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Maria Eduarda de Alencar – Odontologia 2019.2 Bloqueadores Neuromusculares Introdução - A comunicação de um neurônio com o músculo se chama junção neuromuscular, no músculo existe uma região chamada placa motora – região especializada para receber o estímulo – onde há receptores nicotínicos, canais que irão se abrir com a ação da Ach; - Ao se ligar no seu receptor, a Ach irá estimular a geração de um potencial de ação que atingirá a placa motora do músculo. Os bloqueadores neuromusculares irão agir exatamente impedindo isso – bloqueiam o PA na fibra muscular; OBS.: Existem também bloqueadores que atuam nos neurônios. - Na área da anestesia, os bloqueadores neuromusculares serão ferramenta importante, pois irão atuar impedindo a ocorrência de contrações musculares durante procedimentos, sem que haja a necessidade de utilizar muito anestésico – em altas doses esse anestésico poderia ser muito prejudicial, no estágio 4 de anestesia tem-se paralisia respiratória, por exemplo; - Pode-se ver um outro exemplo ocorre durante a intubação endotraqueal, onde se utiliza um bloqueador neuromuscular de rápida ação – efeito quase que imediato – para relaxar o músculo – evitar contração; OBS.: O bloqueador neuromuscular mais potente que existe é o succinilcolina – age em 1 min e mantém sua ação por até 5 min. → Propagação de Sinal na Placa Motora - O neurônio motor libera Ach na placa motora, ela por sua vez se liga aos receptores nicotínicos – é necessário que haja duas Ach ligadas ao canal – logo em seguida o receptor abre e ocorre entrada de Na+ e saída de K+, isso despolariza a célula muscular, gera um potencial de ação e a contração muscular; → Receptor Nicotínico - Ele é um receptor proteico que possui cinco subunidades que formam um poro e dois sítios de ligação com a Ach, as subunidades alfa, esse poro fica fechado na ausência da Ach; - Além dos sítios de ligação da Ach, há uma comporta de inativação, caso a Ach passe mais tempo que o necessário no seu sítio de ligação, a comporta de inativação se fecha, fazendo com que não entre mais Na+, mesmo que a comporta de cima mantenha-se ativada. Essa condição não ocorre normalmente, pois a Ach é degradada muito rapidamente pela acetilcolinesterase – quebra e bloqueia o efeito da Ach, trata-se de uma das enzimas mais rápidas que se conhece; → Bloqueio do Potencial de Ação - Existem várias formas/vário agentes de bloqueio neuromuscular/bloqueadores neuromusculares; !!! Tetrodotoxina: Toxina altamente potente, encontrada no peixe baiacu, que paralisa o músculo, uma vez que bloqueia o PA no neurônio; !!! Toxina Botulínica: Age bloqueando o PA, impedindo a liberação da vesícula de Ach na junção neuromuscular, bloqueando a ação sinaptobrevina, uma proteína muito importante para liberação da vesícula. O que explica a duração do efeito dessa toxina é o fato de o neurônio demorar para produzir a sinaptobrevina novamente. Essa toxina é altamente potente, que em poucos miligramas pode matar até mesmo um boi; !!! Alcaloides do Curare: O curare é um veneno bem antigo, utilizado por índios para a caça, já antes da chegada dos portugueses no Brasil, ele apresenta uma ação muito rápida e realiza um bloqueio muscular muito forte. A partir do curare, vários bloqueadores neuromusculares foram criados para serem utilizados na clínica, sendo a tubocurarina o principal. Bloqueadores Neuromusculares - Esses bloqueadores surgiram de plantas; - Depois de muitos estudos com o curare, em 1897 conseguiu-se isolar a principal molécula desse veneno, a tubocurarina – primeira substância bloqueadora – mas só em 1935 ela passou a ser utilizada clinicamente – tubarine, tubadil, mecostrin. Hoje em dia, devido aos efeitos adversos da tubocurarina ela não é mais utilizada na clínica, mas a partir dela surgiram vários outros bloqueadores, com efeitos mais/menos duradouros, mais previsíveis e com menos efeitos adversos; OBS.: O curare não é absorvido por via oral, apenas parenteral, pois ele é uma molécula muito grande e não é absorvido na mucosa digestiva, sendo excretado, por isso os índios conseguiam caçar com ele e ingerir a carne do animal atingido sem se prejudicar. OBS.: Não se conhece até hoje uma substância de origem natural que consiga reverter o efeito do curare, mas existem medicações que conseguem. - A tubocurarina deve ser administrada por via parenteral para surtir efeito, diferentemente da mucosa digestiva, os vasos sanguíneos do tecido subcutâneo possuem fenestras, que permitem a passagem dessa molécula tão grande; → Bloqueadores Não Despolarizantes - É a maior classe, eles impedem a despolarização sustentada da placa motora, um exemplo é a tubocurarina – antagonista; OBS.: A maioria desses bloqueadores tem o nome cúrio ou curônio. → Bloqueadores Despolarizantes - São agonistas e produzem efeito bloqueador a partir da despolarização da placa motora; - A succinilcolina é praticamente o único agente despolarizante que se usa. Ela age no mesmo local da Ach – sua estrutura consiste em duas Ach ligadas – mas diferente dela seu efeito dura mais tempo – ativação persistente – pois a acetilcolinesterase não consegue metabolizar a succinilcolina, sendo assim, a comporta de inativação é ativada, passando minutos fechada – no começo se tem uma contração leve, devido ao PA gerado, e depois uma paralisia, quando a comporta de inativação se fecha impedindo a entrada de Na+; - Todos os bloqueadores neuromusculares são administrados por via intravenosa. Esses agentes apresentam alguns efeitos adversos, entre eles pode-se citar a liberação de histamina; - A tubocurarina, por exemplo, não é mais utilizada pois ela estimula muito essa liberação de histamina, gerando vasodilatação e queda de pressão – a anestesia já gera isso, se um outro fármaco também gera isso pode ser muito perigoso. Além dela, agentes com a terminação curônio ou cúrio também podem ser citados, dentre eles o pancurônio é um exemplo. BNM Não Despolarizantes - São divididos em três classes baseado na sua conformação molecular: → Benzilisoquinolínicos - d-Tubocurarina – existe a L-Tubocurarina, mas a d-Tubocurarina é a eficaz – metocurarina – versão modificada da tubocurarina, não é mais utilizada – atracúrio, cisatracúrio, mivacúrio, doxacúrio, alcurônio; → Aminoesteróis - Pancurônio, vecurônio, rocurônio, pipecurônio, rapacurônio; → Aminas Cuaternarias - Galamina – tem sido pouco utilizada, pois estimula a liberação de bastante histamina; !!! Mecanismo de Ação - Antagonismo competitivo: Para bloquear a ação da Ach, o fármaco só precisa se ligar a uma das subunidades alfa – para gerar o PA a Ach precisa se ligar as duas subunidades – feito isso ele impede a depolarização e a geração do PA; - A tubocurarina, pode bloquear o canal de outra forma, em alguns pacientes, e principalmente em grandes concentrações – ou quando muitos canais estão abertos – ela bloqueia o canal encaixando-se dentro da comporta aberta do receptor barrando fisicamente a passagem dos íons de Na+, quando a concentração dela baixa, ela perde a afinidade pelo poro e sai, esse tipo de bloqueio pode durar horas, por isso que ele é tão imprevisível. Ele !!! Farmacocinética: Os bloqueadores são classificados de acordo com seu tempo de duração, entre todos os não despolarizantes, o mivacúrio é o mais rápido, e o pancurônio o mais demorado. Esse tempo de duração do efeito é dose-dependente, quanto maior a dose, maior é o tempo; - O cisatracúrio e o atracúrio são metabolizados no plasma, na temperatura de 37°C a molécula sofre uma lise – eliminação de Holfmann – sendo fármacos interessantes para quem tem problemas hepáticos – a maioria dos fármacos é metabolizado no fígado; - Não são absorvidos por via oral ou escassamente absorvidos; - Distribuição limitada, não vão chegar ao sistema nervoso central – a incapacidadede atravessar a BHE; - Baixa metabolização; - Eliminação ocorre principalmente por via renal; - A idade influencia positivamente o bloqueio – ou seja, o bloqueio é mais forte em idosos; - Influência positiva – sinergia muito grande entre os dois – dos anestésicos particularmente voláteis – portanto deve-se ter cuidado ao administrar os dois; !!! Ordem de Paralisia e Recuperação - Não há paralisia em todos os músculos de uma vez, primeiro os músculos extrínsecos oculares – pálpebra de fecha – e faciais, depois os dos membros superiores e inferiores, seguidos dos músculos do pescoço e tronco, e, por último, intercostais e diafragma – músculos respiratórios; - Em relação a recuperação essa ordem se inverte, os primeiros músculos a se recuperarem são os músculos respiratórios e por último os extrínsecos oculares e faciais; !!! Usos Clínicos - Cirurgias: Relaxamento muscular durante cirurgia; - Controle das Convulsões: Não são usados em qualquer convulsão, apenas quando nenhum medicamento está resolvendo, não se sabe a causa ou em casos de tetania, então utiliza-se o bloqueador neuromuscular, em UTI, pois o paciente deve estar entubado para tal procedimento; - Manobras Ortopédicas; - Laringoscopia, broncoscopia; - Controle de Ventilação: Paciente que está entubado, mas tenta respirar por conta própria; !!! Efeitos Adversos: Irão depender das características farmacocinéticas de cada agente, das farmacodinâmicas também; - Além dos receptores nicotínicos – de Ach – esses bloqueadores antagonizam também bloqueadores muscarínicos – do sistema parassimpático; - Embora a afinidade seja pequena é algo que se deve considerar, pois ao antagonizar esses receptores tem-se a ocorrência de efeitos adversos em órgão vitais, coração, pulmão e órgãos do sistema digestivo; - Quando se pensa nos efeitos adversos tem-se: boca seca, dificuldade de micção, taquicardia – devido a ação antagonista do pancurônio e da galamina no receptor M2 – arritmias – combinação do halotano(anestésico)-pancurônio – e hipotensão – devido à liberação de histamina e bloqueio ganglionar gerada pela tubocurarina, pelo atracúrio e pelo pancurônio; - Liberação de Histamina: Normalmente decorre da administração rápida de grandes doses de alguns BNM, gera eritema na face, região cervical e tronco, hipotensão e taquicardia reflexa, broncoespasmo e aumento da secreção brônquica, tem efeitos de curta duração – 1 a 5 min – e dose dependente; !!! Como Reverter o Bloqueio Neuromuscular: Ele poderá ser revertido com o aumento da disponibilidade/concentração da Ach, inibindo a acetilcolinesterase com medicamentos; - Um caso espacial é o do fármaco Sugammadex, ele é um carboidrato enorme com um poro no meio, que tem o encaixe perfeito para o rocurônio e vecurônio – BNM – quando os BNM se ligam ao Sugammadex eles ficam inutilizáveis, sendo depois metabolizados e eliminados, revertendo o quadro de paralisia. BNM Despolarizantes - Os agentes deste grupo são o decametônio – não tem um efeito bloqueador tão bom – e a succinilcolina – ou suxametônio – entretanto a succinilcolina é o único agente comercialmente disponível com início de ação rápido e duração ultrarrápida. A rapidez da recuperação se deve a metabolização pela butirilcolinesterase; !!! Mecanismo de Ação - O bloqueio ocorre por excesso de estímulo, o que se tem não é um antagonismo e sim um agonismo forte; - Esse bloqueio ocorre em duas fases: Fase I – bloqueio estimulatório – e Fase II – bloqueio flácido; - Fase I: Ocorre uma pequena contração, também chamada de fasciculação – o músculo treme um pouco. Abertura do receptor → despolarização da placa terminal → despolarização da membrana adjacente → contração muscular generalizada e desorganizada – fasciculações; - Fase II: O receptor é inativado e o músculo relaxa, ocorre dois minutos após a aplicação. Exposição continuada ao BNM → inativação do receptor → paralisia flácida – não ocorre flacidez em aves; !!! Farmacocinética - A succinilcolina é polar e não sofre absorção significativa no trato gastrointestinal, sua administração é feita unicamente por via intravenosa; - Apresenta meia-vida ultra curta, tendendo a se difundir para o plasma novamente, onde é metabolizada pela butirilcolinesterase, resultando na formação de succinilcolina + colina; - Apresenta início de ação em 1min e duração de 5-8min, servindo para procedimentos rápidos; !!! Efeitos Adversos - Hipertermia Maligna: Aumento da temperatura corporal e espasmos – pois libera muito cálcio do retículo sarcoplasmático, gerando contrações e aumento da temperatura – mais comum quando associado ao anestésico geral halotano; - Choque Anafilático: Reação imunológica intensa contra a molécula do fármaco; - Bradicardia Sinusal: Envolve a ativação dos receptores muscarínicos cardíacos no nodo sinusal, tem incidência maior na segunda dose administrada após curto intervalo da primeira; - Arritmias Ventriculares: Reduz o limiar para arritmias ventriculares; - Hipercalemia ou Hiperpotassemia: Eleva os níveis séricos de potássio – pode-se ter parada cardiovascular se esses níveis aumentarem demais; - Aumento da Pressão Intraocular: Ação agonista sobre os receptores muscarínicos; - Dores Musculares: Causadas pelas fasciculações; OBS.: Nenhum medicamento reverte o efeito do suxametônio. OBS.: Ativa tanto receptores nicotínicos quanto muscarínicos, embora tenha baixa afinidade por esse segundo. !!! Usos Clínicos - Em procedimentos de curta duração – pequenas intervenções cirúrgicas, manipulações ortopédicas e intubação endotraqueal – em que se deseja um relaxamento rápido e intenso da musculatura esquelética.