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ASSAF NETO, Alexandre. MERCADO FINANCEIRO. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2006. Mercado – Risco e seleção de carteiras A avaliação de carteiras de investimentos envolve três grandes fases de estudo: análise dos títulos, análise das carteiras e seleção da carteira. O valor intrínseco é obtido pêlos fluxos futuros esperados de rendimentos de caixa descontados a uma taxa de atratividade definida pelo investidor. Essa taxa de desconto exigida pelo investidor deve embutir, em sua metodologia de cálculo, uma parcela de remuneração pelo risco do ativo e outra referente a uma operação classificada como sem risco (rendimentos dos títulos públicos, por exemplo). A análise de carteiras envolve as projeções de retorno esperado e risco do conjunto de ativos considerado. Nessa fase do estudo das carteiras é utilizado um instrumental financeiro técnico de avaliação, tendo por base os valores determinados na primeira fase de análise dos títulos. O presente conteúdo aprofunda este estudo a partir da moderna teoria de carteiras desenvolvida por Markowitz (o conceito mais moderno de diversificação e risco de um portfolio é atribuído, em grande parte, a Harry Ma-rkowitz, cuja essência de seu estudo é encontrada na obra portfolio selection, editada em 1959 por John Wiley & Sons. As formulações utilizadas para cálculo do risco de um portfolio são provenientes do modelo desenvolvido pelo autor, a quem foi atribuído o Prémio Nobel de Economia de 1990.). A seleção de carteiras procura identificar a melhor combinação possível de ativos, obedecendo às preferências do investidor com relação ao risco e retorno esperados. Dentre as inúmeras carteiras que podem ser formadas com os ativos disponíveis, é selecionada aquela que maximiza seu grau de satisfação. 14.1 Risco de uma carteira Um aspecto relevante da teoria do portfolio é que o risco de um ativo mantido fora de uma carteira é diferente de seu risco quando incluído na carteira. No estudo da diversificação, o risco de um ativo é avaliado pela sua contribuição ao risco total da carteira. Elevando-se, de maneira diversificada, o número de títulos em uma carteira, é possível promover-se a redução de seu risco, porém a uma taxa decrescente. A partir de um determinado número de títulos, a redução do risco praticamente deixa de existir, conservando a carteira, de forma sistemática, certo nível de risco. Assim, até mesmo carteiras consideradas bem diversificadas costumam manter certo grau de risco, impossível de ser eliminado pela diversificação, denominado de risco sistemático. O risco de uma carteira depende não somente do risco de cada elemento que a compõe e de sua participação no investimento total, mas também da forma como seus componentes se relacionam (co- variam) entre si. Relacionando-se ativos com baixa correlação (ou co-variância inversa) é possível reduzir-se o risco total da carteira. Nessas condições, o risco de uma carteira constituída de dois ativos (X e Y) pode ser obtido a partir da seguinte expressão: Observe que o desvio-padrão de um portfolio de dois ativos não é obtido unicamente pela soma do desvio-padrão de cada ativo ou, até mesmo, pela sua média aritmética ponderada. A expressão de cálculo considera também a co-variância entre os ativos, de forma a expressar a contribuição da diversificação sobre o risco do portfolio. A correlação entre dois ativos é determinada pela relação entre sua covariância e o produto de seus desvios-padrão, ou seja: A partir dessa expressão, tem-se: Substituindo-se a fórmula de COVxy na identidade de cálculo do risco do portfolio (σp) para dois ativos, pode-se desenvolver a seguinte expressão bastante l adotada: De outra forma, é demonstrado que o desvio-padrão de uma carteira de dois ativos (X e Y) é função do: a. desvio-padrão de cada ativo (σx e σy); b. percentual da carteira aplicado no ativo X (Wx) e no ativoY (Wy); c. coeficiente de correlação dos ativos X e Y (ρxy). Assim, a redução do risco de uma carteira pode ser promovida pela seleção de ativos que mantenham alguma relação inversa entre si. Ressaltando colocações anteriores, o objetivo da diversificação é o de combinar ativos de forma que reduza o risco do portfolio. A expressão geral de cálculo do risco (desvio-padrão) de uma carteira contendo n ativos, baseando-se no modelo de portfolio desenvolvido por Markowitz, é a seguinte: Por exemplo, o desvio-padrão de uma carteiral composta de três ativos (A, B e C) é apurado, a partir da identidade geral enunciada, da maneira seguinte: e assim por diante. 14.1.1 Exemplo ilustrativo: efeitos da correlação sobre o risco do portfolio Com o intuito de demonstrar mais claramente os efeitos da correlação dos retornos dos ativos sobre o risco de um portfolio, admita ilustrativamente uma carteira formada por duas ações (A e B) com os seguintes resultados separados. O quadro elaborado a seguir demonstra o retorno esperado da carteira formada com diferentes participações das ações A e B e o risco da carteira adotando-se coeficientes de correlação extremos (ρAB = +1 e ρAB = - 1). O risco da carteira (σp) foi calculado de acordo com o modelo de Markowitz, o qual leva em consideração o risco de cada ativo, sua participação na carteira e a correlação. Assim, para WA = 80%, WB = 20% e ρAB = +1, tem-se: e assim por diante. O conceito de diversificação de Markowitz permite que, ao se selecionarem ativos com correlação perfeitamente negativa, seja eliminado todo o risco da carteira. No quadro elaborado acima, uma carteira constituída com 60% da ação A e 40% da ação B, e admitindo-se um índice de correlação PAB = - l, apura um risco nulo (σp = 0). Essa situação, como observado anteriormente, é bastante difícil de verificação prática. A diversificação, conforme proposta por Markowitz, permite a redução ou até a eliminação total do risco diversificável (não sistemático) de um portfolio, ficando, porém, sempre presente a parcela do risco sistemático. É importante que se acrescente, ainda, que a diversificação, quando utilizada com o propósito de redução do risco, não é uma decisão aleatória. Deve sempre ser elaborada observando-se as correlações dos retornos dos ativos, de maneira a se estabelecer a melhor composição possível de uma carteira. Os efeitos da diversificação sobre o risco de uma carteira costumam ser bastante relevantes na maioria dos mercados financeiros. Alguns estudos publicados demonstram que no mercado acionário a diversificação é capaz de promover a redução de mais da metade do risco da carteira. 14.1.2 Exemplo ilustrativo: determinação do retorno esperado e risco de um portfolio Admita ilustrativamente dois ativos (X e Y) que promovem, para cada estado de natureza considerado (desempenho da economia), os seguintes resultados: O risco de cada ativo, considerado isoladamente, e expresso pela medida do desvio-padrão, é determinado da maneira seguinte: Pode-se caslcular a co-variância entre os retornos dos ativos X e Y, com a seguinte expressão: onde Pj, representa a probabilidade estatística de verificação do estado de natureza e Řx e Řy os retornos esperados respectivamente, dos ativos X e Y. O quadro 14.1 ilustra os vários cálculos da co-variância dos dois ativos seguindo a expressão de cálculo acima. A correlação entre dois ativos é de 0,1161, ou seja: O Quadro 14.2 ilustra o risco e o retorno esperado dos ativos X e Y assumindo diferentes proporções no portfolio. Observe que a redução do risco do portfolio somente se processa mediante uma diminuição do retorno esperado, verificando-se uma correlação positiva entre risco e retorno. A partir dos valores esperados e riscos calculados para as diversas combinações possíveis da carteira, deverá o investidor, considerando sua curva de indiferença, isto é, seu grau de aversão ao risco, eleger a melhor combinação possível de ativos de forma a atender satisfatoriamentea sua expectativa com relação ao dilema risco e retorno presente nas decisões de investimento. A correlação entre os ativos é ligeiramente menor que 1,00 ( ρxy = 0,9636) promovendo, pelo modelo de diversificação, a redução do risco do portfolio. Como foi comentado, quanto menor a correlação dos retornos, maior a redução do risco pela diversificação. O desvio-padrão do portfolio, apurado pela formulação de Markowitz, é inferior, para qualquer participação dos ativos no total do investimento, à média ponderada dos desvios-padrão dos retornos desses ativos. Sendo: σx = 14,08% e σy = 4,65%, conforme calculados anteriormente, tem-se: Sempre que o índice de correlação for inferior a 1,00, ocorre a diversificação do risco. A redução é maior quanto menos positivamente correlacionados se apresentarem os ativos. Evidentemente, o maior benefício da redução do risco do portfolio pela diversificação ocorre na situação já comentada de correlação negativa dos retornos dos ativos. 14.2 Ativos com correlação nula Se os retornos esperados de dois ativos forem independentes, ou seja, apresentarem correlação nula (PAB = 0), o percentual de cada ativo a ser aplicado na carteira considerada de mais baixo risco deve obedecer à seguinte expressão de cálculo: A participação do ativo B é de (l - WA). A proporção do ativo A, conforme determinado na expressão mencionada, permite que o risco da carteira seja minimizado. Em verdade, nenhuma outra combinação de ativos irá possibilitar um risco menor que o apurado. Ilustrativamente, admita dois ativos (A e B) com correlação nula entre seus retornos esperados, ou seja: ρAB = 0. O desvio-padrão do ativo A é de 15% e o do ativo B de 12%. O risco da carteira atinge seu nível mínimo quando a participação do ativo A for de 39,0%, e B, em consequência, de 61,0%, ou seja: Para demonstrar essa estrutura de risco mínimo, o quadro a seguir calcula o risco da carteira (σ P) para diferentes proporções. 14.3 Conjunto de combinações de carteiras O exemplo ilustrativo desenvolvido no item 14.1.2 retratou o cálculo do retorno esperado e do risco da carteira formada pêlos ativos X e Y. Os dados básicos da ilustração são: Ao se ampliarem as possíveis combinações das participações dos ativos X e Y na carteira ilustrativa, podem ser obtidos os resultados relativos a cada composição, conforme identificados no Quadro 14.3. As composições sugeridas no Quadro 14.3 são apenas algumas das possíveis carteiras que poderiam ser formadas com os ativos em questão. Observe que a carteira 9, constituída exclusivamente pelo ativo X, é a que apresenta, ao mesmo tempo, o maior retorno esperado e também o risco mais elevado (maior desvio-padrão). O contrário se verifica na carteira l, composta unicamente do ativo Y. A carteira 2, fortemente concentrada no ativo Y (tem 10% do ativo X e 90% do ativo Y), diminui seu risco e eleva o retorno esperado. A carteira 3, ao reduzir ainda mais a participação do ativo Y, promete maior retorno e também um mais alto nível de risco; e assim por diante com as demais carteiras formadas. Os diversos resultados relatados no Quadro 14.3 podem descrever uma curva que retrata o conjunto possível de combinações de uma carteira, conforme ilustrado na Figura 14.1. A representação gráfica descreve as possíveis alternativas que se apresentam a um investidor de maneira a combinar a participação dos ativos X e Y no contexto de uma carteira. A curva inserida no triângulo KWZ indica os possíveis resultados de risco e retorno esperados da carteira constituída por ativos considerados como não perfeitamente correlacionados. Foi demonstrado que um ativo perfeitamente correlacionado deve apresentar um coeficiente igual a +1,0 (correlação positiva) ou - 1,0 (correlação negativa). Os ativos X e Y, conforme cálculos efetuados no item 14.1.2, apresentam um coeficiente de correlação igual a 0,1161. A reta KW reflete os possíveis resultados que os ativos apresentariam se fosse apurada uma correlação perfeitamente positiva (ρxy = +1,0). Observe ainda na referida Figura 14.1 que essa linha une as carteiras compostas exclusivamente pelo ativo X e ativo Y, de acordo com os resultados determinados no Quadro 14.3. Como a curva KMW está destacada dessa reta (situada a sua esquerda), isso sugere o efeito da diversificação da carteira pela redução do risco. Conforme foi colocado, ainda, os ativos X e Y não apresentam correlação positiva perfeita (ρAB< 1,0) e promovem, em consequência, uma redução do risco da carteira. A reta ZW, por outro lado, indica uma correlação perfeitamente negativa entre os ativos, caso de verificação muito pouco comum na prática. Em verdade, mesmo que fossem identificados ativos com correlação exatamente igual a -1,0 no mercado, a forte demanda dos investidores por estes títulos poderia (e, muito provavelmente, ocorreria) alterar a correlação perfeitamente negativa, desaparecendo sua capacidade de eliminar todo o risco de uma carteira. O ponto M, destacado na curva KW, representa uma carteira de ativos que apresenta o menor risco possível. É geralmente conhecida por carteira de variância mínima. Quanto mais uma carteira se distancia desse ponto de menor desvio-padrão, maior é o risco que apresenta e, conseqüentemente, também mais elevado é seu retorno esperado. Investidores com nível mais alto de aversão ao risco escolherão, evidentemente, carteiras mais próximas do ponto M, ocorrendo o inverso com aqueles que apresentam maior indiferença ao risco. A carteira M, por envolver o risco mínimo, é preferencial a todas as demais carteiras que oferecem um retorno esperado menor. Em outras palavras, diz-se que M domina todas as demais carteiras que se encontram abaixo dela. Para dois ativos (A e B), a carteira de variância mínima pode ser determinada a partir da seguinte expressão: No exemplo ilustrativo em consideração, conformr representado na Figura 14.1, têm-se os seguintes resultados: Substituindo esses valores na fórmula da variância mínima apresentada, tem-se: O retorno esperado e o risco desta carteira atinge: Logo, a carteira M, de variância mínima, possui retorno esperado de 12,91% e um risco (desvio- padrão) de 13,07%. EMPLO ILUSTRATIVO. Estão sendo analisados os resultados das combinações de duas ações (A e B), as quais apresentam as seguintes características: O coeficiente de correlação desses dois ativos é de 0,20. A partie dessas informações, são apurados, a seguir resultados da carteira admitindo-se diferentes proporções dos ativos. No gráfico, o portfolio M é o de menor risco (variância) e, por definição, também o de menor desvio-padrão. O ponto M domina todos os demais formados abaixo, apresentando menor risco para um retorno esperado mais elevado. As oportunidades de investimentos a serem consideradas estão localizadas sobre a curva MF, também conhecida por conjunto ou fronteira eficiente. 14.4 Fronteira eficiente A seleção da carteira de investimento mais atraente para um investidor racional, que avalia a relação risco/retorno em suas decisões, fica restrita às combinações disponíveis no trecho MW da linha de combinações descrita na Figura 14.1. Esse segmento, conhecido por fronteira eficiente, insere todas as carteiras possíveis de serem construídas. A escolha da melhor carteira é determinada, uma vez mais, pela postura demonstrada pelo investidor em relação ao dilema risco/retorno presente na avaliação de investimentos. Em outras palavras, na fronteira eficiente, é possível selecionar uma carteira que apresenta, para um determinado retorno, o menor risco possível. A Figura 14.2 ilustra uma fronteira eficiente. Cada ponto da curva (área sombreada) indica o retorno esperado e o desvio-padrão (medida de risco) resultantes de cada investimento possível. Por exemplo, ao se considerarem três ativos podem ser formadas três carteiras constituídas com um só ativo cada (A, B e Q, três carteirasde dois ativos cada (AB, AC e BC] e uma carteira com os três ativos. De outro modo, cada uma dessas carteiras com mais de um ativo pode apresentar diferentes proporções, elevando significativamente o número de carteiras possíveis de serem formadas. Dessa maneira, ao se considerarem mais ativos, verifica-se a presença de um número quase infinito de alternativas de investimento. De qualquer forma, todas as combinações possíveis de ativos encontram-se identificadas dentro dessa área sombreada descrita na Figura 14.2. Cada ponto identificado na área sombreada representa uma carteira que demonstra certo retorno esperado e risco. Não é possível identificar carteiras em outras áreas do gráfico, devendo o investidor tomar sua decisão com base no conjunto de oportunidades descrito. A diferença básica entre a Figura 14.2 e a Figura 14.1, anterior, é que a área sombreada identifica as possíveis combinações de carteiras envolvendo muitos ativos. A fronteira eficiente descrita na Figura 14.1 restringe o conjunto de oportunidades para somente dois títulos. A questão básica identificada na frigura 14.2 continua sendo a de descrever como um investidor toma sua decisão de aplicação de Capital, ou seja, como é selecionada a melhor alternativa de investimento em condições de risco. Conforme comentado, o investidor racional deverá escolher aquela combinação que maximiza o retorno esperado para um menor nível possível de risco ou, em outras palavras, a que promove o menor risco para um dado retorno esperado. As alternativas de investimento que atendem a essa orientação são aquelas dispostas ao longo do segmento MW, e são denominadas por Markowitz de eficientes. Por exemplo, ao comparar-se a carteira A, situada sobre a fronteira eficiente, com a carteira 2, localizada dentro da área sombreada, verifica-se que o risco de A é menor, apresentando ambas as carteiras o mesmo nível de retorno. Assim, qualquer carteira situada à direita desta linha MW (conjunto eficiente) produz maior risco para o mesmo retorno esperado, ou o mesmo nível de risco para um menor retorno esperado. A Figura 14.3 ilustra as preferências de dois investidores (A e B) diante de carteiras dispostas na fronteira eficiente. As curvas de indiferença traçadas refletem diferentes posturas perante o risco. Diante do mesmo conjunto de oportunidades, o investidor A seleciona uma carteira de ativos de menor risco que B. Em razão dessa postura mais conservadora (maior aversão ao risco), o retorno prometido para A é menor que o esperado por A. Outros investidores, ainda, com diferentes níveis de aversão ao risco, selecionariam outras carteiras de investimento, com medidas de retorno esperado e desvio-padrão compatíveis com suas curvas de indiferença. É importante registrar que a construção de um conjunto eficiente de carteiras de investimentos constituídas com vários ativos é perfeitamente possível de se efetuar na prática. Há diversos tipos de "softwares" disponíveis no mercado e que podem ser aplicados com boa eficiência no estudo de seleção de carteiras de investimentos em condições de risco.
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