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GESTÃO EMPREENDEDORA E INOVAÇÃO Marcia Maria da Graça Costa , 2 5 EMPREENDEDORISMO SUSTENTÁVEL A discussões sobre os impactos das atividades econômicas sobre o meio ambiente, e a sociedade como um todo, têm início na década de 1960, com os questionamentos acerca do modelo econômico vigente. Diversas comissões foram formadas e congressos mundiais foram realizados para refletir e discutir o tema, resultando na formação do conceito de desenvolvimento sustentável. Ele é entendido como o desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das futuras gerações de satisfazer as suas. Em outras palavras, o desenvolvimento sustentável é aquele que contribui para resolver os problemas atuais e a garantia da vida, com a proteção e manutenção dos sistemas naturais que a tornam possível (BORGES, 2014; RAUFFLET; BRES; FILION, 2014). Esse conceito de desenvolvimento sustentável articula o tripé social-econômico- ambiental, também chamado de triple bottom line. O objetivo é obter equilíbrio entre a rentabilidade financeira e o crescimento econômico com a justiça, o bem-estar social, a conservação ambiental e a utilização racional dos recursos naturais. A partir desse conceito, são discutidas novas formas de atuação e gestão das empresas, com vista a implementação de mudanças destinadas a converter organizações tradicionais em organizações sustentáveis (BORGES et. al., 2013). A sustentabilidade está na pauta dos diversos agentes sociais: consumidores, empresas, governos e organizações da sociedade civil discutem como integrar o crescimento e o desenvolvimento econômico às questões sociais e ambientais. É nesse contexto que o conceito da sustentabilidade surge como pilar para sustentação de negócios que articulam a obtenção de resultados econômicos à responsabilidade socioambiental. Diversos agentes sociais refletem e discutem políticas públicas, comportamentos e padrões de produção e consumo que equilibrem a busca pela lucratividade do capital e os impactos na sociedade e no meio ambiente. Assim sendo, o empreendedorismo, considerado o grande motor da inovação e do crescimento, enfrenta o desafio de , 3 gerar inovações que equilibrem as relações entre crescimento econômico e a responsabilidade social e ambiental. Assim, a conscientização dos empreendedores acerca da importância da sustentabilidade resulta em oportunidades de negócios alinhadas ao desenvolvimento sustentável (BORGES, 2014; RAUFFLET; BRES; FILION, 2014). O empreendedorismo sustentável, portanto, trata da aplicação dos conceitos e comportamentos empreendedores para a identificação de oportunidades de negócio inovadoras no âmbito social e ambiental. Trata-se da exploração de ideias de negócios relacionadas aos nichos ambiental e social, que harmonizam os ganhos econômicos com as melhorias sociais e ambientais. Sob tal enfoque, [...] o empreendedorismo, que sempre foi visto como um agente de transformação social, em especial para o crescimento econômico, passou, dessa forma, a ser considerado também um veículo que pode colaborar para o desenvolvimento sustentável. [...] Na perspectiva dos empreendedores, o empreendedorismo sustentável apresenta potencial de maximizar lucros na exploração de oportunidades de negócio ligadas ao nicho ambiental ou social, ou, ainda, a possibilidade de colaborar com seu ambiente ou sua comunidade (BORGES, 2014, p. 7-8). O tema empreendedorismo sustentável tornou-se objeto de pesquisa a partir do momento em que os pesquisadores perceberam que as mesmas imperfeições de mercado que geravam problemas ambientais e sociais poderiam resultar em inovações radicais, articulando novas tecnologias e modelos de gestão. Dessa forma, os empreendedores poderiam contribuir para a solução de problemas sociais e ambientais, ao mesmo tempo em que obtém resultados econômicos decorrentes das receitas geradas por esse tipo de inovação (RAUFFLET; BRES; FILION, 2014). Para Raufflet, Bres e Filion (2014), o empreendedorismo sustentável associa dois conceitos econômicos, qual sejam, a economia do bem-estar baseada na ideia que as deficiências de mercado estão na origem dos problemas sociais e ambientais que impedem o alcance dos objetivos do desenvolvimento sustentável; e a economia clássica empreendedora que percebe essas deficiências como uma fonte de oportunidade de negócios. Portanto, o estudo do empreendedorismo sustentável permite compreender como os empreendedores transformarão essas deficiências em , 4 iniciativas para a solução dos problemas socioambientais e obter lucro, simultaneamente. Em resumo, uma definição de empreendedorismo sustentável é assim apresentada por Cândido Borges (2014, p. 3): “O empreendedorismo sustentável pode ser definido como a descoberta, o desenvolvimento e a exploração de oportunidades ligadas aos nichos sociais e ambientais que geram ganho econômico e melhoria social e ambiental.” 5.1 Empreendedorismo e desenvolvimento sustentável O empreendedorismo articulado ao desenvolvimento sustentável pode surgir de algumas maneiras, resultando em uma tipologia resultante de três indicadores: o nicho da sustentabilidade que é explorado; os motivos para incorporação da sustentabilidade (meio ou fim) e se os conceitos de responsabilidade social fazem parte do novo negócio. A combinação desses três indicadores resulta em uma consolidação de conceitos, como mostra o quadro a seguir. Quadro 5.1 – Tipos de empreendedorismo sustentável Fonte: Borges (2014, p. 4). Na avaliação de um empreendimento, com o objetivo de identificar a sua tipologia, é preciso considerar que a classificação não é estanque. Alguns negócios podem, por exemplo, articular ações para exploração de mais de um nicho da sustentabilidade. , 5 A. Nichos explorados Nicho ambiental Os negócios originados por esse nicho decorrem das mudanças da sociedade quanto à sua conscientização sobre os impactos do negócio no meio ambiente. São negócios que refletem as perspectivas de produtores e de consumidores preocupados em reduzir os efeitos ambientais causados pelas empresas, conduzindo-os aos produtos e serviços ecologicamente adequados. Esses negócios podem ser classificados em categorias, de acordo com a maneira como o empreender explora a vertente ambiental, como é possível observar no quadro a seguir. Quadro 5.2 - Categorias de negócios ambientais Fonte: Borges (2014, p. 5). Os negócios do nicho ambiental, em qualquer uma de suas categorias, implicam o desenvolvimento de inovações sustentáveis, gerando produtos, serviços e processos que reduzem substancialmente os impactos ambientais e aumentam a qualidade de vida das pessoas (BORGES et. al., 2013). , 6 Nicho social Assim como os negócios ambientais, os decorrentes do nicho social também recebem classificação em categorias, conforme o tipo de produto ou serviço oferecido pelo empreendedor. Essas categorias estão sintetizadas no quadro a seguir. Quadro 5.3 – Categorias de negócios sociais Fonte: Borges (2014, p. 5). Os negócios sociais, conforme as categorias apresentadas, têm sido objeto de discussão dos pesquisadores. Especialmente os negócios na base da pirâmide têm sido questionados como efetivamente sociais em virtude da exploração de oportunidade com o objetivo de gerar lucros. Entretanto, os defensores dessa categoria de negócio social argumentam que a oferta de produtos acessíveis às pessoas da base da pirâmide atende suas necessidades de consumo e melhora a sua qualidade de vida. Apesar desses questionamentos, trata-se de uma categoria cuja aceitação como negócio social tem aumentado nos últimos anos. Qualquer que seja a abordagem da inovação sustentável, com vistas à criação de negócios, é importante destacar que essas inovaçõesse tornam bem sucedidas quando geram vantagem competitiva, com a obtenção de resultados econômicos pela aplicação de práticas ambientais e sociais inovadoras. Esse sucesso é atingido apenas quando os produtos, negócios e as tecnologias desenvolvidos se mostram como , 7 opções viáveis, em relação às alternativas tradicionais disponíveis no mercado (BORGES et al, 2013). B. Papel da sustentabilidade O papel da sustentabilidade no empreendimento pode variar de acordo com os objetivos do empreendedor. Nesse sentido, podem ser identificados dois grupos de empreendedores, como apresentam Borges et. Al. (2013): aqueles que são movidos pela oportunidade e utilizam a sustentabilidade como meio; e os que tem a sustentabilidade como objetivo. Ampliando essa classificação, temos que as ações sustentáveis de cunho ambiental ou social, podem ser o meio ou o objetivo do empreendedor. Para uns, o objetivo principal com o empreendimento é o lucro, e a exploração de um negócio social ou ambiental é o meio utilizado para isso. Para outros, o objetivo é colaborar para o desenvolvimento sustentável, e o lucro proporcionado pelo negócio é apenas um meio de manter uma empresa e um estilo de vida compatíveis com os valores da sustentabilidade. (BORGES, 2014, p. 6) Assim como outros temas relacionados ao empreendedorismo sustentável, se tratando de um tema ainda em construção, a sustentabilidade de um empreendimento também é questionada por alguns autores quando o negócio tem o lucro como objetivo e a sustentabilidade é o meio de obtê-lo. No entanto, já existem argumentos a favor, uma vez que ao explorar o nicho ambiental ou social, os empreendedores criam valor para a sociedade com a oferta de produtos e serviços sustentáveis (BORGES, 2014; DALMORO, 2009). C. Responsabilidade social empresarial Uma distinção que precisa ser feita em relação aos negócios sustentáveis é que o fato de ser baseado em um nicho ambiental ou social não significa que automaticamente a Responsabilidade Social (RSE) está presente. Para compreensão dessa distinção, é necessário conceituar a SER. , 8 [...] responsabilidade social empresarial é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais que impulsionem o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais (INSTITUTO ETHOS, 2011, apud BORGES et al, 2013 p. 89). Desse conceito pode-se concluir que a RSE está relacionada tanto à responsabilidade social como ambiental. Para distinguir os empreendimentos sustentáveis em relação à aplicação da RSE, vamos utilizar um exemplo. Pode-se, por exemplo, vender placas de energia solar, sem necessariamente adotar práticas de responsabilidade social e ambiental. Mas o contrário também é possível: as empresas nascentes podem adotar práticas de responsabilidade social empresarial. Um empreendedor que vende placas de energia solar, ao adotar, em sua loja, ações de reutilização e reciclagem dos papéis e de água utilizada, pratica a responsabilidade ambiental, e, ao contratar apenas funcionários da comunidade próxima, a responsabilidade social (BORGES, 2014, p. 6). Em conclusão, afirma-se que a adoção de práticas de Responsabilidade Social Empresarial em um negócio sustentável é um elemento adicional que agrega valor ao empreendimento, uma vez que criará maior valor para a sociedade (BORGES, 2014; DALMORO, 2009). 5.2 Empreendedorismo social O contexto no qual o empreendedorismo social se desenvolve é alicerçado nos mesmos fatores que conduziram ao empreendedorismo sustentável de maneira mais ampla. Trata-se dos desafios de ordem social e ambiental originados no sistema econômico vigente, anteriormente desconsiderados ou subestimados, e que se tornaram foco de discussões em nível mundial. As desigualdades sociais e o esgotamento de recursos do meio ambiente conduziram a uma busca de soluções aos desafios enfrentados (SILVA et al, 2019; TISCOSKI, 2017). , 9 Os novos modelos de organizações, decorrentes do enfretamento aos desafios, resultaram em empreendimentos destinados a gerar e oferecer soluções inovadoras, na forma de produtos, processos e tecnologias, para atender as demandas da sociedade, e representam um novo campo de pesquisa para o qual ainda não existem definições únicas e consensuais. Parente et. al. (2011), ao abordar esse tipo de empreendedorismo, argumentam que suas raízes estão no século XIX, quando se percebeu uma alteração na maneira como a caridade era praticada. O ato de dar esmolas aos pobres evolui para um processo mais sistemático e estratégico, com o objetivo de proporcionar resultados mais duradouros. Os autores destacam trabalhos que podem representar esse tipo de caridade estratégica, como mostra o quadro a seguir. Quadro 5.4 – Exemplos de caridade sistemática e estratégica NOME AÇÃO CONTRIBUIÇÕES Florence Nightingale Fundou a primeira escola de enfermagem. Desenvolvimento de práticas modernas de enfermagem na Segunda Guerra Mundial, por meio de reformas profundas nos hospitais do exército inglês. Michael Young Fundou a School for Social Entrepreneurs. Desempenhou um papel central na promoção e legitimação do campo do empreendedorismo social. Maria Montessori Médica italiana, criou um novo método de educação. O método de educação criado consistia na defesa de que cada criança tinha um desenvolvimento único. O sucesso do seu método conduziu à criação de diversas Escolas Montessori. Fonte: elaborado pela autora com base em Parente et al (2011, p. 3). , 10 Muitas discussões foram, e ainda têm sido realizadas para obtenção de um conceito de empreendedorismo social. Atualmente, esse conceito estabelece que o empreendedorismo social está pautado na criação de valor social e na introdução de inovações para gerar transformações na sociedade. A inserção da dimensão econômica e da lógica de mercado abriu novas possibilidades para atuação das organizações que até então consideravam as dimensões econômica e social excludentes. Por isso, surgiram vários termos para definir negócios com fins lucrativos e que associam objetivos de geração de valor social, por exemplo, empresas sociais, negócios sociais e negócios inclusivos (PARENTE et. al., 2011). Para Silva et. al. (2019), o conceito atual de negócio social é definido por uma empresa com fins lucrativos que possui operação comercial e gera lucro, que será reinvestido em sua missão social. Os autores diferenciam os negócios sociais das organizações sem fins lucrativos, pois esses empreendimentos assumem riscos econômicos para oferecer produtos e serviços. A ênfase na aplicação de indicadores de desempenho para atingir seus objetivos estão presentes em sua cultura organizacional. A partir dessa perspectiva, o empreendedorismo social pode ser considerado uma forma de ação entre os setores público, privado e de sociedade civil, diferente da economia social, que engloba organizações localizadas entre o setor público e empresarial (o chamado terceiro setor) que têm por objetivo fornecer serviços à sociedade. Os negócios originados por esse tipo de empreendedorismo se aproximam de negócios tradicionais quanto aos produtos, serviços, clientes, mercados, custos e receitas; mas apresentam uma diferenciação no seu propósito principal, que é servir a sociedade e melhorar as condições de vida de populações de baixa renda. São empreendimentos distintos, de organizações não governamentais, em virtude da busca de sustentação econômica de suas operações por meio da venda de produtos e serviços ao invés de doações ou outras formas de captação de recursos(PARENTE et. al, 2011; SILVA et al, 2019). , 11 5.3 Características dos empreendedores sociais O empreendedor social tem papel relevante na transformação da sociedade, pois trata-se de um profissional que associa as características do empreendedor ao objetivo de minimizar problemas sociais e beneficiar a comunidade, por meio da criação de ideias inovadoras e criativas. Em Silva et. al. (2019) encontramos uma definição de empreendedor social, que o caracteriza: [...] como indivíduo que apresenta um conjunto de comportamentos, capaz de entregar valor social aos desfavorecidos por meio de um empreendimento financeiramente independente, autossuficiente e sustentável (ABU-SAIFAN, 2012 apud SILVA et al, 2019, p. 41). Dessa forma, podemos concluir que ele é alguém que reconhece um problema social e utiliza os princípios empreendedores tradicionais para organizar, criar e administrar um empreendimento que realize mudança social, portanto, busca, essencialmente, gerar “valor social”. Seu trabalho está voltado não somente para efeitos imediatos, de pequena escala, mas para mudanças intensas, de longo prazo. A partir dos estudos realizados por Parente et. al. (2011); Silva et. al. (2019) e Tiscoski et. al. (2017), realizamos uma consolidação das principais características desse tipo de empreendedor. • Motivados por uma missão: sua principal preocupação é a geração de valor social antes de riqueza. A criação de riqueza pode ser parte do processo, mas não é um fim em si mesma. Assim como os empreendedores de negócios, os empreendedores sociais são intensamente concentrados e perseverantes, incansáveis em sua busca de ideia social; • Ambiciosos: empreendedores sociais lidam com questões sociais importantes, como a pobreza, igualdade de oportunidades, a inclusão, dentre outras, com paixão por fazer a diferença. Podem trabalhar sozinhos ou no interior de uma ampla cadeia de organizações existentes, incluindo as que misturam atividades lucrativas e não lucrativas; , 12 • Estratégicos: assim como os empreendedores de negócios, os empreendedores sociais veem e atuam sobre o que outros desconsideram: oportunidades para melhorar sistemas, criar soluções e inventar novas abordagens que geram valor social; • Talentosos: empreendedores sociais normalmente operam em contextos com acesso limitado a importantes e tradicionais sistemas de apoio a mercados. Como resultado, devem ser excepcionalmente hábeis em recrutar e mobilizar recursos humanos, financeiros e políticos; • Focados em resultados: assim como os empreendedores de negócios, os empreendedores sociais são motivados pelo desejo de ver as coisas mudarem e produzirem retorno mensurável. Os resultados que buscam estão essencialmente ligados à ideia de “fazer do mundo um lugar melhor”, por exemplo, com melhorias em qualidade de vida, acesso a recursos básicos e suporte a grupos desfavorecidos. A combinação dessas características compõe o perfil de um empreendedor social de sucesso, como veremos no quadro a seguir. , 13 Quadro 5.5 – Perfil do empreendedor social de sucesso Gestão profissional É uma característica associada ao empreendedor de negócios, mas que também deve integrar o perfil do empreendedor social. Ele precisa compreender a importância de uma gestão eficiente para ter um negócio de sucesso. Atuação local Significa que o empreendedor social deve fazer a diferença nas comunidades próximas a ele. Melhorar as condições da comunidade na qual está inserido, aproveitando ideias e inovações de outras regiões. Suas ações locais tendem a servir de inspiração para novas ações em outras regiões. Promover a inclusão Promover a inclusão de pessoas com algum tipo de limitação é uma característica essencial de empreendedores sociais. Inspiração A inspiração é uma importante fonte de motivação dos empreendedores sociais. Por meio de sua inspiração, eles desenvolvem a capacidade de influenciar as pessoas ao seu redor. Muitas vezes, eles são inspirados por suas próprias experiências pessoais. Desafios e dificuldades vivenciadas tornam-se a base para ajudar outras pessoas a superar problemas semelhantes. Ganhos financeiros Os ganhos financeiros não tornam menos importantes as contribuições dos empreendedores sociais. Já vimos que o fato de um empreendimento ter foco social não significa que a sustentabilidade financeira deve ser desprezada. A perenidade do empreendimento depende da sua saúde econômica para manter os benefícios proporcionados. Fonte: elaborado pela autora com base em Parente et al (2011); Silva et al (2019) e Tiscoski et al (2017). , 14 5.4 Empreendedorismo social e o Terceiro Setor O Terceiro Setor tem apresentado crescimento relevante nas últimas décadas, impulsionado pelo engajamento social e por políticas públicas de apoio, dentre elas, o desenvolvimento de legislação específica. Esse contexto proporciona maior segurança aos investimentos realizados no setor, assim, atrairão a atenção das empresas privadas, que passarão a destinar recursos a esse tipo de organização, além de incluir estruturas destinadas às ações de responsabilidade social em sua estrutura organizacional (SILVA et. al., 2019; TISCOSKI et. al., 2017). O cenário apresentado permitiu que o empreendedorismo social conquistasse espaço com o crescimento dos negócios de impacto social e o desenvolvimento de iniciativas para atender as demandas da sociedade. Dessa forma, o Terceiro Setor passa a contar com indicadores de desempenho destinados a avaliar o seu impacto na atuação destinada a prover serviços que deveriam ser ofertados pelo primeiro setor (Estado) e também pela sua representatividade na defesa de causas relacionadas à proteção ao meio ambiente e à redução de problemas sociais, como a pobreza e o desemprego. Ao agregar o comportamento empreendedor às ações do Terceiro Setor, são geradas inovações destinadas a resolver os problemas por ele assumidos. O resultado dessa articulação pode ser identificado nas adaptações realizadas em inovações desenvolvidas para o primeiro e o segundo setores (Estado e Mercado, respectivamente), permitindo que as organizações do terceiro setor obtenham resultados não oferecidos pelos outros dois setores (PARENTE et al, 2011; SILVA et al, 2019). No Terceiro Setor, a principal característica do empreendedorismo social é a missão de criar e maximizar o valor social, por intermédio de atividades inovadoras, não tendo ênfase nos resultados econômicos inerentes ao empreendedorismo. No entanto, o comportamento empreendedor continua presente em suas características de buscar e avaliar oportunidades, realizar a gestão do risco, atuar com proatividade e gerar inovação. É por todo esse contexto que as inovações no Terceiro Setor são mais complexas, como afirma Silva et. al. (2019). , 15 Os processos, a escala, a missão e o tipo de atuação que os empreendedores sociais têm no terceiro setor são mais focados na criação de valor social em detrimento da geração de lucro econômico, logo, o tipo de inovação que esses empreendedores engendram é fundamentalmente social e até mais complexo (SILVA et al, 2019, p. 75). 5.5 Eco empreendedorismo e economia verde Os debates acerca da sustentabilidade nos negócios, como discutimos ao longo deste texto, tem gerado uma série de temas como seus desdobramentos, dentre eles, economia verde, cidades sustentáveis, negócios sustentáveis, negócios verdes, programas governamentais sustentáveis e políticas de apoio ao desenvolvimento sustentável estão entre esses assuntos (FERREIRA, 2014). Para o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUMA), uma economia verde é aquela que resulta em melhoria do bem-estar humano e da equidade social, ao mesmo tempo em que reduz significativamente os riscosambientais e a escassez ecológica. Em sua expressão mais simples, uma economia verde pode ser vista como uma economia de baixo carbono, eficiente em termos de recursos e socialmente inclusiva. Em uma economia verde, o crescimento da renda e do emprego deve ser impulsionado por investimentos públicos e privados que reduzem as emissões de carbono e a poluição, melhoram a eficiência energética e de recursos e evitam a perda de biodiversidade e serviços ecossistêmicos (UNEP, 2011). De acordo com o Pnuma (UNEP, 2011), um dos obstáculos ao desenvolvimento e a disseminação da economia verde e a existência de mitos sobre o assunto, em especial, a existência de uma troca inevitável entre meio ambiente, sustentabilidade e progresso econômico, ou seja, que a aplicação da economia reduz as possibilidades de obter crescimento econômico. No entanto, ainda, segundo o programa, já existem evidências substanciais de que o "esverdeamento" das economias não inibe a criação de riqueza nem a geração de empregos, pois existem muitas alternativas de negócios verdes que demonstram , 16 oportunidades significativas de investimento e crescimento relacionados à riqueza e ao emprego. Nessa perspectiva, Ferreira (2014), destaca existência de um ambiente favorável e que abre oportunidades para os empreendedores existentes ou em potencial. Para isso, é necessário que ele assuma um papel ativo, identificando e avaliando as oportunidades e elaborando planos de negócios consistentes. O autor sintetizou alguns setores para demonstrar as novas oportunidades de negócios sustentáveis, baseados no conceito de economia verde, conforme quadro a seguir. Quadro 5.6 – Oportunidades de negócios em economia verde SETOR DE ATIVIDADE NOVAS OPORTUNIDADES DE NEGÓCIOS Agricultura, pecuária e silvicultura Agricultura orgânica, produção de novas oleaginosas para biocombustível, produção de carne certificada, construção de biodigestores, novos sistemas de gerenciamento agrícola, reflorestamento, novos sistemas de gerenciamento de florestas, extração sustentável de frutos das florestas, criação de peixes etc. Construção civil Reutilização de resíduos da construção, madeira cultivada, tijolo ecológico, construção verde para economizar energia, entre outros. Energia Mercado de biocombustíveis, pequenas usinas para produção de combustíveis, produção de óleo biocombustível, produção de painéis solares, produção de lâmpadas econômicas etc. Indústria de transformação Produção de novos produtos (energia) a partir de subprodutos de outros processos produtivos, como bagaço de laranja e de cana; produção de estrados (paletes) e contêineres de plástico em substituição à madeira; indústria de reciclagem de produtos como plásticos e madeira; transformação de resíduos agrícolas em energia; produção , 17 de sacolas ecológicas, produtos naturais de beleza, dentre outros. Turismo Turismo sustentável, hotéis verdes, gerenciamento de serviços ambientais, pesca sustentável, serviços ambientais, produção e comercialização de artesanatos etc. Transporte Veículos de baixo consumo de combustível, veículos elétricos, embalagens recicladas etc. Fonte: elaborado pela autora com base em Ferreira (2014, p. 146). O quadro evidencia que a economia verde abre novas oportunidades de negócios, os chamados de eco empreendimentos, muitos deles com possibilidade de exploração utilizando menor volume de investimento, tais como no setor de turismo, produção agrícola e construção, viabilizando a inserção de pequenos negócios na forma de empreendedorismo sustentável. 5.6 Empreendedorismo e economia colaborativa A economia colaborativa, assim como os demais temas tratados neste texto, é uma decorrência das discussões e da crescente preocupação em relação à responsabilidade social e ambiente da sociedade. A base das discussões, nesta perspectiva, é o consumo exagerado (hiperconsumo), pois já existem pesquisas indicando que esse nível de consumo não poderá ser sustentado em virtude do esgotamento dos recursos naturais (SILVEIRA; PETRINI; SANTOS, 2016). Economia colaborativa é a expressão utilizada para descrever novas relações de consumo de produtos e serviços por meio da divisão e do compartilhamento entre consumidores. É uma forma de resposta ao movimento de hiperconsumo e tem sido avaliada com um novo estágio das relações econômicas entre produtores e consumidores. Trata-se de um fenômeno recente, mas que tem crescido e se difundido com grande velocidade, especialmente pela utilização de redes digitais como apoio a essas relações de consumo (SILVEIRA; PETRINI; SANTOS, 2016). , 18 O acesso cada vez mais amplo às tecnologias de informação e comunicação, permitiu que algumas práticas já existentes, porém em pequena escala, se tornassem a base de novos modelos de negócios. Por exemplo, o aluguel de imóveis em temporadas e o compartilhamento de automóveis, que serviram de inspiração a negócios inovadores como Airbnb e Uber. Esses fatos demonstram que a difusão dos conceitos centrais da economia colaborativa tem viabilizado a identificação de novos negócios, reforçando o seu potencial de desenvolvimento econômico (SILVEIRA; PETRINI; SANTOS, 2016; GOIDANICH, 2016). O crescimento da economia colaborativa, por meio do consumo compartilhado, divisão ou empréstimos; tem gerado novas oportunidades ao empreendedor. A necessidade de produzir e consumir de maneira mais sustentável, decorrente da conscientização da sociedade acerca dos problemas sociais e ambientais, tem demonstrado que esse modelo de negócio atende melhor à combinação de crescimento econômico com sustentabilidade ambiental e social, dimensões‐base do conceito de desenvolvimento sustentável. O crescimento da Geração Y na população com renda para consumo tem contribuído para a ampliação do mercado consumidor desses negócios. Trata-se de uma geração mais preocupada com a sustentabilidade, e com maior foco na experiência do que no acúmulo de bens, portanto, contribui para aumentar a viabilidade de negócios baseados no consumo compartilhado. São vários os exemplos, como as bicicletas e patinetes compartilhados como forma de obter mobilidade e a aquisição de frações de imóveis de lazer (SEBRAE, 2018). Conclusão Discussões sobre o modelo econômico vigente conduziram à necessidade de obter equilíbrio entre produção e geração de riqueza e as questões socioambientais. O chamado tripé da sustentabilidade, que articula as dimensões econômica, social e ambiental, é o conceito que tem promovido mudanças na forma como os negócios são gerados e administrados para garantir o desenvolvimento sustentável. O , 19 empreendedorismo sustentável é a vertente do empreendedorismo que se propõe a gerar ideias, oportunidades e negócios que atendam a esses pressupostos. Nessa vertente do empreendedorismo, as possibilidades abrangem negócios a serem explorados em nichos ambientais ou sociais, ou uma combinação de ambos. Esses negócios podem ter a sustentabilidade como meio ou como fim. Quando o negócio tem a sustentabilidade como fim, os lucros são utilizados para manter o negócio em funcionamento; se o objetivo é o lucro, a sustentabilidade é o meio pelo qual esse lucro é obtido. No entanto, nem todo empreendimento sustentável apresenta características de Responsabilidade Social Empresarial, mas a adoção dessas práticas em um negócio sustentável é um elemento adicional que agrega valor ao empreendimento, uma vez que criará maior valor para a sociedade. Em relação ao empreendedorismo social, o conceito atual de negócio social é definido por uma empresa com fins lucrativos que possui operação comercial e gera lucro, que será reinvestido em sua missão social. Os autores diferenciam os negócios sociais das organizações sem fins lucrativos, pois esses empreendimentos assumem riscoseconômicos para oferecer produtos e serviços. Em suas relações com o Terceiro Setor, o empreendedorismo tem obtido papel de destaque por meio da geração de inovações, permitindo que essas organizações obtenham resultados que não são oferecidos pelos outros dois setores do mercado. O grande responsável por essas inovações é o empreendedor social, cujo perfil e motivações o tornam alguém que reconhece um problema social e utiliza os princípios empreendedores tradicionais para organizar, criar e administrar um empreendimento que realize mudança social, portanto, busca, essencialmente, gerar “valor social”. Seu trabalho está voltado não somente para efeitos imediatos, de pequena escala, mas para mudanças intensas, de longo prazo. Na vertente ambiental, temos o eco empreendedorismo, que tem aproveitado o ambiente favorável ao desenvolvimento de negócios ambientalmente adequados para gerar inovações e oportunidades ao empreendedor. Além disso, a economia colaborativa e o aumento dos consumidores da geração Y têm criado um ambiente , 20 propício para empreendimentos baseados no consumo compartilhado de produtos e serviços. REFERÊNCIAS BORGES, C. (org.). Empreendedorismo sustentável. São Paulo: Saraiva, 2014. BORGES, C; BORGES, M. M; FERREIRA, V. R. S; NAJBERG, E; TETE, M. F. “Empreendedorismo sustentável: proposição de uma tipologia e sugestões de pesquisa”. In: Revista de Empreendedorismo e Gestão de Pequenas Empresas, v. 2, n.1, p. 77-100, 2013. Disponível em: <https://bit.ly/3ep6kwL>. Acesso em: 03 jul. 2020. BOSZCZOWSKI, A. K; TEIXEIRA, R. M. “O empreendedorismo sustentável e o processo empreendedor: em busca de oportunidades de novos negócios como solução para problemas sociais e ambientais”. 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