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1 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 ARRITMIAS SISTEMA DE CONDUÇÃO ELETRICA A atividade elétrica de um ritmo cardíaco normal (ritmo sinusal) surge no Nó Sinusal. As células desse nó, possuem a importante propriedade de automatismo, ou seja, a capacidade de se despolarizar espontaneamente com uma determinada frequência de disparos. O estimulo elétrico se propaga para o miocárdio atrial ao mesmo tempo em que através de feixes intermodais alcança o Nó Atrioventricular. A ativação elétrica do miocárdio atrial inscreve-se no eletrocardiograma como onda P. Quando o ritmo é sinusal, a onda P tem que ser positiva em D1 e D2. Chegando ao nó AV, o estimulo elétrico sofre um atraso fisiológico de aproximadamente (3- 5mm), o que corresponde ao intervalo PR no ECG. Após isso, o estimulo propaga-se para o feixe de His e sistema de Purkinje. A ativação elétrica do miocárdio ventricular inscreve-se no ECG como o complexo QRS. O período refratário termina quando os miócitos se repolarizam, evento marcado pela onda T. O intervalo desde o início do QRS até o final da onda T (intervalo QT). A Frequência Cardíaca (FC) pode ser determinada no ECG medindo-se a distância entre os complexos QRS. Dividimos 1.500 por esta distância. AVALIAÇÃO DO ECG 1. ONDA P A onda P compreende o registro eletrocardiográfico da despolarização atrial, determinada pela despolarização automática do nó sinusal. O intervalo compreendido entre o início da onda P e o início do QRS é chamado de PR, o qual corresponde ao atraso fisiológico na condução da onda elétrica gerada na despolarização dentro do nó AV. Esse atraso pode ter a duração máxima de 5 quadradinhos. 2. COMPLEXO QRS O complexo QRS representa a despolarização elétrica dos ventrículos. Quando a duração é menor que 0,12 segundos é chamado de QRS estreito. E quando maior ou igual a 0,12 segundo é chamado de QRS largo. Quando, por algum motivo — alteração metabólica, isquemia, degeneração etc. —, o estímulo elétrico progride apenas por um dos ramos ventriculares, o ventrículo oposto é despolarizado pela propagação da onda elétrica por meio do músculo cardíaco. E essa condução ocorre de forma mais lenta do que aquele feita pelo sistema de condução, determinando o QRS largo. Assim de forma genérica, este indica o bloqueio de um dos ramos do sistema de condução. 3. ONDA T 2 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 A onda T representa a repolarização elétrica ventricular. Vários fatores podem influenciar esse período, como distúrbios metabólicos e isquemia. ARRITMIAS A chave para a interpretação das arritmias é a análise da forma e das inter-relações da onda P, do intervalo PR e do complexo QRS. A avaliação do traçado envolve a análise da frequência, do ritmo, da origem mais constante do estímulo (marca-passo predominante) e da configuração da onda P e do QRS (estreito ou largo). As arritmias cardíacas acontecem, de forma simplificada, por meio de três mecanismos possíveis: ALTERAÇÃO DO AUTOMATISMO CARDÍACO Pode ocorrer por aceleração ou desaceleração das estruturas automáticas do coração, como o nó sinusal — taquicardia ou bradicardia sinusal —, nó AV ou o próprio miocárdio. Batimentos ou despolarizações ectópicas podem surgir por distúrbios elétricos atriais, da junção AV ou dos ventrículos. Também são possíveis ritmos anormais, como taquicardia atrial ou ventricular. DISTÚRBIOS DE CONDUÇÃO ATRIOVENTRICULAR. A condução pode ser acelerada, como na Síndrome de Wolff-Parkinson-White (SWPW), ou lenta, como no bloqueio AV. COMBINAÇÕES DE DISTÚRBIOS DE AUTOMATISMO E DE CONDUÇÃO É a combinação dos dois distúrbios. Extrassistole atrial com bloqueio AV ou taquicardia atrial com bloqueio AV 3:1 são exemplos dessas combinações. IDENTIFICANDO ARRITMIAS As arritmias são interpretadas pela análise de um traçado em derivação única. O paciente, independentemente da frequência da arritmia (taquicárdica ou bradicárdica), deve ser rapidamente caracterizado como estável ou instável do ponto de vista de repercussão clínica da arritmia. Para essa caracterização, é importante checar quatro parâmetros (mnemônico dos 4 “Ds”): Dizziness (tontura, sonolência), Dispneia, Dor torácica e Down pressure (hipotensão): • O paciente tem alteração da consciência, atribuída ao baixo débito cardíaco pela arritmia? • O paciente está em insuficiência respiratória, congestão pulmonar, pela arritmia? • O paciente tem dor torácica com características isquêmicas? • O paciente tem sinais e sintomas de choque/baixo débito cardíaco? Para qualquer resposta “sim” a uma das quatro perguntas anteriores, o paciente está “instável” e demandará intervenção agressiva para controle do ritmo, sem tempo para aguardar o efeito de drogas antiarrítmicas. 3 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 Nas bradicardias, isso significa uso imediato do marca-passo transcutâneo e, nas taquiarritmias, cardioversão elétrica. Caso essas questões tenham tido resposta negativa, o paciente é caracterizado como “estável” e permitirá o uso de medicações intravenosas para controle do ritmo. FIBRILAÇÃO ATRIAL Quando os miocitos atriais estão “doentes”, algumas de suas propriedades elétricas podem se alterar e dá origem a formação de novos caminhos elétricos através do miocárdio atrial. Nessa condição, um estimulo pode passar a surgir de pequenos circuitos de reentradas (movimentos circulares), fazendo com que o miocárdio perca sua contração rítmica. É a taquiarritmia crônica mais comum na população, com um aumento progressivo com a idade. A FA é uma arritmia de indivíduos cardiopatas, idosos ou hipertireoides. Porem acomete pacientes jovens casos esses sejam submetidos a determinados fatores precipitantes como libação alcoólica ou uso de adrenérgicos (cocaína ou anfetamina). Em nosso meio, dois grupos de cardiopatia predominam como causa de FA: (1) hipertensiva e (2) reumática (valvopatias mitrais). A fibrilação atrial, ao mesmo tempo em que é um marcador de gravidade na cardiopatia, pode contribuir para a piora hemodinâmica, precipitando sintomas do tipo palpitações, dispneia, desconforto torácico, tonteira, sudorese fria, urgência urinária. Uma parcela significativa de casos, entretanto, revela-se assintomática. TROMBOEMBOLISMO: é uma das principais preocupações em pacientes com FA. Como os átrios perdem sua contração rítmica, o sangue sofre estase no interior das câmeras, predispondo a formação de trombos murais. O SNC é o local mais frequentemente acometido, determinando AVE isquêmico embólico. Você já deve ter percebido que o AVE isquêmico pode ser a primeira manifestação de uma fibrilação atrial. TRATAMENTO: 1. PACIENTE INSTÁVEL: Se a FA se apresentar com algum critério de “instabilidade”, a conduta é a cardioversão elétrica imediata! A cardioversão elétrica é a maneira mais rápida de se restaurar o ritmo sinusal em qualquer taquiarritmia!!! Diversos esquemas podem ser empregados, sendo o mais comum a combinação de drogas com meia-vida curta, como propofol ou midazolam (sedativos-hipnóticos) + fentanil (analgésico). 4 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 O paciente deve estar com suporte de O2, além de acesso venoso periférico e monitorização contínua do eletrocardiograma e dos sinais vitais (OVM = Oxigênio, Veia e Monitor), ficando o material de reanimação prontamente disponível. O choque inicial com o desfibrilador monofásico deve ter carga entre 100-200 J, e deve ser sincronizado com a onda R do complexo QRS. Se o ritmo sinusal não for reestabelecido, pode-se repetir o choque com uma carga maior, de 360J. Se ainda assim a cardioversão não for bem-sucedida, pode-se ministrar o antiarrítmico ibutilida (1 mg IV em 10min) seguido de nova tentativa de cardioversão. 2. PACIENTE ESTÁVEL: Nesta situação – que, diga-se de passagem, é a forma mais comum de apresentaçãoda FA – dá tempo para avaliarmos cada caso individualmente, a fim de selecionar a melhor estratégia... Existem três opções: (1) “Controle do ritmo”, onde se tenta a cardioversão ELETIVA: Diversas drogas antiarrítmicas são eficazes em cardioverter a FA. As mais empregadas na prática atual são: ibutilida, amiodarona (com cardiopatia), dofetilida, propafenona (sem cardiopatia), flecainida e sotalol (2) “Controle da resposta ventricular”, onde deixamos o paciente em ritmo de FA e utilizamos drogas inibidoras do nódulo AV, com o intuito de diminuir a frequência cardíaca. Três grupos de inibidores do nódulo AV podem ser utilizados: (1) betabloqueadores - metoprolol e esmolol; (2) antagonistas de canais de cálcio não diidropiridínicos - Diltiazem e Verapamil e (3) digitálicos - digoxina. (3) “Risco cardioembólico” - anticoagulação: Nesse momento, o risco cardioembólico deve ser sempre avaliado. Quando for significativo, a anticoagulação deve ser instituída. Existem escores que auxiliam nessa tarefa: CHA2DS2- VASC. Quando o paciente é Portador de estenose mitral moderada a grave (ou prótese valvar), ele automaticamente é considerado de “alto risco cardioembólico” na vigência de FA, devendo, portanto, ser anticoagulado. 5 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 A anticoagulação plena pode ser iniciada de duas formas: (1) com a associação de Heparina de Baixo Peso Molecular (ex.: enoxaparina 1 mg/kg, SC, de 12/12h) e warfarina (dose ajustada para manter o INR entre 2- 3), suspendendo a heparina após o INR atingir a faixa terapêutica; ou (2) com os novos anticoagulantes orais que não necessitam de heparina no início do tratamento (devido ao seu efeito anticoagulante imediato). Os NOAC não deve ser prescrito para pacientes com prótese mecânica ou estenose mitral moderada a grave. 6 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 TAQUICARDIA SUPRAVENTRICULAR PAROXÍSTICA (TSVP) O termo “taqui supraventricular paroxística” faz referência as taquicardias de origem não ventricular que sempre começam e terminam subitamente (caráter paroxístico). A taquicardia por reentrada nodal é a responsável pela maioria dos casos. MECANISMO ELETROFISIOLÓGICO Para desenvolver tal arritmia, o indivíduo precisa ter desde o nascimento uma dupla via nodal, ou seja, o nó AV apresenta duas vias de condução com propriedades eletrofisiológicas diferentes. Tudo começa com uma extrassístole atrial (uma onda P que vem antes do tempo). O estimulo proveniente da extrassístole, no momento em que alcança o nódulo AV, encontra a via rápida (beta) refratária, passando apenas pela via lenta (alfa). Por esta via ter condução lenta, no momento em que o estimulo acaba de passar por ela, a via rápida já se recuperou do período refratário, permitindo que o estimulo suba por ela e encontre novamente o início da via lenta, completando um circuito de reentrada. Observe que o estímulo desce pela via lenta (alfa), despolarizando os ventrículos normalmente pelo sistema His-Purkinje (inscrevendo um QRS estreito no ECG); em seguida sobe pela via rápida (beta), despolarizando os átrios de forma retrógada, quase ao mesmo tempo em que os ventrículos foram despolarizados. A ativação atrial retrógrada determina uma onda P negativa no final do QRS, justificando o pseudo-S em D2 e o pseudo-R’ em V1. QUADRO CLÍNICO A maioria dos pacientes é previamente hígida. E os sintomas começam e terminam subitamente, como um estalo. Durante a crise, o relato de palpitações é muito intenso, referidas no pescoço (frog positivo) ou no peito, dispneia, tonteira ou até sincope. A sincope pode ser de natureza vagal (reflexo vagal desencadeado pela taquicardia). A intensidade dos sintomas é percebida quando o paciente refere que precisa parar imediatamente seus afazeres quando vem a crise de palpitações. 7 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 TRATAMENTO O tratamento da crise de TSVP se baseia no bloqueio da via lenta no nó AV com drogas de ação imediata. Se não houver contraindicações, pode ser tentada uma manobra vagal (Valsava ou compressão do seio carotídeo) que pode ser eficaz em alguns pacientes. A cardioversão elétrica sincronizada está indicada nos pacientes que chegam com instabilidade. Nos pacientes com hemodinâmica estável, apesar de sintomáticos, uma droga venosa deve ser aplicada - primeira escolha: Adenosina (reverte mais de 90%) e segunda escolha: Verapamil; terceira escolha: betabloqueadores. A terapia crônica está indicada quando a arritmia é frequente e sintomática. A profilaxia das crises pode ser eficaz com digoxina, verapamil (BCC), diltiazem (BCC) ou betabloqueadores, isolados ou em associação. 8 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022
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