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SUMÁRIO 1. Defesa da pele ............................................................ 3 2. Impetigo ......................................................................... 5 3. Síndrome da pele escaldada estafilocócica (SSSS) ...................................................14 4. Furunculose ................................................................18 5. Erisipela x celulite.....................................................23 6. Fasciíte necrotizante ...............................................29 Referências bibliográficas ........................................35 3DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE 1. DEFESA DA PELE Os mecanismos de defesa da pele são essenciais para o combate a inú- meros agentes infecciosos, tanto pela barreira física que impede ou dificulta a penetração bem como pela respos- ta imune eficaz após o contato com determinados agentes. Dentre os principais elementos de defesa des- tacam-se o turnover celular, o pH, secreção celular, resposta imune e a própria flora bacteriana residente. Va- mos estudar detalhadamente esses componentes. O turnover celular nada mais é do que a descamação superficial da pele, processo fisiológico de renovação ce- lular e eliminação de células mortas. Este evento favorece a “limpeza” ex- terna da pele por eliminar possíveis agentes patógenos presentes nessa região bem como dificultar sua pro- liferação. O pH da pele é ácido, em torno de 4,7 e 5,75, que também di- ficulta a proliferação e agressão bac- teriana por tornar o meio inóspito a determinados agentes agressores. A pele não é inerte, apesar de for- mar uma barreira física para entrada de elementos, permite as secreções de substâncias sebáceas, essas que contém elementos antibióticos prote- tores ao organismo, e também produz resposta imune pelas células de defe- sa presentes nas camadas celulares, por exemplo, as células de Langhe- rans, mastócitos e células dendríticas. Por fim, destaca-se a flora bacteriana natural da pele, estas que são colo- nizadoras e estão presentes desde o nascimento, servindo também como uma proteção natural ao organismo. Estas agem efetivamente contra as demais bactérias consideradas pato- gênicas. Contudo, fique atento, pois em condições de quebra da barreia física por lesão ou diminuição da res- posta imunológica, as mesmas po- dem iniciam processos patológicos graves. Como exemplo os Staphylo- coccus e Corynebacterium. HORA DA REVISÃO! Estrutura e função da pele As suspeitas diagnósticas de determina- das patologias podem ser fortalecidas, dentre outros fatores, pelas camadas da pele acometidas em cada afecção e ma- nifestações clínicas. Os agentes agres- sores têm mecanismos de penetração e desenvolvimento diferentes entre si, alguns se proliferando em camadas mais superficiais, enquanto outros pro- liferam e agridem mais profundamente a pele. Por isso, é essencial relembrar os componentes básicos da pele e suas funções. A pele é o maior órgão do corpo humano e é constituída por três principais cama- das, a epiderme, a derme e a hipoderme. Estas possuem ainda subdivisões. A epiderme, derivada da ectoderme, é constituída de quatro camadas, na se- quência de superficial para profunda: a camada córnea, camada granulosa, camada espinhosa e camada basal ou germinativa. As principais células da epiderme são os queratinócitos, pois correspondem a 80% da epiderme. A 4DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE camada basal é a região de proliferação e maturação dos queratinócitos, estes que migram para a camada espinhosa onde há abundância de desmossomos permitindo que as células estejam bem unidas entre si. Em seguida, destacam- -se os grânulos de queratina presentes na camada granular e, por fim, na ca- mada córnea existem células anucleadas, pois os núcleos são secretados, bem como a queratina extracelular. As demais células constituintes são os melanóci- tos (responsáveis pela coloração da pele), células de Langerhans (responsáveis pela resposta imune) e células de Merkel. A derme, derivada da mesoderme, é dividida em derme papilar e derme reticular, separadas entre si pelo plexo vascular superficial. Esta é a grande importância dessa camada, pois vasos, nervos e anexos cutâneos estão presentes nessa camada formada de uma rica matriz extracelular. As células são fibroblastos, mastócitos e células dendríticas. Derme papilar Derme reticular Figura 1. Representa as camadas da pele. Superficialmente, em roxo, está a epiderme e logo abaixo a derme. Corado com hematoxilina e eosina (HE). Fonte: SanarFlix. Figura 2. As camadas da epiderme, de superficial para profundo a camada córnea, granulosa, espinhosa e basal ou germinativa. Corado com hematoxilina e eosina (HE). Fonte: SanarFlix. Figura 3. Representa as camadas da pele. Superficialmente, em roxo, está a epiderme e logo abaixo a derme, subdividida em derme papilar e derme reticular. Corado com hemato- xilina e eosina (HE). Fonte: SanarFlix. Figura 4. Representa a derme em maior aumento e as fibras constituintes: elásticas, colágenas e núcleos de fibroblastos. Cora- do com hematoxilina e eosina (HE). Fonte: SanarFlix. 5DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE A hipoderme é constituída de adipóci- tos (célula gordurosa), formando o te- cido subcutâneo que protege contra traumas mecânicos e de alterações de temperatura. Figura 5. Representa a hipoderme. Corado com hematoxilina e eosina (HE). Percebe-se que as células de gordura, os adipócitos, não se coram, formando áreas arredondadas com interior branco. Fonte: SanarFlix. As funções da pele são de proteção e bar- reira, regulação da temperatura, respos- ta imunológica, excreção, estímulos sen- soriais e função endocrinometabólica. 2. IMPETIGO Conceito O Impetigo é uma doença bacteriana superficial de pele, altamente conta- giosa, causada por Staphylococcus aureus e Streptococcus pyogenes que acomete principalmente os re- cém-nascidos e crianças. Essas bac- terinas colonizam a pele e mucosa nasal, ou seja, há reservatórios natu- rais no corpo. Em situações de quebra da barreira física da pele por trauma como coceira, feridas, microfissuras e picadas de inseto, esses micror- ganismos podem causar manifes- tações características do impetigo. Comumente ocorrem reinfecções se esse reservatório não for identifica- do e devidamente tratado, bem como pode ocorrer infecções em pessoas próximas com contato direto com o paciente. Epidemiologia O impetigo é uma doença universal, mas tem maior incidência e impacto em áreas com condições socioeco- nômicas precárias, bem como menor acesso ao sistema de saúde, pois afe- tam diretamente na higiene pessoal. A principal faixa etária acometida é de bebês e crianças pré-escolares e escolares, entre dois e cinco anos de idade que, muitas vezes, tem infec- ções de repetição pelo contato com adultos assintomáticos, visto que nestes as bactérias podem colonizar a pele sem causar danos. As infecções de repetição, aglomerações e precá- rias condições de higiene predizem picos de impetigo em crianças com convívio próximo. Há predominância nos períodos quentes e úmidos como no verão, pela maior proliferação bac- teriana. Não há distinção entre sexos. O contato ocorre diretamente com a pele ou secreções de pessoas infec- tadas ou colonizadas pelas bacté- rias e também por objetos pessoais como roupas e sabonetes, por isso, é 6DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE essencial que existam medidas de hi- giene pessoal. Formas de apresentação O impetigo pode ser bolhoso, não bo- lhoso e comum, com manifestações clínicas dermatológicas e complica- ções variadas. Bolhoso A forma bolhosa do impetigo ocorre em menor incidência se comparada às demais. Frequentemente acomete recém- nascidos e lactentes. As bolhas ocorrem pela liberação de exotoxinas por parte das bactérias que agem contra as desmogleínas, estas que são proteínas de união dos queratinócitos. Imagine que a lesão das desmogleínas faz com que os queratinócitosse soltem, percam a união entre si e haja o surgimento de bolhas na pele. Essa doença é considerada a forma localizada da síndrome da pele escal- dada estafilocócica que será detalha- da adiante. Neste caso, o agente etio- lógico é o mesmo, o S. aureus, mas as bolhas se restringem a regiões locali- zadas do corpo como na face, mãos, tronco, pés, dentre outras. Enquanto isso, na forma disseminada há envol- vimento de grandes áreas corporais. Em fases iniciais da doença, as le- sões são semelhantes à queimadura por cigarro, como pontos específicos na pele, até que surgem as bolhas e crostas. O conteúdo dessas bolhas é formato por uma secreção sero-pustulosa ou serosa com formação de crostas ao redor das bolhas e vesículas. Figura 6. Impetigo bolhoso. Bolhas e vesículas com conteúdo claro em região de membros superiores, ná- degas e virilha. Há eritema e rubor em torno das bolhas. Fonte: https://alunosonline.uol.com.br/biologia/impeti- go-causas-sintomas-tratamento.html Não bolhoso O impetigo não bolhoso tem predo- minância em crianças pré-escolares, na faixa etária entre dois e cinco anos e é caracterizado pela formação de crostas melicéricas. Você deve estar pensando... de onde vem esse nome? Como muitas denominações em der- matologia, o nome deriva da aparência da lesão, melicérica, pois são lesões amareladas, carameladas, com a co- loração de mel. Em geral ocorrem na região próxima à boca e ao nariz, mas podem acometer região de pernas e 7DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE nádegas. Atente-se, pois a não iden- tificação e tratamento correto podem gerar complicações como o avanço das lesões para a derme, evento cha- mado de ectima com ulceração e for- mação de crostas hemorrágicas. Figura 7. Impetigo não bolhoso. Formação de crostas melicéricas em região nasal e perilabial. Fonte: https://drauziovarella.uol.com.br/ doencas-e-sintomas/impetigo/ Figura 8. Impetigo não bolhoso. Formação de crostas melicéricas extensas em região nasal e perilabial. Fonte: http://pediatriaemfoco.blogspot. com/2012/01/diagnostico-visual-qual-o-prova- vel_08.html Comum O impetigo comum ocorre como pro- pagação de uma infecção secundá- ria nas regiões lesadas por outros agentes, tanto por lesões de barreiras quanto por situações de imunossu- pressão. Lembrem-se de que indi- víduos imunossupressos, tanto por doenças congênitas, adquiridas ou por uso de medicamentos como imu- nossupressores, têm maior chance de desenvolver infecções secundá- rias e complicações. Logo, áreas le- sadas, por exemplo, por coceira, po- dem surgir como fonte importante de infecção por germes oportunistas. A imagem abaixo representa a lesão característica de escabiose com pro- pagação de impetigo (lesões em bo- lhas e crostas). 8DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE FAIXA ETÁRIA LESÃO CARACTERÍSTICA AGENTE ETIOLÓGICO PRINCIPAIS LOCAIS DE ACOMETIMENTO Bolhoso Recém-nascidos e lactentes Bolhas S. aureus e S. pyogenes Face e genitais/ nádegas Não bolhoso Pré-escolares (2 a 5 anos) Crostas melicéricas S. aureus e S. pyogenes Face (nariz e boca) Comum Ambas as faixas supracitadas Bolhas, crostas melicéricas e lesões específicas dos agentes oportunistas ou demais infec- ções em associação (placas, eczemas, etc) S. aureus e S. pyogenes + outros agentes bacteria- nos ou fúngicos Qualquer local do corpo Tabela 1. Características clínicas e epidemiológicas dos tipos de impetigo bolhoso, crostoso e comum. Lesão característica de escabiose Lesão característica do impetigo Figura 9. IImpetigo comum. São visualizadas áreas com lesões características de escabiose e lesões do impetigo com formação de vesículas e crostas. Fonte: SanarFlix Complicações As complicações podem surgir prin- cipalmente em casos de infecções recorrentes e não tratadas previa- mente, mas não excluem outras situ- ações. Dentre elas destacamos a glo- merulonefrite pós estreptocócica que é uma lesão renal após infecção pelo S. pyogenes, cerca de 20 dias após a infecção de pele. Um dos princi- pais aspectos dessa complicação é a não resposta a antibióticos, visto que ocorre lesão glomerular pelos imuno- complexos circulantes e não por ação direta da bactéria. A reinfecção pode ser considerada uma complicação em casos de higie- ne precária, pois evidenciam a maior chance de infecções associadas por outros germes, estas que podem evoluir para complicações pulmona- res, cardíacas, neurológicas, dentre 9DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE outras. Assim, torna-se ainda mais evidente a importância da identifica- ção precoce, tratamento direcionado, bem como as medidas de prevenção das reinfecções com o controle dos contatos dos infectados, sejam cui- dadores ou outras crianças. SE LIGA! Glomerulonefrite pós-estreptocócica A glomerulonefrite pós-estreptocóci- ca ocorre após infecção do streptococo beta hemolítico do grupo A, o S. pyo- genes. Ele não gera agressão direta ao rim, mas sim, suas cepas nefrogênicas. Constitui a forma de doença glomeru- lar mais comum em crianças na faixa etária escolar pela maior incidência de doenças infecciosas bacterianas, por exemplo, faringites (cepas tipo 12) e o impetigo (cepas tipo 49). Então, du- rante a infecção aguda é comum ter o acometimento renal? A resposta é não! Estamos falando de cepas nefrogênicas, estas que ocorrem certo tempo após a infecção inicial, que em muitos casos já teve melhora, seja ela por uma doença autolimitada ou pelo tratamento antibi- ótico bem estabelecido. Então, vamos lá. Você está diante de uma criança, 5 anos de idade, previamente hígida, frequenta creche e convive com a mãe e mais três irmãos. A mãe refere que a criança está febril há dois dias, sem ter aferido, uri- nando sangue e com um pouco de es- puma, sendo que houve diminuição da quantidade e frequência da urina diária também há dois dias. Queixa-se de in- disposição. Paciente em bom estado geral, lúcida, fáscies atípica, leve edema de membros inferiores, pressão arterial de 150x90 mmHg, sem nenhuma outra alteração visível ou relatada. Mãe afir- ma histórico de bolhas pelo corpo há 30 dias que foram tratas com antibióticos orais receitados ambulatorialmente. Não sabe referir se fez uso até o final do tem- po indicado. Qual a sua conduta? Antibioticoterapia empírica para infec- ção urinária baixa e dar alta à paciente. Inicia soro de reidratação oral, antibioti- coterapia de amplo espectro, solicita he- mograma e sumário de urina. Solicita sumário de urina, PCR, Cr, Ur, hemograma, complemento sérico, inicia medidas de suporte clínico com antipi- réticos, se febre, repouso e observa a paciente. Solicita sumário de urina, PCR, Cr, Ur, hemograma, inicia medidas de suporte, antibioticoterapia empírica e corticoide oral. Vejamos, se sua principal suspeita foi uma infecção de trato urinário inferior alguns outros dados deveriam estar inclusos como ardência e disúria, mas não apenas isso, você concorda que o sumário de urina e urocultura é essen- cial para avaliar a infecção, caso esta seja sua suspeita? Se sim, descarte a primeira opção, pois está incompleta. Você até poderia colocá-la como diag- nóstico diferencial, mas a sequência da investigação não pode ser negligencia- da. Seguindo, a segunda opção não nos parece confiável, visto que a criança não apresenta sinais de desidratação. Você deve sim observar e ofertar tratamento sintomático, contudo, a reidratação não é indicada nesse caso, pois pode piorar o edema encontrado no exame físico. Além disso, não há indicação de antibio- ticoterapia neste momento, tão pouco em larga escala, sem nenhuma referên- cia a internações prévias, mas, principal- mente, porque em nossa primeira sus- peita veremos que a antibioticoterapia não é indicada. A terceira alternativa segue uma sequência lógica e coerente, com suporte clínico e sintomático, solici- tação de exames que auxiliam na con- firmação diagnóstica. Após essa etapa, 10DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE novos exames devemser solicitados e veremos a adiante. Por fim, a última op- ção, além de indicar antibioticoterapia sem evidencia de infecção ativa, solici- ta associação com corticoides, incorreto por nossa suspeita diagnóstica. Sim, e qual mesmo a nossa suspeita? Glomerulonefrite pós-estreptocócica! Os sinais e sintomas clássicos dessa doença são hematúria, edema, hiper- tensão arterial e leve proteinúria, es- tes que são manifestações da síndrome nefrítica, além de eventualmente possuir manifestações como prostração, fraque- za ou indisposição. Essas manifestações ocorrem entre 10 a 20 dias após a infec- ção bacteriana por faringite ou impetigo, na maioria dos casos. O diagnóstico é clínico e laboratorial. Após identificação dos sintomas e relato da infecção pré- via a suspeita já deve ser evidente, em associação com sumário de urina, PCR, ureia, creatinina e complemento sérico. Espera-se encontrar alteração da função renal com elevação de ureia, por exem- plo, hipocomplementenemia e os acha- dos supracitados no exame de urina. O tratamento é iniciado com medidas die- téticas como restrição hídrica e de sódio para minimizar o edema e evitar com- plicações renais, bem como restrição de potássio e proteínas. A depender dos níveis tensionais e edema, podem ser indicados diuréticos como furosemida, na dose de 4mg/kg, até a redução do edema. Não falamos nesse box sobre a biópsia renal, mas veja bem, ela pode ser indi- cada se suspeita de variação anatomo- patológica grave, não melhora com tra- tamento sintomático ou complicação do paciente. Caso contrário, não há neces- sidade para confirmação diagnóstica. É uma doença de caráter autolimitado e benigno, portanto, trate os sintomas e avalie se há necessidade de maiores intervenções. SE LIGA! Febre reumática A febre reumática é uma doença que ocorre após faringite estreptocócica não tratada ou inadequadamente tra- tada por infecção pelo Estreptococo beta-hemolítico do grupo A. Então, preste atenção: não ocorre por complicação do impetigo! Isso pode ser pegadinha de prova, pois os mes- mos microrganismos podem causar am- bas as doenças. É uma doença de caráter autoimune, inflamatória, que cursa com manifes- tações em torno de sete a quinze dias após o episódio infeccioso. Como sinto- mas, podem ocorrer dor articular, cardi- te, coreia (movimentos descoordenados dos membros), manchas na pele, nódu- los subcutâneos, febre, prostração, ina- petência, dentre outros. O diagnóstico ocorre pela história clínica e exames laboratoriais como hemogra- ma, hemocultura, cultura da orofaringe e pesquisa de anticorpos. Além disso, na suspeita de acometimento de outros órgãos, deve ocorrer solicitação de ele- trocardiograma, ecocardiograma e ra- diografia de tórax. O tratamento eficaz ocorre com preven- ção secundária pela administração de antibiótico, A Penicilina Benzatina. Uso para crianças: 600.000 UI IM, 21 em 21 dias, se peso <25 kg. Essa indi- cação ocorre até a concentração de 0,03 unidades/ml de penicilina sérica. Tratamento O tratamento é iniciado com as me- didas gerais de cuidado, e quais são eles? Cuidados locais com limpeza da pele na região infectada, para re- tirada das crostas que podem estar 11DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE aglomeradas e endurecidas. Neste caso, a limpeza é realizada com água e sabão e muito cuidado para não ter o contato com as lesões e secreções. Posteriormente é iniciado o tratamen- to específico com antibioticoterapia que pode ocorrer de forma tópica ou sistêmica. • Antibióticos tópicos: em casos de lesões localizadas são indicados a mupirocina e ácido fusídico. O tra- tamento é realizado com aplica- ção dos agentes tópicos de três a quatro vezes ao dia, com duração de cinco a sete dias. Atentar para a lavagem adequada com água e sabão durante todos os banhos do dia e aplicação logo após para garantir o tempo de ação do medi- camento. Toalhas de rosto e banho não devem ser compartilhadas! • Antibióticos sistêmicos: em ca- sos de doenças difusas, com maiores extensões, são indicados a cefalosporina de primeira gera- ção, Cefalexina, sendo esta a pri- meira escolha ou Amoxacilina com Clavulanato. A Cefalexina pode ser indicada na dose de 25 a 50mg/kg/ dia, de seis em seis horas, via oral, por sete dias, para crianças. Os adultos tem indicação de 250mg/ kg/dia, de seis em seis horas, por sete dias. A amoxacilina com cla- vulanato é na dose de 45mg/kg/ dia, de 12/12 horas, via oral, de sete a 10 dias. 12DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE FLUXOGRAMA – TRATAMENTO IMPETIGO MEDIDAS GERAIS ESPECÍFICO Lavar com água e sabão Soro fisiológico TÓPICO TÓPICO Doses indicadas para crianças, a duração pode variar até dez dias Mupirocina Ácido fusídico Cefalexina Amoxacilina + Clavulanato Retirar crostas Aplicar após banho, três vezes ao dia, por 5 a 7 dias. 50mg/kg/dia, 06/06 horas, via oral, por sete dias Adulto aumenta a dose para: 250mg/ kg/dia 45mg/kg/dia, de 12/12 horas, via oral, por sete dias 13DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE MAPA MENTAL – IMPETIGO Manifestações Tratamento Transmissão Epidemiologia Agentes etiológicos Definição Bolhoso Mupirocina Cefalexina Lavar com água e sabão Ácido fusídico Amoxacilina + Clavulanato Soro fisiológico Não bolhoso Comum Bolhas Tópico Contato direto Recém nascidos e crianças S. Aureus S. pyogenes Doença bacteriana, altamente infecciosa, comum na faixa etária infantil Condições precárias de higiene Condições de aglomeração infantil Sistêmico Medidas gerais Cristas melicéricas Outras lesões associadas 14DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE 3. SÍNDROME DA PELE ESCALDADA ESTAFILOCÓCICA (SSSS) Conceito A SSSS é descamação da pele de forma intensa e difusa após infec- ção pelo S. aureus, que ocorre pela liberação de citocinas contra as des- modeínas, semelhante ao que ocorre no impetigo. Mas fique atento: o foco de infecção neste caso está distante dos locais de descamação, sendo as- sim, bolhas e locais de descamação não são infecciosos. Epidemiologia É uma doença rara afetando cerca de 0,09 a 0,56 por milhão de habitantes no mundo, com predominância em recém-nascidos. Quando a doença ocorre em adultos é possível que haja algum comprometimento imunoló- gico. Não há predominância entre sexos. Manifestações clínicas Existe, inicialmente, a fase de pródro- mo da doença, com duração de até 48 horas, por otites, faringites e con- juntivites. Nestes casos, o paciente pode apresentar febre, mal estar e prostração. Na fase clínica, o paciente pode apre- sentar febre alta e rash eritematoso inicialmente em fase e seguimen- to para todo o corpo, além do surgi- mento de bolhas e descamação pelo corpo, principalmente em regiões de dobras como virilha, nádegas, região posterior do joelho e antebraço. Fa- lando especificamente da descama- ção, há o sinal de Nikolsky, pois a pele pode até aparentar normal à visuali- zação, mas com o toque do examina- dor e tração na pele há descamação. Figura 10. Imagem representa criança com síndrome da pele escaldada. Perceba a descamação da pele em regiões de dobras, principalmente em virilhas e mem- bros superiores. Fonte: https://www.msdmanuals. com/pt-pt/casa/dist%C3%BArbios-da-pele/infec%- C3%A7%C3%B5es-bacterianas-da-pele/s%C3%AD- ndrome-da-pele-escaldada-por-estafilococos 15DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE SE LIGA! DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL NECRÓLISE EPIDÉRMICA TÓXICA A necrólise epidérmica tóxica ou Sín- drome de Lyell é uma farmacodermia, ou seja, uma reação cutânea adversa, extremamente grave com acometimen- to extenso da pele. Essa manifestação ocorre como reação a vários medica- mentos como lamotrigina, carbamazepi- na, alopurinol, sulfonamida e nevirapina. É possível que outras causas estejam associadas como infecção pelo Myco- plasma pneumoniae e citomegaloví- rus, mas em menor escala. Indivíduos imunocomprometidos, seja por uso de medicamentos como corticoterapia, por doenças como HIV ou tratamentos quimioterápicos,têm maior chance de desenvolvimento da doença bem como gravidade na evolução e surgimento de complicações. As manifestações podem iniciar com sintomas gripais, prostração, fraqueza e evoluir para surgimento de bolhas dolorosas na pele e mucosas. O diagnóstico é clínico pelo dermatolo- gista que avalia a descamação da pele em mais de 30% do corpo, bem como áreas de bolhas e eritemas. Há separa- ção evidente da derme papilar das ca- madas basais. É possível indicação de biópsia se dúvida diagnóstica. O trata- mento inicial é baseado na suspensão do agente causador se medicamentoso de forma imediata e encaminhamento do paciente para unidade de terapia in- tensiva. O paciente é tratado como um queimado grave, com cuidados especí- ficos com a pele e cuidados gerais como hidratação e medidas de suporte nutri- cional. Os sintomáticos devem ser admi- nistrados em caso de dor, com atenção para evitar novas reações adversas por interação medicamentosa. Em casos es- pecíficos, pode fazer uso de ciclospori- na, plasma ou imunoglobulina, mas não há padrão de indicação. Diagnóstico Clínico O diagnóstico clínico ocorre pela vi- sualização das bolhas e padrão de acometimento. Por exemplo, bolhas e descamação em regiões de dobras. Microbiológico Vamos relembrar, mencionamos acima que o foco de infecção é distante ao local das manifestações dermatoló- gicas, logo, as bolhas serão estéreis. Pode ser realizada cultura em caso de dúvida diagnóstica e não cresceriam bactérias na cultura. Por isso, deve ser realizada cultura de outras regiões, como nas fezes! Neste caso, poderá existir o foco infeccioso. Biópsia A biópsia de pele evidencia a sepa- ração das camadas, bem como perda de ligação das desmogleínas. Há vi- sualização de bolhas. Figura 11. Imagem histológica obtida após biópsia de pele, corada em HE, evidenciando a formação de bolhas intraepidérmicas. Fonte: SanarFlix. 16DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE Imunoflorescência A imunofluorescência é indicada para auxiliar no diagnóstico diferencial, por exemplo, com os pênfigos, que são doenças autoimunes. Tratamento Esta é uma doença com grandes ex- tensões e grave, principalmente pelo acometimento de recém-nascidos. Logo, deve haver internamento ime- diato e suporte clínico com analgesia e controle hidroeletrolítico. Além disso, curativos e limpeza das áreas descamadas para evitar infecções secundárias. O tratamento específico deve ser ini- ciado com antibioticoterapia paren- teral, sendo utilizada a Oxacilina que é a primeira escolha. Essa associa- ção tem efeito importante tanto para erradicação bacteriana quanto para evitar a ação das toxinas que tem o efeito indesejado na pele. Posterior- mente, após alta do paciente, é indi- cado uso de Cefalexina, via oral, por sete a quatorze dias. Fique atento: corticoides são con- traindicados, pois podem prejudicar o sistema imune e favorecer a disse- minação da infecção pelo corpo. Indicação: Oxacilina, 100 a 200mg/ kg/dia, endovenoso, a cada quatro ou seis horas, por sete a dez dias. Seguimento: Cefalexina, 50mg/kg/ dia, 06 em 06 horas, por sete dias. FLUXOGRAMA – TRATAMENTO SÍN- DROME DA PELE ESCALDADA TRATAMENTO INTERNAMENTO MEDIDAS GERAIS ANTIBIOTICOTERAPIA Analgesia Limpeza da pele Oxacilina, 100 a 200mg/ kg/dia, endovenosa, a cada 04 ou 06 horas, por sete dias Hidratação Curativo Controle Manutenção com Cefalexina, 50mg/kg/dia, via oral, 06/06 horas, por sete dias 17DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE MAPA MENTAL – SÍNDROME DA PELE ESCALDADA ESTAFILOCÓCICA Diagnóstico Tratamento Aspectos gerais Clínica Clínico Suporte hidroeletrolítico Exotoxinas contra desmogleínas Foco infeccioso à distância Recém-nascidos e crianças Pródromo Característico Bolhas estéreis Analgesia Anatomopatológico + imunofluorescência ATB tópico: mupirocina Oxacilina Corticoide CONTRAINDICADO! Faringite Regiões de dobras Nikolsky positivo Mucosas poupadas Bolhas estéreis Conjuntivite Otite 18DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE 4. FURUNCULOSE Conceito A furunculose é o nome dado à in- fecção bacteriana dos folículos pilo-sebáceos, ou seja, tanto do fo- lículo piloso quanto das glândulas se- báceas, que ocasiona a formação de furúnculos que se estendem além da região dos folículos, acometendo a região do tecido subcutâneo. Figura 12. Nódulo eritematoso com conteú- do purulento. Fonte: https://www.tuasaude. com/3-dicas-para-curar-um-furunculo/ Epidemiologia / Etiologia O agente infeccioso é o S. aureus, que pode colonizar a pele sem causar danos por longos períodos, mas por motivos diversos como, por exemplo, quebra da barreira física ou deficiên- cia do sistema imune penetram a pele e geram a agressão patológica. Em 25% dos casos gera furunculose re- corrente tanto nos pacientes coloni- zados quanto naqueles contactantes. É uma doença universal, sem predile- ção entre os sexos, bastante comum em áreas de higiene inadequadas, em baixas condições socioeconômi- cas ou aglomerações. Existem alguns fatores de risco as- sociados como histórico familiar e contato próximo com pessoas infec- tadas; obesidade pela formação de dobras na pele que facilitam a proli- feração bacteriana e dificultam a lim- peza local, além de alterações infla- matórias proeminentes pelo tecido gorduroso; diabetes mellitus e ou- tras situações de imunodepressão, pois são condições que impedem ou dificultam a ação eficaz do sistema imune contra o agente causador, bem como dificultam a resposta de deseja do organismo e a higiene precária já mencionada. O histórico de furunculose já cons- titui um fator de risco para novos epi- sódios pela colonização bacteriana, por isso, é essencial o tratamento adequado e a erradicação dos focos infecciosos. Aspectos clínicos O furúnculo é um nódulo eritema- toso, com rubor, calor e dor, além de possuir uma área flutuante para drenagem do conteúdo pustulento. A ocorrência de várias lesões se- melhantes determina o quadro de furunculose. A infecção pode ocorre tanto em fo- lículos diversos pelo corpo quanto de 19DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE forma localizada, com vários nódulos acometidos simultaneamente, es- tes, chamados de antraz. O período de incubação é variável e indefinido, podendo variar entre 4 a 10 dias na maioria dos casos. SE LIGA! ANTRAZ O antraz ocorre pelo acometimento de vários folículos adjacentes, formando um grande nódulo, mais profundo, com múltiplos orifícios, ou seja, locais de dre- nagem, podendo acometer regiões de dorso, nuca e coxas, preferencialmente. Esses nódulos precisam de uma aten- ção particular pela possibilidade de limi- tação de movimento, por exemplo, em região de nuca e coxas, pelo atrito da pele e dor local intensa. O antraz é mais comumente encontrado em pacientes idosos e imunossuprimidos pela maior possibilidade de disseminação da doen- ça e extensão local acometendo regiões profundas da pele. Figura 13. Nódulo eritematoso extenso, profundo, com vários pontos de drenagem, denominado antraz. Fonte: https://www. msdmanuals.com/pt/profissional/dist%- C3%BArbios-dermatol%C3%B3gicos/infe- c%C3%A7%C3%B5es-bacterianas-da-pele/ fur%C3%BAnculos-e-antraz Tratamento • Medidas gerais: o tratamento ini- cial deve conter medidas de hi- giene e cuidados locais como limpeza com uso de antissépti- cos como a solução de clorexidina e calor local para estimular a dre- nagem pelos pontos flutuantes. A indicação de drenagem ocorre apenas se os pontos flutuantes já estiverem evidentes, de forma es- téril, com um pequeno rasgo na re- gião central facilitando a liberação das secreções. Em caso de não formação dos pontos de flutua- ção a drenagem não está indicada pelo profissional, exceto se ocorrer espontaneamente. • Infecção localizada: nestes ca- sos, o tratamento é indicado com antibióticos tópicos como mupi- rocina ou ácido fusídico, 3 a 4 ve- zes ao dia, sempre após o banho. A indicação é: tomar o banho com sabonetes individuais, secarbem todo o corpo, inclusive a região do furúnculo e, posteriormente, depo- sitar uma quantidade suficiente da loção tópica para cobrir a lesão e evitar contato com a mesma. • Fique atento! Além dos locais de lesão deve ser indicado uso dos agentes tópicos em região de vi- rilhas, região nasal, ponta dos de- dos, perianal e umbigo, pois são áreas possíveis de reservatório de bactérias. 20DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE • Infecções sistêmicas: Cafalexina, 250mg/kg/dia, 06/06 horas, via oral, por sete a dez dias ou Eritro- micina, 30 a 40mg/kg/dia, 06/06 horas, via oral, por sete a dez dias. Diagnóstico Lembre-se: seja sempre um exce- lente clínico! Boa parte das infecções dermatológicas podem ser diagnos- ticadas pelos aspectos visíveis das lesões, extensão e acometimento profundo ou não da pele. O diagnós- tico da furunculose não é diferente, é clínico! Pode haver cultura das le- sões em caso de dúvida diagnósti- ca, mas são exames desnecessários rotineiramente. Complicações Infecções recorrentes ou extensas podem destruir os anexos da pele e deixar lesões cicatriciais, com pre- juízo estético e funcional. Esse risco se eleva com o ato de drenar manu- almente os furúnculos sem o auxílio profissional. Diagnósticos diferenciais Hidradenite: infecção crônica supu- rativa com períodos de remissão das lesões, seguidos de exacerbações. Ocorrem principalmente na região in- guinal e axilar. Figura 14. Nódulos inflamatórios subcutâneos erite- matosos em região de axilas característicos da hidrade- nite. Fonte: https://www.mdsaude.com/dermatologia/ hidradenite/ Miíase: nódulo cutâneo após penetra- ção de larvas de insetos na pele com região central orificial que é o local de entrada e saída da larva. Neste caso, a reação inflamatória é menos inten- sa. Como exemplo, há penetração por larva da mosca varejeira. Figura 15. Miíase furuncular formando nódulo com orifício central para saída de larvas. Fonte: https://para- mais.com.br/calcanhar-de-maracuja-confira-o-que-es- ta-doenca-faz-a-sua-pele/. 21DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE FLUXOGRAMA – TRATAMENTO FURUNCULOSE TRATAMENTO MEDIDAS GERAIS LOCALIZADA EXTENSA Drenagem Antissepsia Mupirocina ou ácido fusídico Cefalexina, 250mg/kg/dia, 06/06 horas, via oral, por sete a dez dias. Eritromicina, 30 a 40mg/kg/dia, 06/06 horas, via oral, por sete a dez dias. OU Se pontos flutuantes Clorexidina 3 ou 4 aplicações ao dia em todas as lesões, após o banho, por cinco a sete dias Aplicação em nariz, virilhas, periauricular, umbigo, mãos e pés 22DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE MAPA MENTAL – FURUCULOSE CONCEITO EPIDEMIO DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL CLÍNICA TRATAMENTO ATENÇÃO! S. aureus Miíase Calor Medidas gerais Tratar com ATB tópicos os contactantes Localizado Contato familiar Nódulo eritematoso Obesidade Área flutuante Colonização Hidradenite Rubor Universal Dor Diabetes mellitus Vários folículos simultâneos Sistêmico Infecção bacteriana dos folículos pilossebáceos Cefalexina Antisséptico clorexidina Mupirocina ou ácido fusídico Antraz Drenagem 23DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE 5. ERISIPELA X CELULITE Conceito A erisipela consiste na infecção bacteriana de pele com acometi- mento das camadas superficiais, logo, é uma infecção que chega até a derme. Enquanto isso, a celulite é uma infecção bacteriana profunda da pele, com acometimento do tecido subcutâneo, até a hipoderme. Erisipela Celulite Figuras 16 e 17. Representam, respectivamente, a erisipela com acometimento superficial da pele, chegando até a derme e a celulite, com acometimento profundo atingindo a hipoderme. Fonte: Aula SanarFlix. Agentes infecciosos O agente etiológico da erisipela é o S. pyogenes, já o agente causador da celulite é o S. aureus. Acometimento Ambas as doenças tem predominân- cia de acometimento em região de membros inferiores, 85% dos casos e na face (10%) e ocorre por solução de continuidade. Vamos aprofundar com um caso clínico e discussão? Paciente masculino, 23 anos, lavra- dor, católico, casado, natural e pro- cedente de Amargosa (BA). Queixa principal: dor e inchaço em tornozelo há cinco dias. HMA: paciente, previa- mente hígido, refere que há cerca de cinco dias percebe inchaço na perna direita, com calor, dor e vermelhidão local, sentiu o corpo quente, mas não aferiu a febre. Conta que há oito dias sentiu algo perfurante entrando em seu pé direito durante o traba- lho, retirou o mesmo, mas não soube especificar o conteúdo do material, apenas que era pequeno e pontia- gudo. Nega outras queixas. Afirma 24DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE diabetes mellitus tipo I. Mãe com diabetes mellitus tipo I, nega outras doenças familiares. Calendário vaci- nal atualizado. Afirma uso contínuo e correto de insulina. Ao exame, você percebe um paciente em bom esta- do geral e nutricional, fáscies atípica. Aparelho respiratório, cardiovascu- lar, neurológico sem alterações. Pele enrugada, queimada de sol, com várias manchas hipercrômicas, em membro inferior direito há grande lesão eritematosa que se estende do tornozelo à panturrilha, bem delimi- tada, dolorida, sem secreções, apa- rentemente superficial. Você já tem uma suspeita, não é mesmo? Isso! Erisipela. A lesão superficial, eritematosa, uni- lateral, bem delimitada, em paciente diabético, com histórico de perfu- ração em pé por um objeto desco- nhecido é bastante sugestiva de infecção por continuidade, principal- mente por S. pyogenes. Lógico que você pode ter outras suspeitas como, por exemplo, trombose venosa, mas bem menos provável pelo histórico clínico do paciente ou alguma com- plicação venosa do diabetes e pode sim investigá-las detalhadamente. Mas e agora? Você tem uma suspei- ta diagnóstica principal, vamos tra- tar, não é mesmo? Veremos a seguir detalhadamente as opções de trata- mento e seguimento desse paciente. Epidemiologia A erisipela e celulite tem epidemio- logia semelhante, pois, em geral, es- tão relacionadas a fatores de risco como obesidade, diabetes mellitus, doença venosa periférica, dentre ou- tras condições que favoreçam a proli- feração bacteriana por deficiência do sistema imune e, sobretudo, por for- mar portas de entrada ao organismo. As portas de entrada são lesões em pele como úlceras por problemas ve- nosos ou pela própria dificuldade de cicatrização evidente em pacientes diabéticos. As lesões favorecem a penetração bacteriana e proliferação gerando erisipela ou celulite. Não há predileção entre sexos ou idade. Indivíduos imunocomprometidos tem maior susceptibilidade a infecções, bem como complicações e disse- minação da doença após instalação inicial. Aspectos clínicos • Pródromos sistêmicos: febre, mal-estar, prostração. • Evolução: eritema, calor, dor e edema unilaterais. A grande dife- rença para diagnóstico clínico está na profundidade das lesões e uma forma simples de avaliá-las é per- cebendo se há bordas bem deli- mitadas que é o caso da erisipela ou mal delimitadas, como ocorre na celulite. O fato da infecção da 25DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE celulite chegar até a hipoderme di- ficulta a boa delimitação superficial. ERISIPELA CELULITE Camadas da pele Superficial (derme) Profunda (hipoderme) Agente etiológico S. pyogenes S. aureus Fatores de risco Obesidade, imunodeficiência, diabe- tes mellitus Obesidade, imunodeficiência, diabe- tes mellitus Locais de acometimento Membros inferiores e face Membros inferiores e face Características clínicas Eritema, dor, calor, edema, bordas bem delimitadas Eritema, dor, calor, edema, bordas mal delimitadas Tabela 2. Celulite x erisipela Tratamento O tratamento é sempre realizado com antibioticoterapia sistêmica asso- ciada a sintomáticos, podendo ser realizada em casa em condições fa- voráveis. Segue abaixo as opções de escolha antibiótica para erisipela, ce- lulite por S. aureus resistente à meti- cilina e sensível à meticilina. Erisipela: deve ser utilizada uma das opções abaixo. Sefebre, calafrios e Figuras 18 e 19. A imagem 18 não tem delimitação específica das bordas pelo padrão profundo de acometimento da celulite, enquanto isso, a imagem 19 apresenta boa delimitação das bordas, característico da erisipela. Fonte: https:// www.mdsaude.com/dermatologia/erisipela-celulite/ manifestações sistêmicas graves a opção é uso de cefalosporinas: Amoxacilina 500 mg, via oral, de 8 /8 horas, 5 a 10 dias; Eritromicina 500 mg, via oral, de 6 /6 horas, 5 a 10 dias (para pacientes alérgicos à penicilina); Ceftriaxone 1g, endovenosa, a cada 24 horas ou Cefazolina 1-2g, endo- venosa, a cada 8 horas, também de 5 a 10 dias. 26DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE Para a celulite purulenta por S. au- reus resistentes à meticilina, se- guem as opções abaixo, deve ser uti- lizada uma opção antibiótica: Clindamicina 300-450 mg, Via oral, de 8/8 horas, 5 a 10 dias; Doxiciclina 100 mg, via oral, de 12/12 horas, 5 a 10 dias; Sulfametoxazol-trimetoprim 800/160 mg, via oral, de 12/12 horas, 5 a 10 dias. Celulite não purulenta com S. au- reus sensíveis à meticilina, deve ser utilizada uma das opções: Dicloxacilina 500 mg, via oral, de 6/6 horas, 5 a 10 dias; Cefalexina 500 mg, via oral, de 6/6 horas, 5 a 10 dias; Clindamicina 300-450 mg, via oral, a cada 8-8 horas, 5 a 10 dias; Internação Há necessidade de internação em casos de: imunossuprimidos, lesões em face e falência do tratamento oral. Além disso, fique atento, pois em 25% dos casos há recidiva da doença e se essas recidivas ocorrerem mais de três vezes ao ano a orientação é utilizar antibiótico profilático. Exemplo: Penicilina G Benzatina, in- tramuscular, a cada três semanas. Em caso de febre e dor pode ser indi- cado analgésico simples como Dipi- rona, 500mg a 1g, via oral, de seis em seis horas, até melhora dos sintomas. 27DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE TRATAMENTO ERISIPELA E CELULITE ERISIPELA OBS 1: ESCOLHA UMA OPÇÃO TERAPÊUTICA! OBS 2: O TRATAMENTO OCORRE DE 5 A 10 DIAS! TRATAMENTO CELULITE Amoxacilina 500 mg, via oral, de 8 /8 horas Se dor ou febre: Dipirona 500mg, via oral Recidiva S. aureus resistentes a meticilina S. aureus sensíveis a meticilina Eritromicina 500 mg, via oral, de 6 /6 horas, se alergia a penicilina Ceftriaxone 1g, endovenosa, a cada 24 horas, se manifestações sistêmicas Sulfametoxazol-trimetoprim, 800/160 mg, via oral, de 12/12 horas Penicilina G Benzatina, IM, a cada três semanas Clindamicina 300-450 mg, via oral, de 8/8 horas Cefalexina 500 mg, via oral, de 6/6 horas 28DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE MAPA MENTAL – ERISIPELA X CELULITE EPIDEMIO CLÍNICA DIAGNÓSTICO CLÍNICO TRATAMENTO RISCO FACE (10%) Sulfametoxazol-trimetoprim OU Cefalexina OU Clindamicina PRÓDROMO FACE (10%) BORDAS MAL DEFINIDAS CELULITE CELULITE FACE (10%) INFECÇÃO DE PARTES MOLES OBESIDADE – DIABETES MELLITUS - IMUNODEFICIÊNCIA MEMBROS INFERIORES (85%) Ceftriaxone OU Amoxacilina FEBRE DOR ERITEMA PROFUNDA BORDAS BEM DEFINIDAS CALOR S. AUREUS SUPERFICIAL S. PYOGENES 29DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE 6. FASCIÍTE NECROTIZANTE Conceito É a necrose rapidamente progres- siva das camadas da pele che- gando até a fáscia muscular, logo, é uma infecção profunda e grave. Os principais locais de acometimen- to são membros inferiores, períneo e abdome e ocorre por proliferação polimicrobiana. Epidemiologia É uma patologia rara, porém, extre- mamente incapacitante e letal, pois a mortalidade é em torno de 75%. Afe- ta em menor número crianças e pa- cientes jovens e seu risco aumenta em pacientes idosos, principalmen- te se doenças crônicas associadas como diabetes mellitus e doença vas- cular periférica. Condições como uso de drogas endovenosas e abuso de álcool também são fatores de risco. Não há diferença entre os sexos. Como medidas de prevenção des- taca-se a limpeza de feridas e trata- mento adequado conforme indicação médica, para evitar proliferação e dis- seminação de agentes infecciosos. Por exemplo, os Streptococcus be- ta-hemolíticos, que são os principais agentes etiológicos envolvidos na gênese da fasciíte necrotizante. SE LIGA! Gangrena de Fournier A gangrena de Fournier é caracterizada pela infecção extensa, aguda e grave de partes moles na região do períneo. Há presença de germes anaeróbios, baci- lo gram-negativos ou, frequentemente, flora bacteriana mista. Em geral, a doen- ça inicia como uma fasciíte necrotizante comum, com eritema, dor e calor local, associado a febre e mal-estar, com evo- lução rápida e progressiva. Está muito associada ao estado geral do paciente, aqueles imunodeprimidos e com doen- ças crônicas são mais frequentemente acometidos. Pode ser uma infecção de- corrente de abcessos perirretais, esca- ras de decúbito e pós-procedimentos ci- rúrgicos com cicatrização prejudicada. O tratamento consiste na abordagem ge- ral ao paciente, tratamento antibiótico e abordagem cirúrgica para debridamento da área necrótica. Existem várias opções terapêuticas para tratar as feridas e evi- tar complicações como a oxigenação hi- perbárica e óleo de girassol que podem ser utilizados com indicação médica es- pecializada. A prevenção é sempre um elemento chave no cuidado a pacientes debilitados e com maior risco de desen- volvimento de feridas de pele. Figura 20. Gangrena de Fournier. Lesão exten- sa em região de órgão genital e períneo com necrose tecidual. Fonte: https://pt.wikipedia.org/ wiki/Gangrena_de_Fournier 30DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE Clínica A fasciíte necrotizante tem início com uma lesão eritematosa, localizada e dolorosa, semelhante a uma celulite (infecção também profunda de partes moles), contudo, a dor é despropor- cional à celulite, visto que o paciente refere dor extensiva e progressiva, até que ocorre a sensação de anestesia pela perda dos anexos nervosos. En- tão, não perca tempo! Dor lacerante e desproporcional com achados se- melhantes à celulite merecem aten- ção especial. A evolução é crítica com toxemia pela disseminação bacteriana e reação imune e há coloração azulada nas lesões características da necrose te- cidual, seguidas de coloração arroxe- ada e enegrecida, além disso, há for- mação de bolhas e descamação. Figura 21. Lesão extensa arroxeada, com focos de necrose tecidual e formação de bolhas, característica da fasciíte necrotizante. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Fasce%C3%ADte_necrotizante Diagnóstico O diagnóstico exige a avaliação mi- nuciosa por um tripé que envolve as informações e sinais clínicos, exames laboratoriais e exames de imagem. • Clínica: Como mencionado, há inicio gradual com lesão seme- lhante à celulite, contudo, com dor desproporcional e extensiva, muitas vezes incapacitante e que 31DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE não melhora com medicamentos sintomáticos. • Laboratorial: Pela evidência de inflamação e infecção grave, deve ser solicitado hemograma, marca- dores de inflamação como CPK, eletrólitos e função renal. Vejamos, o paciente apresenta sinais clássi- cos de infecção, logo, o hemogra- ma é essencial para avaliar a leu- cocitose e desvio à esquerda que representa aumento de neutrófilos por infecção bacteriana. CPK vai estar elevado pela grande lesão muscular característica da agres- são necrotizante. Haverá insufi- ciência renal aguda pelas toxinas liberadas a partir da lesão muscu- lar e dificuldade de filtração renal a partir dessa agressão. • Imagem: Os exames de imagem são solicitados para avaliar os fo- cos de lesões profundas e sua extensão interna. A ressonância magnética é o exame mais indica- do por evidenciar lesões em partes moles com maior definição. Tratamento A abordagem do paciente com fas- ciíte necrotizante deve ser agressiva, com equipe prontamente preparada para o desbridamento cirúrgico pre- coce e extenso, de caráter urgente. Em associação deve existir o controle pressórico e febril evitando maiores complicações. Figura 22. Abordagem cirúrgica da fasciíte necrotizante – debridamentoda área lesada. Fonte: aula SanarFlix. 32DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE A antibioticoterapia deve ocorrer também de forma otimizada e garan- tindo cobertura para germes aeróbios e anaeróbios. Abaixo apresentamos algumas opções antibióticas. A penicilina e Clindamicina são an- tibióticos com boa resposta a agen- tes streptococócicos, nas doses: Penicilina G, 4 milhões de unidade, a cada 04 horas + Clindamicina 4g/dia, EV, dividida em quatro doses diárias. Na suspeita de infecção mista deve ser acrescentado Metronidazol 1,5- 2,0g, EV, em 3 doses diárias + Cipro- floxacina 400mg, EV, 12/12h. FLUXOGRAMA – TRATAMENTO FASCÍTE NECROTIZANTE CUIDADOS GERAIS CIRÚRGICO ATB FASCIÍTE NECROTIZANTE Reposição volêmica Debridamento extenso S. Pyogenes Flora mista Pensar na flora mista é sempre a melhor opção Controle pressórico Analgesia Penicilina G, 4 milhões de unidade, a cada 04 horas + Clindamicina 4g/dia, EV, dividida em quatro doses diárias. Penicilina G, 4 milhões de unidade, a cada 04 horas + Clindamicina 4g/dia, EV, dividida em quatro doses diárias. + Metronidazol 1,5-2,0g, EV, em 3 doses diárias + Ciprofloxacina 400mg, EV, 12/12h. 33DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE CONCEITO AGENTE ETIOLÓGICO FATORES DE RISCO TRATAMENTO DIAGNÓSTICO CLÍNICA Necrose rapidamente progressiva de partes moles – atingindo fáscia múscular Aeróbios e anaeróbios Idosos Sintomático Clínica Eritema Diabéticos CIRÚRGICO Hemograma Dor Doenças venosas periféricas Clindamicina CPK Calor Drogas endovenosas Drogas endovenosas Função renal Necrose tecidual Ressonância magnética Febre Toxemia MAPA MENTAL - FASCÍTE NECROTIZANTE Penicilina Metronidazol Ciprofloxacina 34DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE MAPA MENTAL – VAMOS REVISAR? Recém-nascidos Glomerulonefrite pós estresptocócica BOLHOSO NÃO BOLHOSO COMUM Crianças S. aureus S. pyogenes Pele e fáscia muscular Superficial Necrose Febre RNM S. pyogenes CPK – IRA - LEUCO DM, DROGAS ENDOVENOSAS Profunda Septicemia Calor Dor lacerante S. aureus Debridamento Clindamicina + Metronidazol + Cipro Pródromo – otite; faringite Rash eritematoso Febre Cultura de outros focos Descamação Descamação intensa e difusa da pele SÍNDROME DA PELE ESCALDADA ESTAFILOCÓCICA IMPETIGO FASCIÍTE NECROSANTE ERISIPELA X CELULITE S. aureus Bolhas Crostas melicéricas Outras doenças associadas Higiene Mupirocina Dor Cefalexina Edema Limpeza Clindamicina Amoxacilina Cefalexina Biópsia + imunofluorescência Interna Analgesia Cafelexina e oxacilina Folículos pilossebáceos Nódulo eritematoso Limpeza FURUNCULOSE Edema Cefalexina Rubor Mupirocina Calor INFECÇÃO DE PARTES MOLES 35DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Sociedade Brasileira de Dermatologia. https://www.sbd.org.br/dermatologia/pele/ doencas-e-problemas/. Walter Belda Junior, Nilton di Chiacchio, Paulo Ricardo Criado. Tratado de Dermatologia. Atheneu, 3° edição. 2018 Azulay, RD, Azulay DR. Dermatologia, Guanabara Koogan, 5° edição, atualizada e revisada em 2011. 36DOENÇAS BACTERIANAS DE PELE
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