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Saúde da Criança – Amanda Longo Louzada 1 ICTERÍCIA NEONATAL DEFINIÇÃO: Consiste na manifestação clínica da hiperbilirrubinemia, definida como a concentração sérica de bilirrubina indireta (BI) maior que 2 mg/dL ou de bilirrubina direta (BD) maior que 1 mg/dL, desde que esta represente mais que 10% do valor de bilirrubina total (BT). No entanto, a icterícia manifesta-se apenas quando os níveis séricos de bilirrubina são superiores a 5 mg/dL e é resultante do acúmulo de pigmento bilirrubínico na pele e nas mucosas. É um dos sinais mais frequentes no período neonatal Coloração amarelada da pele, esclera e membranas mucosas, aumento da bilirrubina sérica, acumulando nos tecidos A icterícia tem progressão crânio-caudal, e quando chega na zona V (mãos e pés), é perceptível em bebês da cor branca DIFERENÇA ENRE BILIRRUBINA DIRETA E INDIRETA: Bilirrubina Direta\ Conjugada: é a bilirrubina indireta que é conjugada pela ação da enzima UDP glicoroniltransfase, é polar e hidrossolúvel Geralmente cursa com colestase (acolia fetal, colúria e ictérico) Bilirrubina Indireta\ Não conjugada: bilirrubina ligada a albumina, é apolar e lipossolúvel. É mais comum na icterícia neonatal EPIDEMIOLOGIA: A maioria dos casos decorre de um aumento da fração indireta, ou livre de bilirrubina 60% dos RNT e 80% dos RNPT na 1ª semana de vida Maiorias das vezes é reflexo de uma adaptação, considerada fisiológica, do metabolismo da bilirrubina no período de transição fetal para a vida neonatal Algumas vezes processo patológico, podendo alcançar concentrações elevadas e ser lesiva ao cérebro, instalando-se o quadro de encefalopatia bilirrubínica que, ao exame anatomopatológico, caracteriza-se por coloração amarelada dos gânglios da base, denominada kernicterus. ENCEFALOPATIA BILIRRUBÍNICA: Agudo: Sucção débil, progredindo em 3 – 4 dias para hipertonia, opistotóno, hipertemia convulsões e choro agudo. Nessa fase 70% dos RN podem evoluir com óbito Sobreviventes: sequelas neurológicas a longo prazo: paralisia cerebral espática. Distúrbios de deglutição e fonação, deficiência auditiva grave e mental leve a moderada CLASSIFICAÇÃO DA BILIRRUBINA: Significante: BT com níveis que requerem fototerapia, geralmente BT Maior ou igual a 12 mg\dL Grave ou severa: BT próxima ao nível de exsanguineotrasnfusão (EST) tradicionalmente maior ou igual a 20 mg\Dl Extrema: se BT em nível de EST, BT ≥25 mg/dL HIPERBILIRRUBINEMIA INDIRETA: SOBRECARGA DE BILIRRUBINA AO HEPATÓCITO: Doenças hemolíticas: Hereditárias: Imunes: incompatibilidade Rh (antígeno D), ABO ou antígenos irregulares Enzimática: deficiência de piruvato-quinase hexoquinase Membrana eritrocitária: esferocitose e eliptocitose Hemoglobinopatias: alfa-talassemia Adquiridas: infecções bacterianas (sepse, infecção urinária) ou virais Coleções sanguíneas extravasculares: Cefalohematoma, hematomas e equimoses Hemorragia intracraniana, pulmonar e gastrintestinal Policitemia: Recém nascido pequeno para a idade gestacional RN de mãe diabética Transfusão feto-fetal ou materno-fetal Clampeamento de cordão umbilical após 60 segundos Circulação enterro-hepática aumentada de bilirrubina; Anomalias gastrintestinais, obstrução estenose hipertrófica do piloro Jejum oral ou baixa oferta enteral Icterícia por oferta inadequada de leite materno DEFICIÊNCIA OU INIBIÇÃO A CONJUGAÇÃO DE BILIRRUBINA: Hipotireoidismo congênito Síndrome icterícia pelo leite materno Síndrome de gilbert Síndrome de Crigler Najjar HIPERBILIRRUBINEMIA DIRETA: Saúde da Criança – Amanda Longo Louzada 2 ICTERÍCIA NEONATAL Icterícia colestática. Icterícia presente por mais de 14 dias constitui indicador de alerta para diagnóstico da colestase. A principal causa a ser afastada é atresia de vias biliares, que demanda pronto diagnóstico e cirurgia de Kasai, de preferência antes de 30 dias de vida. Causas: Alterações dos ductos biliares na excreção da bilirrubina: Atresia de vias biliares Cisto de colédoco e estenose extra-hepática Distúrbios hepatocelulares na excreção da bilirrubina: Hepatites primárias causadas por infecção congênita (sífilis, rubéola, citomegalovirose e outras) Icterícia colestática é sempre patológica e indica disfunção hepatobiliar. Fezes acólicas ou hipocoradas e urina escura investigar hepatite ou obstrução das vias biliares. O diagnóstico precoce da atresia de vias biliares é fundamental para que a cirurgia seja realizada em tempo (< 6 semanas de vida) para o melhor prognóstico Vale salientar que em 1/3 dos RN com atresia biliar as fezes são pigmentadas, inicialmente, pois os ductos biliares intra e extra-hepáticos permanecem funcionantes nas 1ªs semanas de vida. À medida que se tornam atrésicos, o fluxo da bile é bloqueado e as fezes e a urina mudam de cor. Qualquer RN que esteja ictérico com 2 semanas ou mais de idade pós-natal deve ser avaliado para colestase com mensuração de bilirrubina sérica total e direta METABOLISMO DA BILIRRUBINA: A bilirrubina resulta do catabolismo das proteínas do heme. Cerca de 75% da produção diária da bilirrubina provém da destruição de hemácias; FISIOPATOLOGIA: ICTERÍCIA FISIOLÓGICA: Varias são as restrições do metabolismo da bilirrubina que explicam a chamada “icterícia fisiológica”: a origem da bilirrubina está na degradação das hemácias fisiologicmanete normal no RN O RN produz 2 – 3 vezes mais bilirrubinas que o adulto por causa da maior quantidade proporcional de hemoglobina, e, possui menor vida média das hemácias A bilirrubina do feto é metabolizada pela placenta Logo após o clampeamento do cordão umbilical, o RN assume a função da degradação da bilirrubina. Consequentemente, há hiperbilirrubinemia transitória, reflexo da combinação dos efeitos de produção, conjugação e circulação entero-hepática no período neontal Sobrecarga da bilirrubina no hepatócito, devido a circulação enterro-hepática aumentadas devido ao menor tempo de vida média das hemácias e à maior quantidade de hemoglobina do RN A maior circulação entero-hepática é determinada pelas escassa flora intestinal e pela maior atividade da enzima betaglicorunidade na mucosa do intestino Caracteriza-se por início tardio (após 24 horas), com pico entre 3º e o 4º dia de vida e bilirrubinemia total de 12 A presença de icterícia antes de 24-36 horas de vida ou de valores de BT > 12 mg/dL, independentemente da idade pós-natal, alerta para a investigação de processos patológicos. A hiperbilirrubinemia indireta é denominada de fisiológica nos RN termo quando a manifestação clínica ocorre após 24 horas de vida, atingindo concentração de bilirrubina sérica em torno de 12mg/dL de BT, entre o 3º e 4º dia de vida. DOENÇA HEMOLÍTICA: O aparecimento de icterícia nas primeiras 24-36 h de vida alerta para a diagnóstico de doenças hemolíticas por incompatibilidade sanguínea materno-fetal do sistema Rh ou ABO Considerar a doença hemolítica a principal etiologia. É causada por incompatibilidade sanguínea materno-fetal decorrente da aloimunização por diferentes sistemas sanguíneos. Doença hemolítica do RN por incompatibilidade ABO ocorre em cerca de 20% das mães O e feto A ou B Vale ressaltar que a doença hemolítica por incompatibilidade ABO é limitada ao RN tipo A ou B filho de mãe tipo O Genitoras do grupo A ou B com RN do grupo B ou A, respectivamente, produzem anticorpos anti-A ou anti-B predominantemente da classe IgM que não atravessam a barreira transplacentária, o que não causa destruição eritrocitária. LEITE MATERNO X ICTERÍCIA: ICTERÍCIA DO LEITEMATERNO: Saúde da Criança – Amanda Longo Louzada 3 ICTERÍCIA NEONATAL Ocorre na primeira semana de vida, após as 24hs. RN em AME Déficit de ingestão → pega/posicionamento incorretos, perda de peso acentuada nos 1ºs dias de vida e/ou pouca oferta láctea. Perda ponderal de 7% e até desidratação. Devido a circulação entero-hepática. SÍNDROME DA ICTERÍCIA DO LEITE MATERNO: Ocorre na 1ª semana de vida, após as 24h, ao redor do 4º dia de vida. Várias hipóteses levantadas para explicá-la, dentre elas: presença de um metabólito da progesterona no leite materno, potente inibidor da glicuroniltransferase; predisposição genética a icterícia Nessa síndrome chama atenção o bom estado geral do RN e o ganho de peso adequado. Ao invés de haver queda os níveis de bilirrubina, ocorre um aumento podendo chegar a 20- 30mg/dl. Nesse caso, temos um bebê BEG e com bom ganho pondero-estatural. Bebê em AME, costuma persistir a icterícia por 2-3 semanas, Caso haja uma suspensão do AME por 24h, costuma retornar os níveis a normalidade em 48h. GRAUS DE ICTERÍCIA: 0: sem gravidade; com estado mental, tônus muscular e tipo de choro normal 1: gravidade leve Estado mental: sonolento e sucção débil Tônus Musvulae: hipotonia ou hipertonia Tipo de Choro: choro agudo 2: gravidade moderada Estado mental: letárgico e irritado Tônus Muscular: pescoço arqueado com distonia cervical (retrocolis) Tipo de Choro: choro estridente 3: grave Estado Mental: comatoso e convulsões Tônus muscular: tórax arqueado, em opistótono Tipo de choro: inconsolável ZONAS DE KRAMER E GRAVIDADE: Zona 1: cabeça e pescoço BT: 4 – 8 mg\100 mL Zona 2: tronco até cicatriz umbilical BT: 5 – 12 mg\100 mL Zona 3: cicatriz umbilical até os joelhos BT: 8 – 16 mg\100 mL Zona 4: braço, antebraço e região entre o joelho e o tornozelo BT: 11 – 18 mg\100 mL Zona 5: região de mãos e pés inclusive palmar e plantar BT: 15 mg\100 mL ou mais BILIRRUBINA TRANSCUTÂNEA: A determinação da bilirrubina total transcutânea é realizada no esterno do RN com equipamentos importados de custo elevado. Os instrumentos de métodos não invasivos possuem coeficientes elevados de correlação sérica até valores próximos a 15mg/dL.1 Estudos recentes avaliam a possibilidade do uso de aplicativo no smartphone através de imagens das escleras e/ou da pele como futuro método de acompanhamento da icterícia FATORES DE RISCO: Menor meia-vida dos eritrócitos Imaturidade hepática Maior quantidade de glicuronidase no leite materno 2x mais bilirrubina Trato grastrointestinal estéril Icterícia nas primeiras 24-36 horas de vida; Incompatibilidade materno-fetal Rh (antígeno D Mãe negativo e RN positivo), ABO (mãe O e RN A ou B) ou antígenos irregulares (c, e, E, Kell, outros); Idade gestacional de 35 e 36 semanas (independentemente do peso ao nascer); Aleitamento materno exclusivo com dificuldade ou perda de peso > 7% em relação ao peso de nascimento; Irmão com icterícia neonatal tratado com fototerapia; Presença de céfalo-hematoma ou equimoses; Descendência asiática; Mãe diabética; Deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase12; Bilirrubina total (sérica ou transcutânea) na zona de alto risco (> percentil 95) ou intermediária superior (percentis 75 a 95) antes da alta hospitalar. Clampeamento do cordão umbilical, 60 segundos após o nascimento Sexo masculino EXAMES SOLICITADOS: Investigação Inicial: Bilirrubina total e frações; Saúde da Criança – Amanda Longo Louzada 4 ICTERÍCIA NEONATAL Hemoglobina e hematócrito; Reticulócitos; Tipo sanguíneo da mãe e RN para sistemas ABO e Rh Coombs direto no sangue de cordão ou do RN Outros exames: Pesquisa de anticorpos anti-D se mãe Rh negativo Pesquisa de anticorpos maternos para antígenos irregulares (anti-c, anti-e, anti-E, anti- Kell e outros) se mãe multigesta/transfusão sanguínea anterior e RN com Coombs direto positivo Dosagem sanguínea quantitativa de glicose-6- fosfato desidrogenase (G-6-PD) Dosagem sanguínea de hormônio tireoidiano e TSH (exame do pezinho) Lembrar que a icterícia prolongada pode ser a única manifestação do hipotireoidismo congênito, pois o hormônio tireoidiano é um indutor da atividade da glicuroniltransferase. BEBÊS PREMATUROS: A idade gestacional de 35-36 semanas, independentemente do peso ao nascer, é considerada um dos fatores de risco mais importantes para a hiperbilirrubinemia significante. Esses RN possuem capacidade diminuída de conjugação hepática da bilirrubina e apresentam dificuldade na sucção e deglutição para manter uma oferta adequada de leite materno. CONDUTA: Atualmente, a maioria dos casos de hiperbilirrubinemia indireta é controlada pela fototerapia quando aplicada de maneira adequada, sendo a doença hemolítica grave por incompatibilidade Rh a principal indicação de exsanguíneotransfusão (EST). Como a EST acompanha-se de elevada morbidade e mortalidade, deve ser indicada com precisão e praticada exclusivamente por equipe habilitada em cuidados intensivos neonatais FOTOTERAPIA: MECANISMO DE AÇÃO: A fototerapia atua nos capilares e nos espaços intersticiais superficiais da pele e do tecido subcutâneo, tornando a BI (bilirrubina não conjugada) hidrossolúvel. Dessa maneira, esse composto pode ser excretado na urina e na bile sem ser necessária a formação da bilirrubina conjugada pelo fígado. Sob a ação da luz, em especial no espectro de onda azul e verde, após a reação fotoquímica, são formados os fotoisômeros configuracionais e estruturais, além de elementos foto-oxidantes, que aparecem rapidamente, antes mesmo do declínio da bilirrubina. CUIDADOS COM O RN: Proteger os olhos com cobertura radiopaca por meio de camadas de veludo negro ou papel carbono negro envolto em gaze Verificar a temperatura corpórea a cada 3 horas para detecção de hipotermia ou hipertermia Verificar o peso diariamente Posicionar o RN adequadamente para maximizar a exposição à luz Usar fraldas cortadas adequadamente para cobertura da genitália Cobrir a solução parenteral e o equipo com papel alumínio ou uso de extensores impermeáveis à luz Descontinuar a fototerapia durante a amamentação, inclusive com retirada da cobertura dos olhos, desde que a bilirrubinemia não esteja próxima de valor de risco para neurotoxicidade Estimular o contato da mãe-filho para melhorar o vínculo afetivo na hora da amamentação Evitar uso de mantas ao redor do RN Evitar luvas e meias Evitar fraldas grandes Evitar retirar o RN do equipamento, exceto para cuidados rápidos e amamentação Evitar distância acima de 30 cm do equipamento em relação ao RN Aumentar a oferta hídrica através do aleitamento materno EFEITOS ADVERSOS: A interferência física e emocional na formação do vinculo mãe-criança é também relatada como evento indesejado do tratamento com fototerapia. Flutuações da temperatura e na perda de líquido corporal, além do dano à retina, assim como o surgimento do eritema cutâneo e da síndrome do bebê bronzeado. Saúde da Criança – Amanda Longo Louzada 5 ICTERÍCIA NEONATAL Com o uso da lâmpada LED, a hipotermia torna- se evento adverso importante. QUAANDO SUSPENDER A FOTOTERAPIA: Até o 5º dia de vida: RN > ou = 38 semanas suspender se BT < ou = 11,5mg/dL RN entre 35 e 37 semanas suspender se BT < ou = 9,5mg/dL A partir do 5º dia: RN > ou = 35 semanas suspender se BT< ou = 14mg/dL EXSANGUINEOTRASNFUSÃO: Os objetivos da EST são diminuir os níveis de bilirrubina para reduzir o risco de encefalopatia bilirrubínica,além de substituir hemácias sensibilizadas e reduzir anticorpos circulantes. Com a técnica, há a remoção das hemácias com anticorpos ligados e/ou circulantes, redução da bilirrubina e correção da anemia. ICTERÍCIA NEONATAL: Realizar a alta hospitalar somente após 48 horas de vida e o retorno ambulatorial em 48-72 horas para acompanhamento da icterícia, aleitamento materno, entre outras intercorrências, conforme preconizado pela Sociedade Brasileira Pediatria e pelo Ministério da Saúde.
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