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Tradições Religiosas Aula 1: Do Animismo ao Monoteísmo Apresentação Nesta aula, estudaremos as bases que deram origem à religião. Na primeira parte, explicaremos por que as pessoas, normalmente, confundem experiência religiosa, religiosidade e religião e aprenderemos que esses três conceitos são diferentes, apesar de se complementarem. Discutiremos a experiência religiosa e como ela foi primordial para o nascimento da religião institucionalizada. Para ajudar nesse entendimento, abordaremos o animismo, como ele criou as bases para o nascimento dos rituais, e como estes foram importantes para o nascimento da religião institucional graças à criação de sistemas de crenças que deram signi�cado para a vida no homem no mundo. Por �m, acompanharemos a evolução do sentimento e das formas de expressão da religiosidade. Percorreremos uma trilha histórico-cultural que partirá da forma religiosa primordial, passará pelo nascimento no politeísmo e terminará na expansão do monoteísmo pelo Ocidente graças à in�uência das religiões abraãomicas. Bons estudos! Objetivo Analisar o nascimento e a construção da religião a partir de seus sistemas de crenças; Relacionar a crença no sobrenatural com a organização das sociedades. Religião Bartolomeu I ao Papa: que as religiões construam pontes. Líderes do catolicismo, budismo, islamismo e judaísmo juntos no vídeo do Papa sobre diálogo inter-religioso / Foto: Reprodução do Vaticano | Fonte: Canção Nova Você já parou para pensar o que é a religião? A palavra é muito usada, mas seu signi�cado poucos conhecem. Sendo bem simplista, ela pode ser entendida como um conjunto de crenças e práticas. Essa pergunta também é boa, e você deve fazê-la sempre que buscar compreender porque o homem procura ter contato com o sobrenatural até hoje – apesar do surgimento do conhecimento cientí�co. A religião surgiu a partir da busca por respostas a perguntas que vão além do que é natural e físico. Ela tenta ressigni�car a natureza, transformá-la em outra substância que não a física. A religião, seja ela qual for, possui uma história, possui símbolos e uma teia de crenças e práticas que nos permite estudar e entender boa parte do signi�cado que ela possui para o praticante, para quem crê. Você parou para refletir por que a maioria das pessoas acreditam e praticam rituais religiosos? Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online javascript:void(0); No livro de Gênesis é dito que a terra, as plantas e todos os animais, inclusive o homem, foram criados por Deus. Livro de Gênesis | Fonte: Anatolii Mazhora / Shutterstock Na mitologia Grega, a terra é uma deusa chamada Gaia e o céu é o deus chamado Urano, que a fertilizou. Cena da Grécia antiga | Fonte: Matrioshka / Shutterstock Na mitologia Hindu, quem criou o mundo e todas as coisas que nele existe foi o deus Brahma. Deus Brahma | Fonte: PunkbarbyO / Shutterstock Essas são verdades que o crente não discute, ele aceita, mesmo não entendendo como isso foi possível, como aconteceu. As crenças – dogmas, doutrinas e teologias – são mantidas pelas instituições religiosas. São elas que de�nem as formas e as normas que devem ser seguidas e obedecidas pelos �éis quando praticam os rituais próprios da sua religião. É o ato de participar da missa, do culto, de fazer as oferendas para os orixás etc. É na prática que se cria a identidade de grupo, que dá a sensação de pertencimento e acolhimento. A forma primordial da religião Você já ouviu falar de experiência religiosa? A experiência religiosa é anterior à religião. É ela que dá respostas para perguntas que não possuem uma explicação natural, como, por exemplo: qual o sentido da vida? Por que existimos? Ela também nos ajuda a aceitar a morte porque permite uma visão transcendental dá existência. Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online A religiosidade também é anterior à religião. Ela é a expressão da experiência religiosa. A religiosidade é manifestada nas orações, nas crenças, nos rituais, nos símbolos etc. Ela é a a exteriorização da Fé, a crença na existência em um ser maior, transcendental, que controla e ordena a vida das pessoas, que transforma o Caos em Cosmo. A experiência religiosa expressa na religiosidade deu signi�cado para quem acredita e segue um credo. Em todas as religiões, de uma madeira geral, no início de tudo havia o Nada ou a desorganização e a confusão primordial – também chamada de Caos. Foi a Fé, o ato de acreditar em algo sagrado e sobrenatural, que deu ordem ao Caos e criou o que chamamos de ordem cósmica. A religião é a institucionalização da experiência religiosa e da religiosidade. É a repetição do ato de criação do Cosmo. Para �car mais claro, um exemplo: só seguindo os ensinamentos da Bíblia e os rituais criados pela Igreja Cristã se chega ao paraíso. Ou seja, ela criou padrões para se alcançar a transcendência. Sua maior característica é a criação de um sistema simbólico claro para todos e capaz de explicar a vida e a existência pós-morte. Ela cria uma cosmologia que deve ser seguida e repetida pelo �el se quiser alcançar a graça de Deus. O �el deve ir à missa, seguir os Dez Mandamentos, realizar todos os sacramentos, não cometer os Sete Pecados Capitais e obedecer aos preceitos defendidos pelo Vaticano. Essa explicação inicial é necessária para que o conceito de Sagrado, tão caro às religiões, seja explicado. O Sagrado faz parte da esfera religiosa, mas possui múltiplos signi�cados, não importa se a religião é politeísta ou monoteísta. Sagrado signi�ca consagrar algo a uma divindade, ou que algo é consagrado a uma divindade, não importa qual seja. Exemplo Pode-se consagrar um rio, uma mata, o sangue de um sacrifício animal ou humano e qualquer outra coisa a um deus ou deuses pedindo graças. Só para não deixar dúvidas, em algumas religiões, também há consagrações a entidades vistas como malignas, todavia, nesses casos, a palavra Sagrado dá lugar a palavras como maldito ou impuro. Mas, apesar de possuir outro nome, o ato não deixa de ser a consagração de algo ou alguém a uma divindade. Existem coisas que são consagradas a divindades, mas também podem ser entendidos como Sagrado os cânticos religiosos, os rituais, as oferendas e também as festas e cerimônias religiosas. Por último, mas não menos importante, pessoas podem ser consagradas. Algumas pessoas foram e são cultuadas a ponto de serem vistas como divindades: imperadores romanos se tornaram deuses e, Jesus Cristo, que era uma pessoa de carne e osso, hoje é visto como uma divindade imortalizada e tornado eterno. Representação do túmulo de Jesus vazio | Fonte: Romolo Tavani / Shutterstock O que foi consagrado ou que é sagrado depende da experiência religiosa e da religiosidade de quem vivencia e pratica um credo especí�co. No Ocidente cristão – até os dias atuais – chamou-se de maldito ou pecado as várias formas de consagração feitas por outras religiões. Basta pensar no que aconteceu com os judeus, maias, incas e astecas. Esses povos foram perseguidos e mortos porque tinham uma forma de entender o Sagrado diferente do aceito como certo pela cristandade. Atividade 1 - As religiões foram moldadas a partir de um sistema de crenças ordenadas de tal forma que o �el é capaz de entender e aceitar como verdade os ensinamentos prescritos dentro desse sistema. A partir dessa a�rmação, escreva um texto analisando a importância da experiência religiosa no processo de criação desses sistemas. Animismo Antes do surgimento das grandes religiões como o judaísmo, cristianismo e o islamismo, as pessoas já viviam experiências religiosas, só não havia uma forma institucionalizada de vivê-las. Pedras, rios, vento, animais e outras coisas do meio físico ou biológico poderiam mediar a relação entre o mundo natural e o mundo espiritual. Pinturas rupestres descobertas em Mali | Fonte: La entrada secreta javascript:void(0); Podemos a�rmar, no primeiro momento, que existiamdeuses em todos os lugares, mas não podemos chamar essa forma de viver a experiência divina de politeísmo. Essa forma de entender o Sagrado é chamada no Ocidente de animismo. Esse termo foi criado pelos pesquisadores e estudiosos das religiões para tentar explicar como e por que alguns povos do passado acreditavam na existência de seres espirituais que lhes visitavam nos sonhos e lhes enviavam mensagens pelo vento. Como isso acontecia? Por que isso acontecia? Porque aquele que acreditava, via a manifestação do Sagrado no vento, na pedra, nos sonhos. O animismo não era uma religião, era um ato de Fé nascido da crença, na aceitação da existência de fenômenos e seres que não existem ou não têm origem no mundo natural. Essa forma de estudar e entender as expressões religiosas dos primeiros povos que habitaram a terra foi criada e moldada no Ocidente, no século XIX, por estudiosos (teólogos, sociólogos e antropólogos) que possuíam toda uma tradição, uma cultura pautada nas verdades pregadas pelo monoteísmo, principalmente as verdades cristãs. O Politeísmo Com o surgimento de grandes civilizações, como a Egípcia, a Grega e a Romana, a religiosidade, expressa na crença em vários deuses, passou a se desenvolver e se expandir. Ainda não havia uma forma propriamente institucionalizada de religião. As pessoas acreditavam em várias divindades. Cada uma tinha uma característica e possuía um signi�cado religioso único para quem a cultuava. A forma animista de expressão religiosa não é a mesma das grandes religiões politeístas. Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online A expressão religiosa politeísta era mais elaborada, possuía livros sagrados e tinha no mito, na alegoria, e na �loso�a sua razão de ser. A religiosidade, expressa na forma de rituais e crenças também a tornava diferente. Um bom exemplo é estudar os mistérios dionisíacos, ór�cos e elísios: os mistérios helênicos. Nós iremos discuti-los na aula 4. Henryk Hector Siemiradsky (1847-1902) Phrine the Poseidon's celebration in Eleusis -- oil on canvas 1889 | Fonte: Viático de Vagamundo Outras características das grandes religiões politeístas são: 1 A existência de um panteão de deuses que de alguma forma se relacionam. 2 Os deuses possuíam personalidade própria. A diversidade de valores e motivações que guiavam as pessoas quando realizavam determinados atos se originavam nos deuses. As pessoas poderiam ser usadas como instrumentos para que seus desejos e caprichos se concretizassem. 3 O respeito aos outros deuses. As pessoas erguiam altares em casa e iam ao templo de um deus especí�co, masrespeitavam e temiam os outros deuses. 4 As deusas eram cultuadas sem preconceito ou discriminação. O fato de serem mulheres não as tornava deusasmenores. Elas eram cultuadas com o mesmo fervor e a mesma reverência que os outros deuses. A História dos Heróis Gregos, seus feitos e suas tragédias são bons exemplos para se entender como os deuses manipulavam as vontades dos seres humanos. javascript:void(0); É fácil entender isso relembrando características e poderes dos deuses do panteão grego. Para citar alguns: Zeus era o senhor dos raios. Afrodite, a deusa do amor e da beleza. Hera protegia os lares e os rituais de matrimônio. Dionísio era o deus do vinho. Ares, o deus da guerra. Atenas, a deusa da sabedoria e grande estrategista na arte das guerras. Mas o que todos esses deuses têm em comum? Personalidade própria. Eles usavam seus poderes para manipular os homens de acordo com suas vontades e seus interesses. Eles se apaixonavam, tinham ciúmes, inveja, lutavam pelo controle do panteão e tomavam partido quando havia luta entre os povos que os cultuavam. Se você já assistiu a algum �lme ou leu um livro que trate do comportamento dos deuses gregos sabe do que falamos. Quem os adorava via em suas atitudes e seus poderes uma forma de inspiração. O Monoteísmo O monoteísmo foi uma forma rara de expressão religiosa na antiguidade. Por quê? Porque é uma forma de expressão religiosa dual. O que é dual? É entender o mundo a partir das diferenças entre o Bem e Mal. Nas religiões monoteístas existe sempre um Deus bom, que criou todas coisas e uma entidade maligna, que existe somente para destruir ou macular as coisas boas criadas por Deus. As principais religiões monoteístas são: 1 O Judaísmo 2 O Cristianismo 3 O Islamismo Você sabia que essas três religiões possuem uma origem comum? Todas dizem que suas origens remontam a Abraão, o primeiro patriarca do Judaísmo, por isso, elas também são conhecidas como religiões abraâmicas. Talvez você possa estar se perguntando: se elas não negam que possuem uma origem comum, qual é o motivo de tantas lutas entre esses três povos? Por que os cristãos perseguiram os judeus? Por que os islâmicos travam uma luta em nome de Deus contra os cristãos? A resposta para essas perguntas encontra-se nos dogmas que cada uma dessas religiões possui. Um dogma é uma visão fechada sobre algo. É não aceitar outros pontos de vista sobre a forma de entender o mundo e o que o cerca. Essas três religiões possuem dogmas que, apesar da origem comum, não aceitam outra interpretação religiosa das escrituras sagradas que não as suas próprias. Mais ainda, todas as três se institucionalizaram de forma diferente. Ou seja, cada uma possui um modo de interpretar e praticar. As religiões monoteístas possuem, normalmente, uma visão linear da História. De uma forma geral, elas acreditam que em algum momento Deus criou o mundo e todas as criaturas (Gênesis), mas que essa forma terrena durará por um período especí�co de tempo e, após esse tempo, ela terá um �m, e todos os que seguiram os ensinamentos prescritos por Deus viverão junto a Ele na eternidade. Tábuas dos dez mandamentos | Fonte: Inked Pixels / Shutterstock A religião e o ordenamento social A existência da religião foi e ainda é um fator essencial para a organização das sociedades. A religião ajudou a moldar e ainda molda os comportamentos sociais por meio de seus dogmas, pela ética e pela moral oriunda dos seus ensinamentos religiosos. Mesmo um ateu segue, sem querer ou sem saber, regras de comportamentos ditadas pela ética e moral nascida da religião. Observe um exemplo dentro do Cristianismo: Exemplo Quais são os Sete Pecados Capitais? Gula, Preguiça, Ira, Soberba, Avareza, Luxúria e Inveja. Esses pecados foram listados pela primeira vez no século IV pela Igreja Cristã. De lá para cá muito tempo se passou, mas até hoje os comportamentos listados como Pecados Capitais são moralmente reprovados pela sociedade. Mesmo um ateu reprova alguns, senão todos. A moralidade cristã ajudou a moldar o comportamento das pessoas, pois foi ela que serviu de base para a de�nição do que é um comportamento certo e do que é errado na sociedade ocidental. Alguns comportamentos vistos como virtuosos pela sociedade ocidental também tiveram um empurrão da ética e da moral cristã para se difundirem. Provavelmente, você já foi elogiado por mostrar Humildade, Generosidade, Castidade, Paciência, Moderação, Caridade ou Diligência. Saiba que esses comportamentos foram de�nidos como as Virtudes que deveriam ser perseguidas por todas as pessoas que querem viver nas graças de Deus. É possível fazer a mesma a�rmação para todas as sociedades. De uma forma ou de outra, a religião institucionalizada ajudou a moldar os comportamentos e os costumes nas mais diversas sociedades. Atividade 2 - A ética e a moral religiosa são bases estruturantes de quase todas as sociedades organizadas. No Ocidente (Europa e Américas), a ética e a moral cristã ajudaram a moldar as relações sociais e os costumes. Ela é tão presente no dia a dia, que a maioria dos ocidentais não percebem que fazem coisas, ou tomam decisões importantes, in�uenciados pela ética e pela moral cristã. Você concorda com essa a�rmação? Explique sua resposta. 3 - A religiosidade é expressa nas orações, nas crenças, nos rituais e símbolos. Ela é a expressão e a exteriorizaçãoda Fé, a crença na existência em um ser maior, transcendental, que controla e ordena a vida das pessoas, que transforma o Caos em Cosmo. Explique essa a�rmação. 4 - Uma pergunta direta: estudar a Religião é importante? Justi�que sua resposta. Referências Notas DERRIDA, Jacques; VATTIMO, Gianni (org.). A Religião: o seminário de Capri. São Paulo: Estação Liberdade, 2000. ELIADE, Mircea. O sagrado e o profano: a essência das religiões. 2.ed. Trad. Rogério Fernandes. São Paulo: Martins Fontes, 2008. LAGENEST, J. P. Barruel de. Elementos de Sociologia da Religião. Petrópolis: Vozes, 1976. LÉVI-STRAUSS, Claude. O pensamento selvagem. Trad. Tânia Pellegrini. Campinas: Papirus: 2008. OTTO, Rudolf. O Sagrado: aspectos irracionais na noção do divino e sua relação com o racional. Trad. Walter O. Schlupp. São Leopoldo: Sinodal EST, 2007. SILVA. E. M. Religião, Diversidade e Valores Culturais: conceitos teóricos e a educação para a Cidadania. Revista de Estudos da Religião. n.2, 2004, p. 1-14. Disponível em: https://www.pucsp.br/rever/rv2_2004/p_silva.pdf. Acesso em: 23 fev. 2019. Próxima aula Conceito de religião; A visão antropológica da religião; Aspectos da religião na atualidade. Explore mais Assista ao vídeo “Ciência e Religião”. Assista ao �lme: A VILA. Dir.: M. Night Shyamalan. Estados Unidos, 2004. Leia o artigo de Pierre Sanchis intitulado “No mapa das religiões, há lugar para a ‘religiosidade?’”. javascript:void(0); javascript:void(0); javascript:void(0); Tradições Religiosas Aula 2: A religião e sua amplitude conceitual Apresentação Nesta aula, aprofundaremos a discussão sobre a ciência da religião ou as ciências das religiões. Aprenderemos que existem diversas formas de abordar, de estudar a religião e que, dependendo da forma de abordagem, a interpretação dos fenômenos religiosos muda. Analisaremos as principais teorias e vertentes de interpretação do que é a religião e o fenômeno religioso. Dependendo da teoria usada para compreender as religiões e seus rituais, o resultado do estudo pode mudar signi�cativamente. Por último, mais não menos importante, começaremos a estudar as tradições religiosas a partir da perspectiva antropológica, buscando entender os principais aspectos da experiência religiosa, da religiosidade, e da religião institucionalizada na atualidade. Esses três princípios não mudam, mas as formas como eles surgem são in�uenciadas pelas mudanças culturais, sociais e tecnológicas típicas do século XXI. Bons estudos! Objetivo Examinar as ciências das religiões a partir de suas principais vertentes teóricas; Analisar a religião pela perspectiva antropológica; Identi�car os principais aspectos que norteiam a religião na atualidade. Epistemologia "A religião é essencialmente uma doutrina de hierarquia, uma tentativa para recriar uma ordem cósmica de posições e poderes." - Friedrich Nietzsche "A ciência sem a religião é manca, a religião sem a ciência é cega." - Albert Einstein Epistemologia é a teoria do Conhecimento. E você sabe o que é o Conhecimento? Quantos tipos existem? Onde buscá-lo? O que podemos usar para buscá-lo? Como devemos agir para aprender? São muitas perguntas com várias respostas, mas, nesta aula, nosso foco é saber que o Conhecimento, com “C” maiúsculo, é fonte de discussão, e ainda se busca uma forma de de�ni-lo. Os estudiosos que tentam entender a religião olham para as culturas, sociedades e para a própria história dos seres humanos para buscar conhecimento sobre o tema. Eles sabem que em alguns momentos nós, seres humanos, tomamos decisões pensando de forma egoísta e, em outros, tomamos decisões pensando na coletividade. Eles também sabem que fazemos escolhas e agimos em determinadas circunstâncias de forma consciente ou inconsciente, porque queremos ou porque fomos coagidos. Todos que estudam religião buscam conhecimento desse jeito, e sabem que o comportamento humano in�uencia as crenças e os rituais religiosos, entretanto, parte desses estudiosos olham para a religião como se ela tivesse um padrão, um modelo: o cristão ocidental. Percebeu o problema? É por isso que devemos saber a diferença epistemológica entre ciência da religião e ciências das religiões. Como poderemos buscar conhecimento sobre o comportamento religioso de outros povos, de outras culturas, se olharmos suas crenças e rituais a partir na nossa visão de religião? Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online A ciência é uma construção histórica, isso quer dizer que somente poderemos entendê-la se considerarmos os contextos social, econômico, político e religioso que a cercam. Ciência da religião ou das religiões? Construir Conhecimento já é algo complicado. Ser o dono da verdade sobre o Conhecimento criado é mais complicado ainda, por isso falamos, já na introdução da aula, que iríamos discutir se existe uma ciência da religião ou ciências das religiões. Começaremos a discussão analisando os argumentos dos estudiosos que defendem a existência de uma única ciência que estuda a religião. Ciência da religião Vamos começar nossa análise delimitando o objeto de estuda da ciência da religião. A ciência da religião tem como objeto de estudo a... religião. Qual? Todas e nenhuma. Os defensores da ideia de que existe somente uma ciência que estuda a religião a�rmam que ela deve ser vista de forma totalizante. Ela não pode ser dividida para ser analisada em partes: credo, rituais, símbolos e todos os outros aspectos que se ligam de forma direta ou indireta à religião não podem ser analisados separadamente. Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online A forma de pensar dos defensores dessa teoria é interessante. Eles partem do princípio que áreas, como: Direito, História, Geogra�a, Arqueologia, Sociologia, Arte, entre outras, estudam a religião a partir de análises típicas de cada área do saber. O Direito estuda a religião a partir do princípio das normas, a Sociologia, a partir das formas de ordenamentos sociais, e assim por diante. Essas ciências, separadamente, não dão conta de entender a totalidade do estudo do fenômeno religioso, nem se propõem a fazer isso segundo os teóricos da ciência da religião. Na visão dessas pessoas, só um cientista da religião é capaz de unir todos os conhecimentos produzidos pelas outras áreas do saber e demonstrar a totalidade da religião. Os defensores da existência de uma única ciência da religião não negam que é necessário existir interdisciplinaridade e transversalidade para que seja possível entender o fenômeno religioso. Eles até defendem isso, mas deixam claro que só os cientistas da religião fazem a composição interdisciplinar e/ou transdisciplinar com o objetivo de criar uma ciência institucionalizada e totalizante. A Religião é seu objeto de estudo e por isso só um nome poderia ser dado a essa ciência nova, institucionalizada e totalizante: Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Ciência da religião. Toda ciência necessita de uma fundamentação epistemológica, de linguagem cientí�ca, de abordagens psicológicas e sociais, além de enfoques especí�cos que tratem da relação entre seu objeto de estudo (neste caso a Religião) e convívio social. Mas, você deve entender que toda ciência possui essas estruturas e é a partir delas que constroem suas perspectivas metodológicas especí�cas. O cientista da religião a�rma que seu papel é pegar as análises realizadas pelas outras ciências e uni-las, fazendo nascer uma nova visão do fenômeno religioso que foi estudado somente de forma pontual pelas outras áreas do saber. Segundo esse ponto de vista, dessa união de saberes individualizados, o cientista da religião será capaz de: 1 Fazer uma análise crítica dos dados obtidos. 2 Criar uma interpretação própria e integralizada. Como já dissemos, essa análise é complexa porque os cientistas da religião acreditam que não é possível dissociar a experiência religiosa, da doutrina, dos atos ligados direta ou indiretamenteàs pessoas e suas crenças e da comunidade onde a religião é vivenciada. Para eles, essas são as bases de sustentação da religião e não podem ser analisadas separadamente, pois constituem a totalidade do fenômeno religioso. São elas que mantêm o equilíbrio entre o passado e presente, tradição e mudança. A ciência da religião não aceita qualquer outra forma ou método de análise sobre a religião que não seja a sua. Ela admite a interdisciplinaridade quando a religião é estudada, entretanto, não permite a aplicação de métodos cientí�cos oriundos de outras ciências. Os cientistas da religião acreditam que só seus métodos próprios são capazes de analisar de forma coerente e total a religião, pois ela é o seu objeto de estudo e, por isso, somente ela, é capaz de entendê-la em toda a sua dimensão. Compreender isso é importante porque uma das premissas da ciência da religião é buscar sempre uma posição de neutralidade na sua análise. Ao cientista da religião cabe expandir o saber sobre o mundo e as pessoas sem intervir nas crenças, rituais e comportamentos religiosos dos grupos humanos que estão sendo estudados. A visão que os cientistas da religião possuem sobre seu objeto de estudo (religião) é ampla. Eles se propõem a estudar ao mesmo tempo a relação dos �éis com a sociedade e, com as pessoas que possuem o mesmo credo que o seu, as ações praticadas pelas pessoas em nome da fé que professam, os rituais que simbolizam a relação das pessoas com o sagrado e o êxtase religioso em si. Ciências das religiões Os defensores da teoria que a�rmam que existem ciências das religiões, declaram que a religião deve ser vista como cultura. Qual a diferença? Quando se estuda uma religião a partir da cultura de quem a segue, necessariamente tem-se que partir do princípio que ela é única. Você percebeu a diferença e como ela é importante para quem estuda a religião? Quando alguém se propõe a estudar uma religião a partir de sua cultura, esse alguém já parte da premissa de que existem várias religiões, porque existem várias culturas. Essa diferença epistemológica faz toda a diferença quando se estuda a religião. Toda religião tem forma própria e existem diferentes maneiras de expressar a religiosidade. Isso aparece nas preces, nos rituais, nos dogmas defendidos, na relação do crente com a sociedade. De uma forma geral, toda sociedade possui uma religião e ela interfere nas relações e nos comportamentos sociais das pessoas. É por isso que alguns cientistas a�rmam que não é possível estudar a religião como algo absoluto, pois a forma de expressão religiosa é relativa. Toda religião tem seus alicerces apoiados em quatro bases estruturantes: 1 A forma como se dá a experiência religiosa 2 A doutrina que a mantém 3 Os rituais praticados pelas pessoas que acreditam na doutrina pregada 4 A relação com a comunidade em que está inserida Essas bases são expressadas de forma diferente em cada uma das religiões que existem no planeta, pois possuem signi�cados culturais diferentes. Vamos tomar o Cristianismo como exemplo para entender melhor essas bases que estruturam uma religião. A experiência religiosa no Cristianismo busca compreender a origem da vida e o que existe depois que morremos. Para o cristão praticante, a vida na terra é só uma etapa que deve ser vivida para se chegar no céu, para se viver eternamente junto a Deus. A doutrina que o sustenta é a crença nos livros que deram origem ao Velho Testamento e ao Novo Testamento – quando juntos são chamados de Bíblia. Os rituais cristãos são muitos e variados, mas os mais comuns são o ato de ir à missa ou ao culto, fazer penitências e promessas, e festejar dias santos como a Páscoa e o Natal. Por último, a relação com a comunidade ocorre de forma intensa, pois a ética e a moral cristã moldam e ditam os comportamentos das pessoas na sociedade. No Ocidente, onde a maioria das pessoas são cristãs, a existência dessas bases passa até despercebida porque já faz parte da cultura ocidental, entretanto, essas mesmas bases, quando expressadas pela perspectiva de outras religiões – como o islamismo, o budismo, o hinduísmo ou o candomblé – são vistas com estranheza e, em alguns casos, nem chegam a serem vistas como bases de uma religião. Sim, estamos dizendo que boa parte das pessoas que seguem um credo religioso são preconceituosas. Elas acreditam que só há uma forma de entender a realidade. É por meio dessa verdade que os cientistas das religiões constroem sua teoria. Segundo eles, quando você estuda a religião, é necessário de�nir desde logo sob qual perspectiva pretende analisá-la. Nós estudamos no início do tópico, que os cientistas acreditam que religião é cultura, e, por isso, defendem que cada religião tem uma forma especí�ca de ser entendida. Cada caso é um caso. Cada religião deve ser estudada a partir de metodologias diferentes, porque foram criadas a partir de padrões culturais diferentes. Os cientistas das religiões veem a religião como um fenômeno cultural. Como existem várias culturas, necessariamente existem religiões. Não existe apenas um objeto de estudo (religião), mas sim, vários (religiões), pois o número varia de acordo com a quantidade de culturas religiosas que existem no mundo. A visão antropológica sobre a religião Talvez você tenha achado a discussão sobre a epistemologia na religião desgastante, mas ela é necessária porque a religião e as tradições religiosas são vistas e analisadas pelas outras ciências como uma temática com um viés mais antropológico. Isso acontece porque a religião é vista pela ciência como algo criado pelo homem. O sobrenatural é negado pelo conhecimento cientí�co. Em nenhum momento negamos a existência da experiência religiosa, da religiosidade, do Sagrado e das outras estruturas que compõem as formas religiosas. O que a�rmamos é que a ciência acredita que todos esses conceitos e fatos podem ser explicados a partir da observação e da aplicação do método cientí�co. Isso só é possível porque as ciências sociais, principalmente a Antropologia, criaram conceitos que nos permitem ver, falar, estudar e criar teorias sobre coisas que não existem na natureza. Você sabe que o êxtase religioso não é natural, como também sabe que não é natural que rios, pedras e imagens possuam poderes capazes de modi�car a organização e o comportamento social, mas existem pessoas que acreditam nisso. O que, então, estuda a antropologia? A Antropologia é a ciência que estuda o comportamento cultural do homem e, por isso, os estudos antropológicos sobre religião são fontes importantes para quem busca conhecer as tradições religiosas. A religião e as tradições religiosas partem da premissa de que existem coisas que não podem ser explicadas pela ciência. Nas tradições religiosas, a crença no sobrenatural aparece de forma mais nítida. Você já deve ter visto uma oferenda feita a um orixá ou participado de uma missa e visto o momento em que o pão e o vinho são consagrados. Esses fatos são analisados pela Antropologia como sistemas simbólicos que ajudam a de�nir a cultura religiosa de um povo. Você não consegue entender o que é o batismo no Cristianismo se não compreender a cultura que deu origem a esse ritual, como também não consegue entender por que algumas religiões proíbem o consumo de determinados alimentos se não entender a cultura das pessoas que se submetem e aceitam essa restrição alimentar. A chave para entender todas essas coisas é a interpretação. O antropólogo busca interpretar a cultura de um povo ou sociedade, com o objetivo de explicar as ações das pessoas. Quando um antropólogo se propõe a estudar uma religião ou comportamento religioso, ele busca interpretar todos os fatos observados no seu estudo por uma perspectiva cultural, ou seja, como algo criado pelo homem com o objetivo de explicar ou entender algum ato ou fenômeno que ele não pode, ou não consegue, explicar a partir do mundo físico. Para você que está estudando as tradições religiosas, essas informaçõessão importantes porque grande parte dos temas que norteiam o comportamento humano não podem ser observados. A moral e a ética não podem ser observadas, mas orientam os comportamentos sociais. Elas são invisíveis, mas existem. Foram criadas pelo homem para mediar as relações e comportamentos sociais. São preceitos que se tornam visíveis ao serem praticados, por isso é possível a�rmar que você só conseguirá entender o real signi�cado dos rituais, dos tabus e das outras formas de expressão do credo em uma religião se entender que ela, a religião, faz parte de uma coisa maior chamada Cultura. A religião na atualidade Entender a religião hoje em dia signi�ca estudar a identidade cultural do praticante. Exemplo Muitas pessoas acreditam que todo árabe é mulçumano e islâmico, e isso não é verdade. As religiões passaram a ser mais sincréticas, ou seja, as crenças e os rituais que eram especí�cos de uma religião foram incorporados por outras – com certeza você já viu rituais de descarrego, típicos das religiões de matriz afro, sendo realizados em templos cristãos. Atualmente, existe um pluralismo religioso que é de difícil entendimento. Isso acontece porque se busca uma forma de expressão religiosa que seja, ao mesmo tempo, plural e inclusiva. Apesar de existirem pessoas que interpretam as doutrinas de sua religião de forma literal, extremista, a busca pelo ecumênico, pelo universal, pelo papel conciliador da religião é a tônica atual dos praticantes. Isso quer dizer que quem estuda a religião acredita que a maioria das pessoas que possuem um credo buscam dialogar com outras de credos diferentes. O diálogo leva ao respeito, que leva à aceitação do diferente. Muitas pessoas acreditam que a identidade religiosa, que é um marcador cultural, deve ser respeitada. Para terminar, é necessário frisar que na atualidade há uma busca pela aceitação e inclusão, entretanto, a intolerância religiosa passou a ser mais visível. Ela sempre existiu, mas em virtude da ampliação dos meios de comunicação ela passou a ser percebida de forma mais nítida, tornando mais claro o preconceito e a discriminação a certas tradições religiosas. Atividade 1 - “No estudo da religião, os especialistas possuem uma imensa variedade de produtos das mentes e práticas humanas como os seus dados. Estes produtos são criados por seres humanos e se voltam para seres humanos em culturas, sociedades e histórias.” (Jeppe Sinding Jensen). Partindo da citação, demostre a diferença epistemológica entre ciência da religião e ciências das religiões e depois se posicione, dê seu ponto de visto sobre qual das duas premissas mais se adequa para explicar a religião. 2 - A Antropologia é a ciência que estuda o comportamento cultural do homem e por isso os estudos antropológicos sobre religião são fontes importantes para quem busca conhecer as tradições religiosas. Explique porque essa a�rmação é verdadeira. 3 - A discussão epistemológica sobre a existência de uma ciência da religião ou das religiões deve ser entendida como algo vai além da simples a�rmação de um ponto de vista. A forma de abordar a temática religião hoje em dia pode ser um diferenciador importante para ampliar ou restringir a exclusão social. Analise a a�rmação. 4 - A religião ou comportamento religioso são observados pelo antropólogo por uma perspectiva cultural, como algo criado pelo homem com o objetivo de explicar ou entender algum ato ou fenômeno que ele não pode, ou não consegue, explicar a partir do mundo físico. Explique essa a�rmação. Notas Referências FILORAMO, Giovanni; PRANDI, Carlo. As ciências das religiões. São Paulo: Paulus, 2005. GRESCHAT, Hans-Jürgen. O que é ciência da religião? São Paulo: Paulinas, 2014. LAGENEST, J.P. Barruel de. Elementos de Sociologia da Religião. Petrópolis, Vozes, 1976. LÉVI-STRAUSS, Claude. O pensamento selvagem; Trad. Tânia Pellegrini. Campinas: Papirus, 2008. PASSOS, João Décio; USARSKI, Frank (Org.). Compêndio de Ciência da Religião. São Paulo: Paulinas, 2013. OTTO, Rudolf. O Sagrado: aspectos irracionais na noção do divino e sua relação com o racional. Trad. de Walter O. Schlupp. São Leopoldo: Sinodal EST, 2007. Próxima aula Relação entre mito e religião; Relação entre cultura e religião; Religião como meio de coesão social. Explore mais Assista ao documentário Luz, Trevas e o Método Cientí�co, de Leopoldo de Meis (em sete partes). Leia o livro O que é Ciência da Religião?, de Hans-Jürgen Greschat. O livro foi publicado pela editora Paulinas em 2005. Sua leitura é interessante porque o autor, além de dar uma de�nir para Ciência da Religião também faz uma proposta de abordagem metodologia sobre seu objeto de estudo. javascript:void(0); Tradições Religiosas Aula 3: A relação entre religião, mito e cultura Apresentação Na aula anterior, estudamos as vertentes teóricas que analisam a religião a partir de duas perspectivas diferentes: A religião vista como coisa, e a religião como algo complexo que não pode ser entendida como una (existem religiões, não religião). Nesta aula, abordaremos a religião a partir de dois conceitos que se interligam e ampliam a discussão da aula anterior. Analisaremos a religião sob o ponto de vista antropológico, abordando dois conceitos que norteiam todas as discussões sobre as tradições religiosas: mito e cultura. Estudar a relação existente entre mito, cultura e religião permitirá entender que as tradições religiosas são mais que simples representações simbólicas ou repetições de rituais milenares. Elas fazem parte da história dos povos que as realizam. Compreenderemos como a religião e as tradições religiosas ajudam a ordenar as sociedades, dando unidade ao criar uma identidade étnica e cultural entre seus praticantes. Bons estudos! Objetivo Analisar a relação existente entre religião e mito; Examinar a relação existente entre religião e cultura; Descrever como a relação existente entre a religião, mito e cultura cria um sentimento de identidade entre seus praticantes lhes dando unidade social. Primeiras palavras Compreender a relação existente entre mito, cultura e religião é essencial para entendermos as tradições religiosas. É importante deixar isso claro, porque, a partir desta aula, ampliaremos as discussões sobre religião, estudando as semelhanças que existem entre coisas diferentes: Caos e Cosmo; Céu e Terra; Vida e Morte; Bem e Mal. Abordaremos a religião com ênfase na perspectiva antropológica. Conceitos que são bases de sustentação de todas as religiões como os de Sagrado, Profano, e Transcendência, entre outros, serão estudados como algo construído, criado pelo homem para compreender a realidade. Tudo o que as religiões a�rmam que é Sagrado (rituais, objetos, pessoas etc.) será estudado como crença criada pelo homem para esclarecer algum acontecimento que ele não consegue explicar de forma racional, como algo que tem o poder de eliminar o que é entendido como normal no dia a dia de uma comunidade, ou que é capaz de destruir explicações tradicionais. Já o Profano será estudado como o contraponto do Sagrado. A Queda dos Anjos Rebeldes de Pieter Bruegel | Fonte: Wikipedia A religião e o mito: A alegoria como forma de ordenamento social Você já deve ter lido em algum lugar que mito signi�ca narrativa ou relato sagrado sobre o arché, o elemento primordial. Talvez não com essas palavras, mas já deve ter lido ou ouvido em alguma aula de Filoso�a. O mito realmente é uma narrativa sobre algo sagrado e usa metáforas ou alegorias, mas não é uma fantasia. O mito não é uma fantasia. Ele re�ete a realidade e o momento histórico que foi criado. Normalmente, as pessoas entendem a palavra mito como algo que não existe, e fazem associação errada com a palavra lenda. O mito é bem mais que uma lenda, ele desempenha funções especí�cas dentro da sociedade capazes de ordená-la. O mito é usado para explicar o presente a partir de ações ou fatos que ocorreram no passado. Exemplo javascript:void(0); Qual o motivo doshomens terem sido expulsos do paraíso e hoje viverem na Terra? Eva ter colhido a fruta da árvore proibida e oferecido para Adão, segundo a tradição judaico-cristã. O mito também pode ser usado para ordenar as relações sociais. Ele pode legitimar e também garantir a conservação de normas complexas pautadas no controle das condutas humanas, algumas vezes proibindo, em outras permitindo ações dos indivíduos no meio social. Exemplo No Islamismo, as normas que organizam a sociedade nascem na Sharia, um conjunto de leis, inspiradas no Alcorão, que ditam como deve ser o comportamento social de um mulçumano. O mito também tem a função de consolar as pessoas quando sofrem alguma perda, como a morte de alguém querido, ou para garantir que um erro do passado seja consertado no presente. Exemplo Já ouviram alguém falar “foi castigo de Deus!”, quando uma pessoa que cometeu uma injustiça passa por alguma provação ou sofre algum tipo de perda? Essa seria uma forma de consolo: aqui se faz e aqui se paga. Essa forma de compensação ajuda a regular as relações comunitárias, pois todos partem do princípio que são observados ou comandados por uma entidade superior, divina. Como a�rma a �lósofa Marilena Chauí, o mito tem um caráter educativo, porque nele encontramos mensagens ou normas que nos orientam e ditam os comportamentos que temos que ter para vivermos em sociedade de forma harmônica. O mito não é racional e nem pode ser explicado pela Ciência. Ele existe e é aceito porque sua base de sustentação é a emoção, a afetividade ou sentimento de intimidade nascido dentro de uma comunidade. O mito ou conhecimento mítico é respaldado pela fé e pela revelação divina. Exemplo Não adianta tentar explicar para um cristão que é impossível, biologicamente falando, alguém ressuscitar dos mortos. Ele vai falar mais ou menos assim: “Homem de pouca fé! Cristo veio a nós para fazer uma nova aliança e depois voltou ao Pai”. A religião e as tradições religiosas usam as funções do mito a todo momento. Veja a seguir: Usam a função de: 1 Explicação Para esclarecer a origem do mundo 2 Organização social Para respaldar a obediência ao credo e as normas ditadas pelos líderes religiosos 3 Compensatória Para explicar porque as pessoas necessitam passar por provações aqui na Terra O mito sempre trata de situações que são comuns a todos os seres humanos ou pelas quais todas as pessoas passaram um dia. Eles tratam de temas ligados à biologia, como o nascimento e o envelhecimento e também tratam de relações interpessoais como o casamento e a família. O que diferencia o mito da biologia e da sociologia é a forma como esses temas são tratados, explicados por ele. A imaginação e o ato de acreditar no que é narrado mexem com a estrutura psicológica dos que ouvem. Ele promove transformações, tanto no individual como no coletivo de uma sociedade, pois passa a fazer parte da cultura. Exemplo Você conhece o mito de Édipo? Um rei da cidade de Tebas, chamado Laio, foi informado por um Oráculo que seria assassinado por seu �lho, e que este �lho se casaria com sua mulher. Para evitar que isso acontecesse, o rei mandou que seu �lho fosse levado para um lugar bem distante e deixado lá para morrer. Mas ele não morre, um pastor o encontra e lhe dá o nome de Édipo. Logo depois desse episódio o rei da cidade de Corinto o adota. Depois de crescido, Édipo encontra um Oráculo que lhe narra a mesma profecia que seu pai biológico ouviu. Ele pensa que a profecia falava de seus pais adotivos e, por isso, foge da cidade de Corinto para não matar o homem que lhe criou. Na sua fuga, Édipo se dirige para a cidade de Tebas, mas, no caminho, entra em uma briga com um grupo de negociantes e mata todos, inclusive o líder do grupo — o líder dos negociantes era seu pai biológico, Laio. Quando Édipo chega à cidade de Tebas, ele decifra o enigma da Es�nge, livra a cidade de suas ameaças, vira rei, casa-se com a viúva do rei Laio, a rainha Jocasta, e com ela tem quadro �lhos. Nas suas mãos, o reino de Tebas próspera, mas, em determinado momento, a cidade é assolada por uma peste. Édipo e sua mulher, Jocasta, vão consultar um Oráculo para saber como devem agir para acabar com a praga que assola a cidade de Tebas e lá descobrem que são mãe e �lho. No desespero que se seguiu à revelação, Jocasta se mata e Édipo fura os dois olhos como forma de penitência por não ter reconhecido a mãe. O mito de Édipo ensina várias coisas, entre elas, que é errado cometer parricídio (matar o pai) e incesto (relacionamento sexual entre parentes próximos: mãe e �lho, pai e �lha, irmão e irmã). Essas ações são proibidas em quase todas as sociedades. Esse mito é tão marcante que ainda provoca re�exões hoje. A Psicologia o usa para explicar alguns impulsos e sentimentos que têm origem na infância. Quadro do pintor Bénigne Gagneraux intitulado “The Blind Oedipus Commending his Children to the Gods | Fonte: Wikipedia javascript:void(0); Atividade 1 - O mito proporciona um conhecimento que explica o mundo a partir da ação de entidades — ou seja, forças, energias, criaturas, personagens — que estão além do mundo natural, que o transcendem, que são sobrenaturais. Partindo dessa a�rmação, explique como a religião e as tradições religiosas usam as diversas funções do mito para respaldar seus símbolos e costumes. Cultura e religião: uma relação simbiótica e de interdependência A palavra cultura faz parte do nosso dia a dia, mas muitas pessoas que usam a palavra não sabem o seu signi�cado real. O que elas normalmente chamam de cultura é somente uma expressão cultural. Cultura, no seu sentido antropológico, possui uma de�nição bem mais complexa. Ela soma, de uma maneira geral, todas as coisas abstratas e materiais que foram pensadas ou construídas pelo homem. Edward Tylor (1832-1917), um grande estudioso do tema, deu uma de�nição para cultura que até hoje serve de base para os outros pesquisadores. Cultura engloba ao mesmo tempo todos os conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra habilidade ou tradições adquiridos por uma pessoa quando vive em sociedade. Mulheres balinesas | Fonte: CW Pix / Shutterstock A visão de Tylor foi, e ainda é, um marco histórico dentro da Antropologia, porque negou a teoria que dizia que algumas raças já nasciam com capacidades que as direcionavam e as faziam ter determinados comportamentos culturais especí�cos. Essa teoria fortaleceu preconceitos, porque ajudou a sedimentar teorias etnocêntricas, que diziam que algumas raças eram mais evoluídas que outras. Além de Tylor, outros estudiosos buscaram entender o que é a cultura. Vejamos alguns conceitos: Ao a�rmar que cultura não se resume a materialidade, o último conceito inclui o sobrenatural, a expressão religiosa e a religiosidade. Essa teoria a�rma que a cultura cria padrões de comportamentos que são ditados pela sociedade. Todas as pessoas que fazem parte da sociedade são educadas e também coagidas a seguir esses padrões culturais. Compreendendo cultura dessa forma é possível a�rmar que as pessoas agem de acordo com o meio cultural em que foram criados. Cultura: São todos os conhecimentos e crenças que permitem que as pessoas vivam em sociedade. São sistemas simbólicos criados e transmitidos pelas pessoas que servem para organizar a sociedade por meio da criação de princípios estruturais norteadores, como os mitos, o conceito de família, a religião, entre outros. Não cria princípios norteadores e sim sistemas de controle social. Ela organiza, classi�ca e dá signi�cados a fatos e ações realizadas pelas pessoas. Essa forma de entender a cultura nega o princípio que diz que cultura são só expressões materiais do cotidiano. A cultura é a base do nascimento e da manutenção das tradições religiosas. Sem ela não haveria transmissão de conhecimentos, crenças e rituais que mantêm as tradições religiosas vivas, porque elas são expressões culturais. As tradições religiosas possuem todo um simbolismo próprio que guiaas pessoas reforçando os símbolos, as crenças e os rituais que as caracterizam. Desse modo: Religião é cultura, pois possui signi�cado para quem crê. A religião é cultura porque é pública, ou seja, mesmo para quem não acredita, ela possui um signi�cado e ordena o comportamento da pessoa descrente. Exemplo Natal, Carnaval, Páscoa, dias santos. Mesmo para quem não crê no Cristianismo, esses dias possuem um signi�cado. O Natal constrói um sistema de controle social do qual poucas pessoas conseguem fugir. O período natalino cria um clima que obriga as pessoas a buscarem harmonia e a deixarem as diferenças de lado. Você pode perceber isso quando participa da brincadeira de amigo secreto, quando compra um presente para dar a uma pessoa que você acha especial, quando participa da ceia natalina com a família ou um grupo de amigos. Nesses momentos, a harmonia e a camaradagem entre as pessoas são cobradas e, às vezes, até exigidas (quando a família é reunida). João Cherelus (à dir.) e a mulher Lurene Jenti (ao lado) passam primeiro Natal longe da filha de quatro anos | Fonte: Bruno Ropelato / ndonline As tradições religiosas não nasceram espontaneamente. Foi necessária a criação de mecanismos culturais que transformaram a expressão religiosa e a religiosidade em uma Tradição. Foi necessário organizar a fé, o ato de crer em algo, em estruturas que pudessem fazer sentido para as pessoas. O mito, os objetos sagrados ou consagrados foram — e ainda são usados — para dar signi�cado à religião e às tradições religiosas. Só a fé e o ato de acreditar no sobrenatural não criam tradições religiosas. É necessária a criação de mecanismos culturais capazes de canalizar o credo no sobrenatural, e transformá-lo em coisas capazes de serem entendidas, seguidas e transmitidas para as outras gerações. É isso que mantém viva uma tradição religiosa. "A coerência de um hábito cultural somente pode ser analisada a partir do sistema a que pertence." - LARAIA, 2005, p.87 javascript:void(0); Seguindo essa linha de raciocínio, é possível a�rmar que existem pelo menos duas práticas, dentro de todas as religiões, que ajudam a enraizar tradições religiosas em uma sociedade: o ritual e os tabus. Toda as religiões possuem um conjunto de costumes e normas que devem ser seguidas sem contestação. Exemplo O ritual mulçumano de se ajoelhar todos os dias, em cinco momentos diferentes, para fazer suas preces voltados em direção à cidade de Meca. A maioria das religiões também possui algum tipo de gesto, formula mágica ou objeto sagrado capaz de criar o êxtase religioso todas as vezes que é realizado ou exposto. Exemplo A Transubstanciação ou transmutação do pão e do vinho no corpo e sangue de Cristo, realizado pelo padre no culto católico. Os dois exemplos citados são formas ritualísticas que organizam os �éis praticantes. São cerimônias que ajudam a reforçar a religião Islâmica e o Cristianismo Católico por meio da criação de hábitos, via orações e atos de fé, que devem ser seguidos por todos os crentes. Exemplo O mulçumano acredita que a oração diária o conecta com Deus, e que todos os �éis que rezam voltados para Meca nos horários prede�nidos se conectam entre si. Já a transmutação na oração eucarística tem como objetivo lembrar ao �el católico da paixão de Jesus Cristo e reforçar o credo em sua volta. Os tabus religiosos possuem essa mesma função social. Exemplo O Judeu não pode comer vários tipos de alimentos porque são considerados impuros. Os Indus não comem vacas porque são sagradas. Como é possível perceber nos exemplos, os tabus limitam e de�nem as ações e os comportamentos das pessoas. Ele impõe limites, que somados aos rituais, acabam por controlar o dia a dia do crente. Atividade 2 - Segundo Ruth Benedict, a cultura é como a lente, através da qual o homem vê o mundo. Analise a a�rmação e explique o que ela quer dizer. A religião como agente aglutinador Depois de estudar o mito e a cultura, é possível entender como as tradições religiosas podem ser marcadores culturais que de�nem um povo, uma sociedade. Folia de reis Autor: Samuel Macedo | Fonte: Diário do nordeste Se você observar os comportamentos sociais das pessoas que estão ao seu redor será capaz de perceber isso. O grupo social do qual você faz parte possui uma visão de mundo que une os integrantes. Todos os povos possuem uma herança cultural, passada de pai para �lho ao longo do tempo, que os educa, e os condiciona a ter determinados comportamentos. É por meio dessa herança cultural, passada de pai para �lho, que as tradições religiosas se perpetuam. Ao educar seus �lhos, as pessoas ensinam o que acham correto e também os obrigam, às vezes sem perceber, a participar de rituais e manterem tabus. Exemplo Rezar antes de dormir, ir à missa ou ao culto, participar de procissões, não comer ou comer certos alimentos. javascript:void(0); Essas tradições religiosas, ensinadas desde a infância, são absorvidas pelas pessoas e passam a fazer parte de suas vidas, de sua cultura. Para �nalizar, guarde essa informação: As tradições religiosas podem ser de�nas, de modo geral, como um conjunto de rituais e tabus que conectam as pessoas ao mundo sobrenatural de forma organizada, ordenada. Elas criam parâmetros, de�nem costumes e perpetuam conhecimentos que devem ser seguidos e aprendidos por todos que as realizam. A religião, por meio das tradições religiosas, cria uma identidade cultural que diferencia seus praticantes do restante do mundo. Ela possibilita às pessoas perceberem no outro o re�exo de si mesmas. Atividade 3 - As tradições religiosas criam laços que conectam as pessoas e as fazem sentir emoções relacionadas à ideia de comunidade. O ato de acreditar em algo, e compartilhar essa crença com outras pessoas é capaz de uni-las. Partindo dessa a�rmação, explique a importância das tradições religiosas para a construção da comunidade. Notas Referências FILORAMO, Giovanni; PRANDI, Carlo. As ciências das religiões. São Paulo: Paulus, 2005. GEERTZ, C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1989. GEERTZ, C. Nova Luz sobre a Antropologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. GIARD, L. Cozinhar. In: Certeau, M.; Giard, L.; Mayol, P. A invenção do cotidiano – 2: morar, cozinhar. Petrópolis: Vozes, 2005. LARAIA, R. B. cultura: um conceito antropológico. 14.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. LÉVI-STRAUSS, Claude. O pensamento selvagem. Trad. Tânia Pellegrini. Campinas: Papirus, 2008. SAHLINS, M. cultura e razão prática. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. TERRIN, A.N. Antropologia e horizontes do sagrado. culturas e religiões. São Paulo: Paulus, 2004. Próxima aula Religião Tribal, suas diferenças e diversidade; Origem étnica e tribal como base histórica e formador do ethos das comunidades africanas; Religiões grega e romana e o politeísmo como base mitológica. Explore mais Assista ao documentário Obrigações e Proibições, produzido pelo Canal Curta e dirigido por Bárbara Kahane Belisario Franca, faz parte da série No caminho do Bem. Ele se propõe a entender quais as funções e como as pessoas entendem as proibições e obrigações religiosas. Leia o artigo A religião nos limites da simples educação: notas sobre livros didáticos e orientações curriculares de ensino religioso, de Emerson Giumbelli intitulado. javascript:void(0); javascript:void(0); Tradições Religiosas Aula 4: Da religião tribal ao politeísmo greco-romano Apresentação A partir desta aula, você estudará as grandes tradições religiosas. Nelas, você encontrará a base mitológica e ritualística que explicam o ordenamento social e o comportamento humano no universo social africano, oriental e ocidental. Abordaremos a matriz religiosa africana e o politeísmo greco-romano. Você perceberá que as duas matrizes religiosas, apesar de parecerem totalmente diferentes, possuem vários pontos em comum e, em alguns momentos, como ressaltou Homero, o lendário historiador grego, tocam-se e relacionam-se. No tribalismoafricano e nas cidades-estados gregas e romanas, o princípio de pertencimento a uma comunidade ou a um clã foi o fator aglutinador que deu origem à vida social. Esclareceremos como isso foi possível e quais as principais tradições religiosas que nasceram nessas comunidades. Bons estudos! Objetivo Analisar a religião tribal, suas diferenças e diversidade; Discutir como a origem étnica e tribal forma a base histórica e constrói o ethos das comunidades africanas; Descrever as religiões Grega e Romana e o politeísmo como base mitológica. Primeiras palavras Vamos começar esta aula com uma pergunta: Você acha que a religião praticada pelos africanos é primitiva? Se sua resposta foi a�rmativa você está julgando a religião africana de forma etnocêntrica. Você se lembrou da forma como os africanos expressam sua religiosidade, comparou com a ocidental e concluiu que os africanos são menos cultos. O nome disso é etnocentrismo e é uma forma de preconceito. Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Essa forma de analisar a experiência religiosa e a religiosidade africana é comum entre os ocidentais, que partem da premissa de que a forma ocidental de organização social é melhor e, por isso, julgam as outras formas de organização social de modo pejorativo. Homero, o historiador grego, autor de Ilíada e Odisseia, ao escrever sobre os povos africanos que estavam sendo escravizados pelos gregos, a�rma que as artes, ciências e a própria fala grega foi ensinada pelos africanos. Bateristas togoleses | Fonte: Anton_Ivanov / Shutterstock A África e a religião africana estavam ligadas à Grécia e às suas cidades-estados. Duas informações demonstram essa ligação: De acordo com a mitologia grega, todos os anos, os deuses viajavam para as terras da Etiópia para realizar a festa dos 12 dias. Poseidon é frequentemente relacionado a essa região, e uma de suas �lhas, Bentesicime, a deusa das ondas profundas, morava na Etiópia. O mito de Perseu e Andrômeda — No reino da Etiópia, Perseu encontra Andrômeda acorrentada e pronta para ser sacri�cada para salvar a cidade. Ao compreender a situação, Perseu salva Andrômeda e casa-se com ela. Quadro Perseus e Andromeda pinto por Giorgio Vasari | Fonte: Wikiart As duas informações constam nos livros sobre mitologia grega, mas a relação entre a Grécia Antiga e África é relatada também em outras fontes. A África possui uma cultura própria , que é totalmente diferente da ocidental e da oriental. Nesta aula, estudaremos as tradições religiosas africanas e greco-romanas, por um prisma que permita colocar a cosmogonia dessas duas tradições em um mesmo patamar: o princípio da comunidade. 1 As religiões tribais africanas: o culto aos antepassados como meio de ligação com o sobrenatural No Ocidente cristão, as formas de expressões religiosas dos africanos são vistas com preconceito e sofrem discriminação . No entanto, as religiões africanas são ricas em simbolismos e possuem signi�cados que norteiam seus praticantes, pois refere-se à ancestralidade. Veja a seguir a estrutura das religiões africanas: 2 javascript:void(0); https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/go0158/aula4.html https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/go0158/aula4.html Clique nos botões para ver as informações. Dentro do clã, cada ancestral morto pode se tornar um objeto de culto e, se seus ensinamentos forem incorporados pela comunidade, ele passa a ser visto como sagrado, deixa o nível humano e passa a viver em um plano diferente. Eles podem até se transformar em divindades. Não como o santo católico, mas como uma divindade ancestral que é responsável pelo bem-estar do indivíduo e da comunidade. Mesmo existindo divindades ancestrais, as religiões africanas possuem uma cosmologia como todas as outras. Há uma divindade maior que deu ordem ao universo. O nome dessa divindade se altera de acordo com o clã. Em alguns ele é chamado de Olorum, em outros de Onyankopon, Nzambi ou Mawu. Também a origem do mundo e do homem varia de acordo com o clã. Bantos — Nzambi é o criador do mundo, o ser humano veio do seio da terra, e a família é o centro de todas as coisas. Nagôs — Suas tradições religiosas deram origem às religiões afro-brasileiras — possuíam um mito que dizia que Olorum, o ser supremo, a entidade maior e criadora dos orixás, entregou a Odudua, divindade primordial que representa a divinização da terra, um saco com um punhado de terra, uma muda de dendê e uma galinha e fez uma corrente até os pântanos ou águas primordiais. O mito diz que Odudua derramou a terra nas águas primordiais e depois colocou sobre a terra a galinha e a palmeira de dendê. A galinha, assim que tocou na terra começou a ciscá-la e espalhá-la para todos os lados, expandindo o mundo e criando espaços para a proliferação do homem. Religiões africanas Você percebeu algo comum aos dois mitos: a comunidade e a ocupação do espaço. O lugar ocupado por uma comunidade é uma das bases da religiosidade africana. Uma outra é a própria comunidade, por meio do culto aos ancestrais. Como estudamos, os ancestrais são reverenciados pelas comunidades e, se os ensinamentos deixados por um ancestral forem incorporados pela comunidade, o ancestral passa a ser visto como uma divindade e é até cultuado. Obra de Agnes Dosanto – 2004 A criação da Terra | Fonte: UFMG javascript:void(0); O local de origem da comunidade e a ancestralidade são marcadores religiosos! Saiba mais Para saber mais sobre esse assunto, leia o texto “Oferendas e rituais A simbologia da religiosidade africana”. Atividade 1 - Você sabe o que é Etnocentrismo? Ele é uma formar restrita de analisar a vida humana. Muitos cristãos que vivem no Brasil veem a religião de origem africana de forma etnocêntrica. Dito isso, faça uma pesquisa sobre o assunto, analisando os motivos que levam o cristão a achar que sua forma de expressão religiosa é superior à africana. Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online 2 - O mito Nagô e o mito Banto possuem em comum a base comunal e a ocupação do espaço. Explique com suas palavras como os dois mitos, se assemelham pela importância que dão à família. O politeísmo greco-romano e sua singularidade comunitária javascript:void(0); A religião greco-romana sempre despertou a imaginação e a curiosidade dos ocidentais. Imagine o mundo mitológico grego: Uma montanha imensa onde moram, em palácios feitos de ouro e mar�m, deuses de uma beleza indescritível e com poderes extraordinários. Essa é a visão ocidental do século XXI, mas as verdadeiras tradições religiosas gregas não aparecem nesse panteão, elas aparecem nos mistérios helênicos e na própria �loso�a. 3 Apollo – mitologia greco-romana | Fonte: Croisy / Shutterstock Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online Exemplo A deusa Reia, também chamada de Deusa Mãe, foi incorporada e entrou para a mitologia grega como a mãe de Zeus. Os indo-europeus não abriram mão de seus deuses e entidades mágicas ligadas à natureza que se materializavam em árvores, animais e fontes. A religião sincrética que estava nascendo tinha sua base de sustentação no animismo e no culto a deuses locais, que protegiam as comunidades. Desse caldeirão sincrético surgiu o panteão de deuses gregos. Deuses universais por terem sua autoridade respeitada por todos, mas também especializados quando se tratava de in�uenciar a vida cotidiana . A ausência de mistério tirou dos deuses a essência da experiência religiosa, que foi transferida para os mistérios, principalmente para os dionisíacos, de Elêusis e Ór�cos. Veja a seguir. 4 https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/go0158/aula4.html https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/go0158/aula4.html Os mistérios dionisíacos O deus grego Dionísio é celebrado como o deus do vinho, mas os mistérios dionisíacos são bem mais complexos que a bebida. Para começar, os mistérios dionisíacos não eram realizadosnas cidades, e sim em grutas ou cavernas. Eles eram realizados à noite, e o indivíduo que seria iniciado passava por um período de preparação antes se ser inserido no grupo. Os mistérios de Elêusis Os mistérios de Elêusis tratam da busca de Deméter, deusa da agricultura e das estações do ano, por sua �lha Perséfone, raptada por Hades e levada para o mundo inferior. Os mistérios simbolizavam a mudança das estações e a fecundidade da terra, mas mais que isso, eles levavam esperança ao crente. Os mistérios ór�cos Os mistérios ór�cos representaram uma ruptura no culto tradicional grego. Inspirado no mito de Orfeu e Eurídice, mais precisamente no fato de Orfeu ter sido o único mortal a ter entrado e saído do reino de Hades, os mistérios ór�cos estavam ligados a necessidade de salvação e puri�cação da alma. Os mistérios nas tradições religiosas gregas possuem uma característica comum: seus rituais possuíam uma simbologia capaz de criar um sentimento de solidariedade entre os iniciados, pois acreditavam que faziam parte de um grupo de escolhidos, de eleitos. Saiba mais Para saber mais sobre esse assunto, leia o texto “Mistérios dionisíacos, de Elêusis e de Ór�cos”. javascript:void(0); O politeísmo estatal romano e perpetuação da ancestralidade no seio familiar É comum a associação da religião grega com a romana. Foi transmitida a ideia que a difusão do helenismo fez com que os romanos absorvessem os deuses gregos e os cultuassem. Essa parte da história é verdade, entretanto, não é dito em nenhum lugar que, na base religiosa romana, sempre estiveram os deuses cultuados dentro de casa, no seio familiar e que perpetuavam a descendência. Na Roma antiga havia um culto o�cial, entretanto, era o Estado que o controlava, a ponto de aceitar e incluir deuses estrangeiros no seu panteão desde que “seus poderes” fossem usados para proteger Roma. A experiência religiosa e a religiosidade romana aconteciam normalmente no seio familiar e eram pautadas na ancestralidade. Larário | Fonte: Wikipedia Quando um Imperador se tornava um deus, ele era reverenciado publicamente, mas as tradições religiosas romanas eram pautadas no antepassado comum e nos deuses familiares. Era na intimidade familiar e na proteção do lar que se realizava a ligação com o sobrenatural. Esses deuses familiares, chamados de Penates e Lares, estavam representados nos altares erguidos dentro das casas e nas libações realizadas pelo chefe da família. 5 Atividade 3 - Explique qual a diferença entre o culto cívico e os mistérios na tradição religiosa grega. javascript:void(0); https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/go0158/aula4.html 4 - Faça uma pesquisa sobre os Penates, os Lares e gênios familiares romanos, analisando a importância que esses deuses possuíam na manutenção da identidade familiar. Notas Cultura própria 1 A base da organização social é tribal, ligada à ideia de comunidade, clã e família. A sociedade grega também tem essa mesma estrutura na sua gênese. No período Homérico (XX-VIII a.C.), surgiram pequenas comunidades chamadas de geno, normalmente governada por um basileu, que possuía poderes para tomar decisões nas áreas militar, religiosa e da administração da justiça. Nas comunidades, a terra era coletiva e cultivada por todos. A organização social do geno tinha uma base familiar. A dispersão dos membros de um geno em busca de terras para o cultivo fez nascer vários genos. Um conjunto de genos formava uma fatria e um conjunto fatria formava uma tribo. Como você pode perceber, o clã grego tem origem familiar e comunal. O termo basileu “tem sua origem no grego, signi�ca "Rei". É um título dado ao rei na Grécia do Segundo milênio a. C. Primariamente, é como um senhor feudal”. DICIONÁRIO INFORMAL. Disponível em: https://www.dicionarioinformal.com.br/basileu/ Discriminação 2 Boa parte do preconceito ocidental vem da incompreensão da sociedade tribal africana e da forma como é transmitida sua cultura. Nas religiões africanas, com exceção da egípcia, a tradição oral ainda é a maior fonte de transmissão de conhecimento dentro das comunidades. Somada a ela estão as práticas religiosas e culturais, vistas como rudimentares e primitivas pelos ocidentais, educados para serem etnocêntricos. Os ocidentais criaram um conceito de civilização que discrimina as outras culturas. A expressão da religiosidade concreta africana possui rituais antigos, ligados à ancestralidade e à origem da comunidade. Essa característica está relacionada a um conjunto de costumes, de condutas e de comportamentos, a partir dos quais o homem religioso africano exterioriza sua fé e nós, ocidentais, não queremos ou não conseguimos compreender. Mas, é essa característica que faz nascer a unidade religiosa de uma comunidade. Religião greco-romana 3 A forma como a religião grega se formou é intrigante. Quando os indo-europeus invadiram a parte sul da península balcânica, onde �oresceria posteriormente o mundo grego, destruíram a civilização minoica, mas preservaram uma parte de sua cultura e incorporaram uma parte da tradição religiosa. Vida cotidiana 4 javascript:void(0); Você já deve ter visto em �lmes ou lido em algum livro como Afrodite manipula os sentimentos amorosos, ou como Ares incita a guerra entre povos. Os deuses gregos eram divinos, mas possuíam sentimentos mundanos: apaixonavam-se, eram violentos, sentiam inveja, praticavam a vingança quando se sentiam desrespeitados. Essas características não lhes tiravam a divindade, eles protegiam as cidades e nelas havia um culto cívico ao deus protetor que devia ser praticado por todos os cidadãos. Intimidade familiar e na proteção do lar 5 A tradição religiosa o�cial de Roma era praticada e as oferendas eram feitas nos dias apropriados, mas a expressão religiosa, a religiosidade e o contato com o sobrenatural aconteciam no interior das casas, em frente ao altar erigido aos Lares. O politeísmo greco-romano que chegou até os dias atuais não representava a verdadeira tradição religiosa desses povos. Havia o culto o�cial e os deuses protetores das cidades que deviam ser reverenciados e cultuados, mas eram nos mistérios e por meio dos Penates e dos Lares que a experiência religiosa e a religiosidade era sentida. O contato com o sobrenatural ocorria a partir da escolha individual — do iniciado nos mistérios — ou pela sensação de pertencimento a uma comunidade familiar que possuía deuses domésticos capazes de proteger o indivíduo e a família. Referências BURKERT, W. Religião grega na época clássica e arcaica. Trad. Manuel José Simões Loureiro. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1993, p.124-558. FERRETTI, S. F. Repensando o sincretismo: estudo sobre a Casa das Minas. São Paulo: Edusp; São Luís: FAPEMA, 1995. GINZBURG, Carlo. Mitos, Emblemas e Sinais. São Paulo: Cia. das Letras, 1990. KERÉNYI, K. Os deuses gregos. Trad. Octavio Mendes Cajado. São Paulo: Cultrix, 2000, p.193- 203. LODY, R. O Povo do Santo: religião, história e cultura dos orixás, voduns, inquices e caboclos. Rio de Janeiro: Pallas, 1995. VERNANT, Jean-Pierre. Mito e religião na Grécia antiga. São Paulo: Martins Fontes, 2012. Próxima aula Experiência e religiosidade indianas; As tradições religiosas indus; A �loso�a religiosa budista. Explore mais Assista ao �lme Gladiador (2000). No �lme, a todo momento, são feitas alusões aos deuses domésticos e também ao culto cívico à �gura do imperador. O �lme foi dirigido por Ridley Scott e distribuído pela Columbia Pictures do Brasil. Assista ao documentário O que é a Umbanda, produzido por Rogério Avelino. O �lme aborda de forma bem didática a Umbanda, seus orixás, fundamentos, dogmas. javascript:void(0); Tradições Religiosas Aula 5: A História das religiões indianas: Hinduísmo e Budismo Apresentação Na Ásia, mais especi�camente na Índia, existe uma das formas religiosas mais antigas do mundo — o Hinduísmo, que é uma forma de religião complexa, com correntes de pensamentos religiosos que nasceram milharesde anos antes de Cristo. O Hinduísmo é a terceira maior religião do mundo, com aproximadamente um bilhão de seguidores. Você sabia que foi na Índia que o Budismo nasceu? No Budismo não existe a �gura de um deus, mesmo assim o Budismo é visto como uma religião, a quinta maior do mundo. Nesta aula, descobriremos o que signi�ca o nobre Caminho do Óctuplo no Budismo, bem como estudaremos as tradições religiosas dessas duas religiões de origem indiana e como elas in�uenciam diretamente no comportamento social dos indivíduos que as praticam. Bons estudos! Objetivos Reconhecer a experiência e a religiosidade indiana, a partir das tradições religiosas que a estruturam; Analisar as tradições religiosas do Hinduísmo como sendo a base de ordenamento social; Esclarecer a �loso�a religiosa budista. Primeiras palavras A Ásia sempre encantou e despertou o desejo do Ocidente pelas suas riquezas. Alguns deuses greco-romanos foram importados de lá, como Dionísio (ou Baco). As mercadorias mais valorizadas pelos ocidentais também vinham de lá. Como você sabe, até nossos índios são chamados de índios porque os portugueses erraram o caminho para das Índias e chegaram aqui. Além da riqueza material, a Ásia também possui uma riqueza religiosa capaz de fascinar qualquer estudioso das tradições religiosas — e a Índia é o principal centro irradiador dessas tradições. Estatueta de Ganesha | Fonte: Content_creator / Shutterstock O Hinduísmo, a principal religião da Índia, é vista no Ocidente como uma religião homogênea, mas não é. O Hinduísmo possui diversas tradições, e é tão complexo, que não é possível de�ni-lo como uma única religião. Você sabe como foi criada a palavra Hinduísmo? A palavra Hinduísmo não foi criada pelos indianos, quem a criou foram os ingleses em uma tentativa de descrever as expressões religiosas e a religiosidade das comunidades que foram dominadas por eles no século XIX. Os ingleses usavam a palavra hindu como sinônimo de indiano em clara demonstração de etnocentrismo. Na Índia existem cristãos, islâmicos, budistas e muitas outras religiões. O que se convencionou chamar de Hinduísmo é um conjunto de tradições religiosas que possuem uma origem comum ou parecidas, mas não são iguais. Isso acontece porque o conjunto de tradições que compõem o Hinduísmo nasceram de ensinamentos escritos. Existem várias escrituras compiladas de ensinamentos anteriormente transmitidos de forma oral, que são interpretadas, com variações diferentes, pelas escolas de pensamento hindu. Hinduísmo Budismo Apesar de ter origem nas escrituras sânscritas como o Hinduísmo, o Budismo se diferencia do Hinduísmo e das outras religiões por não crer na existência de um deus supremo ou deuses. Como existe uma religião sem Deus ou deuses? O budista acredita que se seguir um conjunto de regras especí�cas chegará à iluminação. Quem consegue chegar à iluminação travou uma luta contra os desejos e instintos humanos e venceu, deixou o plano físico e passou ao plano espiritual, vivendo a plenitude da serenidade. Estátua de Buda | Fonte: Mai111 / Shutterstock Vamos agora discutir essas duas religiões e suas tradições religiosas. Hinduísmo O Hinduísmo é uma das culturas religiosas mais importantes do mundo. Não só pela pluralidade de seus ritos, deuses e gênios. Isso a distingue das outras, mas o mais importante é o papel que o Hinduísmo desempenha na estruturação da sociedade indiana. O Hinduísmo é formado por um conjunto de tradições e costumes que servem de guia para os crentes. Apesar de haver inúmeras tradições internas que diferenciam as expressões religiosas hindu, a estruturação social é pautada em um princípio chamado Dharma. É esse princípio que organiza a vida social e o comportamento social do hindu. Leia o texto “A sociedade de castas” para entender o que são castas. O que é o Dharma? O Dharma possui várias regras que devem ser obedecidas — e vividas pelo crente — que torna seu entendimento difícil para quem não foi criado dentro da cultura hindu. Essa complexidade é um dos motivos para o preconceito ocidental. A tradução de Dharma, ao pé da letra, signi�ca ordem, mas também é chamado de Caminho Eterno. Ele de�ne qual o comportamento correto e quais rituais devem ser praticados pelo indivíduo quando se relaciona com os deuses ou divindades, com sua família e com a casta da qual faz parte. O Dharma normatiza como o indivíduo deve se comportar em sociedade e como deve cultuar as divindades. Ele pode ser de�nido como a verdade religiosa. O hindu acredita que todas as coisas têm seu Dharma, sua ordem dentro do Cosmo. Nada é aleatório. Todas as coisas são regidas por uma lei, por um dever eterno. É essa certeza que manteve durante milênios — e ainda mantém — a religiosidade do hindu. Isso é bom? Não sendo etnocêntrico, apenas analisando os fatos à luz da racionalidade ocidental, essa organização social, constituída a partir de princípios religiosos, ajuda a perpetuar situações de exploração ou exclusão social. As tradições religiosas hindus têm na sociedade de casta um de seus pilares de sustentação. Você sabe o que são castas? A sociedade de castas Clique no botão acima. A sociedade de castas Elas são uma forma de divisão social que nasceu na Índia, segundo alguns estudos, em 1500 a.C. Na origem, o sistema não era hereditário. A casta do indivíduo era determinada pela sua aptidão em vida. Uma pessoa justa, possuidora de grandes virtudes morais e espirituais, faria parte da casta sacerdotal, os Brâmanes. Pessoas que demonstrassem aptidão para governar ou para a guerra eram indicadas para a casta Xátria. Quem possuía tino para os negócios pertencia à casta Vaishyas. Todos os outros pertenciam à casta Shudra, que incluía os fazendeiros e artesãos etc. Entretanto, depois da criação de um código de conduta chamado Manusriti, por volta do século IV d.C, os sistema foi institucionalizado. Quem o escreveu retirou da religiosidade indiana seu argumento legitimador e tornou o sistema de casta hereditário. A divisão da sociedade indiana em castas surgiu da crença de que a alma do universo, também chamada de Purusha, foi morta pelos deuses para criar o mundo. De sua cabeça teriam nascido os Brâmanes, de seus braços teriam nascidos os Xátrias, de suas coxas haviam nascido os Vaishyas e dos seus pés teriam nascido os Shudra. Há uma ordem hierárquica na sociedade de castas. Brâmanes (cabeça), Xátrias (braços), Vaishyas (coxas) e Shudra (pés). Quem não pertence a nenhuma dessas castas é chamado de Dálit (pessoas consideradas sem direitos e impuras). Desse modo, a alma do universo foi usada como argumento para legitimar a discriminação e exclusão social nascida da sociedade de casta. A religiosidade dos hindus legitima a estrati�cação social e a exclusão das pessoas que “não descendem da alma do universo”. Os deuses e avatares Se você for estudar os Vedas verá que existem 33 divindades principais que habitam o céu, o ar e a terra. Esses deuses são descritos como seres ou forças da natureza e podem se apresentar de diversas formas, mas os mais importantes são Brahma, Shiva e Vishnu, a trindade hindu. Eles são responsáveis, respectivamente, pela criação, manutenção e destruição do mundo. Vamos conhecê-los. Brahma É considerado a força criadora do universo. Ele criou tudo e está presente em tudo que existe. Vishnu É o deus responsável pela manutenção, proteção e sustentação do universo e sua imagem também possui todo um simbolismo. Shiva Apesar de ser chamado de destruidor, é também o deus associado à renovação e transformação — na mitologia hindu ele destrói para reconstruir. Leia o texto “A trindade hindu” para conhecer um pouco mais sobre esses deuses. A trindade hindu Clique no botão acima. A trindade hindu Brahma Sua imagem carrega todo um simbolismo: Os quatro rostos recitam os quatro Vedas; A barba signi�ca sabedoria; As quatro mãos signi�cam autocon�ança, o ego, a meditação, e o intelecto; A �or de lótus representa
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