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ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO PARA O CUIDADO Lina Sant Anna Macro e micronutrientes: lipídeos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Reconhecer o conceito e os tipos de lipídeos. � Identificar características dos lipídeos. � Descrever as implicações do consumo inadequado de lipídeos para a saúde. Introdução Os lipídeos são substâncias que apresentam, como propriedade comum, a insolubilidade em água e a solubilidade em solventes orgânicos. Suas moléculas, assim como as das proteínas e dos carboidratos, possuem carbono, hidrogênio e oxigênio em sua composição química. No caso dos lipídeos, porém, é maior a proporção de carbono e hidrogênio em relação ao oxigênio. Assim, proporcionam mais energia por grama do que os outros macronutrientes. Na alimentação humana, os lipídeos se apresentam na forma de óleos e gorduras, em vários alimentos originários tanto do reino animal como do vegetal. Além de melhorarem o sabor e a palatabilidade dos alimentos, desempenham diferentes funções no corpo humano, participando da formação das membranas celulares nos nervos e no cérebro. Servem também como depósitos de energia; ajudam na formação de hormônios corticosteroides, no transporte de vitaminas lipossolúveis, além de forne- cerem proteção para órgãos e ossos. No entanto, devem ser consumidos com moderação (cerca de 20 a 35% do valor calórico total da dieta), em vista da participação das gorduras saturadas, presentes em alguns deles, no desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Conceito e tipos de lipídeos Os lipídeos constituem um amplo grupo de compostos quimicamente diversos que não se dissolvem rapidamente em água, mas se dissolvem facilmente em solventes orgânicos, como o éter etílico. Quando são sólidos à temperatura ambiente são chamados de gorduras. Quando ficam em estado líquido, sob a mesma condição, são definidos como óleos. Fazem parte deste grupo os ácidos graxos, os triglicerídeos, os fosfolipídeos e os esteróis. A seguir, vamos conhecer as características de cada classificação. Ácidos graxos Os ácidos graxos são os lipídeos mais simples e estão presentes também nos triglicerídeos (que são o principal tipo de lipídeos que consumimos). São formados por uma longa cadeia de carbonos ligados entre si por átomos de hidrogênio, tendo um radical ácido numa extremidade e, na outra, um radical metila. A Figura 1 mostra uma molécula de ácido graxo. Figura 1. Molécula de ácido graxo. Fonte: Adaptada de Wardlaw e Smith (2013, p. 189). radical ácido radical metila C O OH CH3 Macro e micronutrientes: lipídeos2 Os ácidos graxos que ocorrem na natureza podem ser classificados em duas categorias: � Ácidos graxos saturados: ocorrem quando o átomo de carbono man- tém uma infinidade de moléculas de hidrogênio. São assim chamados, portanto, por estarem “saturados” de hidrogênio. Em sua maioria, as gorduras ricas em ácidos graxos saturados permanecem sólidas em temperatura ambiente, a exemplo das gorduras de origem animal, como a banha, a manteiga, as gorduras aparentes das carnes, etc. � Ácidos graxos insaturados: ocorrem quando o átomo de carbono con- tém uma ou mais duplas ligações e, portanto, terá menos posições para se ligar ao hidrogênio. Se o ácido tiver apenas uma dupla ligação, será denominado ácido graxo monoinsaturado (presente no azeite de oliva). Se tiver mais de duas, será denominado ácido graxo poli-insaturado (presente nos óleos vegetais e nos peixes gordurosos como o salmão e a sardinha). Os ácidos graxos são vitais para o funcionamento normal de todos os siste- mas do corpo. Os sistemas circulatório, respiratório, tegumentar, imunológico, neurológico e outros órgãos requerem ácidos graxos para seu funcionamento adequado. São denominados ácidos graxos não essenciais aqueles que o organismo é capaz de sintetizar e constituem a maioria. No entanto, existem alguns que o corpo não consegue sintetizar e são, portanto, chamados de ácidos graxos essenciais. Os ácidos graxos essenciais são o ácido linoleico (ômega-6) e o ácido alfa- -linolênico (ômega-3). Eles compõem estruturas vitais do corpo, desempenham importantes papéis no sistema imune e na visão; ajudam a formar membranas celulares e produzem compostos semelhantes a hormônios. Precisam ser fornecidos pela dieta porque as células do corpo humano não possuem as enzimas necessárias para produzi-los. Outros ácidos graxos, como os ácidos graxos ômega-9, podem ser sintetizados pelo organismo e por isso não são essenciais da alimentação (WARDLAW; SMITH, 2013). Os ácidos graxos essenciais ômega-3 e ômega-6 também ajudam a regular o colesterol e a coagulação sanguínea, além de controlar a inflamação nas articulações, tecidos e corrente sanguínea. Essas gorduras estão presentes em alimentos de origem vegetal e animal como descritas no Quadro 1. 3Macro e micronutrientes: lipídeos Fonte: Adaptado de Wardlaw e Smith (2013). Ácido graxo Fontes Ômega-3 Salmão, atum, sardinha, aliche, robalo, dourada, arenque, cavala, truta. Óleos de soja, canola, sementes de oleaginosas, linhaça Mariscos, caranguejo e camarão. Ômega-6 Óleos vegetais (milho, soja, cártamo), nozes e sementes Quadro 1. Fontes de ômega-3 e ômega- 6 O consumo de ácidos graxos poli-insaturados ácido linolênico (ômega-3) e ácido linoleico (ômega-6) favorece a diminuição dos níveis de colesterol LDL, a elevação do colesterol HDL, resultando na redução da pressão arterial e, portanto, em menor risco de doenças cardiovasculares. A proporção ideal de consumo é sempre de 5:1 (5 g de ômega-6 para 1 grama de ômega-3, por exemplo). Percebe-se, porém, que os indivíduos consomem muito ômega-6 por meio dos óleos vegetais, mas quantidades insuficientes de ômega-3. Para obter um equilíbrio adequado entre os dois, portanto, deve-se aumentar a ingestão de peixes ou outras fontes de ácidos graxos ômega-3, pelo menos duas vezes por semana. Ácidos graxos trans Onde existem ligações duplas, existe a possibilidade de isomerismo geométrico cis ou trans, que afeta as propriedades do ácido graxo. A maioria das formas de ocorrência natural são os isômeros cis, nos quais os átomos de hidrogênio estão do mesmo lado da dupla ligação. Neste arranjo, os ácidos graxos se encaixam menos firmemente, aumentando a fluidez das membranas. Macro e micronutrientes: lipídeos4 Quando os átomos de hidrogênio estão dispostos em lados opostos da ligação dupla, em configuração trans, a molécula permanece alongada e semelhante a um ácido graxo saturado. Isso permite que as moléculas este- jam mais firmemente juntas, aumentando o ponto de fusão da gordura e lhe conferindo consistência mais firme. É muito comum o uso de ácidos graxos trans no preparo de alimentos processados, o que pode trazer efeitos adversos à saúde. Em 2010, a American Heart Association recomendava que o consumo de gordura trans fosse de até um por cento das calorias totais da dieta (REMIG et al., 2010). A última recomendação, de 2015, preconiza que o consumo de gordura trans deve ser evitado (AMERICAN HEART ASSOCIATION, 2015b). Os ácidos graxos trans são obtidos como resultado do processamento de alimentos e são, portanto, encontrados em produtos que contêm gorduras endurecidas, como margarina dura, doces, biscoitos e produtos cárneos. Também são produzidos durante as transformações por bactérias anaeróbias no rúmen de ovinos e vacas, de modo que alguns poucos ácidos graxos trans podem ser encontrados na carne e nos produtos desses animais, como leite e produtos lácteos. Fosfolipídeos Os fosfolipídeos representam apenas cerca de dois por cento dos lipídeos da dieta e são encontrados em plantas e animais. A lecitina é a fonte mais abun- dante de fosfolipídeo encontrada na natureza e está presente em alimentos como ovos, fígado, amendoim, soja e gérmen de trigo. Essas substâncias são cruciais para construir a barreira protetora das membranas celulares. Diferentes dos outros lipídeos,estes são solúveis em água. Assim, fun- cionam como uma interface entre os meios aquosos e lipídicos, trabalhando como agentes emulsificantes muito eficazes. Por esse motivo as indústrias de alimentos os utilizam nas margarinas, queijos e sorvetes. Presentes no sangue e nos fluidos corporais, os fosfolipídeos também formam a estrutura das lipoproteínas, substâncias que transportam a gordura por toda a corrente sanguínea (MANN; TRUSWELL, 2015). 5Macro e micronutrientes: lipídeos O papel crucial da lecitina dentro do corpo é fazer parte da membrana das células por todo o corpo. Cerca de 28% do cérebro e 66% da gordura no fígado é composto de lecitina. Muitas pessoas consomem diferentes suplementos de lecitina disponíveis no mercado em razão de propriedades da lecitina que promovem a saúde, tais como a sua capacidade de reduzir o colesterol no sangue e contribuir para a perda de peso. No entanto, como o corpo pode produzir a maioria dos fosfolipídeos e, entre eles, toda a lecitina de que precisa, seu consumo em cápsulas é desnecessário. Triglicerídeos Os triglicerídeos ou triacilgliceróis são formados por três moléculas de ácidos graxos ligados a uma molécula de glicerol e constituem cerca de 95% de gorduras provenientes da dieta. São a principal forma de lipídeos encontrada no corpo. Durante a digestão, os triglicerídeos são facilmente quebrados em diglicerídeos e monoglicerídeos, que contêm dois ou um ácido graxo, respectivamente. Desta forma, a maior parte da gordura consumida na dieta é absorvida na forma de monoglicerídeos e ácidos graxos que, uma vez ab- sorvidos, voltarão a formar triglicerídeos. Esteróis Os esteróis são o tipo menos comum de lipídeos, embora um deles, o coles- terol, seja muito conhecido. São substâncias com aspecto ceroso, que não se parecem com os triglicerídeos, ou seja, não têm a estrutura básica de glicerol ligado a ácidos graxos. Ainda assim, são classificados como lipídeos, pois não se dissolvem facilmente em água. Encontramos essa substância principal- mente nos alimentos de origem animal como carnes, leite e derivados e ovos (WARDLAW; SMITH, 2013). O corpo, no entanto, recebe apenas pequena quantidade de colesterol por meio da comida. A maior parte é produzida pelo próprio organismo. Muitos compostos vitalmente importantes para o corpo são esteróis. Entre eles, estão os ácidos biliares, os hormônios sexuais, os hormônios adrenais e a vitamina D, bem como o próprio colesterol, que pode servir como matéria prima para a formação desses compostos ou como um componente estrutural Macro e micronutrientes: lipídeos6 da membrana celular. Portanto, ao contrário do que se pensa, o colesterol é uma substância importante para o corpo e é fabricado no fígado, a partir de fragmentos de carboidratos, proteínas e gorduras. Cerca de 800 a 1.500 mg de colesterol são fabricados no fígado por dia (WHITNEY; ROLFES, 2008). Os efeitos danosos do colesterol no corpo ocorrem quando ele forma depósitos nas paredes arteriais. Esses depósitos são chamados de ateromas e levam à aterosclerose. Características Nesta seção, veremos quais as funções dos lipídeos no organismo e como é feita sua digestão. Funções dos lipídeos As principais funções dos lipídeos são fornecer e armazenar energia, isolar e proteger o corpo, fazer a regulação hormonal, transportar de vitaminas lipossolúveis e promover sabor e saciedade, todas elas detalhadas a seguir. Fonte e armazenamento energia Os triglicerídeos da dieta, armazenados no tecido adiposo, fornecem os áci- dos graxos, que são o principal combustível para os músculos nas fases de repouso e atividade leve. Outros tecidos do corpo também usam os ácidos graxos como fonte de energia. Em geral, cerca de metade da energia usada pelo corpo em repouso e durante atividades leves provém dos ácidos graxos (WARDLAW; SMITH, 2013). O excesso de calorias, ingeridas em quantidade acima do necessário, converte-se em gordura como fonte de armazenamento. Essa gordura ar- mazenada será convertida em energia caso não exista energia prontamente disponível pelos carboidratos. 7Macro e micronutrientes: lipídeos Ao contrário de outras células do corpo, que podem armazenar gordura apenas em quantidades limitadas, as células de gordura (adipócitos) são espe- cializadas para armazenamento de energia e são capazes de expandir-se quase indefinidamente em tamanho. Uma grande quantidade de tecido adiposo pode resultar em estresse no corpo e pode ser prejudicial à saúde. Um sério impacto do excesso de gordura é o acúmulo de colesterol nas paredes arteriais, que pode engrossá-las, levando à doença cardiovascular. Assim, enquanto quantidades adequadas de gordura corporal são importantes para a nossa sobrevivência, em grandes quantidades pode ser um impedimento para manter uma boa saúde. As gorduras são armazenadas nos adipócitos principalmente na forma de triglicerídeos. Em geral, cerca de metade da energia usada pelo corpo em repouso e durante as atividades leves provém das gorduras. Isolamento e proteção do corpo A camada protetora de lipídeos que fica logo abaixo da pele é formada prin- cipalmente por triglicerídeos. Esta camada isola o corpo de temperaturas extremas e ajuda a manter o clima interno sob controle. A gordura também previne o atrito, principalmente nas nádegas, mãos e pernas. Indivíduos que não têm gordura suficiente em seus corpos tendem a sentir mais frio, muitas vezes sentem fadiga e apresentam feridas de pressão na pele. Cerca de 30 % do peso corporal é composto por tecido adiposo e parte disso é composta de gordura visceral (tecido adiposo ao redor dos órgãos) como o coração, rins e fígado. O cérebro tem 60% de gordura, evidenciando o papel estrutural básico da gordura em nosso organismo. Regulação hormonal Os triglicerídeos também ajudam o corpo a produzir e regular os hormônios. O tecido adiposo secreta o hormônio leptina que regula o apetite. Dentro do sistema reprodutivo, ácidos graxos são necessários para a saúde reprodutiva adequada. As mulheres que não os têm em quantidades adequadas podem parar de menstruar e apresentar problemas de fertilidade. Macro e micronutrientes: lipídeos8 Transporte de vitaminas lipossolúveis Os lipídeos auxiliam no transporte de micronutrientes, principalmente as vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K). Estas vitaminas são mais bem absorvi- das quando combinadas a alimentos ricos em gordura. os lipídeos também aumentam a biodisponibilidade dos compostos conhecidos como fitoquímicos, que são os constituintes da planta, como o licopeno (encontrado em tomates) e o betacaroteno (encontrado em cenouras). Estudos mostram que o consumo de fitoquímicos promove a saúde e o bem-estar. Como resultado, comer tomates com azeite ou molho de salada facilitará a absorção do licopeno. Cozinhar cenouras ou abóbora com um pouco de azeite na água também facilitará a absorção do beta caroteno. Sabor e saciedade A gordura contém compostos que contribuem para melhorar o sabor e aroma dos alimentos, além de proporcionar textura agradável à comida. Alimentos cozidos com gordura tornam-se mais macios e úmidos. Portanto, a comida preparada com gordura é melhor aceita pelas pessoas. Além disso, a gordura desempenha outro papel importante na nutrição, que é contribuir para a saciedade, ou sensação de plenitude. Quando alimen- tos gordurosos são consumidos, o corpo responde pelo atraso na digestão, promovendo assim uma sensação geral de plenitude. Porém, muitas vezes a sensação de plenitude ocorre e as pessoas continuam a consumir alimentos ricos em gordura. Portanto, as mesmas características que tornam atraentes as comidas ricas em gordura podem se transformar em obstáculo para a ma- nutenção de uma dieta saudável. 9Macro e micronutrientes: lipídeos Digestão dos lipídeos Todos os dias, o trato gastrointestinal recebe cerca de 50 a 100 g de triglicerí- deos, 4 a 8 g de fosfolipídeos e 200 a 350 mg de colesterol. O corpo necessita digerire absorver esses lipídeos. O principal objetivo desse processo é quebrar os triglicerídeos em pequenas moléculas que o corpo possa utilizar. A seguir serão descritas as etapas de digestão e absorção dos lipídeos. � Boca: é iniciado o processo de digestão já que os lipídeos estimulam a secreção de lipase lingual, que se tornará ativa no estômago. � Estômago: ocorre a secreção da lipase gástrica, que não possui grande importância fisiológica pois o pH ácido do estômago não permite a ação integral desta enzima. A ação gástrica na digestão dos lipídeos, portanto, está relacionada com os movimentos peristálticos do estô- mago, emulsificando-os e dispersando-os de maneira uniforme no bolo alimentar. � Intestino delgado: a chegada do bolo alimentar acidificado no duodeno induz a liberação do hormônio colecistocinina que, por sua vez, promove a contração da vesícula biliar, liberando a bile que irá emulsificar os lipídeos e irá formar as micelas por meio dos sais biliares. � Pâncreas: a lipase pancreática é a principal enzima na digestão de lipídeos, liberando grande quantidade de colesterol, ácidos graxos e algumas moléculas de mono e diglicerídeos. A síntese de lipase pan- creática ocorre pela ação do hormônio secretina e pela presença de triglicerídeos no intestino delgado. A Figura 2 mostra o processo de emulsificação dos lipídeos para formar as pequenas gotículas chamadas micelas, que facilitam a absorção dos mo- noglicerídeos e ácidos graxos pelo intestino delgado. Macro e micronutrientes: lipídeos10 a bile emulsifica os alimentos para melhorar a digestão dos lipidios Figura 2. Emulsificação dos lipídeos pela ação da bile. Fonte: Wardlaw e Smith (2013, p. 203). Grande gota de gordura Ácidos biliares Micela Lipase Monoglicerídeos e ácidos graxos Célula da mucosa A bile é produzida no fígado e armazenada na vesícula biliar. É um líquido emulsificante dos lipídeos e é constituída por sais biliares, fosfolipídeos e esteróis. 11Macro e micronutrientes: lipídeos O intestino delgado, principalmente na região do jejuno é o local de ab- sorção dos lipídeos. Os lipídeos, já emulsificados pelos sais biliares, são absorvidos pela mucosa intestinal por meio de difusão passiva. A eficiência da absorção de gorduras em humanos é de cerca de 95%. O transporte de lipídeos pela circulação sanguínea é alcançado pela agregação de lipídeos e proteínas, as chamadas lipoproteínas, que serão des- critas a seguir. Lipoproteínas Devido à sua natureza hidrofóbica, as gorduras não conseguem circular facilmente pelo sangue e, portanto, precisam se associar com substâncias hidrofílicas; caso contrário, irão se separar e flutuar na circulação. Os quilomícrons são as primeiras lipoproteínas a facilitarem a entrada das gorduras na circulação, Estes são os compostos maiores e mais leves. As lipoproteínas são classificadas de acordo a sua densidade e podem ser sepa- radas por ultracentrifugação de uma amostra de sangue. Numa extremidade da faixa estão os grandes e leves quilomícrons. Em seguida e por tamanho decrescente, aparecem as lipoproteínas de muito baixa densidade, lipoproteínas de baixa densidade e lipoproteínas de alta densidade, geralmente referidos por suas siglas VLDL, LDL e HDL. A seguir, vamos descrever cada uma delas. � VLDL: As lipoproteínas de muito baixa densidade são produzidas no fígado a partir de restos de quilomícrons e triglicerídeos. Elas transpor- tam as gorduras do fígado a vários tecidos do corpo. À medida que as VLDLs circulam pelo sangue, a lipase retira a VLDL dos triglicerídeos; � LDL: As lipoproteínas de baixa densidade são comumente conhecidas como “mau colesterol”, porque o levam, junto a outros lipídeos, do fígado para os tecidos em todo o corpo. As LDLs abrigam mais de 50% de colesterol e ésteres de colesterol. Respondem pela entrega de lipídeos para as células, pois a superfície delas possui um receptor especificamente concebido para se ligar às LDL. Uma vez dentro da célula, a LDL é quebrada e seu colesterol é liberado. No fígado, es- ses receptores ajudam no controle dos níveis de colesterol no sangue. Quando há deficiência desses receptores, é liberada uma alta quantidade de colesterol circulante na corrente sanguínea, que pode levar a doença cardíaca ou aterosclerose. Dietas ricas em gorduras saturadas limitam os receptores de LDL. Macro e micronutrientes: lipídeos12 very low density lipoprotein low density lipoprotein o alto consumo causa essa deficiência � HDL: As lipoproteínas de alta densidade são responsáveis pela remoção do colesterol da corrente sanguínea, levando-o para o fígado, onde é reutilizado ou removido do corpo junto com a bile. A HDL possui uma maior quantidade de proteína associada à baixa quantidade de colesterol (20 a 30%) em comparação com as outras lipoproteínas. Portanto, essas lipoproteínas são comumente chamadas de “bom colesterol”. O Quadro 2 resume a composição e funções das lipoproteínas do sangue. Fonte: Adaptado de Wardlaw e Smith (2013). Lipoproteínas Componente primário Principal função Quilomícron Triglicerídeo Transporta as gorduras de origem alimentar a partir das células do intestino delgado VLDL Triglicerídeo Transporta os lipídeos produzidos e captados pelas células do fígado LDL Colesterol Transporta o colesterol produzido no fígado e em outras células HDL Proteína Contribui para remover o colesterol das células e para sua excreção no organismo Quadro 2. Composição e funções das lipoproteínas Consumo inadequado de lipídeos Fontes alimentares de lipídeos Entre todos os nutrientes, os lipídeos são os mais frequentemente ligados a doenças cardíacas e alguns tipos de câncer. Felizmente, essa mesma constatação pode ajudar a prevenir todos esses problemas. Para tanto, deve-se escolher uma dieta com baixo teor de ácidos graxos saturados e moderada quantidade de lipídeos totais. É importante saber diferenciar o tipo de lipídeo presente nos alimentos. Passaremos a chamá-los de gorduras para facilitar o entendimento. 13Macro e micronutrientes: lipídeos As gorduras visíveis são aquelas que podem ser vistas claramente na comida, incluindo as que se espalham, como os óleos de cozinha e a gordura em volta de pedaços de carne. As gorduras invisíveis são mais difíceis de serem removidas, pois estão presentes dentro do alimento. Como exemplo, citamos a gordura na gema de ovo, a gordura contida nos tecidos da carne e do peixe, nas oleaginosas, em alimentos processados como salsichas, hambúrgueres, tortas, biscoitos, bolos, doces e chocolate. É claramente mais difícil reduzir o consumo dessa gordura, pois envolve mudanças na tecnologia de produção do alimento ou simplesmente eliminar a comida da dieta. Algum sucesso tem sido alcançado em leites e produtos lácteos com baixo teor de gordura e em versões com menos gordura de alguns alimentos processados. No Quadro 3, a seguir, estão listadas as quantidades de lipídeos em alguns alimentos. Fonte: Adaptado de Wardlaw e Smith (2013). Alimento Quantidade de lipídeos (g) 90 g de contrafilé 17 30 g de nozes e amêndoas 16 1 colher de sopa de óleo de canola 14 1 hambúrger 12 1 colher de sopa de margarina 12 ½ xícara de abacate 11 30 g de queijo cheddar 10 1 copo de leite integral 8 90 g de peito de frango com pele 7 250 ml de iogurte natural 7 ½ xícara de ervilha ou feijões assados 7 1 colher de sopa de sementes de linhaça 3 Quadro 3. Quantidade de lipídeos em alguns alimentos Macro e micronutrientes: lipídeos14 Doenças cardiovasculares e consumo de lipídeos Riscos da gordura saturada O aumento do colesterol LDL no sangue está relacionado com as doenças cardiovasculares e, com grande frequência, as gorduras saturadas estão impli- cadas no aumento do LDL. Entretanto, nem todos os ácidos graxos saturados tem o mesmo efeito na elevação do colesterol. Mais notavelmente, entre os ácidos graxos saturados que elevam o colesterol sanguíneo estão os ácidos láurico, mirístico e palmítico. Oácido esteárico não parece ter esse efeito. No entanto, fazer distinções pode parecer impraticável ao se planejar uma dieta, já que todos eles costumam aparecer juntos nos alimentos. As gorduras de origem animal são as principais fontes de gordura saturada. Algumas gorduras vegetais como palma e coco fornecem quantidades menores. Escolher aves ou peixes e produtos lácteos sem gordura auxilia na redução da ingestão de gordura saturada (WHITNEY; ROLFES, 2008). Riscos das gorduras trans Pesquisadores têm relacionado o consumo de produtos alimentícios contendo gorduras trans produzidas industrialmente às doenças cardiovasculares. No corpo, os ácidos graxos trans alteram o colesterol sanguíneo do mesmo modo que algumas gorduras saturadas. Eles elevam o colesterol LDL e reduzem os níveis de colesterol HDL (WHITNEY; ROLFES, 2008). Um estudo mostrou que adultos que consumiram alimentos fritos (que contêm gorduras trans) de quatro a seis vezes por semana eram 23% mais propensos a desenvolver doenças na coronária, além de um aumento genera- lizado em lesões de aterosclerose em geral. Portanto, esse tipo de gordura está associado a maior mortalidade (AMERICAN HEART ASSOCIATION, 2015a). Limitar a ingestão de ácidos graxos trans provenientes de alimentos pro- cessados, como margarinas, macarrão instantâneo, biscoitos e sorvetes, pode reduzir esses problemas. Riscos do colesterol Em quantidades adequadas, o colesterol é um composto que possui muitas funções importantes para o organismo. Em excesso, porém, é prejudicial, pois se acumula na estrutura dos vasos sanguíneos. Uma alta quantidade de 15Macro e micronutrientes: lipídeos colesterol LDL e uma baixa quantidade de colesterol HDL são os principais indicadores do risco de doenças cardíacas. A maior influência sobre os níveis de colesterol no sangue prevalece no consumo de gordura saturada e gordura trans na dieta. Perfil desejável de lipídeos no sangue: � Colesterol total: < 200 mg/dL � Colesterol LDL: < 100 mg/dL � Colesterol HDL: > 60 mg/dL � Triglicerídeos: < 150 mg/dL Recomendação de consumo de lipídeos Algumas gorduras são essenciais na dieta para a manutenção da boa saúde, mas o excesso, especialmente de gordura saturada, aumenta os riscos de doenças crônicas não transmissíveis. Contudo, é impossível definir a quantidade exata de gordura que beneficia a saúde e a que começa a prejudicá-la. Apesar disso, as recomendações sugerem que (FOOD AND NUTRITION BOARD, 2005; AMERICAN HEART ASSOCIATION, 2015b): � as calorias dos lipídeos devem ser limitadas entre 20 e 35% do total de calorias; � o consumo de ácidos graxos poli-insaturados deve ser de cinco a 10% do total de calorias para ômega-6 e 0,6 a 1,2% do total de calorias para o ômega-3; � deve-se consumir menos de 10% das calorias provenientes de ácidos graxos saturados; � deve-se evitar o consumo de ácidos graxos trans; � o valor diário para colesterol é de 300 mg independente do consumo de energia. Macro e micronutrientes: lipídeos16 Em relação aos ácidos graxos poli-insaturados, a Food and Nutrition Board (2005) recomenda um consumo de: Ômega-3: � 1,6 g/dia para homens � 1,1 g/dia para mulheres Ômega-6: � 17 g/dia para homens � 12 g/dia para mulheres Para reduzir o risco de doenças cardiovasculares, a American Heart Asso- ciation (2015b) desenvolveu as metas dietéticas e de estilo de vida para redução do risco de doença, com as seguintes recomendações: � consumir uma alimentação saudável; � consumir peixe, especialmente peixes gordurosos, pelo menos duas vezes na semana; � preferir alimentos feitos de grãos integrais, ricos em fibras; � reduzir o consumo de alimentos e bebidas que contenham açúcar adicionado; � se for consumir bebida alcoólica, que seja com moderação; � escolher ou preparar alimentos com pouca quantidade de sal; � procurar manter um peso adequado; � procurar manter os níveis recomendados de colesterol LDL, colesterol HDL e triglicerídeos; � procurar manter a pressão e a glicemia em níveis normais; � manter a atividade física; � evitar o uso e a exposição ao tabaco. 17Macro e micronutrientes: lipídeos AMERICAN HEART ASSOCIATION. Taking the Trans Fat Out: Banning Trans Fats in Schools, Workplaces, and Restaurants. Washington, 2015a. 2 p. Disponível em: <https://www. heart.org/-/media/files/about-us/policy-positions/fact-sheets/ucm_489725.pdf?la=e n&hash=F27282F7C774945F98A4D3F8C03CDF7D06FB3392>. Acesso em: 2 out. 2018. AMERICAN HEART ASSOCIATION. The Facts on Fats: 50 Years of American Heart As- sociation Dietary Fats Recommendations. Washington, 2015b. 18 p. Disponível em: <https://www.heart.org/-/media/files/healthy-living/company-collaboration/inap/ fats-white-paper-ucm_475005.pdf>. Acesso em: 2 out. 2018. FOOD AND NUTRITION BOARD. Dietary references intakes: for energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, protein and amino acids. Washington: Academy Press, 2005. 1331 p. Disponível em: <https://www.nal.usda.gov/sites/default/files/fnic_uploads/ energy_full_report.pdf>. Acesso em: 2 out. 2018. MANN, J.; TRUSWELL, S. Nutrição humana. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011. 2 v. REMIG, V. et al. Trans fats in America: a review of their use, consumption, health im- plications, and regulation. Journal of The American Dietetic Association, [s.l.], v. 110, n. 4, p. 585-592, Apr. 2010. WARDLAW, G. M.; SMITH, A. M. Nutrição contemporânea. 8 ed. Porto Alegre: AMGH; Artmed, 2013. 768 p. WHITNEY, E., ROLFES, S. R. Nutrição: tradução da 10. edição norte-americana. São Paulo: Cengage Learning, 2008. 2 v. Leituras recomendadas BARASI, M. E. Human nutrition: a health perspective. 2. ed. London: Hodder Arnold, 2003. 384 p. DAMODARAN, S.; PARKIN, K. L.; FENNEMA, O. R. Química de alimentos de Fennema. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. 900 p. Macro e micronutrientes: lipídeos18 Conteúdo:
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