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Estudo Sobre a Palavra de Deus (Sinopse) Comentário Bíblico do Novo Testamento Colossenses Autor John Nelson Darby Tradutor Martins do Vale Revisor Josué da Silva Matos 2019 www.boasemente.com.br www.palavrasdoevangelho.com COLOSSENSES INTRODUÇÃO A Epístola aos Colossenses considera o Cristão como ressuscitado com Cristo, mas não do mesmo modo como a Epístola aos Efésios que no-Lo apresenta como assentado nos lugares celestiais em Cristo. Uma esperança está reservada para ele nos céus; por isso deve pensar nas coisas que estão no Céu, e não nas que estão na Terra. Ele está morto em Cristo e com ele ressuscitado, mas não assentado nos lugares celestiais. Temos nesta epístola uma prova do que outras epístolas demonstram, a saber, a maneira preciosa como o nosso Deus, na Sua graça, dirige todas as coisas para o bem daqueles que O amam. Na Epístola aos Efésios, o Espírito Santo desenvolveu os planos de Deus acerca da Igreja — os privilégios desta. Não havia nada a censurar aos Cristãos de Éfeso (1), e assim o Espírito podia aproveitar a ocasião que esse fiel rebanho Lhe oferecia para desenvolver todos os privilégios que Deus tinha determinado para a Igreja em geral, em virtude da união desta com http://www.boasemente.com.br/ o seu Chefe (a sua Cabeça) Jesus Cristo, assim como os privilégios individuais dos filhos de Deus. (1) Como é doloroso de ver esta querida Assembleia de Éfeso ser tomada mais tarde como exemplo do abandono do primeiro amor (Apocalipse 2); mas tudo tende para o seu fim. Não acontecia o mesmo quanto aos Colossenses: Estavam um pouco decaídos dessa bendita posição, e tinham perdido a consciência da sua união com a Cabeça do Corpo; pelo menos, se não era realmente assim, eles estavam sendo assaltados pelo perigo e expostos à influência daqueles que procuravam desviá-los e sujeitá-los aos ditames da filosofia e do Judaísmo, de modo que o apóstolo devia ocupar-se do perigo e não apenas dos privilégios. Graças a Deus que esta união com o Chefe não pode ser perdida; mas podemos perdê-la como verdade na Igreja, e, individualmente podemos perder a consciência dela. Demasiado o sabemos nós na Igreja de hoje. Todavia, isso dava ao Espírito a ocasião de revelar todas as riquezas e toda a perfeição que se encontrava em Jesus e na Sua obra, a fim de restaurar do seu enfraquecimento espiritual os membros do corpo ou de mantê-los no pleno gozo prático da sua união com Cristo e no poder da posição que lhes era adquirida por esta união. Para nós, esta epístola aos Colossenses é de instrução perpétua acerca dos tesouros que se encontram em Cristo. Se a Epístola aos Efésios nos expõe os privilégios do corpo, a Epístola aos Colossenses revela-nos a plenitude que está na Cabeça, e o fato de nós sermos realizados em Cristo. Assim, na primeira destas duas epístolas, a Igreja é a plenitude d'Aquele que enche tudo em todos; enquanto que, na Epístola aos Colossenses, toda a plenitude da divindade habita corporalmente em Cristo, e nós somos realizados n'Ele. Há, porém, outra diferença que e importante assimilar: Na Epístola ao Colossenses, à parte a expressão “amor no Espírito”, não encontramos nenhuma menção ao Espírito Santo, que está plenamente em evidência na Epístola aos Efésios. Mas, por outro lado, temos Cristo como nossa vida, muito mais pormenorizadamente desenvolvido, o que é de igual importância no seu lugar. Em Efésios encontramos mais acentuado o contraste do Paganismo com os privilégios e o estado dos Cristãos. A maneira como a alma é formada à semelhança viva de Cristo é muito desenvolvida em Colossenses, e o assunto da unidade do Judeu, e do Gentio em um antes Cristo em nós do que nós em Cristo, embora as duas coisas não pudessem ser separadas. Outra diferença importante é que, em Efésios, o tema da unidade do Judeu e do Gentio em um só corpo ocupa muito espaço. Em Colossenses só os Gentios estão em evidência, embora em conexão com a doutrina do corpo de Cristo. À parte estas diferenças, poderemos dizer que as duas epístolas têm uma grande semelhança no seu caráter geral. CAPÍTULO 1 Começam pouco mais ou menos de igual modo (1), sendo ambas escritas de Roma, quando o apóstolo ali estava prisioneiro, e enviadas pelo mesmo mensageiro e na mesma ocasião (como também provavelmente a Epístola a Filemom), a avaliar por aquilo de que os nomes e as saudações que ali se encontram fazem fé. (1) Não se encontra o nome de Timóteo na Epístola dirigida aos santos de Éfeso. A mensagem aos Efésios põe talvez os santos de Éfeso mais imediatamente em relação com o próprio Deus, em lugar de colocá- los, como aos de Colossos, na comunhão fraternal sobre a Terra; os santos de Éfeso não são chamados irmãos (Efésios 1:1), mas somente “santos e fiéis em Cristo Jesus”. Em Colossenses são considerados como andando sobre a Terra, embora ressuscitados. É por isso que encontramos ali uma longa oração pelo seu comportamento, embora considerados numa esfera santa e elevada, na sua qualidade de libertados. A Epístola aos Efésios começa por todo o propósito e todo o fruto dos desígnios de Deus. Nessa epístola, o coração do apóstolo expande-se imediatamente no sentimento da bênção de que os Efésios gozavam. Eles eram abençoados de toda a bênção espiritual nos lugares celestiais em Cristo. Para os Colossenses havia uma esperança reservada nos céus. Um prefácio de vários versos, relativo ao Evangelho que eles tinham ouvido, serve de introdução à sua oração pelo comportamento e estado espiritual deles neste mundo. Isto leva-nos ao mesmo ponto que Efésios 1:7, mas com um desenvolvimento muito mais amplo da glória pessoal de Cristo; e ali encontramos também mais desenvolvida a exposição dos próprios caminhos de Deus. Entre as mensagens dirigidas às Igrejas, a que foi enviada aos Colossenses tem um caráter mais pessoal do que a enviada aos Efésios. Mas consideremos agora mais particularmente o que é dito em Colossenses. Falta aqui esse caudal de gloriosos privilégios de que o apóstolo fala no primeiro capítulo da Epístola aos Efésios (versos 3-10), e os privilégios da herança (versos 11-14); ressuscitados na Terra, não estão assentados nos lugares celestiais, tornando-se assim todas as coisas em herança deles. Aqui, não são eles em Cristo, mas sim Cristo neles; a esperança da glória e a oração mencionada mais acima enchem o capítulo até chegarmos ao terreno comum da glória de Cristo (Colossenses 1:15). É mesmo aqui apresentada a glória divina de Cristo, ao passo que em Efésios é o simples fato do propósito de Deus quanto a Cristo que é apresentado. Em Colossenses não só não encontramos a herança de Deus como sendo nossa, mas também não se fala aqui do Espírito como garantia. Isto como vem já, é característico de Colossenses. Não se fala aqui do Espírito, mas da vida. Insiste-se mais na Pessoa e na glória divina de Cristo, e no nosso estado como realizados n'Ele; mas não da mesma maneira acerca da posição dos santos junto de Deus. Além disso, sendo o santo considerado como estando na Terra, e não em Cristo nos lugares celestiais, está em causa a sua responsabilidade (verso 23). O verso 3 do capítulo 1 da Epístola aos Colossenses corresponde ao verso 16 do capítulo 1 da Epístola aos Efésios; apenas se sente que há mais plenitude na alegria de Efésios 1:16. Mas a fé em Cristo e o amor por todos os santos encontram-se bem patentes nos dois exemplos, como causa da alegria do apóstolo. O tema da oração de Paulo é muito diferente na Epístola aos Efésios, onde ele tinha podido desenvolver os planos de Deus acerca da Igreja; o apóstolo pede que os santos compreendam esses planos assim como a força por meio da qual eles ali participam. Mas aqui, na Epístola aos Colossenses, pede que o comportamento deles seja dirigido pela inteligência divina. Isto, porém, refere-se a uma outra coisa, a saber, ao ponto de vista sob o qual ele considera os santos no seu discurso. Vimos que na Epístola aos Efésios o apóstolo os considera como assentados nos lugares celestiais;por conseguinte, a sua herança é todas as coisas, porque todas as coisas devem ser reunidas sob Cristo como Chefe. Aqui, na Epístola aos Colossenses, uma esperança é reservada para os santos no Céu; portanto, a oração do apóstolo, nesta epístola, ocupa-se do comportamento dos santos, a fim de que este seja de harmonia com o alvo que eles se propõem atingir. Estando na Terra e não permanecendo ligados à Cabeça, os fiéis de Colossos estavam em perigo de se afastaram desse alvo. Paulo orava, pois por eles em vista dessa esperança celestial. Eles tinham ouvido falar dessa perfeita e gloriosa esperança — o Evangelho a tinha anunciado por toda a parte. Era este Evangelho, pregado em vista de uma esperança reservada nos céus, que tinha produzido frutos entre os homens, frutos caracterizados pela sua origem celeste. A religião dos Cristãos, o que governava o seu coração nessas relações com Deus era celestial. Ora os Colossenses estavam em perigo de reentrarem na corrente das ordenanças e dos hábitos religiosos de homens vivendo no mundo e tendo uma religião em relação com o mundo onde Eles habitavam uma religião que não era iluminada e cheia da luz celeste. Somente a união consciente com Cristo pode manter-nos em segurança. Ordenanças para se chegar, junto d'Ele não podem encontrar lugar ali, onde nós estamos unidas com Cristo. A filosofia dos pensamentos humanos não chega onde nós estamos, pela energia da vida, na posse dos pensamentos divinos. No entanto, quão precioso não é, ainda que nós não estejamos devidamente à altura da nossa vocação, que um objeto, que nos liberta deste mundo e das influencias que nos escondem Deus, seja colocado perante os nossos corações! Tal é o alvo do escrito do apóstolo: Dirige os olhos dos Colossenses para o Céu, para que eles vejam ali Cristo e reencontrem essa consciência que eles tinham perdido um pouco ou estavam em perigo de perder, da sua união com a Cabeça. Não tinham, no entanto, perdido o fundamento, isto é, a fé em Jesus e o amor por todos os santos. Faltava-lhes apenas a fé prática da sua união com o Chefe. Todavia, somente esta fé podia mantê-los no elemento celeste acima das ordenanças da religião humana e terrestre. Como de costume, o apóstolo, com o fim de os reedificar, toma o seu ponto de partida no lugar onde achava o bem nos santos aos quais ele escreve. Era-lhes chegada esta esperança celestial e tinha já produzido frutos. É isto o que distingue o Cristianismo de qualquer outra religião, e em particular do sistema judaico, que (mesmo quando, pela graça, os indivíduos suspiravam pelo Céu) escondia Deus atrás de um véu, e, longe d'Ele, enredava a consciência numa série de ordenanças. Ora, fundado nesta esperança, que colocava a vida interior do Cristão em relação com o Céu, o apóstolo pede que os Colossenses sejam cheios do conhecimento da vontade de Deus em toda a sabedoria e inteligência espiritual. É o fruto da relação com Deus de um Homem ressuscitado sobre a Terra. Isto é algo diferente dos mandamentos e das ordenanças. É o resultado da comunhão íntima com Deus e do conhecimento do Seu caráter e da Sua natureza em virtude desta comunhão; e, embora as bênçãos que o apóstolo pede se refiram todas à vida prática, o gênero de compreensão que faz o assunto da sua oração, como dizendo respeito à vida interior, deixa as ordenanças completamente para trás. O apóstolo teve de começar por essa ponta, por assim dizer, pela vida cristã. Talvez, os Colossenses, primeiramente, não tivessem compreendido o alcance do ensinamento, mas essa instrução encerrava um princípio que, já implantado e capaz de ser despertado nos seus corações, devia conduzi-los lá aonde o apóstolo desejava chegar, e era ao mesmo tempo um privilégio muito precioso de que podiam, da mesma forma, apreender o valor. Tal é a caridade! O apóstolo desenvolve, com força e clareza, os privilégios dos Cristãos, do ponto de vista que o preocupa, e faze-o como alguém que sabe o que é uma tal conduta, mas com o poder do Espírito de Deus. Eles não estão no Céu, mas sim na Terra, e este é o caminho que convém Aqueles que são ressuscitados com Cristo e que têm os olhos voltados da Terra para o Céu. É a vida divina na Terra, e não o Espírito Santo colocando a alma do crente no centro dos planos divinos, como em Efésios 3, em virtude de Cristo habitar pela fé no coração. O primeiro princípio desta prática da vida celestial é o conhecimento da vontade de Deus; é ser-se Cheio deste conhecimento, e não correr atrás dele como atrás de uma coisa que está fora de nós, nem com indecisão ou incerteza quanto ao que ela é, mas ser-se cheio dela por um princípio de inteligência que vem de Deus e que produz essa compreensão e a sabedoria do Cristão na própria alma. O caráter de Deus traduz-se assim vitalmente, na maneira como o Cristão aprecia tudo o que Ele faz. E note-se aqui que o conhecimento da vontade de Deus tem por base o estado espiritual da alma — a sabedoria e o entendimento espirituais. Isto é da maior importância na prática. Os mandamentos humanos particulares quanto ao comportamento não poderiam de modo nenhum substituí- lo; quando muito poderiam impedir-nos de sentirmos a necessidade do entendimento espiritual. Sem dúvida alguma um espírito mais espiritual pode ajudar-me a discernir a vontade de Deus (2); mais Deus ligou o conhecimento do caminho que é de harmonia com a Sua vontade, do Seu caminho para Ele, com o estado interior da alma, e faz-nos atravessar determinadas circunstâncias — a vida humana neste mundo — a fim de pôr esse estado à prova, a fim de nos revelar a nós mesmos qual é esse estado e de nos exercitar nele. O Cristão, pelo seu estado, deve conhecer os caminhos de Deus. O meio a empregar para tal é a Sua Palavra (ver João 17:17- 19). Deus tem um caminho para Si que nem o olho da águia consegue vislumbrar, conhecido somente do homem espiritual, ligado ao conhecimento de Deus, procedendo desse conhecimento e a ele conduzindo (ver Êxodo 33:13). Assim, quanto ao seu comportamento, o Cristão anda de uma maneira digna do Senhor; sabe o que convém ao Senhor (3), e anda assim para Lhe agradar em todas as coisas, frutificando em toda a boa obra, e crescendo no conhecimento de Deus (verso 10). (2) É uma das seduções do coração; embora conheçamos perfeitamente a vontade de Deus, vamos pedir conselho a alguém que não é mais espiritual do que nós. (3) São-nos dadas três medidas do comportamento do Cristão, sendo assim qualificado: Digno de Deus, que nos chama para o Seu próprio Reino e para a Sua glória; digno do Senhor, aqui, neste mundo; e digno da chamada de que fomos alvo, isto é, do Espírito Santo habitando na Igreja (Efésios 2), tema este que é desenvolvido no fim do capítulo 3. Todavia, não é tudo a vida ter esse caráter; ela frutifica à medida que cresce, e isto em relação com o crescente conhecimento de Deus. Mas esta relação do Cristão com Deus conduz-nos a uma outra bem preciosa consideração. Não só o caráter e a energia vital do Cristão se ligam ao conhecimento de Deus, mais também á força do Senhor (4) ali se desenvolve. Nós tiramos força d'Ele. (4) O antecedente é, penso eu, aqui o Senhor; mas o pensamento do Senhor e o de Deus formam um todo aqui, isto é, são apenas UM. Ele dá-a aos fiéis para andarem assim “fortalecidos — diz Ele — com todo o poder, segundo a força da Sua glória”. Tal é a medida da força do Cristão, para uma vida de harmonia com o caráter de Deus. Assim, o caráter desta vida é revelado na glória celeste, no Céu, em Jesus Cristo; na Terra, a sua manifestação, tal como teve lugar em Jesus Cristo, realiza-se com toda a paciência e constância, com alegria, no meio das pessoas e das aflições da vida de Deus neste mundo. Esta forma da vida é também muito impressionante: toda a força divina, segundo a glória de Deus, está harmonizada de modo que o Cristão seja paciente e tolerante. Que caráter a sua vida reveste assim neste mundo! Além disso, há um generoso auxílio dos outros que esse caráter nos habilita a mostrar em todo o tempo.Nenhum fruto do poder é mais evidente do que este. A vontade encontra-se vencida! Assim, apesar de tudo o que tivermos de sofrer, gozamos de uma alegria, constante perante Deus. É um quadro precioso da maneira como a vida divina se manifesta. Ora, aqui o apóstolo liga esta vida de paciência à sua origem, ao seu objetivo e ao que ela possua atualmente pela fé. Estamos cheios de alegria por andarmos assim, e damos graças ao Pai, que nos tornou capazes (5) de participarmos na herança dos santos na luz (versos 11-12). (5) Note-se bem aqui que Paulo não diz: “nos tornará capazes”, como de uma coisa a realizar no futuro e na qual poderia haver progresso. Eis, pois, os santos estabelecidos nas suas relações próprias com Deus (seu Pai) no Céu — na luz. Deus é Luz e habita na luz. Temos, portanto aqui o estado da alma, o caráter da marcha e a força pela qual andamos. E quanto à capacidade de sermos recebidos diante de Deus na luz, nós a Possuímos. Além disso, somos levados ao Reino do Filho do Seu amor. São em seguida apresentados o meio empregado para nos colocar na luz e o caráter prático da obra que ali nos introduz, fazendo-nos conhecer (nos limites desta epístola) os planos de Deus, mas de uma maneira prática — nos seus resultados futuros ou atuais — e não no Seu pensamento ou como sendo o mistério da Sua vontade. O Pai libertou-nos do poder das trevas e transportou-nos para o Reino do Filho do Seu amor. Não é por meio de uma regra judaica para um homem; é uma operação do poder de Deus, que nos trata como estando todos em iguais condições, e, por natureza, escravos de Satanás e das trevas, e nos coloca, por um efeito desse poder, numa nova relação Consigo mesmo. Encontra-se bem aqui, se examinarmos os princípios na sua origem, o que é expresso em Efésios 1:4-5 e 2:1-6, quanto à nossa posição precedente; mas é evidente que faltam a plenitude e a pureza de uma Nova Criação (6). “À herança dos santos na luz” e “o Reino do Filho do Seu amor” lembram-nos Efésios 1:4-5; porém, não há aqui a mesma coisa, tal como está no pensamento de Deus, mas sim o fato de que já neste mundo fomos tornados capazes de ali participarmos. Consequentemente, também não encontramos o desenvolvimento de uma posição familiar, como sendo aquela em que nos encontramos. (6) Veremos também mais à frente que a base do ponto de partida da Epístola aos Colossenses é um pouco diferente, e, embora haja alguma alusão às verdades fundamentais da enviada aos Efésios, se refere mais ao homem tal como ele é de fato encontrado, vivendo no pecado, e absolutamente menos aos pensamentos do próprio Deus, que encontra o homem já morto nos seus pecados, e o forma de novo segundo os Seus próprios desígnios. Mas disto falaremos mais tarde. Por outro lado, em Efésios 1:6, a nossa posição é a graça perfeita em Cristo. Em Colossenses 1 estamos já realmente livres do poder das trevas e transportados ao Reino do Filho do Seu amor; não encontramos aqui graça ou aceitação no Bem-Amado. O poder e o amor do Pai deram-nos o direito de ali estarmos; o caráter de Deus, como Luz e Amor, encontra-se necessariamente revelado nesta graça, segundo a Sua relação com o Seu Filho; todavia, o que é dito neste versos não se refere à nossa relação com o próprio Deus, deixando de lado a questão do estado de que Ele nos tirou, mas sim à obra em geral, que nos coloca nessa relação, em contraste com a nossa posição precedente. Ele libertou- nos do poder das trevas e transportou-nos para o Reino do Seu amado Filho. Temos parte na herança dos santos na luz, mas, onde está o “santo e irrepreensível diante d'Ele em amor”? Onde está a nossa relação com Deus, seguindo os desígnios d'Aquele que só vê o bem que Se propunha no Seu próprio coração — ou a adoção para Ele por Jesus Cristo, pela Sua predestinação eterna, desde todos os séculos? Na Epístola aos Efésios a libertação é introduzida como uma consequência da posição em que se encontram os herdeiros, objetos dos eternos desígnios de Deus (7). (7) Isto diz respeito ao princípio mencionado mais acima. Na Epístola aos Efésios tudo é considerada do ponto de vista dos eternos desígnios de Deus, antes que houvesse mal, do ponto de vista do bem que Ele Se propunha em Si mesmo, embora a redenção fosse necessária quando o mal tivesse entrado — e que fosse também para glória do próprio Deus e a base da nossa glória no cumprimento dos Seus desígnios. Na Epístola aos colossenses o homem caído no mal é o objeto da graça. Aqui a libertação é o tema principal. Como é perigoso, desastroso mesmo, afastarmo-nos do Cabeça e perdermos a boa consciência, na luz, da nossa união com Ele! Como é perfeita e preciosa esta graça que se adapta ao nosso estado para nos reconduzir a Deus e nos fazer gozar, segundo o Seu poder e a Sua graça, da inestimável posição que Ele nos preparou em Cristo! O meio que o Espírito Santo emprega aqui para realizar esta obra de graça é a revelação da glória do Senhor, “do Filho do Seu amor”. É somente aqui, tanto Quanto eu sei, que o Reino é chamado “o Reino do Filho”, e isto não é, creio eu, porque esta passagem introduz a Pessoa do Filho como centro de tudo e nos dá a medida da grandeza da nossa bênção: É o Reino d'Aquele a quem pertence este lugar, o Reino do Filho do Seu amor, no qual nós somos introduzidos. É bem o Seu Reino; e para que nós aprendamos o caráter atual desse Reino para nós, e a nossa relação íntima com Deus como ali tendo parte, ele é chamado o Reino do “Filho do Seu amor”. Este título constitui agora o fundamento da relação com Deus daqueles que estão verdadeiramente no Reino e a ele pertencem, e caracteriza essa relação. O Reino do Filho do homem é a manifestação desse mesmo Reino mais tarde, em glória e em governo. Aqui é caracterizado pela relação pessoal do próprio Filho com o Pai, acrescentando o que nos dá pleno direito de ali termos parte, a saber: “a redenção pelo Seu sangue, a remissão dos pecados”. Agora o apóstolo, tendo introduzido o Filho na Sua relação com o Pai, como objeto central e poderoso que devia atrair o coração dos Colossenses e libertá-los do jugo das ordenanças, desenvolve as diversas partes da glória desta Pessoa do Filho. E se a glória da Igreja falta aqui, a de Jesus está muito mais em evidência aos nossos olhos. É assim que Deus aparta o bem do mal e alimenta de toda a maneira os Seus bem-amados. O Senhor Jesus é “a imagem do Deus invisível”. É no Filho do Seu amor que nós vemos o que Deus é (ver João 1:18 e também 1 João 1:2). É o primeiro caráter da glória pessoal do Salvador e o centro essencial de todo o resto. Ora, a par desse caráter próprio da Sua Pessoa, Cristo toma de direito uma posição que lhe é própria na Criação, como representando Deus. Adão fora criado de algum modo à imagem de Deus, e colocado como centro de uma Criação que lhe estava sujeita; mas, ao fim e ao cabo, ele não era senão uma imagem do Cristo, d'Aquele que devia vir. O Filho, na Sua própria Pessoa, na Sua natureza (e para nós como no seio do Pai), é Aquele que faz conhecer a Deus, porque O representa na Sua própria Pessoa, e numa plena revelação do Seu ser e do Seu caráter perante os homens e em todo o universo, porque toda a plenitude da divindade habita em Si corporalmente. Todavia, Ele é Homem; e é sob esta forma que Ele é visto pelos anjos. Nós temo-Lo visto com os olhos ou pela fé. Assim, Ele é a imagem do Deus invisível. Temos visto n'Ele o perfeito caráter e a apresentação viva do Deus invisível. Que maravilhosa verdade esta para nós, com respeito à Pessoa do nosso bendito Salvador! Mas então, que lugar deve Ele ter na Criação, quando ali entra segundo os eternos desígnios de Deus? Não pode ter senão um: O de uma supremacia sem contestação e sem controvérsia. Ele é “o primogênito de toda a Criação” — e isto é para Ele, um nome de relação, e não de data acerca do tempo, é dito de Salomão: “Dar- lhe-ei o lugar de primogênito ; fá-lo-ei mais elevado do que os reis da Terra”. Assim o criador, quando toma lugar na Criação, é, necessariamente, o Chefe desta,Ele não fez ainda valer os Seus direitos porque, em graça, queria cumprir a redenção. Mas nós falamos aqui dos Seus direitos — direitos que a fé reconhece. Ele é, pois, a imagem do Deus invisível e o primogênito de toda a Criação, quando toma o Seu lugar nesta. E a razão disto merece um pouco mais de atenção. É simples, mas maravilhosa: Ele Criou! Foi na Pessoa do Filho que Deus atuou quando, pelo Seu poder, criou todas as coisas, quer nos céus, quer na Terra, visíveis e invisíveis. Tudo o que é poderoso e elevado é obra da Sua mão; tudo foi criado por Ele (o Filho) e para Ele. Assim, quando Ele toma esse todo, toma-o como Sua herança de direito. Que maravilhosa verdade esta: Aquele que nos resgatou, que Se fez homem, um de nós quanto à natureza, para realizar esse resgate, é o Criador! Mas esta é a verdade!... Em relação com esta admirável verdade, fazia parte dos desígnios de Deus que o homem dominasse sobre todas as obras de Suas mãos; assim, Cristo homem, possui de direito esse domínio, e, de fato, dele tomará posse mais tarde. Esta parte da verdade de que falamos é tratada no capítulo 2 da Epístola aos Hebreus. Voltaremos a este assunto mais pormenorizadamente quando estudarmos essa epístola; introduzo- o, porém, aqui, somente para compreendermos as circunstâncias em que o Filho toma posse da Sua herança: O Espírito Santo fala d'Aquele que é Homem, mas que é, ao mesmo tempo, o Criador de todas as coisas, o Filho de Deus. Todas as coisas foram criadas por Ele — e foram também, necessariamente criadas para Ele. Portanto, até aqui temos encontrado a glória da Pessoa de Cristo e a Sua glória na Criação, em relação com a Sua pessoa. Em Jesus nós vemos a imagem do Deus invisível. Ele tudo criou, tudo é para Ele — e Ele é o primogênito de tudo o que é criado. Um outro gênero de glória, uma outra primazia se apresenta agora: Ele toma um lugar especial em relação com a Igreja no poder da ressurreição. É a introdução do poder divino, não na Criação, mas no domínio da morte, para que outros participem na glória de Cristo, pela redenção e pelo poder da vida que há n'Ele. A primeira glória era, por assim dizer, natural; esta é especial, e adquirida (embora em virtude da glória da Sua Pessoa) ao atravessar a morte e todo o poder do Inimigo, na morte. Por isso se liga, como acabamos de dizer, à redenção e à introdução de outras pessoas na participação dos mesmos privilégios. Eis o Chefe (o Cabeça) do corpo que é a Igreja, o princípio, o primogênito de entre os mortos, para que em todas as coisas Ele tenha o primeiro lugar. Ele é primogênito da Criação; Ele é primogênito (8), segundo o poder da Sua ressurreição, nessa nova ordem de coisas segundo a qual o homem é predestinado para uma posição inteiramente nova, adquirida pela redenção, e na qual ele participa para glória de Deus (tanto quanto pode participar aquilo que é criado), e isto participando na vida divina em Jesus Cristo, o Filho de Deus e a Vida eterna — e para o que concerne à Igreja, como membro do Seu corpo. (8) Uma destas primazias depende dos Seus direitos divinos como Criador; a outra depende da Sua obra e do Seu poder manifestado na sua humanidade, no ato da ressurreição. Ele possui tudo como Homem e tudo pelo Seu poder divino; mas pode dizer-se que uma parte da Sua glória depende da Sua divindade e a outra da Sua vitória como Homem. O Cristo é primogênito da Criação, primogênito de entre os mortos, Criador, e vitorioso sobre a morte e o poder do Inimigo. São estas as duas esferas do desenvolvimento da glória de Deus. A posição especial da Igreja, corpo de Cristo, faz parte da última. Cristo deve ter esta glória de ressurreição, e também a primazia e a superioridade universais (como sendo Homem), porque toda a plenitude (a plenitude da divindade) se agradou de habitar n'Ele (ver capítulo 2, verso 9). Que outro lugar poderia Ele ter, senão o primeiro, em todas as coisas?! Mas, antes de nos ocuparmos do que se segue, convém fazer algumas importantes observações acerca do que já percorremos: O Filho é-nos aqui apresentado como Criador. Não, evidentemente, excluindo o poder do Pai ou a operação do Espírito Santo: os três são UM; mas é o Filho que nos é apresentado aqui. No capítulo 1 do Evangelho segundo S. João, é a Palavra, o Verbo, quem cria tudo. Aqui, e na Epístola aos Hebreus, capítulo 1, é sob o nome de Filho que Aquele que é também a Palavra, o Verbo, nos é revelado. Ele é a Palavra de Deus, a expressão do pensamento de Deus e do Seu poder. É por Ele que Deus opera e Se revela. Ele é também o Filho de Deus, e em particular o Filho do Pai. Ele revela Deus, e quem O viu a Ele viu. O Pai. Embora nascido neste mundo por operação de Deus, pelo Espírito Santo, Ele é Filho de Deus (Salmo 2:7; Lucas 1:35); mas isto tem lugar no tempo, quando a Criação é já a cena da manifestação dos caminhos e dos desígnios de Deus. Mas o nome de Filho é também o nome que exprime a relação própria da Sua gloriosa Pessoa com o Pai, antes que o mundo existisse. É nesse caráter que Ele criou todas as coisas. O Filho deve ser glorificado como o Pai. Se Ele Se humilhou a Si mesmo, como o fez por amor de nós, tudo deve ser colocado em suas mãos, a fim de que a Sua glória seja manifestada na mesma natureza que Ele tomou, tendo- Se humilhado até ao tomá-la. Desde então, o poder da Vida e de Deus n'Ele foi manifestado pela ressurreição, de modo que Ele é determinado Filho de Deus em poder pela ressurreição. Está nela a prova desse poder. Aqui, na Epístola aos Colossenses, o que nos é apresentado é a glória da Sua Pessoa como Filho antes que o mundo existisse. Ele é Criador como Filho. É muito importante notar isto. Depois, a Escritura não separa as Pessoas na Sua manifestação. Se o Filho operou milagres sobre a Terra, se expulsou os demônios pelo Espírito, o Pai, que morava n'Ele (Cristo), fez as obras. É preciso também recordar que O que nos é dito de Cristo no Novo Testamento, é dito logo que Ele foi manifestado em carne — da Sua Pessoa completa, d'Ele, Homem sobre a Terra. Não que não separemos a divindade da humanidade em pensamento, mas mesmo assim separando-as, temos de pensar na única Pessoa acerca da qual o fazemos. Nós dizemos: Cristo é Deus; Cristo é Homem — mas é o mesmo Cristo que é, ao mesmo tempo, Deus e Homem. Digo isto aqui, não para fazer teologia, mas sim para chamar a atenção do leitor para a notável expressão: “Foi do agrado do Pai que toda a plenitude nele habitasse” (verso 19). Toda a plenitude da divindade se encontrava em Cristo. Os Gnósticos, que mais tarde tanto atormentaram a Igreja, empregavam esta palavra “plenitude” num sentido místico e particular; para darem a ideia da soma e origem (pouco local, no entanto, porque tinha um a demarcação que a separava de todas as outras coisas) de divindade, que se desenvolvia nos quatro pares de seres (ou emanações) de que Cristo era apenas um (9). (9) Acrescentado mesmo aos quatro, como suplementar. Não é necessário avançar mais nessas fantasias, a não ser para fazer notar que, com diversas gradações de vistas, esses Gnósticos atribuíam a Criação a um deus inferior e mau, que era também o autor do Antigo Testamento. A matéria — diziam eles — não procedia do Deus supremo. Não, comiam carne nem se casavam, entregando-se a toda a sorte de torpezas e de dissolução, e, coisa estranha, associavam-se com o Judaísmo. Praticavam o culto dos anjos, etc., etc. O apóstolo estava frequentemente em luta com esses instrumentos do diabo, de que Pedro também fala. Aqui, ele verifica, pela Palavra de Deus, a absoluta plenitude da divindade de Jesus Cristo. Longe de ser algo de inferior, como uma emanação; longe de ter apenas um lugar nessas genealogias sem fim, por mais elevado que fosse esse lugar, toda a plenitude habitava n'Ele. Gloriosa verdade a respeito da Pessoa do Senhor nosso Salvador! Podemos deixar na sombra todas as loucas fantasias dos homens, para gozarmos da perfeita luz desta gloriosa plenitude de Deus no nosso Chefe e Senhor. Toda a plenitude se encontrava em Cristo!Nós conhecemos bem Deus o Pai, mas revelado por Cristo; possuímos bem o Espírito, mas a Sua plenitude estava em Cristo! E, tendo realizado a nossa redenção e a nossa purificação, Ele recebeu esse Espírito para nós. E o próprio Deus, em toda a Sua plenitude, tem sido revelado, sem nenhuma reserva, na Pessoa de Cristo — e esse Cristo, é o nosso Cristo, nosso Salvador, nosso Senhor! Ele foi manifestado a nós e por nós! Que gloriosa verdade!... É para Sua própria glória, sem dúvida alguma, que Ele deve ser conhecido tal como é, como Amor; mas não é menos verdade que esta revelação foi feita em afinidade conosco. Não é somente o Filho revelando o Pai, por mais doce e precioso que seja esse fato; é a plenitude da divindade como tal que se encontra revelada e posto em evidência em Cristo. A vontade e o agrado da plenitude era habitar ali. Ora, Cristo não era apenas Chefe da Criação em virtude da glória divina da Sua pessoa, e Chefe da Igreja como ressuscitado de entre os mortos e vencedor do poder do Inimigo. A Criação, e todos os que deviam formar a Igreja estavam igualmente afastados de Deus — e estes últimos por sua própria vontade. Para poderem estar em relação com Deus deviam reconciliar-se com Ele. Esta obra de reconciliação é a segunda parte da glória de Cristo. Não era somente do agrado da plenitude da divindade o habitar em Cristo, mas também de tudo reconciliar com ela por meio d’Ele, tendo feito a paz pelo sangue da Cruz. Esta Reconciliação de todas as coisas, tanto nos céus, como na Terra, não está ainda cumprida. A paz foi, na verdade, feita pelo sangue, mas o poder não interveio ainda para fazer entrar tudo, de fato, em relação efetiva com Deus; segundo O valor desse sangue. De igual modo em Israel o sangue era posto sobre o propiciatório, e a expiação a paz — era feita. Mas, além disso, faziam-se a aspersão do sangue sobre tudo, e os pecados do povo eram confessados. Para o que concerne à Criação e a Israel isto não está ainda cumprido. Todo o que estiver fora da vida espiritual, está ainda longe de Deus, embora a paz esteja feita. Sabemos que a vontade de Deus é reconciliar Consigo mesmo todas as coisas, nos céus e na Terra, por virtude desse sangue. Tudo entrará na ordem, sob um novo regime. Os culpados, permanecendo nos seus pecados, estarão fora desta cena de bênção; mas os céus e a Terra serão completamente libertados do poder do mal, e, durante o milênio, ficarão já livres de toda a manifestação exterior do mal. Mais tarde, ficarão mesmo absolutamente livres de qualquer vestígio da sua presença. O mal será erradicado por virtude desse sangue, que decidiu entre o bem e o mal, de harmonia com o caráter do próprio Deus, e glorificou a Deus de tal modo que a paz já está feita. Deus pode agora atuar livremente para abençoar. Mas aqui a obra de reconciliação é dupla, como também a glória da Pessoa de Cristo, e em relação com os mesmos objetos que essa glória. Está nos desígnios de Deus reconciliar todas as coisas Consigo, nos céus e na Terra, por Cristo; mas já reconciliou os Cristãos. Estes, outrora, não só imaculados como a criatura, mas também inimigos no seu entendimento, já Ele os reconciliou no corpo da Sua carne, pela morte. A obra perfeita que Cristo consumou no Seu corpo, apagando os nossos pecados, e glorificando perfeitamente a Deus Seu Pai, pôs-nos em relação com Deus na Sua santidade, segundo a eficácia dessa obra. Isto quer dizer que essa obra é eficaz para nos apresentar perfeitamente reconciliados, santos, sem mácula e irrepreensíveis perante a Sua face, tendo consciência de tudo isso, assim como do amor que o operou e do favor em que somos introduzidos, de sorte que, no sentimento desses fato, o coração é levado a Deus. Nós somos reconciliados Com Deus. Isto supõe que permanecemos firmes na fé até ao fim. A posição dos Colossenses dava lugar a essa advertência, porque são considerados como andando na Terra (10). Vimos que eles se tinham afastado um pouco ou estavam em perigo de se afastar, perdendo assim a consciência da sua união com Cristo. (10) Quando o Cristão é considerado como estando em Cristo, não há lugar para o “se”. Estamos em Cristo. Quando é considerado como peregrino neste mundo, está em caminho para a glória e deve tender para o alvo. Vêm então os “ses”, os perigos e a necessidade de sermos guardados. Mas nessa altura o Cristão tem a mais completa certeza de que será guardado e não perigará nunca, que será fortalecido até ao fim e que a boa obra será acabada. A alma salva é assim mantida na dependência de Deus e na confiança da Sua fidelidade Notar-se-á também que o apóstolo fala do seu Evangelho, como tendo ele propagado por todo o mundo. A graça tinha ultrapassado os estreitos limites do Judaísmo e da esfera do Messias, para expandir o testemunho do perfeito amor de Deus em toda a Criação sob o Céu, de que Paulo era o instrumento entre os Gentios (11). (11) Note-se como tudo é aqui claramente dito e ricamente desenvolvido: verso 14, a redenção e o perdão; verso 21, a reconciliação com Deus; verso 13, a libertação e a introdução no Reino; verso 12, somos tornados capazes de termos parte na herança dos santos na luz. Tudo isto nós temos, e consequentemente, somos chamados para andarmos de maneira digna do Senhor. Portanto, até aqui o Espírito de Deus apresentou-nos as duas prerrogativas de Cristo: Sobre a Criação e sobre a Igreja; e as duas reconciliações que lhes correspondem, a saber, primeiro a reconciliação das coisas acima das quais Cristo é colocado, como Chefe de tudo nos céus e na Terra, segundo a reconciliação dos próprios Cristãos — esta já efetuada; a primeira ainda por vir. Ora, agora o ministério do apostolo tem o mesmo duplo caráter sem dúvida ele não tem de pregar no Céu, mas o seu ministério exercesse em todos os lugares, sob o Céu, onde houver uma alma para ouvir. Ele é servo deste Evangelho; depois, é servo da Igreja, serviço ou ministério distinto, que faz conhecer a verdadeira posição desta e os seus privilégios, serviço, aliás, ligado com aquele em que o Evangelho tem sido levado aos Gentios para os fazer entrar (versos 23 e 25). Sem esta segunda parte do seu ensinamento o apóstolo completava a Palavra de Deus — princípio importante pelo que concerne à autoridade exclusiva da Palavra escrita, e que mostra que a totalidade desta Palavra está já perante nós, totalidade demonstrada pelos assuntos que ela contém. Todos os temas que Deus quis tratar na Sua Palavra estão inteiramente concluídos, com exclusão, portanto, de qualquer outro assunto que se pretendesse introduzir nela. O círculo das verdades que Deus tinha a tratar para nos revelar a glória de Cristo e nos dar um ensinamento perfeito de harmonia com a Sua sabedoria, fica completo quando a doutrina da Igreja é revelada. Não há mais nada a acrescentar-lhe (12). (12) Não se trata aqui das datas dos livros, mas do círculo dos assuntos. A lei, o Reino, a Pessoa do Cristo, a redenção e os caminhos de Deus tinham já sido postos perante nós. Faltava revelar a doutrina da Igreja para tornar as comunicações de Deus completas no que concerne aos assuntos a que essas comunicações se referiam. Mas esta doutrina da Igreja, em particular, expunha o apóstolo a perseguições e a sofrimentos que os Judeus acima de tudo e o Inimigo de qualquer maneira procuravam fazer-lhe suportar; mas ele regozijava-se disso como de um privilégio, porque Cristo tinha sofrido por causa do Seu amor pela Igreja, pelos Seus. O apóstolo fala aqui, não da eficácia da morte do Salvador, mas do amor que o levou a sofrer. Segundo este ponto de vista, o apóstolo pode ter parte nesses sofrimentos, e nós também, apesar da nossa pequenez, mas o apóstolo podia-o de uma maneira especial, como testemunha fidedigna dessa verdade. Se Cristo tivesse querido aceitar a posição do Messias segundo o pensamento humano, teria sido bem recebido. De igual modo, se Paulo tivesse pregado a circuncisão, o escândalo da Cruz teria cessado. Se a religião de Deus tivesse reconhecido o homem, na carne, o homemteria podido ter a sua própria parte na religião de Deus. Mas, se Deus é revelado, se a Sua graça se estende aos Gentios, e se, sem ter mais em conta o Judeu do que o Gentio. Deus forma, por essa graça, uma Igreja — corpo de Cristo — que partilha a glória celeste de Seu Filho — eis o que a carne, não poderia suportar! Ser assim excluído como não valendo, nada perante Deus; nem mesmo na sua religião, sejam quais forem os sacrifícios que ela faça, é insuportável para a carne. Neste fato, se encontra a origem da inimizade do espírito judaico que é fundado sobre a carne, sobre o homem, e que reaparece constantemente na história do apóstolo, quer excitando o ódio dos pagãos, quer corrompendo a doutrina de Cristo e a simplicidade do Evangelho. A religião da carne glorifica-se dos seus privilégios particulares (ver Filipenses 3). Encontrámos assim um duplo ministério, uma dupla primazia de Cristo e uma dupla reconciliação, em cada uma das quais se encontram os dois mesmos temas, que mutuamente se correspondem: Cristo Chefe de todas as coisas nos céus e na Terra, Cristo Chefe da Igreja; todas as coisas nos céus e na Terra devem ser reconciliadas; os Cristãos são reconciliados; Paulo exerce o seu ministério em toda a Criação sob o Céu; ele é servo da Igreja. Naturalmente o ministério de Paulo restringia-se à Terra. Sob todos os aspectos, a extensão e o alcance da glória de Cristo e do ministério ultrapassavam os limites do Judaísmo e contrastavam com todo esse sistema. O apóstolo insiste depois sobre a segunda parte do seu ministério, de que acabava de falar, detendo-se um pouco mais particularmente sobre o que respondia às necessidades dos Colossenses, desenvolvendo-o, para fortalecer os corações destes no gozo do conjunto dessas preciosas verdades. Ele completava a Palavra de Deus ao anunciar esse mistério, que tinha sido escondido de todos os séculos e de todas as gerações, mas que era agora manifestado aos santos. Nenhum desenvolvimento dos caminhos de Deus desde a Criação, em atenção às verdades sobre as quais estava fundado, na revelação de Deus — do Seu poder ou dos Seus pensamentos (que lhe servem de base e lhe dão o caráter), tinha encerrado o mistério contido na doutrina da Igreja; não tinha sido comunicado a nenhum desses que faziam parte dos sistemas que o tinham precedido, ou que iluminavam os outros como instrumentos da revelação da luz de Deus. Os anjos, os homens, Israel, os profetas, todos de igual modo o ignoravam. A Igreja, este corpo unido ao Filho de Deus feito Homem e glorificado, e a chamada dos Gentios a esta unidade estavam escondidas a todos eles. Agora que Cristo, Chefe da Igreja, Cabeça, do corpo, era glorificado, o mistério desse corpo era posto em evidência. O apóstolo insiste aqui sobre um aspecto particular deste assunto que, depois da Pessoa de Cristo, forma o centro de todos os desígnios de Deus. Esse aspecto é Cristo em nós (sobretudo na nossa qualidade de Gentios), a esperança da glória. E nisto nós vemos ainda que os crentes são considerados como estando na Terra, embora no poder da ressurreição. O aspecto do mistério é aqui Cristo em nós, neste mundo, não a união com Ele na glória, embora se não possa separar uma coisa da outra. De fato, este mistério era, de qualquer modo, um pensamento novo, uma verdade nova. Possuía-se o conhecimento claro de um Messias que devia ser manifestado entre os Judeus o cumprimento da glória no meio deles. Os Gentios, quando muito, teriam parte na bênção como subordinados ao povo de Deus. Mas agora, segundo a doutrina na Igreja, Cristo, de uma maneira invisível, habitaria no meio dos Gentios (13), e até mesmo neles, em seus corações. E, quanto à glória, não havia senão a sua esperança. (13) Já fiz notar que em Colossenses são os Gentios que estão, sobretudo em vista, e não a união do Judeu e do Gentio num só corpo. Um Cristo morando no coração dos homens, de homens outrora rejeitados e estranhos às promessas, e enchendo o coração de alegria e de glória, na consciência da sua união com Ele, eis o maravilhoso mistério preparado por Deus para a bênção dos Gentios. Era este Cristo, era um tal Cristo que Paulo pregava, exortando todo o homem e ensinando cada um segundo a plena revelação da sabedoria de Deus. Esta sabedoria operava com poder pelo Espírito Santo no apóstolo, para apresentar todo o homem num estado espiritual que respondesse a essa revelação de Cristo, como sendo também o seu fruto. Não é que todos quisessem recebê-lo, mas já não havia limites à esfera do testemunho. Toda a distinção era apagada de igual modo pelo pecado e pela graça. Não havia senão uma coisa a fazer e a procurar, a saber, que todo o homem, pelo poder da Palavra e do Espírito, refletisse Cristo e crescesse até à estatura da Sua plenitude, revelada na doutrina confiada ao apóstolo. Paulo trabalhava para atingir esse alvo, segundo a ação die Cristo nele; porque Cristo não era só o objeto, mas também o poder que atuava para formar as almas à Sua imagem. CAPÍTULO 2 Ora, este poder operava na fraqueza do apóstolo, num coração humano que sentia como um homem, embora segundo Deus, as necessidades dos homens e as dificuldades que se apresentavam no caminho — e este poder era o fruto do amor de Deus. Ele queria que os Colossenses compreendessem bem quão grande era o combate que se travava por eles e por todos aqueles que ainda o não tinham visto, para que fossem encorajados e estivessem bem unidos em amor, de modo que, em toda a riqueza de uma plena segurança, eles compreendessem o mistério de Deus. O apóstolo sentia bem que era disso que eles necessitavam — o que seria um meio de bênção para eles. Ele sabia que a união com Cristo, conhecida no coração, era o que preservava das astúcias do Inimigo, às quais os Colossenses estavam expostos; ele sabia qual era o inefável preço dessa união, e mesmo da sua realização pela fé. Paulo trabalhava, combatia nas suas orações, porque orar é um verdadeiro combate, para que a plena consciência dessa união com o glorioso Chefe fosse operada nos seus corações, de sorte que o Cristo que está no Céu estivesse neles pela fé. No mistério esteavam encerrados todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento. Os fiéis de Colossos não tinham de os procurar noutro lado. A ciência, falsamente assim chamada; podia pretender fornecer-lhes alturas que a simplicidade da doutrina de Cristo não atingia; mas, de fato, a sabedoria de Deus e a profundidade dos Seus desígnios deixavam esses obscuros esforços do espírito humano a uma distância infinita. Eram verdade e realidade — e não criações da imaginação humana, inspiradas pelo Inimigo. Foi por isso que o apóstolo colocara em primeiro lugar essas maravilhosas revelações de Deus quanto à dupla glória de Cristo e quanto à Sua Pessoa. Falava delas a fim de que ninguém seduzisse os Colossenses com palavras persuasivas. Aproveitava-se da ordem que reinava entre eles, da sua fé, para pô-los em guarda contra os perigos a que os tivessem exposto certos pensamentos que podiam deslizar enganados, despercebidos, nos seus espíritos, enquanto tudo corria bem e a consciência da fé permanecia sem ser atingida. É o que frequentemente acontece: Tem-se fé em Cristo, andasse bem, não nos apercebemos de que certas ideias subvertem a fé; admitem-se essas ideias, mantendo-se sempre a profissão da fé ao lado delas, mas a força da verdade, a consciência da união com Cristo e a simplicidade que n'Ele se encontra são perdidas. O Inimigo tem, nesta medida, atingido o seu alvo. O que desse modo se recebeu não é o crescimento em Cristo, mas algo fora d'Ele. É por isso que o apóstolo diz; “Como, pois, recebestes o Senhor Jesus Cristo, assim também andai n’Ele; arraigados e sobre- edificados n'Ele, e confirmados na fé, assim como fostes ensinados” (versos 6-7). Quando se tem recebido Cristo em nossos corações, tudo o mais não é senão um desenvolvimento do que Ele é, e da glória que os desígnios de Deus ligaram à Sua Pessoa. Os conhecimentos, os pretendidos conhecimentos fora de Cristo não fazemsenão afastarmos d'Ele, não fazem senão subtrair os nossos corações à influência da Sua glória, lançando-nos na falsidade e colocando as nossas almas em relação com a Criação sem Deus e sem possuirmos a Chave dos Seus desígnios. Assim, uma vez que o homem é incapaz de sondar o que existe e de disso se dar conta, os seus esforços para o conseguir levam-no a inventar um amontoado de ideias sem fundamento e a tentar preencher o vazio que se encontra nos seus conhecimentos, por causa da sua ignorância de Deus, por meio de especulações nas quais, porque está longe de Deus, Satanás, sem que o homem disso se aperceba, desempenha o mais importante papel. O homem, filho de Adão, não é o centro do imenso sistema dos caminhos de Deus. Fora de Cristo, e sem Cristo, ele não conhece esse centro; especula sem fundamento e sem fim, para se extraviar sempre mais e mais. O seu conhecimento do bem e do mal, a energia das suas faculdades morais não fazem senão desencaminhá-lo, porque ele ocupa-se de questões mais elevadas do que aquelas que dizem respeito puramente à ordem física — e elas produzem nele a necessidade de conciliar princípios aparentemente incompatíveis, que não se conciliam sem Cristo. De resto, a tendência do homem é sempre de fazer de si próprio, tal como é, o centro de tudo. A partir daí, tudo é falso... Os Cristãos devem, pois, andar com simplicidade nos caminhos do Senhor, tal como eles O receberam, e os seus progressos devem realizar-se no conhecimento de Cristo, verdadeiro centro e plenitude de todas as coisas (verso 6). Quando o homem se ocupa filosoficamente de tudo, a insuficiência dos seus próprios recursos lança-o sempre nas mãos de um cabecilha intelectual e nas tradições. E, quando se trata de religião, lança-o em tradições que desenvolvem a religião da carne e se adaptam às forças e às tendências destas. No tempo em que o apóstolo escrevia, o Judaísmo tinha as mais elevadas pretensões nesse gênero de religião. Aliava-se com especulações humanas e adaptava-as; prosseguia-as mesmo assiduamente, oferecendo ao mesmo tempo provas da sua origem divina, que tornavam prováveis a ausência das grosserias da Mitologia pagã e as necessidades que satisfazem a consciência do homem na existência die um ser divino. Essa relativa pureza tendia a tirar, para os espíritos esclarecidos, o que havia de repugnante, de asqueroso, no sistema pagão. O Judaísmo tinha, pela morte de Jesus, perdido todo o direito à pretensão de ser o verdadeiro culto de Deus, e assim era próprio, pelas vantagens que oferecia, em virtude da pureza comparativa dos seus dogmas, para servir de instrumento a Satanás, para se opor à verdade. Em todo o tempo o Judaísmo tinha sido adaptado à carne e tinha sido fundado sobre os elementos deste mundo, porque, quando era reconhecido de Deus, Deus provava o homem por seu intermédio, na posição em que ele se encontrava. Agora Deus já não estava com o Judaísmo. Os Judeus, movidos pela inveja, arrastavam os Gentios à perseguição, e o Judaísmo aliava-se às especulações pagãs para corromper e minar o Cristianismo, e para destruir o seu testemunho. Em princípio, é sempre assim. A carne pode parecer, por um tempo, desprezar as tradições, mas o que é puramente intelectual não se manterá nunca no seio da humanidade sem qualquer coisa de religioso. A carne não tem a verdade, nem o mundo tem o que pertence à fé; e, para a grande maioria, é precisa a superstição e as tradições, isto é, uma religião que a carne possa perceber e que lhe convenha. Deus pode conservar ainda, pelo Seu poder, uma parte da verdade, ou deixar que tudo se corrompa; mais, num ou noutro caso, a verdadeira posição cristã e a doutrina da Igreja estão perdidas (1). (1) Havia no sistema gnóstico lendas muito belas, contendo algumas porções de verdade; mas os Gnósticos tinham perdido Deus e a verdade, assim como a realidade da consciência perante Deus. Podemos bem encontrar a filosofia separada da religião da carne, e esta separada da filosofia, mas, nesse caso, a filosofia é impotente e ateia; a religião da carne é estreita, legal, supersticiosa e, seu poder, perseguidora. Neste capítulo encontramos a filosofia e o vazio da sabedoria humana reunidos com a tradição dos homens, caracterizados como “os rudimentos do mundo”, em oposição com “o Cristo”; porque, com efeito, nós temos um Cristo celestial, que forma um perfeito contraste com a carne no homem vivendo sobre a Terra, um Cristo em quem se encontram toda a sabedoria e toda a plenitude, e a realidade de tudo o que a lei pretendia dar-nos, ou que apresentava em figura, e ao mesmo tempo uma resposta a todas as nossas necessidades. É o que o apóstolo desenvolve aqui, mostrando a morte e a ressurreição com Cristo como o meio de n'Ele termos parte. Em primeiro lugar, “nele habita, corporalmente, toda a plenitude da divindade” (verso 9). Em vez das nebulosas especulações dos homens e das emanações fanáticas, temos a plenitude de Deus, corporalmente, num verdadeiro corpo humano, e assim eficazmente para nós, na Pessoa de Jesus Cristo. Em segundo lugar, “estamos aperfeiçoados n'Ele”. Mas temos necessidade de nada que esteja fora de Cristo (2). (2) Estas expressões referem-se ao duplo caráter de Cristo já posto perante nós no capítulo 1. Elas apresentam-nos, de uma maneira bem positiva, o que nós temos em Cristo, como o que segue se aplica a tudo aquilo que, neste mundo, nos pode impedir de d'Ele gozarmos. Em Cristo está a plenitude da divindade, objeto também das nossas delícias, porque n'Ele tudo possuímos. N'Ele temos também uma posição acima de toda a criatura, de harmonia com a perfeição que O colocou nessa posição suprema. Nós somos realizados (tornados completos, plenos) n'Ele, que é o Chefe de todo o principado e de toda a potestade. Quanto à fraseologia, a substituição de uma palavra por outra, que, todavia, não é melhor em si mesma, facilita a apreensão do pensamento do apóstolo: N'Ele habita, corporalmente, toda a perfeição da divindade, e nós somos completos n'Ele. Por um lado, temos n'Ele, Deus perfeitamente apresentado em toda a Sua plenitude; por outro, possuímos n'Ele a perfeição e temo-la completamente perante Deus. Nada nos falta quanto à nossa posição perante Deus. Que verdade! Que posição! Deus, na Sua perfeita plenitude, em Cristo Homem; nós n’Ele perante Deus na perfeição do que Ele é! N'Ele, Chefe de todos os principiados e potestades, perante os quais o homem, na sua ignorância, estaria disposto a dobrar o joelho! Nós n'Ele, em quem, quanto à Sua Pessoa, habita a plenitude da divindade; n’Ele que, quanto à Sua posição e aos Seus direitos como Homem elevado ao céu, está acima de toda a potestade e de todo o principado! Em seguida o apóstolo entra em pormenores de aplicação para demonstrar que os fiéis têm tudo em Cristo, considerado de acordo com a posição que Ele tinha tomado, não tendo, portanto, nada a procurar neste mundo. A circuncisão, sinal divino da aliança de Deus com os Judeus e do despojamento da carne, exigida para fazer parte do povo de Deus, tinha a sua realidade n'Ele. Os Cristãos, feitos participantes da eficácia da Sua morte pelo poder da vida que está n'Ele, e que é a deles, têm-se por mortes e despojaram o corpo do pecado pela fé. É a verdadeira circuncisão de Cristo, feita sem mãos. A circuncisão feita por mãos era apenas o sinal desse despojamento do corpo da carne, que é o privilégio do Cristão em Cristo. Tendo uma nova vida em Cristo, ele despojou eficazmente o velho homem. Nós somos sepultados com Cristo pelo batismo (porque este é o significado dessa cerimônia), no qual também somos ressuscitados com Ele pela fé nessa operação do poder de Deus, pelo qual Ele foi ressuscitado de entre os mortos. O batismo era o sinal e a expressão dessa obra (3); a fé na operação de Deus que O ressuscitou, o meio pelo qual se efetua em nós esta maravilhosa ressurreição com Cristo para entrarmos num novo estado e numa nova cena — esta feliz morte, ou antes, esta preciosa participação na morte d’AqueIe que tudo fez por nós.E quando digo “a fé”, quero dizer o poder do Espírito de Deus operando em nós. Mias é o poder do próprio Deus, tal como atua em Cristo, que opera em nós, para nos dar a nova posição na vida. (3) Alguns não ligam “ressuscitados” com o batismo. Neste caso, parece-me que a passagem deve ler-se: “Em quem também fostes circuncidados, com uma circuncisão que não foi feita por mão, no despojamento do corpo da carne pela circuncisão de Cristo”, tendo sido sepultados com Ele no batismo, em quem também fostes ressuscitados juntamente (no sentido de: juntamente com Cristo) pela fé, etc. O batismo significa claramente a morte; e não é o fato de se ser batizado, mas sim o de se sair da água que pode aplicar-se à ressurreição. O sentido do batismo, mesmo como figura, não é, de modo nenhum, o dom da vida, mas o fato de se deixar a vida de Adão pela morte (a morte de Cristo) e entrar por esta porta numa posição inteiramente nova. Considerada em relação com a nossa ressurreição com Cristo, esta vida implica, pelo fato de nós a recebermos, que somos perfeitamente e para sempre perdoados. Estávamos sob o peso dos nossos pecados, mortos nos nossos débitos. Cristo colocou-Se sob esse peso, morrendo por nós, realizando a obra que tirou os nossos pecados, pois foi até à morte, e morte de Cruz, por nós. Ressuscitados com Ele, enquanto participantes da vida que Ele goza como ressuscitado de entre os mortos, temos, como Ele e com Ele, deixado todo esse peso de pecados e de condenação para trás, com a morte de que fomos libertados. É por isso que o apóstolo diz: “Perdoando todos os nossos delitos”. Cristo, ao ressuscitar, deixou atrás de Si a morte e o peso da condenação sob a qual nós estávamos; e aos também fomos ressuscitados com Ele. E é de toda a evidência que Deus, ao ressuscitarmos assim do estado em que nos encontrávamos, não o fez para nos condenar ou para nos deixar sob uma condenação ligada a essa nova vida que é Cristo, porque Cristo tinha já levado sobre si a condenação, satisfeito a Justiça de Deus e abolido o pecado na Sua morte, antes de nos comunicar a vida. Deus faz-nos sair da morte e da condenação, com Cristo, que a levou por nós. Mas este fato liga-se a um outro aspecto desta obra de graça de que se fala aqui, do mesmo modo que em Efésios e mesmo em João 5, e em 2 Coríntios 5. Aquele que vive em pecado está, perante Deus, morto em pecados. Se for considerado como vivendo em pecados, é preciso que a morte intervenha — e ela interveio na Cruz (ver Romanos 6). Este aspecto não é evidenciado em Efésios. A morte só é posta em evidência em Romanos; em Colossenses também o é, mas acompanhada da ressurreição em Cristo, de que temos falado. Como disse, esta questão não é posta em Efésios. Ali somos considerados como mortos nos nossos pecados, mortos perante Deus, e tudo o que há de bom é uma nova Criação segundo os desígnios de Deus. Fomos vivificados juntamente com Cristo quando estávamos mortos nos nossos delitos e pecados. Isto é também apresentado em Colossenses, mas não é mencionado como sendo uma nova Criação. Todavia, há uma nova vida nas duas epístolas, que nos é dada quando estávamos mortos; simplesmente a Epístola aos Efésios começa por esta nova vida em Cristo ressuscitado e exaltado, e pelo mesmo poder em nós. Em Colossenses é apresentada como complemento ao ensinamento sobre a administração desta doutrina da nossa morte no batismo e da nossa ressurreição pela fé na operação de Deus em Cristo. Em Efésios, a graça encontra-nos mortos e vivifica-nos com Cristo. Em Colossenses, acha-nos vivos nos nossos pecados, introduz a morte e a ressurreição, e completa esta obra vivificando-nos com Cristo. Do mesmo modo todas as ordenanças que pertenciam aos rudimentos deste mundo e se aplicavam ao homem na carne, pesando como um jugo insuportável sobre os Judeus (ordenanças às quais eles queriam sujeitar os outros), essas ordenanças — que colocavam a consciência sob o peso contínuo de um serviço não realizado pelo homem, de uma justiça não satisfeita em Deus — eram suprimidas. O Judeu, nessas ordenanças, tinha, por assim dizer, posto a sua assinatura e sua culpabilidade; mas a obrigação foi destruída e cravada na Cruz de Cristo. É-nos dada a liberdade, assim como a vida e o perdão. Mas não é tudo. Tínhamos contra nós a força dos principados e das potestades — o poder espiritual de maldade. Cristo venceu-os e despojou-os na Cruz, tendo triunfado sobre eles. Cristo afastou tudo o que era contra nós, a fim de nos introduzir, totalmente libertos de tudo, na nossa nova posição. Note- se aqui que o apóstolo, no que nos diz da obra de Cristo, não vai além do que Cristo fez para nos libertar, com o propósito de nos colocar nos lugares celestiais. No verso 10 fala dos direitos de Cristo, mas não como assentado nos lugares celestiais, nem como tendo levado cativos os inimigos; não nos vê assentados em Cristo nos lugares celestiais. Cristo fez tudo o que era necessário para nos introduzir ali, mas os Colossenses são considerados como estando na Terra, embora ressuscitados, e como, pelo menos, em perigo de perderem o sentimento da sua posição em virtude da sua união com Cristo e de caírem de novo sob os rudimentos do mundo e da carne, do homem vivendo na carne, que não está nem morto nem ressuscitado com Cristo. O apóstolo procura reconduzi-los, mostrando-lhes como Cristo tinha cumprido tudo o que era exigido e tinha afastado do caminho tudo o que os impedia de chegar. Mas não pode falar-lhes da posição em si mesma; os Colossenses não estavam ali de uma maneira consciente. Nas coisas de Deus não se compreende uma posição sem se estar nela. Deus pode revelá-la e mostrar-nos o caminho para a atingirmos. O apóstolo faz isso mesmo aqui, com respeito à Pessoa de Cristo, para alertar os Colossenses. Ao mesmo tempo desenvolve a eficácia da sua obra para libertar os santos dos laços que os retinham e mostrar-lhes que todos os obstáculos estavam afastados. Mas, em pormenor, ele é obrigado a aplicar a sua doutrina aos perigos que os Colossenses corriam, antes de desenvolver os seus gloriosos efeitos no Céu. As ordenanças judaicas eram apenas sombras; o corpo era de Cristo (verso 17). Introduzindo os anjos como objetos de homenagem, e colocando-os assim entre Cristo e eles, separavam- se os membros do corpo da Cabeça que estava acima de todo o principado e potestade. A simplicidade da fé cristã segurava firme a Cabeça, da qual todo o corpo tirava diretamente o seu alimento, e assim crescia do crescimento de Deus. Podia parecer um ato de humildade colocar-se assim em relação com os anjos, como seres superiores e elevados, podendo servir de mediadores; mas havia dois vícios de tremendo alcance nessa aparem-te humildade. Primeiro, tratava-se de um verdadeiro orgulho a pretensão de penetrar nos segredos do Céu, do qual nada se sabe. Que sabiam eles da posição dos anjos, para tomarem essas criaturas os objetos de uma tal homenagem? Era a pretensão de subirem ao Céu para avaliarem, por si próprios, a sua relação com as criaturas de Deus sem Cristo e colocarem-se de modo próprio em relação com elas. Segundo, era renegar a sua união com Cristo. Se eles eram UM com Ele, não podia haver o que quer que fosse entre eles e Cristo; se houvesse alguma coisa entre eles e Cristo, eles estavam mortos e duas vezes mortos. Além disso, pela sua união com Cristo, eles eram UM com Ele, que está acima dos anjos. Unidos a Ele, recebiam, como temos visto, a comunicação por meio de todos os membros do corpo, tesouros de graça e de vida que estavam na Cabeça. Os muitos laços existentes entre os membros do próprio corpo eram, portanto, fortificados, e assim o corpo crescia normalmente. Seguem-se duas aplicações da doutrina de que eles estavam mortos com Cristo e com Ele ressuscitados (capítulo 2:20). O apóstolo aplica o princípio da morte a todas as ordenanças e ao ascetismo, que tratava o corpo como uma coisa vil em si mesma, e que se devia rejeitar. No capítulo 3, verso 1, Paulo emprega a ressurreição para elevar os corações dosColossenses a uma esfera mais elevada e levá-los a Cristo, impelindo-os a olhar para cima, estendo eles mesmos mortos quanto ao velho homem (4). (4) Estas aplicações são a consequência do capítulo 2:11-12; Será bom notar que a Epístola aos Romanos, a partir do capítulo 5:12, trata da morte ao pecado, na qual o homem, como filho de Adão, estava vivo. Em Efésios, o homem é considerado como morto nos seus pecados perante Deus. A Epístola aos Colossenses trata dos dois assuntos. O capítulo 2:11-12 acrescenta a ressurreição com Cristo. O verso 13 dá sequência à doutrina de Efésios. Os capítulos 2:20 e 3:1 dão sequência ao capítulo 2:11-12 e apresentam-nos as exortações em relação com o fato de que o velho homem foi despojado e o novo homem revestido. Para tornar essas instruções mais claras, mostrando o seu seguimento, podemos notar que o apóstolo assinala o duplo perigo, a saber, a filosofia e as tradições humanas, em contraste com Cristo (capítulo 2:3; ver os versos 9 a 15). Identificando-os em tudo com Cristo, fala primeiro do alcance da obra do Senhor. Nos versos 16 a 19 o apóstolo aplica essa obra. Primeiro, no verso 16, à sujeição às ordenanças, isto é, ao lado judaico do perigo que eles corriam; segundo, no verso 18, à filosofia gnóstica (5) a ciência (falsamente assim chamada) que se ligava ao Judaísmo (ou à qual o Judaísmo se aliava) e em cujo sedo se reproduzia sob uma nova forma. (5) Embora esta palavra tenha a aparência do saber e não pareça talvez característica, não é assim. A ciência, falsamente assim chamada, de que o apóstolo fala noutro lugar, é chamada, em Grego, “gnôsis”, e daí vem o nome de “gnosticismo” que se deu a essa presunçosa e corruptora filosofia, e de “gnósticos” aos seus sectários. Este sistema desempenha um imenso papel na História da Igreja, com a qual me não ocuparei aqui — mas os seus princípios encontram-se frequentemente no Novo Testamento, postos em evidência pelos apóstolos, para os combaterem. Os Judeus tinham-se deixado levar na crença da mediação dos anjos, embora não exatamente da mesma forma que a Filosofia Gnóstica. Depois do verso 20 o apóstolo aplica a nossa morte e a nossa ressurreição com Cristo aos princípios de que acabamos de falar, ou à libertação dos Colossenses, elevando os seus pensamentos ao Céu. Mas os Colossenses não eram os únicos que tinham de correr esse perigo. No fundo, esses mesmos princípios têm sido a ruína da Igreja em todo o tempo; são os princípios do mistério da iniquidade (6), que tanto tem amadurecido desde então, tendo produzido efeitos tão variados, com modificações tão diversas, em consequência de outros princípios que ali têm também atuado, sob a soberana Providência de Deus. Nos versos que se seguem veremos o princípio profundo, simples e decisivo, que se encontra envolvido no raciocínio do apóstolo sobre a questão de que nos ocupamos. (6) Esse mistério de iniquidade estava presente nos dias dos apóstolos. Paulo resistiu-lhe com a energia do Espírito Santo. Após a sua partida, esse poder faltou. A Igreja histórica não teve nunca os dois grandes princípios fundamentais do Cristianismo: A perfeição em Cristo (por uma única oferenda, Ele tornou-os perfeitos para sempre), e a presença e o poder direto do Espírito Santo neste mundo. Esses princípios foram suplantados pelos sacramentos e pelo clero. Os versos já citados, até ao vigésimo, tinham julgado todo esse sistema judaico-filosófico, do ponto de vista da obra de Cristo e da Sua ressurreição, assim como da união dos crentes com Ele, na Sua posição celestial. O que se segue julga esse mesmo sistema segundo a nossa posição atual. Os versos que precedem o verso 20 tinham demonstrado que o sistema era falso, porque Cristo e a Sua obra eram tal como são descritos nesses versos; o que vamos estudar mostra que esse sistema é absurdo e de maneira nenhuma pode ser aplicado a nós, por causa da nossa posição. Por um lado, esse sistema é falso e nulo em todas as suas partes, se Cristo é verdadeiro e se está no Céu; por outro, o sistema é absurdo na sua aplicação a nós, se somos Cristãos E eis porquê: Esse sistema supõe a vida neste mundo e relações com Deus a adquirir, relações que teriam o seu fundamento nesta vida, pretendendo mortificar a carne; e, não obstante, dirige-se a pessoas que, pela fé, estão mortas. Nós estamos — diz o apóstolo — mortos para os rudimentos deste mundo, para todos os princípios segundo os quais é dirigida a vida deste mundo; por que então, como se nós ali vivêssemos ainda, como se estivéssemos ainda em vida neste mundo, nos sujeitaríamos a ordenanças que se dirigem a esta vida e a supõem, a ordenanças que se ocupam das coisas que perecem enquanto nos servimos delas, e não têm nenhuma relação com o que é celestial e eterno? Elas têm, é verdade, uma aparência de humildade e de abnegação, para o que concerne ao corpo, mas não têm nenhuma ligação com o Céu, esfera da nova vida, de todos os seus motivos, de todo o seu desenvolvimento. Além disso, elas não reconhecem a honra da criatura como saída da mão de Deus e que, como tal, tem sempre o seu lugar e a sua honra. Colocam o homem na carne e sob a carne, pretendendo libertá-lo da carne, e separam o Cristão de Cristo, colocando os anjos entre a alma, a sua posição e a sua bênção celestes, ao passo que nós estamos unidos a Cristo, que está acima de todos esses poderes — e nós estamos n'Ele! Essas ordenanças ocupam- se das coisas inteiramente corruptíveis; não se ligam à nova vida, mas sim ao homem vivendo da sua vida carnal sobre a Terra, vida para a qual o Cristão está moralmente morto. E pelo que diz respeito a essa vida, não reconhecem o corpo como criatura de Deus, como deve ser feito. Assim, esse sistema de ordenanças não possuía Cristo, que era a sua substância. Prendia-se ao orgulho que pretendia penetrar no Céu, para se pôr em relação com seres que a gente não conhece de maneira a podermos entrar em relação com eles — orgulho que, fazendo assim, se separava da Cabeça do corpo, de Cristo, renegando assim toda a relação com a fonte da vida e a única verdadeira posição da alma perante Deus. Esse sistema falseava igualmente a posição do Cristão na Terra, tratando-o como vivendo da vida do velho homem, ao passo que o Cristão está morto; desonrava a criatura como tal, em lugar de a reconhecer, na sua qualidade de saída da mão de Deus. O que era um perigo para os Cristãos do tempo do apóstolo caracteriza a Cristandade do tempo em que nós vivemos. Assim, a posição do Cristão é verificada aqui, mas aplicando a verdade desta posição a afastar os perigos antes que a desenvolver os privilégios celestes do Cristão. Deste modo a graça nos proveu de tudo aquilo de que as nossas almas têm necessidade. Estende-se sobre os nossos privilégios, servindo-se da fé de uns — e fornece-nos advertências e instruções inapreciáveis aproveitando as faltas dos outros. CAPÍTULO 3 Começam agora as exortações diretas, fundadas sobre a verdade que tem sido apresentadas e adaptadas ao estado em que são considerados os Colossenses, isto é, como ressuscitados com Cristo, mas não assentados nos lugares celestiais. Ressuscitados com Cristo, eles devem pensar nas coisas que estão no Céu, onde Cristo está assentado à direita de Deus, e não naquelas que estão na Terra. As coisas celestiais e as coisas terrestres não podem andar juntas. Olhar ao mesmo tempo para cima e para baixo, ter ao mesmo tempo motivos no Céu e na Terra, é impossível. Ser tentado pelas coisas terrestres, ter de as combater, está bem; mas disso não é tê-las por objetos. Porém, a razão da abnegação das coisas deste mundo encontra-se na nossa posição; nós estamos mortos, e a nossa vida está escondida com Cristo em Deus. O apóstolo não diz que precisamos de morrer. O homem não pode fazê-lo pela simples vontade do homem; não pode renegar a vontade pela vontade. Aliás, a vontade da carne não o fará nunca; quando atua, não abdica! Nós estamos mortos! Esta é a preciosa e consoladora verdade a respeito do Cristão, em virtude de Cristoestar morto por ele. O Cristão recebeu a vida de Cristo — e tudo o que Cristo fez por ele nesta vida lhe pertence. Assim, ele está morto, porque Cristo está morto por ele. A vida, à qual a força da tentação, a culpabilidade, os ataques do pecado o ligam, já não existe para a fé. Pela morte, tudo o que se ligava a esta vida teve o seu fim. Ora, o que se ligava à vida do velho homem era o pecado, a condenação, a fraqueza, o medo, a impotência contra os ataques do Inimigo. Mas tudo isso passou! Nós temos uma vida, mas é em Cristo. Esta vida está escondida com Ele em Deus. Não estamos ainda manifestados na Sua glória, tal como o seremos um dia, perante todos, nos céus e na Terra. Por agora a nossa vida está escondida, mas em segurança, na sua origem eterna. Tem a sorte de Cristo, em Quem nós a possuímos. Ele está escondido em Deus, e de igual modo ali está também a nossa vida. Quando Cristo aparecer, nós apareceremos com Ele. Note-se que o apóstolo não fala aqui da nossa união com Cristo, mas sim da nossa vida, do fato de estarmos mortos e da nossa vida estar escondida com Ele em Deus. Paulo não fala da Igreja pelo que concerne à nossa posição; ele fala, sem dúvida, de Cristo como sendo o Chefe, pelo que concerne à Sua glória pessoal, mas não em relação conosco. De nós, fala individualmente. Cada qual tem a sua vida n'Ele, em Cristo, sem dúvida alguma, mas cada um a tem como sendo sua. Não é, a unidade com outros Cristãos que o apóstolo trata aqui. Nós temos esta vida em Cristo, mas isso não constitui a nossa união num só corpo com Ele. O que nos é apresentado aqui é o caráter individual do Cristão, para quem Cristo, Chefe no Céu, é tudo. O que é também muito importante de notar, em relação com esta verdade, é que, na epístola que agora estudamos, não se trata, em parte alguma, do Espírito Santo. O apóstolo fala aos Colossenses de uma maneira prática do amor deles no Espírito, mas no ensino da epístola não nomeia o Espírito Santo. Mesmo quando diz que não há nem Judeu nem Grego, etc., é do novo homem que se trata — e não porque somos um em Cristo. O indivíduo devia manter firme a Cabeça; ele já não está vivo neste mundo, mas sim morto, e a sua vida está escondida com Cristo em Deus. Mas esta verdade era, para ele, uma verdade pessoal; o que ele devia conhecer e preservar para si mesmo, como verdade necessária, para estar protegido contra as astúcias do Inimigo. Numa palavra, a vida em Cristo é a grande verdade que nos é aqui apresentada. Noutro lugar muitas das coisas de que o apóstolo fala aqui serão mencionadas como frutos do Espírito, por Quem a comunhão e a união são mantidas; mas aqui referem-se simplesmente à natureza da vida em que esses frutos encontram a sua origem. É, pois, muito natural que nos faltem aqui o alcance e a reunião num conjunto de todas as relações espirituais em Cristo que fazem parte da instrução divina, quando o Espírito Santo é introduzido. Na Epístola aos Efésios, a operação do Espírito Santo encontra-se por toda a parte e caracteriza o conjunto do que é desenvolvido em comunhão com a Cabeça, Cristo, com Quem nós estamos unidos num só corpo pelo Espírito. Assim, somos individualmente selados pelo Espírito da promessa, penhor da nossa herança. Temos todos acesso junto do Pai por um só Espírito. Somos também juntamente edificados para sermos uma habitação de Deus pelo Espírito. A união dos Gentios e dos Judeus num só corpo é revelada agora pelo Espírito. Os santos são fortificados pelo Espírito no homem interior. Há um só corpo e um só Espírito. Não devemos entristecer o Espírito. Devemos estar cheios d'Ele. A própria Palavra de Deus é a espada do Espírito. A unidade do corpo com Cristo, nossa ressurreição com Ele, o fato de estarmos assentados com Ele no Céu, numa palavra, tudo o que emana desta união é plenamente desenvolvido. Mas, ao mesmo tempo, o Espírito Santo que nos une a Ele e nos congrega num só corpo — o Espírito Santo, que, neste mundo, caracteriza a presença de Deus na Igreja — o Espírito Santo que atua em nós assegurados o nosso futuro e torna-Se a nossa força para o tempo presente. O Espírito. Santo, digo, encontra-se por toda a parte na epístola para completar a verdade e dar-lhe a sua força atual para nós neste mundo. Várias das exortações da Epístola aos Efésios são pouco mais ou menos as mesmas que as dirigidas aos Colossenses, mas, na Epístola aos Efésios, ligam-se ao Espírito, e em Colossenses ligam-se à ação da Palavra e da graça no coração. Isto dá um imenso alcance e muita unidade à doutrina da Epístola aos Efésios pelo que concerne à nossa posição neste mundo, porque o apóstolo introduz o próprio Deus — e Deus morando pelo Espírito em nós e enchendo-nos como indivíduos ou na unidade do corpo. É-nos também dada a conhecer ali toda a extensão dos desígnios de Deus. Mas a posse da vida é, por outro lado, tão importante como a presença do Espírito Santo e o fato d'Ele habitar no Cristão. Faz com que a bênção recebida seja a nossa própria pessoa, e não simplesmente uma operação em nós. E, como vimos, o caráter da vida divina é muito mais plenamente desenvolvido em Colossenses do que em Efésios; em Efésios encontramos sobre tudo o contraste com o estado precedente. Na Epístola aos Romanos encontramos, no capítulo 8, a ação e a presença do Espírito Santo, apresentadas de um modo muito notável quanto ao indivíduo. O Espírito caracteriza-nos vitalmente no princípio da nossa ressurreição. É a testemunha em nós de que somos filhos, enchendo-nos de alegria e da esperança da glória como herdeiros. Ele é o apoio da nossa fraqueza e a causa das nossas orações e dos nossos suspiros. Na Epístola aos Romanos o Espírito está em ligação com a nossa relação pessoal com Deus. Na Epístola aos Efésios Ele é apresentado como sendo a presença de Deus em nós, em relação com a nossa união com Cristo num só corpo. Há ainda uma coisa a notar aqui, que deita luz sobre a intenção do Espírito nestas epístolas. O ponto de partida na que é dirigida aos Efésios são os desígnios de Deus. O homem é considerado ali tal como ele é, de fato, sem um simples movimento de vida sequer acerca de Deus. Está morto em delitos e pecados, e, de sua natureza, filho da ira. Mas Deus é rico em misericórdia; ressuscita-o com Cristo, que, em graça, desceu à morte, e coloca-o, de harmonia com os Seus desígnios, na mesma posição em que Cristo Se encontra. Nós somos a Sua obra, criados de novo em Cristo Jesus. Deus quer colocar-nos perante a Sua face, segundo os Seus próprios desígnios e segundo a Sua natureza. Não nos é dito que estamos mortos com Cristo; o homem não é considerado como vivendo na carne, de sorte que, de uma maneira ou de outra, ele tivesse de morrer. Não é, pois, necessário desenvolver esta parte da verdade. Os Efésios estavam em condições de apreenderem, por um lado; o pleno contraste entre Deus e o homem segundo os Seus desígnios, e por outro, o estado de pecado em que o homem se encontrava segundo a sua natureza. Na epístola que lhes é dirigida; tudo é a obra do próprio Deus, segundo o desígnio original do Seu próprio coração, da Sua natureza e da Sua vontade (1). O homem está já morto, e o próprio Cristo não é apresentado em relação com o Seu lugar na glória antes de ter sido visto primeiro como morto e depois como ressuscitado e elevado aos altos céus. (1) É por isso que não encontramos a justificação em Efésios. Esta epístola trata de uma nova Criação. Os Colossenses estavam dispostos a sujeitarem-se às ordenanças, e, por conseguinte, no que concerne ao homem, como vivendo no mundo. O apóstolo faz-lhes sentir que nós estamos mortos com Cristo; via-se forçado a segui-los em graça lá onde eles estavam, porque havia, para eles, o perigo de tomarem o homem em consideração, como vivando na Terra. No entanto o seu objetivo era mostrar-lhes que o Cristão já está morto com Cristo, e com Ele ressuscitado, muito embora se encontre ainda na Terra. Em efésios, o homem não morre com Cristo. Está morto nos seus pecados quando Deus começa a agir a seu respeito.
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