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1 Louyse Morais – Medicina – 108 Abordagem da dor lombar Epidemiologia • As patologias discais são prevalentes em indivíduos assintomáticos. • Estudos em gêmeos idênticos indicam que a influência genética na degeneração discal é tão ou mais importante do que idade e a sobrecarga mecânica. • 85% das lombalgias não tem uma causa específica. • Os fatores de risco incluem trabalho física ou psicologicamente estressante, trabalho sedentário, obesidade, fatores psicossociais, idade avançada e tabagismo. Classificação e diagnóstico diferencial As classificações usam como critérios a duração, a etiologia e a semiologia. Classificação quanto à duração • Aguda: até 4 semanas • Subaguda: entre 4 e 12 semanas • Crônica: dor por, pelo menos, 12 semanas e dor em pelo menos metade dos dias nos últimos 6 meses. Classificação das lombalgias de acordo com a semiologia e etiologia • Não irradiadas o Não específica (70-90%) o Degenerativa (10%) o Espondilolistese (3%): deslocamento anterior de uma vértebra ou da coluna vertebral em relação à vértebra inferior o Espondilólise (1-4%): fratura por estresse ou trauma das facetas articulares • Irradiadas com radiculopatia (ciatalgia): dor irradiada desde a região lombar até abaixo da região do joelho, sendo que a dor lombar é com menor intensidade do que a irradiada. o Hérnia discal que necessita intervenção cirúrgica (2%) o Estenose espinal (3%) o Causa equina (0,0004 ou 1-2% das hérnias discais) • Visceral (referida) ou outras causas específicas o Sistêmica ▪ Fratura por osteoporose (4%) ▪ Infecção (osteomielite, abscesso paraespinhal, tuberculose) (0,01%) ▪ Malignidade (0,7%) ▪ Espondilite anquilosante (0,3%) ▪ Doenças do tecido conectivo o Referida ▪ Aneurisma aórtico ▪ Pancreatite aguda ▪ Pielonefrite aguda ▪ Cólica renal ▪ Úlcera péptica Associação entre lombalgia e trabalho: quando houver suspeita de relação com o trabalho, é importante evitar a elevação de objetos pesados e, quando isso ocorrer, usar a musculatura dos MMII. A principal orientação é o retorno imediato ao trabalho, evitando por alguns dias movimentos de elevação e esforços físicos extenuantes. Exame clínico Anamnese A avaliação clínica da dor lombar deve enfocar três aspectos principais: • Descartar doença sistêmica subjacente; • Identificar comprometimento neurológico que demande avaliação cirúrgica, e • Considerar a existência de fatores psicológicos ou sociais (bandeiras amarelas) que possam amplificar ou prolongar a duração do quadro. As perguntas-chave a serem respondidas durante a história são: existe uma doença sistêmica grave causando a dor? Existe comprometimento neurológico que possa exigir avaliação cirúrgica? Existe sofrimento social ou psicológico que possa amplificar ou prolongar a dor? A história deve tentar eliminar a chance uma patologia específica e classificar a lombalgia em um dos seguintes grupos: • Grupo 1: lombalgia associada à radiculopatia • Grupo 2: lombalgia associada a alguma causa específica, como cauda equina, neoplasia, 2 Louyse Morais – Medicina – 108 infecção, fratura vertebral, artrite inflamatória, pielonefrite, disfunção sacroilíaca. • Grupo 3: lombalgia inespecífica (85% dos casos). Para excluir uma condição lombar séria (grupo 2), deve-se ficar atento às bandeiras vermelhas a seguir: Descartando essas causas sérias, o clínico deve concentrar-se na avaliação de causas específicas de dor lombar (grupo 1), como hérnia de disco com radiculopatia, estenose e espondilolistese. Na ausência de sinais e sintomas sugestivos dessas causas, o caso será classificado como dor lombar inespecífica. Exemplos de perguntas que ajudam a fazer essa classificação: • Duração: “você está com essa dor há quanto tempo?” • Frequência: “quantos dias a dor veio nos últimos 7 dias?” • Severidade (escala de dor): “de 0 a 10, quanto dói em geral?” • Constância: “quais momentos do dia a dor aparece?” • Presença de irradiação: “a dor vai para as pernas? Para qual perna? Até onde ela vai?” • Fraqueza: “além da dor, tem fraqueza? Para fazer qual movimento?” • Alteração na sensibilidade: “tem alguma dormência ou formigamento?” • Demais órgãos afetados: “tem alguma alteração na urina ou nas fezes?” • Relação com o trabalho: “trabalha com o quê? Acha que pode ter relação com o trabalho?” • Tratamentos anteriores: “quais remédios já tomou para esta dor?” Aspectos relevantes a serem abordados na história são: cronologia, natureza da dor (irradiada ou não irradiada) e desencadeantes, impacto na função, sinais de alerta que indiquem causa específica ou urgência (vermelho), sinais de alerta que indiquem um prognóstico ruim (amarelo). Quando suspeitar de doenças específicas? Exame físico • Inspeção para observar se não há abaulamento ou sinais de trauma • Flexão do dorso para avaliar limitação e funcionalidade • Palpação das apófises e da região dolorida para avaliar extensão da dor e possibilidade de patologia localizada e específica. A descrição de ciatalgia na história tem moderada sensibilidade, mas baixa especificidade. Fraqueza é um sintoma com melhor especificidade para compressão radicular. Caso haja descrição ou suspeita de radiculopatia, realizar os seguintes testes: • Teste da elevação da perna reta (laségue): dor neste membro a 30 a 60 graus. Sensível, mas pouco específico para hérnia de disco clinicamente significativa. • Teste da elevação da perna oposta: dor no membro não elevado a 30 a 60 graus. Pouco sensível, mas altamente específico. Pode-se sensibilizar mais o Laségue ao fazer uma dorsiflexão do pé. Deve-se considerar laségue positivo apenas quando a elevação inferior a 60 graus reproduz ou exacerba os sintomas de catalgia, com dor intensa e 3 Louyse Morais – Medicina – 108 superficial irradiada abaixo do joelho (não meramente dor nas costas ou na coxa). Outros testes que podem dar informações adicionais são: Suspeita de espondilite anquilosante • Teste de Patrick ou FABER: posiciona-se o maléolo lateral de um pé encostado na patela contralateral e pressiona-se para baixo o joelho da perna fletida estabilizando a pelve contralateral com a outra mão; dor associada a esse teste pode indicar origem na articulação sacrilíaca. • Teste de Schober: com a pessoa em pé, marca-se um ponto na linha da coluna na altura de L5-S1 (projeção da espinha ilíaca posterior) e outro ponto 10 cm acima deste; quando a pessoa se agacha (flexão ventral), a distância aumenta 5 cm, ficando 15 cm no mínimo entre os dois pontos. O teste positivo (aumento inferior a 5 cm) pode indicar limitação funcional com a ressalva que idosos e obesos a possuem naturalmente. Esse teste é pouco específico e avalia apenas a funcionalidade. Obs.: Sinais de envolvimento medular, como disfunção esfincteriana ou sexual, fasciculações, fraqueza e hipotrofia musculares, hipertonia espástica, hipo ou hiperreflexia profundas, sinal de Babinski e disestesias com distribuição dermatométrica são situações associadas a quadros mais graves e exigem avaliação especializada com um neurocirurgião. Discopatia Para os pacientes com suspeita de herniação de disco, os testes neurológicos devem ser focados nas raízes nervosas de L5 e S1, já que mais de 95% das herniações de disco clinicamente importantes ocorrem nos níveis de L4- 5 e L5-S1. • Levantar da cadeira em uma perna ou subir em banqueta de 18 cm com uma perna: essa avaliação do quadríceps diferencia lesão de L3-L4 e L5-S1; teste positivo sugere lesão de L3-L4. • Reflexo de Aquileu diminuído: é importante notar que apenas 60% das pessoas assintomáticas e hígidas com mais de 60 anos têm este reflexo bilateral; teste positivo sugere lesão em S1. • Dermátomo: focar na simetria da dor provocadapor um objeto pontiagudo nos dermátomos L4 (face medial da perna), L5 (dorso do pé) e S1 (maléolo lateral). • Avaliação motora e sensitiva: fraqueza na dorsiflexão do tornozelo no teste contra a resistência do examinador e do hálux sugere lesão de L5. Todos os pacientes que têm dor persistente (mais de 4 semanas) ou suspeita de lombalgia específica por radiculpatia, infecção, tumor, doença reumatológica ou dor referida necessitam de uma avaliação completa que envolve todos os testes citados mais exames complementares de acordo com a suspeita. Exames complementares Exames de imagem: nem sempre o achado radiográfico explica a dor se não houver correlação com a história e o exame físico. A grande maioria das pessoas não necessita de exames laboratoriais na avaliação inicial. Para indivíduos idosos, com sintomas constitucionais ou falha terapêutica, podem ser solicitados exames como: • Hemograma completo, velocidade de hemossedimentação (VHS), proteína C-reativa. Condições distintas, frequentemente de maior gravidade Síndrome da cauda equina 4 Louyse Morais – Medicina – 108 Corresponde à compressão da porção inferior da medula espinhal (abaixo de L1-L2) e de suas raízes nervosas, mais comumente por uma grande herniação central do disco intervertebral. Apresenta-se como dor lombar aguda muito intensa, com mais frequência unilateral, com irradiação para as extremidades inferiores, acompanhada de disfunção esfincteriana (retenção urinária, incontinência fecal ou urinária), hipoestesia da região perineal e fraqueza dos membros inferiores. É uma emergência cirúrgica. A descompressão deve ser realizada imediatamente após o diagnóstico com o objetivo de prevenir ou limitar as sequelas neurológicas. Fratura Fatores preditivos: sexo feminino, idade > 70 anos, trauma significativo e uso prolongado de corticosteroides. Causas inflamatórias Espondiloartrites são doenças de base autoimune. Podem acompanhar-se de fadiga, perda de peso e febre baixa. As artropatias inflamatórias costumam resultar em rigidez matinal prolongada, maior que uma hora, enquanto a lombalgia mecânica está associada a rigidez que dura menos de 30 minutos. A espondilite anquilosante é a mais incapacitante das artropatias inflamatórias. O diagnóstico é sugerido por um quadro de dor lombar crônica de início insidioso, associda à rigidez e limitação progressiva da mobilidade axial, acometendo tipicamente homens antes dos 40 anos. A atividade física ao longo do dia em geral melhora a dor da espondilite e exacerba a lombalgia mecânica. Fatores de história clínica de espondilite anquilosante em adultos com menos de 50 anos: • Rigidez matinal > 30 minutos • Melhora da dor lombar com exercício, mas não com repouso • Dor interrompendo sono na segunda metade da noite • Dor nas nádegas que alterna lados Causas infecciosas A infecção focal da coluna, causada por osteomielite, infecção no espaço discal (discite) ou sacroileíte séptica, pode manifestar-se como lombalgia aguda ou crônica. Herpes-zóster pode causar dor importante na distribuição de um dermátomo, sendo difícil de diagnosticar antes do surgimento da erupção vesicular clássica. Finalmente, síndromes virais e outras infecções sistêmicas podem determinar dor lombar de padrão inespecífico. Neoplasias Em geral, a dor óssea secundária à neoplasia é contínua, progressiva, não alivia com o repouso e piora com o decúbito, despertando o paciente à noite. O sinal de alerta mais informativo para diagnosticar malignidade é uma história prévia de câncer. Outros sinais são: idade > 50 anos, sem melhora após um mês, perda de peso inexplicada, sem alívio na posição deitada. Síndromes radiculares Espondilolistese/espondilólise Consiste no deslizamento anterior de uma vértebra sobre outra. A espondilolístese ístmica é a mais comum, causada por uma fratura vertebral de estresse na apófise interarticular do segmento L5-S1. Se a fratura não desalinhar a vértebra, o processo é chamado de espondilólise. Ocorre habitualmente entre os 10 e 18 anos, em indivíduos com história de atividades ou esportes que exigem hiperextensão da coluna (ginástica, musculação, voleibol). Pode ocorrer em idosos de forma degenerativa, com dor lombar isolada ou associada à ciatalgia, semelhante ao padrão da estenose espinhal. Os sintomas podem ser acentuação da lordose lombar e dor do tipo mecânica. Estenose Consiste no estreitamento do canal medular, podendo resultar em compressão das raízes nervosas lombossacrais, em geral em indivíduos com mais de 50 anos de idade. Manifestação típica: pseuclaudicação – o paciente experimenta dor bilateral nos membros inferiores quando deambula ou permanece em pé por tempo prolongado. Ocorre expansão do canal medular e alívio dos sintomas ao sentar-se ou flexionar-se anteriormente o tronco. Hérnia de disco com radiculopatia Dor de início agudo na região lombar em indivíduos com menos de 50 anos é uma apresentação comum. A recuperação costuma ser mais lenta em relação à dor lombar inespecífica. Apenas 10% dos pacientes permanecem com sintomas que levam a considerar o tratamento cirúrgico. A porção herniada do disco tende a regredir com o tempo, com resolução parcial ou completa em dois terços dos casos após seis meses. 5 Louyse Morais – Medicina – 108 Conduta proposta Na maioria das vezes, aconselhamento e manter- se ativo é suficiente. Pacientes com maior risco de pior prognóstico devem ter uma intervenção mais intensiva, como, por exemplo, TCC e fisioterapia. Por isso deve-se estratificar o risco durante a abordagem. Quando referenciar? Atividades preventivas e de educação: Fazer atividade física regularmente, alimentar-se adequadamente e dedicar-se à higiene do sono ajudam na recuperação e na presença de lombalgia e devem ser sempre abordados no curso do cuidado com a pessoa. Tratamento na fase aguda • Orientar o paciente a manter-se ativo • Evitar descanso no leito • Reassegurar sobre o prognóstico favorável nas primeiras semanas • Avaliar o nível de dor e de incapacidade funcional • Oferecer tratamento medicamentoso para alívio da dor. Pacientes com dor lombar de início recente, e com sintomas restritos a região lombar e coxa, podem ser encaminhados precocemente a um fisioterapeuta ou quiroprata para uma ou duas sessões de manipulação vertebral. Em pessoas cujo sintoma referido na perna ou coxa muda de uma posição distal para proximal, se aproximando do centro da coluna, exercícios em amplitude final na direção de preferência (que diminuem ou centralizam os sintomas) são mais eficientes. O paciente é ensinado a realizar os movimentos por conta própria, observando todas as vezes o efeito dos movimentos no sintoma mais distal, que deve diminuir em intensidade ou centralizar. Ele é orientado a manter a postura concordante com a direção de preferência e evitar temporariamente o movimento oposto. O tratamento como um todo leva quatro encontros com o fisioterapeuta ao longo de um mês. Medicamentos Apesar de não haver evidências diretas para aplicações tópicas de AINEs em dor lombar, ibuprofeno e piroxicam mostraram-se efetivos no alívio da dor musculoesquelética aguda, justificando o seu emprego em pacientes mais suscetíveis às reações adversas gastrintestinais e renais do uso sistêmico. O diclofenaco gel, disponível no Brasil, pode ser aplicado no local da dor três vezes ao dia. O emprego combinado de AINEs e paracetamol pode proporcionar maior analgesia, já que atuam por mecanismos diferentes. O uso de relaxantes musculares (benzodiazepínicos e ciclobenzaprina) durante um curto período de tempo pode apresentar um benefício modesto para alívio da dor e promove melhora global na percepção do paciente. A indicação de ciclobenzaprina parecelimitar-se à primeira semana de um episódio agudo de lombalgia, ocorrendo declínio da eficácia terapêutica após esse período. 6 Louyse Morais – Medicina – 108 Não há evidências do uso de corticoides sistêmicos para o manejo da dor lombar. Opioides só devem ser prescritos a critério clínico se necessário e por curto período de tempo. Demais tratamentos Exercícios, em geral, não devem ser implementados na fase aguda (duração de 4 a 6 semanas), bem como acupuntura e massagem. Calor superficial se mostrou benéfico para a redução de dor lombar aguda, com efeitos discretos, apenas a curto prazo. Tratamento na fase crônica A terapia na fase crônica consiste basicamente em exercícios, medicamentos conforme necessidade, terapia cognitivo-comportamental e/ou reabilitação multidisciplinar. Além disso, é importante educar o paciente, verificando e corrigindo crenças, pensamentos, emoções e atitudes inadequados em relação à dor. • Exercícios: programa individualizado, supervisionado por um terapeuta, incluindo alongamento e fortalecimento. • Terapias comportamentais • Medicamentos: analgésicos e AINEs devem ser utilizados em associação com programas de reabilitação física, visando à recuperação do tônus muscular e à melhora do condicionamento físico. A terapia com antidepressivos pode ser útil para o terço dos pacientes com dor lombar crônica que apresentam depressão concomitante. • Tratamento multidisciplinar: encaminhamento a um centro multidisciplinar de dor. • Acupuntura 7 Louyse Morais – Medicina – 108 8 Louyse Morais – Medicina – 108 9 Louyse Morais – Medicina – 108 Síndrome dispéptica A dispepsia é caracterizada pela presença recorrente ou persistente de dor ou desconforto epigástrico não relacionado ao uso de anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) e acompanhado, ou não, de sensação de saciedade precoce, násuseas, vômitos, pirose, regurgitação e excessiva eructação. A dispepsia pode ser classificada em dismotilidade, úlcera ou refluxo. No entanto, não há correlação da sintomatologia com o diagnóstico etiológico, sendo desnecessária a utilização desses critérios na prática clínica da APS. A dispepsia funcional é responsável por 60% dos casos das pessoas com sintomas dispépticos, sendo caracterizada por sintomas presentes por pelo menos 3 meses e ausência de alterações estruturais. Anamnese Na anamnese, deve-se buscar identificar os sinais de alerta e a presença de sintomas que sugiram diagnósticos diferenciais à síndrome dispéptica, como problemas cardíacos ou biliares. Quando a pessoa necessitar de uso continuado de AINE, um IBP deverá ser prescrito em conjunto apenas se houver antecedente de úlcera péptica. Exames complementares Os exames complementares relacionados à investigação da dispepsia e mais comumente usados são a endoscopia digestiva alta (EDA) e os testes para detecção de H. pylori. A EDA é usada para diagnosticar lesões estruturais e causas específicas da dispepsia apenas nas pessoas que apresentarem sinais de alerta, a fim de excluir doença orgânica grave. Sugere-se solicitar EDA para indivíduos maiores de 55 anos, quando os sintomas dispépticos persistem, independente de tratamento adequado inicial. Para aqueles que já realizaram o exame em algum momento e retornaram com os sintomas, deve- se introduzir terapêutica de acordo com o diagnóstico anterior. Só repete o exame se houver sinais de alerta. Para identificar infecção pelo H. pylori sem realização de EDA, as técnicas mais utilizadas são o teste respiratório com 13C ureia e exame sorológico. A sorologia detecta IgG específicos para H. pylori. É um exame mais sensível e de menor custo, mas permanecerá positivo mesmo após erradicar a bactéria. Conduta proposta Tratamento A estratégia inicial na dispepsia não investigada é o tratamento empírico com IBPs. Há evidência que a erradicação do H. Pylori aumenta a taxa de melhora dos sintomas e/ou diminui a sua recorrência nas principais causas de dispepsia. Como os exames para detecção da infecção pelo H. pylori ainda são pouco disponíveis, uma alternativa seria tratar empiricamente para a erradicação de H. pylori após falha terapêutica do IBP. O esquema mais usado é amoxicilina 1g e claritromicina 500 mg, por 7 dias, em duas tomadas diárias, associadas ao IBP em dose plena. 10 Louyse Morais – Medicina – 108 Atividades preventivas e educação Apesar de não ser clara a associação entre tabagismo, sobrepeso, dieta inadequada e ingestão de álcool e café com dispepsia, sugere-se recomendar modificações nos hábitos de vida. Aqueles que sofrem por tempo prolongado com sintomas dispépticos devem ser encorajados a reduzir o uso das medicações prescritas. 11 Louyse Morais – Medicina – 108 Abordagem da dor de ouvido O diagnóstico é feito na presença de efusão na orelha média, evidenciada por: • Abaulamento moderado a intenso da membrana timpânica (MT) ou início recente de otorreia não devida à otite externa aguda, ou • Abaulamento leve da MT ao mesmo tempo com dor de ouvido nas últimas 48 horas (puxar ou esfregar a orelha em crianças que ainda não falam) ou hiperemia intensa de MT A otite média aguda (OMA) é uma infecção da orelha média, com consequente presença de líquido (efusão) preenchendo a sua cavidade sob pressão, com início abrupto dos sinais e sintomas causados pela inflamação. Pode ser não complicada (sem otorreia), não severa (otalgia leve a temperatura < 39°C), severa (otalgia moderada a severa, ou febre > 39°C) e recorrente (três ou mais episódios isolados e documentados nos últimos 6 meses ou quatro ou mais episódios nos últimos 12 meses com ao menos um episódio nos últimos 6 meses). Associações: infecção das vias aéreas superiores (IVAS), corpo estranho, OMA, otite externa e rolha de cerume. Causas pouco frequentes: paralisia de Bell, abscesso peritonsilar, disfunção temporomandibular, coleasteatoma e alterações de dentes, faringe e laringe. Geralmente, a OMA segue uma IVAS aguda e, por isso, o líquido da orelha média, na maior parte das vezes, apresentará vírus associados a bactérias. As mais prevalentes são Haemophilus infruenzae, Moraxella catarrhalis e Streptococcus pneumoniae. Deve-se pensar em OMA sempre que houver dor de ouvido. Se houver, em crianças pequenas, início súbito de febre após 4 ou 5 dias de IVAS, irritabilidade, dificuldade em permanecer na posição horizontal, choro inconsolável ou alteração no sono, a otoscopia pode confirmar ou afastar o diagnóstico. • Fatores protetores: aleitamento materno exclusivo no primeiro semestre de vida, adoçante xilitol (encontrado em frutas e legumes, usado sistematicamente. • Fatores de risco: frequentar creche, usar chupeta ou mamadeira, história de aleitamento artificial. Diagnóstico Anamnese A dor de ouvido que segue um quadro de resfriado comum ou de gripe, com tosse e rinorreia tem associação com OMA, assim como menoridade gestacional ao nascer, frequentar creche, ter pais fumantes ou irmãos mais velhos. Adulto e criança que já se comunica referem dor ou desconforto na área auricular. Na criança menor, observar se está irritada, chorosa, deseja fica no colo (posição vertical), tem dificuldade em aceitar alimentação e está com o sono agitado. Como sintoma local, às vezes esfrega ou puxa o pavilhão auricular. A OMA sem dor, só chama atenção na otoscopia após ruptura da MT. • Temperatura < 39°C + otalgia leve = OMA leve • Temperatura > 39°C + otalgia moderada/intensa = OMA severa Exame físico Um exame sem resistência do examinado ou evidência de dor local durante a acomodação do otoscópio no conduto reduz a probabilidade de inflamação da orelha média. A compressão do trágus não tem acurácia estudada e não apresenta utilidade prática.A retirada do cerume para melhorar a visão da MT é recomendada em ambiente ambulatorial de especialidade, mas na APS só deve ser realizada se o médico for treinado para isso e houver otoscópio próprio para manipulação do conduto auditivo sob visão. Não há OMA sem efusão em orelha média. A intensidade do abaulamento da MT é o mais importante achado. 12 Louyse Morais – Medicina – 108 A acurácia dos sinais clínicos mostrou que os achados da MT que são altamente sugestivos de OMA são abaulamento e opacificação. A imobilidade da MT tem boa acurácia, mas apenas em presença de abaulamento. A hiperemia discreta da membrana tem baixa acurácia diagnóstico, pois pode surgir em qualquer febre ou choro da criança, ao passo que a coloração intensamente hiperemiada da membrana é sugestiva de OMA e, se apresentar coloração normal, é improvável que seja OMA. Exames complementares • Otoscopia: suficiente e definitiva. • Timpanometria: apenas com referenciamento, quando há dúvidas diagnósticas em OMA de repetição. • TC: pode ser útil apenas para avaliar complicações, como mastoidite Conduta proposta Para crianças com idade menor do que 6 meses e diagnóstico confirmado de OMA, está indicado o uso de antibioticoterapia. Para os demais, os sintomas melhoram em 24 horas em cerca de 60% das crianças e, em 3 dias, a condição se resolve em 80% delas. Medidas não farmacológicas Compressa morna e manutenção no colo são medidas úteis e também de reforço do vínculo e de compromisso da atenção. Medidas farmacológicas Manejo da dor: anestésico local em gotas pode reduzir o desconforto por alguns minutos, mas não de forma duradoura. Os fármacos de escolha para a maioria dos casos são paracetamol ou ibuprofeno por demanda, evitando o uso concomitante de anti-histamínicos e antitussígenos, para impedir interação medicamentosa. Paracetamol • 200 mg/ml – 1 gota = 10mg, ou 500 mg • 10 a 15 mg/kg/dose a cada 4 ou 6h – máximo de 75 mg/kg/dia • Adulto: 500 mg de até 6 em 6h – máximo de 4000mg/dia Ibuprofeno • 50 ou 100 mg/ml – 1 gota = 5 ou 10 mg, 200 mg ou 300 mg • 5 a 10 mg/kg/dose a cada 6 a 8h – máximo de 4 doses/dia • Adulto: 200 a 400 mg de 8 em 8h – máximo de 3200 mg/dia Uso de ATB 13 Louyse Morais – Medicina – 108 Duração do tratamento antibiótico • OMA severa ou < 2 anos de idade: 10 dias • OMA leve ou moderada, se 2 a 5 anos: 7 dias • OMA leve ou moderada, se > 6 anos: 5 a 7 dias Quando referenciar: Casos de persistência dos sintomas e sinais 48 a 72 horas após antibioticoterapia, se indicada, deverão ser referenciados para atendimento especializado, assim como aqueles em que a família perceba algum déficit auditivo após um episódio de OMA. Prognóstico e complicações possíveis A resolução espontânea ocorre em 3 a 4 dias em 97% das crianças que não encontraram critérios para uso de antibiótico, segundo o fluxograma abaixo. Em crianças com menos de 2 anos, os sintomas eventualmente persistem por até 7 dias. Complicações como meningite, mastoidites e redução da acuidade auditiva são raras, e o uso de antibióticos não altera o prognóstico. Atividades preventivas e de educação • Dar leite materno ao menos nos 6 primeiros meses de vida • Reduzir a probabilidade de IVAS pela alteração dos planos de cuidados • Limitar o uso de chupeta nos primeiros 6 meses de vida, para apenas na hora do sono • Evitar tabagismo passivo
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