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SOCIOLOGIA P EDAGOGIA Sumário UNIDADE I – TEORIAS SOCIAIS: Marx, Weber e Durkheim ............................................................ 4 UNIDADE II – SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLA ............................................................................. 15 UNIDADE III – TEORIAS REPRODUTIVAS E COMPENSATÓRIAS DA EDUCAÇÃO ............................. 25 UNIDADE IV – TEORIA CRÍTICA E EMANCIPATÓRIA PARA EDUCAÇÃO ESCOLAR .......................... 35 BIBLIOGRAFIA................................................................................................................................. 45 UNIDADE I – TEORIAS SOCIAIS: Marx, Weber e Durkheim Para iniciarmos nossa conversa, precisamos pensar sobre o que é a Sociologia e, principalmente, o que é Sociologia da Educação. A Sociologia é a ciência que estuda os mecanismos de funcionamento das instituições sociais, as relações entre as pessoas e tais instituições. Podemos dizer, então, que a Sociologia da Educação é o ramo da Sociologia que estuda os mecanismos de funcionamento das instituições especificamente voltadas para o ensino, ou seja, estuda a própria escola e como ela se relaciona com a sociedade. A Sociologia, como ciência, tem em Karl Marx, Max Weber e Émile Durkheim seus mais renomados pensadores, sendo considerados os clássicos da Sociologia. Isto porque eles elaboraram análises sociológicas fundamentais para o entendimento de como se constitui a vida em sociedade. Suas análises foram produzidas no momento em que a sociedade capitalista estava se consolidando. Mas é também importante destacar dentro do estudo da Sociologia, concepções como o Liberalismo, surgido no século XVIII e ganhando força no século XX, e como influenciaram as concepções de educação e sociedade. 1. Karl Marx e a crítica ao Capitalismo Karl Marx foi um dos mais notáveis pensadores sobre o capitalismo. Embora não tenha sido o primeiro a escrever so sobre a sociedade capitalista, foi, certamente, quem mais i influenciou as posteriores análises críticas. Mas como Marx via a sociedade capitalista? K. Marx (1818 -1883) E o que ele criticava nela? Marx dizia que o modo de produção capitalista era superior a todos os outros até então conhecidos, sobretudo por sua eficiência em produzir mercadorias. As forças produtivas do capitalismo tendiam a superar todos os outros modos de produção, expandindo-se para o mundo todo. Quanto mais elas se expandiam, mais o capitalismo transformava tudo em mercadorias e assim, o mundo se transformava em um grande mercado. Marx afirmava que há dois tipos de mercado: o “mercado” físico. Um lugar concreto, visível onde as pessoas vão trocar produtos por outros produtos. No caso das sociedades modernas o dinheiro passou a ser o equivalente geral de trocas. E há outro tipo de mercado que começou a ganhar forma a partir do momento que a história chama de Idade Moderna (Séculos XVI o XVIII). É um mercado mais amplo, genérico, invisível: o mercado capitalista. Este mercado, apesar de se sustentar em trocas concretas, é um mercado de difícil apreensão, porque não se limita a um lugar específico e vai se tornando cada vez mais complexo. É possível afirmar que as grandes navegações, os grandes “descobrimentos” e as chamadas revoluções burguesas (Independência norte americana – 1776, Revolução Francesa – 1789/1798) deram “corpo” a este novo mercado. Não podemos nos esquecer da Revolução Industrial (meados do século XVIII) que revolucionou e, ainda hoje, revoluciona o nosso modo de vida. Os ideais de liberdade, igualdade, democracia, cidadania ganharam força com a Revolução Francesa por meio da luta revolucionária que marcou a ascensão da burguesia. Mas com a consolidação do capitalismo (século XIX) esta mesma burguesia enriqueceu evidenciando, assim, a miséria dos trabalhadores. A industrialização e a urbanização promoveram profundas transformações no modo de vida de grande parcela da população. Porém a grande maioria não pode se beneficiar dos avanços e progressos que a sociedade alcançava. Em sua análise, Marx percebeu as contradições do modelo capitalista e denunciou a situação de desigualdade social que este modo de produção gerava. A partir deste olhar, propôs um projeto de luta revolucionária que pudesse superar as contradições e as desigualdades que ele percebera e denunciava. Em seu célebre livro O CAPITAL, Marx faz uma sofisticada elaboração da sociedade capitalista. O pressuposto básico desta elaboração é que essa sociedade está dividida em classes sociais com interesses opostos: de um lado os donos dos meios de produção, com interesse em ampliar e preservar sua propriedade. Do outro, os trabalhadores, com interesses nas reivindicações de benefícios como salário ou melhores condições de trabalho, por exemplo. 2. Max Weber e a Teoria da Ação Social Weber tinha uma concepção de sociedade diferente de Marx. Marx acreditava que o proletariado (conjunto dos trabalhadores) promoveria as transformações necessárias à superação das desigualdades sociais. Weber acreditava que os conflitos são resultantes de M. Weber (1864 -1920) interesses que nunca serão superados. Marx centrava sua análise nas relações entre as classes sociais; era otimista em relação ao futuro da humanidade e acreditava na força revolucionária do proletariado. Weber analisava o significado das ações dos in divíduos; era mais pessimista e centrava sua análise na abordagem nos interesses que motivavam as ações. Um dos conceitos básicos com os quais Weber constrói sua ideia de sociedade é o de ação social. Uma ação é social quando aquele que age o faz em função de um sentido previamente atribuído à sua relação com outro ou outros. A realidade social é uma teia de significados construída pelos indivíduos em ação. Weber elaborou uma sociologia da AÇÃO SOCIAL, demonstrando que a sociedade resulta de múltiplas interações de indivíduos em determinado meio. Para Weber os trabalhadores podem até agir de modo semelhante, visando a defender os mesmos interesses, quando, por exemplo, fundam um sindicato. Porém, nem todos os trabalhadores sindicalizam, e nem todos que se sindicalizam lutam pelos interesses da categoria, porque, segundo Weber, são eles próprios que atribuem sentidos as suas ações. Esses agentes atribuem sentidos diferentes às suas ações porque as coisas têm significados diferentes para eles. Desta forma, para Weber, não havia nada que pudesse mover TODOS os indivíduos na luta pela transformação da realidade. Weber identifica quatro tipos de ação social: AÇÃO TRADICIONAL – é a ação motivada pelo valor da tradição, pelo costume arraigado. Algo é tradicional em um meio quando é repetido ao longo do tempo, com pouca ou nenhuma modificação. AÇÃO AFETIVA, ESPECIALMENTE EMOCIONAL – é a ação movida por um estado emocional, seja demonstrando afeição, alegria, seja demonstrando tristeza, ódio, rancor. AÇÃO RACIONAL REFERENTE A FINS – é a ação pensada, calculada, planejada, orientada, especificamente, por uma finalidade que se deseja atingir. Quando fazemos um projeto, apontamos os objetivos, isto é, os fins, as metas que pretendemos atingir e os meios através dos quais pretendemos atingir tais fins. AÇÃO RACIONAL COM RELAÇÃO A VALORES – é também uma ação pensada,planejada, orientada. Porém, quem age orientado pelos valores não está interessado em criar algo novo. Age em função de algo que está “na moda”. Ainda que as ações sociais possam ser concretamente verificáveis, o resultado delas somente pode ser pensado como probabilidade. Mesmo as ações racionais, bem planejadas, calculadas e orientadas podem resultar no oposto do que se desejava. Isto porque os interesses de quem “planejou” podem ser diferentes daquele para quem ele planejou. 3. Émile Durkheim e a Sociologia da Educação Durkheim é o sociológico por excelência, pai da Sociologia geral e da Sociologia da Educação em particular. Para ele a sociedade é um conjunto integrado de fatos sociais. E o que o fato social? É tudo aquilo que tem existência própria, E. Durkheim (1858- 1917) independente das manifestações e juízos individuais, e que exerce sobre os indivíduos uma coerção exterior. E como se manifesta esta coerção? Quando nascemos, diz Durkheim, encontramos todo um sistema de crenças, normas e valores já constituídos ao qual devemos ser incorporados através da educação. Por isso, ele afirma que a sociedade exerce uma COERÇÃO sobre os indivíduos. A educação é uma das formas de exercício dessa coerção porque toda atividade pedagógica supõe um esforço de permitir aos indivíduos internalizarem algo já constituído. A língua, as leis, as normas da convivência coletiva, diz Durkheim, precede o nascimento dos indivíduos. É tarefa da educação ir permitindo aos indivíduos a apropriação dessas normas. Caberia às instituições de ensino difundir valores que proporcionassem a COESÃO SOCIAL. Durkheim afirma que a coerção é um instrumento fundamental para que haja a coesão social, isto é, integração dos indivíduos à sociedade. Quando os indivíduos acham que podem agir sem obedecer aos regulamentos, as pessoas podem ser punidas pela transgressão. Segundo ele, a vida social é regulada pela solidariedade social. A solidariedade social é um fator de coesão social que vai se distanciando de acordo com o grau de divisão do trabalho e pode ser dividida em solidariedade mecânica e solidariedade orgânica. Na solidariedade mecânica há baixo grau de divisão de trabalho. Mas o que isso quer dizer? Pensemos em uma tribo indígena. O partilhamento coletivo de valores e normas de conduta são muito semelhantes, ou seja, o grau de diferenciação entre os indivíduos é muito baixo. Todos os membros desta comunidade partilham um mesmo conjunto de crenças muito firmes e aceitas coletivamente. Neste caso a educação é também pouco variável, pois a ela cabe o papel de difundir sempre os mesmos costumes, os mesmos padrões de comportamento, os mesmos hábitos e valores. Nas sociedades modernas há um maior grau de divisão do trabalho. À medida que esta divisão do trabalho vai aumentando o nível de diferenciação social aumenta progressivamente. Isto ocorre em função da especialização de funções exercidas pelos indivíduos. De acordo com Durkheim, esta é uma tendência das sociedades modernas que consiste em produzir maior cooperação no trabalho que por sua vez aumenta a divisão do trabalho, exigindo, cada vez mais, especializações dos indivíduos para exercerem funções sociais mais específicas. Este tipo de cooperação, que resulta uma coesão, Durkheim chama de solidariedade orgânica, exigindo aumento da escolarização, cabendo a escola a formação deste indivíduo/trabalhador para a realização de tarefas que esta divisão do trabalho exige. Como podemos ver há distanciamentos e aproximações entre estes três pensadores. PRINICPAIS DIFERENÇAS ENTRE WEBER E DURKHEIM Para Weber o que constituía objeto de análise sociológica eram as ações individuais, enquanto para Durkheim a Sociologia é a ciência dos fatos sociais, isto é, das instituições – língua, família, religião, igreja, casamento, escola, estado, trabalho, etc. Weber centrava sua análise nos conflitos de interesses e nas relações de dominação. Durkheim analisava os fatores ligados a ordem social. PRINCIPAIS DIFERENÇAS ENTRE MARX E DURKHEIM Marx analisava a sociedade observando, principalmente, suas contradições e seus conflitos, enquanto Durkheim analisava a sociedade observando, principalmente, o consenso, isto é, como é possível que a ordem e a integração nela existam. Marx acreditava na revolução do proletariado e que tal revolução resolveria o problema de desigualdade entre os homens. Durkheim acreditava que as mudanças desejadas seriam alcançadas através da educação. Durkheim vê a divisão do trabalho de uma maneira diferente da de Marx. Enquanto Marx analisa a sociedade sob a perspectiva da contradição e do conflito, Durkheim centra-se na questão do consenso, perguntando como a ordem e as estabilidades sociais são possíveis e como a educação deverá estar a seu serviço. Além de teórico ele tentou realizar, na prática, suas ideias e criou a disciplina Sociologia da Educação, que ministrou, por muitos anos, em cursos de formação de professores na França. Para Durkheim, educação é o mesmo que socialização e tem por objeto formar o ser social, isto é, tornar o ser egoísta que somos ao nascer, em ser socialmente ajustado. Toda criança deseja que o mundo seja seu. É através da educação que ela aprende a conviver na sociedade, reconhecendo o outro. Esse ser social é produto da coerção exercida pela sociedade, que tende a moldar a criança a sua imagem, “pressão de que tantos os pais quanto os mestres não são senão representantes e intermediários.” (Durkheim, 1990:5). A sociedade é vista por Durkheim como um conjunto integrado de fatos sociais. Esses fatos sociais (instituições) exercem sobre o indivíduo uma coerção exterior. Dessa forma, família, igreja, escola, Estado são instituições que, através de seus intermediários se impõem sobre os indivíduos, moldandoos à sua imagem. Tais instituições são socializadoras, pois para esse pensador, socializar é fazer com que os indivíduos partilhem ideias e normas vigentes em uma sociedade. Durkheim atribuía à escola uma importância fundamental por dois motivos: • Caberia à escola desenvolver aptidões individuais permitindo aos indivíduos se adequarem à divisão do trabalho; • Escola com papel importante de no processo de socialização, criando e difundindo ideias que reforçam as estruturas da sociedade. Encontramos em Durkheim uma definição para EDUCAÇÃO. Para ele educação é: A ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social; tem por objeto suscitar e desenvolver na criança certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política no seu conjunto e pelo meio especial a que a criança, particularmente, se destine. (DURKHEIM, 1987:42) É importante compreender esta definição de educação oferecida por Durkheim, pois nela aparecem dois aspectos em que a maioria dos sistemas de ensino se sustenta: os aspectos UNO e MÚLTIPLO da educação. Para ele “não existe sociedade na qual o sistema de educação não apresente duplo aspecto: o de ser, ao mesmo tempo, uno e múltiplo”. (Durkheim, 1987). ASPECTO UNO Neste aspecto a educação constitui uma base comum de conhecimentos partilhados indistintamente por todos os indivíduos. Segundo Durkheim, “não há povo em que não exista certo número de ideias, de sentimentos e de práticas que a educação deve inculcar a todas as crianças, indistintamente, seja qual for a categoria social a que ela pertença.” (Durkheim, 1987:41). Podemos perceber este aspecto uno, quando pensamos nas disciplinas ensinadas na escola, como por exemplo o ensino de uma Língua. Mesmoexistindo variações linguísticas regionais, ensina-se uma língua padrão em todas as escolas do país. ASPECTO MÚLTIPLO A diferenciação social e a especialização de funções no âmbito da crescente divisão do trabalho fazem com que a educação não possa ser a mesma para todos os indivíduos em todo período educacional. Para atender à diversidade de funções provocada pela divisão do trabalho, faz-se necessário que haja uma educação diferenciada. E quem promove uma educação diferenciada de acordo com esta diversidade, é a escola. Esse aspecto múltiplo da educação se refere não apenas às diversidades regionais, mas também às opções diferenciadas que os indivíduos vão fazendo, por exemplo, ao escolherem suas carreiras profissionais. É por essa via do uno e do múltiplo que a educação vai exercendo sua função homogeneizadora (aspecto uno) e diferenciadora (aspecto múltiplo). Émile Durkheim tinha uma grande expectativa em relação ao papel da escola como instituição educadora, encarregada de desenvolver aptidões individuais numa sociedade que exige, cada vez mais, qualificação de seus trabalhadores. É ela que impedirá a desagregação social, na medida em que permitir a realização social dos indivíduos. Para ele a educação é essencialmente boa. Tão boa que os indivíduos se sujeitam à submissão social, “porque o novo que a ação coletiva, por intermédio da educação, assim edifica, em cada um de nós, representa o que há de melhor no homem, o que há em nós de propriamente humano.” (Durkheim, 1987:45). PARA LEMBRAR: MARX faz uma análise crítica da divisão técnica do trabalho, porque ao parcelar as atividades do processo de produção, essa divisão técnica leva os trabalhadores a desenvolver habilidades m uito parciais e limitadas. DURKHEIM, ao contrário, diz que as pessoas tem habilidades apenas parciais, cabendo a educação desenvolver essas habilidades para que à medida que cada um faça uma tarefa, o processo se realize no seu todo. OS IDEAIS LIBERAIS OS IDEAIS LIBERAIS O Liberalismo é uma concepção que teve em Adam Smith e John Locke uns de seus maiores pensadores. Surgiu no século XVIII, influenciado pelo iluminismo e pelos ideais de liberdade defendidos pelas revoluções burguesas na Europa, principalmente a Revolução Industrial e a Francesa. O Liberalismo defendia, incialmente, a liberdade de mercado e a liberdade política, se contrapondo ao controle estatal (Governos Absolutistas) da época. Pregava a liberdade individual e igualdade perante a lei, ou seja, o povo não poderia ser subjugado a vontade do monarca, pois assim estaria impedindo os princípios de liberdade e igualdade. No campo econômico, o liberalismo, defendia o direito à propriedade e ao livre mercado, com pouca ou nenhuma intervenção do Estado. Tal intervenção era vista pelos pensadores liberais como privação da liberdade, pois impediria a prosperidade individual e ficaria destinada a alguns setores da sociedade. Segundo eles, a economia, por si só, encontraria meios para equilibrar-se. Como filosofia, o liberalismo emerge no século XX, influenciando os regimes econômicos e políticos da modernidade. Defendendo as ideias de democracia, os Estados Democráticos tem como função garantir os direitos individuais dos cidadãos. O Liberalismo ganha força no final da década de 1980 e início da década de 1990 (o chamado Neoliberalismo) com as profundas mudanças econômicas e sociais nos países socialistas europeus. Um dos exemplos mais notável, talvez seja o da Alemanha Oriental, que abandonou o sistema socialista e se integrou a Alemanha Ocidental, capitalista, em 1989. Muitos países, principalmente da Europa Oriental com orientação política e econômica mais socialista, no final do século XX também começaram a adotar uma política mais liberal (ex-URSS, Polônia, Romênia entre outros). De acordo com Oliveira (1996), o sistema burocrático controlado rigidamente pelo Estado “está sendo substituído por formas mais flexíveis de organização política e econômica, com pluripartidarismo e menor participação do Estado na economia”. (OLIVEIRA, 1996:64). Mas que relação existe entre o Liberalismo e a Educação? Aprofundaremos esta discussão na disciplina História da Educação, quando estudaremos um pouco sobre alguns pensadores dessa corrente e como eles pensavam a educação dentro deste novo sistema político e econômico. UNIDADE II – SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLA Na unidade anterior tivemos o primeiro contato com a Sociologia da Educação. De um modo geral vimos como o modo de produção capitalista fez surgir uma questão social que fez emergir uma nova ciência. Essa nova ciência, a Sociologia, precisava dar uma resposta para essas questões. Várias foram as respostas que autores, considerados clássicos, como Karl Marx, Max Weber e Émile Durkeim, deram aos problemas que esta nova ordem social trazia. Neste contexto, pudemos perceber como a escola foi adquirindo centralidade como instituição educadora e muitas expectativas foram sendo criadas de que a escola pudesse solucionar tais problemas e pudesse funcionar como elemento de reconstrução da sociedade em crise. Nesta unidade vamos dialogar sobre três questões centrais: o que é cultura e qual a relação entre sociedade, cultura e escola; a segunda questão está relacionada à mobilidade social; e a terceira está relacionada à mudança social. ❖ SOCIEDADE, CULTURA E ESCOLA O que é cultura? O que é conhecimento? Como a escola se posiciona frente ao conhecimento? De que conhecimento se trata? Vamos analisar como a escola moderna, que foi se constituindo no capitalismo, seleciona determinados componentes da cultura para ensinar aos alunos. Sabemos que o conhecimento das pessoas que vivem em zona rural é diferente do conhecimento das pessoas que vivem na cidade; que o conhecimento dos brasileiros é diferente do conhecimento dos chilenos; que o conhecimento prevalecente na população ocidental é diferente do conhecimento das pessoas que vivem no oriente. Há um conhecimento diretamente ligado ao exercício das atividades práticas, denominado conhecimento empírico; e outro ligado às atividades do pensamento, o conhecimento teórico. Há, também, o conhecimento que circula no conjunto da população, o senso comum e um conhecimento que circula entre grupos específicos, o conhecimento restrito. E há tipos de conhecimento que cabe à escola difundir: humanístico, científico, técnico, artístico, etc. O termo cultura é de difícil apreensão. Não porque lhe falta uma definição, mas por ter muitas. Então deveríamos falar em “culturas” ou a “cultura do plural” como destaca Michel de Certeau (1995). Como associar então, conhecimento e cultura? Marilena Chauí, filósofa brasileira, nos diz que o termo cultura deriva do latim, colere e se referia ao cuidado com a terra, as plantas e os animais, bem como ao cuidado com as crianças; era ainda expressão de adoração aos deuses (culto), designando, então, o indivíduo de espírito cultivado. (Chauí, 1994:11) Jean-Claude Forquin (1993), em seu livro Escola e Cultura, identifica e discute cinco diferentes acepções para o termo cultura: tradicional, descritiva, identitária, universalista-unitária e a filosófica. 1. ACEPÇÃO TRADICIONAL: “conjunto das disposições e das qualidades do espírito cultivado” (Forquin, 1993:11). Desta acepção tiramos o conceito de sujeito culto, ou seja, aquele que “cultivou o espírito”, acumulando um vasto conjunto de conhecimentos. É uma visão individualista e elitista da cultura, pois o indivíduo erudito, ilustrado, portador de um saber enciclopédico é formado na tradição da melhor educação humanística e filosófico-científica. 2. ACEPÇÃO DESCRITIVA: está em oposição à primeira acepção (tradicional); relaciona-se à acepção descritiva desenvolvida pelas ciências sociaiscontemporâneas (Sociologia e Antropologia). Nesta acepção “cultura é considerada como o conjunto dos traços característicos do modo de vida de uma sociedade, de uma comunidade ou de um grupo, aí compreendidos os aspectos que se podem considerar como os mais cotidianos, os mais triviais ou os mais „inconfessáveis‟”. (Forquin, 1993: 11). Sob essa perspectiva, constituem a cultura todas as manifestações de um povo. Nesse sentido, não há povo nem indivíduo sem cultura, Há culturas diferentes, e diferentes manifestações. 3. ACEPÇÃO IDENTITÁRIA: essa acepção entende a cultura como “um patrimônio de conhecimentos e competências de instituições, de valores e de símbolos, constituído ao longo de gerações e característico de uma comunidade humana particular” (Forquin, 1993:12). Surge aqui o conceito de „identidade cultural‟. Há um “patrimônio de conhecimentos e competências” que distingue as pessoas do campo daquelas que vivem na cidade ou daquelas que vivem no ocidente daquelas que vivem no oriente. A identidade cultural de um povo depende de sua própria história. 4. ACEPÇÃO UNIVERSALISTA-UNITÁRIA: se refere “a ideia de que o essencial daquilo que a educação transmite (ou do que deveria transmitir) sempre, e por toda parte, transcende necessariamente as fronteiras entre os grupos humanos e os particularismos mentais e advém de uma memória comum e de um destino comum a toda a humanidade”. (Forquin, 1993: 12). Por exemplo, vivemos no Brasil, temos aquilo que nos distingue como brasileiros, é claro. Mas nossa „memória comum‟, nos remete a civilização Judaico-Cristã e não ao Budismo ou ao Hinduísmo, por exemplo. 5. ACEPÇÃO FILOSÓFICA: afirma ser a cultura “antes de tudo, um estado especificamente humano”, ou seja, “aquilo pelo qual o homem distancia-se da natureza e distingue-se especificamente da animalidade”. (Forquin, 1993: 12). Diante da elaboração destas acepções para o termo cultura, Forquin nos traz para uma grande reflexão. Diz ele “é preciso reconhecer que sempre, e por toda parte, a educação implica um esforço voluntário com vistas a conferir aos indivíduos (ou ajudar os indivíduos a adquirir) as qualidades, competências, disposições, que se tem por (...) desejáveis, e que para isso nem todos os componentes da cultura no sentido sociológico são de igual utilidade, de igual valor”. (Forquin, 1993:11). Ou seja, a escola, como instituição que está a serviço da transmissão cultural, faz com que certos aspectos da cultura sejam reconhecidos como mais relevantes que outros, ocupando assim, um lugar privilegiado como objeto de ensino. A grande questão é: Quem define o que é mais relevante para compor os currículos e os respectivos conteúdos que se ensinam nas escolas? Que relações de poder se estabelecem entre aqueles que definem a constituição das redes de escolarização? Não são questões fáceis de responder, mas cabe refletirmos, neste momento, o papel importante do professor como mediador cultural na escola. ❖ DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, MOBILIDADE SOCIAL E EDUCAÇÃO Já ouvimos, algumas vezes, que a educação é associada ao desenvolvimento econômico, a mobilidade social. Mas o que isso realmente quer dizer? No final do século XVIII, a burguesia revolucionária passou a exigir educação para todos, educação como direito do cidadão e dever do Estado. Vamos analisar se esta exigência de uma educação para todos foi se realizando ou não e como vai se estabelecendo a relação estrutura social e desempenho escolar. Para compreendermos essas questões é importante compreendermos dois conceitos presentes na estrutura da sociedade: o liberalismo e o neoliberalismo. O sistema capitalista em uma liberdade formal se implantou sob duas orientações gerais: o liberalismo econômico, que se expressava pela liberdade de mercado e o liberalismo político, que se expressava na liberdade de ação dos cidadãos. Um se nutrindo do outro. O capitalismo então é um modo de produção que se alicerça no liberalismo: o liberalismo econômico que sustenta que o modo de produção é regido por leis naturais e não cabe ao Estado interferir na economia; e o liberalismo político assegura que os indivíduos são livres para realizar seus empreendimentos. Ao Estado, cabe somente, garantir oportunidades iguais para todos. Ao longo do século XIX, os ideais de liberdade e igualdade trazidos pelo liberalismo começaram a ser questionados. Ao mesmo tempo que o modo de produção capitalista se mostrava cada vez mais eficiente em produzir mercadorias, ele ia demonstrando cada vez mais a dificuldade de garantir as mesmas oportunidades para todos. Quanto mais se ampliavam as relações de mercado, mais visíveis se tornavam as desigualdades sociais. Cada vez mais ficava nítida a contradição entre crescimento econômico e desenvolvimento. Vejamos um exemplo: mesmo entendendo o crescimento econômico como um forte indicador de riqueza de um país, é preciso considerar o desenvolvimento econômico. Isto está relacionado a fatores de natureza qualitativa como distribuição de renda, qualidade de vida, indicadores de escolarização, etc. Quanto mais dinâmico o capitalismo se torna vai se ligando a vários fatores como crescimento (aumento do volume da riqueza produzida) e desenvolvimento (transformação dessa riqueza em qualidade de vida para a população). Porém, essa dinâmica se liga também a dois outros fatores: mobilidade social e mudança social. Mobilidade social é movimento. É a mudança de um indivíduo ou grupo de indivíduos de uma posição social para outra. Há dois tipos de mobilidade social: horizontal e vertical. A mobilidade vertical é a que está diretamente ligada a fatores educacionais. A mobilidade social vertical indica um significativo movimento em relação à sua origem econômica, social e/ou cultural. Muitos são os estudos sobre mobilidade social relacionados à escola, principalmente nos EUA, onde a ideia de meritocracia na educação é bastante forte. De acordo com essa concepção, a escola deve premiar os melhores com boas posições no mercado, dependendo o indivíduo apenas de seus próprios talentos e esforços. Essa concepção, de fato, busca demonstrar que a educação é a chave para o sucesso em uma sociedade democrática e de amplas oportunidades de mobilidade. Porém, não podemos deixar de analisar que o descenso social (mobilidade descendente) se apresenta de forma bastante imperiosa quando vemos pequenos empresários “quebrando” pela concorrência ou de diplomados que não conseguem emprego. Não podemos dizer que não houve esforço ou que não foi desprendido talento suficiente, mas que quanto mais o mercado avança, mais seletivo se torna e nem sempre há lugar para todos. Se um ou outro empresário quebra ou um ou outro diplomado não consegue trabalho, pode sim se caracterizar como um problema individual. Porém quando esse número aumenta, podemos dizer que está se configurando um problema na estrutura da sociedade. Fonte: https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ Mas onde fica a educação nisso tudo? O sociólogo C. Wrigth Mills faz, em um texto publicado em 1951, uma interessante análise sobre isso. No mundo de pequenos empresários, pouca ou nenhuma preparação escolarizada era necessária para o sucesso e muito menos ainda para a sobrevivência: a pessoa era persistente ou corajosa, tinha bom senso e trabalhava duramente. A educação escolar pode ter sido encarada como o principal caminho para a igualdade social e liberdade política e como um auxílio para encontrar oportunidades que permeassem apropriadamente a capacidade e o talento; não era, porém, a grande avenida https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ https://escsunicamp.wordpress.com/2011/12/01/os-caminhos-da-cidadania-no-brasil/ do progresso econômico para a maioria da população. (MILLS, 1987: 272) EM RESUMO... No capitalismo concorrencial, a ascensão social está ligada principalmente à livre iniciativa, em que empreendedores dis postos a „subir na vida‟ se dedicam intensamente ao trabalho. A educação escolar, nesse caso, pouca importância tem como fator de mobilidade social. No capitalismo de grande empresa, a ascensão social está ligada à ocupação de postos de trabalho que exigem elevada qualificação. A educação entra, aqui, como fator fundamental para a mobilidade social. A frase que sintetiza o texto de Mills, “a educação (escolar) atuará como instrumento de obtenção do sucesso somente até quando as necessidades ocupacionais de uma sociedade o exijam”. (Mills, 1987: 278), traz um grande desafio para os profissionais da educação, pois de um modo geral, as pessoas costumam vincular seu investimento em educação escolar a um retorno em termos de emprego e renda. ❖ EDUCAÇÃO E MUDANÇA SOCIAL Fonte: https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ Mudança social é o mesmo que mobilidade social? Vamos analisar: mobilidade expressa mudança de posição social dos indivíduos, subida ou descida na hierarquia da sociedade; desenvolvimento expressa uma mudança qualitativa, como por exemplo, a mudança na qualidade de vida de uma população. Mas a mudança de que vamos tratar aqui diz respeito de como a escola pode ser posta a serviço da mudança nas relações sociais mais amplas. Será que é possível colocar a educação a serviço de uma mudança que promova maiores benefícios para um número maior de pessoas? Existirá mesmo uma relação entre educação e mudança social? A educação já foi vista como um mecanismo de reconstrução das relações sociais em crise. Já foi denunciada como mecanismo de reprodução de todas as relações de desigualdade econômica, cultural e social do capitalismo (veremos isto nos próximos módulos). A escola sempre esteve em meio a disputas. É necessário chegar a uma posição mais equilibrada. A escola não pode e não deve ser vista como a redentora, pois sabemos que há limitações em seu campo de atuação em função da estrutura social que se apresenta. Porém ela pode e deve fazer algo. Quando nos referimos à educação que se realiza na escola, deveríamos ter em mente a escolarização, a educação formal ou a educação escolar. Porém o termo educação faz parte do nosso cotidiano e nos referimos a ele tanto para nos referirmos à educação escolar quanto para nos referirmos à educação que acontece fora da escola. Em outras palavras, educação em sentido amplo é o https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ https://www.stoodi.com.br/exercicios/upe/2014/questao/upe-2014-observe-a-tirinha-a-seguir-percebem-se-na-fala/ processo pelo qual há a apropriação de códigos simbólicos e da capacidade de deciframento e uso desses códigos. Ela acontece em todo e qualquer lugar, de maneira informal por meios de práticas cotidianas e está mais preocupada com a conservação do que propriamente com a mudança. É na escola, educação formal ou escolarização, que um conjunto sistematizado de conhecimentos é passível de ser reproduzido a públicos específicos. Esse conjunto de conhecimentos organizado em currículos é ofertado por profissionais especialmente voltados para essa tarefa e acontece em instituições, tempos e lugares bem definidos e são regulamentados por lei. Já vimos que a partir do século XVIII a burguesia passou a reivindicar educação como direito de todos e dever do Estado. A partir do século XIX passa, também, ser função do Estado construir escolas, formar profissionais para a tarefa do ensinar, criar mecanismos para a organização dos conteúdos a serem ministrados no período da escolarização, etc. Mas será que a educação é mesmo capaz de promover uma mudança social? Para que isso aconteça, Demerval Saviani, um dos grandes educadores brasileiros, nos sugere que para que a educação seja promotora de mudança, precisamos que ela seja uma pedagogia revolucionária. Em suas palavras: A pedagogia revolucionária é crítica. E por ser crítica, sabe- se condicionada. Longe de entender a educação como determinante principal das transformações sociais, reconhece ser ela elemento secundário e determinado. Entretanto, longe de pensar, como o faz a concepção crítico-reprodutivista que a educação é determinada unidirecionalmente pela estrutura social dissolvendo-se a sua especificidade, entende que a educação se relaciona dialeticamente com a sociedade.Nesse sentido, ainda que elemento determinado, não deixa de influenciar o elemento determinante. Ainda que secundário, nem por isso deixa de ser instrumento importante e por vezes decisivo no processo de transformação da sociedade. (SAVIANI, 1991:75) Saviani então nos sugere que a pedagogia seja revolucionária, portanto, crítica e, sendo crítica, ela precisa se nutrir de conteúdo, pois a crítica sem conteúdo é esvaziada de sentido e significado, não se sustenta. Neste contexto, faz sentido a crítica dos teóricos da reprodução (os críticos- reprodutivistas de quem fala Saviani) que denunciaram a escola e seus mecanismos como fator de reprodução das desigualdades as quais ela deveria combater. Mas essa é uma crítica em aspecto macro, ou seja, estrutural, global. Uma crítica a própria estrutura da sociedade capitalista e suas desigualdades sociais. O que Saviani nos propõe é um pensar para além desta estrutura macro. É pensar na prática, na ação pedagógica de forma planejada, orientada, coerente, reflexiva que envolve professores e alunos num projeto coletivo de produção do novo e, consequentemente, de construção de novas relações sociais na escola e na sociedade. É desse aspecto micro que a Sociologia da Educação recente tem dado mais atenção, buscando analisar como se estabelecem as relações cotidianas dentro deste espaço, o ambiente interno, as salas de aula, etc. A problemática central de análise sociológica em educação, hoje, consiste em verificar a relação entre escola, sociedade e cultura com toda a ampla variação de significados que o termo representa. Não cabe a Sociologia da Educação „oferecer receitas‟ de como promover mudanças sociais desejadas, isto porque, os desejos são muito diferentes entre as pessoas. Sua tarefa, então, é investigar e permitir um conhecimento mais sistemático dos processos sociais em curso. UNIDADE III – TEORIAS REPRODUTIVAS E COMPENSATÓRIAS DA EDUCAÇÃO Neste módulo analisaremos o fenômeno educativo à luz de duas grandes perspectivas de análise: os programas de educação compensatória e como fator de reprodução. Este estudo se faz importante, pois contribuirá na ampliação da compreensão sobre a necessidade da prática educativa ser discutida a partir de uma dinâmica MICRO (sala de aula e escola) e em uma perspectiva MACRO (realidade social). Antes de iniciarmos nosso estudo sobre essas concepções educacionais, é importante lembrar que a Sociologia surgiu no século XIX como uma tentativa de explicar as mudanças sociais produzidas pelo desenvolvimento do capitalismo e o surgimento de um novo momento histórico, a modernidade. É importante não perder de vista essa ideia, uma vez que, na sociedade moderna, a educação escolar passa a ter grande importância no processo de transmissão, construção e socialização do conhecimento. Estudar a relação entre educação e sociedade, é fundamental, pois a instituição escolar passa a ser percebida como espaço, por excelência em que identificamos muitas situações decorrentes da organização social. É pela via da prática pedagógica que o professor produz e/ou constrói um determinado projeto de sociedade. Mas como isto acontece? A instituição escolar é um lugar de manifestações de conflitos ideológicos, desta forma, a escola lida com concepções diferentes de mundo presentes na realidade social. Sendo assim, diversas maneiras de pensar, de ser e estar em sociedade, se expressam, muitas vezes, por fenômenos que, de certo, podem contribuir para a reprodução de uma ideologia ou para a transformação social. Quando pensamos em definir o que é educação, podemos verificar que cada um de nós terá uma concepção relacionada à nossa visão particular de mundo, tornando difícil pensar em uma educação “ideal, perfeita” para todos os homens, em todos os lugares e em todos os tempos. Em seu livro O que é Educação? Carlos Rodrigues Brandão, antropólogo e educador, nos diz que há tantos tipos de educação quantas forem as sociedades existentes. Ele afirma que seria melhor falarmos em educações, já que “não há uma forma única e nem um único modelo de educação [...]” (Brandão, 1996:9). A educação varia muito de acordo com o lugar e o tempo em que se concretiza. Ela existe em todos os lugares e é exercida de modo diferente de acordo com os tipos de sujeitos que cada sociedade deseja formar. A historicidade das concepções educacionais se faz importante para poder compreender que se hoje alguns conceitos de educação nos parece retrógrados, ultrapassados ou até mesmo muito conservadores, precisamos ter em mente que, na época em que foram elaborados não eram vistos assim. Por isso é importante lembrar que as duas concepções que estudaremos a seguir, precisam ser vistas e consideradas em seu tempo histórico e sob a luz do contexto social em que foram geradas. Elas não se contrapõem. Apenas convivem no tempo. A) OS PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO COMPENSATÓRIA Veremos agora uma abordagem que surgiu na década de 50. Esta abordagem chamada de PROGRAMA DE EDUCAÇÃO COMPENSATÓRIA manifesta-se na educação como uma política de intervenção nos problemas educacionais. Tal programa surge nos Estados Unidos da América em um contexto voltado para os grupos pré-escolares ao se constatar que muitas crianças quando chegavam à escola, mostravam deficiências das mais diversas naturezas. A ideia defendida por esta concepção é que os problemas sociais, que causavam tais deficiências poderiam ser resolvidos – COMPENSADOS – por meio do atendimento à criança pequena. Desta forma, o que se alegava é que, crianças negras e de classes sociais desfavorecidas, em sua maioria, possuíam condições materiais inadequadas e insuficientes o que as levava ao fracasso e insucesso na escola. De acordo com os defensores da educação compensatória, estes dois grandes grupos – negros e de classes sociais desfavorecidas – não teriam tido um ambiente educativo favorável o que poderia contribuir, também, para seu fracasso escolar. Muitas pesquisas foram feitas na época para discutir tais questões e surgiram, assim, inúmeras nomenclaturas para identificar os grupos que seriam atendidos pela educação compensatória: os culturalmente desfavorecidos, os linguisticamente deficientes, os socialmente prejudicados, etc. Tais programas voltaram-se para o atendimento a essas crianças pequenas. A educação escolar passa a ser encarada como um instrumento adequado para a correção das injustiças sociais. Portanto, a ideia geral é COMPENSAR tais injustiças sem alterar as estruturas sociais. Mas, será possível a escola solucionar problemas advindos das relações sociais? Bem, a grande crítica aos programas de educação compensatória está voltada a exagerada importância dada aos primeiros anos de vida da criança na etapa denominada pré-escolar. Essa fase da escolarização passava a ser considerada como a solução de todos os problemas e compensadora das mais diferentes deficiências da sociedade como um todo. Verificamos então que a noção de educação compensatória traz a ideia de que para a família e, consequentemente, a criança, falta alguma coisa e essa falta deveria ser “compensada” pela escola. O discurso veiculado, portanto, é de que cabe a escola compensar as deficiências resultantes de um ambiente pobre em que vivem as crianças das classes trabalhadoras, fundamentando-se na ideologia de privação cultural. Tal ideologia argumenta que a criança proveniente dessa classe social é portadora de déficits socioculturais. Os defensores desta concepção não questionam se tais diferenças sociais decorrem das características individuais dos sujeitos ou são resultados diretos da divisão em classes nocontexto da sociedade capitalista. PARA REFLETIR Considerando a origem e as características do programa de educação compensatória vistos até aqui, você acredita que a instituição escola PODE e DEVE compensar os vários problemas sociais das crianças? Vários estudiosos não reconhecem a educação compensatória como uma teoria educacional. Isto se deve ao fato de que para eles a educação compensatória não se constitui como uma resposta crítica a complexidade da questão educacional. Um destes estudiosos é Demerval Saviani. Para ele há três argumentos para não reconhecê-la: 1. A educação compensatória não interpreta o processo educacional de forma a resultar em uma determinada proposta realmente pedagógica; 2. Os adeptos da educação compensatória não analisam criticamente as funções da educação; 3. A discussão teórica dos adeptos da educação compensatória não revela nenhuma consistência acerca das contribuições do ato educativo para o processo de transformação social. (SAVIANI, 1991). A partir destes argumentos e do que foi explicitado até aqui, é possível concluir que os programas de educação compensatória reduzem-se a iniciativas que visam compensar, pela ação educativa, deficiências das mais diversas ordens: questões de saúde, nutrição, familiar, ou seja, questões determinantes e consideradas a partir do meio carente de onde essas crianças procedem – meio social, cultural, família. Portanto, essas crianças são vistas como alguém a quem sempre falta algo ou que está sempre em atraso ou desvantagem em relação a um padrão, apresentado como modelo: o das crianças de classes médias ou dominantes. A escola então, voltando-se para a resolução de problemas que não lhe cabe solucionar, corre o risco de deixar sem solução aqueles problemas de que precisa dar conta: o ato de educar. Basil Bernstein, teórico que criticou o modelo de educação compensatória, nos faz o seguinte alerta: “Deveríamos parar de pensar em termos de „educação compensatória‟ e, em vez disso, considerar mais seriamente e de maneira sistemática as condições e os contextos do ambiente educativo”. (BERNSTEIN, 1979: 48). A) TEORIA REPRODUTIVA DA EDUCAÇÃO Agora discutiremos outra concepção de educação para ampliar a compreensão acerca da relação escola-sociedade: a concepção de educação como fator de reprodução social. Esta concepção, elaborada nos anos 60 e 70, reconhece a educação escolar como o meio pelo qual ocorre a reprodução da sociedade e a escola é vista como veículo do sistema econômico, reproduzindo as relações sociais de produção da sociedade capitalista. Essa teoria se apresenta como uma crítica à educação como fator de equalização social, sendo a educação reprodutora da estrutura social. Saviani (1991) denomina essas teorias como crítico-reprodutivas uma vez que elas não percebem alternativas para romper com a função própria da educação que seria a reprodução da sociedade na qual a prática educativa se desenvolve. Althusser, um dos mais renomados pensadores desta teoria, afirma que o processo de assegurar o poder e o domínio que a ideologia representa, ocorrerá por meio de certos mecanismos institucionais, denominados por ele de Aparelhos Ideológicos de Estado. (AIE). Tais mecanismos cobrem diversos campos da sociedade: familiar, religioso, jurídico, sindical, cultura, etc. Para Althusser (1991) a escola, na sociedade capitalista, assumiu funções antes desempenhadas pela igreja, que assegurava uma posição dominante na transmissão dos valores culturais. Porém, com a separação entre estas instituições – Igreja/Estado - a partir do século XIX, a escola foi se tornando o principal veículo de manutenção do status quo. Se entendermos a escola como sendo o mais poderoso Aparelho Ideológico do Estado, ela assume papel fundamental no processo de incutir à classe trabalhadora a ideologia da classe dominante. Vejamos alguns exemplos: você já deve ter percebido como o conceito de família é tratado de forma ideologizada em alguns livros didáticos. Esse conceito, muitas vezes, está muito distante da realidade dos alunos das classes menos abastadas. Outro exemplo é o do esforço pessoal dando a impressão à classe trabalhadora que este tipo de esforço é suficiente e bastante para os indivíduos vencerem na sociedade. De acordo com a perspectiva reprodutiva, à medida que a cultura escolar veicula ideologias como essas, a educação vai assumindo papel fundamental na reprodução de UMA realidade. A escola passa então a eleger um único saber como verdadeiro, e o passa para os indivíduos que são concebidos de forma isolada de suas condições sociais ou de classes. A escola passa então, como poderoso AIE, a difundir uma ideologia burguesa, impondoa a classe trabalhadora, negando a essa, a possibilidade de expressar sua visão de mundo. PARA ALTHUSSER A EDUCAÇÃO CONSTITUI UM DOS PRINCIPAIS VEÍCULOS POR MEIO DOS QUAIS A CLASSE DOMINANTE TRANSMITE SUAS IDEIAS SOBRE O MUNDO SOCIAL GARANTINDO A REPRODUÇÃO DA ESTRUTURA EXISTENTE! Outros estudiosos, que analisam a relação educação-sociedade, também produziram escritos sobre este caráter reprodutivo da educação. Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron (2016), afirmam que a prática pedagógica constitui um dos principais mecanismos de reprodução social, admitindo-se que não existe apenas uma cultura e, sim, culturas em conflito dentro do espaço escolar. Para Bordieu e Passeron a sociedade capitalista é marcada por imensas desigualdades sociais o que faz com que alguns grupos sejam privilegiados e outros não. Tais grupos privilegiados demonstram grande interesse em que a sociedade se reproduza, mantendo assim seu status quo. Neste contexto, a função ideológica da escola se manifesta, reproduzindo a sociedade tal como ela existe. Nesta perspectiva, a escola assume um papel reprodutor, independente dos contextos históricos que a geraram. Na visão dos referidos autores, quando a escola participa da reprodução cultural, os resultados obtidos pelos diferentes indivíduos que a compõem, não ocorrem devido às características pessoais desses sujeitos e, sim, ao fato de as regras escolares, impostas a todos, favorecerem os grupos dominantes. Entende-se a escola como a principal instituição pela reprodução e, também, legitimação de valores e ideias de uma cultura dominante. Como a escola faz isso? Estabelecendo normas de conhecimento, conduta e linguagem. Nesse sentido, a escola acaba por reproduzir interesses de grupos dominantes e a educação, então, serve mais para manter a desigualdade social do que para reduzi-la. Fonte: https://incertasverdadescontestaveis.wordpress.com/ Bordieu e Passeron (2016) denunciam, com os conceitos de “violência simbólica” e “reprodução”, que a escola além de legitimar o poder estabelecido também o reforça, fazendo com que os indivíduos enxerguem e avaliem o mundo com os padrões e critérios definidos por um discurso dominante; ou seja, ideias coletivas que buscam estabelecer (e solidificar) comportamentos e visão de mundo dentro dos padrões estabelecidos por uma parte da sociedade. Outra perspectiva crítico-reprodutivista, a Teoria da Escola Dualista, foi elaborada em 1971 pelos franceses Christian Baudelot e Roger Establer no livro L’Ecole Capitaliste en France. Esta teoria baseou-se no conceito de Aparelho Ideológico de Estado proposto por Althusser. Para estes autores a função principal da escola capitalista é IMPOR a ideologia da classe dominante à classe https://incertasverdadescontestaveis.wordpress.com/ https://incertasverdadescontestaveis.wordpress.com/trabalhadora, contribuindo, assim, para a reprodução da força de trabalho e das desigualdades sociais. Baudelot e Establer afirmam que a visão de mundo dos trabalhadores é destruída pela escola e esse processo se desenvolve à medida que a escola procura torná-los submissos, sem forças para se manifestar e fazer valer sua visão de classe. Na Teoria da Escola Dualista, Baudelot e Establer denunciam a existência de duas redes de escolarização na sociedade capitalista: • Primária Profissional (PP): tem como objetivo fundamental impor ao proletariado os valores burgueses, domesticando-o para participar de forma submissa do processo de produção. • Secundária Superior (SS): absorve os filhos de classe dominante permitindo seu fluxo natural em todos os níveis, fortalecendo sua condição de elaboradores e difusores da concepção de mundo da sua classe. Por ser composta por estas duas redes com finalidades distintas e de forma paralela, a escola capitalista assume, então, um caráter DUALISTA. O sistema educacional acaba distribuindo de forma desigual o poder, por meio destas duas redes de escolarização. Os alunos provenientes das classes socioeconômicos mais privilegiados encontram na escola uma continuidade dos valores e símbolos vigentes na sociedade dominante. O proletariado, diferentemente, não encontra tal sequência, e vai se distanciando da possibilidade de fortalecer a ideologia de sua classe, existente no contexto extraescolar. Vimos, então, que as teorias crítico-reprodutivas denunciam a educação como uma grande colaboradora para a reprodução social. Mas como fica o papel do professor segundo essas teorias? Essas teorias apontam para uma concepção de professor que não percebe em sua prática condição de se opor à reprodução social. Althusser (1991) encara o papel do professor de forma bastante, digamos, pessimista. Vejamos o que ele diz: Peço desculpas aos professores que, em condições assustadoras, tentam voltar-se contra a ideologia, contra o sistema e contra as práticas que os aprisionam (...) em certa medida são heróis. Mas eles são raros, e muitos (a maioria) não tem nem um princípio de suspeita do trabalho que o sistema (que os ultrapassa e esmaga) os obriga a fazer... (ALTHUSSER, 1991: 80-81) Desta forma o papel do professor não é de transformação nem tampouco de emancipação, mas sim, de uma educação classista contribuindo, assim, para a marginalização cultural do aluno. As limitações e imprecisões destas teorias são analisadas por Silva (1992), fazendo com que elas sejam: • Mecanicistas e reducionistas, na medida em que o fator econômico é apresentado como determinante das outras dimensões da vida social; • Simplistas, pessimistas e derrotistas, por não levarem em conta o caráter político das ações dos sujeitos sociais, visando a processos de transformação social; • Desconhecedoras dos conflitos e das contradições, uma vez que pressupõem a imposição da ideologia da classe burguesa sobre o proletariado sem nenhum ou quase nenhum processo de resistência por parte desse último; • Imprecisas na descrição da realidade social, por não conseguirem captar o caráter contraditório da realidade social; • Próximas ao funcionalismo, por defenderem uma total passividade dos sujeitos sociais e lhes atribuírem um caráter estático que os leva a apenas aceitar e reproduzir uma ideologia; • Descontextualizadas historicamente, por focalizarem as relações humanas de forma abstrata, não valorizando devidamente as condições concretas da existência humana. Tais questionamentos às teorias crítico-reprodutivistas revela que as mesmas não conseguem perceber a real complexidade do fenômeno educativo, e não mostram a educação como um espaço que NÃO SE ESGOTA NA REPRODUÇÃO SOCIAL, mas que pode trabalhar também voltado para a transformação social. Porém, como dissemos no início, tais teorias precisam ser analisadas em seu tempo social e histórico. É a partir das contribuições destas teorias que vários outros pensadores vem ampliando a reflexão sobre a concepção de educação e da função social do professor em uma abordagem mais crítica. Essa questão será o tema do nosso próximo módulo quando analisaremos a concepção de educação voltada para a resistência, transformação e emancipação social. UNIDADE IV – TEORIA CRÍTICA E EMANCIPATÓRIA PARA EDUCAÇÃO ESCOLAR Chegamos ao quarto e último módulo da nossa disciplina! Quanta coisa analisamos até aqui não é mesmo? Para ampliarmos nossa reflexão sobre escola e sociedade, levaremos nossa discussão para outra direção. Vamos analisar as possibilidades do fenômeno educativo ser compreendido como um processo de resistência cultural, de transformação social e como prática de liberdade e emancipação. A EDUCAÇÃO COMO FATOR DE RESISTÊNCIA CULTURAL Como vimos na Unidade 1, a concepção de sociedade proposta por Marx é bastante divergente àquela proposta por Durkheim. Para Marx a sociedade enfrenta contradições e conflitos decorrentes das relações entre os homens. Dessa perspectiva decorre uma concepção de educação voltada para a emancipação do homem e consequentemente, para a transformação social. A ideia marxista vê a História como algo dinâmico e conflituoso diante dos interesses opostos entre dominantes e dominados. Assim, o homem deve ser percebido como sujeito histórico, sujeito de seus atos e não como algo abstrato e descontextualizado de suas condições históricas concretas, devendo a história ser compreendida como produto de vários homens e não apenas por um pequeno grupo. Embora Marx não tenha escrito sistematicamente sobre a educação, seu pensamento trouxe grandes contribuições para muitos estudos sobre o fenômeno educacional na perspectiva da sociedade capitalista. Seu pensamento contribuiu, portanto, para a formulação de diversas teorias que discutem a relação escola-sociedade. Como vimos na Unidade III, as teorias crítico- reprodutivistas foram insuficientes na tentativa de explicar este fenômeno, levando à necessidade de elaboração de outras perspectivas que analisassem conceitos de poder, cultura, ideologia, currículo. Tais conceitos servem de pressupostos básicos para uma melhor compreensão e discussão da relação escola-sociedade. A partir das reflexões de base marxista, Gramsci (intelectual italiano do início do século XX), propõe uma nova abordagem: a de RESISTÊNCIA CULTURAL. Este elemento foi desconsiderado pelas teorias de reprodução social. Antes de continuarmos nossa discussão cabe, aqui fazermos uma diferenciação entre as teorias crítico-reprodutivistas, vistas na Unidade III, e as teorias críticas, que analisaremos agora: As TEORIAS CRÍTICO-REPRODUTIVISTAS se mostram críticas na medida em que denunciam o papel da escola capitalista voltado para a reprodução social e acusam essa instituição de reproduzir o poder e a ideologia da classe dominante. As TEORIAS CRÍTICAS além de denunciarem esse mesmo papel da escola capitalista, reconhecem a possibilidade de o trabalho dessa instituição se voltar também para o processo de transformação social. Voltemos a TEORIA DA RESISTÊNCIA CULTURAL! Essa teoria defende uma educação capaz de mostrar que o processo de dominação nunca é total e quem sofre a dominação pode encontrar meios de se posicionar e refletir em relação à ação de dominação que o atinge. Giroux (1986) é um pensador contemporâneo que defende esta teoria. Ele afirma que tal teoria retrata de forma correta a ideia de que a dominação é um processo que nunca se completa. A escola, então, passa a ser entendida como espaço social onde o poder nunca é único e que o conhecimento deve esclarecer os oprimidos acerca de sua posição e condição como grupo. Assim, os indivíduos vão ocupando e descobrindo espaços de resistênciadentro da escola e esta vai se transformando em espaço de contestação. A Teoria da Resistência Cultural defende que na educação escolar existem práticas sociais de resistência à ideologia que a classe dominante busca impor à classe dominada. A discussão em torno desta teoria centra-se, então, na necessidade de se desenvolver práticas escolares que possam possibilitar a mudança social e não reforcem as subordinações que, muitas vezes, são difundidas via educação. E qual o papel do professor nesta perspectiva? Para esta teoria o professor deve ser capaz de perceber que a prática pedagógica que desenvolve cria novas relações que irão produzir situações que não se constituem, meramente, como reprodução de situações anteriores. Para esta teoria a educação É CAPAZ DE PRODUZIR O NOVO, para muito além de reproduzir o já existente. EDUCAÇÃO COMO FATOR DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL Voltemos a Gramsci. Para ele a escola assume um papel fundamental na socialização da cultura de um povo. Ele defendeu uma educação transformadora que pudesse elevar o nível cultural da classe trabalhadora, ou seja, a educação seria uma importante colaboradora para o processo de transformação social. Gramsci (1991) entende que para haja dominação econômica de uma classe em relação a outra, há também que existir o domínio político e ideológico. A dominação ideológica produz um consenso social que implica na aceitação pela classe dominada de princípios que a classe dominante estabelece como verdadeiro, fazendo valer, assim, sua visão de mundo. Outra ideia presente em Gramsci é a de que todos os homens são intelectuais, embora, devido a condições materiais e ideológicas nem todos desempenham, efetivamente, esta função. Portanto, não existe, para Gramsci, nenhuma atividade humana em que não esteja presente o elemento intelectual. Outra contribuição gramsciana para a educação é de que essa se torna instrumento necessário como instrumento de luta entre as classes, considerando conhecimento como sinônimo de poder. O saber é que vai possibilitar a compreensão da realidade, fazendo om que a classe trabalhadora comece a questionar os problemas e as contradições da sociedade capitalista. É nesse sentido que a educação pode contribuir para o processo de transformação social. Encontramos também em Gramsci outra concepção importante em relação à educação: ela deve ser uma obrigação do Estado, porém em uma perspectiva diferente daquela proposta pela burguesia. Para o referido autor, há uma contradição fundamental no trabalho escolar: ao mesmo tempo em que ela mantém a visão de mundo da classe dominante, também oferece espaços para a resistência a essa mesma visão de mundo. A escola, então, pode e deve contribuir para o esclarecimento político das classes dominadas. Para finalizar, Gramsci propõe um tipo de escola, denominada por ele de ESCOLA UNITÁRIA. Nessa escola os aspectos humanistas da escolarização estão articulados com os aspectos profissionais na busca de articular a relação teoria e prática. Nessa associação, a Escola Unitária busca associar o homem técnico ao homem político. EDUCAÇÃO COMO PRÁTICA DE LIBERDADE E EMANCIPAÇÃO Vimos anteriormente a educação como fator de resistência cultural e como fator de transformação social, destacando as contribuições de Antonio Gramsci para essas duas concepções educacionais. Muitos pensadores brasileiros têm apresentado importantes contribuições para a construção de uma concepção de educação como fator de transformação social. Assim como temos, também, pensadores com valiosas contribuições para o processo emancipatório e libertador da e na educação. Esses pensadores apresentam, por vezes, um engajamento político que vem resultando em avanços significativos no que se refere a essa questão. Nesta perspectiva podemos citar: Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro, Anísio Teixeira, Paulo Freire, entre outros. Florestan Fernandes (1920 -1995) era sociólogo e vários de seus escritos tiveram a educação como tema, apresentando a instrução como um desdobramento natural de sua obra de sociólogo. Assim como Gramsci, Florestan não separava o trabalho teórico de suas crenças ideológicas. Embora tivessem abordagens diferentes, tanto Gramsci quanto Florestan, acreditavam que existe na educação uma imensa capacidade transformadora e por isso, deveria ser instrumento de elevação cultural e desenvolvimento social das camadas mais desfavorecidas da população. Florestan foi deputado federal nos anos 1980 e 1990. Durante este período esteve envolvido e militando nos debates mais importantes que aconteceram no congresso no campo da educação. Ele participou ativamente da discussão, elaboração e tramitação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) que, após um ano de sua morte, em 1996, foi aprovada. Florestan Fernandes (1920 -1995) foi um político, sociólogo e ensaísta brasileiro, considerado o fundador da Sociologia Crítica no Brasil. Defensor da Escola Pública, sempre foi ligado aos movimentos sociais reivindicatórios. Elegeu-se Deputado Federal Constituinte onde destacou -se na defesa da Escola Pública e no projeto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Fonte: https://brasilescola.uol.com/biografia/floresta n-fernandes.htm Outro importante pensador brasileiro em relação à proposta de uma educação como prática emancipatória foi Darcy Ribeiro (1922 – 1997), chamado de “antropólogo da educação”. Este pensador iniciou seu trabalho como antropólogo se dedicando ao estudo dos índios no Pantanal brasileiro. A partir da década de 1950 dedicou-se a educação primária e superior. Assim como Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro embrenhou-se na política sendo senador da república. Neste período combateu energicamente as propostas para a LDB. Ele defendia uma legislação mais democrática e eficaz. A principal bandeira de Darcy Ribeiro era a escola pública: a maior invenção do mundo, como dizia. Através dela, todos os homens podiam ser herdeiros das bases do patrimônio mundial. O etnólogo via a educação como sendo a transmissão do saber da gente madura que já sabe para a gente imatura que ainda não sabe. Uma educação que deve ser capaz de ensinar as pessoas ao mesmo tempo sobre o mundo, sobre o seu país e sobre si mesmas. Em suas palavras: “Uma educação pública honesta e boa.” Fonte: https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacaocomo- justica-social Darcy Ribeiro foi fortemente influenciado por outro importante pensador da educação brasileira. Considerado o principal idealizador e pioneiro na implantação de escolas públicas em nosso país, Anísio Teixeira (1900 – 1971) foi responsável por ideias de mudança que marcaram a educação brasileira no século XX. https://brasilescola.uol.com/biografia/florestan-fernandes.htm https://brasilescola.uol.com/biografia/florestan-fernandes.htm https://brasilescola.uol.com/biografia/florestan-fernandes.htm https://brasilescola.uol.com/biografia/florestan-fernandes.htm https://brasilescola.uol.com/biografia/florestan-fernandes.htm https://brasilescola.uol.com/biografia/florestan-fernandes.htm https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-socialhttps://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social https://cartacapital.com/educacao/carta-fundamental-arquivo/a-educacao-como-justica-social Para Anísio Teixeira a educação deve ser compreendida em permanente mudança e em permanente reconstrução o que traz para dentro do espaço escolar novas responsabilidades que, segundo ele, eram para mais do que instruir, educar. Educar para formar cidadãos livres em vez de homens dóceis. Anísio acreditava que a escola deveria preparar para o futuro, ensinar a viver com mais inteligência, mais tolerância. Mas para que tudo isso pudesse acontecer, a escola precisaria ser “reformada”. A escola seria então um verdadeiro espaço de aprendizagem, mas uma aprendizagem que refletisse na vida cotidiana dos sujeitos envolvidos neste processo. Para Anísio Teixeira não se aprende somente ideias, fatos, números... Apende- se também ideais e senso crítico. Esta seria a grande mudança estrutural na escola. Anísio Teixeira (1900-1971) foi um importante teórico da educação no Brasil. Foi o principal idealizador das grandes mudanças que ocorreram na educação brasileira no século XX. Fez parte do movimento de renovação do ensino chamado de Escola Nova. No fim doas anos 50, Anísio Teixeira participou de debates para a implantação da Lei de Diretrizes e Bases. Junto com Darcy Ribeiro fundou a Universidade de Brasília, tornando-se reitor em 1963. Fonte: https://www.ebiografia.com/anisio_teixeira/ Para dar continuidade a nossa discussão, nos deteremos agora em um dos maiores nomes das propostas de uma educação libertadora e emancipatória brasileira: Paulo Freire. Freire é, atualmente, o educador de Língua Portuguesa mais conhecido no mundo e suas ideias sobre educação e mudança social difundidas em nível internacional. Sua proposta educacional é sinônimo de uma educação libertadora, tendo seu pensamento bastante citado, estudado e analisado por diversos pesquisadores da teoria crítica. As reflexões de Paulo Freire (1921 – 1997) estão diretamente ligadas àquelas produzidas por vários outros intelectuais brasileiros que discutem a necessidade de uma educação que ajude as camadas dominadas a se libertarem da opressão que lhes é imposta pelas classes dominantes. https://www.ebiografia.com/anisio_teixeira/ https://www.ebiografia.com/anisio_teixeira/ Freire não desenvolveu, propriamente, uma Sociologia da Educação, porém sua obra tem apresentado grandes contribuições para a análise da relação escola/sociedade. Vejamos o que dois grandes pensadores contemporâneos da teoria crítica, tendo a educação como meio de transformação social, dizem a respeito de Paulo Freire: O trabalho do educador Paulo Freire posiciona-o na ala dianteira daquela „classe em extinção‟ de revolucionários educacionais que marcham atrás da bandeira da libertação para lutar por justiça social e transformação do ensino (...) O trabalho de Freire tem sido citado por educadores em todo o mundo e constituído uma importante contribuição para a pedagogia crítica, não somente por causa de seu refinamento teórico, mas por causa do sucesso de Freire em colocar a teoria na prática. (McLAREN, 1997: 327-328). (...) a abordagem freiriana é um avanço sobre as formas como normalmente pensamos a educação não formal, sobre o conhecimento de que grupos é apropriado e sobre como podemos articular isto de modo bastante crítico, que seria um ato de má fé não permitir que ela influenciasse muito do que fazemos. (APPLE, 1997: 254). Paulo Freire parte do pressuposto que vivemos em uma sociedade dividida em classes que determina que uma tenha privilégios e a outra, impedida de usufruir dos bens produzidos. Neste contexto de lutas de classes, um dos bens essenciais é a EDUCAÇÃO que é vista como o bem necessário e fundamental para superar as desigualdades sociais. Ao considerar a sociedade dividida em classes, Paulo Freire discute dois tipos de pedagogia: a do dominante e a do oprimido. Na pedagogia do dominante a prática educativa se centra como prática de dominação. Em contrapartida, na pedagogia do oprimido ela deve ser encarada como prática de liberdade. Desta forma, entendendo a educação como uma ação que pode libertar o sujeito da opressão, ela acontece em um contexto de luta de classes. Diante desta constatação, o autor diz que a pedagogia do oprimido deve efetivar um trabalho que conscientize e politize os sujeitos promovendo, além da conscientização - consciência crítica da opressão -, a transformação desta realidade. Nesse sentido, é preciso que os homens reflitam e atuem sobre essa condição, sobre o mundo, para transformá-lo. Sem esse processo não há possibilidade de libertação das condições de opressão. A educação, para Freire, é sempre uma prática política e, qualquer prática política é também, pedagógica, ou seja, não existe educação neutra. Toda ação educativa é, essencialmente, uma ação política. Por isso a necessidade de definirmos a educação pela liberdade e, para o sujeito conseguir essa liberdade, é preciso que ele tome consciência e reflita sobre sua realidade concreta. Nesta concepção de educação como ato político, ela passa de domesticadora à libertadora. Ao ser vista desta maneira, a educação busca esclarecer, libertar e emancipar o indivíduo, resultando em um processo que o leve a conhecer sua realidade concreta, permitindo-lhe ter uma visão crítica em relação às suas reais condições de vida. Um conceito criado e muito criticado por Freire em sua obra é o de EDUCAÇÃO BANCÁRIA. Em uma perspectiva de educação oposta à de Paulo Freire, a função do professor é vista como ato de depositar conhecimentos, onde o professor é o depositante e o aluno o depositário. Tal concepção implica na passividade do educando e o educador é o único sujeito do processo pedagógico, passando a ideia de que o mundo é estático, harmônico e sem contradições. Para Freire o professor desenvolve sua capacidade de proporcionar aos alunos condições de aprendizagem não só para o trabalho de sala de aula, mas também para que eles aprendam a ler criticamente o mundo social, visando a modificá- lo. A educação consiste, então, em um processo que se faz no contato do homem com o mundo vivido, exigindo um diálogo constante entre os dois sujeitos envolvidos neste processo: professor aluno. Esse diálogo não admite imposições de qualquer natureza, uma vez que a educação como prática de liberdade e emancipação do homem baseia-se na compreensão da consciência humana e do mundo. A ESCOLA DOS MEUS SONHOS Ela não briga com a TV, mas leva-a para a sala de aula: são exibidos vídeos de anúncios e programas e, em seguida, analisados criticamente. A publicidade do iogurte é debatida; o produto, adquirido; sua química, analisada e comparada com a fórmula declarada pelo fabricante; as incompatibilidades denunciadas, bem como os fatores porventura nocivos à saúde. O programa de auditório de domingo é destrinchado: a proposta de vida subjacente; a visão de felicidade; a relação animador-platéia; os tabus e preconceitos reforçados etc. Em suma, não se fecha os olhos à realidade; muda-se a ótica de encará-la. Há uma integração entre escola, família e sociedade. A Política, com P maiúsculo, é disciplina obrigatória. As eleições para o grêmio ou diretório estudantil são levadas a sério e um mês por ano setores não vitais da instituição são administrados pelos próprios alunos. Os
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