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Capítulo 49 – Problemas associados à imagem corporal Introdução Discutir sobre a percepção e avaliação da própria aparência física em conjunto com as diversas influências socioculturais, atratividade e aceitação de seus corpos Imagem corporal (IC) É a concepção que o indivíduo constrói do próprio corpo e a sensação que este lhe causa É um reflexo das percepções, sensações e sentimentos A formação da IC é um somatório de experiências pessoais, afetivas, socioculturais, familiares, de influência da mídia e pressão da sociedade Envolve duas dimensões: a atitudinal (tamanho, forma e peso corporal) e a perceptiva (cognitiva, afetiva e comportamental) Insatisfação com a imagem corporal Pode estar associado à baixa qualidade de vida e ao risco elevado de desenvolver problemas como estresse, ansiedade, depressão e transtornos alimentares Uma parcela significativa da população apresenta questões com relação à IC, sendo detectada inclusive em crianças e chegando a 47% entre jovens de 18 a 24 anos3 , independentemente de gênero ou orientação sexual Entre os jovens, um terço das mulheres e dos homens homossexuais ou bissexuais apresenta comportamento de risco para controle de peso por conta da insatisfação com sua imagem corporal A imagem negativa de si pode levar ao isolamento social e preocupações excessivas, o que resulta em altos índices de ansiedade, depressão, TA, transtorno dismórfico corporal (TDC) e pensamentos suicidas Homens cis gays e bissexuais Cerca de 30% dos homens cis gays apresentam INIC, proporção maior do que a dos homens cis heterossexuais Não foram encontrados dados na literatura científica que abordassem o tema na população bissexual. Mulheres cis lesbica e bissexuais Demonstram grau de satisfação com o corpo semelhante ao das mulheres cis heterossexuais Mulheres cis bissexuais apresentam grau maior de desconforto com o corpo quando comparadas às lésbicas, já que também se relacionam com homens e, portanto, se sentem suscetíveis ao seu julgamento masculino de beleza Mulheres cis lésbicas com traços lidos como femininos pela sociedade demonstram maiores preocupações com o corpo do que aquelas que apresentam traços mais masculinos O envolvimento com a comunidade lésbica é um fator protetor para as mulheres homossexuais e está associado à maior aceitação da forma corporal, peso e questões relacionadas à aparência física Pessoas transgênero mulheres trans apresentam maior incidência de INIC, prestando muita atenção ao próprio corpo e gastando muita energia na busca da magreza, com comportamentos de compulsão e expurgo, evoluindo frequentemente para TA os homens trans demonstram mais INIC, preocupações com o ganho de massa corpórea, com o visual, despendendo larga atenção aos cuidados com o corpo Homens trans podem querer ganhar peso para aumentar a leitura social masculina se não tiverem realizado a mamoplastia masculinizadora A intensidade do desconforto com o corpo varia de acordo com o momento, sendo mais elevada antes do início do processo de transição de gênero, atenuando-se conforme as características do gênero vivenciado são adquiridas Pessoas intersexo Podem nascer com características físicas que fogem das padronizadas como masculino/feminino e dos padrões sociais habituais Experiências ruins com profissionais da saúde, somados à vergonha, à estigmatização e ao preconceito, têm impacto negativo psicossocial, na autoestima e na IC, gerando sintomas como ansiedade, depressão e TA Transtornos alimentares São caracterizados por comportamento alimentar patológico no qual se desenvolve uma relação não saudável com o alimento e a quantidade consumida No Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-5, 2013), os principais TA são a anorexia nervosa (AN), a bulimia nervosa (BN) e o transtorno da compulsão alimentar (TCA) Afetam pessoas de todos os gêneros, sexos, classes sociais, etnias e orientações sexuais, tendo o seu pico de início entre adolescentes e adultos jovens A proporção de casos é, na adolescência, de 1 homem cis para cada 4 mulheres cis (1:4), enquanto entre adultos cis é de 1:10 O TCA apresenta episódios recorrentes de compulsão alimentar que ocorrem em média de uma a três vezes por semana, podendo chegar a casos extremos de catorze ou mais episódios, acompanhado de sensação de falta de controle sobre a ingesta excessiva de alimentos Existem poucos estudos sobre TA em LGBTQIA+, mas os existentes têm demonstrado altas taxas entre as minorias sexuais, com maior incidência entre pessoas transgênero Homens cis lésbicas e bissexuais Um recente estudo afirma haver mais chances de dietas agressivas e danosas devido à presença de obesidade ou sobrepeso Os padrões socioculturais de atratividade e a discriminação estariam fortemente associados à vigilância e vergonha corporais, reforçando o comportamento dietético danoso Pessoas transgênero O corpo pode representar fonte de grande sofrimento nessa população, com frequência de INIC em torno de 70% nos adultos Mulheres trans com INIC apresentam forte preocupação com a alimentação, o peso e a forma corporal, com intensa busca pela magreza, podendo evoluir com comportamentos de restrição alimentar e/ou bulímicos Meninos trans adolescentes podem querer restringir a alimentação no decorrer ou antes da puberdade, como tentativa de frear o processo que não desejam Homens trans também têm maior controle dos alimentos ingeridos, preocupação com o peso e a forma corporal, maiores níveis de INIC e checagem do corpo, quando comparados a homens cis A angústia ou repulsa relacionadas ao corpo e IC, associadas à baixa aceitação social da transgeneridade, podem gerar intenso sofrimento psíquico, levando os portadores de TA ao uso de hormônios de forma inadequada, comportamentos autolesivos Transtorno dimórfico corporal É um transtorno pouco estudado e com diagnóstico geralmente negligenciado pelos profissionais de saúde Caracteriza-se por uma preocupação irracional com um ou mais defeitos imaginários ou discretas imperfeições na aparência física, afetando a percepção que o indivíduo constrói de sua IC A grande maioria dos pacientes com TDC busca intervenções no intuito de conquistar a melhoria do aspecto que lhes desconforta por meio de procedimentos dermatológicos, cirúrgicos, dentários, eletrólise Transgeneridade é uma expressão de diversidade de gênero que não se refere apenas à experiência corporal Homens e mulheres trans podem fazer uso de hormônios em excesso, muitas vezes de forma danosa, assim como buscar cirurgias plásticas e procedimentos extras e complementares ao processo de modificações corporais Vigorexia Pode ser entendida como uma “obsessão pelos músculos” Contribui para comportamentos com potencial de risco à saúde, como uso nocivo de drogas e abuso de atividades físicas para alcançar o corpo desejado e musculoso É possível identificar o diagnóstico a partir de comportamentos como modificações preocupantes na dieta, treino excessivo, automedicação com ou sem orientação médica, isolamento social, cansaço extremo A média de idade para o aparecimento do quadro é de 17 e 19 anos Dentre as pessoas trans, os homens têm maior prevalência devido à dissonância entre gênero e aparência física, por não se aproximarem dos ideais predominantes de beleza impostos pela sociedade, musculosos e viris O uso de testosterona propositadamente em excesso para ganho muscular pode ser um fator adicional que leva à exposição de riscos relacionados à saúde e deve ser abordado pelo profissional sem julgamentos O comportamento excessivo da pessoa com vigorexia pode ser confundido com autocuidado, dificultando seu diagnóstico e tratamento Isso dificulta o diagnóstico de vigorexia, tornando-se imprescindível ao profissional da saúde compreender que mesmo comportamentos saudáveispodem provocar doenças quando executados em excesso e com foco distorcido Considerações finais A maneira como cada um vê seu corpo em meio à identidade de gênero, orientação sexual, ambiente sociocultural e familiar é parte da sua existência e marca o seu papel na sociedade. Os profissionais da saúde desempenham um papel importante no que diz respeito à aceitação da diversidade, tanto pelo próprio indivíduo, parte de uma minoria sexual ou de gênero, quanto à sua família e sociedade O tratamento ideal é realizado com equipe transdisciplinar, com uma visão global do indivíduo Pouco se encontra na literatura científica a respeito dos problemas de saúde relacionados à IC entre as minorias sexuais, notoriamente no que diz respeito às pessoas intersexo CIASCA, Saulo Vito; HERCOWITZ, Andrea; JUNIOR, Ademir Lopes. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. 1. Ed. Sanada de Parnaíba [SP]: Manole, 2021
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