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PEDRO SANTOS – DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS LEISHMANIOSE TEGUMENTAR (ÚLCERA DE BAURU) Agente Etiológico: Leishmania (Leishmania) e Leishmania (Viannia). Família: Trypanosomatidae Período de Incubação: AGENTE ETIOLÓGICO A Leishmania é um protozoário pertencente à família Trypanosomatidae, parasito intracelular obrigatório das células do sistema fagocítico mononuclear, com duas formas principais: uma promastigota e amastigota. No Brasil, foram identificadas 7 espécies, sendo 6 do subgênero Viannia e 1 do subgênero Leishmania. As três principais espécies são: Leishmania (Leishmania) amazonensis. Pode ser responsável por formas cutâneas, cutaneomucosas ou com a forma tegumentar difusa. Seu principal vetor é a Lu. flavicutellata, inseto de hábitos noturnos e pouco antropofílico, e a Lu. olmeca, no Amazonas e Rondônia. Leishmania (Viannia) guyanensis. Causadores em geral de quadros cutâneos com múltiplas lesões. Seu principal vetor é a Lu. umbratilis, que tem o hábito de repousar em árvores em terra firme, e atacam em grupos quando perturbados. Leishmania (Viannia) braziliensis. Causa leishmaniose cutânea e cutâneo-mucosa. Tem como vetor na Serra dos Carajás o Psychodopygus wellcomei, de hábitos diurnos, antropofílico e de maior atividade em épocas de chuva. VETOR Os vetores da LT são insetos denominados flebotomíneos, pertencentes ao gênero Lutzomyia, conhecidos popularmente, como Mosquito-Palha, Tatuquira, Birigui, entre outros. RESERVATÓRIOS Infecções por leishmanias que causam a leishmaniose tegumentar (LT) foram descritas em várias espécies de animais silvestres (roedores, marsupiais, edentados e canídeos silvestres), sinantrópicos (roedores) e domésticos (canídeos, felídeos e equídeos). Com relação a esses últimos, seu papel na manutenção do parasito no meio ambiente ainda não foi esclarecido. A Leishmaniose Tegumentar nesses animais pode apresentar-se como uma doença crônica, com manifestações semelhantes às da doença humana. TRANSMISSÃO A transmissão se dá através da picada da fêmea hematófaga do mosquito vetor, infectada pela Leishmania. Não há transmissão direta (pessoa a pessoa). EPIDEMIOLOGIA A leishmaniose tegumentar (LT) constitui um problema de saúde publica em 85 países, com registro anual de 0,7 a 1,3 milhão de casos novos. A LT ocorre em ambos os sexos e em todas as faixas etárias, entretanto, na média do País, predominam os maiores de 10 anos (92,5% do total de casos) e o sexo masculino (74% no ano de 2014). Em 2019 foram confirmados 15.484 casos novos de LT no Brasil, com os maiores percentuais de casos registrados na região Norte (42,8%). No Brasil, a LT é uma das afecções dermatológicas que merece mais atenção, devido à sua magnitude e também pelo envolvimento psicológico devido às deformidades e cicatrizes desfigurantes provocadas pela doença, associada ao estigma social. PEDRO SANTOS – DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS CICLO DE VIDA O mosquito transmissor contém as formas promastigotas infectantes (metacíclicas) da Leishmania em seu aparelho digestivo. Durante o repasto sanguíneo, este material é regurgitado, permitindo a inoculação dos parasitas na derme do hospedeiro. Neste local, são internalizados por macrófagos locais, após ligarem-se a receptores específicos. No interior do vacúolo fagocítico, as formas promastigotas perdem o flagelo, transformando-se em formas amastigotas. Estas se proliferam por divisão binária, gerando múltiplos protozoários que se acumulam no citoplasma do macrófago provocando o rompimento da célula. Ao serem liberados no meio extracelular, infectam novos macrófagos ou monócitos. No interior destas células, o protozoário caminha pela corrente sanguínea, alcançando órgãos do sistema reticuloendotelial, como fígado, baço e medula óssea, onde encontram novos macrófagos, mantendo um ciclo proliferativo celular. Ao picar o homem ou animal infectado, o flebotomíneo ingere monócitos contendo formas amastigotas ativas, que são liberadas no intestino do inseto. Aí encontram um meio propício para evoluírem até a forma promastigota metacíclica, invadindo retrogradamente o aparelho digestivo proximal (estômago, esôfago e faringe) do mosquito. Nesse momento, cerca de cinco dias após ter adquirido o parasita, o mosquito já pode transmiti-lo para um novo hospedeiro. FISIOPATOLOGIA Após a picada do mosquito vetor infectado, o parasita é inoculado na pele, estimulando resposta imune celular específica no local. Normalmente, há predomínio de resposta imune Th1, mais efetiva na eliminação de patógenos intracelulares, sendo responsável por infecção localizada ou subclínica, com boa resposta terapêutica e prognóstico favorável. O parasita invade as células do sistema fagocíticomononuclear (macrófagos), dando origem às amastigotas, que sofrem multiplicação intracelular, propagando a infecção. O parasitismo associado à ativação imune local, com liberação de mediadores inflamatórios, como IL-12 e IFN-γ, levam à destruição tecidual e surgimento das lesões características da doença. Sendo assim, o quadro clínico depende da espécie envolvida e do estado imunológico do indivíduo. A resposta imune predominante influencia significativamente a evolução da doença para cura espontânea, formas localizadas ou formas progressivas, sendo a resposta Th1 mais favorável na LTA. Em alguns casos, pode ocorrer predomínio de resposta imune do tipo 2 (humoral), mediada por anticorpos anti-Leishmania, pouco efetiva na LTA, com maior sobrevivência do protozoário, evolução desfavorável com disseminação das lesões e má resposta terapêutica. Sugere-se que a forma mucosa da doença é resultante de resposta imune celular exacerbada no local de depósito de antígenos da Leishmania, associada à incapacidade de promover uma modulação adequada dessa resposta. A resposta terapêutica nesses casos é ruim e as recidivas são frequentes. QUADRO CLÍNICO PERÍODO DE INCUBAÇÃO: No ser humano, em média de 2 a 3 meses, podendo apresentar períodos mais curtos (2 semanas) e mais longos (dois anos). INFECÇÃO INAPARENTE: infecção sem manifestação clínica baseada em resultados positivos de IDRM e que não constitui indicação para o tratamento específico. Obs: O uso de testes sorológicos não está indicado para a detecção de infecções assintomáticas. PEDRO SANTOS – DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS Classicamente, a doença manifesta-se sob duas formas: 1. Leishmaniose Cutânea 2. Leishmaniose Mucosa. LEISHMANIOSE CUTÂNEA O período de incubação varia usualmente entre 2 semanas e 2 meses. A lesão ulcerada é precedida por uma macula, que perdura de 1 a 2 dias depois da picada infectante. A macula evolui formando uma pápula que aumenta progressivamente produzindo, geralmente, uma ulcera. A linfoadenomegalia satélite pode ocorrer antes, durante ou após o aparecimento da lesão. A úlcera típica de leishmaniose cutânea (LC) é geralmente indolor e costuma localizar-se em áreas expostas da pele; tem formato arredondado ou ovalado; mede de alguns milímetros até alguns centímetros; tem base eritematosa, infiltrada e de consistência firme; apresenta bordas bem delimitadas e elevadas com fundo avermelhado e granulações grosseiras. As lesões vegetantes caracterizam-se pelo aspecto papilomatoso, úmido e de consistência mole. As lesões verrucosas caracterizam-se por superfície seca, áspera, com presença de pequenas crostas e de descamação. Caso não tratadas, as lesões podem evoluir para a cura espontânea em período de alguns meses a poucos anos. As lesões cutâneas, ao evoluir para a cura, costumam deixar cicatrizes atróficas, deprimidas, com superfície lisa, áreas de hipo ou de hiperpigmentação e traves fibrosas. Pode-se classificara leishmaniose cutânea de acordo com as seguintes apresentações clínicas: a) Forma cutânea localizada: lesão é geralmente do tipo úlcera, com tendência à cura espontânea e apresenta boa resposta ao tratamento, podendo ser única ou múltipla (até 20 lesões em um mesmo segmento corporal). Pode acompanhar-se de linfadenopatia regional e de linfangite nodular e costuma apresentar IDRM positiva. b) Forma cutânea disseminada: observada em até 2% dos casos. As duas espécies reconhecidas como causadoras desta síndrome são Leishmania (V.) braziliensis e a Leishmania (L.) amazonensis. É caracterizada pelo aparecimento de múltiplas lesões papulares e de aparência acneiforme com úlceras de fundo granuloso e bordas elevadas, que acometem vários segmentos corporais, envolvendo com frequência a face e o tronco. O número de lesões pode alcançar as centenas. O fenômeno de disseminação ocorre posteriormente ao desenvolvimento das lesões primárias, que se estabelece em poucos dias, às vezes em 24 horas, causando lesões distantes do local da picada. A adenomegalia satélite raramente é detectada nos pacientes com a forma disseminada e, quando se apresenta, é de forma discreta. Outros aspectos a serem destacados nesta forma clínica são o acometimento mucoso concomitante (30% dos pacientes), e as manifestações sistêmicas (febre, mal-estar geral, dores musculares, emagrecimento, anorexia...). Os pacientes apresentam títulos elevados de anticorpos séricos antileishmania, resposta variável na IDRM. Outro aspecto relevante no exame histopatológico é a presença de acometimento folicular que se correlaciona com a expressão clínica acneiforme. PEDRO SANTOS – DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS c) Forma recidiva cútis: ativação da lesão nas bordas, após cicatrização da lesão, mantendo-se o fundo com aspecto cicatricial. A resposta terapêutica costuma ser inferior à da lesão primária. d) Forma cutânea difusa: no Brasil, a doença é causada pela L. (L.) amazonensis. Constitui uma forma clínica rara e grave, que ocorre em pacientes com anergia e deficiência específica na resposta imune celular a antígenos de Leishmania. Inicia de maneira insidiosa, com lesão única e má resposta ao tratamento; evolui de forma lenta com formação de placas e múltiplas nodulações não ulceradas recobrindo grandes extensões cutâneas. A resposta à terapêutica é pobre ou ausente e a IDRM apresenta-se negativa. LEISHMANIOSE MUCOSA Clinicamente, a LM expressa-se por lesões destrutivas localizadas nas mucosas das vias aéreas superiores. A forma mucosa da leishmaniose tegumentar (LT) é geralmente causada por disseminação hematogênica dos parasitos para as mucosas nasais, orofaringe, palato, lábios, língua, laringe e, excepcionalmente, traquéia e árvore respiratória superior Esta forma da doença se caracteriza por apresentar IDRM fortemente positiva, mas com difícil confirmação parasitológica devido à escassez parasitária, e por apresentar difícil resposta terapêutica. Pode-se classificar a leishmaniose mucosa de acordo com as seguintes apresentações clínicas: a) Forma mucosa tardia: é a forma mais comum. Pode surgir até vários anos após a cicatrização da forma cutânea. Classicamente está associada às lesões cutâneas múltiplas ou de longa duração, às curas espontâneas ou aos tratamentos insuficientes da LC. b) Forma mucosa sem lesão cutânea prévia: quando a LM apresenta-se clinicamente isolada, não sendo possível detectar nenhuma outra evidência de LC prévia. Tais formas estariam provavelmente associadas às infecções subclínicas ou lesões cutâneas pequenas, não ulceradas, de evolução rápida e que teriam passado despercebidas sem deixar cicatrizes perceptíveis. c) Forma mucosa concomitante: quando a lesão mucosa ocorre à distância, porém ao mesmo tempo em que a lesão cutânea ativa (não contígua aos orifícios naturais). Por ser uma apresentação incomum, nesta forma clínica deve-se investigar imunodeficiência (infecção pelo HIV). PEDRO SANTOS – DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS d) Forma mucosa contígua: ocorre por propagação direta de lesão cutânea localizada próxima a orifícios naturais, para a mucosa das vias aerodigestivas. A lesão cutânea poderá encontrar-se em atividade ou cicatrizada na ocasião do diagnóstico. e) Forma mucosa primária: ocorre eventualmente pela picada do vetor na mucosa ou semimucosa de lábios genitais. DIAGNÓSTICO Demonstração direta do parasito É o procedimento de primeira escolha por ser mais rápido, de menor custo e de fácil execução. Quanto menor o tempo de evolução da lesão, maior a probabilidade de encontro do parasito. Procedimentos: escarificação da borda da lesão, biópsia com impressão do fragmento cutâneo em lâmina por aposição e punção aspirativa; Intradermoreação de Montenegro (IDRM) Em áreas endêmicas é um método pouco confiável, a IDRM positiva pode ser LTA anterior ou aplicação anterior de antígeno de IDRM, infecção sem doença, alergia ao diluente ou reação cruzada com outras doenças. Após a cura clínica, a IDRM pode permanecer positiva por vários anos sendo de limitado valor para o diagnóstico de reativação. Pacientes com leishmaniose mucosa apresentam geralmente IDRM exacerbada, com vesiculação, podendo ulcerar e necrosar. Na forma cutânea difusa a IDRM costuma ser negativa. Isolamento em cultivo in vitro (meios de cultivo) É um método de confirmação da presença do agente etiológico que permite a identificação da espécie de Leishmania envolvida. Os fragmentos são obtidos geralmente por biópsia da borda da úlcera; Isolamento in vivo (inoculações animais) O material é obtido por biópsia ou raspado da lesão. Em função da complexidade e do alto custo, é um método pouco utilizado, apesar de apresentar elevada sensibilidade entre os demais métodos parasitológicos. TRATAMENTO O tratamento da LT deve ser indicado de acordo com a forma clínica, com o apoio do diagnóstico laboratorial e obedecendo aos critérios estabelecidos para cada situação. FORMA CUTÂNEA Antimonial de N-metil-glucamina (por 20 dias): nome comercial é Glucantime, é injetável. Utilizado para todos os tipos e é liberado somente pelo Ministério da saúde. Por ser derivado de metal pesado é contraindicado para pessoas com doença cardíaca, não pode utilizar em crianças menores de 5 anos e gestantes. Pentaminina 4mg/Kg a cada 2 dias (até completar 2g de dose). Muito tóxica e menos efetiva, só se usa para restrição do Glucantine ou quando ele não teve efeito. Anfotericina B doses diárias até atingir 1 a 1,5g da droga. Pode desencadear problema renal e hepático. Utilização endovenosa e hospitalar, único que pode ser usado por gestantes. Se tiver infecções secundarias no local usa antibiótico junto. PEDRO SANTOS – DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS FORMA MUCOSA Antimonial de N-metil-glucamina (Glucantime) (por 30 dias); Pentaminina 4mg/Kg a cada 2 dias (até completar 2g de dose); Anfotericina B doses diárias até atingir 1 a 1,5g da droga.
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