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158 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III Unidade III 7 África O continente africano caracteriza‑se por apresentar um contorno maciço, com poucos recortes em seu litoral. Possui uma superfície de cerca de 30,3 milhões de quilômetros quadrados. Por ser cortado, ao mesmo tempo, pelo Meridiano de Greenwich, em sua porção ocidental, e pelo Equador, ao centro, é o único continente a possuir territórios nos quatro hemisférios: ocidental, oriental, setentrional e meridional. Dois terços do território africano concentram‑se no hemisfério setentrional, e apenas uma pequena parte no hemisfério Ocidental. 7.1 Divisão político‑regional, quadro natural e suas paisagens Nos próximos subtópicos, abordaremos as características físicas do continente africano. 7.1.1 Divisão político‑regional O continente africano é cortado ao norte pelo Trópico de Câncer, na região abrangida pelo Deserto do Saara, e ao sul pelo Trópico de Capricórnio, na região abrangida pelo Deserto do Kalahari. Por isso, apresenta considerável influência da tropicalidade em grande parte do seu território. Delimita‑se ao norte com o Mar Mediterrâneo, a nordeste com o Mar Vermelho, a oeste com o Oceano Atlântico e a leste com o Oceano Índico. Entre os Mares Mediterrâneo e Vermelho, encontra‑se o Istmo de Suez (Península do Sinai), e, entre o Marrocos, a noroeste, e a Espanha, encontra‑se o Estreito de Gibraltar, passagem de navios do Atlântico para o Mediterrâneo. Os pontos extremos do continente africano são: ao norte, o Cabo Branco, na Tunísia; ao sul, o Cabo das Agulhas, na África do Sul; a leste, o Cabo Hafun e Guardafun, na Somália; e, a oeste, o Cabo Verde, próximo ao Senegal. Cercada de mares e oceanos, a África é um continente maciço, com uma costa pouco recortada, o que torna difícil o acesso ao interior, sendo raros os portos naturais. 159 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia Figura 70 – Divisão política da África 7.1.2 Relevo e estrutura geológica O continente africano é uma vasta plataforma tabular, em que predominam os terrenos cristalinos e uma série de planaltos (com 600 m a 700 m de altitude), que se estendem a perder de vista. É um continente fortemente trabalhado pela erosão, em que se sobressaem picos rochosos isolados, semelhantes ao Pão de Açúcar. Os planaltos são elevados no litoral e descem bruscamente para o mar em degraus abruptos. No interior, o relevo é suave. Além do predomínio de planaltos cristalinos fortemente trabalhados pela erosão, observa‑se no continente africano a presença de bacias sedimentares de dois tipos: • bacias fechadas: não apresentam contato direto com o mar, possuindo rios de drenagens endorreicas (às vezes intermitentes), que desembocam nos Lagos Chade, ao norte, e Ngami, ao sul; • bacias abertas: estão diretamente em contato com o mar, como é o caso daquelas formadas pelos Rios Congo, Nilo e Zambeze. 160 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III Altitudes (metros) Depressão De 0 a 200 De 200 a 500 De 500 a 1.500 De 1.500 a 3.000 Acima de 3.000 Cumes Vulcões Figura 71 – Relevo africano Observam‑se ainda as formações montanhosas, com destaque para: • Cadeia jovem do Atlas, formada durante a Era Terciária e localizada a noroeste do continente. Divide‑se em Atlas Marroquino (Grande e Pequeno Atlas e Cadeia do Rife) e Atlas Argelino, onde aparecem montanhas muito erodidas pelo vento (Tell, Hogar e Tibesti). • Montanhas antigas do Golfo da Guiné, também elevadas e vulcânicas, em que se destacam a Serra Leoa e os Montes Camerum e Fouta Djalon. • Montanhas vulcânicas da porção oriental, onde se destacam o Planalto de Abissínia e os maciços do Quênia e do Kilimanjaro. Neste último se encontra o pico mais alto da África: o Pico Kibo ou Uhuru (Independência), com 5.893 m de altitude, coberto de neves eternas e situado entre o Quênia e a Tanzânia. • Montanhas antigas do sul, onde aparecem os Montes Drakensberg, o Conglomerado Mineralógico de News‑Weld e a Cadeia do Cabo, todos de origem antiga e bastante trabalhados pela erosão. Na porção oriental africana, o rígido embasamento cristalino, não resistindo às pressões interiores (tectonismo), fragmentou‑se, determinando a formação de uma linha de falhas no sentido 161 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia longitudinal e originando uma imensa fossa tectônica que, posteriormente ocupada por água doce, deu origem a dezenas de lagos tectônicos: Vitória, Tanganica, Niassa, Mweru, Bangueolo, Alberto, Turkana, Eduardo etc. 7.1.3 Grandes cadeias montanhosas • Atlas: sistema montanhoso que se orienta da Costa Atlântica do Marrocos para o Nordeste, numa extensão de 2.250 km, até o norte da Tunísia. Consiste em vários alinhamentos de relevos grosseiramente paralelos. No Marrocos, inclui (de sul para norte) o Antiatlas (sim, é o nome da montanha; subdivisão sudoeste da cadeia principal), o Alto Atlas e o Médio Atlas; na Argélia, o Atlas Saariano (que inclui as montanhas Amour e se estende até o maciço de Aurés, a leste) e, mais para o norte, o Atlas Teliano, ou Atlas Marítimo. O pico mais elevado do norte da África – Djebel Toubkal (4.167 m) – ergue‑se no Alto Atlas, no Marrocos. • Drakensberg: cadeia montanhosa que se estende por 1.125 km, desde o leste do Transvaal, através dos Estados sul‑africanos de Orange e Natal, o Reino de Lesoto, até o leste da província do Cabo. Faz parte da Grande Escarpa, e o nome deriva de lendas segundo as quais os montes eram habitados por dragões. Os picos mais altos situam‑se na fronteira entre a África do Sul e o Lesoto, onde o Thabana Ntlenyana (no Lesoto) atinge 3.482 m, e o Champagne Castle (na África do Sul), 2.274 m. • Kilimanjaro: a montanha mais alta da África, no nordeste da Tanzânia, na fronteira com o Quênia. O Kilimanjaro tem dois picos – o Kibo (5.895 m) e o Mawenzi (5.149 m), ambos vulcões extintos. Lembrete Drenagem endorreica é a orientação de uma bacia hidrográfica que corre para o interior de um continente, para um mar fechado ou lago; é o contrário de drenagem exorreica, quando uma bacia tem seu desaguadouro associado a um oceano ou mar aberto. Os Montes Drakensberg são uma formação montanhosa da porção meridional do continente africano que constitui um fenômeno geológico, pois sua formação pré‑cambriana encerra uma das maiores e mais diversificadas concentrações de minerais metálicos do globo. Fossa tectônica é uma depressão alongada enquadrada por uma série de degraus produzidos por falhas paralelas. Lagos tectônicos são aqueles formados pelo preenchimento de fossas tectônicas por águas fluviais. 162 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III 7.1.4 Hidrografia O continente africano dispõe de duas enormes artérias fluviais: o Rio Nilo e o Rio Congo. O Nilo é o segundo mais extenso do planeta, e o Congo é, depois do Amazonas, o rio que possui o segundo maior volume de água da Terra. Rios permanentes Canais de irrigação Figura 72 – Delta do Nilo (Egito) • Rio Nilo: nasce no Lago Vitória, com o nome de Nilo Branco, e corre sempre para o norte, recebendo água dos Lagos Kyoga e Alberto. Atravessa o Sudão e recebe, pela margem direita, os Rios Sabat, Nilo Azul e Atbara; e, pela margem esquerda, o Rio Gazelas (Bahr el Ghazal). Em seguida, atravessa todo o Deserto do Saara (2.000km), sem um único afluente e, antes de formar as seis grandes cataratas, descreve um enorme “S” no Deserto da Núbia. Deságua finalmente no Mediterrâneo, depois de um curso de mais de 6.500 km, formando um grande delta de 600 km de largura, onde estão as maiores cidades africanas: Cairo (baixo curso) e Alexandria (foz). 163 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia Figura 73 – É um espetáculo a cascata do Rio Nilo Azul, na Etiópia O regime do Rio Nilo está na dependência das chuvas de verão; suas águas provêm principalmente dos afluentes da margem direita. Essas enchentes ocorrem de junho a setembro, e o nível das águas chega a atingir 7 a 8 metros acima do nível mais baixo. Observação Delta é o desaguadouro de um rio em que se observam vários canais. Essa dispersão das águas fluviais ocorre em face do acúmulo exagerado de sedimentos. São essas enchentes que depositam o limo fertilizante sobre as margens; daí a famosa frase de Heródoto: “O Egito é uma dádiva do Nilo”. Hoje em dia, suas enchentes são reguladas pelas barragens das hidrelétricas de Assuã e Assiut. • Rio Congo ou Zaire: é o primeiro da África em volume de água (40.000 m3) e o segundo em extensão (4.600 km). Oriundo do Lago Bangueolo, atravessa o Lago Mweru e recebe as águas do Lago Tanganica. Forma ainda as famosas Cataratas de Livingstone (cerca de 32 cachoeiras). É o único rio da Terra que atravessa duas vezes o Equador. Os seus principais afluentes são o 164 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III Ubanque, pela margem direita, e o Cassai, pela margem esquerda. Seu regime depende das chuvas equatoriais, e quase toda a sua bacia é coberta por impenetráveis florestas equatoriais. Figura 74 – Hidrografia da África O Rio Congo banha três capitais: Bangui, na República Centro‑Africana; Brazzaville, na República Popular do Congo; e Kinshasa, na República Democrática do Congo. • Rio Níger: nasce nos Montes Fouta Djalon, corre para o norte e depois descreve uma imensa curva, levando suas águas para o Golfo da Guiné, onde forma um grande delta. Sua extensão é de aproximadamente 4.200 km, e seu principal afluente é o Benue. Banha Bamaco e Niamei. • Rio Zambeze: com 2.600 km de extensão, forma ao longo de seu trajeto as famosas Quedas de Vitória, nas quais o rio despenca de uma altura de quase 140 metros. Atravessa três biomas: a savana, as estepes do Sahel e a floresta equatorial. Desemboca no Índico, no Canal de Moçambique, onde forma um amplo delta. Nele se encontra a maior hidrelétrica do continente, Cahora Bassa, em Moçambique. • Rio Limpopo: nasce ao norte da África do Sul, separando‑a do Zimbábue e desembocando no Índico. • Rio Orange: com nascentes no leste da África do Sul, próximo ao Reino do Lesoto, separa a Namíbia do norte da África do Sul, desembocando em seguida no Oceano Atlântico. • Rio Chari: sua extensão é de 1.300 km; nasce na savana africana, atravessa o Sahel e deságua no Lago Chade, ao sul do Saara. Por desaguar no interior, sua drenagem é endorreica. 165 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia Além de ter grandes rios, o continente africano conta com grandes formações lacustres. Estas aparecem em uma linha longitudinal, na porção centro‑oriental do continente, e são de origem tectônica. O maior lago africano é o Vitória, com 66.000 km2. Localiza‑se a 1.000 m de altitude, sendo cortado pelo Equador. Além dele, podemos destacar os Lagos Tanganica, Niassa ou Malauí, Turkana, Alberto, Eduardo, Bangueolo, Mweru, Kariba e outros. As Cachoeiras de Vitória, no Rio Zambeze, chegam a 120 metros de altura. Cabe mencionar ainda os lagos situados em depressões, como o Chade e o Ngami. 7.1.5 Clima Em virtude de sua posição geográfica, cortada pelos dois trópicos, a África é dominada por climas quentes. Em geral, as temperaturas do mês mais frio não descem a menos de 10 °C, e, por toda parte, o mês mais quente apresenta sempre mais de 20 °C. Nos desertos, a temperatura chega a mais de 59 °C. O continente africano apresenta grande variedade na distribuição das chuvas. Em algumas regiões, elas são abundantes; em outras, são extremamente escassas. Há uma África úmida, bem diferenciada. Na região equatorial e na Costa do Golfo da Guiné, existe a zona de calmarias, que produz chuvas de convecção: chove em abundância quase diariamente. Em regiões mais afastadas dessa zona, as precipitações diminuem, e há um período sensivelmente menos chuvoso em certas épocas do ano, correspondente aos meses menos quentes: é o regime de climas tropicais úmidos propriamente dito. Mediterrâneo Desértico Equatorial Tropical Figura 75 – Clima da África 166 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III Em contraposição à África úmida, há uma África seca. Nas latitudes tropicais, formam‑se centros de alta pressão (anticiclones), dispersores dos ventos alísios, que se deslocam em direção ao Equador. Nessas áreas de alta pressão, formam‑se os Desertos do Saara, ao norte, e do Kalahari, a sudoeste. Como consequência, a estação seca prolonga‑se por quase todo o ano, e as chuvas, bem raras, são muito irregulares. Já nas suas extremidades norte e sul, o continente torna‑se mais úmido. Aí os ventos do oeste provocam chuvas que se concentram nos meses de inverno, caracterizando climas mediterrâneos. A diferenciação do clima se faz, de maneira geral, acompanhando o sentido dos paralelos. De norte a sul, encontramos: • clima equatorial: com chuvas abundantes durante o ano todo, sem estação fria, abrange as áreas próximas ao Equador, como Congo e Quênia; • clima tropical: com chuvas durante o verão, secas no inverno e médias térmicas anuais elevadas, aparecendo entre as áreas desérticas e as de clima equatorial; • clima desértico quente: índice pluviométrico abaixo de 250 mm/ano; exemplos: Desertos do Saara e do Kalahari. O Deserto do Saara é o maior do globo (7.780.000 km2), correspondendo a um imenso peneplano que vai do Atlântico ao Mar Vermelho e ocupa todo o norte do continente africano. Figura 76 – Vista do Deserto do Saara, no norte do Níger 167 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia O Deserto do Saara é uma vasta região de rochas e areias, caracterizada por uma aridez desolada. As temperaturas são elevadíssimas durante o dia, chegando a 57 °C na Líbia, e durante a noite podem cair bastante, atingindo até mesmo 0 °C. Os cursos de água (ueds), mais comuns nas periferias norte e sul, são temporários, só fluindo quando chove, predominando a drenagem endorreica. Há três tipos de deserto: o hamada – uma espécie de planalto rochoso, às vezes parecido com um chapadão seco e duro; o reg – uma vasta área de seixos e cascalhos amontoados; e o erg – composto de dunas de areia. O Deserto do Kalahari situa‑se ao sul do continente, é cortado pelo Trópico de Capricórnio e abrange terras de Botsuana e parte da Namíbia ou África do Sudoeste. Lembrete Ventos alísios são ventos que sopram durante todo o ano em direção às calmarias equatoriais, que são áreas de baixa pressão. Ueds são rios intermitentes ou temporários, que existem apenas na época das chuvas. Observação O Deserto do Kalahari é uma região árida e semiárida de 520.000 km, formada por areias e depressões de solo salgado seco. As temperaturas mais elevadas sãoverificadas entre novembro e dezembro. Os khoisan, mais conhecidos como hotentotes ou bosquímanos, constituem a maioria da população. O deserto possui várias reservas de animais selvagens, incluindo as do Kalahari Central, Makgadikgadi Pan e Kalahari Gemsbok National Park, no norte da província do Cabo (África do Sul) e no sudoeste da Botsuana. Sahel é uma região semiárida que se estende do Senegal ao Sudão em forma de uma faixa que separa o Deserto do Saara das florestas tropicais. Na sua maior parte, é revestida de savanas, existindo ainda algumas terras irrigadas pelos Rios Níger e Senegal. Trata‑se de uma região frágil do ponto de vista ambiental, sempre ameaçada pelos ventos secos do deserto. A sobrecarga do Sahel com pastoreio e agricultura alterou seu equilíbrio, causando grande crise, com queda da produção alimentar e êxodo populacional em 1974 e 1984. • Clima subtropical: é encontrado nos extremos norte e sul da África, em latitudes médias e nas altitudes elevadas. No extremo norte, o clima subtropical pode ser chamado mediterrâneo, em razão de acentuadas influências do Mar Mediterrâneo. 168 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III Intensidade Mais de 2.000 mm De 1.000 a 2.000 mm De 500 a 1.000 mm De 250 a 500 mm Menos de 250 mm Figura 77 – Pluviosidade 7.1.6 Formações vegetais As paisagens vegetais na África estendem‑se de um e de outro lado do Equador, de acordo com a distribuição das chuvas: a zona equatorial, quente, muito úmida, com uma floresta densa e alta; a zona tropical, úmida, mas com estação seca bem‑marcada e vegetação de savana; as estepes; e os desertos. • Florestas da África úmida: uma floresta densa cobre toda a Bacia do Congo e as regiões costeiras do Golfo da Guiné. Compreende centenas de espécies, muitas delas de madeira de lei. Também a fachada costeira da África Oriental é ocupada por densa floresta, cuja riqueza vegetal é comparável à da Amazônia. O húmus (produto da decomposição parcial de restos vegetais que se acumulam no chão da floresta) constitui fonte de matéria orgânica para a nutrição vegetal da floresta. Entretanto, os solos em geral são muito pobres e esgotam‑se facilmente quando cultivados. 169 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia Savana Equador Estepes Floresta equatorial Vegetação desértica Vegetação mediterrânea Figura 78 – Vegetação • Savanas: estendem‑se de um lado e de outro da floresta equatorial, na faixa dos trópicos, mas também predominam nos planaltos e na região dos Grandes Lagos Africanos. Os solos são pobres e, em grandes extensões, prejudicados por lateritas. Nas savanas, vivem grandes mamíferos, como girafas, zebras, elefantes, além de outros de menor porte. • Estepes e desertos: gramíneas típicas das áreas de transição de climas secos para úmidos, como as áreas entre os desertos e as savanas, numa faixa que se estende do Atlântico ao Mar Vermelho. Os desertos abrangem as áreas onde as chuvas são inferiores a 250 mm anuais. Onde existe alguma umidade, uma vegetação rasteira e de folhas grossas cresce em tufos e recobre os leitos secos dos rios temporários. No Deserto do Kalahari, entre blocos de rochas, desenvolve‑se uma vegetação xerófita. Nessa formação, encontramos ao sul do Deserto do Saara uma faixa conhecida como Sahel. • Vegetação mediterrânea: também conhecida como maquis e garrigues. Era formada por estreita floresta que foi devastada pela ação antrópica. Hoje, a vegetação mediterrânea é constituída por formações arbustivas, herbáceas e algumas árvores, próprias das áreas calcárias mais secas próximas ao litoral mediterrâneo, tanto da Europa quanto do Magreb africano. 170 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III Lembrete Lateritas são crostas do solo decorrentes da laterização, processo de desgaste dos solos em que a retirada de seus elementos orgânicos tem como contrapartida o acúmulo de óxido de ferro e alumínio e, consequentemente, a formação de uma crosta em seu horizonte superior. Xerófita é a planta adaptada aos climas secos (cactácea). 7.2 Quadro socioeconômico Nos próximos subtópicos, estudaremos o quadro socioeconômico do continente africano. 7.2.1 Origens históricas A África é o continente de mais antiga ocupação do planeta. Foi lá que foram encontrados os vestígios arqueológicos que permitiram datar a vida humana sobre a Terra a partir dos fósseis dos primeiros hominídeos que ali viveram há cerca de 6 milhões de anos. Segundo o historiador africano Joseph Ki‑Zerbo, não se sabe ao certo a origem da palavra África. Após ter designado o litoral norte‑africano, passou a aplicar‑se ao conjunto do continente, desde o fim do século I antes da Era Cristã. Há várias hipóteses trazidas por Ki‑Zerbo (2010): • A palavra África teria vindo do nome de um povo (berbere) situado ao sul de Cartago: os Afrig. De onde Afriga ou África para designar a região dos Afrig. • Uma outra etimologia da palavra África é retirada de dois termos fenícios, um dos quais significa espiga, símbolo da fertilidade dessa região, e o outro, Pharikia, região das frutas. • A palavra África seria derivada do latim aprica (ensolarado) ou do grego apriké (isento de frio). • Outra origem poderia ser a raiz fenícia faraga, que exprime a ideia de separação, de diáspora. Enfatizemos que essa mesma raiz é encontrada em certas línguas africanas (bambara). • Em sânscrito e hindi, a raiz apara ou africa designa o que, no plano geográfico, está situado “depois”, ou seja, o Ocidente. A África é um continente ocidental. 171 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia Uma tradição histórica retomada por Leão, o Africano, diz que um chefe iemenita chamado Africus teria invadido a África do Norte no segundo milênio antes da Era Cristã e fundado uma cidade chamada Afrikyah. Mas é mais provável que o termo árabe Afriqiyah seja a transliteração árabe da palavra África. Chegou‑se mesmo a dizer que Afer era neto de Abraão e companheiro de Hércules! (KI‑ZERBO, 2010, p. 31, grifo nosso). Para compreender hoje o quadro social e econômico da África é necessário retroceder brevemente até, pelo menos, algumas décadas atrás. Anteriormente ao domínio europeu, predominavam no continente grandes civilizações, como a do Egito (ao longo do Rio Nilo), a do Reino do Benim (junto ao Delta do Níger), a do Zimbábue (no Rio Zambeze) e diversas outras. Desde a Antiguidade, povos asiáticos entram em contato com civilizações africanas. Os árabes, buscando expandir seu comércio, mantiveram grande contato com diversos povos do norte da África, em que imprimiram sua cultura, principalmente sua religião, o islamismo, que se difundiu até a África Central. No século XV, tem início o Período do Capitalismo Comercial, em que o comércio passa a ser a base econômica da Europa, e não mais a agricultura. Em razão da necessidade de expandir o seu comércio, os países da Europa Ocidental viram‑se incentivados a realizar grandes navegações pelo Oceano Atlântico. No século XVI, as potências da época, Portugal, Espanha, Holanda, Inglaterra e França, dividiam o mundo em regiões de domínio geopolítico, como se vê no mapa a seguir: Área sob controle de Portugal Área sob controle da Espanha Área sob controle da França Área sob controle da Inglaterra Área sob controle da Holanda Figura 79 – O mundo dividido entre as potências europeias no século XVI 172Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III A presença portuguesa ficava restrita ao litoral e a entrepostos comerciais na região costeira. Mas, no final do século XIX, no auge da Revolução Industrial, as potências europeias iniciaram uma corrida imperialista para controlar as matérias‑primas e conseguir novos mercados para seus produtos manufaturados. A Conferência de Berlim (1884‑1885) pretendeu colocar fim aos desentendimentos pela partilha do continente. De 1880 a 1914, todo o território africano esteve sob o domínio europeu, com exceção da Libéria e da Etiópia. Vejamos a situação geográfica às vésperas da Primeira Grande Guerra Mundial. Possessão belga Possesssões alemãs Possessões inglesas Possessões italianas Possessões francesas Possessões espanholas Possessões portuguesas Estados independentes Colônia do Cabo Basutolândia Madagascar Zamzibar (Ingl.) CamarõesLibéria Togo Nigéria Quênia Rodésia Angola Mo ça mb iqu e Bechuanalândia África do Sul Ocidental África Oriental África Equatorial África Ocidental Rio do Ouro Congo Belga Costa do Ouro Serra Leoa Guiné Port. Gâmbia Mauritânia Cos ta d o Mar fim Cabinda Uganda Gabão Muni Somália Italiana Somália Britânica Sudão Anglo‑Egípcio Abissinia EgitoLíbia Marrocos Argélia Ifni Tunísia Senegal Somália Francesa Britreia Figura 80 – A divisão da África às vésperas da Primeira Guerra Mundial As disputas entre as potências europeias pelos territórios afro‑asiáticos desencadearam a Primeira Guerra Mundial. Com a formação das colônias, a economia do continente foi ainda mais modificada, visando atender às necessidades dos colonizadores. A colonização de exploração, por exemplo, alterou a agricultura de subsistência, que antes era, muitas vezes, suficiente para a população, substituindo‑a por plantations e passando a atender ao mercado externo. Praticamente todas as atividades do continente foram desenvolvidas visando às necessidades do colonizador. Após a Segunda Guerra Mundial (1939‑1945), o modelo colonial europeu entra em decadência, e crescem os movimentos de 173 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia emancipação das colônias. Desta vez, o contexto da Guerra Fria lança duas potências geopolíticas (EUA e URSS) na disputa pela influência na região. No final da Segunda Guerra Mundial, apenas quatro países eram independentes na África: Libéria, Etiópia, Egito e União Sul‑Africana. O período de maior descolonização na África ocorreu entre 1957 e 1975. Em muitos casos, o processo de independência transcorre sem guerras. Porém, nações colonizadas, como Argélia (pela França), República Democrática do Congo (Bélgica) e Angola (Portugal), enfrentam guerras duríssimas para conquistar a autonomia. Saiba mais Você sabia que um médico congolês foi candidato ao Prêmio Nobel da Paz em 2013? Para saber mais, leia: CONGOLÊS recebe Prêmio de Coragem Civil por cuidar de vítimas da violência sexual. Por Dentro da África, 16 out. 2013. Disponível em: <http://www.pordentrodaafrica.com/ciencia/medico‑recebe‑premio‑ de‑coragem‑civi l‑por‑cuidar‑de‑vit imas‑da‑violencia‑sexual ‑na‑republica‑democratica‑do‑congo>. Acesso em: 14 nov. 2014. Contudo, as sequelas da colonização vão além do redirecionamento da economia para a exploração colonial. Uma das questões mais nevrálgicas e que mais têm ressonância até os dias de hoje nos processos sociais, econômicos e, sobretudo, geopolíticos africanos diz respeito ao fato de a colonização ter criado fronteiras geográficas totalmente artificiais de repartição do território. O traçado foi feito sem levar em conta as diferenças étnicas, culturais ou linguísticas desses povos, colocando‑os dentro de um mesmo território. Com a independência dessas colônias e a manutenção dessas fronteiras, sérios problemas surgiram em decorrência desse fato, levando os diferentes grupos a disputas pelo poder, a conflitos civis e a separatismos. Divisão étnica Divisão política Figura 81 – Fronteiras étnicas e políticas da África pós‑colonização europeia 174 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III Até hoje se fazem sentir as consequências desse processo de desmembramento do território. Persistem conflitos e rivalidades étnicas decorrentes desse processo histórico desastroso. Observação Na visão do africanista Samir Amin, não se deve usar a expressão tribo para designar os grupos étnicos africanos. Ele recomenda que se use o termo povos em seu lugar. Samir diz que o que existe na África são povos com línguas, religiões e histórias bem diferentes. Ele explica: “Não utilizo o termo tribo, não faz sentido: os haussás são da ordem dos quarenta milhões, não vejo por que eles seriam uma tribo, enquanto os islandeses, que são duzentos mil, seriam um povo [...]” (AMIN, [s.d.], p. 64). As fronteiras artificiais criadas no contexto do colonialismo, após os processos de independência, fizeram da África um continente marcado por guerras civis, golpes de Estado e conflitos étnicos e religiosos. Do ponto de vista socioeconômico, embora independentes, esses países tiveram sua economia bastante prejudicada pelo processo de colonização e, atualmente, sofrem uma forte dominação econômica. A emancipação política vinda com o processo de descolonização e independência política não foi suficiente para que as novas nações superassem a pobreza e os problemas sociais dos países em desenvolvimento. De um modo geral, houve intensa desestruturação do sistema produtivo das ex‑colônias. O cenário político, em contrapartida, é dominado por violentas disputas pelo poder, golpes de Estado e ditaduras sangrentas. Saiba mais Assista aos seguintes filmes: DIAMANTE de sangue. Direção: Edward Zwick. Produção: Marshall Herskovitz, Graham King, Paula Weinstein e Edward Zwick. EUA; Alemanha: Warner Bros, 2006. 1 DVD (143 min). HOTEL Ruanda. Direção: Terry George. Produção: Terry George e Keir Pearson. Reino Unido; Itália; África do Sul; EUA: United Artists, 2004. 1 DVD (121 min). O filme Diamante de Sangue (2006) mostra a guerra civil em Serra Leoa (1991‑2001), e o filme Hotel Ruanda (2004) denuncia o genocídio dos tutsis pela etnia rival, os hutus, em Ruanda, em 1994.. 175 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia 7.2.2 As duas Áfricas O continente africano abriga duas sub‑regiões claramente delimitadas: a África Setentrional e a Subsaariana. O limite natural entre ambas é o Deserto do Saara. Os seis países da África Setentrional têm características físicas e humanas semelhantes às das nações do Oriente Médio. Seu clima é desértico, e a região, majoritariamente ocupada, desde o século VII, por povos árabes, que difundiram o islamismo, bem como a língua e a cultura árabes. Mas também existem ali mouros, berberes e tuaregues. Ali, os chamados “brancos” são, na verdade, morenos. A porção mais ocidental dessa região, conhecida pelo nome de Magreb (que significa poente, em árabe), compreende o Marrocos, a Argélia e a Tunísia. Os outros três países são Líbia, Egito e Djibuti. A África Negra ou Subsaariana é constituída por 34 países – em média com 50 anos de autonomia. A África Subsaariana, bem mais extensa, reúne a maioria da população, predominantemente negra. Essa região concentra alguns dos principais problemas econômicos e sociais do planeta. A populaçãoafricana é estimada em 1 bilhão de habitantes, distribuindo‑se irregularmente pelos quase 30 milhões de quilômetros quadrados de superfície do continente. Representa aproximadamente 15% da população mundial, como se vê no gráfico a seguir. Ásia 60,2 Europa 10,8 Oceania 0,5 África 15 América 13,5 População – 2011 (em %) Total mundial: 7 bilhões de habitantes Figura 82 – Distribuição da população mundial pelos continentes 176 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III A densidade demográfica geral é de 33 hab./km2, mas, observando no mapa a seguir, verificamos variações regionais. As áreas mais povoadas (zonas vermelhas do mapa) localizam‑se no Baixo Nilo, onde encontramos as cidades do Cairo e de Alexandria, que se destacam entre as mais populosas da África; no Magreb Setentrional ou África Menor (porção mediterrânea do Marrocos, Argélia e Tunísia); e nas proximidades do Golfo da Guiné, antiga Biafra, onde se localiza a cidade de Lagos, maior metrópole africana. Na África do Sul, as regiões de Cabo e Durban apresentam densidades elevadas por constituírem importantes centros industriais do continente. As menores densidades aparecem em áreas desérticas do Saara e do Kalahari e da floresta equatorial congolesa. Mar Mediterrâneo Oceâno Atlântico Menos de 10 de 10 a 100 Mais de 100 Hab./km2 Oceâno Índico Figura 83 – Densidades demográficas da África A África sempre apresentou altas taxas de crescimento vegetativo, e o crescimento populacional ficava em torno de 4% ao ano em diversos países da área subsaariana (populações negras), fato que se repetia na África Branca muçulmana. Contudo, nos anos 1990, a taxa de crescimento começou a declinar em razão de vários fatores que aumentaram a mortalidade da população. A comparação com as taxas médias de natalidade por continente dá ideia de quanto a natalidade africana é alta: 36/00 habitantes, o dobro da asiática (18/00 habitantes) e quase quatro vezes maior que a da Europa (cerca de 10/00 habitantes). 177 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia 50 40 30 20 10 0 África 36,1 América 17,6 Ásia 18,8 Europa 10,5 Oceania 17,1 Natalidade – 2011 (por mil habitantes) Figura 84 – Taxas de natalidade nos continentes (2011) A expectativa de vida média dos africanos está entre as mais baixas do mundo, como é o caso das nações da costa ocidental, como Serra Leoa, onde os indivíduos não esperam sobreviver além dos 38 anos. Não por acaso, no ranking do IDH, calculado pela ONU, todos os 22 países que têm IDH considerado baixo são da África Subsaariana. Dois indicadores sociais muito significativos são as taxas de mortalidade e de desnutrição. Atestam as péssimas condições sociais do continente. Mais da metade dos países africanos apresenta taxas de subnutrição de 35% na população, fato que denota condições de vida miseráveis. Taxa de mortalidade muito alta Taxa de mortalidade alta Taxa de mortalidade média Taxa de mortalidade baixa Sem dados Figura 85 – Quadro da mortalidade mundial Na África está a maior concentração de países com altos índices de desnutrição. Na Ásia e na América Latina, a situação é melhor; já nos países desenvolvidos, há pouca subnutrição, mas a obesidade está se tornando um grande problema de saúde. 178 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III Porcentagem de subnutridos 35 ou mais 20 a 34 5 a 19 2,5 a 4 Menos de 2,5 Dados não disponíveis Figura 86 – Subnutrição no mundo A mortalidade geral alta, por sua vez, é gerada por uma mortalidade alta na infância, em virtude da desnutrição associada às péssimas condições sanitárias. A incidência da aids é responsável por pelo menos 1 milhão de mortos anualmente desde 1998 e faz a expectativa de vida diminuir cerca de trinta anos nos países mais afetados, como Botsuana, Lesoto, Suazilândia e Zimbábue. A malária também é endêmica, e, em 2012, cerca de 560 mil africanos morreram em decorrência da doença, o que representa 90% dos óbitos mundiais. A região também apresenta a maior quantidade mundial de casos de sarampo, poliomielite e cólera, e atualmente é vítima do pior surto de ebola da história. No primeiro semestre de 2014, 470 pessoas morreram contaminadas pelo vírus ebola, na Região Oeste. Dos 33,2 milhões de portadores do vírus HIV no mundo em 2007, 22,5 milhões eram da África Subsaariana – quase 68% do total. Em outras palavras, de cada dez pessoas que têm aids, sete vivem nessa região. 42 milhões 45 45 45 45 25 20 15 0 34 milhões 1980 Total no mundo Na África 2009 Figura 87 – Prevalência de aids 179 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia 7.2.3 Economia A economia africana é pautada basicamente nas riquezas minerais e nas atividades agropecuárias. 7.2.3.1 Riquezas minerais Como vimos, a região da África Subsaariana é uma das áreas mais pobres do planeta. São 48 países cujo somatório do PIB, em 2013, foi de cerca de US$ 1,56 trilhão. Para se ter uma ideia, este valor é inferior ao do PIB brasileiro do mesmo período e corresponde a 2,1% do PIB mundial. Grande parte da riqueza do continente africano decorre de seu subsolo. A presença de estrutura geológica cristalina antiga proporciona grande riqueza mineral. Por isso, a mineração é uma das principais atividades econômicas do continente africano, sendo a base econômica da maior parte dos países. O petróleo destaca‑se dentre os minérios. São extraídos dos poços africanos cerca de 8% do petróleo mundial (mais de 130 bilhões de barris). Os dois maiores produtores são Nigéria e Angola, e a exportação desse recurso gera mais de 90% das receitas desses países. Os depósitos de óleo e gás localizam‑se principalmente no norte do continente (África Setentrional) e nas nações do Golfo. Os maiores produtores regionais são Nigéria, Líbia, Argélia e Angola, membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). A nova onda de exploração de minérios raros e petróleo tem gerado crescimento econômico. O PIB da África Subsaariana cresceu a uma taxa média de 4,5% ao ano entre 1995 e 2013. Em alguns países, como Serra Leoa, Chade, Moçambique e Sudão do Sul, esse crescimento deve superar 8% ao ano. O investimento estrangeiro na África atingiu USS 43 bilhões em 2013. Os principais interessados em investir no continente são EUA, Índia, China, Brasil e alguns países da Europa, tendo em vista não só o petróleo, mas também o rico conjunto de minérios da região. Associados ao petróleo, outros minérios estratégicos fazem da África um território cobiçado por países dependentes de matérias‑primas, como a China e os EUA. Dentre os produtos de destaque, temos: ouro (África do Sul, Gana, Congo, Botsuana e Gabão); diamante (Congo, África do Sul, Gana e Botsuana); manganês (África do Sul, Gabão, Gana, Nigéria e Congo); urânio (África do Sul, Namíbia e Nigéria); bauxita (Guiné e África do Sul); fosfato (Marrocos, Gabão e Togo); cobre (Zâmbia, Congo e África do Sul); vanádio (África do Sul, Namíbia e Zâmbia); ferro (África do Sul, Gabão e Nigéria) e cromo (África do Sul e Zimbábue). Em geral, os países investidores desenvolvem projetos de infraestrutura para a mineração, a extração de petróleo e gás natural e a construção de hidrelétricas e oleodutos (incluindo um oleoduto de 1,5 mil quilômetros no Sudão). O comércio africano com a China cresce vertiginosamente. Este paísé hoje o maior parceiro comercial do continente, superando os EUA desde 2009. Os EUA pretendem diminuir seu grau de dependência de petróleo da África, responsável por nada menos que 15% do petróleo consumido pelos norte‑americanos. 180 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III O Brasil também se torna um grande parceiro comercial da África por meio de empresas nacionais, como a Vale, a Petrobras e as construtoras Odebrecht e Camargo Corrêa. Por parte do governo, para facilitar a aproximação, pensou‑se em renegociar a dívida externa de alguns países do continente com o Brasil e dar apoio técnico e científico em agricultura e saúde. 7.2.3.2 A indústria Somente dois países africanos têm destaque na área industrial: África do Sul e Egito. A atividade industrial na África é muito recente e enfrenta sérios problemas: possui grandes reservas minerais, mas não dispõe de capital para a exploração; tem um dos maiores potenciais hidrelétricos do mundo, mas com pequena potência instalada; as deficiências nas redes de transporte dificultam a utilização dos recursos naturais; a falta de mão de obra especializada e o baixo poder aquisitivo da população são problemas que os programas de industrialização têm de enfrentar. Diversos países possuem atividades industriais concentradas na produção de tecidos, nas indústrias de transformação, no refino de petróleo, dentre outros. A República da África do Sul é o país mais industrializado do continente africano, concentrando, principalmente, indústrias pesadas, como metalúrgicas, siderúrgicas, químicas, têxteis, de montagem de automóveis e de equipamentos, de mineração e de construção naval. O Egito é o segundo país industrial da África. Produz artigos têxteis, alimentícios, químicos e petroquímicos. As indústrias africanas estão centralizadas nas regiões do Cabo (África do Sul) e de Alexandria (Egito). O turismo tem‑se tornado importante fonte de divisas no setor industrial do Quênia (Parque Nacional de Nairóbi) e em Gâmbia. 7.2.3.3 Pecuária Atividade de pouco rendimento no continente africano, em virtude da pobreza das pastagens, dos animais ferozes de certas regiões e da mosca tsé‑tsé. Nas estepes norte‑africanas predominam os grupos de pastores nômades, com seus rebanhos de ovelhas, camelos, cabras e dromedários. Nas encostas de montanhas, pratica‑se o pastoreio de cabras e ovelhas. Na África Central, apesar de prejudicada pela doença do sono, nas áreas mais secas da savana e nos planaltos orientais, os negros criam gado da raça zebu como uma atividade de subsistência. 181 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia 7.2.3.4 Agricultura Tubérculos e plantação de banana Milhete ou sorgo Trigo, frutas cítricas e uva Trigo e cevada MilhoM A P C X O Arroz Palmeiras oleaginosas Cacau e café Algodão Criação extensiva Região onde o problema da fome é particularmente grave Figura 88 – Principais produtos agrícolas No Norte da África, na região dos oásis do deserto ou na região mediterrânea, as populações sedentárias desenvolvem a tradicional agricultura de regadio (tamareiras, cereais, legumes, forragens) em áreas de planícies. Nas encostas de montanhas, cultivam‑se os produtos típicos da agricultura mediterrânea – vinhedos, oliveiras, figueiras, amendoeiras, hortaliças e algumas cítricas. Destaca‑se também nessa região o algodão, principalmente na Tunísia, na Argélia e no Egito. Na África Central, o Congo e o Gabão apresentam grandes destaques na exploração madeireira, de seringueira e de dendê. De um modo geral, a maior parte da população é de agricultores, que praticam uma agricultura extensiva de subsistência, geralmente, utilizando técnicas rústicas de cultivo, como a queimada para limpeza do terreno e início de novas culturas temporárias, resultando em esgotamento do solo e deslocamento para outras áreas. Na zona tropical há culturas de cereais (milho, sorgo ou oleaginosas e amendoim), mas também são importantes as culturas de banana e dendê, enquanto na zona equatorial são destaques os tubérculos (inhame e mandioca). Embora a maioria das áreas seja destinada à agricultura de subsistência, podemos observar o sistema de plantation (monocultura para a exportação), principalmente, na porção ocidental do continente. Os principais produtos cultivados são: cacau (Gana, Nigéria e Costa do Marfim); algodão (Egito, Sudão, Uganda e Senegal); café (Costa do Marfim, Uganda, Etiópia, Madagascar e República de Camarões); e amendoim (Nigéria e Senegal). 182 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III 7.3 Geografia cultural africana: a religião, a experiência do sagrado e a arte O continente africano apresenta o perfil religioso exposto na tabela a seguir. Tabela 11 – Distribuição das religiões africanas segundo a região geográfica (em %) Cristianismo Islamismo Religiões tradicionais Demais religiões Total 2006 2010 2006 2010 2006 2010 2006 2010 2006 2010 África Central 81,3 82,5 9,6 9,7 8,0 6,7 1,1 1,1 100 100 África Oriental 63,9 66,0 21,8 21,9 13,1 10,9 1,2 1,2 100 100 Norte da África 9,0 8 87,6 89,1 2,2 2,1 1,2 0,8 100 100 África Austral 82,0 82,4 2,2 1,5 9,7 7,9 6,1 8,1 100 100 África Ocidental 35,7 36,5 48,1 51,0 15,7 12,1 0,5 0,4 100 100 A maioria dos africanos pratica a religião cristã; em segundo lugar vêm os adeptos do Islã, e, em menor proporção, aqueles que praticam as religiões tradicionais. Existe, no entanto, importante variação regional das distribuições. Na África Austral (países do sul do continente) e nas porções centrais e orientais do continente, predominam os cristãos, respectivamente, com 82,4%, 82,5% e 66% dos praticantes. Em contrapartida, os adeptos do Islã são maioria na porção norte do continente (89,1%) e também na África Ocidental (51%), sobretudo, na Costa do Marfim, no norte de Gana e no sudoeste e no norte da Nigéria. Também se concentram os muçulmanos no nordeste da África e ao longo da costa da África Oriental. O Islã, assim como a religião cristã, assume características próprias na África porque costuma haver um sincretismo entre estas religiões e as religiões tradicionais. São formas mescladas com crenças ancestrais dos povos mais antigos que a tradição preservou. O sincretismo típico das religiões africanas, no entanto, costuma gerar conflito apenas na região da Arábia Saudita, cujos representantes mais ortodoxos islãos são menos favoráveis a esse fenômeno. As expansões islâmicas ocorreram durante o processo expansionista árabe iniciado no século VII, a partir da unificação dos povos da Península Arábica, com a disseminação do islamismo. Com o expansionismo, os muçulmanos conquistaram, além do Oriente Próximo, a Península Arábica, a Península da Anatólia, a Mesopotâmia, o norte da África, a costa do Índico Setentrional Africano e a Península Ibérica. As religiões tradicionais africanas são também denominadas religiões étnicas. Representam práticas e rituais trazidos pela tradição há séculos. São pouco representativas no norte da África, concentrando adeptos nas porções orientais e ocidentais do continente. Sobre este aspecto, vale observar que, entre 2006 e 2010 (Tabela 11), as religiões tradicionais perderam proporção de adeptos em três regiões. Na África Oriental, perderam cerca de 2% dos adeptos, diminuindo de 13,1% em 2006 para 10,9% em 2010, redução 183 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia que sedeu paralelamente ao incremento dos cristãos em cerca de 2% (de 63,9% em 2006 para 66% em 2010) na região. A diminuição proporcional de 2% dos praticantes das religiões tradicionais também é observada na região da África Austral. Por sua vez, na porção ocidental do continente, observou‑se a maior variação proporcional. Desta vez, é claro que a perda de adeptos das religiões tradicionais de 15,7% em 2006 para 12,1% em 2010 provavelmente tenha ocorrido pelo aumento das conversões ao islamismo, dado que houve aumento da proporção de 48,1%, em 2006, para 51%, em 2010. Lembrete Islã, islamismo ou maometismo é a religião sistematizada pelo profeta Muhammad (Maomé) e que prega a subserviência ao deus único, Alá. Fetichismo ou animismo é a religião que considera todos os seres da natureza dotados de vida e capazes de agir conforme uma finalidade. Cristianismo e judaísmo são religiões que têm origem no Velho Testamento. A diferença básica entre as duas é que os cristãos celebram a vinda de Cristo (Novo Testamento), enquanto os judeus aguardam a vinda de um messias. Mesmo hoje, quando a adesão à religião tradicional é tão pequena, pode‑se dizer que a importância desses valores é grande, porque o cristianismo e o islamismo, religiões de maior prevalência na África, assumem formas sincréticas claramente mescladas com as da religião tradicional. Segundo Roger Bastide (1968), analisar a cultura africana segundo o método estrutural da experiência do sagrado das religiões tradicionais tem papel revelador. Por isso, um dos objetivos deste tópico é compreender, via análise da arte e da religião africanas, o aspecto fundamental da cultura africana enquanto uma cultura denominada material. Elucidar o significado da expressão cultura material nos dá a porta de entrada para compreendermos desde o estilo da arte africana até o modo pelo qual os processos sociais se desenvolvem no meio africano. Dada a vasta produção técnica, estilística e ontológica de centenas de sociedades, reinos e culturas da África tradicional, a expressão arte africana parece redutora. No entanto, é melhor do que outras que se usavam anteriormente, como arte primitiva ou arte selvagem, que espelhavam um preconceito de, antes de um exame mais cuidadoso, considerar essa cultura pouco evoluída ou muito simplória (SALUM, 2004, p. 1). O objetivo deste texto é mostrar que, para além do estilo ou dos objetivos da arte africana, que, no seio das religiões tradicionais, prestava‑se a ornamentar rituais e sacrifícios selvagens, trata‑se de uma arte extremamente viva cuja elucidação revela a riqueza da cultura dos povos que a produzem. O grande diferencial da arte africana é sua característica de vitalidade. Por isso, a simples observação dos objetos como peças isoladas, tal como se encontram nos museus, não oferece nenhuma chave de leitura do seu significado profundo. Então, antes de tudo, é preciso levar em conta que: 184 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III [...] exposição nenhuma jamais poderia recuperar a força das rochas, fontes e matas que abrigavam estátuas, nem o ambiente dos palácios, templos, altares em que se situavam. Formavam conjunto com outras peças e seu entorno: eram arquiteturais e espaciais, porém muitas não podiam ser tocadas, nem ao menos vistas. E daí tirarmos: nem toda produção plástica da África era visual (SALUM, 2004, p. 1). Note‑se que Salum (2004) defende que nem toda arte africana é visual no que se refere a ter sido feita para ser vista por todos. O curioso é que se hoje esses objetos estão espalhados em muitos museus pelo mundo e, portanto, colocam‑se como objetos para serem vistos, originalmente, os rituais em que eles se encaixavam eram reservados a poucos, ou seja, eram apenas os iniciados e os sacerdotes que tinham acesso aos mistérios veiculados nos rituais onde esses objetos circulavam, pois parte das esculturas antropomórficas representa uma “presentificação” dos ancestrais fundadores e podia ser vista somente por poucos iniciados nos mistérios. Escribas e arqueólogos descobriram peças antigas, muitas do século V a.C., que remetiam à mesma identidade ritualística, bem como aos mesmos padrões e texturas que se reproduziam nas joias, na tecelagem, na arte corporal e na arquitetura, ou seja, compunham um conjunto de objetos que integravam o mesmo evento, cada qual cumprindo uma função, daí se falar também que a arte africana é uma arte funcional. Os antropólogos dizem que a África tem uma cultura material e que sua arte reflete esta característica. Isto significa que os objetos que a compõem pertencem ao uso cotidiano dos povos e não foram feitos com intenção apenas de ser contemplados como expressão artística. Em outras palavras, a arte está profundamente ligada à materialidade das formas de vida, e como as formas de vida africanas das sociedades tradicionais eram profundamente ligadas à natureza, essa arte apresenta também a relação íntima entre cultura e natureza. Salum (2004, p. 2) argumenta que o destaque ou a ênfase que nós costumamos dar ao fato de a cultura africana ser extremamente ligada à natureza revela muito sobre a nossa cultura ocidental contemporânea. O estranhamento em torno da questão revela o distanciamento das nossas formas de vida atuais em relação à natureza. A autora chega a afirmar que a própria denominação de que a cultura africana seja um exemplo de cultura material é acrítica, como se esta forma de pensar mantivesse ali explícita a ideia meio absurda de que a relação tão direta de uma cultura com a natureza fosse algo “antinatural”. Na verdade, a diferença entre as culturas é muito mais profunda, ou melhor, trata‑se de uma diferença radical, considerando que estas culturas se organizam por formas diferentes de racionalidade. Não se trata de diferença qualitativa entre dois pensamentos, nem de juízos de valoração diferentes sobre as mesmas questões, mas de matrizes culturais que geram questões distintas. A arte africana está inserida no contexto da religiosidade, é desenvolvida como ornamento na relação do homem com os mistérios, com o sagrado, e as formas das religiões tradicionais africanas incluem sempre a experiência corporal e a expressão deste corpo com outros elementos da natureza. O que não é exatamente de se espantar, porque toda experiência do sagrado, em suas origens, é uma 185 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia experiência corporal. Inclusive, o cristianismo assim o era em suas origens, conforme nos lembra Roger Bastide (1968, p. 6). Outra diferença fundamental é que a civilização africana tradicional (anterior à sua ocidentalização) se expressava por meio de símbolos, e a ocidental, por meio de sinais linguísticos, ou seja, da língua escrita. Estes “são caminhos diametralmente opostos” (BASTIDE, 1968, p. 7). No esquema simbólico, não é a palavra que significa os objetos, mas sim os próprios objetos da natureza que se remetem uns aos outros para construir uma cadeia de significados. Os objetos do mundo, nesse contexto, passam a ser as palavras, que compõem um tipo de linguagem. Originalmente, a religião ocidental cristã também apresentava uma relação corpórea com os sacramentos, mas, pouco a pouco, eles foram se tornando palavras celebradas pelo sacerdote das quais se participa em significado: Os sacramentos da igreja católica, entre muitos católicos modernos [do século XVII], vão perdendo seus valores ontológicos para se tornarem simples sinais de participação. São raros os católicos que sabem que são o marido e a mulher que realizam o “sacramento” do matrimônio, e não o padre que os abençoa, e é pelo ato sexual que unificam seus corpos:é, no entanto, a partir dessa experiência, se ela fosse vivida, que seria fácil à etnologia católica compreender a sexualidade africana como uma forma de liturgia ou de pensamento “sacramental” (BASTIDE, 1968, p. 8). É nesse sentido que a colonização trouxe às sociedades africanas tradicionais uma mudança brusca de mentalidade: substituiu uma visão simbólica do mundo por uma visão linguística. Além do mais, uma sociedade não cristã não é marcada necessariamente por uma visão dualista de mundo; logo, os mortos não habitam outro mundo diferente do nosso, mas compartilham do mesmo, por meio dos sonhos, das memórias, dos rituais sagrados ou até da crença na reencarnação. Desse modo, a morte não simboliza o contrário da vida, mas está dentro desta, pertence ao fenômeno da vida, existem um culto e um diálogo com os ancestrais. Sobre a questão dos ancestrais, vale destacar que este é um dos aspectos que dão unidade aos povos da África tradicional. O indivíduo torna‑se um, ou seja, é considerado um indivíduo justamente porque ele compõe com os outros uma linhagem, porque tem um ascendente. Da mesma forma, quem vai lhe garantir a finalidade e a memória de sua existência é o seu descendente. Daí a profusão de imagens antropomórficas esculpidas a que se chama de ancestrais. Mas, diferentemente da arte ocidental, que é, por essência, uma arte representativa (ou seja, as formas tendem a representar algo existente no plano do real ou do imaginário), a arte tradicional africana é simbólica; as estátuas dos ancestrais não buscam mimetizar algum antepassado específico, mas simbolizam sua figura. Nesse sentido, muitos elementos simbólicos veiculam os valores de longevidade e da vitalidade e podem ser vistos expressados graficamente nas decorações de superfície de esculturas, na tecelagem e no trançado, bem como na própria arquitetura, por meio de figuras geométricas (zigue‑zagues, linhas onduladas, espirais – contínuas e infinitas) e de figuras zoomorfas (cobras, lagartos, tartarugas). 186 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III Figura 89 – Pintura de rosto – povo Nuba (Sudão, África) Quanto às matérias‑primas e ao uso dos materiais, Salum (2005, p. 3‑5) faz as seguintes observações: • As matérias‑primas utilizadas nas peças informam muito sobre sua procedência. A madeira era muito usada nas regiões de floresta, e a estatuária de madeira também está concentrada na chamada África Ocidental e na África Central, regiões onde predominavam as florestas equatorial e tropical. O marfim, tradicionalmente usado, foi muito valorizado, desde o Renascimento europeu, ligado ao comércio e ao turismo. • Outras artes, como cerâmica, cestaria e adornos corporais, eram feitas tradicionalmente por todas as sociedades, respondendo às necessidades cotidianas e rituais; podemos destacar algumas em que essas técnicas eram mais usadas do que a escultura, de acordo com o modelo de organização social e as formas de expressão estética. Nesses casos, os recursos gráficos eram mais aplicados do que os recursos representativos da escultura. Aqui podem ser compreendidos, particularmente, os produtos de sociedades situadas em regiões semiáridas, que, na busca periódica de novos territórios, não podiam transportar com facilidade bens móveis de grande porte. • Como a vida cultural é essencialmente ritualizada, o mundo material e o espiritual são concebidos juntos, com divindades que representam também forças da natureza. Os candomblés brasileiros conservam formas de culto muito próximas às de cultos tradicionais da África Ocidental, adotando emblemas, nomes e outras características de suas divindades. O caráter cósmico dessas religiões, e seu traço comum, é que seus deuses remetem às forças da natureza, pois é característica fundamental destas religiões que a experiência do sagrado remeta diretamente à participação do homem com os demais componentes do cosmo, os outros animais, os vegetais, os minerais, os mares, os ventos, as forças da vida, enfim. 187 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia As artes plásticas da África são uma série de produtos: esculpidos, fundidos, modelados, pintados, trançados, tecidos etc. Cada estilo ou grupo de estilos corresponde a um reino, região ou aldeia. Além disso, cada objeto é apenas uma parte da manifestação estética a que pertence, constituída por um conjunto de atitudes (gestos, palavras), danças e músicas. Isso pode determinar as diferenças entre a arte de um grupo e de outro, tendo‑se em vista também o lugar e a época. É possível encontrarmos na arte africana alguns elementos de aproximação com os de correntes da arte ocidental, do naturalismo ao abstracionismo. Esses elementos permitiram a artistas, como Picasso, revolucionar a arte ocidental, ainda que a ideia de cubismo seja uma invenção intelectual dos europeus que nada tem a ver com a intenção dos africanos. Ainda que qualquer tentativa de classificar esse tipo de arte esbarre em dificuldades, podemos observar que algumas produções são mais realistas ou mais geométricas. Salum (2005, p. 5) informa que o realismo ocorre com frequência nas estátuas, talvez por seu caráter representativo (de uma figura humana, de uma imagem onírica ou de um antepassado), enquanto o geometrismo aparece muito nas máscaras, principalmente, naquelas que representam espíritos e seres sobrenaturais. Os oleiros marroquinos são, na sua maioria, analfabetos; por isso, em vez de copiarem textos do Corão, simulam a caligrafia corânica. A tribo Ekoi da Nigéria utilizava os mesmos padrões, quer na olaria, quer nos artísticos penteados tradicionais A cor tradicional dos potes zulu é o preto. Uma decorativa tampa feita com erva mantém o conteúdo fresco e sem insetos. Figura 90 – Alguns padrões de arte africana 188 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III Saiba mais O Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da Universidade de São Paulo disponibiliza no site <www.arteafricana.usp.br> uma lista de portais de interesse para quem quer conhecer coleções de peças e fotos de importante valor histórico‑documental que integram acervos acessíveis na Internet. Veja a lista de museus: Linha do tempo da história da arte no continente africano de 8.000 a.C. à atualidade, Museu Metropolitano, Nova Iorque: <http://www.metmuseum.org>. Museu Etnológico de Berlim: <http://www.smb.spk‑berlin.de/mv/afrika>. Museu Real da África Central, Tervuren: <http://www.africamuseum.be>. Museu Nacional de Arte Africana, Washington: <http://www.nmafa.si.edu>. Arquivos fotográficos Elliot Elisofon: <http://www.sirismm.si.edu>. Museu Britânico, Londres: <http://www.thebritishmuseum.ac.uk>. Museu Nacional Pré‑histórico Etnográfico Luizi Pigorini, Roma: <http:// www.pigorini.arti.beniculturali.it>. Recitos de viajantes sobre a África – Base de dados Gallica: <http:// gallica. bnf.fr/ voyagesEnAfrique>. Museu Africano de Berg em Dal: <http://www.afrikamuseum.nl>. Museu Histórico de Abomey: <http://www.epa‑prema.net/abomeyGB>. Museus da África na Internet: <http://www.icom.museum/vlmp/africa.html>. Museu Afro‑brasileiro, Salvador: <http://www.ceao.ufba.br/mafro>. Fototeca África da Fundação Pierre Verger: <http://www.pierreverger. org/br/photos/>. Casa das Áfricas: <http://www.casadasafricas.org,br>. Museu Nacional de Belas Artes: <http://www.mnba.gov.br>. 189 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e ÁsiaPara Bastide (1968, p. 11), enquanto os africanos se mantêm ligados ao mundo no entendimento profundo de que são partes da criação deste conjunto, ou seja, permanecem em “casamento espiritual” com o mundo, o ocidental dele se afasta por meio da linguagem da representação. O diálogo do homem, neste caso, não é mais com o mundo, mas com as palavras, as representações do mundo. Ao transformarmos os objetos em pensamento dos objetos, nós nos distanciamos deles, e mais, “destruímos” os objetos materiais para concebê‑los como conceitos, imagens etc. Substituímos nossa relação com o sagrado do mundo por um discurso sobre o sagrado; em vez de participarmos do mistério do mundo, pensamos sobre o mistério do mundo. “Já as civilizações africanas conhecem e cultivam o transe, como participação do homem com o sagrado, com o mundo dos mortos, com o mundo das forças cósmicas, mundo dos deuses que controlam ou regem essas forças cósmicas” (BASTIDE, 1968, p. 12). Vimos, portanto, que, para discutir a questão da cultura africana tradicional, é necessário deslocar o olhar para além da nossa cultura. Esse esforço é necessário, mas não é totalmente possível porque, por mais que tentemos nos libertar dos nossos valores para tentar refletir sobre a cultura do outro, nosso próprio pensamento em si já está moldado por um modo de olhar e conhecer da nossa cultura. Desse modo, podemos afirmar que, “se o modo de produção dominante de uma sociedade pode dizer muito sobre a vida dessa sociedade, certamente não comporta explicações de todas as dimensões de como os homens constituem suas vidas e modelam suas existências” (SALUM, 2005, p. 2). Na verdade, a questão maior é que habita em nosso imaginário ocidental sem mais questionamentos a ideia de que a África acolhia (e ainda acolhe) uma sociedade culturalmente atrasada. Tal fato era verdade não questionada até o início do século XX. Tal crença era, aliás, muito oportuna para justificar a exploração econômica dos recursos naturais e humanos da região durante séculos. Segundo o historiador John Fage (1982), essa mentalidade resultava, sobretudo, da junção de correntes de pensamento oriundas do Renascimento, do Iluminismo e da crescente revolução científica e industrial. Nesse contexto, não foi difícil convencer os europeus de que os objetivos, os conhecimentos e a cultura da civilização europeia deveriam prevalecer como horizonte de valor a ser alcançado pelas demais civilizações. O filósofo Hegel (1770‑1831) definiu explicitamente essa posição em sua obra Filosofia da História: A África não é um continente histórico; ela não demonstra nem mudança nem desenvolvimento. [Os povos negros] são incapazes de se desenvolver e de receber uma educação. Eles sempre foram tal como os vemos hoje (HEGEL, 1817‑1830 apud FAGE, 1982, p. 7‑8). Fage (1982) diz que, ironicamente, foi durante a vida de Hegel que os europeus lançaram os fundamentos de uma avaliação racional da história e das realizações das sociedades africanas. Essa exploração era ligada, em parte, à reação contra a escravidão e o tráfico de escravos, e, em parte, à competição pelos mercados africanos. Na época, muitos exploradores se lançaram ao continente africano para explorar as fontes da cultura negra africana. Curiosamente, assim como estes primeiros explorados constituem exemplos de viajantes‑pesquisadores que produziram interessante material historiográfico, os primeiros geógrafos das novas terras americanas também eram exploradores que partiam em busca de informações, aventuras e riquezas, obviamente, mas que produziram os primeiros mapas e croquis, além das 190 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III primeiras descrições das paisagens das novas terras, material muito valorizado posteriormente pelos historiadores da Geografia e da História. Estes estudiosos recolhiam todo o material que encontravam, como documentos escritos, e descreviam tradições orais e testemunhos que descobriam sobre os traços do passado. “A literatura produzida pelos exploradores é imensa. Alguns desses trabalhos contêm história no melhor sentido do termo, e, em sua totalidade, tal literatura constitui um material de grande valor para os historiadores” (FAGE, 1982, p. 9). O fato é que essas investidas constituíam atitudes isoladas. Em geral, a ideia hegeliana não só impera, mas também ganha força. O historiador explica: Como essas tentativas [de exploração econômica e cultural] pareciam necessitar de uma justificativa moral, as considerações hegelianas foram reforçadas pela aplicação dos princípios de Darwin. O resultado sintomático disso tudo foi o aparecimento de uma nova ciência, a Antropologia, que é um método não histórico de estudar e avaliar as culturas e as sociedades dos povos “primitivos”, os que não possuíam “uma história digna de ser estudada”, aqueles que eram “inferiores” aos europeus e que podiam ser diferenciados destes pela pigmentação de sua pele (FAGE, 1982, p. 10). Os historiadores e arqueólogos mantinham certa reserva sobre as pesquisas na África, porque naquela época se postulava que a História deveria orientar‑se essencialmente pelas fontes escritas, as quais não estavam disponíveis na África Subsaariana. Tal quadro epistemológico mudaria com a valorização dos testemunhos orais para investigar o passado de um povo (FAGE, 1982, p. 12). Ademais, a partir de 1947, com a criação da Sociedade Africana de Cultura, intelectuais, desta vez, africanos, começam a definir seu próprio enfoque retrospectivo, lutando pela construção das fontes de uma identidade cultural negada pelo colonialismo. Saiba mais Existe uma obra monumental sobre a África? Um dos projetos editoriais mais importantes da Unesco nos últimos trinta anos, a coleção História Geral da África é um grande marco no processo de reconhecimento do patrimônio cultural da África, pois ela permite compreender o desenvolvimento histórico dos povos africanos e sua relação com outras civilizações a partir de uma visão panorâmica, diacrônica e objetiva, obtida de dentro do continente. O projeto envolveu especialistas de áreas como História, Antropologia, Arqueologia, Linguística, Botânica, Física, Jornalismo, dentre outros. Com quase 10 mil páginas, foi construída ao longo de trinta anos por 350 pesquisadores, coordenados por um comitê científico composto por 39 especialistas, dois terços deles africanos. 191 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia A obra está estruturada da seguinte forma: Volume I – Metodologia e Pré‑História da África. Volume II – África Antiga. Volume III – África do século VII ao XI. Volume IV – África do século XII ao XVI. Volume V – África do século XVI ao XVIII. Volume VI – África do século XIX à década de 1880. Volume VII – África sob dominação colonial, 1880‑1935. Volume VIII – África desde 1935. Consulte: KI‑ZERBO, J (Ed.). História Geral da África. Brasília: Unesco; Secad/ MEC; UFSCar, 2010. 8 vol. Disponível em: <http://www.unesco.org/new/ pt/brasilia/about‑this‑office/single‑view/news/general_history_of_africa_ collection_in_portuguese‑1/#.VGotMTTF_kU>. Acesso em: 17 nov. 2014. A concepção da cultura e das artes africanas impõe rever, portanto, duas ordens de questões fundamentais: a do modo da relação de uma sociedade com sua história e a compreensão dos modos pelos quais uma cultura se relaciona com a natureza (sua “cultura material”) que não necessariamente implica subjugá‑la tecnologicamente para operar a produção de determinados tipos de bens de consumo. Assim, podemos considerar que o fato de os povos daquela região não terem escrito sua história não quer dizer que não a tenham, nem que não atenham tido escrita. A história deles está “escrita” numa infinidade de objetos que estão plenos de mensagens codificadas por signos e símbolos que podem ser “traduzidos”, ou interpretados verbalmente, como é o caso de muitos objetos proverbiais. Por se tratar de sociedades com história cujo registro é oral, seus tempos históricos são marcados por eventos, não por datas, e os objetos trazem as marcas destes eventos, bem como seu lugar e instante. Os eventos podem ser de ordens diversas de importância e de extensão, podem ser eventos da natureza ou sociais. Vejamos alguns exemplos dados por Salum (2005, p. 4): a queda de um cometa célebre, uma enchente inusitada, fatos e feitos de determinado governo, deslocamentos das comunidades ou grandes correntes migratórias motivados por fatores culturais, naturais ou comerciais, assim como conquistas territoriais, dominação de povos, união de culturas de povos amigos etc. É bom notar também que se trata de objetos cuja origem remete a tempos bastante remotos, muito anteriores à conquista colonial da África pelos europeus nos séculos XIX e XX. Descobertas arqueológicas vêm demonstrando a procedência da espécie humana no continente africano, como o caso do exemplar mais antigo do Homo sapiens sapiens 192 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III descoberto no Quênia, datado de 130 mil anos atrás. Recentes pesquisas arqueológicas apontam para a região do Saara, na África, como um importante centro dessa manifestação da cultura pré‑histórica. Figura 91 – Pinturas pré‑históricas em cavernas Outro ponto importante que se refere à geografia cultural da África diz respeito diretamente à divisão do território que se deu durante o processo de colonização. O recorte do território colonial não condizia nem de longe com as fronteiras de centenas de grupos étnicos africanos, de forma que podemos dizer que esta questão geográfica foi uma das primeiras grandes violências que os povos africanos sofreram no seu processo histórico, como diz a autora: O mais agravante, porém, é que as linhas de divisa colonial foram de modo geral absorvidas na configuração dos países atuais, a partir de então com seus próprios governos. Mesmo assim, até hoje são países que lutam com dificuldade, tentando recuperar suas origens ancestrais, e prosseguir suas vidas dentro do quadro da globalização imposto mundialmente. As lutas civis e a presença de ditadores compactuados com potências estrangeiras na África atual refletem ainda os problemas que a exploração europeia e a ideologia do desenvolvimento causaram aos povos africanos (SALUM, 2005, p. 5). 193 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Regionalização do espaço Mundial: euRopa, ÁfRica e Ásia A sociedade ocidental entendida como civilização prometeica é aquela que instala uma distância entre o sujeito e o objeto, entre o homem e seu mundo, o cosmos. Então, é esta oposição hierárquica que se instala entre o homem e o mundo que faz com a natureza; a materialidade é algo passível de ser dominado. Neste ponto, o homem abandonou sua relação ancestral com as forças da natureza, pois o sujeito já se desligou da ordem cósmica ao se colocar “acima” dela, como quem a pensa ou a captura numa representação. Por isso o herói ocidental é aquele que conquista o território, submete o outro povo ao seu jugo, ao passo que o herói da sociedade tradicional, segundo Bastide (1968, p. 13‑4), é aquele que faz a intermediação com os deuses para ensinar ao homem a cultura e os modos de organização familiar, social e política. 8 África: a hiStOriciDaDe (cOLOniaLiSmO, neOcOLOniaLiSmO), OS cOnfLitOS e prObLemaS reGiOnaiS e a SituaçãO GeOpOLítica A África é um continente cuja história de dominação é muito recente. Nos próximos subtópicos, abordaremos os conflitos e problemas regionais, bem como a geopolítica desse continente. 8.1 África Setentrional O norte da África, por sua proximidade com a Europa, tem uma importância geopolítica. Nos subtópicos a seguir, estudaremos essa importância. 8.1.1 Importância estratégica da África Setentrional O que nós vamos estudar como África Setentrional (ou África do Norte) é o trecho do continente africano que se estende da Mauritânia, no extremo oeste, até o Egito, na porção leste, incluindo nações como Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia e Saara Ocidental. Como em todo o continente africano, o relevo é planáltico, sobressaindo‑se a Cadeia do Atlas, abrangendo Marrocos, Argélia e Tunísia. De formação recente, está sujeito a abalos sísmicos e possui altitudes superiores a 3.000 m. O clima da região é árido, com destaque especial para o Deserto do Saara, que se estende pelo interior da região. Caracterizada pelas elevadas temperaturas diurnas e pela baixíssima pluviosidade, é uma região de difícil circulação, mas que apresenta riquezas como o petróleo, intensamente explorado por Argélia, Líbia e Egito. A importância estratégica do norte da África está na sua proximidade com a Europa, o que lhe permite um contato constante com esse continente, ao mesmo tempo recebendo e exercendo influência. De fato, desde a Antiguidade, o norte africano foi uma área de incursão de povos como fenícios, gregos e romanos, que lá possuíam colônias. Diversos povos bárbaros, vindos da Europa ou do Leste, fizeram também suas incursões no território norte‑africano, mas, sem dúvida alguma, foram os árabes que, com o advento do islamismo (século VI), marcaram sobremaneira a região. Hoje em dia, podem‑se reconhecer dois grupos étnicos principais: os semitas brancos, muito semelhantes aos árabes do Oriente Médio, que, durante a expansão islâmica em direção ao sul da Europa, se estabeleceram no litoral, dedicando‑se ao comércio e à agricultura mediterrânea; e os camitas, que se estabeleceram no interior, no deserto, dedicando‑se ao pastoreio nômade. São eles: tuaregues, berberes, mouros etc. 194 Re vi sã o: Ju lia na - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 12 /1 2/ 20 14 Unidade III A economia regional baseia‑se no comércio, na agricultura e na exploração mineral. O petróleo ganha destaque na Líbia e na Argélia (que são membros da Opep), e os fosfatos são explorados no Marrocos. Analisaremos alguns fatos que merecem ser ressaltados na região. 8.1.1.1 Noroeste: o Magreb Definida como a região que engloba Marrocos, Argélia e Tunísia, tem por limite, ao norte, o Mar Mediterrâneo e a Cadeia do Atlas, e, ao sul, o Deserto do Saara. Por ser a área mais próxima da Europa, tornou‑se de interesse colonial, notadamente da França, que se estabeleceu na região no século XIX. A interferência francesa na região, principalmente na Argélia, rendeu um dos mais sangrentos conflitos do Pós‑guerra, juntamente com as guerras do Vietnã e da Coreia. Estabelecida no norte da Argélia desde 1830, a França não considerava o país uma colônia, mas uma extensão do território francês, tendo enviado para lá sucessivas levas de colonos. Esses franceses ocupavam as melhores terras da região, entrando em conflito com os habitantes locais. Isso fez surgir, na década de 1930, a Frente de Libertação Nacional (FLN), que, por meio de guerrilhas, lutava pela expulsão dos franceses. Num primeiro momento, o governo francês interferiu, enviando à Argélia cerca de 500 mil soldados para defender os colonos. Entre os próprios colonos, surgiu um movimento contraguerrilheiro conhecido como Organização do Exército Secreto (Organisation Armée Secrète – OAS), famoso por seus atos terroristas. Apesar de todo o esforço dos colonos, o governo francês resolveu ceder a independência à Argélia, o que resultou na evasão de mais de 1 milhão deles. O atual cenário político do país caracteriza‑se
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