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106 Unidade II Unidade II 5 OUTRAS ÁREAS FORENSES 5.1 Balística forense A balística forense é uma área da criminalística que tem como objetivo a análise técnico-científica de identificação das armas de fogo utilizadas no ato criminal ou acidental, de seu funcionamento e efeitos mediatos e imediatos sobre a vítima e o próprio atirador; além da verificação da munição (projétil e estojo) utilizada no fato. Atualmente, a balística e a medicina legal, que serão estudadas em um tópico particular, são indispensáveis na tipificação dos crimes envolvendo arma de fogo (homicídios, suicídios ou acidentes). 5.1.1 Classificação das armas de fogo Para o estudo da balística forense é preciso conhecer armas de fogo (funcionamento, características e classificação), bem como o tipo de munição, seus constituintes e o calibre. As armas de fogo são objetos mecânicos que, através da combustão de substância ou mistura de elementos explosivos em seu interior, obtêm a impulsão do projétil em uma determinada direção e sentido. Figura 53 – Sequência do mecanismo interno do disparo de arma de fogo As armas de fogo podem receber diferentes classificações, de acordo com alma do cano, sistema de carregamento, sistema de inflamação e funcionamento. 107 BIOMEDICINA FORENSE Alma do cano Quando fabricada, a arma de fogo pode ter impressa uma série de sulcagens helicoidais paralelas (raiamento) no interior do cano, tornando-a de alma raiada (exemplos: revólver, pistola, fuzil) ou não imprimir nenhum raiamento, caracterizando a arma como de alma lisa (espingarda). Existe arma de fogo com alma mista, a qual apresenta um cano de alma lisa e outro cano de alma raiada. Para confeccionar o raiamento de uma arma, utiliza-se o processo de usinagem ou brochamento e martelamento ou forjamento a frio, o qual pode ser impresso no sentido horário (dextrógiro) ou anti-horário (sinistrógiro). Saiba mais Para conhecer mais detalhes sobre os processos de usinagem, brochamento e forjamento, leia os artigos indicados a seguir. PROCESSOS de usinagem: mandrilhamento e brochamento. Disponível em: https://profmilton.weebly.com/uploads/2/6/6/4/26645062/ mandrilhamento_brochamento.pdf. Acesso em: 26 ago. 2020. PAIVA, M. C. Forjamento. Wordpress, [s.d.]. Disponível em: https:// burocracismo.wordpress.com/2009/08/28/forjamento/. Acesso em: 26 ago. 2020. A B Figura 54 ؘ– Espingarda de origem alemã Sistema de carregamento O carregamento das armas consiste em municiá-las e pode ser feito pela boca do cano (antecarga) ou pela extremidade posterior, culatra ou câmara de combustão (retrocarga). Sistema de inflamação As armas mais antigas e obsoletas apresentam um sistema de inflamação direta por faísca (atrito) e as mais modernas apresentam um sistema de percussão, no qual a inflamação ocorre por detonação de explosivo sensível a choques mecânicos (impacto do precursor). Esse último sistema se divide em 108 Unidade II extrínseco, quando a espoleta é colocada externamente e se comunica com a carga de projeção através de um orifício (ouvido), um mecanismo comum das armas de antecarga, e intrínseco, normalmente verificado em armas de retrocarga e que consiste na utilização de cartucho de munição, composto de mistura iniciadora e carga de projeção (pólvora). O sistema de percussão intrínseco ainda se divide em sistema de pino lateral (obsoleto), central (a mistura iniciadora encontra-se na espoleta localizada no centro da base do cartucho) e radial (a mistura iniciadora encontra-se internamente ao cartucho, mais precisamente em torno de sua base). Ainda, os sistemas de percussão intrínseco central e radial se classificam de acordo com o mecanismo de disparo em recuo direto, quando o cão do revólver e pistola ou o precursor presente no conjunto do ferrolho do rifle aciona a espoleta através do impacto na cápsula, e indireto, quando uma peça móvel – pino precursor – localizado na armação entre o cão e a espoleta a aciona. Funcionamento Em relação ao funcionamento das armas, elas podem ser classificadas em armamento de tiro unitário e de repetição. As armas de tiro unitário se dividem em simples, quando ocorre apenas um disparo antes do recarregamento, e múltiplos, quando apresentam dois ou mais canos paralelos com mecanismos de disparo independentes. Já as armas de repetição apresentam um único mecanismo de disparo, com a extração e o carregamento entre os tiros ocorrendo de forma mecânica. As armas de repetição se dividem em não automáticas, quando o mecanismo de disparo, extração e carregamento se dão por sistema de alavanca, bomba ou ferrolho de forma manual; semiautomática, quando o mecanismo de disparo é acionado pela força muscular do atirador e a extração do estojo e o carregamento ocorrem devido às forças geradas pelos gases produzidos durante o tiro; e automática, quando apenas o primeiro disparo depende do atirador, sendo que os demais são sequenciais e contínuos devido à movimentação dos gases originados da combustão da carga de projeção. Na balística forense, os exames periciais em sua maioria são realizados em armas de fogo portáteis, sendo as principais: • Revólver: arma de repetição, não automática, constituída de: armação (corpo da arma), que a identifica e a classifica perante os demais tipos de armamento; tambor (cilindro rotativo), que é a parte de carregamento da arma e integrante do mecanismo de disparo e repetição; gatilho, parte integrada ao tambor e responsável pelo acionamento do disparo através de uma pressão manual do dedo do atirador; cão, que corresponde à parte do revólver que movimenta o percursor para impactar a base do cartucho íntegro; e cano, que tem como função imprimir a velocidade inicial do projétil em uma direção e sentido determinados devido à expansão dos gases produzidos pela combustão, empregando um movimento de rotação (helicoidal) devido ao raiamento da arma e proporcionando uma maior estabilidade à trajetória do projétil (maior precisão do tiro). Geralmente, os revólveres apresentam ação simples (disparo da arma engatilhada – tração manual do cão) e ação dupla (não engatilhada – o não armamento do cão antes do disparo). 109 BIOMEDICINA FORENSE 1 2 3 4 5 6 12 11 10 9 8 7 Figura 55 – Peças externas do revólver: 1 – massa de mira; 2 – cano; 3 – tambor; 4 – alça de mira; 5 – cão; 6 – botão da chave do retém do tambor; 7 – placa esquerda de guarnição do cabo; 8 – gatilho; 9 – guarda-mato; 10 – armação; 11 – suporte do tambor; 12 – vareta do extrato • Pistola: arma de repetição semiautomática e independente da força muscular do atirador (que apenas aciona o mecanismo de disparo). As partes desse armamento são: armação (corpo da arma), na qual encontram-se o carregador, o cano e o ferrolho. O carregador é uma peça oca e alongada que recebe os cartuchos e os impulsiona em direção à câmara; o cano apresenta em sua porção próxima ao cão a câmara de combustão (lisa) e posteriormente a essa parte raiado; o ferrolho é uma peça móvel que desliza sobre trilhos presentes na armação, responsável pelo mecanismo de disparo e repetição que ocorre devido ao pino do percursor e também do extrator. As pistolas apresentam movimento simples (ação simples ou dupla) e movimento duplo (ação simples e dupla). 1 2 3 4 5 6 7 8 12 11 10 9 13 1415 Figura 56 – Peças externas da pistola: 1 – massa de mira; 2 – cano; 3 – janela de ejeção; 4 – ferrolho; 5 – retém do ferrolho; 6 – alça de mira; 7 – cão; 8 – trava de segurança; 9 – carregador; 10 – coronha; 11 – retém do carregador; 12 – gatilho; 13 – guarda-mato; 14 – alavanca de desmontagem; 15 - armação 110 Unidade II • Armas longas: — Rifle: armamento com cano maior que 20 polegadas de comprimento e raiado, pode ser de tiro único (utilizado para caça) ou de repetição (não automático ou semiautomático) e de vários calibres (.22 – curto e pequeno poder de fogo até .50BMG – grande alcance e alta energia, utilizado por militares). — Carabina: apresenta as mesmas característicasdo rifle, porém com um cano menor que 20 polegadas de comprimento. Guarda-mato Gatilho Soleira Coronha Cão Carregador Armação Ejetor Alça de mira Cano Massa de mira Obturador Telha Carregador tubular Boca do cano Figura 57 – Vista explodida de uma carabina da marca Winchester, de calibre 38 — Fuzil: armamento de cano com comprimento maior que 20 polegadas e raiado, de repetição (aproveita a expansão dos gases da combustão de carga de projeção) automática e a cadência (intermitente ou em rajada) pode ser selecionada; de uso militar. — Submetralhadora: arma de cano raiado, de repetição (análogo ao do fuzil) automática ou semiautomática, calibre típico de porte de arma curto, tendo dimensões (ausência de coronha para apoio no ombro) que não a classifica como arma longa; as submetralhadoras utilizadas pelos policiais e militares apresentam coronhas fixas ou escamoteáveis, com seletor de cadência de tiro, semelhante ao fuzil. — Espingarda: arma de cano longo e liso, de tiro unitário (munição – cartucho carregado com múltiplos projéteis (balins) ou projétil único de grande massa (balote), é utilizada em competições esportivas e para caça de animais; ainda, existe cartucho carregado com projéteis de borracha (elastômero) ou sacos de areia utilizados por policiais e militares para dispersão de multidão (controle de distúrbios civis). A espingarda de tiro unitário pode apresentar um ou dois canos (lado a lado ou sobrepostos). Existem espingardas de repetição semiautomáticas (sistema de tomada de gases e alimentadas por carregadores) e não automáticas (alavanca e ferrolho). • Armas de fabricação artesanal: são feitas de forma rústica ou até mesmo em escala industrial e consistem, normalmente, na mudança do calibre da arma original (por exemplo, submetralhadora utilizando calibre .380 e revólver usando cartucho de calibre 12). 111 BIOMEDICINA FORENSE A B C Figura 58 – (A) Arma de fogo, rusticamente confeccionada, para utilização com munição do calibre 38 (apreendida na cidade de São Paulo). (B) Exemplos de armas de fogo artesanais do tipo submetralhadora, confeccionadas em escala industrial. (C) Arma de fogo artesanal do tipo revólver, também confeccionada em escala industrial Munição é um termo utilizado para designar um conjunto de cartuchos que correspondem à unidade de alimentação das armas de fogo. O cartucho de munição para arma de fogo de alma raiada é constituído de estojo, peça mais externa de liga metálica, que contém em seu interior a carga de projeção (pólvora) e em sua base a espoleta, onde são inseridos a identificação do fabricante e calibre e, na outra extremidade é fixado o projétil. Para cada tipo de arma existe um formato de estojo específico, por exemplo, o estojo do revólver é cilíndrico em toda sua extensão e apresenta a base com aros para melhor acomodação nas câmaras do tambor, já o estojo de pistola não apresenta aros em sua base e o de fuzil possui o diâmetro da base maior do que o da boca, local onde o projétil é fixado. 112 Unidade II Pólvora Pólvora Pólvora Projétil (camisa de revestimento) Projétil (núcleo de preenchimento) Projétil Estojo Estojo A B C Culote do estojo Culote do estojo Evento Eventos Bigorna Bigorna Mistura iniciadora Mistura iniciadora Mistura iniciadora Culote do estojo Espoleta Espoleta Projétil Figura 59 – (A) Cartucho de fogo central no calibre 9 mm. (B) Cartucho de fogo circular no calibre 22. (C) Cartucho de fogo central no calibre 7,62 x 39 mm Espoleta é o compartimento onde está localizada a mistura iniciadora (explosivos sensíveis a choques mecânicos) que, quando deflagrada, resulta na explosão da carga de projeção. Em cartucho de fogo central, a espoleta apresenta uma cápsula na base do estojo, tendo um orifício de comunicação; já em cartucho de fogo circular não há cápsula, a mistura iniciadora se localiza no interior da base do estojo de forma radial e em contato com a carga de projeção. Carga de projeção, também chamada de propelente, corresponde à substância ou mistura responsável pela combustão e, consequentemente, pela expansão de gases dentro do estojo e do cano da arma, promovendo o disparo do projétil. Atualmente, a pólvora utilizada nos cartuchos como propolente pode ser de base simples (nitrocelulose) ou dupla (nitrocelulose e nitroglicerina), conferindo maior estabilidade e controle. Projétil é a parte móvel do cartucho, que se desprende quando a arma é disparada, transfixando o alvo. É produzido em chumbo ou cobre, podendo apresentar diversas formas e dimensões de acordo com o propósito, uma vez que tais fatores influenciam em sua velocidade e trajetória e nos efeitos perante o alvo. Totalmente encamisado ponta oca silver tip Pontiagudo Cone truncadoPonta planaSemicanto-vivoCanto-vivoOgival Totalmente encamisado ogival Semiencamisada ponta oca Totalmente encamisado (nyclad) ponta hydra-shok Pontiagudo expansivo Figura 60 – Diferentes tipos de projéteis. Os dois últimos no calibre 7,62 mm e os demais no calibre 38 113 BIOMEDICINA FORENSE A composição dos cartuchos de armas de cano de alma lisa é semelhante à dos de alma raiada, diferenciando-se apenas quanto ao estojo, que pode ser de base metálica e corpo de plástico ou papelão e com os projéteis mais pronunciados. Dentro dos cartuchos de armas de fogo de alma lisa, mais precisamente entre a pólvora e os projéteis (balins ou balote), há uma bucha pneumática, normalmente de plástico, que determina o calibre do cartucho após disparo. Evento Bucha pneumática Balins (projéteis múltiplos) Fechamento estrela Estojo A Cartucho de fogo central para arma de caça calibre 12 Pólvora Mistura iniciadora Bigorna Espoleta 12 7½ 111 7 T9 6 TTT8 35 SG balote 1,25 2,38 4,001,50 2,50 5,002,00 2,75 5,502,25 3,503,00 8,40 17,6 Número de chumbo B Dados sobre os tamanhos de chumbos da CBC Diâmetro em milímetros Figura 61 – (A) Cartucho de fogo central no calibre 12. (B) Dados dos balins (projéteis múltiplos) e balotes fabricados pela Companhia Brasileira de Cartuchos Como descrito anteriormente, a balística forense tem como intuito identificar armas e munições, individualizando-as e associando-as a determinados eventos e/ou pessoas. A identificação pode ser direta ou imediata e indireta ou mediata. Na identificação direta verificam-se as dimensões, as características como espécie (revólver, pistola etc.), raiamento (quantidade e orientação), calibre, comprimento do cano, capacidade, acabamento, modelo, entre outras, e também caracteres de identificação impressos na produção das armas e munições, como sinetes do fabricante, número de peças e numeração de série, que muitas vezes são alteradas (supressão por lixamento ou soldagem/regravação). Para tentar revelar as inscrições suprimidas, a perícia utiliza-se de processos físico-químicos, descritos no tópico sobre química forense. A B D C E Figura 62 – (A e B) O número de série das armas foi suprimido, o primeiro encontra-se pinado e o segundo, raspado. (C) O número de série da arma foi regravado. No detalhe observa-se a nítida falta de homogeneidade na gravação dos caracteres. (D e E) O revólver, com acabamento oxidado, foi submetido ao tratamento físico-químico para restauração dos vestígios latente do número de série original, com uso do reagente de Besseman e Haemers. Apenas o segundo caractere não foi revelado 114 Unidade II A identificação indireta ou mediata consiste no confronto balístico microcomparativo, ou seja, na análise do cartucho deflagrado, mais precisamente do estojo/espoleta e projétil para verificar se foi disparado de uma determinada arma. Outra análise considerada de identificação é a mensuração da energia cinética do projétil utilizado como parâmetro-limite para a restrição de armas e munições. Como exemplo, as armas de fogo de cano de alma raiada apresentam uma energia cinética do projétil na saída do cano de 407 J (joules) para as curtas e de 1.355 J para as longas. Assim,para determinar a energia cinética do projétil, o perito precisa aplicar a fórmula a seguir, na qual m representa a massa do projétil em gramas, v a velocidade do projétil após o disparo, obtido através de um cronógrafo e representado em metros por segundo, e g equivale à aceleração da gravidade do local do teste. E = (1/2 . m . v2) / g Quando apenas os cartuchos coletados no local do crime são encaminhados para a perícia, o perito utiliza tabelas informativas fornecidas pelos fabricantes para obtenção dos parâmetros da fórmula. A perícia criminal recebe constantemente solicitações de exames para verificação da eficiência das armas de fogo e de disparos acidentais. Para tal, o perito analisa o funcionamento dos mecanismos de disparo, extração, repetição e segurança da arma, além de verificar o peso do gatilho e, caso observe algum defeito ou anormalidade, eles devem ser descritos. Portanto, o perito analisa o funcionamento da arma de fogo sob condições normais de uso, realizando, caso necessário, testes de queda com a arma dotada apenas de estojo com a cápsula de espoletamento e sem carga de projeção e projétil, para avaliação da eficiência, bem como testes para verificação de disparos acidentais, nos quais são analisadas circunstâncias anormais, como o disparo sem o acionamento do gatilho e possíveis interrupções anormais no funcionamento da arma de fogo devido a superaquecimento ou falha de alimentação ou ejeção. No exame de confronto balístico, são feitas análises macroscópica e microscópica do projétil, do estojo e da espoleta do cartucho deflagrado, pois neles são formadas impressões após o disparo, como o molde das raias e eventuais defeitos (devido ao processo de fabricação ou desgaste natural) do cano. Assim, tais impressões individualizam as armas de fogo. Durante a realização do exame de confronto balístico, são feitos disparos dentro de um tanque coletor com água com a arma supostamente utilizada no crime. A seguir, tal munição disparada no tanque, denominada como padrão, é comparada com a munição questionada (coletada no local do crime) por um equipamento microcomparador balístico. Dessa forma, o perito reúne elementos que convergem para a identificação positiva da utilização de determinada arma de fogo no crime ou, ainda, elementos que divergem para a eliminação de tal suspeita. 115 BIOMEDICINA FORENSE A B C Figura 63 – (A e B) Tanque coletor com água, para a recolha de projéteis padrões (disparados com arma suspeita de participar da ocorrência). (C) Microscópio óptico comparador acoplado a acessório que permite captura e impressão de imagens digitalizadas No confronto balístico o perito observa inicialmente as características de ordem genérica nos projéteis e nos estojos, por serem excludentes. Nos projéteis são analisados profundidade, largura, distância entre as impressões de raias, seus números e orientações; e nos estojos avaliam-se conformação, localização e profundidade da marca do precursor ou do ejetor e extrator. Caso as características de ordem genérica sejam coincidentes entre a munição coletada no local do crime com a padrão, são realizadas as observações de ordem específica (estriamentos finos), responsável pela individualização da arma de fogo pelo exame microcomparativo. A D B E C F Figura 64 – (A) Concordância entre projéteis semiencamisados do tipo ponta oca expansivo calibre 38. (B) Concordância entre projéteis encamisados total do tipo ogival. (C) Concordância entre projéteis de chumbo de calibre 32. (D) Concordância entre estojos deflagrados por uma pistola da marca Taurus de calibre 380 ACP. (E) Concordância entre estojos deflagrados por uma carabina da marca Marlyn de calibre 9 mm Luger. (F) Concordância entre estojos deflagrados por um revólver da marca Taurus de calibre 38 Em locais de crime, os peritos podem relatar os efeitos primários do tiro, quando se deparam com projéteis que tiveram sua trajetória interrompida por um anteparo (objetos inanimados - janela ou até mesmo o corpo humano); os efeitos secundários do tiro, que são resultantes do disparo da arma de fogo, como gases, resquícios de combustão da pólvora e da mistura iniciadora e microfragmentos do projétil; além de determinar a trajetória (angulação, direção e sentido) de um disparo de arma de fogo em local de crime, desde que haja pelo menos dois pontos de embate do projétil. Para determinação da trajetória de um disparo, os peritos utilizam luzes infravermelhas (apontador com mira laser), varetas e hastes flexíveis. 116 Unidade II B Rupturas radiais Rupturas concêntricas A Figura 65 – (A) Simulador de um impacto balístico sobre o corpo humano. (B) Disparo em vidro de veículo. As letras A e B em vermelho mostram a orientação de dentro para fora e de fora para dentro, respectivamente < Tr aj et ór ia 1 < Traj etória 3< Tr ajet ória 2 Laje da residênciaLaje da residência ReconstituiçãoReconstituição Ângulos da trajetória no corpo da vítimaÂngulos da trajetória no corpo da vítima Janela Janela da salada sala Vítima VítimaVítima Testemunha Testemunha Trajetória 1 Trajetória 1 Obs.: Trajetórias 2 e 3 incompatíveis com os ferimentos e as posições da vítima e testemunha Tra jet ór ia (2) a pa rti r d a l aje Trajetór ia (3) a partir da janel a da sal a da residênc ia Trajetória (1) Trajetória (1) Obs.: Trajetórias 2 e 3 incompatíveis com os ferimentos e as posições da vítima e testemunha Figura 66 – Desenhos utilizados na reprodução simulada da reconstituição de um crime para determinação da trajetória de um tiro que vitimou um rapaz, em região próxima ao coração. Testemunhas alegavam que o disparo tinha vindo da residência em frente ao local em que o rapaz se encontrava conversando com outra pessoa. Esta versão não era condizente com o trajeto observado pelo médico legista no corpo do rapaz 117 BIOMEDICINA FORENSE Figura 67 – Emprego de varetas para auxílio na determinação da trajetória de tiros que foram dados contra uma viatura policial, em cidade do Texas (Estados Unidos), e que vieram a provocar a morte do policial condutor Os resíduos expelidos, após o disparo da arma de fogo, são analisados para dois propósitos principais: estimar a distância do tiro e verificar se o suspeito realmente atirou com a arma de fogo suspeita. Adicionalmente, o estudo das formas, proporções e relações da zona de chama ou chamuscamento (quando os gases inflamados do disparo queimam o objeto atingido pelo projétil), da zona de esfumaçamento (quando partículas finíssimas oriundas da combustão da pólvora são lançadas contra o alvo) e da zona de tatuagem (quando fragmentos do projétil ou produtos da combustão apresentam um maior potencial de penetração no local atingido), podem sugerir ao perito a distância e a trajetória do tiro (tais análises são melhor abordadas no tópico sobre química forense). A B C Figura 68 – (A) Resíduos projetados no momento do tiro. (B) Vítima com três orifícios de entrada de projétil de arma de fogo. As letras A, B e C, em vermelho, evidenciam, respectivamente, tiro encostado evidenciado pela câmara de mina de Hoffman, tiro a curtíssima distância evidenciado pela zona de chama e tiro a curtíssima distância evidenciado pela zona de tatuagem. (C) Vítima com orifício de entrada de projétil de arma de fogo. O tiro foi dado a curta distância, evidenciado pela zona de esfumaçamento 118 Unidade II Lembrete A balística e a medicina legal são indispensáveis na tipificação dos crimes envolvendo armas de fogo. A balística forense tem como intuito identificar armas e munições individualizando-as e associando-as a determinados eventos e/ou pessoas. O exame de confronto balístico consiste na análise macroscópica e microscópica do projétil, do estojo e da espoleta do cartucho deflagrado. Exemplo de aplicação Como exemplo de aplicação prática em casos de crimes de grande repercussão, pode ser citado o uso da balística no caso Mércia Nakashima,pois os únicos vestígios encontrados dentro de seu veículo foram dois projéteis de arma de fogo que, de acordo como as posições em que estavam alojados no carro, levaram à conclusão de que os disparos e sua trajetória aconteceram de baixo para cima e que a vítima teve uma postura de defesa. Ainda, após a análise de balística dos projéteis ficou evidente que se tratava de um revólver 38 com algumas alterações particulares. Porém, a arma do crime nunca foi achada, prejudicando o detalhamento preciso do instrumento utilizado no crime. 5.2 Papiloscopia, datiloscopia e revelação e impressões digitais Existem relatos indicando que desde a Antiguidade as impressões digitais, palmares e plantares já eram usadas em contratos e selos chineses e babilônicos para garantir o reconhecimento de compromisso e da individualidade. Em 1880, ocorreu a primeira identificação criminalística realizada por Henry Faulds no hospital de Tsukiji, no Japão. E, na Índia, William Herschel fez o primeiro trabalho de identificação criminal, provando que as impressões digitais permaneciam íntegras por um longo período de tempo. Juan Vucetich elaborou o primeiro sistema de classificação de impressões digitais em 1891, recebendo a denominação icnofalangometria, junção das palavras gregas ichmos (vestígio) + fálangas (falanges) + métro (medida). Posteriormente, tal denominação foi alterada para dactiloscopia, junção dos vocábulos gregos dáchtylo (dedo) + skopeîn (examinar), sugestão de Don Francisco Latzina, em seu artigo publicado no jornal La Nación. E, em 1904, Vucetich publicou sua obra-prima, Dactiloscopia comparada. A palavra papiloscopia (originária dos termos latino papillae e grego skopeîn) foi usada pela primeira vez na obra La técnica de la papiloscopia: identificacíon de recíen nacidos y menores. Atualmente, papiloscopia ou datiloscopia refere-se à área da criminalística que estuda as impressões formadas pelas projeções da pele nos dedos (digitais), nas palmas das mãos (palmares) e nas plantas dos pés (plantares). 119 BIOMEDICINA FORENSE A revelação dessas impressões pode ocorrer dentro de laboratórios e em locais de crime, sendo que nesse último os exames são realizados em estruturas, objetos, e outros materiais encontrados, além de na própria vítima, a fim de identificar a autoria e a dinâmica do delito. Tal procedimento recebe o nome de revelação de impressões papilares. Saiba mais Para conhecer melhor o histórico dos processos de identificação, leia o artigo indicado a seguir. ARAÚJO, M. E. C.; PASQUALI, L. Histórico dos processos de identificação. Disponível em: http://www.institutodeidentificacao.pr.gov.br/arquivos/File/ forum/historico_processos.pdf. Acesso em: 26 ago. 2020. Observação Papiloscopista é o profissional responsável por controlar e executar trabalhos periciais relacionados a levantamento, coleta, análise, codificação, decodificação e pesquisa de padrões e vestígios papilares. 5.2.1 Identificação criminal e civil Devido à necessidade de identificação de criminosos reincidentes, surgiu a identificação criminal, que tem por base a análise das impressões digitais. Entretanto, de forma natural, tal análise passou a ser utilizada também para determinar, através de vestígios encontrados, se o indivíduo suspeito realmente está envolvido na autoria do crime. Após o início da revelação de impressões digitais em cenas de crime, temos os primeiros arquivos de suspeitos para comparação. Com o aumento desses arquivos, a polícia passa a prender pessoas suspeitas de serem autoras de crimes e impedir a prisão de inocentes. Dessa maneira, surge a identificação civil, composta de um conjunto de registros e procedimentos jurídicos armazenados em um banco de dados, individualizando e ditando os direitos e deveres do indivíduo perante a sociedade. Assim, a perícia criminal utiliza como ferramenta de identificação as bases de dados da identificação civil, ou seja, as carteiras de identidade para consultar e comparar as impressões digitais com as do suspeito do delito. Tal procedimento foi otimizado após o desenvolvimento de sistemas automatizados, que permitem ampla comparação, incluindo toda a população. Portanto, com a finalidade de buscar a autoria do delito, a criminalística utiliza-se do confronto datiloscópico, ou seja, compara o elemento questionado de um local de crime com um padrão gerado pela identificação civil. 120 Unidade II Na década de 1960, devido ao aumento do número de fichas de impressões digitais, surge o AFIS (Automated Fingerprint Identification System) com o objetivo de comparar de forma automática a impressão digital questionada (revelada em cenas de crimes) com a de possíveis suspeitos. A polícia do estado de São Paulo possui o sistema AFIS, que está atualmente alimentado pelo registro geral de identificação civil (RG) de pessoas que solicitaram, nesse Estado, suas respectivas carteiras de identidade e pela identificação criminal de pessoas que praticaram algum tipo de crime. Em âmbito nacional a Polícia Federal é a detentora do referido sistema. O sistema AFIS funciona da seguinte forma: a impressão digital encontrada e revelada no local de crime, como em objetos, materiais e corpo, por exemplo, é tratada gerando padrões previamente definidos, os quais são comparados com a base de dados que leva a um escore (seleção de impressões semelhantes) em relação a um montante. Em seguida, o papiloscopista, profissional especializado em papiloscopia, verifica as características correspondentes entre as impressões digitais, concluindo a identificação ou não do indivíduo. A partir de 2002, normas e consensos empregados pelo método de exame chamado ACE-V (Analysis, Comparison, Evaluation and Verification) passaram a qualificar tal prática de confronto papiloscópico criada pelo sistema AFIS. A classificação da datiloscopia/papiloscopia é feita de acordo com o objeto de estudo e dos objetivos propostos. Portanto, pode-se dividi-la em: • datiloscopia criminal: que realiza o confronto de vestígios digitais encontrados em local de crime, em materiais e objetos e no corpo da vítima, com padrões digitais da própria vítima e do suspeito a fim de determinar a autoria do delito; • datiloscopia civil: trata-se da identificação civil através da biometria (impressão digital) em documentos oficiais, como na cédula de identidade, passaporte, entre outros; • datiloscopia clínica: estuda as alterações dos desenhos papilares em decorrência de doenças, de esforços repetitivos e da influência da hereditariedade. Características dos desenhos papilares (impressão digital) A impressão digital possui algumas características bastante peculiares, descritas a seguir. • Perenidade: os desenhos papilares são perenes, ou seja, permanecem inalterados desde o nascimento até a morte do indivíduo. • Imutabilidade: os desenhos papilares permanecem inalterados, mesmo após regeneração do tecido local devido sua retirada, em decorrência de atividades repetitivas, de doenças e de cicatrizes cirúrgicas. 121 BIOMEDICINA FORENSE • Variabilidade: os desenhos papilares variam de dedo para dedo e cada pessoa apresenta suas digitais próprias e diferentes, permitindo sua individualização. Tipos fundamentais de impressão digital As impressões digitais são constituídas de linhas salientes que demarcam todo o dedo chamadas cristas papilares. Essas cristas encontram-se na parte superior da epiderme e apresentam poros que excretam compostos do suor. Entre as cristas existem depressões, conhecidas como sulcos papilares. Normalmente, a impressão digital apresenta três sistemas de linhas: nuclear (região central do desenho papilar), basal (abaixo da região nuclear) e periférica (acima da região nuclear). A junção desses sistemas de linhas origina uma formação particular e específica, denominado delta. O delta classifica as impressões digitais quanto a sua presença ou ausência e posição. Ainda, as impressões digitais apresentam desenhos observados diretamentena pele do dedo e que são peculiares a cada pessoa. Esses desenhos ou tipos fundamentais classificam-se em: • Arco: desenho papilar formado apenas por linhas que percorrem o dedo de um lado para o outro sem apresentar o delta. • Presilha: é um conjunto de linhas que se inicia de um lado do dedo e, em um determinado ponto, recurva-se e volta para o mesmo lado em que se originou. Esse tipo de desenho papilar pode se apresentar como presilha interna, quando as extremidades livres da presilha estão voltadas para o lado esquerdo (interno) do observador e o delta para o lado direito, e presilha externa, quando as extremidades livres da presilha estão voltadas para o lado direito (externo) do observador e o delta para o lado esquerdo. • Verticilo: é um desenho papilar com um formato circular ou espiral presente no centro do dedo e que possui dois ou mais deltas. A C B D Figura 69 – (A) Arco. (B) Presilha interna com o delta marcado. (C) Presilha externa com o delta marcado. (D) Verticilo com os deltas marcados 122 Unidade II De acordo com os tipos fundamentais observados no polegar direito de cada pessoa, os indivíduos são agrupados em quatro grandes grupos, os quais, posteriormente, são divididos em quatro subgrupos com base nos tipos fundamentais do polegar esquerdo, perfazendo um total de dezesseis subgrupos. Ainda, existem subdivisões subsequentes de acordo com os algarismos da série, subdivididos a partir dos algarismos da seção. Tais divisões apenas foram possíveis devido à planilha ou ficha decadatilar (dez dedos) idealizada por Vucetich. Nela, há informações do indivíduo e, ao lado delas, duas fileiras com cinco espaços, cada uma para a inserção das cinco impressões digitais da mão direita (série) e das cinco impressões digitais da mão esquerda (seção), devendo ser seguida uma sequência padronizada. Nessa planilha, os tipos fundamentais são determinados por letras nos polegares e por número nos demais dedos da mão (arco – A ou 1; presilha interna – I ou 2; presilha externa – E ou 3; verticilo – V ou 4), originando um conjunto de caracteres denominado fórmula datiloscópica (ex.: V-1222/V-3333). Observação Uma ficha decadatilar compreende o conjunto das impressões digitais dos dez dedos das mãos de um indivíduo. Figura 70 – Ficha individual datiloscópia de Juan Vicetich O formato de análises das impressões digitais descrito anteriormente é preconizado para as buscas manuais. A comparação dos tipos fundamentais de impressões digitais constantes nas fichas decadatilares da identificação civil permite a classificação do indivíduo dentro de um determinado grupo, e não sua identificação, que só será possível por análise dos pontos característicos. 123 BIOMEDICINA FORENSE Pontos característicos datiloscópicos Os desenhos digitais apresentam pontos característicos que os diferem do comum devido à descontinuidade das linhas (acidentes), as quais podem ser observadas como confluência (forquilha), bifurcação, começo e fim de linha, cortada, empalme (encerro) e ilhota. Esses pontos característicos ocorrem de forma aleatória e não se repetem entre os indivíduos, sendo algo primordial para a identificação inequívoca de uma pessoa. A) B) C) D) E) F) G) H) Figura 71 – Alguns exemplos de pontos característicos: (A) fim da linha; (B) início da linha; (C) bifurcação; (D) confluência; (E) cortada; (F) dupla bifurcação; (G) trifurcação; (H) empalme Para fins criminais, o estudo das impressões digitais encontradas em local de crime, objetos, materiais, corpo, entre outros, é feito através da comparação inicial entre as impressões da vítima e do suspeito; caso não coincidam, a comparação passa a ser feita com toda a população. Esse confronto datiloscópico faz parte dos diversos exames periciais realizados em laboratório com o intuito de identificar a autoria do delito e, para tal, faz-se necessária a verificação de um número suficiente de pontos caraterísticos. 13 13 1 2 3 4 5 6 78 9 10 11 12 12 11 10 9 8 7 6 5 4 321 Figura 72 – Exemplo da aparência de um confronto datiloscópio 124 Unidade II 5.2.2 Revelação de impressões digitais em diferentes superfícies As impressões digitais podem estar presentes em diferentes superfícies e objetos do local do delito, incluindo as vestes e o próprio corpo da vítima. No entanto, para que elas permaneçam como vestígio, há dependência da dinâmica do contato, ou seja, se eventual ou persistente, longo ou rápido, acidental ou intencional, além das características da própria superfície. Pelo fato de existirem diferentes superfícies, a escolha de técnicas adequadas para a revelação das impressões digitais é de grande importância. A seguir são descritas as principais superfícies e técnicas utilizadas na perícia para revelação de impressões digitais. • Superfícies lisas e não porosas: são as mais comumente encontradas em local de crime, tais como vidro, estruturas de materiais e equipamentos, plásticos de montagem, entre outros, e nas quais a impressão permanece depositada, tornando-se mais frágil e de fácil destruição. As técnicas mais recomendadas para esse tipo de superfície são as de pó, vaporização por cianoacrilatos, aplicação de filmes finos crescidos em vácuo e pulverização catódica, podendo ser realizadas no próprio local do crime. Figura 73 – Impressão digital relevada com cianocrilato • Superfície rugosa e não porosa: presente na grande maioria dos materiais sintéticos, sendo a vaporização por cianoacrilatos, realizada dentro dos laboratórios, a melhor técnica utilizada. • Superfície porosa: destacam-se os papéis, papelão e madeira. Devido à porosidade desses materiais, a impressão digital migra para baixo da superfície, podendo se tornar latente por anos. A revelação da impressão digital nesses materiais ocorre no laboratório, através de reagentes líquidos que interagem com aminoácidos, com destaque para a ninidrina e seus derivados (DFO – 1,8 diazafluoren-9-one e IND – 1,2 indanedione), além de reagentes alternativos (fluorescamina, OPA e outros) e de produtos naturais (genipina e hena). Ainda, através do aquecimento do papel é possível revelar impressões digitais pela coloração contrastante que se forma, pois o papel apresenta propriedades térmicas diferentes dos compostos da impressão digital; a evolução de tal técnica propõe o uso de micro-ondas para a revelação. 125 BIOMEDICINA FORENSE Figura 74 – Impressão digital relevada com ninidrina • Plástico: devido às várias possibilidades de fabricação, são necessários diferentes reveladores (específicos para cada tipo). • PVC, borracha e couro: por serem materiais de difícil revelação, recomenda-se o uso de vaporizações em laboratório. • Fita adesiva: por apresentar duas superfícies distintas (uma lisa e outra com substância adesiva), deve-se utilizar duas técnicas diferentes e realizá-las no laboratório. A técnica mais empregada neste tipo de superfície é a revelação da impressão digital pela violeta genciana. • Metal não tratado: se a superfície metálica for pintada ou coberta com outro revestimento, deve-se utilizar a técnica de vaporização no próprio local do crime. Porém, recomenda-se levar esse tipo de material para o laboratório para aplicar a técnica de filmes finos. • Madeira não tratada e superfícies enceradas e oleosas: as técnicas devem ser realizadas em laboratório. Podem ser empregadas técnicas como ninidrina e nitrato de prata. • Tecido: é a superfície mais difícil de reter impressões digitais, dependendo de vários fatores como presença de sangue ou outro fluido biológico, exposição a chuva (ou molhado de outra forma), se o tecido estava em contato direto com a pele, o espaçamento entre as fibras etc. Nesse caso, pode-se utilizar a técnica de depósito de metal a vácuo. • Mancha de sangue: as impressões digitais feitas por sangue são visíveis, precisando apenas de tratamento para melhoria. Elas podem ocorrer de duas formas: quando a mão ou dedo é colocado sobre uma poçade sague ou quando a mão ou dedo sujo de sangue entra em contato com alguma superfície que permita a retenção e fixação da impressão digital (decalque em superfícies, parede, papel etc.). • Pele humana: apesar de difícil execução, atualmente existem técnicas para verificar impressões digitais na pele de indivíduos vivos e mortos. As mais utilizadas são as de cianoacrilatos em associação com pó magnético. 126 Unidade II Saiba mais Como visto, existem diversas técnicas que podem ser utilizadas na perícia para a revelação de impressões digitais, as quais são aplicadas de acordo com o tipo de superfície. Leia mais sobre o assunto acessando os artigos indicados a seguir. CHEMELLO, E. Ciência forense: impressões digitais. Química Virtual, dez. 2006. Disponível em: http://www.quimica.net/emiliano/artigos/2006dez_ forense1.pdf. Acesso em: 26 ago. 2020. MACEDO, I. O.; CAMPOS, A. F. C. Discussão da técnica de visualização térmica de impressões digitais em suportes metálicos. Disponível em: http://www.cpgls.pucgoias.edu.br/6mostra/artigos/SAUDE/IZABELA%20 DE%20OLIVEIRA%20MACEDO.pdf. Acesso em: 26 ago. 2020. Além da revelação de impressões digitais através de diversas técnicas, empregadas para as diferentes superfícies, atualmente vários trabalhos científicos demonstram a possibilidade da extração de material genético das impressões digitais para a realização de exame de DNA. Apesar de haver controvérsias sobre sua aplicabilidade pelos estudiosos, a estimativa da idade da impressão digital (verificação do tempo em que ocorreu o fato) também pode ser feita pelas características físicas da imagem que se deterioram. Com o tempo, o decalque das impressões digitais em superfícies começa a evidenciar as cristas papilares espalhadas, diminuindo os sulcos e deixando os contornos mal definidos. Essa distorção depende de vários fatores, como variação pessoal, concentração de substâncias orgânicas e inorgânicas, estresse, predisposição metabólica, dieta e idade, além de fatores ambientais. Mais recentemente, a partir de um trabalho científico, foi possível a datação de uma impressão digital através da eletrização, uma vez que o decaimento da carga elétrica superficial é mensurável. Figura 75 – Impressões digitais reveladas dentro de medidores de energia elétrica 127 BIOMEDICINA FORENSE Lembrete Papiloscopia ou datiloscopia é a área da criminalística que estuda as impressões formadas principalmente pelas projeções da pele nos dedos, denominadas digitais, que são únicas para cada indivíduo, mesmo no caso de gêmeos monozigóticos. Além da revelação de impressões digitais através das diversas técnicas, atualmente existe a possibilidade da extração de material genético das impressões digitais para a realização do exame de DNA. Exemplo de aplicação A papiloscopia poderia ser empregada em todos os casos de repercussão que estão sendo abordados como exemplos de aplicação. No caso de Isabella Nardoni, a papiloscopia poderia verificar e identificar as impressões digitais deixadas pelas manchas de sangue na maçaneta da porta de entrada do apartamento, na tesoura e faca utilizadas para cortar a tela de proteção, no lençol da cama onde foi observado um decalque de sangue da mão da vítima, entre outros lugares relacionados de forma direta e indireta ao caso. No caso de Elisa Samudio, a impressão digital da vítima, bem como as dos comparsas do crime, poderia ser observada no apartamento, no veículo Land Rover e na casa do sítio do acusado Bruno. Já no caso do zelador Jezi, poderiam ser verificadas impressões digitais do acusado Eduardo no serrote e em outros instrumentos utilizados no desmembramento do corpo, além das digitais da própria vítima no interior do apartamento onde aconteceram os fatos. A presença de todas essas impressões digitais nas diferentes superfícies poderia ter sido evidenciada pela aplicação de técnicas específicas, as quais podem ser executadas por biomédicos que atuam na área papiloscópica. 5.3 Medicina veterinária forense É a área de estudo que relaciona a saúde animal no âmbito penal, civil, trabalhista, administrativo, entre outros. Através de conhecimentos científicos, a medicina veterinária forense analisa o bem-estar animal (avaliação da dor, desconforto e estresse), a identificação de animais silvestres (verificação da origem, história de vida e morte), a segurança alimentar (fraudes alimentares e doenças transmitidas por alimentos de origem animal, inspeção sanitária no abate), além de realizar a patologia veterinária para determinação de causa, tempo e circunstâncias da morte. 128 Unidade II Quando acionado para verificar e tipificar o crime de maus-tratos de animais, em um primeiro momento o perito veterinário analisa o local de criação (espaço inadequado, sujidade e baixa luminosidade do local, infestação de insetos e/ou roedores, privação de alimento e água, umidade e calor excessivo do local, além da observação da presença de equipamentos de caça e outros, como de choque elétrico) e, em seguida, através do exame clínico, observa o aspecto geral do animal (porte atípico, arranchamento de penas e pelos etc.) e seu comportamento (acuado ou agitado). No exame clínico, o veterinário forense pode diagnosticar sintomas de desidratação, diversas lesões, como as de pele e as ortopédicas, aumento de temperatura, elevação da frequência cardíaca e respiratória, indicando maus-tratos. Adicionalmente, o perito veterinário pode utilizar análises laboratoriais complementares (toxicológicas, parasitológicas, microbiológicas e patológicas). Ainda nessa vertente, o veterinário forense verifica procedimentos e métodos empregados na eutanásia de animais para que não caracterize tecnicamente maus-tratos e, consequentemente, crime. A eutanásia é preconizada nos seguintes casos: quando o animal estiver com dor, estresse e sofrimento e que não tenha nenhum tratamento que possa aliviar tais sintomas; quando o animal representar uma ameaça à saúde pública e de outros animais; ou quando o animal for material de estudo e pesquisa. Outra situação analisada pelos peritos veterinários é o abate humanitário, que estabelece procedimentos técnicos desde o embarque do animal na propriedade rural até o momento da morte nos frigoríficos. Os animais de corte devem ser inicialmente insensibilizados e depois mortos de forma indolor, para que não configure maus-tratos. Figura 76 – Insensibilização de um suíno – procedimento técnico previsto para o abate humanitário de animais de açougue A perícia de animais silvestres inicia-se com a identificação da espécie, pois a legislação brasileira imputa diferentes penas em relação a animais domésticos e/ou exóticos e os ameaçados de extinção. Para a identificação do animal, primeiramente é feito o estudo morfológico (forma, tamanho, cor, aspectos da plumagem ou pelagem e algumas particularidades anatômicas). Esse estudo é realizado em animais vivos e mortos, carcaças, ovos, peles, pelos, penas, entre outros, e se baseia em fontes bibliográficas especializadas, podendo utilizar também instrumentos de medição, pesagem, ampliação e iluminação quando necessário. Ainda, a identificação do animal pode ser realizada através da vocalização (cantos de aves, rugidos, entre outros sons emitidos por eles). 129 BIOMEDICINA FORENSE A C B Figura 77 – (A) Complexidade da identificação morfológica em face da grande diversidade da fauna silvestre e exótica. (B) Objeto confeccionado com partes animais exigem conhecimento técnico especializado para a identificação das espécies envolvidas. (C) A identificação de ovos de aves silvestres ganha cada vez mais importância forense Atualmente, para identificação da espécie animal de forma inequívoca são empregadas as análises de DNA, principalmente em casos de identificação morfológica inconclusiva de ovos e carcaças ou fragmentos de corpos de animais que muitas vezes podem se assemelhar e passar por animais domésticos (alegação da defesa de acusados de crimesambientais). Os ovos são amplamente traficados devido à facilidade de acondicionamento e transporte e por terem menor visibilidade durante o processo de fiscalização em fronteiras e aeroportos. A análise de DNA também é uma ferramenta determinante na verificação e rastreamento da ancestralidade de animais, principalmente nos casos em que criadores de animais silvestres mantêm os exemplares (matrizes) de forma ilegal, oriundas do tráfico. 130 Unidade II Figura 78 – Técnica de venipunção jugular aplicada em exemplar de Ara ararauna (Arara-canindé) com fins de investigação de ancestralidade Já na área de segurança alimentar, o médico veterinário atua desde a produção e industrialização dos alimentos (controle de qualidade) até a fiscalização e investigação criminal. Os alimentos de origem animal são os mais investigados, uma vez que representam os principais veiculadores de doenças, como as intoxicações alimentares bacterianas. Além desses riscos biológicos, existem os riscos químicos, como uso de conservantes proibidos, adulterantes, fármacos e resíduos de processos industriais, e os riscos físicos (resíduos sólidos). Nesse contexto, o perito veterinário atua investigando possíveis contaminações nas instalações e nos processos produtivos e adulterações através de análises laboratoriais preconizadas para avaliação da idoneidade e inocuidade, evitando, dessa forma, irregularidades e fraudes. Observação Diz-se inócuo aquilo que não causa dano à saúde humana. A patologia veterinária é considerada uma ferramenta crucial na apuração de crimes de maus-tratos, envenenamento e morte de animais. Através da necropsia o perito veterinário pode determinar a causa, o tempo e as circunstâncias da morte, observando e evidenciando alterações macro e microscópicas de órgãos, tecidos e células. Ainda, o exame cadavérico pode ser complementado com algumas análises laboratoriais, como as toxicológicas, histopatológicas, citopatológicas, microbiológicas, entre outras. 131 BIOMEDICINA FORENSE CB A D E F Figura 79 – (A) Aspecto geral do animal, evidenciando lesões ao longo da lateral do corpo, sobretudo na face. (B) Lesões cutâneas à direita do corpo do animal. (C) Detalhe da lesão no membro anterior direito. (D) Hemorragia subcutânea na região da lesão. (E) Porção da traqueia e brônquios evidenciando transudato. (F) Fotomicrografia de pulmão evidenciando sinais de congestão e edema Com o exposto, observa-se a importância da medicina veterinária forense na revelação da verdade científica para a materialização de delitos e para a elucidação de crimes contra os animais. 5.4 Perícia audiovisual forense Atualmente, a maioria do conteúdo investigativo policial consiste em registros de áudio, produzidos por interceptações telefônicas e por gravações de áudio ambiental, e de imagens, reproduzidas por tomadas de imagens ou fotografias em campo ou por equipamentos de vigilância (câmera de circuito fechado de TV). Para que tais conteúdos sejam inseridos como provas materiais nos inquéritos policiais e nos processos judiciais, é necessária a descrição de um laudo pericial com todos os aspectos técnicos observados na execução das análises. 5.4.1 Divisão das análises audiovisuais As análises periciais em conteúdo audiovisual devem ser feitas nas mídias originais (primeiro registro do evento), pois cópias e reproduções podem apresentar alterações no formato original, serem adicionadas de degradações e elementos que mascarem indicativos de edição, dificultando a detecção de alguns elementos significativos e, consequentemente, a conclusão da perícia. Tais análises podem ser divididas em: comparação fonte/origem, análise de conteúdo e verificação de edição. 132 Unidade II Comparação fonte/origem São exames comparativos entre o vestígio questionado de um crime com um material padrão que o produziu (indivíduo ou objeto). Destacam-se nas análises audiovisuais a comparação do locutor, a comparação facial e a comparação de indivíduos ou objetos por imagens. As conclusões dos exames comparativos audiovisuais são baseadas na experiência prévia do perito criminal, e não em critérios científicos mensuráveis. Assim, a comunidade forense vem aceitando a apresentação dos resultados desses exames audiovisuais em uma escala de grandeza através do cálculo da razão de verossimilhança (likelihood ratio – LR), que determina por probabilidade matemática o envolvimento ou não de um indivíduo a um crime. O exame comparativo de registros de áudio e imagem (vestígio) de um crime com um determinado suspeito locutor (padrão) consiste em extrair dos registros questionados características específicas através das análises acústicas (avaliação da composição dos formantes – fonemas vocálicos característicos da anatomia do trato vocal do falante) e articulatórias (observação dos sons produzidos pela fala – características regionais e sociais, produção de fonemas particulares e a existência de características conversacionais ou de patologias específicas) que possam materializar e individualizar o crime. Dessa forma, os peritos fonoaudiólogos elaboram roteiros para o procedimento de coleta da voz do locutor (suspeito), dividindo-o em períodos de fala espontânea e de leitura de textos previamente descritos. Essa coleta de voz deve ter uma boa qualidade e quantidade, além de apresentar um lapso temporal curto entre o fato e a perícia. Atualmente, existem sistemas de reconhecimento automático de fala (FASR – Forensic Automatic Speaker Recognition) utilizado como ferramenta de apoio na comparação de locutor. A comparação facial e a comparação de indivíduos ou objetos por imagem para fins forenses compreendem uma análise preliminar das imagens, observação de parâmetros da imagem investigada, coleta consentida do suspeito (padrão de comparação), observação de parâmetros do padrão de imagem coletado e conclusão. Esse tipo de análise se torna inconclusiva quando se tem uma baixa qualidade das imagens devido à distância do indivíduo ou objeto em relação a câmera (variação de detalhes perceptíveis), a luminosidade do local, a resolução da câmera, o tipo de lente, entre outros fatores. No exame de comparação facial é observada a anatomia facial do indivíduo presente na imagem investigada com uma fotografia dele (padrão), a fim de traçar algumas características biométricas da face através de técnicas de processamento digital de imagem, fotogrametria e antropometria craniofacial. 133 BIOMEDICINA FORENSE Imagem 1 captada a uma distância adequada da câmera Trecho da imagem 1 recortado e ampliado: podem ser vistos diversos detalhes da face da pessoa Imagem 2 captada a uma distância excessiva da câmera Trecho da imagem 2 recortado e ampliado: vários detalhes e características potencialmente identificadoras são perdidos Figura 80 – Efeitos da captação de imagens em diferentes distâncias Figura 81 – Estimativa da altura de um suspeito a partir de imagens utilizando-se técnicas de fotogrametria Observação Fotogrametria é a técnica que utiliza medições obtidas a partir de fotografias ou imagens digitais para definir e estudar dimensões, formas e posições de objetos no espaço. 134 Unidade II Análise de conteúdo Nessa análise, o perito deve elucidar dúvidas inerentes ao conteúdo dos registros audiovisuais gravados, como falas inteligíveis, e desmascarar eventos do fato encobertos pela presença de ruídos; retratar a dinâmica dos fatos e elementos específicos de interesse, como a placa de um veículo, a estatura estimada do suspeito, entre outros, através de técnicas de filtragem e tratamento digital de imagens. Também na análise de conteúdo, principalmente de áudio, cabe ao perito fazer a transcrição fonográfica literal dos diálogos, ou seja, descrever e interpretar o conteúdo gravado. Verificação de edição Tem como finalidade verificar e detectar a existência de edições ou alterações (inserção, subtração ou remanejamento) no conteúdo dos registros audiovisuais atravésde técnicas de processamento digital. As principais ferramentas utilizadas na verificação de edição audiovisual são: softwares editores de áudio (Audacity, Sony Vegas, Adobe Audition, Cool Edit Pro, Praat, entre outros), que possibilitam caracterizar o sinal dos domínios de tempo e frequência de onda (espectrograma), identificar a existência de elementos indicativos de edições ou alterações e suprir ruídos ou melhorar a inteligibilidade de determinados trechos da gravação (filtros digitais); além de sistemas de reconhecimento biométrico por voz (voice fingerprint) utilizados nos exames de comparação de locutor, sendo os principais: FASR/ Batvox – Agnitio, Vocalise – Oxford Waver Research, ALIZE – SpkDet, entre outros. Já para as análises de imagens (fotografias e vídeos), utilizam-se os softwares ImageJ, Adobe Photoshop e o Gimp, os quais identificam a presença de edições e melhoram a qualidade da imagem através de filtros. Outros softwares como VirtualDub, Adobe Premiere, Vegas Video, Apple Final Cut e Avid Media Composer, além de realizarem as duas funcionalidades descritas, separam os fluxos de áudio e vídeo para a análise individualizada. Ainda, existem softwares (WinHex, Streameye e DeFraser) capazes de verificar detalhes sobre o equipamento utilizado para codificar o material audiovisual, obter informações de data e hora da gravação, indicar elementos sugestivos de processo de recodificação no material, bem como recompor e recuperar conteúdo de material audiovisual corrompido ou parcialmente apagado. A C B D Figura 82 – (A) Interface do software Audacity. (B) Interface do software Praat. (C) Interface do software ImageJ. (D) Interface do software VirtualDub 135 BIOMEDICINA FORENSE Exemplo de aplicação No caso do zelador Jezi, as imagens registradas pelas câmeras de segurança do edifício onde trabalhava mostram que no dia de seu desaparecimento, por voltas das 16h, Jezi entregou correspondência no apartamento do suspeito Eduardo, o qual já teria tido algumas desavenças com o zelador, descobertas em depoimento. Ainda, no mesmo dia, o suspeito aparece nas imagens das câmeras de segurança saindo do edifício com uma mala grande de viagem. Tais vestígios foram cruciais para ligar o crime de homicídio ao acusado Eduardo, evidenciando, dessa forma, a aplicabilidade da perícia audiovisual forense como auxílio na elucidação de um crime. 5.5 Psicologia e psiquiatria forense A psicologia e a psiquiatria forense atuam de forma determinante no tocante jurídico-penal quando se faz necessária a compreensão multifatorial de um crime, ou seja, se o discernimento ou autocontrole do criminoso tinha sido prejudicado por algum problema mental que interferisse na sua conduta (entendimento da ilicitude do fato) ou se o comportamento delituoso foi resultante apenas de motivações subjacentes, sendo observações importantes para a caracterização ou exclusão da culpabilidade do indivíduo diante de um crime ou do período de reclusão (redução da pena). Assim, a psicologia e a psiquiatria forense têm como objetivo identificar as circunstâncias que levaram o indivíduo ao crime e o seu histórico de comportamentos anteriores. Além disso, têm como foco de atuação a mediação de casais em litígio e a prevenção e tratamento de vítimas de violência doméstica e/ou sexual. Na esfera criminal, as perícias relacionadas a psicologia e psiquiatria forense podem ser solicitadas na fase investigativa, processual e de execução, sempre que houver dúvidas sobre a integridade ou saúde mental do acusado. Tais perícias devem adotar o sistema biopsicológico (estudo dos aspectos biológico e psicológico), o qual, além de atestar enfermidade, evidencia a manifestação da patologia no momento do crime. E, ainda, verificar algumas condições que possam influenciar o comportamento delituoso, como o uso de substâncias psicoativas (álcool e drogas ilícitas), a modificação no desempenho da funcionalidade do cérebro (sensopercepção, atenção, concentração, memória, sentimentos, emoções, coordenação motora, nível intelectual, entre outros) e a impulsividade. A perícia psicológica analisa a personalidade, o nível intelectual, as características psicosensoriais e afetivas e faz uma avaliação neuropsicológica, a fim de entender e não julgar o ocorrido. Após concluídas as análises, o perito confecciona um laudo ou parecer para a autoridade solicitante. Já a perícia psiquiátrica segue a conduta de uma consulta clínica, porém com o objetivo de produzir uma forma de prova judicial, figurada no laudo. Atualmente, outra análise relacionada a psicologia e psiquiatria forense que vem ganhando espaço na criminalística, principalmente nos casos de homicídios, é a caracterização do perfil criminal do suspeito como forma de complementar e até mesmo elucidar casos investigativos da polícia e/ou como insight da personalidade do criminoso, contribuindo nos trabalhos de acusação e defesa nos tribunais. Para 136 Unidade II tal análise é preciso conhecer a dinâmica psicológica e comportamental humana, o modus operandi (planejamento do criminoso em assegurar o sucesso do crime, proteger sua identidade e garantir sua fuga), a possível motivação para o crime e o comportamento físico e/ou sexual tanto do criminoso como da vítima escolhida; além disso, é necessária a verificação de marcas pessoais do criminoso (assinatura do crime), se elas se mantêm ou são similares a cada crime, como o local dos fatos ser o mesmo do despojo da vítima. A análise de caracterização do perfil criminal tem sido amplamente utilizada como ferramenta essencial na elucidação dos crimes em série, os quais são praticados na maioria das vezes por criminosos que apresentam alguma psicopatologia, e também nos crimes sem motivação aparente. Tal análise auxilia nas investigações policiais, diminuindo a amostragem de suspeitos e gerando estratégias de ação contra novos crimes e métodos de interrogatório mais eficientes. 5.6 Engenharia forense A engenharia forense surgiu da necessidade de periciar e avaliar, através da medição e demarcação, as terras em conflitos (disputas pela propriedade e posse da terra). A partir de então, a engenharia forense começou a ser utilizada para elucidar algumas questões pertinentes aos objetos correlatos na engenharia, como projetos, redes, sistemas, obras e equipamentos, e encontrar as possíveis causas associadas a acidentes, crimes e eventos catastróficos oriundos do emprego de ações que transformassem a natureza, visando a busca de uma infraestrutura adequada aos propósitos humanos. Atualmente, para caracterizar as provas periciais envolvendo a matéria técnica nas diferentes engenharias, compete aos engenheiros civis, industriais, mecânicos, eletricistas, de minas, agrônomos, aeronáuticos, cartográficos, florestais e navais o esclarecimento de questões tanto na esfera civil como na penal. Os principais exames solicitados na engenharia forense são: • exame documental de obra de engenharia relacionados a licitação, projetos e orçamentos; • exame de obra de engenharia para avaliação de custos e qualidade (edificação, estrada, barragem etc.). Os dois exames mencionados são realizados, principalmente, para compreender a alocação de recursos públicos em obras municipais, estaduais e federais quando há suspeita de desvios monetários. Para isso, deve-se verificar e assegurar através de documentos, do plano de trabalho, do projeto básico, do termo de convênio, da planilha orçamentária e do processo licitatório, a viabilidade técnica e os impactos ambientais do empreendimento, além de avaliar os custos da obra e definir os métodos e prazos de execução. Na maioria das vezes, esses exames demandam do perito engenheiro um árduo trabalho de pesquisa, com análise de custos e cálculos para descrever de forma minuciosa a possibilidade de desvios de recursos públicos na obra proposta. 137 BIOMEDICINA FORENSE C F B E A D Figura 83 – (A) Desabamento de trecho da ciclovia Tim Maia, no Riode Janeiro/RJ, em 2016. (B) Desabamento do Edifício Palace II, no Rio de Janeiro/RJ, em 1998. (C) Cenário devastado após o rompimento da barragem do Fundão, em Mariana/MG, em 2015. (D) Desabamento de parte de viaduto em construção em Fortaleza/CE, em 2016. (E) Matadouro público vistoriado: ausência de revestimento externo nas paredes. (F) Visão interna do matadouro público vistoriado: execução de piso diferentemente do originalmente previsto Na história da humanidade, alguns acidentes grandiosos ficaram registrados na memória coletiva como verdadeiros desastres/tragédias, descritos no quadro a seguir. Quadro 4 – Sinistros de grande repercussão envolvendo vítimas no mundo Natureza Evento Ano Náutica Naufrágio do Titanic (Oceano Atlântico) 1912 Química Vazamento de gás na fábrica da Union Carbide (Índia) 1984 Aeroespacial Explosão do ônibus espacial Challenger (EUA) 1986 Nuclear Explosão de reator na usina de Chernobyl (Ucrânia) 1986 Estrutural Colapso do World Trade Center (EUA) 2001 Adaptado de: Velho, Geiser, Espindula (2017, p. 323). Segundo sua origem, tais desastres ou tragédias são classificados como acidentais, naturais ou intencionais. Os acidentais se caracterizam como ocorrências involuntárias quando causados pela ação do homem, como colisões, desabamentos, explosões etc. Como exemplo de desastres/tragédias naturais temos os terremotos, que na maioria das vezes provocam desabamentos de edificações, sendo necessário verificar se tais edifícios, quando construídos, obedeceram às normas vigentes de prevenção de eventos sísmicos de grande magnitude. Já as tragédias ou desastres intencionais podem ser representados pelos atentados terroristas, como a queda das torres do World Trade Center, sendo que, nesse caso, os peritos engenheiros verificaram o comportamento da estrutura dos edifícios após o choque das aeronaves. 138 Unidade II Exemplo de aplicação Agora que você já sabe que os desastres ou tragédias podem ser classificados como acidentais, naturais ou intencionais, de acordo com sua origem, que tal fazer uma pesquisa a respeito dos mais frequentemente encontrados e das consequências associadas? Assim, para todos os casos de grandes acidentes (sinistros) em que se verificam não apenas prejuízos financeiros, mas também envolvem lesão corporal ou morte de vítimas em decorrência do fato, é obrigatória e prioritária a convocação da perícia criminal (perito oficial). Esse perito irá caracterizar o sinistro, determinando as causas e os responsáveis através de investigações árduas e minuciosas, sejam em obras de engenharia, máquinas e/ou equipamentos periciados. As investigações consideram vários aspectos, a saber: • sinistros envolvendo obra de engenharia (acidente do trabalho etc.); • levantamento em local de acidente envolvendo máquinas, equipamentos e veículos; • levantamento em local de desabamento; • levantamento em local de desmoronamento; • levantamento em local de inundação; • constatação de ligação clandestina de serviços, como energia elétrica, água, linha telefônica, TV a cabo (por se tratar de uma conduta criminosa, é necessária a realização de exame pericial para identificação da fraude referente às ligações clandestinas de serviços pelo usuário. Muitas vezes, tal perícia é acompanhada por um representante da concessionária do serviço para disponibilizar o acesso ao material de investigação ou, ainda, autorizar sua retirada para a realização de exames em laboratório a fim de materializar o crime); • levantamento em local de esbulho possessório; • levantamento em local de parcelamento e loteamento irregular; • demarcação de terras (em situações de invasão de propriedade, esbulho possessório ou parcelamento e loteamento irregular, a perícia realiza aferição da área investigada, buscando verificar seus limites legais, pela aplicação dos seus conhecimentos de topografia e georreferenciamento); • exame de constatação de danos ao patrimônio histórico, artístico e cultural (a constatação pelo perito de danos ao patrimônio histórico, artístico e cultural está diretamente relacionada às obras de engenharia – edificações, monumentos etc. – que tenham sofrido alguma alteração em suas 139 BIOMEDICINA FORENSE características construtivas, tipológicas, estruturais e dimensionais originais ou, ainda, a verificação da utilização de materiais e componentes inadequados em caso de reformas ou restauração. • constatação de emissão de fumaça, gás ou vapor; • avaliação de bens – imóveis, empreendimentos, máquinas e equipamentos (nos casos de avaliação de bens, o perito determina o método mais adequado a ser aplicado de acordo com a especificidade do objeto periciado; quando se tratar de imóveis, deve-se levar em consideração a área construída, localização, benfeitorias, disponibilidade de serviços, acessos viários, entre outras e, em relação a máquinas e equipamentos, verifica-se o fabricante, depreciação, estado de conservação, entre outras características relevantes). Atualmente, a demanda de solicitações de perícias da engenharia forense vem aumentando gradativamente no tocante à criminalística e ganhando novas perspectivas em relação à aplicabilidade de uma variedade de exames que possam propiciar uma celeridade no judiciário, além da apresentação de provas cada vez mais irrefutáveis para a materialização do crime. Dessa maneira, a engenharia forense vem constantemente aprimorando métodos de análise já existentes, além de se observar o surgimento de outros, aliados ao avanço tecnológicos, como o receptor GPS diferencial (precisão centimétrica), o ground penetrating radar (GPR), o scanner 3-D, a microscopia eletrônica de varredura (MEV) para inspeção e análise de superfícies fraturadas através da ampliação e resolução de imagens, o drone (para filmar e fotografar áreas de difícil acesso, fornecendo localização geográfica e gerando pontos georreferenciais com extrema precisão e passíveis de modelação em computador), entre outros. Com todos esses avanços, a engenharia forense vem conquistando credibilidade e poder de convencimento por parte das autoridades competentes e da sociedade. Observação Esbulho refere-se à perda da posse de um bem, independentemente de a pessoa ser proprietária ou possuidora, devido à tomada forçada por terceiros. 5.7 Informática forense Atualmente, os computadores, na maioria das vezes, encontram-se embutidos em outros dispositivos, sendo utilizados como meio e/ou alvo da prática de crimes. Ainda, o uso de redes de comunicação (internet) para a entrada e saída de dados colabora para que ocorram crimes virtuais ou cibercrimes como propagação de imagens de pornografia infantil, disseminação de códigos maliciosos, acesso a dados em sistemas computacionais sem a devida autorização, entre outros, uma vez que usuários inautênticos podem solicitar a realização de operações em nome de outros a distância, com os resultados dessas operações ilegais sendo enviados a usuários remotos. Dessa forma, a informática forense tem como intuito encontrar, analisar e apresentar os resultados de análises feitas em dispositivos computacionais em busca de evidências que apontem a autoria e materializem o crime. 140 Unidade II A realização de perícia em dispositivos computacionais é um grande desafio aos peritos devido à fragilidade física na manipulação desses equipamentos, desde a coleta até a apresentação da análise, e à possibilidade de destruição das evidências e na inserção de vestígios forjados por indivíduos com expertise na área de informática. Para uma melhor compreensão de crimes virtuais, observe o quadro a seguir. Quadro 5 – Associação entre crimes no mundo real e virtual Mundo real Mundo virtual Violação de domicílio: entrar numa edificação sem a devida autorização Hacking: invasão de um computador ou rede sem a devida autorização Extorsão: uso ilegal da força, posição ou autoridade para conseguir vantagens Extorsão na internet: invadir um sistema e exigirdinheiro ou vantagens para devolver o controle e/ou dados furtados Estelionato: obter vantagem ilícita induzindo ou mantendo alguém em erro Fraude na internet: usar a internet para realizar transações ou criar relações, sem oferecer a contrapartida devida Roubo de identidade: atribuir-se falsa identidade para obter vantagem Roubo de identidade: obter informações de identidade, passando-se por terceiro através de ardil usando computadores Exploração de menores: pedofilia, abuso ou pornografia infantil Exploração de menores: uso de computadores e internet para facilitar a exploração de menores Fonte: Velho, Geiser, Espindula (2017, p. 356). Quando o crime envolve computador, sem a internet como recurso, os peritos analisam a máquina suspeita (disco rígido, laptops, câmara fotográfica digital e filmadora, console de games, GPS, telefone celular, assistente pessoal portátil – smartphone, impressora, equipamento de fac-simile, modem 3G com memória, tocadores de MP3 etc.) e eventuais dispositivos de memória portáteis (disco rígido externo, cartão de memória, mídia renovável – CD, DVD, disquete, pendrive). Já quando o crime ocorre pela utilização de computador com internet, os peritos verificam o endereço IP (internet protocol) da máquina de onde partiu ou para onde foi destinado o comando ou os dados da investigação, sendo que na maioria das vezes é necessário um mandato judicial para que o mantenedor do servidor forneça informações a respeito. Em situações de busca e apreensão de dispositivos eletrônicos e computacionais, a arrecadação desses objetos para fins de elucidação de um crime deve seguir alguns cuidados, como o manuseio físico do equipamento, a perfeita acomodação e lacração, a vinculação do item a documentos que formalizem o processo e a garantia de que o conteúdo armazenado nos dispositivos possa ser validado. Quando o equipamento apreendido pelos investigadores da polícia se tratar de disco rígido de computador, a arrecadação deve obedecer a alguns critérios, como: • fotografar o microcomputador e seus periféricos; • enumerar os principais itens que formam o microcomputador; 141 BIOMEDICINA FORENSE • especificar as relações do microcomputador com seus periféricos e enumerar os elementos de conexão utilizados; • especificar as informações de tempo constantes no BIOS (basic input output system) e confrontá-las com o momento atual; • remover o disco rígido, registrando as conexões do disco à placa-mãe; • solicitar ao responsável pelo sistema as senhas de BIOS, sistema operacional e sistema aplicativo; • executar o cálculo do número verificador de integridade (resumo de todos os dados constantes em um dispositivo) através de equipamentos (Tableau TD3 e UFED Touch Ultimate) que também realizam uma cópia integral de dados de um dispositivo para outro; • consignar todas as informações em documento de arrecadação, identificando o responsável pelas atividades realizadas. 5.7.1 Exames periciais em informática forense Após a arrecadação dos dispositivos é feita a autenticação (verificação da integridade física e lógica) pelos peritos e, em seguida, a análise propriamente dita. Para a fase de análise é essencial que os peritos façam a duplicação (cópia) integral bit a bit dos dispositivos de armazenamento, mantendo o original intacto. Caso necessário, nessa cópia os peritos recuperam dados, identificam, transplantam e liberam os sistemas operacionais. Os principais exames periciais realizados em informática forense são descritos a seguir. Análise em dispositivos de mídia de armazenamento computacional Consiste em recuperar dados apagados e/ou ocultados e buscar por palavras selecionadas (chaves) para a elucidação do caso. Análise de adulteração de dados e tempo de um sistema computacional Determina se as informações temporais presentes em uma mídia de armazenamento correspondem à realidade. Análise de registros de acesso a dados de um sistema computacional Análise da sistemática de registros de acessos adotada pelo sistema (operacional ou aplicativo) a fim de verificar o acesso, o cadastramento e/ou modificação em um determinado tempo. 142 Unidade II Análise de crimes relacionados à internet Essa análise se divide em três tipos: • Análise de sítio de internet: consiste em rastrear todos os hiperlinks de uma página através da recuperação de um sítio para a materialização e navegação off-line. São exemplos divulgação de material proibido, propaganda enganosa, difamação e calúnia (ponto focal de redes sociais Instagram e Facebook), entre outras situações. • Troca ilícita de informação usando a internet: atualmente, a internet, por ser a principal fonte de troca de informações, viabiliza também a divulgação de conteúdos ilícitos, como a troca de imagens e vídeos sexuais de crianças e adolescentes, materiais protegidos por direitos autorais (softwares de músicas e filmes) através das redes peer-to-peer (eDonkey2000, GnuTella e KazaA), usando programas (e-Mule etc.) e baseados em arquivos torrents. Para a elucidação desse tipo de crime, os peritos buscam pelo IP que está oferecendo tais arquivos (filmes e vídeos sexuais, materiais protegidos), bem como identifica o IP e o provedor de internet detentor desse IP. • Análise de conversação usando internet: os programas de comunicação instantânea (MSN, Skype, Yahoo!, Messenger, WhatsApp, Telegram) correspondem aos principais meios de conversação entre pessoas atualmente e, portanto, são ferramentas muito úteis para descoberta e certificação de alguns tipos de crimes (tráfico de drogas, assassinatos, pedofilia etc.). Lista de contatos, gravação voluntária de conversações, lista de chamadas e mensagens trocadas podem ser analisadas. O programa WMM é utilizado pelos peritos criminais para a verificação de crimes praticados com o suporte de programas de comunicação na internet. Análise de sistemas de informação Nesse tipo de análise o perito deve estabelecer o funcionamento do sistema, que depende de informações obtidas na fase de arrecadação, verificar o registro de conexões do equipamento com outros, a arquitetura do sistema de informação (stand-alone, cliente-server), a dependência de hardware específico para execução, entre outras características. Portanto, nesses casos cabe ao perito: • estabelecer o funcionamento do sistema em um ambiente controlado; • liberar proteções e senhas que o sistema eventualmente possua; • identificar as políticas de acesso; • identificar os mecanismos de registro de ocorrências que o sistema implementa; • reconstruir um processo de instalação do sistema se o original não estiver disponível; • estabelecer um procedimento para que outros peritos possam instalar e executar o sistema por seus próprios meios para a realização de exames finais. 143 BIOMEDICINA FORENSE Fraude bancária via internet Nos dias atuais, devido à realização de diferentes transações bancárias on-line, há um aumento das tentativas de fraudes, as quais consistem na obtenção do número da conta-corrente e da respectiva senha, para posterior execução de saques de contas de terceiros com cartão falso, transferência de valores para conta de laranjas e pagamento de contas e compras com dados usados como cartão de débito. O procedimento utilizado pelo criminoso para furtar senhas bancárias, conhecido por phishing scam, é induzir o usuário a acessar um hiperlink que contenha e instale um programa espião em sua máquina que, quando identifica a interação do usuário com um sítio de instituição bancária, captura a conta e a senha, enviando-as automaticamente para o e-mail do criminoso. Nesses casos, em um primeiro momento a perícia visa determinar quem é o participante da conversação ou o responsável pelo envio de e-mails maliciosos ou falsas mensagens que induzam a vítima a instalar o programa espião. Tal procedimento pode não ser efetivo devido ao e-mail enviado ou à conversação ter acontecido da máquina de um terceiro que já esteja infectada
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