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18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 1/58 CONTEÚDO 7 – TOXICOLOGIA DOS METAIS E OCUPACIONAL TOXICOLOGIA DOS METAIS Neste módulo serão abordados, de forma mais aprofundada, o diagnóstico e o tratamento das intoxicações por chumbo, mercúrio e arsênio, e aspectos do tratamento da intoxicação por ferro. O termo “intoxicação” não é um termo técnico com uma definição precisa, apesar do seu uso difuso na literatura médica e especializada em Toxicologia. Os dicionários de língua portuguesa normalmente utilizados nos meios acadêmicos definem “intoxicação” de forma tautológica, como o “ato de intoxicar ou envenenar”, remetendo o leitor ao seu sinônimo “envenenamento”, que por sua vez é definido como “o ato de envenenar ou envenenar-se” (HOUAISS et al., 2001; FERREIRA, 1986). Na língua inglesa, a palavra “intoxication”, traduzida em português como “intoxicação” e também bastante utilizada em textos técnicos de Clínica e Toxicologia, tem uma definição menos tautológica que em português, embora ainda não apresente a precisão necessária ao uso que se faz dela. O Webster’s Encyclopedia Unabridged Dictionary of the English Language (1996) define “intoxication” como “inebriation; drunkenness; overpowering exhilaration or excitement of the mind or emotions” fazendo o leitor imaginar um estado “clínico” de alteração mental por efeito de uma substância química. Para fins filológicos, esta definição de “intoxication” originou-se na observação do estado de alteração mental secundário ao uso do etanol. Ainda dentro do Webster’s existe uma definição um pouco mais técnica de “intoxication” no item referente à patologia (Pathol.) como “poisoning”, remetendo o leitor ao significado desta palavra dentro da patologia como “the condition produced by a poison or by a toxic substance”. O Oxford English Reference Dictionary (1996) corrobora as definições do Webster’s, de forma mais sumária, porém. Por sua vez, o Churchill’s Medical Dictionary (1989) define “intoxication” como “the action of an absorbed and diffused toxic substance upon an organism or the resultant pathological state of the organism”. O que as definições em língua inglesa trazem em comum é a conotação de alteração de função ou presença de estado orgânico (no caso, mental) alterado resultante da introdução, absorção e difusão de uma substância química exógena que é assim definida como tóxica ou veneno. Apesar dos dois mais conceituados dicionários brasileiros de língua portuguesa não definirem “intoxicação” com a precisão necessária ao seu uso adequado, optamos neste capítulo pelo emprego da palavra com a conotação dada na língua inglesa, ou seja, como uma “alteração da função orgânica normal secundária à introdução de substância química num organismo”. A importância de assumir esta definição será discutida mais adiante. Neste capítulo tentaremos fazer distinção entre o termo “intoxicação” e outros termos usados corriqueiramente na literatura tanto especializada quanto leiga relativa à Toxicologia, como “contaminação”, “exposição excessiva”, “absorção excessiva”, entre outros. Na prática clínica diária, nas 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 2/58 discussões técnico-científicas e na divulgação leiga de assuntos referentes à Toxicologia, é comum vermos esses termos serem mal utilizados ou usados de forma intercambiável, causando confusão e erros importantes de interpretação nas situações de avaliação do risco toxicológico, por exemplo. Isto, por sua vez, leva à assunção de medidas político-administrativas por vezes desastrosas para os indivíduos e para as populações envolvidas. Para o toxicologista clínico, o termo “intoxicação” significa a ocorrência de sinais e sintomas secundários à absorção de substâncias químicas exógenas de qualquer natureza, e é com esse significado que se utiliza na prática. A chave do entendimento dessa definição são as palavras “sinais” e “sintomas”. Como “sinais” os clínicos entendem “qualquer manifestação de doença que pode ser objetivamente observada e certificada pelo médico ou outro observador, através de exame clínico do paciente” (Churchill’s Medical Dictionary, 1989). São exemplos de sinais clínicos o edema ou inchaço das extremidades, a arritmia cardíaca auscultada no precórdio ou sentida pela palpação do pulso do paciente, o vômito, a diarréia, a icterícia vista pelo exame das mucosas ou da conjuntiva ocular, etc. Por sua vez, “sintomas” são definidos como “qualquer evidência de doença ou desordem que é vivenciada pelo paciente, e relatado como experiência subjetiva” (Churchill’s Medical Dictionary, 1989). São exemplos de sintomas, a dor em qualquer localização ou intensidade, a náusea, a tontura, a referência à alteração de memória, o cansaço, a fadiga, etc. Numa situação de exposição a substâncias exógenas, como no caso dos metais (mesmos que essenciais ao metabolismo), podemos ter ao menos quatro possíveis tipos de ocorrências: a) exposição a partir de fontes, tanto naturais (emissões vulcânicas episódicas, constituintes geológicos naturais do solo e água, por exemplo), quanto antropogênicas (poluição urbana por veículos automotores, áreas perifabris, etc.), que levam a cargas corpóreas que ficam dentro dos limites dos valores de referência (VR) [link com VR] existentes para a substância ou metal em questão. Dado o significado do valor de referência utilizado neste texto, essa situação não demanda ações imediatas de controle da exposição, pois valores observados estão dentro dos limites registrados em populações comparáveis na ausência de fontes específicas; b) exposição que resulta em níveis elevados, acima dos valores de referência, a partir de fontes, tanto naturais quanto antropogênicas, sem evidência de efeitos adversos detectáveis. Essa situação é corriqueiramente chamada de situação de contaminação com exposição e absorção anormais. A ausência de efeitos adversos evidenciáveis demanda ações de controle da fonte de emissão ou controle e remediação das áreas contaminadas e das vias de contaminação (solo, água, ar, alimentos, etc.), e monitorização regular e constante do ambiente e das populações expostas; 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 3/58 c) exposição que acarreta níveis elevados, acima dos valores de referência, com presença de efeitos adversos reversíveis a nível bioquímico, e ausência de sinais e sintomas de intoxicação. Esse tipo de exposição é bastante comum no ambiente ocupacional, onde trabalhadores ficam expostos a concentrações atmosféricas elevadas, que produzem dosagens dos indicadores biológicos sempre acima dos valores de referência. Nessa situação, para controle de exposição, são utilizados limites de tolerância ambientais e biológicos, estes últimos atualmente chamados de Índices Biológicos de Exposição (IBE), que são sempre valores mais elevados que os valores de referência. Os Índices Biológicos de Exposição têm correlação com concentrações atmosféricas às quais os trabalhadores podem estar expostos sem que ocorra aparecimento de sinais e sintomas de intoxicação. Esses limites de tolerância ambientais e seus correspondentes biológicos (índices biológicos de exposição) não garantem, no entanto, a ausência de efeitos reversíveis bioquímicos como diminuição de atividades enzimáticas, por exemplo. Cada vez mais são observadas situações de contaminação ambiental da população geral, não ocupacional, que se enquadram nesta categoria de exposição. Nesses casos, as medidas de controle das emissões e das vias de contaminação devem ser otimizadas junto com monitorização regular e constante, visando diminuição dos níveis de exposição. Eventual tendência à elevação dos níveis de exposição poderá causar em curto ou médio prazo ocorrênciade efeitos adversos com sinais e sintomas de intoxicação em parte da população exposta. Nenhuma medida terapêutica individual, porém (além do eventual afastamento da fonte de exposição), deve ser tomada na ausência de sinais e sintomas de intoxicação; d) exposição a níveis elevados, acima dos valores de referência, ou acima dos limites de tolerância, com presença de sinais e sintomas sugestivos de intoxicação, que poderão, ou não, se enquadrar nos critérios clínicos de intoxicação previamente definidos para aquela substância ou metal pesado (ver discussão mais adiante). Nesta situação específica é necessário enfatizar que somente a presença de níveis elevados, acima dos limites de tolerância, da substância ou metal pesado em tecidos ou líquidos biológicos, não caracteriza diagnóstico de intoxicação na ausência de sinais e sintomas sugestivos. É necessário sempre o afastamento imediato e completo da exposição, com posterior avaliação criteriosa da necessidade de medidas terapêuticas específicas. Com várias substâncias químicas, como solventes e alguns metais pesados, o afastamento da exposição é a melhor medida terapêutica, pois ao longo do tempo ocorre a eliminação da substância e de seus metabólitos, com melhora dos sinais e sintomas. O Quadro 1 resume, de forma esquemática, as quatro situações descritas. 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 4/58 CHUMBO Para fins de diagnóstico da intoxicação por chumbo, deve-se ter em mente que este metal age em alguns órgãos-alvo que determinam os sinais e sintomas típicos da intoxicação: cérebro, rins, sistema hematopoïético, sistema nervoso periférico. Em exposições tanto agudas quanto crônicas, em concentrações baixas ou moderadas, o órgão crítico alvo é o cérebro, promovendo sinais e sintomas de encefalopatia de maior e menor grau, dependendo da intensidade e duração da exposição, tais como, cefaléia, perda de memória, perda da concentração e atenção em tarefas corriqueiras, alterações de humor, com irritabilidade, depressão, insônia (ou sonolência). Esses sintomas podem progredir para piora na intensidade, até surgimento de sinais característicos de encefalopatia com alterações neurológicas visíveis ao exame físico, como distúrbios de comportamento mais graves (paranóia, delírios e alucinações), alterações da marcha e do equilíbrio (denotando já um comprometimento de cerebelo), agitação psicomotora e, em situações de exposição a altas concentrações, alterações de consciência como obnubilação, estupor e coma, precedidos, em alguns casos, de convulsões. A seqüência de sintomas e sinais decorrentes da ação do metal sobre o sistema nervoso central deve ser vista como possibilidades de ocorrência dependendo sempre da duração da exposição e da concentração de chumbo no ambiente. Em crianças, pode-se verificar a ocorrência dos mesmos sinais e sintomas, sendo que os sinais mais intensos estão quase sempre relacionados à exposição por via digestiva (ingestão de solo contaminado, ou flocos de tinta de construções ou brinquedos deteriorados, com teores altos de chumbo, como nos EUA). Todos esses sinais e sintomas de encefalopatia são inespecíficos e nenhum deles isoladamente, ou mesmo a soma deles, pode ser considerado como patognomônico da intoxicação por chumbo inorgânico. A suspeita de que esse quadro clínico possa estar relacionado à intoxicação por chumbo surge com o conhecimento de que o paciente, adulto ou criança, tem algum tipo de exposição ao metal. A confirmação do diagnóstico se dá pela presença de outros sintomas, como cólica abdominal, sintomas gerais de fraqueza, fadiga, mialgia generalizada (ou mais localizada nas panturrilhas), inapetência, queixas gástricas, perda da libido, associados a alterações em alguns parâmetros hematológicos como diminuição nos níveis de hematócrito e hemoglobina, e presença de pontilhado basófilo nas hemácias. A confirmação definitiva do diagnóstico se dá pela dosagem de algum parâmetro de dose interna, como chumbo no sangue (plumbemia) ou na urina (plumbúria), ou algum parâmetro de efeito do chumbo na cadeia de formação da hemoglobina, como aumento de ácido deltaminolevulínico na urina (ALA-U), aumento da dosagem de coproporfobilinogênio na urina (CPU), aumento de protoporfirina IX, dosada na forma livre (EP) ou na forma zincada (ZPP), e diminuição na atividade do ácido deltaminolevulínico desidratase (ALA-D). Nos quadros clínicos agudos suspeitos, em crianças, a radiografia simples de abdome -+pode ser útil na detecção de conteúdo radiopaco representativo de ingestão de material contendo chumbo. Em exposições crônicas a longo prazo, em crianças, o efeito do chumbo no metabolismo dos ossos longos em fase de crescimento pode ser visualizado como uma banda densa radiopaca na parte distal das metáfises, logo acima da cartilagem de conjugação, na zona de incorporação de tecido ósseo na 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 5/58 metáfise. Tal banda densa, radiopaca, parece estar relacionada com acúmulo de cálcio na região por distúrbio do metabolismo normal provocado pelo chumbo, e não ao depósito de chumbo, semelhante às linhas de sofrimento que marcam a ossatura de crianças durante estresses nutricionais, infecciosos ou metabólicos intensos durante a fase de crescimento. Em adultos, apesar de o chumbo ter grande afinidade pelos ossos e aí se acumular de forma praticamente definitiva (compartimento tecidual onde o chumbo tem meia vida de eliminação ao redor de 30 anos), a quantidade de chumbo incorporada pela matriz óssea não é suficiente para promover radio-opacidade suficiente para ser detectada ao exame radiológico. Os índices biológicos de exposição são definidos para monitorização de trabalhadores expostos. São valores que devem ter correspondência ou correlação com valores limites da substância no ar do ambiente de trabalho, que por sua vez são chamados de Limites de Tolerância Ambientais (LTA). Nesse sentido, duas situações referentes ao diagnóstico de intoxicação devem ser tratadas separadamente: a) exposição ocupacional, para a qual existem valores limites para dosagens de indicadores biológicos de exposição. Dosagens de indicadores abaixo do IBE apontam para baixa probabilidade de ocorrência de intoxicação clínica. Os valores de indicadores biológicos de exposição são sempre superiores aos valores de referência (VR) para a população não exposta; b) exposição ambiental, de adultos e crianças, na qual existirão valores limites para diferentes faixas etárias de crianças, e valores de referência, que podem ser regionais ou nacionais. Nas duas situações, o critério diagnóstico de intoxicação clínica por chumbo deve, necessariamente, incluir a positividade das três ocorrências assinaladas adiante: a) presença de sinais e sintomas compatíveis com intoxicação; b) comprovação de exposição ocupacional ou ambiental a chumbo, com duração e intensidade compatíveis com os sinais e sintomas; c) dosagens aumentadas de chumbo no sangue e/ou porfirinas no sangue ou na urina. Situações de exposição a substâncias exógenas e possibilidades de ocorrências quanto a efeitos secundários adversos. Situações de exposição: exposição a concentrações ambientais que se expressam em dosagens de indicadores biológicos dentro dos limites dos valores de referência existentes (VR) exposição excessiva, elevada, com dosagens de indicadores biológicos acima dos VR, porém sem ocorrência de efeitos adversos detectáveis exposição (b) excessiva, elevada, com dosagens de indicadores biológicos acima dos 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 6/58 VR existentes, com ocorrência de efeitos adversos bioquímicos reversíveis, mas sem ocorrência de sinais e sintomas sugestivos de intoxicaçãoexposição excessiva, elevada, com dosagens de indicadores biológicos acima dos VR ou acima dos limites de tolerância ambientais e biológicos (IBE), com ocorrência individual de sinais e sintomas sugestivos A positividade de apenas um ou dois desses fatores não autoriza o diagnóstico de intoxicação, sendo necessária a investigação mais cuidadosa visando preencher os três critérios. Sinais, sintomas e alterações laboratoriais e de exames complementares nos quadros suspeitos de intoxicação aguda e crônica por chumbo inorgânico. Sinais e Sintomas Cólicas abdominais que não respondem a antiespasmódicos; anorexia; palidez da pele; icterícia (nos casos com hemólise); náuseas; vômitos; constipação; agitação psicomotora; irritabilidade; ataxia; desequilíbrio; obnubilação; estupor; convulsões; coma; sinais de insuficiência renal aguda; hipertensão arterial transitória. Queixas inespecíficas como fadiga, palidez; perda de memória, irritabilidade, alterações de humor, perda da libido; anorexia leve, mialgia generalizada (ou mais localizada nas panturrilhas); queimação epigástrica; parestesias e perda de força muscular nas extremidades; sinais de insuficiência renal; hipertensão arterial; linhas de deposição de sulfeto de chumbo nas gengivas (linhas de Burton) Para crianças expostas ambientalmente, a maior experiência clínica e epidemiológica acumulada no mundo é a dos norte-americanos, em função do problema crônico e grave de contaminação de tintas usadas nas décadas de 40, 50 e 60 em residências, e que hoje, devido à deterioração e contaminação dos espaços intra e peri-domiciliar, são fonte constante e perene de exposição de crianças que habitam esses locais. Baseado nessa experiência de avaliação de risco epidemiológico e manejo de milhares de casos clínicos de intoxicação, o Centre for Disease Control and Prevention, dos EUA, publicou recomendações sobre o manejo de crianças em áreas contaminadas, lastreado em sintomatologia, sinais clínicos e, basicamente, em níveis de plumbemia medidos regular e periodicamente. O Teste de Mobilização de Chumbo tem por objetivo clínico estimar a carga corpórea de chumbo em expostos, através da medida da quantidade de chumbo excretada na urina (plumbúria ou PbU), a partir da administração de uma dose única padrão de quelante. Tradicionalmente esse teste (também chamado de Teste de Provocação) é feito usando-se o versenato de cálcio (EDTACaNa2), mas pode ser realizado com D- penicilamina e, eventualmente, com DMSA. A interpretação básica do TMC é de que a plumbúria produzida após administração do quelante, reflita a carga de chumbo presente em compartimentos mobilizáveis, e provavelmente não a carga corpórea total de chumbo, presente em tecidos de meia- vida prolongada, como ossos compactos, dentina, e rins. A importância clínica do teste está na possibilidade de avaliar a necessidade de tratamento quelante, em ciclos repetidos, para o chumbo localizado em grande quantidade em 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 7/58 compartimentos mobilizáveis, tais como, fígado, baço, vísceras ocas, eritrócitos, cérebro e, provavelmente, osso trabecular. Resultados de PbU após dose teste de EDTA (PbU-EDTA) têm boa correlação com níveis de plumbemia, principalmente quando a exposição se deu recentemente. Para exposições no passado a correlação não é tão boa. O TMC é útil na indicação ou não de tratamento em casos clínicos nos quais a sintomatologia é leve, ou os níveis de PbS estão baixos, em situação de exposição considerada prolongada a níveis de concentração moderados ou altos. O teste nunca deve ser realizado em pacientes com sintomatologia exuberante e típica de intoxicação por chumbo, ou com níveis de PbS acima de 100 µg/dL, pois a dose padrão do teste é baixa e pode desencadear mobilização de chumbo de compartimentos teciduais em quantidade grande, o suficiente para produzir piora de sintomas. O TMC é realizado em adultos usando-se EDTACaNa2 em dose média de 25 mg/kg (cerca de 1 a 2g) por via endovenosa, em infusão de 1 a 2 horas de duração (em 300 a 500ml de soro fisiológico a 0,9% ou glicosado a 5%), seguida de coleta de urina de 24 horas para dosagem da plumbúria (PbU-EDTA-24h). Para resultados de PbU-EDTA-24h acima de 600µg, a interpretação é de que existe carga corpórea mobilizável de chumbo, que pode ou não necessitar de tratamento quelante. O tratamento quelante estará indicado formalmente quando o PbU-EDTA-24h resultar acima de 1000-1500µg. Os pacientes com resultados entre 600 e 1000-1500µg não necessariamente precisam usar quelantes, podendo se beneficiar apenas do afastamento da exposição por tempo mais prolongado, quando o organismo terá tempo de excretar o excesso de chumbo pelo rim. O TMC está indicado para crianças com níveis de PbS entre 25 e 44µg/dL, desde que afastadas da exposição ambiental. Está contra-indicado em crianças com níveis de PbS acima de 45µg/dL. A dose preconizada é de 500mg/m2 em soro glicosado a 5%, em infusão de 1h. Um TMC em criança será considerado positivo se o índice PbU- EDTA 24h/dose EDTACaNa2 em mg for maior que 0,6. Pode-se realizar TMC com D-penicilamina, na dose de 450 a 500mg em dose única oral, para adultos, dada à noite e dosando PbU em urina das 8 horas seguintes. O Centre for Disease Control and Prevention (USA) não indica uso de D-penicilamina para TMC em crianças. O valor de corte para indicação de tratamento quelante é de 300µg. O DMSA pode também ser usado como quelante na realização de TMC, na dosagem de 10mg/kg em administração oral única, porém ainda não existe padronização da interpretação dos resultados com esse quelante. Estudo de 1995 mostrou que o PbU após provocação com DMSA é, em média, menor quando comparado com dose equivalente de versenato de cálcio. Um dos incômodos na realização do TMC é a necessidade de coleta de urina de 24 horas para a plumbúria. Nesse sentido, algumas propostas alternativas têm sido feitas na literatura, com testes sendo avaliados com urina de 3, 6 ou 8 horas após administração da droga. Aparentemente, os três períodos de coleta fornecem resultados de PbU-EDTA com boa correlação com resultados de 24 horas, indicando 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 8/58 boa segurança na substituição dos períodos de tempo na realização dos TMC. Os coeficientes de correlação obtidos nesses trabalhos foram: r = 0,86 para coleta de 3 horas r = 0,98 para coleta de 6 horas Apesar de controverso em algumas situações clínicas, quanto à interpretação de resultados, o TMC é uma ferramenta importantíssima na avaliação clínica de adultos e crianças expostos a chumbo, visando avaliar carga corpórea mobilizável. As seguintes vantagens podem ser enumeradas: a) avalia indiretamente a carga mobilizável de chumbo no organismo de expostos; b) auxilia na programação da dose e duração dos ciclos de tratamento quelante quando este for indicado; c) avalia a presença de carga corpórea anormal em exposições passadas; d) auxilia na decisão sobre se manifestações clínicas inespecíficas em paciente exposto a chumbo no passado podem ser atribuídas à carga corpórea mobilizável atualmente. MERCÚRIO Os compostos químicos contendo mercúrio são classificados, do ponto de vista toxicológico, em dois grupos principais: compostos orgânicos e compostos inorgânicos, onde se inclui também o mercúrio atômico ou elementar. O mercúrio inorgânico pode apresentar-se sob três formas diferentes e com características toxicológicas bastante diversas entre si, conforme seu estado de oxidação: 1) forma metálica ou elementar (Hgo); 2) forma mercurosa ou catiônica monovalente (Hg+); 3) forma mercúrica ou catiônica bivalente (Hg2+). Os compostos orgânicos, por sua vez, provêm da ligação covalente entre o íon mercúrio (Hg2+) e pelo menos um átomo de carbono, formando sais como o monometilmercúrio (CH3Hg+) e o cloreto de etilmercúrio (C2H5ClHg) (ALESSIO et al., 1995a). Sintomas e sinais clássicos, relacionados à ação tóxica no sistema nervoso central, estão normalmente associados à exposição a mercúrio elementar e compostos de 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 9/58 orgânicos de mercúrio, enquanto o rim é o órgão crítico para as formas inorgânicas monovalente e bivalente. Os mecanismos de ação tóxica nos sistema nervoso central e periférico têm sido estudados de maneira diferenciada, dependendo da forma de mercúrio em questão. Nesse sentido, existem muito mais trabalhos informando sobre a toxicodinâmica no sistema nervoso central e sistema nervoso periférico dos compostos de mercúrio orgânico (metil e etilmercúrio, por exemplo) do que das formas de mercúrio inorgânico. Isto se deve aos desastres ambientais ocorridos em Minamata e Niiagata, no Japão (nas décadas de 50 e 60), e à contaminação de sementes no Iraque (no início dos anos setenta), episódios nos quais centenas de pessoas foram contaminadas por metilmercúrio, no Japão, e etilmercúrio, metilmercúrio e fenilmercúrio no Iraque, apresentando quadros de intoxicação bastante graves e produzindo uma geração de crianças com deficiências ao nível de sistema nervoso central e sistema nervoso periférico. Mercúrio metálico ou elementar O mercúrio metálico encontra-se, basicamente, só no ambiente ocupacional, onde os trabalhadores se expõem à intoxicação crônica por via inalatória e, eventualmente, aguda, quando de vazamentos acidentais de vasos com alta pressão. Pode ser ingerido, principalmente por crianças, a partir de contato manual com o conteúdo de instrumentos de medida quebrados, como termômetros ou barômetros. Injeções acidentais, terapêuticas, ou em tentativas de homicídio ou suicídio, podem ocorrer, envolvendo as vias subcutânea, intramuscular, endovenosa e intrarterial, esta última forma estando relacionada a acidentes com barômetros utilizados, até pouco tempo atrás, para medida de pressão arterial central durante cirurgias cardíacas e neurocirurgias. A intoxicação aguda por exposição inalatória se dá, geralmente, em altas concentrações, após vazamentos em processos industriais, e/ou durante jornadas de trabalho prolongadas, em ambientes fechados e moderadamente contaminados. O mercúrio elementar quando inalado é quase completamente absorvido através da membrana alvéolo-capilar, sendo que um pequeno percentual é retido nos próprios pulmões para ser devolvido ao espaço alveolar. Em altas concentrações, no entanto, antes que ocorra a absorção, ele pode causar um quadro clínico de pneumonite química, com insuficiência respiratória aguda, dor pleurítica, ocorrência de pneumotórax e pneumomediastino, bronquite erosiva e bronquiolite. A bronquiolite é mais comum em crianças jovens e pode causar dilatação alveolar e formação de pneumatoceles. Alguns casos de evolução para a fibrose pulmonar já foram descritos, apesar de serem raros. Mesmo em altas concentrações ambientais (níveis de 1000µg/m3, por exemplo), o paciente pode apresentar quadro respiratório passível de ser confundido com uma infecção das vias aéreas de curta duração, com tosse, dispnéia leve e chiadeira durando dois a três dias, e resolução espontânea. Em alguns casos, alterações funcionais, como restrição e decréscimo na difusão pulmonar, persistem, mesmo na ausência de alterações radiológicas. Todos esses sinais e sintomas respiratórios 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 10/58 podem ser acompanhados por náusea, vômitos, dor abdominal, diarréia, cefaléia, assim como de gosto metálico na boca. O quadro clínico de febre dos fumos metálicos, de resolução fugaz, também tem ocorrido. Já por via gastrintestinal, o mercúrio metálico não apresenta o mesmo risco de absorção, recomendando-se tratamento conservador e conduta expectante, esperando sua eliminação completa pelas fezes, apesar do risco de absorção em alguns raros casos descritos na literatura. Nas exposições crônicas, os efeitos estão relacionados com o órgão-alvo principal, que é o sistema nervoso central. Três quadros clínicos diferentes podem ser estabelecidos: a) mercurialismo crônico b) micromercurialismo c) efeitos pré-clínicos ou sub-clínicos precoces Os três quadros clínicos diferenciam-se entre si basicamente pela intensidade dos fenômenos evidenciados, mas com interposição e sobreposição de sinais e sintomas. a) Mercurialismo crônico A expressão mercurialismo crônico define o quadro clínico geral e mais característico da intoxicação crônica por mercúrio inorgânico na forma elementar. Consiste essencialmente em alterações provocadas nos sistemas nervosos central, autônomo e periférico, representadas por tremor de extremidades (principalmente dedos), eretismo psíquico e distúrbios vaso-motores. Incluem-se também sob esta denominação as alterações da mucosa oral e de glândulas salivares, com gengivites, estomatites, ptialismo A histopatologia das lesões orais se resume em hiperplasia, edema e infiltração mononuclear da submucosa; alterações alveolíticas dentárias podem ser observadas em estudos radiológicos da região. O ptialismo secundário à intoxicação pelo mercúrio já era reconhecido no século VIII como sinal de dosagem adequada de sais mercuriais no tratamento de diversas doenças, inclusive da sífilis. Eventualmente, têm-se também algumas alterações do cristalino, que corresponde a uma descoloração observada pela primeira vez em 1943. Ela é diagnosticada com o uso de lâmpada de fenda, a qual mostra um reflexo amarronzado, acinzentado escuro ou vermelho acinzentado (mercurialentis), simetricamente encontrado na cápsula anterior do cristalino de ambos os olhos. Essa coloração alterada se deve à deposição de mercúrio. Não há evidências de que essa anomalia cause sintomas visuais, ou leve à ocorrência de outras lesões oftalmológicas. A restrição do campo visual, provavelmente secundária à atrofia central do nervo óptico, tem sido descrita apenas em exposição a compostos de mercúrio orgânico, não sendo evidenciada em pessoas expostas a sais inorgânicos ou mercúrio elementar. 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 11/58 A esses sintomas, diversos autores acrescentam distúrbios renais pouco freqüentes, que aparecem em exposições crônicas, em função da dose absorvida: variam da proteinúria de alto peso molecular, assintomática, das exposições a baixas concentrações, até a síndrome nefrótica, em exposições a concentrações mais acentuadas e prolongadas. Um efeito renal precoce pode ser detectado, se traduzindo pela excreção alterada de enzimas de células tubulares lesadas. Alguns casos de glomerulonefrite de tipo membranosa, com depósitos de imunocomplexos, foram descritos. Modelos animais experimentais confirmam a imunodependência das lesões glomerulares causadas pelo mercúrio elementar. A necrose tubular aguda é encontrada após ingestão de cloreto de mercúrio (sal inorgânico), mas não ocorre com o mercúrio elementar. Tremor de extremidades O tremor de extremidades no mercurialismo crônico é detectado inicialmente nos dedos das mãos, acometendo também as pálpebras e a língua, e progredindo para os membros, tanto superiores quanto inferiores. Considerado como um tremor muscular, ele é o sinal mais comum do mercurialismo crônico, mas não necessariamente o primeiro a aparecer. As alterações neurocomportamentais podem sobrevir na ausência do tremor ou de outros sinais de intoxicação. A ocorrência do tremor parece necessitar de um tempo de exposição relativamente longo, entre 8 e 10 anos, nas exposições crônicas, a baixas concentrações. Nos efeitos causados pela exposição ocupacional a mercúrio, pode-se classificar o tremor em estágiossucessivos de gravidade: a) grau 1 - leve tremor estático, que é diagnosticado apenas quando se pede ao paciente para estender completamente os braços e antebraços, mantendo os dedos afastados. Neste estágio, dificilmente o próprio paciente percebe o tremor como algo incômodo, não atrapalhando nenhum dos movimentos rotineiros ou atividades motoras corriqueiras, incluindo as desenvolvidas no trabalho; b) grau 2 - tremor estático, em grau mais intenso associado a tremor intencional, mais evidente. Neste estágio pode haver perturbação moderada da atividade muscular motora delicada, dificultando certas atividades; c) grau 3 - tremor estático e intencional que claramente perturba as atividades motoras rotineiras como escrever, sustentar copos e xícaras, ou mesmo barbear-se; d) grau 4 - tremor intenso levando a dificuldade em realizar movimentos mais grosseiros e amplos; 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 12/58 e) grau 5 - tremor intenso e generalizado, impedindo atividades quotidianas (concussio mercurialis). O tremor do mercurialismo crônico, em qualquer dos graus descritos, se caracteriza pela sua piora induzida pela observação por uma pessoa próxima ou uma situação de estresse emocional. A presença do tremor pode induzir mudanças de comportamento, como o de alimentar-se sozinho, em ambientes afastados dos outros, por exemplo. Quando no grau 1 da classificação exposta, o tremor pode ser de difícil identificação se o exame neurológico se fizer apenas com a observação desarmada; ele necessita de equipamento apropriado. A análise da caligrafia do paciente pode ser uma arma diagnóstica importante em alguns casos selecionados. Na literatura encontra-se ainda uma outra classificação do tremor característico do mercurialismo crônico, dividida em dois quadros clínicos básicos, com predominância de um deles, mas podendo haver sobreposição e mesmo complicação pela adição do quadro psíquico de eretismo: a) tremor fino intencional, que lembra o tremor encontrado em pacientes que sofrem de esclerose múltipla; b) tremor tipo parksoniano, estático, de repouso, com função motora reduzida. O tremor das extremidades pode persistir por muitos anos após o cessar da exposição, mesmo depois do desaparecimento de outros sinais neurológicos como descoordenação motora, tonturas, insônia e fadiga. O tremor pode ter evolução progressiva e contínua, atingindo praticamente o corpo todo, dificultando a marcha e alterando a fala, tornando-a trêmula, simulando fala com “pronúncia estrangeira” e em ritmo de staccato, dificultando o entendimento e a comunicação (psellismus mercurialis). Alterações neurológicas nesse grau de intensidade foram descritas pela primeira vez em 1860, por um médico de New Jersey, EUA, em trabalhadores ligados à manufatura de chapéus de feltro, como “tremor dos chapeleiros” (hatter’s shakes). Nessa época a população leiga referiria-se a esses chapeleiros acometidos pelo mercúrio como “chapeleiros malucos” (mad hatters) devido, provavelmente, à sua marcha alterada, à sua extrema timidez (eretismo) e ao gaguejar ou staccato da fala. Esse estereótipo ganhou maior fama com a publicação do livro “Alice no País das Maravilhas”, de Lewis Caroll, em 1865, onde é apresentado um personagem de comportamento alterado, denominado “Mad Hatter”. Eretismo psíquico 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 13/58 O termo eretismo provém do grego e significa excitação. Foi adotado pela terminologia médica com o significado de “estado de excessiva irritabilidade, extrema e intensa reatividade, e labilidade emocional, envolvendo sinais de depressão e introspecção exagerada”. O eretismo mercurial, presente em praticamente todos os casos de mercurialismo crônico, caracteriza-se por alterações mentais nem sempre típicas, e que podem se sobrepor a alterações presentes em outros tipos de doenças ou distúrbios psicológicos. Entre os sintomas distinguem-se a irritabilidade, as alterações freqüentes do humor, a labilidade emocional, a timidez excessiva, insegurança, desânimo, medo de ser criticado, insônia, perda de memória recente, desatenção, dificuldade de concentração, melancolia e depressão. Dependendo da intensidade e do tempo de exposição, o paciente pode apresentar sintomas de grau leve, indefinidos, como sensação de que “algo está errado” com sua mente e com seu comportamento, até graus mais graves, quando as alterações de humor, a labilidade emocional e a depressão predominam. Distúrbios vasculares Os distúrbios vasculares provocam, em alguns casos de excessiva exposição, um quadro associando dermografismo, rubor facial episódico e sudorese excessiva, secundários a um possível distúrbio do sistema nervoso autônomo. Apesar de alguns estudos mostrarem que em exposições prolongadas acima de 50µg/m3 de mercúrio no ar (o que corresponde a cerca de 50 a 100µg/g de creatinina na urina), sinais e sintomas leves de intoxicação, com alteração do funcionamento do sistema nervoso central, já podem ser detectadas, outros trabalhos têm registrado que as exposições múltiplas a picos elevados de mercúrio no ar podem ser mais perigosas, pois nessas situações existe também maior passagem de mercúrio não ionizado para o sistema nervoso central. Micromercurialismo O micromercurialismo pode ser definido como um conjunto mínimo de sinais e sintomas que ocorrem no mercurialismo crônico e que pode caracterizar um quadro de intoxicação leve em trabalhadores expostos cronicamente a concentrações de mercúrio inferiores a 100µg/m3. Tais sinais e sintomas resumem-se basicamente em anorexia, perda de peso, alguns dos sintomas de eretismo e presença de tremores finos discretos (grau 1). Exposições a concentrações entre 10 e 50µg/m3 dificilmente causam perda de peso e anorexia. Efeitos pré-clínicos ou sub-clínicos precoces Do ponto de vista qualitativo, os efeitos pré-clínicos ou sub-clínicos precoces pouco se distinguem das alterações descritas até agora. O que se busca com essa 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 14/58 classificação é o diagnóstico precoce das mesmas alterações descritas como mercurialismo crônico quando em grau menos intenso ou em estado pré ou sub- clínico. Visando utilizar metodologia mais sensível e sofisticada para o diagnóstico pré-clínico, adota-se a terminologia da neuropsicologia para os sinais e sintomas de possível acomentimento pelo mercúrio elementar, denominando-os “alterações neurocomportamentais”. A análise da literatura afim mostra que se pode classificar as alterações neurocomportamentais secundárias à exposição ao mercúrio elementar em três grupos principais: a) distúrbios do sistema motor, como o tremor fino, que são o sinal e o sintoma neurocomportamental mais freqüentemente mencionados; b) deterioração da capacidade intelectual, que tem sido descrita como insidiosa no seu desencadear, mas gradualmente progressiva em seu desenvolvimento, afetando a memória e as capacidades de concentração e raciocínio lógico; c) alterações do estado emocional, com sintomas inespecíficos, como depressão (humor depressivo), fadiga, desânimo, irritabilidade e “sensibilidade social” (Quadro 2). Tendência à sudorese excessiva e rubor facial são freqüentemente associados a essa síndrome emocional. Conforme discutido no item sobre mercurialismo crônico, o termo “eretismo” tem sido utilizado para descrever essa síndrome emocional. Resumo das alterações pré-clínicas ou sub-clínicas em pessoas expostas a mercúrio inorgânico elementar. Alterações psicomotoras: Tremor de extremidades Velocidade motora (tempos de reação) Coordenação motora Alterações das capacidades intelectuais, da memória visual, da memória auditiva, da cognição,do raciocínio lógico, da concentração. Sintomas emocionais: humor depressivo, irritabilidade, timidez excessiva. fadiga / desânimo. Sistema Nervoso Autônomo: sudorese excessiva, rubor facial. Sistema Nervoso Periférico: velocidade de condução nervosa motora e sensitiva alterada, alterações eletroneuromiográficas. 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 15/58 Alguns desses distúrbios, quando presentes, resultam em alterações neurológicas e neurocomportamentais inespecíficas e subjetivas, dificultando o diagnóstico de possível relação causal com o mercúrio. Buscando-se o aprimoramento do diagnóstico dessas alterações, tem-se preconizado o uso de métodos mais objetivos de aferição que prescindem do relato isolado de sintomas. Tais métodos resumem-se a detectores e quantificadores de tremor, medidas de coordenação motora, aplicação de baterias de testes neurocomportamentais, que incluem testes psicomotores, de função cognitiva, memória e escalas de humor, e utilização de métodos chamados neurofisiológicos, como medição de velocidade de condução nervosa e eletroneuromiografia. O objetivo dessas metodologias é quantificar as alterações observadas e correlacioná-las com os indicadores de dose atualmente disponíveis, como as medidas de mercúrio no ar ambiente e as dosagens de mercúrio no sangue e urina. Outro objetivo importante é a verificação da reversibilidade das alterações detectadas. A grande dificuldade na utilização desses métodos refere-se à situação específica em que eles são propostos. A utilização de testes muito sensíveis e inespecíficos, como algumas baterias de testes neurocomportamentais, traz consigo os inconvenientes do provável excesso de falsos positivos. Testes diagnósticos com essas características têm sido utilizados, em geral como técnicas de triagem para detecção de possíveis casos de intoxicação, que deverão ser explorados por outros métodos, e/ou em estudos epidemiológicos. Nesse segundo tempo, a alocação aleatória dos indivíduos e a comparação de resultados, com grupos controles emparelhados e com características demográficas semelhantes, tendem a controlar as variáveis de mascaramento sempre presentes nesse tipo de investigação. Atualmente existe grande controvérsia quanto à utilização de bateria de testes neurocomportamentais como ferramenta diagnóstica isolada de outros métodos na definição de casos de intoxicação, sejam eles por exposição a mercúrio ou por outro agente neurotóxico. Baterias de testes utilizadas em pesquisa epidemiológica não estão indicadas para o trabalho diagnóstico, pois as duas práticas têm objetivos diferentes. Por exemplo, quando o objetivo é o diagnóstico de uma afecção (no caso, uma intoxicação), a preocupação é a de estabelecer se o indivíduo sofreu deterioração de suas funções cognitivas e se essa deterioração está associada à exposição ao neurotóxico. Neste caso a ponderação sobre variáveis individuais, sociais, culturais, de história de vida, de vida familiar, e a comparação com seu desempenho anterior em tais tipos de teste, é de extrema importância, necessitando mesmo uma abordagem multidisciplinar visando a definição diagnóstica do caso e incluindo a participação de toxicologistas, clínicos gerais, higienistas e neuropsicologistas. Por outro lado, em estudos epidemiológicos o que se busca é evidenciar diferenças de desempenho entre grupos populacionais teoricamente comparáveis e, nesse sentido, o aprofundamento individual das alterações encontradas não é tão importante, privilegiando-se a sensibilidade do teste, em detrimento da especificidade. 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 16/58 Willianson, em 1995, discutindo os problemas intrínsecos à aplicação de testes neurocomportamentais em pesquisa epidemiológica ocupacional, aponta como principais variáveis de confusão a serem controladas, as seguintes: a) efeitos advindos da motivação pelo desempenho nos testes, que por si só podem tomar direções opostas, dependendo da situação em que o trabalhador se encontre, ou seja, de negar possível presença de alteração ou simular a presença da mesma; b) situação física em que se dá a aplicação dos testes, levando-se em conta o local, temperatura, conforto, estresse ambiental, cansaço, efeitos de turnos (ciclo circadiano), etc.; c) procedimentos utilizados, em termos de padronização e em termos de interface com o paciente em questão; d) efeitos provenientes da exposição repetida aos testes em questão; e) diferenças inter-individuais como idade, nível de educação, uso de bebidas alcoólicas, uso de drogas psicotrópicas, problemas pré-existentes como déficit de aprendizado, ou mesmo distúrbios psíquicos não previamente detectados. Ainda no campo das dificuldades do uso de baterias de testes para fins diagnósticos deve-se apontar o problema da ausência de valores de referência populacional adequados para a maioria dos testes em uso. Utilizando-se dessas metodologias, diversos autores e grupos de pesquisas têm estudado populações trabalhadoras expostas a mercúrio elementar, tentando, por exemplo, sugerir limites de tolerância diferentes dos atualmente preconizados. No entanto, a ausência de padronização tanto na coleta de dados quanto na apresentação dos resultados, assim como nas metodologias utilizadas, na apresentação de resultados de medição de mercúrio no ar ambiente e nas dosagens de mercúrio urinário, tornam esses trabalhos pouco utilizáveis. Nem todos conseguem apresentar relação de dose-resposta com os efeitos diagnosticados, dificultando a interpretação de tais efeitos dentro de um raciocínio causal. Isso se deve, em geral, ao tamanho amostral, e às vezes à magnitude das diferenças encontradas entre grupo exposto e grupo controle, apesar da existência de significância estatística. Os estudos epidemiológicos iniciais foram realizados em situações de exposições bastante elevadas, caracterizadas por médias de mercúrio urinário, em certos casos, várias vezes acima do limite de tolerância para a época, em trabalhadores assintomáticos ou com poucos sinais clínicos de intoxicação. Mas, os níveis médios de exposição são bastante elevados para os padrões atuais de higiene industrial. Com relação à ocorrência de neuropatia periférica, estudos experimentais têm mostrado que as fibras sensitivas são mais sensíveis ao mercúrio elementar que as fibras motoras, ao contrário do que ocorre na intoxicação por chumbo inorgânico. No entanto, do ponto de vista eletroneuromiográfico, vêm-se alterações tanto na velocidade de condução nervosa de nervos sensitivos quanto de nervos motores. Isto leva outros autores a afirmar que os distúrbios no sistema motor, quando ocorrem, são mais propensos à reversão do que, por exemplo, as alterações nas funções cognitivas. A utilização de procedimentos de triagem que levem em conta apenas a 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 17/58 aferição de funções motoras, como critério de afastamento da exposição, por exemplo, pode representar um risco para os trabalhadores. Por outro lado, as alterações das funções cognitivas são mais insidiosas e difíceis de serem detectadas em situação de controle médico dentro dos locais de trabalho. Quadros clínicos relacionados com alteração localizada no corno anterior da medula espinal têm sido relatados na exposição a mercúrio orgânico (como o etil-mercúrio empregado como fungicida em sementes), caracterizando o diagnóstico sindrômico de esclerose lateral amiotrófica (ELA). No entanto, dois relatos da literatura descrevem três casos de trabalhadores expostos a mercúrio inorgânico que desenvolveram quadro clínico abrupto, compatível com diagnóstico sindrômico de ELA, mas com reversão total dos sinais e sintomas após afastamento da exposição.Num destes relatos, dois trabalhadores inalaram poeira de óxido de mercúrio (Hg0) na fabricação deste sal. Em outro, um trabalhador expôs-se a mercúrio elementar por dois dias consecutivos apenas, em tarefa de recolhimento de vazamento acidental de mercúrio metálico em fábrica de termômetros. Houve reversão total do quadro clínico nestes três casos. Tanto a forma orgânica quanto a forma inorgânica elementar são absorvidas e distribuem-se pelo sangue. Assim, a dosagem de mercúrio sanguíneo reflete as duas fontes de mercúrio, orgânico, por via oral, no caso de alimentos contaminados, e elementar, por via inalatória. A meia-vida biológica do mercúrio é de cerca de dois meses no organismo como um todo. A excreção é feita através da urina (principal mecanismo, no caso do mercúrio inorgânico elementar), sendo que o mercúrio orgânico é praticamente todo excretado pelas fezes. Assim, o mercúrio urinário é bastante representativo da absorção inalatória de mercúrio elementar. Outras vias de excreção incluem suor, ar exalado, cabelo, descamação da pele, unhas. A excreção urinária (em µg/g de creatinina urinária ou µg/gC) guarda relação com a exposição ambiental (em µg/m3) e mantém relação numérica de 1:1,5 aproximadamente: exposição a 35 µg/m3 de de mercúrio no ar correlaciona-se uma excreção urinária de 50µg/gC, desde que o indivíduo esteja em equilíbrio com o meio. A dosagem de mercúrio urinário reflete uma exposição corrente, não tendo relação direta com o quadro clínico. Desta forma, um trabalhador que apresente níveis de mercúrio urinário acima de 35µg/gC (limite biológico máximo permitido para este indicador, pela NR7, 1994), encontra-se em situação de exposição perigosa, com probabilidade de apresentar sinais e sintomas compatíveis com intoxicação caso continue no mesmo ambiente, mas não encontra-se necessariamente intoxicado. O diagnóstico de intoxicação por mercúrio elementar baseia-se em sinais e sintomas compatíveis, a serem descritos abaixo, prescindindo da dosagem de mercúrio urinário para sua confirmação ou exclusão. Como a meia-vida biológica do mercúrio é relativamente curta, após poucas semanas de afastamento da exposição os níveis de mercúrio urinário devem voltar a estar dentro dos valores de referência, embora, no caso hipotético de uma intoxicação, seus sinais e sintomas ainda persistam. As dosagens urinárias de mercúrio nas exposições ao mercúrio elementar e sais inorgânicos têm seu maior valor na confirmação da exposição e no controle da terapêutica quelante, quando indicada. 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 18/58 No caso de exposição a compostos orgânicos, a dosagem urinária tem pouco ou nenhum valor, já que sua excreção se dá pelas fezes. Aí, a dosagem sanguínea é o exame de escolha e, em geral, reflete a carga corpórea. Valores de referência para mercúrio na urina e no sangue dependerão de investigação em populações regionais isentas de exposição inalatória ou digestiva ao mercúrio. Para o Mercúrio sangüíneo, a média para a população não exposta varia de 1 a 8µg/L e o Mercúrio urinário varia de 4 a 5µg/L. Mais recentemente estudos internacionais subsidiaram o valor estabelecido pela International Commission on Occupational Health (ICOH) e pela International Union of Pure and Applaied Chemistry (IUPAC) de 2µg/L na urina para pessoas que não consomem peixe. No Brasil, a NR-7 do Ministério do Trabalho, 1996, define valores de referência para adultos e índices biológicos de exposição (ou índices biológicos máximos permitidos) para mercúrio urinário - VR = 5µg/gC e IBE/IBMP, = 35 µg/gC. Nas situações clínicas nas quais a exposição foi crônica com doses desconhecidas, ou variável ao longo do tempo ou se deram há mais de dois meses do diagnóstico sintomático, as dosagens de mercúrio urinário ou sangüíneo poderão apresentar discrepâncias. Nesses casos o diagnóstico deve ser realizado a partir da presença de sinais e sintomas compatíveis, relação temporal definida entre o surgimento destes e a história de exposição, e história de exposição comprovada (conhecimento do ambiente + dosagens ambientais caracterizando presença de mercúrio no ar acima dos limites de tolerância estabelecidos). Convém ainda salientar que, apesar de bastante utilizado como material de obturação dentária, o amálgama de mercúrio dentário em geral proporciona elevações no mercúrio urinário em proporções não significantes, de cerca de 3 a 17µg por urina de 24 horas, e que em alguns estudos esses resultados não passaram de 5µg/24 horas, pouco interferindo nos resultados de monitorização. Os casos de intoxicação aguda por mercúrio elementar, casos raros onde a exposição se dá em altas concentrações e geram quadro de pneumonite química grave, além do tratamento inespecífico relacionado à manutenção da homeostase interna, os pacientes podem ser tratados com agentes quelantes. Dentre eles destacam-se: o dimercaprol (BAL), a penicilamina e o ácido dimercapto-1-propanilsulfônico (DMPS). Pessoas com diagnóstico de intoxicação crônica devem ser afastadas imediatamente da exposição. O tratamento quelante não tem mostrado vantagens sobre a excreção urinária natural do mercúrio, embora alguns produtos de nova geração, como os ácidos 2,3-dimercaptosuccínico (DMSA) e dimercapto-1-propanilsulfônico (DMPS), tenham apresentado resultados discretamente benéficos em casos selecionados. Apesar de o DMPS aumentar a excreção urinária de mercúrio em trabalhadores expostos a cerca de 7,6 a 10 vezes o valor pré-quelação, esse fator não é muito diferente do fator obtido em controles não expostos. Da análise da literatura, observa-se tendência marcante de tentativa de redefinição dos limites de tolerância ambientais e biológicos para o mercúrio elementar, em função de achados neurocomportamentais e neurofisiológicos sub-clínicos, faltando, para tanto, a definição de maior homogeneidade nas populações de estudo, visando comparabilidade de resultados e entendimento mais aprofundado do significado clínico (prognóstico, basicamente) das alterações encontradas, além de desenho 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 19/58 epidemiológico prospectivo, pois a grande maioria dos trabalhos apresenta desenho transversal (cross sectional). SAIS DE MERCÚRIO INORGÂNICO O mercúrio inorgânico na forma de sais monovalentes ou bivalentes, como o bicloreto de mercúrio, está normalmente disponível como reagente em laboratórios químicos, e pode ser causa de acidentes ou tentativas de suicídio e homicídio por via digestiva. Ele faz parte do conteúdo químico das baterias tipo botão e cilíndricas. A ingestão de sais inorgânicos de mercúrio produz um amplo espectro de efeitos, de irritação leve do trato gastrintestinal até a insuficiência renal aguda com evolução letal. Algumas horas após a ingestão, ocorrem descoloração acinzentada das mucosas, gosto metálico da boca, náuseas e vômitos, que podem ser sanguinolentos, com dor abdominal, hematêmese e eventualmente melena. Quadros graves registram gastrenterite hemorrágica com perda massiva de líquidos, levando a necrose tubular aguda. Trata-se de substância extremamente tóxica pela classificação baseada em DL50. A dose letal calculada para humanos é de 30 a 50mg/kg de peso. Alguns autores descrevem casos relativamente típicos de ingestão em tentativas de suicídio, com doses de 6 e 7g, respectivamente, com desenvolvimento de insuficiência renal aguda após quadro de hemorragia extensa do trato gastrintestinal, e morte, apesar dos tratamentos quelantes, da hemodiálise e da plasmaferese. A análise da evolução de séries de casos tem mostrado que a morte está associada à ocorrência precoce de oligúria, que revela um acometimento tubular agudo com necrose, e está relacionada com a dose ingerida. A ingestão de baterias tipo botão ou cilíndricas deve ser motivo de preocupaçãomédica e observação criteriosa do paciente, apesar dos poucos casos de complicação desse tipo de acidente até o momento. O tratamento desses casos pode necessitar de intervenção cirúrgica, quando a bateria se rompe na luz do trato gastrintestinal, causando corrosão, necrose e perfuração. O tratamento das intoxicações por sais inorgânicos de mercúrio, além dos cuidados inespecíficos de controle do choque, da insuficiência renal aguda, do sangramento de trato gastrintestinal e, eventualmente, de procedimento cirúrgico nos casos de necrose da parede digestiva, inclui o uso precoce de agentes quelantes. Os quelante indicados são o BAL por via intramuscular, o DMSA e o DMPS. A eficácia de tratamento quelante dependerá do grau de hipovolemia, que dificulta o acesso do fármaco aos sítios de ação do mercúrio, e do grau de insuficiência renal. Hemodiálise, hemoperfusão e plasmaferese devem ser cogitadas e instituídas, em função do caso. MERCÚRIO ORGÂNICO 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 20/58 O mercúrio orgânico se encontra, principalmente, na forma de compostos alquilados (metilmercúrio, etilmercúrio), que foram utilizados, por décadas, como fungicidas na conservação de grãos e sementes, em cultura de cana de açúcar (no Brasil) como conservante dos gomos para o plantio, e pode ainda ser encontrado na indústria química como subproduto de sínteses. A intoxicação humana se dá pela via digestiva, por ingestão direta dos compostos ou de alimentos produzidos com grãos contaminados, ou consumo de peixes e frutos do mar que acumularam quantidades significativas de mercúrio orgânico. a) Diagnóstico clínico A toxicodinâmica desses compostos está primordialmente relacionada a efeitos no sistema nervoso central (sistema nervoso central). As diversas epidemias de intoxicação por mercuriais orgânicos de cadeia curta (metil e etilmercúrio) ocorridas no mundo desde a década de 50, como no Japão, Iraque e México, por exemplo, produziram efeitos agudos e crônicos relacionados basicamente com lesões no sistema nervoso central. Apesar da síndrome ser marcadamente neurotóxica e tardia, pode-se observar nesses episódios, quadros agudos associando sintomas gastrintestinais, tremores, sintomas respiratórios e dermatites. De forma mais típica, no entanto, os sinais e sintomas de intoxicação ocorrem cerca de semanas a meses após o episódio de ingestão, e incluem parestesias na face (lábio) e extremidades, seguidos ou concomitantes a cefaléia, fadiga e tremores. A evolução clínica pode mostrar ataxias, disartrias, constrição do campo visual (visão tunelar) e cegueira, além de distúrbios de audição, hiperreflexia, movimentos atetóticos, ptialismo e quadros variados de demência. E estudo de 33 pacientes intoxicados no episódio do Iraque, onde grãos contaminados com metilmercúrio foram usados para fazer pão, as alterações cerebelares foram as mais proeminentes e as que deixaram mais seqüela. Em Minamata, no Japão, mães contaminadas por metilmercúrio, apesar de não apresentarem sinais e sintomas de intoxicação, tiveram filhos com baixo peso e hipotonia muscular, retardo de desenvolvimento neuropsíquicomotor, tendência a convulsões, surdez e cegueira. Como na exposição crônica a mercúrio metálico elementar por via inalatória, o profissional de saúde deve estar preparado para avaliar alterações sub-clínicas de sistema nervoso central e sistema nervoso periférico, com testes neurocomportametais padronizados para o tipo de população estudada e testes neurofisiológicos, como eletroneuromiografia e velocidade de condução nervosa. b) Diagnóstico laboratorial complementar A avaliação laboratorial complementar deve incluir pesquisa da função renal e dosagem de mercúrio no sangue. A interpretação de níveis baixos de mercúrio sangüíneo não deve descartar a relação etiológica do quadro clínico com uma exposição ao mercúrio no passado. 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 21/58 c) Tratamento O tratamento com agentes quelantes desse tipo de intoxicação é pouco animador. Para uso de BAL, DMPS e DMSA, deve-se levar em conta aspectos da toxicocinética dos compostos mercuriais orgânicos (meia-vida plasmática, volume de distribuição, ligação tecidual, etc.), além da experiência acumulada na literatura mostrando pouca resposta clínica. Nenhum trabalho experimental ou clínico, até o momento, mostrou reversão de sinais e sintomas neurológicos com o uso de quelantes, apesar de haver decréscimo na meia-vida de eliminação do mercúrio de 60 dias para 10 dias em alguns estudos. Apesar de não se observar melhora clínica, é bastante razoável postular que a redução da carga corpórea de mercúrio durante a quelação diminua o risco de piora dos sinais e sintomas e tenda a estabilizar o quadro. Uma resina politiólica administrada por via oral pode ser útil em exposições mais recentes, por interromper o ciclo entero-hepático de excreção e reabsorção do mercúrio pelo trato gastrintestinal. ARSÊNIO Os casos clínicos de intoxicação aguda por arsênio são devidos, em sua maioria, as tentativas de suicídio, quando seus sais inorgânicos, tais como os óxidos de arsênio, são ingeridos em doses elevadas. Os pacientes chegam aos serviços de urgência com sinais de sangramento do trato gastrintestinal e graus variados de hipovolemia. A intoxicação aguda por arsênio manifesta-se inicialmente por quadro de náusea, dor abdominal intensa, vômitos e diarréia, que pode ser profusa, em água de arroz (como no cólera) e tornar-se sanguinolenta com a evolução. Esses sintomas são precoces, ocorrendo alguns minutos ou poucas horas após ingestão. A literatura universal é relativamente pródiga em descrições de intoxicações agudas por arsênio, sendo a de Flaubert, no romance Madame Bovary, uma das mais acuradas, abordando a ingestão do veneno pela protagonista, em tentativa de suicídio bem sucedida, e relatando seus sintomas gastrintestinais iniciais, suas dores abdominais, o choque hipovolêmico e, finalmente, a morte. Na realidade, o quadro clínico é bastante inespecífico, podendo ser causado por diversos outros fatores, tanto tóxicos e como infecciosos. O médico deve estar atento à possibilidade de intoxicação por arsênio, a partir de detalhes da anamnese colhida junto ao paciente ou acompanhantes, da história psiquiátrica, das eventuais tentativas anteriores de suicídio e do acesso ao sal por parte do paciente (as profissões de químicos, farmacêuticos, técnicos de laboratório, facilitam acesso aos compostos de arsênio). Contemporaneamente ao quadro gastrintestinal, ou algumas horas depois, efeitos cardiovasculares tornam-se mais evidentes, como taquicardia, sinais de hipovolemia, como hipotensão e oligúria, levando ao choque. Arritmias graves com torsade de pointes com intervalo QT prolongado, podem surgir tardiamente, dias após a ingestão. 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 22/58 Em casos de ingestão recente, o exame radiológico simples de abdome mostra a presença de material radiopaco na luz intestinal, simulando resíduo de bário pós- exames contrastados. A detecção e dosagem laboratorial de arsênio na urina confirmam definitivamente a intoxicação por arsênio ao encontrar concentrações elevadas, apesar de que concentrações baixas não descartam a relação causal, dependendo da hora da ingestão. Os valores de referência estão definidos como 50µg/L em dosagem de urina pontual, ou um total de 100µg em urina de 24h. Resultados não muito elevados, em quadros clínicos leves de pacientes que ingeriram frutos do mar algumas horas antes, devem ser interpretados com cautela. Em casos de arsenicismo (intoxicação crônica pelo metal), ou mesmo para fins médico-legais, a dosagem de arsênio no cabelo ou unhas é recomendado.Nos casos agudos, a toxicocinética do arsênio não justifica a realização de dosagem com essas matrizes. A intoxicação aguda por ingestão de sais inorgânicos de arsênio deve sempre ser considerada grave a priori, com grande risco de morte, mesmo quando os sinais e sintomas ainda são leves. Ela deve ser tratada agressivamente desde o início, com reposição generosa de volume e uso de drogas vasoativas. A lavagem gástrica, com sonda calibrosa e grandes volumes de soro fisiológico, está indicada nesses casos. O carvão ativado é contra-indicado quando há suspeitas de corrosão da mucosa do trato gastrintestinal, ou se o paciente apresenta sangramento digestivo. O conteúdo da lavagem gástrica pode ser utilizado para dosagem de arsênio e confirmação diagnóstica. O início precoce da terapêutica quelante é fator determinante na sobrevivência desses pacientes, pois as medidas de controle do choque, da insuficiência renal aguda e das arritmias, podem ter seus efeitos comprometidos. O tratamento quelante específico deve ser feito com o dimercaprol (BAL), nas doses de 3 a 5mg/kg, de 4 em 4 horas, por via intramuscular, até que níveis de arsênio na urina estejam abaixo de 50µg/L. O ácido 2,3-dimercatosuccínico (DMSA) pode ser dado, por via oral, como complementação ao tratamento com dimercaprol, quando esta via tornar-se viável durante evolução do quadro. Pouco se sabe sobre os efeitos do DMSA, quanto ao aumento ou diminuição da absorção do arsênio na luz intestinal. A dose é de 10mg/kg, de 8 em 8h, por 5 dias, seguida de 10mg/kg, de 12 em 12h, por mais 14 dias. O ácido dimercapto-1-propanol (DMPS) parece ter melhores efeitos no tratamento da intoxicação aguda por arsênio. Usado também por via oral, é análogo hidrossolúvel e derivado do BAL. Outra opção de tratamento, que complementa o tratamento parenteral com BAL, é o aporte de D-penicilamina por via oral. No entanto, seus efeitos colaterais, principalmente renais, podem contra-indicar seu uso em alguns casos. Hemodiálise pode ser necessária em caso de falência renal (VAZIRI et al., 1980). A ingestão crônica de arsênio inorgânico pode levar a quadros de cólicas, náuseas e diarréia crônica, também inespecíficos, que devem ser diferenciados de outras possíveis etiologias. Fraqueza, emagrecimento por perda de apetite e anemia, quadros de neuropatia periférica de predomínio sensitivo e sintomas de encefalopatia crônica podem ocorrer em trabalhadores expostos. Também aparecem sinais de hepatotoxicidade e alterações dermatológicas, como hiperqueratose palmar e plantar e lesões hipercrômicas, que,Esses associados à história de exposição crônica, devem levar à dosagem de arsênio na urina para confirmar o diagnóstico. 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 23/58 Casos de tentativa de homicídio por contaminação de alimentos com sais de arsênio (o trióxido de arsênio é branco, inodoro e não tem gosto) podem fazer derivar o diagnóstico pela presença de sinais e sintomas inespecíficos sem história conhecida, ambiental ou ocupacional, de exposição crônica ao arsênio. No arsenicismo, as unhas do paciente podem apresentar estrias transversais esbranquiçadas, sugerindo sofrimento da matriz da unha pela presença do arsênio (tais estrias podem ocorrer também na intoxicação por tálio e por mercúrio). Nesses casos, a exclusão de outros possíveis diagnósticos de neuropatias sensitivas, associadas ou não a hepatopatias, e/ou lesões de pele e sintomas gerais inespecíficos, pode levar à suspeita de envenenamento crônico por arsênio. A dosagem de arsênio no cabelo ou na unha, nesses casos, é de extremo auxílio no diagnóstico. TRATAMENTO POR QUELANTES As medidas terapêuticas em Toxicologia clínica estão divididas em etapas ou fases, não necessariamente isoladas ou seqüenciais, podendo ser indicadas simultaneamente conforme cada caso. Dependendo da via de absorção principal, as medidas de desintoxicação variam. A ingestão de sais de metais que podem ser cáusticos ou lesivos à mucosa gastrintestinal contra-indica o vômito provocado, como no caso de soluções concentradas de sais inorgânicos de mercúrio. O carvão ativado tem a propriedade de adsorver diversas substâncias químicas, retirando-as do contato com a mucosa gastrintestinal e impedindo assim sua absorção. Porém, não existem trabalhos mostrando eficácia em casos de ingestão de metais. A lavagem gástrica que se usa no caso de substâncias ingeridas há menos de 1 hora ou há mais tempo no caso do estômago estar com alimentos no momento da ingestão, tem o inconveniente de facilitar a aspiração pulmonar do conteúdo da lavagem, além de causar lesões mecânicas da faringe e esôfago pela passagem da sonda. Com relação à ingestão de sais de metais, há que se levar em consideração o efeito do sal específico na mucosa do tubo digestivo, analisando-se o risco de sangramento durante o procedimento, como no caso de ingestão de sais de arsênio ou de mercúrio nas tentativas de suicídio. A irrigação intestinal total (whole bowel irrigation) pode ser uma medida terapêutica associada ao uso de quelantes em casos de ingestões de grandes quantidades de metais, como o chumbo, na forma de óxidos. No caso específico de ingestão de metais ou metalóides como o arsênio, é de importância o conhecimento da forma química do contaminante, pois existem diferenças marcantes quanto às taxas de absorção pela mucosa digestiva segundo que se trate de metais na forma metálica com valência zero, sais inorgânicos (com diferenças entre si, conforme a valência), ou compostos orgânicos alquilados. 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 24/58 Outras medidas terapêuticas após ingestão, inalação ou absorção dérmica de metais ou de metalóides incluem o aumento da excreção renal e/ou o impedimento ou diminuição da distribuição a partir da corrente sangüínea, utilizando-se técnicas de hemodiálise e hemoperfusão. Estas últimas têm pouca indicação no caso dos metais. O aumento da excreção urinária é procedimento pouco eficaz, mas que deve ser sempre lembrado no sentido de ao menos não se negligenciar e garantir a diurese adequada em pacientes que possam ter quadro de redução do conteúdo intravascular por efeito da intoxicação, como no caso da intoxicação por arsênio. Nesse mesmo sentido, a diurese adequada e a correção de eventual desidratação devem preceder qualquer medida terapêutica específica, como o uso de drogas quelantes. O método mais eficaz de tratamento de intoxicações por metais de que se dispõe é a quelação. O termo “quelação” provém do inglês “chelation”, que por sua vez vem do grego, a partir de khélê, que significa pinça ou mandíbula. O latim também fornece “chêle”, derivado do grego, significando “os braços da constelação de escorpião”. Assim, o sentido do termo usado em química está ligado à ação de pinçar, agarrar, e é utilizado como o processo de transformação de uma substância (o quelante) e um metal qualquer num quelato, que é um complexo químico no qual o metal é «pinçado» ou «agarrado» quimicamente, numa ligação covalente com o agente quelante. Quimicamente, o quelato é um sal ou íon complexo, no qual os ligantes se coordenam com o íon ou átomo do metal através de duas ou mais ligações covalentes, na forma de anel. O uso de agentes quelantes na terapêutica de intoxicações por metais desenvolveu- se a partir dos anos 40. O método de administrar-se agentes quelantes rapidamente excretáveis pelos rins, visando aumento na eliminação de metais, foi explicitado pela primeira vez em 1942, a propósito do uso de citrato iônico no tratamento de intoxicação por chumbo. Nessa mesma década, em 1946, foram publicados os primeiros resultados do uso de um agente quelante, o 2,3-dimercaptopropanol (BAL), no tratamento de intoxicação por arsênio. Desde então, vários outros agentes têm sido sintetizados e colocados em teste clínicoapós estudos experimentais de eficácia e efeitos colaterais. Os metais parecem exercer seus efeitos tóxicos através da ligação com um ou mais grupamentos reativos de enzimas e proteínas constituintes da estrutura ou do metabolismo normais. Os agentes quelantes, também chamados de antídotos, são compostos que competem especificamente com esses grupamentos promovendo a ligação química do metal consigo e não com as enzimas ou proteínas normais. Os metais podem reagir com os seguintes grupamentos contidos em enzimas: -OH, - COO-, -OPO3H, >C=O, -SH; -S-S-, -NH2 e >NH. Um agente quelante possui dois ou mais desses grupamentos em sua estrutura química, permitindo a ligação covalente do cátion metálico, formando um anel heterocíclico bastante estável, que será então eliminado, sem sofrer biotransformação significativa, através da urina. Essa estabilidade química vai variar de acordo com o metal e com o agente quelante. O chumbo e o mercúrio, por exemplo, têm maior afinidade pelos grupamentos contendo enxofre do que pelos grupamentos contendo oxigênio. Os agentes quelantes são relativamente inespecíficos, mas dependendo da afinidade química existem diferenças de eficácia que podem ser significativas clinicamente. A eficácia de um agente quelante vai depender de pelo menos três fatores: 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 25/58 a) a afinidade química pelo metal causador da intoxicação; b) as características toxicocinéticas (coeficiente de partição; passagem por membranas; passagem por barreiras hematoencefálica e placentária, por exemplo); c) a capacidade de excreção do complexo quelado (quelato). O quelante ideal deve preencher alguns pré-requisitos importantes: - ter alta hidrossolubilidade (para garantir máxima excreção urinária do quelato); - não sofrer biotransformação significativa; - ter boa distribuição através dos tecidos orgânicos, onde o metal tóxico possa estar depositado ou agindo; - ter especificidade de ligação com o metal em questão e pouca ou nenhuma afinidade com metais essenciais como zinco, ferro, cobre, magnésio, manganes; - ter pouca afinidade com o cálcio, por risco de produzir hipocalcemia clínica; - ter capacidade química de formar um quelato estável no pH dos diversos compartimentos corpóreos; - ter boa taxa de excreção renal (ou eventualmente, hepatobiliar); - ter baixo índice de efeitos colaterais nas doses terapêuticas. Metais endógenos são componentes integrais de muitos dos sistemas enzimáticos. Estima-se que cerca de um terço das enzimas participantes de nosso metabolismo contêm um íon metálico envolvido em processos catalíticos ou funcionando como co- fator durante a atividade enzimática. Da mesma forma, tem-se demonstrado com freqüência e boa reprodutibilidade, que deficiências de determinados metais resultam em condições patológicas que são revertidas com o suprimento terapêutico ou dietético dos mesmos. Os quelantes hoje disponíveis para uso terapêutico são inespecíficos, quelam metais essenciais com maior ou menor afinidade e devem ser analisados quanto ao desempenho em eficácia e tempo de uso, frente a esse aspecto de depleção de metais essenciais, como veremos adiante com cada um deles. Atualmente, dispõe-se de cerca de 10 quelantes em uso terapêutico e um em situações experimentais de investigação. O Quadro 1 traz a lista deles com suas respectivas aplicações a determinados metais e outras situações clínicas, conforme eficácia clínica estabelecida. Principais quelantes em uso clínico terapêutico e suas respectivas indicações Agente quelante e metais que são quelados 1. Dimercaprol (BAL) ou (2,3-dimercaptopropanol): As, Hg, Pb, Au. 2. DMPS (ácido dimercapto propanil-1- sulfônico) [Dimaval®; Unithiol®]: As, Hg, Pb. 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 26/58 3. DMSA (ácido dimercaptosuccínico) [Chemet®; Succimer®]: Pb, As, Hg, Al. 4. (D-penicilamina) [Cuprimine®; Depen®]: Cu, Pb, As, Hg, Au, Doença de Wilson, cirrose biliar. 5. EDTACaNa2 (ácido etilenodiamino- tetracético cálcico dissódico) [Versenato de Ca]: Pb. 6. Desferoxamina (mesilato de desferoxamina) [Desferal®; DFO]: Fe. 7. (N-acetilcisteina) [Acetilcisteina; N-acetil; Mucomyst®] : Hg, Co, acetoaminofen. 8. (N-acetil-D,L-penicilamina): Hg. 9. Azul da Prússia (Fe4[Fe(CN)6]3) [Ferrocianeto férrico; Ferrocianeto de K]: 137Cs, Ta. 10. (Dihidrocloreto de trientina) [Trientina®; Trien®] : Cu, Doença de Wilson. 11. DTPACaNa3 (ácido dietilenoamino- pentacético cálcico trissódico): 239Pu. DIMERCAPROL Trata-se do primeiro agente quelante utilizado no arsenal terapêutico das intoxicações por metais ou metalóides. Foi desenvolvido e sintetizado na década de 40, por encomenda do governo britânico, como antídoto para os gases de guerra arsenicais utilizados na primeira grande guerra, especificamente o lewisite (um líquido vesicante derivado da arsina, o diclorovinil arsina), assim nomeado em honra a W. L. Lewis, famoso químico norte-americano. Essa substância é um potente produtor de dermatite com vesículas (vesicante), além de produzir efeitos sistêmicos tóxicos. Tentando identificar o mecanismo de ação desse agente, determinou-se que a ligação química base da ação tóxica era do arsênio com grupamentos -SH de enzimas e proteínas, causando a lesão dermatológica vesicante e os efeitos sistêmicos. Assim, a síntese de possíveis antídotos à base de enxofre levou à descoberta do ditiol 2,3- dimercaptopropanol, que foi apelidado então de British anti-lewisite (BAL) pelos norte-americanos, em honra à nacionalidade de seus descobridores. Essa molécula combina-se com o arsênio formando um quelato estável em forma de anel, excretável pelos rins. Trabalhos têm mostrado que o BAL forma quelatos com vários metais: mercúrio inorgânico, arsênio, antimônio, níquel, bismuto, cádmio, cromo, cobalto e ouro. Formar quelatos quimicamente estáveis não quer dizer quer o quelante seja uma boa opção terapêutica para aquele metal específico. Exemplo desse princípio é o caso do cádmio, que apresenta grande afinidade química com o BAL, mas estudos experimentais mostraram aumento da toxicidade renal pelo próprio cádmio, quando do uso do agente quelante. O dimercaprol é altamente lipossolúvel, é incolor e tem forte cheiro de enxofre. Deve ser administrado apenas por via intramuscular, alcança níveis plasmáticos máximos 18/03/2021 UNIP - Universidade Paulista : DisciplinaOnline - Sistemas de conteúdo online para Alunos. https://online.unip.br/imprimir/imprimirconteudo 27/58 em cerca de 30 minutos e tem tempo estimado de meia-vida de excreção renal de cerca de 4 h. Apresenta também excreção considerável pelo sistema hepatobiliar, podendo ser recuperado nas fezes. A formulação de BAL disponível no comércio é da substância associada a 5% de óleo de amendoim e benzoato de benzila (este, na proporção de 2:1), acrescidos de antioxidantes, em ampolas de 3mL, contendo 300mg de dimercaprol, 600mg de benzoato de benzila e 2,1g de óleo de amendoim. A injeção intramuscular pode provocar dor local. Tendo em vista sua boa lipossolubilidade, a absorção por essa via é rápida e sua distribuição pelos tecidos também é rápida e eficiente, passando as barreiras hematoencefálica e placentária sem problemas, garantindo o efeito do fármaco nos sítios celulares de ação do metal tóxico. Assim, os pacientes referem melhora de sintomas logo após a primeira injeção, e níveis elevados de arsênio na urina são logo identificados. Estudos experimentais mostraram que o uso tópico de BAL é eficaz no controle dos efeitos dérmicos tópicos de agentes arsenicais, tanto na sua prevenção quanto no seu tratamento, quando aplicados dentro da 1ª. hora após contato com o metal. Entretanto, durante o uso em seres humanos, o BAL tópico mostrou efeitos colaterais como prurido, eritema e disestesias, desencorajando sua aplicação
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