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1 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA A avaliação radiográfica direcionada de uma determinada região, levando em consideração o mecanismo de trauma e as circunstâncias em que ocorreu. TERMINOLOGIA DAS FRATURAS: As fraturas são descritas e classificadas de acordo com sua localização, extensão, direção, posição e número de linhas de fraturas e fragmentos ósseos resultantes. Classificação: • Completa – apresenta solução de continuidade em todo o diâmetro ósseo o Simples: apresenta 1 linha de fratura com dois fragmentos ósseos o Cominutiva/cominuta: apresenta duas ou mais linhas de fratura. O grau de cominução geralmente se relaciona diretamente com a magnitude da energia envolvida no trauma. • Incompleta – apresenta um segmento da cortical intacto. • Fechada: apresenta a pele adjacente intacta. • Aberta: apresenta lesão da pele associada com ou sem exposição óssea. • Patológica: decorrente da presença de uma lesão óssea focal (benigna ou maligna). OSSOS LONGOS: Aquele em que o comprimento é maior que sua largura. Possuem uma articulação em pelo menos uma extremidade. De acordo com a localização, a fratura pode se localizar na: • Epífise • Metáfise • Diáfise – descrever se ocorre no terço proximal, médio ou distal. Direção da linha da fratura: depende da sua relação com o eixo longo do osso • Transversa – ocorre perpendicular ao eixo longo de um osso e geralmente é causada por uma força direta aplicada ao osso. • Longitudinal – ocorre paralela ao eixo longo. • Oblíqua – ocorre ao longo do eixo longo do osso, em uma angulação de cerca de 30 a 60°. Mecanismo geralmente é uma força compressiva no eixo longo, combinada com um arqueamento do osso. • Espiral – circunda o osso, geralmente causada por forças torcionais. Suas extremidades apresentam pontas afiadas. Em casos específicos, como na patela e na vértebra, a fratura pode ser classificada como horizontal ou vertical. A relação entre os fragmentos ósseos também deve ser avaliada: o alinhamento entre os fragmentos em relação ao deslocamento, angulação, rotação, encurtamento ou afastamento – descritos em relação ao fragmento distal. 2 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Fig 4: desvios – radiografia. Fraturas lineares completas transversas do rádio distal e do fêmur proximal, determinando angulação medial e deslocamento medial, respectivamente. Esta terminologia é sempre em relação ao fragmento ósseo distal. Fratura avulsiva: O fragmento ósseo é arrancado de uma proeminência óssea por uma força tensora na inserção de um ligamento ou tendão. A fratura de um osso longo também pode estar relacionada a um deslocamento entre as superfícies articulares, sendo chamada de: • subluxação quando há uma perda parcial do contato • luxação quando há perda completa do contato entre as superfícies articulares. Nesse caso, é chamada de fratura-luxação. Quando existe perda de contato entre uma sindesmose ou sínfise, o deslocamento é denominado diástase. OUTROS OSSOS: As fraturas dos ossos curtos (ossos do carpo e tarso), chatos (ilíaco, costela e calota craniana), irregulares (vértebras, púbis e ísquio), sesamoides e acessórios podem ser classificadas com a mesma terminologia utilizada para os ossos longos, e em diversos casos uma nova terminologia é aplicada. Fratura compressiva: uma porção do osso é dirigida em direção ao outro, como ocorre nas vértebras. 3 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Fratura-impactação: é semelhante a compressiva, porém descrita em ossos extravertebrais. FRATURAS ESPECÍFICAS DE CRIANÇAS: As diferenças nas propriedades biomecânicas do osso nas crianças em relação aos adultos propiciam a formação de vários tipos de fraturas incompletas, tais como as fraturas em galho verde e torus. Fratura em galho verde: Ocorre em razão de forças angulares, provocando tensão do lado convexo do osso e compressão no lado côncavo. É uma fratura incompleta na cortical convexa, estendendo-se por até a metade da circunferência do osso, semelhante à quebra de um galho verde com arqueamento do mesmo. Fig 10. Fratura em galho verde – radiografia. Radiografias do punho (frente e perfil) em criança de 10 anos demonstrando uma fratura em galho verde do rádio distal (setas), determinando uma angulação volar (cabeça de seta). Fratura em torus: É uma saliência na cortical óssea produzida por uma força compressiva, sendo frequentemente não diagnosticada. FRATURAS EPIFISÁRIAS: São mais comuns em crianças. São descritas de acordo com a classificação de Salter-Harris: Fratura tipo I: 4 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Separação metaepifisária, com a linha de fratura localizada na fise de crescimento. Na radiografia nota-se uma separação do centro de ossificação epifisário. Fratura tipo II: Mais comum. Caracterizada por uma linha de fratura na fise de crescimento, estendendo-se para a metáfise óssea. Fratura tipo III: Fratura da fise estendendo se para a epífise e superfície articular. Fratura tipo IV: 5 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Ocorre frequentemente no côndilo lateral do úmero em crianças menores que 10 anos. Apresenta orientação vertical, acometendo a metáfise, cartilagem de crescimento e epífise. Fratura tipo V: É rara. Corresponde a uma impactação da cartilagem de crescimento. Frequentemente não é vista na radiografia, manifestando-se tardiamente como encurtamento ósseo e deformidades articulares. RADIOLOGIA CONVENCIONAL: É essencial a realização de radiografias de alta qualidade com o apropriado posicionamento do paciente. O estudo radiográfico inicial deve incluir pelo menos dois planos distintos, obtidos em projeções de 90° de um em relação ao outro (frente e perfil). Dependendo da localização e morfologia da fratura, incidências adicionais podem ser necessárias. A fratura aparece como uma linha radiotransparente, podendo se manifestar como uma linha esclerótica nas fraturas compressivas. A presenc ̧a de alterações de partes moles na radio- grafia pode sugerir a fratura nos casos mais sutis. Essas alterações incluem borramento e/ou deslocamento das linhas gordurosas, aumento de partes moles e derrame articular. No entanto, esses achados são inespecíficos, podendo estar presentes apenas relacionados ao trauma, sem fraturas. Para a avaliação das fraturas, as radiografias digitais necessitam de uma alta resolução espacial para avaliar pequenos detalhes ósseos e a capacidade de avaliar te- cidos com valores de atenuação muito diferentes (osso e partes moles). Os novos aparelhos de conversão digital (CR) ou aquisição digital (DR) produzem imagens com uma resolução igual ou superior às obtidas de forma ana- lógica, por meio de filmes radiográficos. 6 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA: A TC apresenta grandes vantagens em relação às ra- diografias convencionais, pois elimina a superposição de estruturas nas imagens, tendo utilidade na avaliação de órgãos com uma anatomia complexa, difíceis de serem avaliados pelas radiografias simples. A TC multidetectores é hoje o método de escolha para o estadiamento das fraturas do esqueleto axial. A capacidade de obtenção de imagens multiplanares per- mite a localização exata das fraturas, a pesquisa de frag- mentos intra-articulares, luxações e uma mensuração precisa de desvios. RESSONÂNCIA MAGNÉTICA: É o método por imagem com melhor contraste entre osso, medula óssea, músculos, líquido, gordura e vasos. A RM é capaz de detectar a fratura, porém apresenta papel limitado em seu diagnóstico e estadiamento, pois existem métodos mais simples e comcusto menor para esse fim. No caso do estadiamento das fraturas, radiografia e TC são, na maioria das vezes, superiores a RM. O papel da RM é crucial no diagnóstico das fraturas ocultas. Essas fraturas não são visíveis na radiografia/TC. Diante disso, por conta do quadro clínico muito evidente para fratura ou suspeita de lesão em partes moles, uma RM é indicada e a fratura pode ser detectada, caracterizando a fratura oculta. A RM também pode ser indicada nos casos de suspei- ta de fraturas da fise de crescimento nas crianças e lesões osteocondrais nos adultos, pois é o melhor método para avaliação da cartilagem. Fig 20. Lesão da fise de crescimento – ressonância magnética. Imagens sagital e coronal de ressonância magnética do punho demonstrando alargamento e hipersinal da fise de crescimento. Indicando lesão (setas). Notar o aspecto normal da fise na imagem sagital (cabeça da seta). A maioria das fraturas são identificadas nas radiogra- fias simples, sendo necessário, por vezes, uma “segunda olhada” após o exame clínico do paciente. Quando a ra- diografia tecnicamente aceitável é normal, porém ainda existe a suspeita clínica de fratura, os métodos por ima- gem seccionais são indicados quando a decisão de con- duta é critica. 7 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Após 1 ou 2 semanas, a presença de consolidação da fra- tura torna fraturas não deslocadas visíveis na radiografia, em razão de um aumento da reabsorça ̃o óssea junto ao sitio da fratura. Existem critérios diagnósticos que podem ser utilizados para indicar racionalmente uma radiografia, baseados nos achados clínicos e em critérios funcionais. Como exemplo, temos as regras de Ottawa para o pé, tor- nozelo e joelho e de Pittsburgh para o joelho. A TC tem maior importância na avaliação do trau- ma do esqueleto axial (crânio, face, coluna e bacia), tendo papel limitado na avaliação inicial do trauma no esque- leto apendicular. No esqueleto apendicular, uma fratura observada na TC geralmente é visível na radiografia, po- rém com maiores detalhes na TC, também podendo ser utilizada no planejamento pré- operatório, por conta de sua capacidade multiplanar. No paciente politraumatiza- do grave, a TC pode ser utilizada na avaliação do crânio, coluna total, tórax, abdome total e pelve em razão de sua rapidez e menor necessidade de manipulação do pacien- te, em relação à radiografia. Porém, essa indicação ainda está limitada aos serviços que possuem um aparelho de TC com multidetectores, por conta de sua rapidez e capa- cidade diagnóstica. A RM é capaz de detectar uma fratura, porém tem pa- pel limitado no diagnóstico e na conduta, pois existem métodos mais simples e com menor custo para esse fim. A RM pode ser indicada quando a radiografia for normal, porém exista uma suspeita clínica de fratura (fraturas ocultas). Outra indicaça ̃o é na pesquisa de fraturas os- teocondrais, sendo possível, inclusive, avaliar o desloca- mento desse fragmento. Também é utilizada para avaliar a necrose pós-traumática de fragmentos ósseos, especial- mente na cabeça femoral, domus talar e escafoide proxi- mal, sendo o método mais sensível para detectar estágios mais precoces de osteonecrose. O comprometimento da cartilagem de crescimento (fise) também é bem avaliado pela RM. Outras indicações são: avaliação de uma fratura patológica, com o intuito de se verificar um tumor associado à fratura e também na avaliação de achados extraósseos associados ao trauma (partes moles – cartilagem, ligamentos, labruns, meniscos etc.). CONSOLIDAÇÃO DAS FRATURAS: Se inicia imediatamente após o evento, com formação de um hematoma e coágulos que realizam a hemostasia no sítio da fratura. Em cerca de 1-2 semanas, há formação de fibroblastos e tecido de granulação, que removem o hematoma. Nessa fase, também se inicia a ação de osteoclastos, removendo osso morto das superfícies de aposição da fratura. Ao mesmo tempo, também se inicia a ação dos condroblastos e osteoblastos com produção das matrizes óssea e cartilaginosa. Esse processo se inicia na periferia da fratura, formando uma “ponte” óssea ou fratura e demora de 4 a 16 semanas para se formar. Achados do reparo ósseo: O achado mais precoce do reparo ósseo aparece em 10 a 14 dias após o trauma, constituído pela radiolucência das superfícies ósseas junto ao foco de fratura, com borramento das margens de aposição. Em seguida, aparece o calo calcificado no foco de fratura, apresentando aspecto amorfo na periferia da fratura. O calo intramedular não é visibilizado nessa fase. Com o tempo, o calo vai aumentando sua densidade e à medida que há a fusão periférica, inicia-se a formação do calo central ou intramedular. 8 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA A evidência radiográfica de consolidação da fratura constitui a presença de uma “ponte” óssea externa, unindo os fragmentos ósseos. O tempo de consolidação óssea depende da idade do paciente e do osso fraturado. Como exemplos, em um adul- to, a consolidação de ossos curtos, como os metacarpos e a clavícula, ocorre em 3-4 semanas; a diáfise umeral em 6-8 semanas; a diáfise tibial em 10- 12 semanas e a diáfise femo- ral em 12-14 semanas. Nas crianças jovens, a consolidação de uma fratura do fêmur ocorre em cerca de 4 semanas, e os outros ossos se unem em tempos menores. PROBLEMAS NA CONSOLIDAÇÃO DAS FRATURAS: Consolidação viciosa: União defeituosa entre os fragmentos ósseos. Associada a importantes deformidades angulares ou rotatórias. Em adolescentes e adultos, normalmente é necessária uma correção cirúrgica, enquanto em crianças existe a possibilidade de correção com o próprio crescimento do osso. Falha na consolidação depende de fatores técnicos e/ou biológicos. Os fatores técnicos são responsáveis por cerca de 80% dos casos de não união e incluem uma aposição inade- quada entre os fragmentos ósseos e excesso de movimenta- ção entre os fragmentos. Os fatores biológicos são responsá- veis por cerca de 20% dos casos. Essa falha na consolidação pode ser: • Retardo na consolidação: caracterizado pela lentificação da união óssea – a consolidação ocorrerá em um ritmo mais lento. • Ausência de consolidação: não união – significa uma falha completa no processo de consolidação. É mais frequente em adultos. • Não união hipertrófica: quando existe esclerose nas extremidades dos fragmentos ósseos. 9 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA • Não união atrófica: quando existe mínima esclerose. Entre os fragmentos ósseos não fundidos, forma-se um tecido fibroso e uma saculação com líquido, dando o aspecto de uma articulação. Por esse motivo, a não união também é chamada de pseudoartrose. Lesões não diagnosticadas ou incompletamente diagnosticadas podem evoluir para incapacidades e sequelas irreversíveis. Para os pacientes de alto risco, atendidos nos centros avançados de trauma, já se utiliza a tomografia computadorizada (TC) multislice como primeiro exame radiológico, estudando-se a coluna vertebral simultaneamente ao crânio, tórax, abdome e bacia. Em decorrência do elevado custo operacional da TC, esse método não está disseminado em todas as regiões, e a radiografia simples continua sendo o primeiro método de imagem utilizado na maior parte do nosso país, apesar de sua inferior capacidade diagnóstica. A ressonância magnética (RM), por sua elevada resolução e diferenciação dos tecidos moles, fica reservada para o estudo das lesões da medula espinal, ligamentos, discos intervertebrais e vasos, nem sempre possível de ser realizada na fase aguda do politraumatizado grave em decorrência da incompatibilidade dos aparelhosde suporte a vida com o campo magnético e condições clínicas do paciente. As vértebras mais frequentemente envolvidas nas lesões traumáticas são C4, C5, C6 e T11, T12, L1, ou seja, o segmento cervical inferior e a transição dorsolombar. As lesões da medula espinal estão associadas às fraturas e luxações vertebrais em 10-14% de todos os casos, e os déficits neurológicos ocorrem preferencialmente no segmento cervical, 10 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA contabilizando 40% dos casos. ANATOMIA E BIOMECÂNICA: Os ligamentos longitudinais anterior, posterior e amarelo, cápsula fibrosa das articulações facetárias, interespinhosos e supraespinhosos são os principais responsáveis pela estabilidade biomecânica da coluna vertebral. De particular importância são os quatro últimos ligamentos que podem ser considerados como estrutura única do ponto de vista funcional e formam o complexo ligamentar posterior. A transição craniocervical, por permitir amplo movimento de rotaça ̃o entre a cabeça e a coluna, possui anatomia ós- sea e articular diferenciada quando se observam os côn- dilos occipitais, atlas e a ́xis. A anatomia ligamentar dessa região tambe ́m é especializada, sendo a membrana tecto- rial, o ligamento transverso do atlas e o ligamento alar os principais componentes estabilizadores. Mecanismo de trauma: Forças maiores que as fisiologicamente suportadas pela coluna durante o trauma resultam nas hiperflexões, hiperextensões, hiperrotações, sobrecarga axial e distrações. Tais forças, agindo isoladamente ou em conjunto, produzem padrões de lesões que se repetem de acordo com o mecanismo de trauma apropiado. TRÊS COLUNAS: • Coluna anterior: fazem parte o ligamento longitudinal anterior, o ânulo fibroso e os dois terços anteriores dos corpos vertebrais e discos. • Coluna média: estão localizados o ânulo fibroso, o ligamento longitudinal posterior e o terço posterior dos corpos vertebrais e disco. • Coluna posterior: constituída pelos arcos posteriores, processos espinhosos, apófises articulares e ligamentos posteriores. 11 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA As lesões que acometem duas ou três colunas ou apenas a coluna média são consideradas instáveis. Durante o trauma em flexão, quando o fulcro de movi- mento ocorre sobre a coluna média, a coluna anterior sofre uma força de compressão e a coluna posterior uma força de tração. Quando o fulcro de movimento ocorre sobre a co- luna anterior, uma força de distração ocorre sobre as outras duas colunas. O inverso ocorre durante o trauma em ex- tensão com força de tração atuando sobre a coluna anterior e força de compressão sobre a coluna posterior, nos casos de fulcro sobre a coluna média. Se o fulcro de movimento ocorrer sobre a coluna posterior, uma força de distração atingirá as colunas anterior e média. Fulcro do movimento = ponto vermelho. Mais de um mecanismo de trauma pode ocorrer no mesmo paciente, especialmente aquelas vítimas de politrauma. ASPECTOS DE IMAGEM: Na suspeita de trauma de coluna, as radiografias de- vem ser obtidas com a menor mobilização possível do paciente. As incidências em perfil e anteroposterior são obrigatórias, sendo realizadas sem mudança de posicionamento. A radiografia simples é suficiente nos pacientes de baixo risco, sem a necessidade de investigação adicional por imagem. Os pacientes conscientes, orientados e sem dor cervical ou déficit neurológico são considerados de baixo risco. TC e/ou RM estão indicadas em todos os pacientes de alto risco nos quais as radiografias simples tenham sido inconclusivas ou apresentem déficit neurológico, não permitindo o correto diagnóstico e conduta. A avaliação do alinhamento vertebral da coluna se faz por meio da radiografia em perfil. No estudo específico da coluna cervical, a radiografia deve incluir desde a base do crânio até a primeira vértebra torácica. As quatro linhas principais a seguir devem ser observadas: • Linha anterior topograficamente correspondendo ao ligamento longitudinal anterior. • Linha posterior correspondendo ao ligamento longi- tudinal posterior • Linha espinolaminar na junção das lâminas com os processos espinhosos. • Linha que une a ponta dos processos espinhosos. Na radiografia com incidência anteroposterior obser- vam-se os processos espinhosos que devem estar alinha- dos e sem desvios rotacionais. Os dois pontos mais críticos na análise radiográfica cervical são a transição craniocervical e transição cervicotorácica em decorrência de sobreposição de estruturas como a mastoide, base do cra ̂nio e mandíbula na primei- ra e ombros sobre a segunda. As lesões traumáticas da transiça ̃o craniocervical, embora infrequentes, são potencialmente fatais no local do acidente, dada a associação com lesão alta da medula espinal ou bulbo evoluindo com grave instabilidade cardiorrespiratória. Os casos que chegam ao hospital frequentemente não são diagnostica- dos na radiografia, na fase aguda do trauma, em virtude da sobreposição de estruturas já descritas. A maioria das lesões traumáticas da transição cervicodorsal são estáveis, não necessitando de tratamento cirúrgico específico, sendo difícil diagnosticá-las na radiografia simples também pela sobreposição de estruturas. A TC é o me ́todo superior à radiografia simples no diagnóstico de fraturas desses dois segmentos, devendo ser realizada o mais breve possível, assim que as condições clínicas do paciente de alto risco permitirem. A RM, quando realizada na fase aguda do politrau- matizado, deve incluir um protocolo reduzido com duas sequências sagitais, sendo uma pesada em T1 e a outra em T2, esta última preferencialmente com supressa ̃o de gordura. Com essas duas seque ̂ncias ja ́ é possível analisar com bastante precisão a medula espinal, excluin- do ou confirmando a presença de lesão. A RM permite classificar as lesões da medula espinhal em transecções parciais, completas ou apenas contusão de acordo com o aspecto morfológico e intensidade de sinal nas diferentes sequências. Outros achados, como hematomas pré- ver- tebrais ou epidurais, derrame articular facetário, hérnias discais traumáticas, lesões dos ligamentos longitudinais e do complexo ligamentar posterior também são diagnós- ticados pela RM. Além disso, caso as condiço ̃es clínicas do paciente permitam, recomenda-se realizar mais duas sequências, uma orientada no plano coronal e a outra no axial, ambas ponderadas em T2. O diagnóstico de fratu- ra não é o objetivo principal da RM no politraumatizado grave, muito embora sua alta sensibilidade para edemas chame a atenção do radiologista para os locais de 12 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA fratura, sendo fundamental a correlação com a TC para a correta interpretação dos achados. Na fase cro ̂nica, a RM é um importante aliado para os diagnósticos de degenerações císticas, atrofias e mielomalácias da lesão medular. Diferentemente do politraumatizado, a RM tem papel fundamental na fratura por insuficiência do idoso, em que, além do colapso vertebral, a presença ou ausência de edema ósseo define a natureza aguda ou crônica da fratura correlacionando-se ao quadro de dor, com implicações diretas na conduta terapêutica do paciente. LESÕES TRAUMÁTICAS DA COLUNA VERTEBRAL: Separa por regiões anatômicas - segmentos cervical, torácico e lombar, que apresentam características anatômicas e funcionais específicas. Mecanismo de trauma e faixa etária ajudam no diagnóstico. Os pacientes idosos são mais susce- tíveis aos traumas em hiperextensão em decorrência de quedas caseiras da própria altura, sem o reflexo de prote- ção das mãos,com impacto da cabeça ou face diretamen- te ao solo, paredes ou mobiliário a sua volta. As crianças, pelo tamanho proporcionalmente grande da cabeça em relação ao corpo, estão mais suscetíveis às lesões da tran- sição craniocervical. Nos adultos jovens predominam os traumas em hiperflexão ou a combinação de mais um tipo de mecanismo, dada a grande associação com aci- dentes automotivos de alta energia. CERVICAL: É subdividido em • segmento superior: Côndilos occipitais, áxis e atlas – está incluída a transição crânio-cervical. • inferior: desde a terceira vertebra cervical até a primeira torácica – inclui a transição cervicotorácica. Inicia-se a análise sistemática de cima para baixo para que nenhuma parte seja esquecida. COLUNA CERVICAL SUPERIOR: Luxações e subluxações da transição craniocervical: As lesões da transição craniocervical têm alto índice de mortalidade no local do acidente por associação com lesão do segmento superior da medula espinal ou bulbo, comprometendo os centros de ativação respiratório e cardíaco. As rupturas dos ligamentos alar, transverso do atlas e membrana tectorial ocorrem por forças de tração e rotação, sendo os principais responsáveis pelas instabilidades mecânicas da transição craniocervical, sempre com importante déficit neurológico ou vascular. As luxações e subluxações craniocervicais podem ocorrer: • entre a base do crânio (côndilos occipitais) e a primeira vértebra cervical (atlas), • entre o atlas e a segunda vertebra cervical (áxis) • ou ainda simultaneamente em ambos Luxações atlanto-occipitais: quando roturas da membrana tectorial e do ligamento alar permitem deslocamentos verticais da cabeça em relação à coluna. 13 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Luxações atlantoaxiais: além da membrana tectorial e do ligamento alar, ocorrem lesões da cápsula articular e do ligamento transverso – permitindo deslocamento superior e anterior da cabeça em relação à coluna, associado ocasionalmente a fratura do ápice do processo odontoide. O diagnóstico das lu- xações craniocervicais é relativamente fácil de ser cor- retamente caracterizado na radiografia em virtude dos grandes deslocamentos do crânio em relação à coluna. As subluxações, por sua vez, têm achados de imagem mais sutis, sendo frequentemente não diagnosticadas na radiografia no atendimento inicial, somente na TC. Uma dica importante é observar a interface da co- luna na área com os tecidos moles da nasorretrofarin- ge, que tende a “seguir” o contorno ósseo, assumindo morfologia sinuosa. O aspecto normal dessa interface é discretamente convexo na topografia do arco anterior de C1 e ligeiramente côncavo ou relativamente plano logo acima e logo abaixo. Distorções e abau- lamentos dessa interface no paciente traumatizado, mesmo sem a caracterização de fraturas, sugerem que há um hematoma da retrofaringe secundário à lesão da transição craniocervical, sendo necessário avanc ̧ar nos métodos diagnósticos, além da radiografia simples. No plano vertical deve-se observar a distância entre o ápice do odontoide e o ápice do clivus, que tem valor normal de no máximo 12 mm. No plano horizontal de- ve-se observar o posicionamento do clivus em relaça ̃o à linha axial posterior de C2. O clivus pode normalmente estar localizado até 12 mm anteriormente ou 4 mm pos- teriomente a linha axial de C2. O intervalo atlantodental anterior mede até 3 mm nos adultos e deve apresentar superfícies corticais paralelas. 14 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA A faixa etária pediátrica, embora incomum, tem um risco aumentado de lesões da transição craniocervical, sobretudo as luxações atlanto- occipitais, em decorrência de côndilos occipitais ainda não totalmente desenvolvidos e tamanho relativamente grande da cabeça em relação ao corpo. Em virtude de frouxidão ligamentar fisiológica, as crianças com até 8 anos de idade podem apresentar imagens radiológicas extremamente intrigantes e que comumente são confun- didas com lesões traumáticas. O intervalo atlantodental anterior, por exemplo, pode na ̃o ter superfícies corticais paralelas assumindo configu- raça ̃o em “V” e com distância máxima de 5 mm. A pseu- dossubluxação C2-C3 é outra armadilha radiológica que não deve ser confundida com lesão traumática, sendo a análise do posicionamento do arco posterior de C2 em relação a C1 e C3 (linha espinolaminar) a chave para o correto diagnóstico. Côndilos occipitais: As luxações ou subluxações craniocervicais podem ser acompanhadas de fraturas, em especial as dos co ̂ndilos occipitais. As fraturas dos côndilos occipitais são classificadas em: • fraturas impactadas • extensão de fraturas do occipício • fraturas avulsivas nas inserções dos ligamentos alares. As últimas são potencialmente instáveis quando há fragmentos ósseos deslocados. 15 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA É extremamente difícil diagnosticar fraturas dos co ̂ndilos occipitais na radiografia e muitas vezes nos surpreendemos na TC com fraturas uni ou bilaterais que se estendem ao redor do forame magno. Na faixa etária adulta, variantes da normalidade, como sincondrose dos côndilos occipitais, podem ser confundidas com fratura quando se analisam apenas imagens axiais de TC, contudo nos planos sagitais e coronais. O correto diagnóstico é feito observando-se uma incisura na face articular inferior dos co ̂ndilos, habitualmente bilateral, simétrica e com cortical bem definida. Fig 14. Sincondrose occipital bilateral (setas vermelhas). A e B: tomografia computadorizada (TC) no plano axial. C e D: TC no plano sagital das massas laterais à direita e à esquerda. Atlas: Tipo particular de fratura dos arcos anterior e posterior de C1 que ocorre por uma força vertical sobre o vértice da cabeça no exato momento em que a coluna cervical está em posição neutra. Essa força vertical passa pelos côndilos occipitais, e em decorrência da disposição geométrica das superfíceis arti- culares dessa região, tem como resultante uma força que se dissipa lateralmente deslocando as massas laterais de C1 e rompendo o ligamento transverso do atlas. 16 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Fig 15. Forças sobre a transição craniocervical e disposição geométrica das superfícies articulares na fratura de Jefferson. Classicamente, observa-se fratura instável bilateral dos arcos anterior e posterior do atlas. Fig 16. Fratura clássica de Jefferson em desenho esquemático. Variações do tipo fratura unilateral de ambos os arcos também ocorrem secundárias a pequenas rotações ou flexões laterais da cabeça no momento exato do trauma. Fig 17. Fratura unilateral de Jefferson. A: Tomografia computadorizada (TC) no plano coronal com deslocamento da massa lateral esquerda (Seta vermelha). B: TC no plano sagital com subluxação C1- C2 (seta azul) secundária a lesão do ligamento transverso e redução do canal vertebral (asterisco). A tração do ligamento longitudinal anterior é o segundo tipo de mecanismo de trauma sobre o atlas com fratura avulsiva do polo inferior do arco anterior, que deve ser diferenciada do centro de ossificação secundário não fundido. Hematoma pré-vertebral, contornos irregulares e não corticalizados do fragmento ósseo são típicos da fratura avulsiva. A fratura do arco posterior do atlas, por compressão do occipício contra o arco posterior de C2 durante hiperextensões forçadas da coluna, é a terceira possibilidade de mecanismo de trauma sobre o atlas. As duas últimas fraturas descritas são consideradas estáveis mecânica e neurologicamente. Subluxação rotatória C1-C2: Desvios rotacionaisatlas-áxis são frequentemente ob- servados na TC da coluna cervical, sendo na maioria das vezes secundários a torcicolos ou posicionamento inadequado do paciente, com movimentos naturais fisiológicos de rotação e inclinação lateral da cabeça durante a realização do exame. Figura 18 Desvio rotacional C1-C2 por posicionamento inadequado do paciente. A: Tomografia computadorizada (TC) no plano axial com linhas de referência nos eixos de C1 e C2. B: TC no plano coronal com assimetria do intervalo atlantodental lateral (asterisco). C e D: TC no plano sagital das massas laterais direitas e esquerdas com “translação” unilateral (seta vermelha). Nos pacientes com trauma, o diagnóstico diferencial se faz com subluxação rotatória C1-C2 que sempre envolve algum grau de lesão ligamentar ou capsular com deslocamento incompleto das articulações, o que gera dor local importante. Os achados de imagem na radiografia e na TC são muito semelhantes nas duas condiço ̃es, sendo que derrame e aumento do espaço articular entre as massas laterais de C1-C2 e edema de partes moles periarticular nem sempre são fáceis de serem caracterizados à TC e favorecem o diagnóstico de subluxação rotatória traumática. A investigação complementar com RM estará sempre indicada nos pacientes conscientes com dor persistente ou nos inconscientes, ambos pós-trauma com achados de radiografia ou TC inconclusivos. Áxis: A espondilólise traumática típica, mais conhecida como fratura do enforcado, ocorre por hiperextensão abrupta e forçada da cabeça com impacto violento do occipício contra o processo espinhoso e arco posterior de C2, fraturando os istmos vertebrais (pars interarticularis). 17 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Figura 19 Lise traumática de C2 com fratura dos istmos vertebrais (setas vermelhas) e hematoma retrofaríngeo (seta azul). A: Radiografia em perfil. B: Tomografia computadorizada (TC) no plano axial. C: TC no plano sagital do istmo vertebral direito. D: TC no plano sagital do istmo vertebral esquerdo. O termo fratura do enforcado não é o mais correto porque esse tipo de lesão também ocorre nas que- das de altura e acidentes automotivos quando, sem o uso do cinto de segurança, há impacto craniofacial sobre o volante ou para-brisa do veículo. Existe também a espondilólise traumática atípica, que é caracterizada por um traço de fratura que se estende pela borda posterior do corpo vertebral de C2 e massas laterais. Figura 20 Espondilólise traumática atípica em fase de consolidação com fratura dos istmos (setas azuis) que cruza a borda posterior do corpo vertebral (setas vermelhas) associado a fratura da borda anterior (seta verde). A e B: Tomografia computadorizada (TC) no plano sagital dos istmos vertebrais direito e esquerdo. C: TC no plano sagital mediano. D: TC no plano axial. Utiliza-se a classificação de Efendi para os desvios e deslocamentos dos fragmentos. O processo odontoide é o outro local de C2 em que podem ocorrer fraturas classificadas em três tipos: O tipo I ocorre no ápice do odontoide no local de inserção do ligamento alar. Fig 21. fratura do odontoide tipo I no “ápice” (seta azul) e subluxaça ̃o atlantoaxial com assimetria dos intervalos atlantoden- tais anterior (seta vermelha) e lateral (asterisco) indicando lesão ligamentar associada. A: Tomografia computadorizada (TC) no plano sagital. B: TC no plano coronal. O tipo II ocorre na base do odontoide, sendo o mais frequente dos três, evolui com 30-40% de pseudoartrose nos tratamentos conservadores e é mecanicamente instável. 18 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Figura 22 Fratura do odontoide tipo II com pseudoartrose (seta azul), luxação anterior C1-C2 e estenose do canal vertebral (asterisco). A e B: Tomografia computadorizada (TC) no plano axial. C: TC no plano sagital. O tipo III ocorre na porção superior do corpo do áxis e tem menor incidência de pseudoartrose quando comparado ao tipo II. Figura 23 Fratura do odontoide tipo III na parte superior do corpo do áxis com desvio (seta vermelha) e esclerose (seta azul). A: Radiografia em perfil. B: Tomografia computadorizada (TC) no plano sagital. C: TC no plano coronal. COLUNA CERVICAL INFERIOR: Mecanismo de lesão mais frequente é a hiperflexão. Adolescentes e adultos jovens são os que apresentam maior risco para esse tipo de lesão, pois estão mais expostos aos politraumatismos causados por acidentes automotivos. Lesões exclusivamente ligamentares, exclusivamente ósseas ou uma combinação entre as duas é o que se encontra nos exames de imagem, portanto não se deve procurar apenas por fraturas, mas também desalinhamentos e deslocamentos dos corpos vertebrais, facetas articulares e processos espinhosos. Fratura em cunha simples: Provocada por força em flexão sobre a coluna cervical. Nota-se fratura impactada do platô anterossuperior com o corpo vertebral, assumindo morfologia em cunha. Como normalmente não há lesão ligamentar asso- ciada, em 6 a 8 semanas espera-se que haja consolidação da fratura no tratamento conservador. Fig 24. Fratura em cunha simples de C7 (Seta preta). A: desenho esquemático. B: radiografia em perfil com redução da altura da parede anterior e pequena fratura do platô anterossuperior. Quando há lesão do complexo ligamentar posterior, uma vértebra pode escorregar e rodar anteriormente no eixo sagital em relação à vértebra vizinha, sendo conhecida como subluxação anterior com ou sem fratura dos elementos ósseos. Translaça ̃o anterior de uma vértebra sobre a outra e incongruência das superfícies articulares das facetas são os achados principais. Instabilidade tardia é uma possibilidade de complicação quando se opta pelo tratamento conservador, pois mesmo sendo uma lesão de tecidos moles, sabe-se que em 20-50% dos casos não ocorre a cicatrização ligamentar. Muitos têm preferido a fusão posterior cirúrgica como tratamento de escolha inicial. É preciso estar atento aos casos de subluxação anterior leve com achados de imagem sutis e que podem passar despercebidos no atendimento inicial, evoluindo para acentuada translação vertebral e possível dano medular, antes inexistente. 19 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Figura 25 Subluxação anterior C5-C6 (seta azul). Incongruência parcial (setas vermelhas) e perda do paralelismo das articulações facetárias (linhas pretas) com aumento do espaço interespinhoso (asterisco). A: Radiografia em perfil. B: Tomografia computadorizada (TC) no plano sagital mediano. C e D: TC no plano sagital das facetas articulares direitas e esquerdas. As lesões ligamentares isoladas do complexo posterior podem não ser acompanhadas de subluxação dos corpos vertebrais ou fraturas na radiografia e a persistência de dor, mesmo após o uso de analgésicos, é um indicativo de que será necessário continuar a investigação diagnóstica. Na RM, o edema de partes moles na topografia dos ligamenos inter e supraespinhosos, bem como pequeno derrame articular facetário, faz o diagnóstico de lesão do complexo posterior (Figura 26B). A cicatrização ligamentar e a regressão do edema podem ser acompanhadas evolutiva- mente por RM (26C). Figura 26 A: Lesão do complexo ligamentar posterior. Radiografia dinâmica com alinhamento vertebral mantido e espondilose em C5-C6. B: Lesão do complexo ligamentar posterior em C6-C7 com edema nos ligamentos supra e interespinhosos e derrame facetário (setas). C: Alterações cicatriciais do complexo ligamentar posterior e regressão do edema (setas). A luxação facetária bilateral ocorre por ação de for- c ̧as em flexão de maior intensidade aplicadas à coluna com maior dano ligamentar e, consequentemente,maior translação vertebral. Também é conhecida como faceta presa bilateral, altamente instável, reduzindo o calibre do canal vertebral e com alto índice de lesão medular em 75% dos casos (Figura 27A e B). As facetas articulares não mais estão justapostas, sendo descritas como descobertas associadas a deslocamento de 50% do corpo vertebral envolvido em relação à largura anterior do corpo vertebral subjacente (Figura 27C). Durante o trauma, se além da flexão houver movimento de rotação associado, pode ocorrer a luxação facetária unilateral, menos grave que a bilateral, com translação anterior do corpo vertebral menor que 50% e lesão do complexo ligamentar posterior, porém raramente com déficit neurológico (Figura 28). Trabalhadores braçais de enxadas, pás e outros objetos são suscetíveis a um tipo particular de mecanismo de trau- ma que acontece por hiperflexão brusca, forçada e voluntá- ria da coluna com fratura do processo espinhoso de C7 ou de seus vizinhos (Figura 29). Tal fratura é estável e não requer tratamento cirúrgico, apenas imobilização temporária. 20 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA A fratura em gota de lágrima é secundária à com- binação de duas forças no momento do trauma, sendo frequente nos mergulhos em água rasa. Carga axial e hiperflexão ocorrem simultaneamente por impacto da cabeça ao solo com o pescoço em posiça ̃o flexionada. Há lesão completa de todos os ligamentos, rotura do disco intervertebral, fratura da borda anteroinferior do corpo vertebral, subluxação ou luxação facetária associada a instabilidade e lesão medular grave. Figura 30 Mergulho em água rasa com deslocamento posterior do corpo vertebral de C5 (seta preta) associado a fragmento ósseo na sua borda anteroinferior (seta azul) e fragmentos ósseos no canal vertebral (seta vermelha). A: Tomografia computadorizada com reconstrução sagital. B: Ressonância magnética (RM) de baixo campo no plano sagital T1. C: RM de baixo campo no plano sagital T2. Uma carga axial sobre a coluna no exato momento que está em posição neutra causa a fratura explosiva do corpo vertebral. Essa força pode ser transmitida ao dis- co intervertebral implodindo o platô vertebral e aumen- tando a pressão no interior do corpo vertebral, a qual é dissipada explodindo em todas as direções. Os principais achados são fratura cominutiva do corpo vertebral com redução da altura, fratura do arco posterior, retropulsão de fragmento ósseo para o interior do canal vertebral e lesão medular em 50% dos casos. Figura 31 Fratura explosiva de C7 na radiografia em perfil com redução da altura central do corpo vertebral (setas azuis). A: Radiografia em perfil da coluna cevical. B: Radiografia em perfil localizada da transição cervicotorácica. Figura 32 Fratura explosiva de C6 com redução da altura predominando na porção central (seta azul), fratura do corpo vertebral com traços orientados nos planos sagitais e coronais (setas vermelhas), fratura da junção espinolaminar (seta preta) e fraturas das apófises articulares (setas brancas). A: Tomografia computadorizada (TC) no plano axial. B: TC no plano sagital. C: TC no plano coronal. Na transição cervicotorácica sabe-se que a maioria das fraturas ocorrem nos processos tranversos, espinhosos e arcos costais sem a necessidade de fixação, e tem pouca importância clínica, porém sendo de difícil caracterização na radiografia por sobreposição dos ombros na radiografia em perfil (Figura 33). Não se recomenda tração dos ombros na tentativa de melhorar as imagens, pois pode agravar possíveis lesões ainda não diagnosticadas. Em substituição, recomenda-se a incidência radiográfica do nadador ou TC nos casos suspeitos. Figura 33. Fratura de processo transverso (seta azul) e costela (seta vermelha) na transição cervicotorácica à tomografia compu- tadorizada. A: Janela intermediária. B: Janela óssea. Os traumas em hiperextensão da coluna cervical são menos frequentes que as hiperflexões, e o achado princi- pal é a rotação e/ou translação posterior de uma vértebra sobre a outra no plano sagital. Há 21 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA impacto craniofacial sem a proteção das mãos. Escoriações e fraturas faciais dão a dica para o mecanismo de hiperextensão e usual- mente são acompanhadas da síndrome medular central com hematoma dos tecidos moles pré-vertebrais. A lesão do ligamento longitudinal anterior associa-se a ruptura do disco intervertebral. A causa mais frequente é acidente automotivo em que o motorista ou passageiro não usa o cinto de segurança. Idosos, por sua vez, estão mais pro- pensos ao mecanismo de hiperextensão cervical em que- das da própria altura, escadas e outros acidentes domés- ticos de menor energia com impacto craniofacial no chão ou paredes. A característica principal na lesão da coluna cervical do idoso é a ausência de achados radiográficos de trauma. Alterações sutis como discreto aumento assimé- trico do espaço discal e pequeno hematoma pré-vertebral podem ser os únicos sinais identificáveis na radiografia. A osteoartrose cervical, presente na grande maioria da população idosa, é um fator complicador de trauma tanto para o diagnóstico radiológico quanto para a gravidade das lesões. Alterações ósseas degenerativas são facilmen- te confundidas com fraturas. O enrijecimento da coluna cervical associado à estenose degenerativa do canal vertebral aumenta a chance de lesão medular no idoso, mesmo sem a evidência radiográfica de fratura (Figura 34). Embora menos frequentes, as hiperflexões também ocorrem no idoso e as lesões são agravadas pelas alterações degenerativas. Figura 34 Trauma cervical em extensão no paciente idoso com artrose e estenose degenerativa do canal vertebral, hematoma pré- -vertebral (seta vermelha) e contusão medular (seta azul). A: Tomografia computadorizada no plano sagital sem evidência de “fratura”. B: Ressonância magnética (RM) no plano sagital T2. C: RM no plano sagital T2 com supressão de gordura. COLUNAS TORÁCICA, TORACOLOMBAR E LOMBAR: Muitos conceitos estabelecidos para a coluna cervical também se aplicam aos demais segmentos. O predomínio de mecanismo de trauma como flexão, rotação e tração associado a particularidades anatômicas do esqueleto ósseo de cada região produz menos tipos de lesão quando comparado ao segmento cervical. Três segmentos distintos devem ser considerados: • torácico de T2 a T11 (T1 faz parte do segmento cervical), • toracolombar de T12 a L1 e • lombar de L2 à articulação lombossacral. COLUNA TORÁCICA: A atitude cifótica relativamente fixa da coluna toráci- ca é uma característica importante a ser considerada no mecanismo de trauma, pois forças de compressão verti- cal (carga axial) automaticamente resultam em fratura em cunha semelhante às que ocorrem nas hiperflexões. Quando associado a forças de tração e/ou rotação, o re- sultado é fratura-luxação vertebral. Essas fraturas podem ser simples, apenas com redução da altura anterior do corpo vertebral, ou mais graves, com maior achatamento, retropulsão de fragmentos ósseos para o canal vertebral e luxac ̧ão das articulações facetárias. As fraturas explo- sivas, portanto, não ocorrem na coluna torácica. Hema- tomas paravertebrais focais ou difusos, uni ou bilaterais são marcadores importantes de tênues fraturas de difícil caracterização até fraturas-luxações maiores (Figura 35). Figura 35. Fratura de coluna torácica (seta vermelha) com hematoma paravertebral (seta azul). A: Tomografia computadorizada (TC) plano axial. B: TC plano coronal. COLUNAS TORACOLOMBAR E LOMBAR: A transição toracolombar de T12a L1 marca a tran- sição de um segmento torácico relativamente rígido para o segmento lombar mais flexivel, sendo o local mais frequentemente acometido de todas as vértebras torácicas e lombares. Forças isoladas de hiperflexão, hiperextensão, compressão vertical, tração ou combinações de hiperflexão com tração e hiperextensão com tração atuam em ambos os segmentos toracolombar e lombar de maneira semelhante (Figura 36). 22 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA Figura 36 Fratura-luxação na transição toracolombar com translação anterior de T12 sobre L1 (seta vermelha), redução do canal vertebral (seta azul), luxação facetária bilateral (setas verdes) e fragmento ósseo no canal vertebral (seta branca). A: Tomografia com- putadorizada no plano sagital. B: TC no plano axial. Hiperflexão resultando em fratura em cunha semelhante à descrita no segmento dorsal é o mecanismo de trauma mais comum (Figuras 37 e 38). Figura 37. Fratura do corpo vertebral de L2 com redução da altura anterior (setas azuis). A: Radiografia digital em perfil. B e C: Tomo- grafia computadorizada com reconstruções tridimensionais. Figura 38. Fratura em cunha recente do corpo vertebral de L2 (seta azul) com edema ósseo (seta vermelha). A: Ressonância mag- nética (RM) no plano sagital T1. B: RM no plano sagital T2. Um tipo particular de hiperflexão é a fratura de Chan- ce, classicamente descrita em 1948, que ocorre quase exclusivamente na transição toracolombar, porém com fulcro de rotação sobre a parede abdominal fixa ao cinto de segurança de dois pontos dos automóveis (Figura 39). Figura 39. Fratura de Chance com traço orientado no plano horizontal cruzando o processo espinhoso (seta azul), lâminas (seta ver- melha) e corpo vertebral com redução da sua altura (seta verde). A: Tomografia computadorizada (TC) plano sagital. B: TC plano coronal. Com o advento do cinto de segurança de três pontos, que fixa o tronco, a incidência desse tipo de lesão diminuiu bastante, ocorrendo atualmente em mecanismo de hiper- flexão grave por queda de altura. Fraturas horizontais do processo espinhoso, lâminas, pedículos e corpo vertebral são achados típicos. Diferentemente de outros tipos de lesão em flexão, a fratura de Chance tem alta associação com lesões intra ou retroperitoneais, como pancreáticas, duodenais e mesenteriais. Uma variante rara da fratura de Chance clássica é a Chance de partes moles, com extensa lesão ligamentar da coluna 23 Laís Flauzino | DIAGNÓSTICO POR IMAGEM | 5°P MEDICINA determinando translação an- terior do corpo vertebral e luxação facetária uni ou bilate- ral. As colunas toracolombar e lombar, por apresentarem maior flexibilidade e permitirem a posição neutra, po- dem sofrer força de compressão axial, resultando na fra- tura explosiva clássica semelhante àquela da coluna cer- vical. Os achados de perda de altura bicôncava dos platôs vertebrais, aumento da distância interpedicular, fratura do arco posterior e retropulsão de fragmentos ósseos são características típicas dessa lesão (Figura 40). Figura 40. Fratura explosiva do corpo vertebral de T12 com reduça ̃o da altura predominado na porça ̃o central (seta azul), fratura do corpo vertebral com traços orientados nos planos sagitais e coronais (setas vermelhas) e retropulsão do muro posterior (seta preta). A: Tomografia computadorizada (TC) plano sagital. B: TC no plano coronal. C: TC no plano axial. Cerri, Giovanni, G. et al. Tratado de Radiologia, Volume 3: Obstetrícia, Mama, Musculoesquelético. Disponível em: Minha Biblioteca, Editora Manole, 2017.
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