma necessidade desde os primeiros anos de escolarização? Mediante este questionamento acredita-se que esta pesquisa se torna de grande relevância, haja visto, que poucos trabalhos no Brasil têm buscado compreender a importância do ensino de Ciências na Educação Infantil. Andreia Freitas, Roziane Santos e Thalita Pacini elaboraram um trabalho através de uma revisão bibliográfica, sob enfoque qualitativo, possibilitando o contato do pesquisador com o que já se produziu e registrou a respeito do tema de pesquisa. Conforme Marconi e Lakatos (2003), a revisão bibliográfica consiste em buscar os trabalhos acerca de temas específicos que já são de domínio público. A partir deste levantamento foram selecionados trabalhos sobre o tema em questão entre os conteúdos pesquisados, realizou-se leituras científicas deste material com a finalidade de discernir sobre o ponto de vista que descreve o currículo de ciências na EI. Desde que a criança nasce a ciência já está presente em sua vida, apresentando fatos que provocam a curiosidade delas, sobre o mundo, sobre si mesma, entre outras coisas. Esses elementos já fazem parte do universo sociocultural infantil, devido a esse fator, proporcionar atividade que permita o contato com conteúdos ligados ao ambiente que ela está inserida envolvendo-as no processo de construção do conhecimento para o desenvolvimento de suas capacidades e formação de atitudes críticas, é uma ação fundamental que deve ser desempenhado pelo professor (BIZZO, 2002). De acordo com Cruz (2011) a ação pedagógica na educação infantil deve prevê a organização dos tempos e dos espaços com foco na criança, na vivência plena de sua infância, essa rotina se constitui em momentos de trocas de experiência, 31 potencialização e desenvolvimento das habilidades que a criança possui. Dessa forma, torna-se necessário pensar em um planejamento que contemplem as peculiaridades da infância, entretanto, antes é preciso que haja a compreensão do significado do ato de planejar. Ostetto (2011) assegura que o planejamento não se trata de uma listagem de atividades a serem desenvolvidas em sala de aula, mas sim um processo de reflexão, uma atitude crítica que envolve o traçar, projetar, programar a proposta, elaborar um roteiro das ações e situações em sala frente ao trabalho docente. Esse planejamento deve levar em conta o olhar atento à realidade, abrangendo o sujeito que se pretende formar e o objetivo dessa formação, deve ainda ser flexível admitindo ao educador repensar sua prática, sua intencionalidade para assim trilhar novos caminhos para orientar o trabalho docente. Para Bizzo (2002), a educação em Ciências deve contextualizar as descobertas e produzir vivências que os transportem ao cerne dos problemas que geraram conhecimentos. Deve ajudar a criança a desenvolver conhecimentos e hábitos mentais de que necessita para tornar-se capaz de pensar por si próprio e para enfrentar a vida, como cidadão consciente, imbuído na construção de uma sociedade justa. Sendo essa área também rica em experimentos, é possível criar situações de observação, in loco, podendo utilizar terra, farinha, pigmentos misturados em água, óleo, leite para se ter algum resultado, articulando com atividades diversificadas com a utilização de obras da literatura, músicas, vídeos e muitos outros (RCNEI, 1998, p. 178-179). Considerando que as crianças constroem o conhecimento desde os primeiros anos de vida, é importante aprimorar os conhecimentos prévios com um currículo capaz de transformar tais conhecimentos em novas aprendizagens. Quero destacar uma ideia de currículo que enfatiza seu aspecto produtivo e interativo. Isto é, o currículo não está constituído por informações, conceitos, princípios que são passados para os alunos (geralmente organizados sob a forma de listas de “conteúdos” – aquilo que deve ser ensinado). O currículo é o que crianças e professores produzem ao trabalhar com os mais variados materiais – os objetos de estudos que podem incluir os mais diversos elementos da vida das crianças e de seu grupo ou as experiências de outros grupos e de outras culturas que são trazidos para 32 o interior da creche e da pré-escola. Portanto, não é o conhecimento preexistente que constitui o currículo, mas o conhecimento que é produzido na interação educacional (CRAIDY & KAERCHER, 2001, p. 18). Neste sentido, fica evidente o quão importante é considerar o que a criança traz consigo, suas experiências, sua cultura e a partir daí, elaborar um planejamento respeitando a individualidade de cada um, partindo do que elas já sabem, para entãopossibilitar uma aprendizagem significativa. Falar de currículo de ciências na educação infantil é um desafio, principalmente porque vem assumindo cada vez mais lugar de destaque no meio educacional, nas áreas de conhecimento pedagógico e na formação de professores para a educação básica, que precisam ser críticos e reflexivos com o intuito de formar os seus alunos a partir dessa mesma ótica. Há indicativos de que o ensino de ciências na Educação Infantil tem sido trabalhado de maneira desvinculada da realidade do educando, pois, ainda é encarado como um conhecimento inapropriado às crianças. Entretanto, o que buscou- se demonstrar nesse trabalho é que o questionamento e a curiosidade da criança com relação ao mundo que as cerca, são fatores fundamentais para o ensino de ciências, pois, o objetivo deste ensino é justamente possibilitar que o indivíduo seja capaz de compreender e intervir de maneira crítica no mundo em que vive. Embora esteja claro que a EI e o ensino de ciências podem caminhar juntos, vale ressaltar que tal tarefa não é simples, requer uma mudança de concepção do próprio professor, do currículo e da cultura escolar. 33 5 O QUE ENSINAR EM CIÊNCIAS Fonte:abrilsuperinteressante.files.wordpress.com A tendência atual da disciplina é fazer com que o aluno observe, pesquise em diversas fontes, questione e registre para aprender. Por quê? Essa é uma das perguntas que as crianças fazem com bastante frequência. Elas têm curiosidade em saber a origem das coisas e as causas dos fenômenos da natureza e em explorar aquilo que lhes parece diferente, intrigante. A disciplina de Ciências, quando bem trabalhada na escola, ajuda os alunos a encontrar respostas para muitas questões e faz com que eles estejam em permanente exercício de raciocínio. Pela importância da área para a Educação, o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) - exame que mede o nível de ensino em diversos países, de três em três anos - investiga como os estudantes de 15 anos estão em relação ao aprendizado desses conhecimentos. Infelizmente, o resultado do Brasil deixa a desejar: em 2006, o país ficou em 52º lugar (de um total de 57 nações participantes). Uma das principais causas apontadas para o fracasso é a maneira de ensinar a disciplina, que muitas vezes é apoiada em concepções equivocadas e não desperta o interesse das turmas. POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar 34 "Trabalhar os conteúdos de Ciências é dar oportunidade a crianças e jovens de entender o mundo e interpretar as ações e os fenômenos que observam e vivenciam no dia a dia", diz Luciana Hubner, formadora de professores e selecionadora do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10. Com a tecnologia mais presente na vida das pessoas, ter conhecimento científico também significa estar preparado para analisar as questões da contemporaneidade e se posicionar frente a elas - alguns dos objetivos da disciplina. A percepção sobre a importância da área de Ciências na escola e na formação dos alunos é relativamente recente. Basta notar como ela demorou para ser incorporada ao currículo. Na concepção que vigorou do século 19 à década de 1950, impregnada de ideias positivistas, predominava o pensamento de que essa área do conhecimento era sempre neutra em suas descobertas e que os saberes delas decorrentes seriam verdades únicas e definitivas. A maneira de ensinar também passou décadas apoiada na reprodução dos mesmos padrões. Acreditava-se que os fenômenos naturais poderiam ser compreendidos com base apenas na observação e no raciocínio, bastando para isso que os estudantes fossem levados a conhecer todo o patrimônio científico produzido até então e a memorizar conceitos. A metodologia que tem no professor e no livro didático o centro da transmissão de saberes ficou conhecida como tradicional ou conteudista - e ainda hoje está presente nas salas de aula. Investimento em tecnologia e reprodução de procedimentos Somente nos anos 1960 é que essa prática pedagógica começou a ser questionada. O movimento que se contrapôs a ela surgiu nos Estados Unidos, estendeu-se para a Inglaterra e a França e chegou, com menos força, ao Brasil. No cenário mundial, havia uma disputa econômica acirrada entre os países e entre blocos econômicos. Portanto, desenvolver tecnologias e saber usá-las para produzir riquezas começou a ser fundamental para o sucesso de uma nação. Era preciso formar mais e mais pessoas com capacidade de criar produtos, métodos e procedimentos que gerassem divisas. Nas escolas, era necessário incentivar a formação de profissionais com esse perfil e acreditou-se que o caminho para isso era levar os alunos a reproduzir os passos que cientistas já haviam trilhado ao fazer suas descobertas. POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar 35 Mitos pedagógicos Aula deve ser experimental Uma atividade prática não carrega em si todos os conteúdos que se quer ensinar, assim como não é necessariamente o procedimento principal ou obrigatório no ensino de Ciências. As aulas em laboratório devem fazer parte de uma sequência didática que envolva exposições teóricas, registros dos alunos e confrontações de ideias. Experiência, só em laboratório Aula prática não depende de equipamentos de alta tecnologia. Com material alternativo também é possível produzir experimentos que levam à construção de conceitos pelos alunos. Observações de fenômenos podem ser feitas no pátio da escola ou na vizinhança. Memorizar nunca mais É um erro reduzir os aprendizados de Ciências a apenas uma lista de enunciados a serem decorados. Porém a memorização às vezes é importante depois de entender os conteúdos. Nem toda terminologia deve ser abandonada. Ela tem sentido e deve ser valorizada por meio de objetivos claros. 5.1 Teoria e prática juntas no processo de investigação O ensino tornou-se experimental, no chamado modelo da redescoberta ou tecnicista: a prática seguia roteiros preestabelecidos, num passo-a-passo encadeado para chegar aos resultados previstos. Ele se contrapôs ao tradicional ao valorizar a ação científica, mas manteve o aluno na passividade e continuou a dar ênfase às definições acabadas. Somente nos anos 1970, em estudos feitos com base em descobertas sobre como a criança aprende, se percebeu a necessidade de o aluno fazer seu próprio percurso, respeitando as ideias que ele já tinha sobre o conteúdo. Diferentemente da abordagem tecnicista, o fundamental passou a ser se apoiar em questões que POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar 36 fizessem sentido para o aluno e assim despertassem a curiosidade e o interesse pelo conhecimento. A chamada perspectiva investigativa começou a tomar corpo e hoje é apontada como a mais adequada para o ensino da disciplina. Maria Teresinha Figueiredo, coautora das Expectativas de Aprendizagem de Ciências da prefeitura de São Paulo, explica que Ciências só se aprende quando há uma situação para resolver, um problema bem colocado que incentive a busca de respostas que não sejam óbvias nem organizativas ou classificatórias: "Não é prática versus teoria, mas é prática com teoria o tempo todo. Os conteúdos não precisam necessariamente estar dispostos de maneira linear, mas organizados como uma rede de informações". Para entrar em contato com essa maneira de estudar, o aluno deve aprender a levantar hipóteses, interpretar os resultados, elaborar problemas, recolher dados, pesquisar, fazer registros, planejar a ação e aplicá-las a novas circunstâncias. O pontapé inicial é a exposição de uma situação-problema, um impasse do dia- dia para o qual a turma mobiliza o que já sabe para tentar solucioná-la. Perguntas do tipo "por que o leitederrama quando ferve?" e "por que os alimentos cozinham mais rápido na panela de pressão?" são alguns exemplos. Para encontrar a solução, o aluno se vale de ideias e conhecimentos que já tem antes de procurar explicações nos livros. Ele agora participa ativamente da aula, planejada para propiciar e valorizar sua iniciativa. O professor, além de ser fonte de informação, passa a ter a função de orientar as ações. O livro didático torna-se apenas um dos materiais de consulta. Para Antônio Carlos Pavão, docente da Universidade Federal de Pernambuco e diretor do Espaço Ciência, tanto o estudante como o docente assumem o papel de pesquisador, ficando esse último com a função também de conduzir a investigação e instrumentalizar a criança para que ela aprenda com autonomia. Internet, museus, revistas, livros científicos e paradidáticos e programas de televisão fazem parte do material de pesquisa. "Cabe ao educador ensinar a turma a usar essas ferramentas, filtrar os dados, contrapor informações e auxiliar a criança a elaborar uma versão adequada para o que acabou de aprender", afirma Pavão. POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar 37 5.2 O valor didático da experiência depende da forma como é feita Falar e escrever sobre as descobertas é parte do caminho para dominar e usar a linguagem específica que aparece em textos científicos, gráficos e tabelas. "Enquanto o aluno reelabora sua percepção anterior de mundo, ao entrar em contato com a visão trazida pelo conhecimento científico, ele também se apropria de novas linguagens", diz Luis Carlos de Menezes em um dos capítulos do livro O Desafio de Ensinar Ciências no Século XXI. A observação e a investigação são fundamentais para entender os fenômenos naturais ou produzidos em laboratório. Contudo, o valor didático da experiência ou de uma saída da escola para estudo depende da forma como elas são realizadas. Os experimentos (antes usados somente para comprovar conhecimentos já recebidos em aulas teóricas) agora assumem a função de permitir o relacionamento entre conteúdos e de facilitar a formulação de conceitos, sempre com a intervenção do professor. Pela metodologia investigativa, a avaliação faz parte do processo de aprendizagem do aluno e do redirecionamento do planejamento do professor: mais do que verificar se os conteúdos foram aprendidos, ela contribui na identificação das dificuldades e no trabalho de aperfeiçoamento dos procedimentos de ensino. As Orientações Curriculares propostas pela prefeitura de São Paulo dizem que "erros, conflitos e soluções de problemas se mostram como aspectos positivos na aquisição de novos conhecimentos e fazem parte do cotidiano da escola". Mais que as respostas corretas ou erradas, o processo de avanço de cada um dos alunos também deve ser levado em conta. Beatriz Santomauro, neste trabalho, apresenta cinco perguntas ao Professor do 8º e 9º ano e coordenador de Ciências na Escola Comunitária de Campinas, em Campinas, a 100 quilômetros de São Paulo, Eduardo Schechtmann . 1) Quais os objetivos da disciplina no Ensino Fundamental? Entender a área do ponto de vista conceitual e procedimental e desenvolver habilidades que formem indivíduos autônomos e seletivos na aquisição do conhecimento. POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar 38 2) Como devem ser as atividades? Elas precisam desenvolver a capacidade de ouvir, falar, argumentar e respeitar diferentes pontos de vista. 3) Quais as melhores estratégias para ensinar os conteúdos? Observação e registro, estudos do meio, aulas expositivas, confecção de mapas conceituais, leitura, produção de textos e discussão em grupo. 4) Quais são as priorizadas em suas aulas? Todas as que estimulam uma postura mais proativa e criativa e que façam os alunos participarem. 5) Como a maneira de ensinar impacta a formação dos alunos? Espero que minhas aulas ajudem a garotada a compreender a realidade dentro da sua complexidade. 5.3 Linha do tempo do ensino de Ciências no Brasil 1879 - É fundada a Sociedade Positivista do Rio de Janeiro. Professores seguem o pressuposto de que o aluno descobre as relações entre os fenômenos naturais com observação e raciocínio. 1930 - A Escola Nova propõe que o ensino seja amparado nos conhecimentos da Sociologia, Psicologia e Pedagogia modernas. A influência desses pensamentos não modifica a maneira tradicional de ensinar. 1950 - Os livros didáticos são traduções ou versões desatualizadas de produções europeias, e quem leciona a disciplina são profissionais liberais. Vigora a metodologia tradicional, baseada em exposições orais. POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar POSITIVO Destacar 39 1955 - Cientistas norte-americanos e ingleses fazem reformas curriculares do Ensino Básico para incorporar o conhecimento técnico e científico ao currículo. Algumas escolas brasileiras começam a seguir a tendência. 1960 - A metodologia tecnicista chega ao país, defendendo a reprodução de sequências padronizadas e de experimentos, que devem ser realizados tal como os cientistas os fizeram. 1961 - Com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), passou a ser obrigatório o ensino de Ciências para todas as séries do Ginásio (hoje do 6º ao 9º ano). 1970 - A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência critica a formação do professor em áreas específicas, como Biologia, Física e Química, e pede a criação da figura do professor de Ciências. Sem sucesso. 1971 - A LDB torna obrigatório o ensino de Ciências para todas as séries do 1º Grau (hoje Ensino Fundamental). O Ministério da Educação (MEC) elabora um currículo único e estimula a abertura de cursos de formação. 1972 - O MEC cria o Projeto de Melhoria do Ensino de Ciências para desenvolver materiais didáticos e aprimorar a capacitação de professores do 2º grau (hoje Ensino Médio). 1980 - As Ciências são vistas como uma construção humana e não como uma verdade natural. São incluídos nas aulas temas como tecnologia, meio ambiente e saúde. 1982 - Surge o modelo de mudança conceitual, que teve vida curta. Ele se baseia no princípio de que basta ensinar de maneira lógica e com demonstrações para que o aprendiz modifique ideias anteriores sobre os conteúdos. 40 2001 - Convênio entre as Academias de Ciências do Brasil e da França implementa o programa ABC na Educação Científica - Mão na Massa para formar professores na metodologia investigativa. Fontes parâmetros curriculares nacionais / inovação educacional no Brasil: problemas e perspectivas, Walter Garcia (coord.) / história da educação e da pedagogia, Maria Lúcia de Arruda Aranha / formação continuada de professores de ciências no âmbito ibero-americano, L.C. Menezes (org.) / o livro didático de ciências no Brasil, Hilário Fracalanza (org.) 5.4 Metodologias mais comuns no ensino de Ciências O ensino de Ciências dos últimos 50 anos adotou estratégias diferentes. Confira. TRADICIONAL Também chamada de conteudista ou convencional. Predominou desde o século 19 até 1950 e, embora não seja considerada a mais adequada para as práticas atuais, ainda é adotada. Foco: Tomar contato com os conhecimentos existentes sobre determinado tema. Estratégia de ensino: Aulas expositivas, sendo o professor e o livro didático as únicas fontes de informação. Incentivo à memorização de definições. A experimentação em laboratório serve para comprovar a teoria. TECNICISTA Surgiu na década de 1950 para se contrapor à concepção
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