Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Antropologia e Cultura Brasileira UNIDADE I OBJETIVOS 1. Compreender a linguagem e a metodologia específica no que diz respeito à relação entre antropologia e cultura; 2. Analisar criticamente a formação econômica, política e cultural brasileira, ressaltando suas bases culturais. ANTROPOLOGIA: DEFINIÇÃO Antropologia é uma ciência, isto é, “um conjunto de teorias” (nem sempre concordantes) e diferentes métodos e técnicas de pesquisa que buscam explicar, compreender ou interpretar as mais diversas práticas dos homens e mulheres em sociedade. PRINCIPAIS ÁREAS DA ANTROPOLOGIA • Antropologia biológica (conhecida também como antropologia física); • Antropologia pré-histórica; • Antropologia linguística; • Antropologia psicológica; • Antropologia social e cultural (ou etnologia). ANTROPOLOGIA SOCIAL E CULTURAL (OU ETNOLOGIA) Abrange tudo que diz respeito a uma sociedade: seus modos de produção econômica, suas técnicas, sua organização política e jurídica, seus sistemas de parentesco, seus sistemas de conhecimento, suas crenças religiosas, sua língua, sua psicologia, suas criações artísticas. ANTROPOLOGIA E CULTURA A antropologia não consiste simplesmente em levantar, sistematicamente, os aspectos da cultura de uma sociedade. Preocupa-se em apresentar como esses aspectos estão relacionados entre si, demonstrando a especificidade, a particularidade dessa sociedade, isto é, a sua totalidade, o que nem sempre é colocado no papel. São coisas como os menores gestos, as trocas simbólicas e os menores comportamentos e atitudes de um grupo, de um povo. NASCIMENTO DA ANTROPOLOGIA Renascimento. Exploração de locais até então desconhecidos, como o Novo Mundo, a América Colonização. PRIMEIRAS QUESTÕES DA ANTROPOLOGIA A grande questão que se colocou a partir do confronto visual com a alteridade, com os que eram diferentes dos europeus, foi justamente se os seres encontrados pertenciam à humanidade. ANTROPOLOGIA DE GABINETE Elaboração das teorias a partir dos relatos dos viajantes, comerciantes, religiosos, militares, exploradores, administradores da colônia etc. Produção centrada nas descrições dos locais e dos povos que os habitavam, mostrando o quanto esses eram diferentes dos europeus. ANTROPOLOGIA: SÉCULOS XIV - XIX CONTEXTO: Colonialismo/neocolonialismo. CARACTERÍSTICAS: Relatos de viagens (cartas, diários, relatórios etc.) feitos por missionários, viajantes, comerciantes, exploradores, militares, administradores coloniais etc. TEMAS E CONCEITOS: Descrição das terras e dos povos, primeiros relatos sobre a alteridade. O PAPEL DA CULTURA Na busca de interpretar as diferenças entre os grupos humanos, a cultura exerce papel fundamental para o olhar antropológico, já que esta passa a ser compreendida como uma prática significativa que distingue o homem da natureza, o homem do animal, além de ser responsável pelas diversas formas de visões de mundo. A cultura é apreendida por meio das experiências que os seres humanos realizam como membros da sociedade. A DEFINIÇÃO DE CULTURA Uma das definições de cultura foi criada por Edward Taylor, em seu livro “Primitiva cultue” (1871). Demonstrou que a cultura pode ser o objeto de um estudo sistemático, isto é, científico, pois se trata de um fenômeno natural que possui causas e regularidades, permitindo um estudo objetivo e uma análise capaz de proporcionar a formulação de leis sobre o processo cultural e a evolução da sociedade. EVOLUCIONISMO OU DARWINISMO SOCIAL A antropologia vai utilizar a teoria do evolucionismo para analisar as sociedades e as culturas. O evolucionismo social ou darwinismo social vai considerar que as sociedades evoluem assim como as espécies. Desta forma, vão considerar não civilizadas as sociedades que não vivem em um modelo industrial como o nosso. EVOLUÇÃO HUMANA EVOLUCIONISMO/ETNOCENTRISMO O evolucionismo, que surge com a ciência antropológica no século XIX, conduz à concepção etnocêntrica do mundo, isto é, parte-se da ideia de que as diferenças entre grupos e sociedades possuem uma escala evolutiva, considerando o mundo europeu como modelo único de sociedade. • EUROCENTRISMO Santos (2005) explica que a sociedade europeia se considerava “civilizada” e “complexa” por ter conseguido a industrialização, a ciência, a tecnologia etc. Por isso, consideravam as demais culturas – as das colônias – “primitivas” e “atrasadas”, por não possuírem tecnologia como eles. O EVOLUCIONISMO DO SÉCULO XIX • Positivismo: Primeira linha de pesquisa da sociologia, influencia muito a produção antropológica. A teoria do evolucionismo social e do positivismo, no século XIX, representava o discurso europeu sobre suas colônias, tratando-se de um discurso de poder, no qual o mais forte era o mais avançado, civilizado, científico, e o mais fraco era o atrasado, selvagem e místico. TEORIAS DETERMINISTAS DETERMINISMO BIOLÓGICO O comportamento cultural é resultado da genética e da hereditariedade dos indivíduos. • Lareia (2004): Antigamente considerava que os grupos humanos eram diferentes uns dos outros devido a traços psicologicamente inatos, como a inteligência ou temperamento. Afirma que as diferenças do ambiente físico determinam a diversidade cultural. Esse momento poderia ser chamado de “saber pé-antropológico”, pois ainda não se tratava de um saber científico. ANTROPOLOGIA E ETNOGRAFIA Malinowski foi o antropólogo que trouxe a grande mudança para a antropologia. Dá início a uma nova antropologia, que também é chamada de etnografia – mapeamento de etnias. A mudança que realizou foi quanto à forma de se fazer a pesquisa, já que esse pesquisador parou de utilizar informações indiretas, aquelas colhidas por viajantes, colonizadores missionários, e começou a realizar pesquisa de campo, ir até as tribos e conviver com as pessoas para, a partir daí, elaborar suas teorias. OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE Método de pesquisa que revolucionou os estudos antropológicos. No lugar de análise de relatos, o pesquisador passa a ir conhecer os povos, penetrar em sua cultura, desvendar seus significados, guiados por essas informações. Para que uma observação seja participativa, é essencial que essa integração do investigador seja aceita e reconhecida pelos demais integrantes do grupo ou comunidade. ESCOLA ANTROPOLÓGICA FUNCIONALISTA Além da revolução que realizou no trabalho de campo, Malinowski trouxe novos elementos para contrapor ao evolucionismo social e ao etnocentrismo. O funcionalismo elabora uma análise sem se preocupar com a história, parte para o estudo da sociedade do “outro” sem se preocupar com o passado dessa sociedade, pois essas sociedades nem sempre buscavam valorizar o tempo como nós fazemos - de forma linear, um tempo histórico, feito de acontecimentos sucessivos para pensar sua própria existência. FUNCIONALISMO Os estudos funcionalistas permitiram que sociedades não europeias passassem a ser compreendidas dentro de suas especificidades. As sociedades tribais africanas, australianas e asiáticas passaram a ser entendidas a partir de sua função social. CRÍTICAS AO FUNCIONALISMO Feitas a partir dos anos 1960. Apontavam para a ineficácia dos modelos de mudanças sociais, suas contradições estruturais e conflitos. Outras críticas apontavam para a descrição das instituições sociais apenas a partir de seus efeitos, omitindo, portanto, as causas que levariam a esses efeitos. Os funcionalistas, ao utilizarem conceitos como aculturação e choque cultural, deixavam de revelar as desigualdades que existem nesse contato, principalmente quando resultam de uma política colonialista. Além disso, são responsáveis pelo que ficou conhecido como relativismo cultural, ou seja, uma postura de tolerância e respeito em relação aos costumes e traços culturaisdiferentes. O CULTURALISMO NORTE-AMERICANO Franz Boas é um dos primeiros antropólogos a perceber a necessidade de se estudar um povo em suas particularidades, isto é, cada grupo tem suas condições históricas, climáticas, linguísticas etc., e tudo isso determina que cada cultura é específica, por isso a pluralidade de culturas diferentes. Assim como Malinowski, realizará estudos junto ao grupo pesquisado, resultando, esses estudos, também em uma antropologia relativista. RELATIVISMO CULTURAL Para relativizar, é necessário deixar de lado todos os meus valores e procurar conhecer o outro, a maneira como ele expressa e experimenta sua vida. Eu não posso falar como o outro se comporta, pensa e sente. É necessário saber como o outro pensa e sente o seu mundo por meio de seus valores e de seu conhecimento. Não podemos explicar o outro pelo nosso mundo, nossos valores e nossos conhecimentos. O CULTURALISMO Boas não organizou e nem apresentou uma teoria da cultura. O conceito de cultura não fica claro, pois sua preocupação consistia mais em levantar hipóteses do que sistematizá-las. Pesquisou várias áreas, como: antropologia física e linguística, folclore, geografia, migrações e organização social. O que há de importante em suas pesquisas é que boas percebeu que a cultura humana não é uma apenas, mas várias, e que elas estão relacionadas pelo ambiente, pela língua ou pelo comportamento dos indivíduos que criaram essas culturas. A INFLUÊNCIA DE FRANZ BOAS O pensamento de boas vai embasar uma geração de antropólogos, como Gilberto Freyre, na antropologia brasileira. FRANZ BOAS TEVE TRÊS GRUPOS DE ALUNOS QUE ACABARAM POR DESENVOLVER ALGUMAS DE SUAS IDEIAS: • Um grupo que relacionou a personalidade e a cultura; • Outro que analisou as relações entre a linguagem e a cultura; • E o terceiro grupo, que trabalhou a relação entre os ambientes geográfico, ecológico e físico com a cultura. A ANTROPOLOGIA INTERPRETATIVA Geertz sustenta que o conceito de cultura é semiótico, isto é, o homem vive em um emaranhado de significados que ele mesmo criou. Desta forma, a análise do emaranhado deve ser realizada pela ciência antropologia, isto é, uma ciência interpretativa que busca os significados, e não uma ciência experimental, ou seja, que tem como objetivo buscar leis gerais. • A TEORIA INTERPRETATIVA Geertz, em suas pesquisas, buscou identificar como as pessoas de determinada cultura se define analisando as formas simbólicas pelas quais se expressam (palavras, rituais, costumes, comportamentos etc.). O antropólogo não precisa morar com o grupo que está estudando, mas deve sim conversar com eles e realizar uma “descrição densa” sobre as particularidades desse grupo, para que se possa levar a interpretação do discurso social, a busca do significado da ação a partir do “ponto de vista dos nativos”. A ANTROPOLOGIA PÓS-MODERNA OU CRÍTICA A partir da década de 1980, surge a antropologia pós-moderna ou crítica, que busca politizar a relação entre o observador e o observado, bem como a crítica dos paradigmas (modelos) teóricos. CRÍTICA: Forma como os antropólogos aparecem em suas pesquisas e a sua relação com aqueles que são observados. CULTURA E FORMAÇÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA IDENTIDADE: Um conceito interligado a outros, como grupo social e cultura. A identidade dos sujeitos forma-se a partir das condições históricas e culturais em que vivem – condições que não escolheram, pois, ao nascer, tudo já estava pronto, então se deparam com um grupo familiar e social, com uma língua usada por todos e com um conjunto de regras, hábitos e tradições utilizadas. A sociedade e a cultura delimitam a nossa vida. BRASIL: PROCESSO DE COLONIZAÇÃO A questão da raça se tornou um adjetivo que acaba por dar significado à nossa identidade: “trabalhadores negros”, “índios”, “operários italianos”, “alemães”, “imigrantes brancos”. Essas raças se tornaram adjetivos que acabaram dando à identidade do trabalhador uma singularidade, de forma que passam a ser reproduzidas nas relações sociais de trabalho. ANTROPOLOGIA NO BRASIL Influência de Gilberto Freyre e seu livro “Casa- grande e senzala”. Nesta obra, Freyre descreve a vida cotidiana nos engenhos e como acontece a formação da economia brasileira a partir da escravidão. Pesquisa a partir do cotidiano, elemento de importância para o estudo de antropologia e sociologia. A TEORIA DE GILBERTO FREYRE Influenciado pela forma de pesquisar do culturalismo americano em “Casagrande e senzala”. Resulta em uma representação da antropologia brasileira nessa linha de pesquisa. TEORIA FREIRIANA Freyre busca aquilo que é específico da nossa cultura e, muitas vezes, sua explicação se embasa nos aspectos geográficos, em outro momento na “raça” e na personalidade dos povos que formam a cultura brasileira, e também na língua utilizada. Esses aspectos são os que o levarão a formar o conceito de cultura brasileira. E são justamente esses aspectos que fazem parte da forma de se fazer pesquisa no culturalismo americano de Franz Boas. DIFERENTES ANÁLISES ANTROPOLÓGICAS Gilberto Freyre deu início às análises da cultura brasileira de uma maneira bastante original, na medida em que viu com otimismo a miscigenação racial e as particularidades das relações sociais no Brasil. TEORIAS DE FREYRE Freyre busca compreender a relação entre raça e cultura, demonstrando que a questão genética não está acima da dimensão cultural, ou seja, a existência dos problemas sociais não estaria, necessariamente, relacionada ao caráter mestiço do povo brasileiro, demonstrando, assim, pensamento contrário ao determinismo biológico. CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE BRASILEIRA Freyre (1997, p.4) caracteriza a base da sociedade brasileira: “[...] a agricultura, as condições, a estabilidade patriarcal da família, a regularidade do trabalho por meio da escravidão, a união do português com a mulher índia, incorporada assim à cultura econômica e social do invasor.” COLONIZAÇÃO HÍBRIDA Segundo Freyre (1997), a aceitabilidade dos portugueses quanto à colonização híbrida e o resultado da mistura entre eles e os índios e negros era consequência do seu passado étnico e cultural, já que eles receberam influências sexuais, alimentícias e religiosas nas suas relações com a África. A partir disso, já havia o mestiço na relação do português com o negro na própria África. INOVAÇÕES Gilberto Freyre se destaca, nesse momento, devido à ousadia na forma como vai interpretar o Brasil e os brasileiros, a partir das características geográficas, das origens étnicas ou da raça, como ele usa em seu texto, buscando descrever a formação do nosso povo. O MITO DA DEMOCRACIA RACIAL O livro “Casa-grande e senzala” é criticado por apresentar uma relação social entre portugueses, índios e negros de uma maneira fantasiosa. Há intelectuais que o criticam por encontrar, na obra, uma mensagem de que, naquele tempo, existia uma “democracia racial”. MISCIGENAÇÃO E MOBILIDADE Para Freyre, o que ajudou o português a conquistar novos territórios foi também a sua facilidade em se aclimatar, denominada por ele de “aclimatabilidade”. Freyre considerava que as condições geográficas de Portugal eram parecidas mais com as da África do que com as da própria Europa. Por isso, os portugueses não sentiram tanta diferença no Brasil. Desta forma, isso os ajudará em sua fixação na formação da colônia híbrida (mestiça). INOVAÇÕES Para Freyre, o problema social é o que debilita a população brasileira, e não a mestiçagem, já que não é a mistura de raça que traz a debilidade a esse povo, mas a pobreza, a escassez de alimentação, o regime escravo, a química dos alimentos tradicionais que consomem, a irregularidade alimentar, a falta de higiene na conservação e distribuiçãodos alimentos. É dentro desse antagonismo que será formada a sociedade brasileira: de um lado, a grande lavoura, a monocultura do litoral; de outro, a pecuária do sertão. Tanto monocultores quanto pecuaristas não tinham uma alimentação sadia. Freyre (1997) diz que, durante os três séculos de colonização, a vida foi difícil, pois a monocultura esterilizou a terra, os senhores rurais se endividaram, as formigas, as enchentes e as secas dificultaram a produção dos alimentos. A obra de Freyre é considerada inovadora pelo fato de destacar, pela primeira vez, algumas características positivas nos grupos indígenas e negros. CARACTERÍSTICAS INDÍGENAS Em relação aos costumes indígenas, Freyre (1997) destaca sua influência na introdução dos hábitos de higiene e na dieta do colonizador português, com a introdução de alimentos nutritivos, como a mandioca e o conhecimento do poder de algumas ervas. Para Freyre, coube à mulher indígena o papel de transmitir esses costumes, pois o homem índio tendia a ser nômade, enquanto a mulher, por se fixar em um só local, teria a facilidade de se amancebar com os portugueses e, consequentemente, transmitir ao europeu um pouco da sua cultura. Quanto ao homem indígena, coube a responsabilidade de transmitir aos portugueses o gosto pela guerra. INFLUÊNCIA NEGRA Freyre (1997) destaca algumas características, como a ternura, a mímica excessiva, elementos religiosos, a música, o andar, entre outras. Sem negar a importância do negro na vida estética e no progresso econômico do Brasil, o autor enfatiza, em sua análise, a separação entre negro e escravo, contrariando as teorias eugênicas predominantes na época e que, influenciadas pelo cientificismo e darwinismo social, descreviam o negro como uma raça inferior. Para Freyre, o negro brasileiro não era inferior, mas, sim, foi inferiorizado durante a escravidão. A escravidão desenraizou o negro do seu meio social e de sua família, soltando-o entre gente estranha e, muitas vezes, hostil. [...] É absurdo responsabilizar o negro pelo que não foi obra sua nem do índio, mas do sistema social e econômico em que funcionaram passiva e mecanicamente. Não há escravidão sem depravação sexual. É da essência mesmo do regime [...] (FREYRE, 1997, p. 315-316). CRÍTICAS À OBRA DE FREYRE A violência e os conflitos que envolveram a escravidão, presentes nas relações entre senhores e escravos, foram minimizados em “Casa-grande e senzala”, reproduzidos em apenas algumas citações sobre as humilhações, castigos e torturas aos quais os negros eram submetidos. Ao aplicar o termo “assimilação” para descrever os contatos entre colonizadores e colonizados, Freyre (1997) traz a visão antropológica da ideia de solidariedade e interação entre os grupos, minimizando os aspectos que demonstram a exploração e a violência que marcaram a história da colonização brasileira. UNIDADE II A PERSPECTIVA DE SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA Publicou, em 1936, seu primeiro livro, “Raízes do Brasil”, um clássico da sociologia, da antropologia e da história brasileira. É uma obra na qual elabora uma análise social criticando a formação das elites culturais e políticas do Brasil. Ao elaborar essa obra, tinha como objetivo delinear uma “psicologia” do povo brasileiro a partir do processo colonizador. “RAÍZES DO BRASIL” Recorre à sociologia weberiana, buscando identificar, entre os ocupantes do nosso território, os “tipos ideais” de homens brasileiros, cunhando então as figuras do semeador e do ladrilhador para melhor explicar a diferença entre a colonização lusitana e a espanhola. Critica a falta de preocupação dos portugueses com a educação, com a linguagem e com a imprensa, resultando em três séculos de ignorância para o nosso país. Demonstra que o povo português trouxe para a colonização características próprias de seu estilo de vida, como: ausência da hierarquia social e utilização do prestígio social em busca de privilégios. Assim, um dos temas fundamentais desse livro será o não interesse pelo trabalho e por atividades úteis, resultando na falta de organização, pois os ibéricos não abrem mão de sua vaidade, de seus caprichos ou interesses particulares para beneficiar o seu grupo. INOVAÇÃO Buarque de Holanda descreve de maneira inovadora os costumes e as características do povo brasileiro, destacando sua formação colonial em uma sociedade dividida entre senhores e escravos. Explica que a busca pela propriedade e riqueza sem muito esforço é uma característica do nosso povo a partir da influência do tipo de homem aventureiro, que influenciou a formação da vida nacional. Isso se deve a vários fatores, como: as raças que se encontraram aqui, os hábitos que trouxeram e as condições geográficas (terra, clima) às quais se adaptaram O COMPORTAMENTO DO PORTUGUÊS “[...] a ausência completa, ou praticamente completa, entre eles, de qualquer orgulho da raça” (HOLANDA, 1995, p. 53). Isso se dá devido ao fato de eles serem já um povo de mestiços. Por isso, a mistura dos portugueses com os africanos não era novidade alguma para eles, pois antes de 1500 já traziam negros para plantar, desbravar terras, trabalhar em suas casas e, por meio das relações sexuais com os negros, formavam uma nação de mestiços. INSERÇÃO SOCIAL E POLÍTICA Mesmo havendo a tentativa de barrar a influência dos negros e mulatos, a tendência da sociedade brasileira era a de abandonar as barreiras sociais, políticas e econômicas entre as diferentes categorias de homem (cor, livres e escravos). O HOMEM CORDIAL Parte da hipótese de que os portugueses eram os mais preparados para executar a colonização brasileira devido à sua forma de civilização. Essa conquista é vista como consequência das suas necessidades naturais de aventuras. A ética da aventura é também um conceito utilizado para a compreensão da sociedade brasileira contemporânea em sua origem histórica. A colonização justifica-se pelo espírito aventureiro do português, que conseguiu se adaptar à América como nenhum outro povo conseguiu. “Homem cordial”: um dos conceitos centrais da obra de Sérgio Buarque de Holanda. Passou a ser utilizado por nós como referência para a compreensão de sua teoria. Ao definir o conceito de homem cordial, o autor buscou compreender as características psicológicas marcantes do modo de ser do brasileiro. Demonstra que o homem realiza determinadas atitudes mais pessoais em momentos nos quais deveria ser mais formal. Mostrando cordialidade, torna-se mais flexível. Por exemplo, no uso de nome e sobrenome, normalmente este é deixado de lado para haver mais personalização nas relações sociais. Isso se dá de forma semelhante na religião, pela superficialidade, para que não haja extremismos. Estas são as características que fazem parte da personalidade do brasileiro. CULTURA DA PERSONALIDADE Ao analisar a colonização da América, Sérgio Buarque destacou a sua concepção de cultura da personalidade, na qual o seu apego pelo prestígio pessoal resultava da ausência de uma moral de culto ao trabalho, diferentemente dos países protestantes. É essa cultura que contribuiu para que se desse valor ao indivíduo autônomo, e não à organização espontânea, formada pela coesão social. Assim, essa característica está intimamente ligada a outra herança ibérica, que é a repulsa ao trabalho. O NOVO OLHAR DA ANTROPOLOGIA As pesquisas sobre os índios, negros e sertanejos no Brasil intensificaram-se na década de 1940. Apareceram, também, estudos e interpretações sobre a sociedade em sua totalidade, ou seja, a pesquisa que considera o chamado “povo brasileiro”. O NOVO OLHAR DA ANTROPOLOGIA Essas análises, elaboradas a partir de 1930 e 1940, tiveram como propostas compreender a “identidade nacional”, resultado do contexto histórico-político do país. Essafase da antropologia brasileira estendeu-se até a década de 1960. NOVAS TEMÁTICAS A partir da década de 1980, as análises antropológicas voltaram-se para temáticas como: diversidade de valores, expressões culturais e variados modos de ser e viver dos grupos sociais urbanos, destacando-se as pesquisas sobre gênero, sobre o papel da mulher na sociedade e seus direitos, sobre a prostituição, as análises que buscavam interpretar os diferentes modelos de família, a arquitetura urbana, as chamadas minorias étnicas, incluindo pesquisas de memória histórico-cultural, e as formas de interação e sociabilidade nas grandes cidades. Com o surgimento da antropologia urbana, são contemplados, nas análises, os valores do homem urbano, as representações e as práticas socioculturais dos diversos grupos que vivem nas vilas, cidades e grandes centros, além da questão da cultura capitalista e da industrialização. DARCY RIBEIRO E O POVO BRASILEIRO Buscou elaborar uma teoria para o Brasil, preocupando-se em entender seu desenvolvimento e as desigualdades sociais existentes desde a formação nacional. Reconstituindo os aspectos históricos, Darcy Ribeiro desenvolve uma análise voltada à compreensão sobre a gestação do Brasil e dos brasileiros como povo: “Surgimos da confluência, do entrechoque e do caldeamento do invasor português com índios silvícolas e campineiros e com negros africanos, uns e outros aliciados como escravos.” CONTRIBUIÇÃO DE DARCY RIBEIRO Romancista, etnólogo e político, Darcy Ribeiro, de formação acadêmica funcionalista, contribuiu em sua análise para desmistificar a ideia de integração racial pacífica no Brasil. De acordo com seus estudos, a unidade nacional resultou de “um processo continuado e violento de unificação política, logrado mediante um esforço deliberado de supressão de toda identidade étnica discrepante e de repressão e opressão de toda tendência virtualmente separatista”. • FORÇAS DIVERSIFICADORAS Apesar da unidade étnica existente, ressaltada pelo antropólogo, não há uniformidade no país, pois atuaram sobre ele três forças diversificadoras: 1) A ecológica, fazendo surgir paisagens distintas; 2) A econômica, criando formas diferenciadas de produção; 3) A imigração, que introduziu, nessa mistura, novos contingentes humanos. MODOS RÚSTICOS DO BRASILEIRO Como resultado desse processo histórico, surgiram, no país, o que Darcy Ribeiro considerou como “modos rústicos de ser dos brasileiros”, ou seja, grupos que se diferenciam devido às adaptações regionais ou funcionais, ou de miscigenação e aculturação, mas que têm em comum a brasilidade, entre eles destacam-se: Sertanejos do Nordeste, Caboclos da Amazônia, Crioulos do litoral, Caipiras do Sudeste e Centro-Oeste, Gaúchos, Ítalo-Brasileiros, Teuto-Brasileiros, Nipo-Brasileiros e entre outros. ORGANIZAÇÃO SOCIAL DO BRASIL DE ACORDO COM DARCY RIBEIRO: O povo brasileiro é novo porque só haverá uma etnia nacional diferente de nossas matrizes formadoras a partir de nossa mestiçagem. Isto é, forma-se uma nova cultura a partir de várias culturas. É um povo novo, também, porque se vê e é visto pelos outros como gente nova, diferente dos que existiam. Darcy destaca uma nova forma de organização da estrutura da sociedade brasileira, já que inaugura uma forma particular da sua organização tanto social como econômica a partir de uma restauração do escravismo e em uma prática de servidão contínua ao mercado mundial. DIVERSIDADE CULTURAL BRASILEIRA Uma das características da sociedade contemporânea, assim como de outras, é a grande diversidade interna. Santos (2006): “Isso decorre do fato de que a população se encontra colocada de modo diferente no processo de produção capitalista”. Poderíamos falar, no Brasil, em diferentes culturas: dos idosos, dos evangélicos, dos aposentados, das mulheres de classe proletária. ou poderia ser também dos idosos aposentados evangélicos, ou das mulheres de classe proletária do estado de São Paulo em 1980. CATEGORIAS CULTURAIS No Brasil, são utilizadas, pelos pesquisadores, diferentes categorias de culturas: cultura popular, cultura erudita, cultura de massa (ou indústria cultural). DEFINIÇÃO DE CULTURA A cultura refere-se a toda produção simbólica, trazendo, em si, todas as contradições da sociedade. No caso de sociedades capitalistas como a nossa, a produção simbólica estaria relacionada às próprias relações capitalistas de produção, relações que opõem capital e trabalho e, consequentemente, dominantes e dominados. CULTURA POPULAR X CULTURA ERUDITA A cultura popular: É a manifestação dessas classes chamadas de dominadas, e são manifestações diferentes das elaboradas pela classe dominante, já que são produzidas fora das instituições oficiais, que existem de forma independente dessas. A cultura erudita: É produzida por membros que fazem parte de uma elite política, econômica e cultural, que tem acesso à escrita, a livros, ao estudo. Segundo Gilberto Velho e Eduardo Viveiro de Castro (apud TOMAZI, 2000), “é impossível definir a cultura erudita, porque os elementos culturais produzidos por intelectuais, fazendeiros, industriais, empresários, burocratas e políticos [...] não podem ser homogeneizados”. O termo “cultura popular” surge no final do século XVIII e início do XIX, momento em que os intelectuais europeus passaram a se preocupar com a produção do povo. Os estudiosos começaram a visitar casas e festas dos artesãos e camponeses para saber e aprender suas canções e estórias. Alguns desses intelectuais eram filhos de artesãos e camponeses. Porém, a maioria era de classes superiores e não os conheciam. Burke (1995) “Quando pensavam no povo, imaginavam-no natural, simples, analfabeto, instintivo, irracional, enraizado na tradição e na terra, sem nenhum sentido de individualidade. Exatamente por isso, queriam conhecê-lo.” em um primeiro momento, consideraram o povo como exótico. Depois passaram a admirá-lo e até chegaram a imitá-lo. Porém, essa valorização do povo pelos intelectuais tinha motivos políticos, intelectuais e estéticos. CULTURA X NAÇÃO Pode-se inferir que, de certo modo, foram os intelectuais que, ao pesquisar e coletar as canções, poemas e estórias populares, inventaram, entre o próprio povo, a ideia de “nação”. • OPOSIÇÃO ENTRE CULTURA POPULAR E ERUDITA A oposição não existe, porque aquilo que, antes, era restrito a determinadas classes, agora é domínio de uma grande maioria. Por exemplo, o domínio da escrita e da leitura, que antigamente eram um saber das classes dominantes, tende cada vez mais a se generalizar, deixando de ser restrito e não podendo mais ser classificado como erudito. CULTURA POPULAR A cultura é produto da sociedade. Ajuda a produzir a própria forma de organizar a vida, a maneira de pensar e sentir dos seres que vivem em sociedade. Por isso, segundo Santos (2006), a cultura não pode ser entendida como uma representação de outras esferas da sociedade, já que a dimensão cultural pode prever e propor mudanças nas situações de existência da sociedade. A cultura é dinâmica e criativa. CULTURA POPULAR OU FOLCLORE Existem pesquisadores que usam o termo “cultura popular” no lugar do termo “folclore”, e outros que acham que não há distinção entre os termos. O antropólogo Antônio Arantes deixa claro que os dois termos servem para as mesmas realidades. Porém, o folclore tem um sentido mais conservador, enquanto a cultura popular é mais progressista. Para Carlos Brandão, o conceito de folclore foi ampliando-se ao longo da história e acabou por associar-se à maneira de o povo viver, incorporando as festas, os ritos e também o cotidiano e seus produtos: a comida, a casa, a vestimenta, os artefatos de trabalho. E, nesse sentido, os dois termos – cultura popular e folclore – querem dizera mesma coisa. A CULTURA EM MOVIMENTO É consenso que a cultura popular incorpora novos elementos e acaba por sofrer mudanças. Carlos Brandão demonstra isso a partir da Folia de Santos Reis, a respeito da máscara de um dos participantes do evento: “Quando é difícil fazer de palha, nós fazemos [sic] de plástico.” A cultura popular ou o folclore, para continuar a existir, utiliza-se de elementos da vida urbana. A CULTURA EM TRANSFORMAÇÃO “A transformação dos eventos culturais em espetáculo ou a distribuição dos produtos culturais no mercado acaba servindo muitas vezes para a manutenção da prática cultural e para a projeção social.” (TOMAZI, 2000, p. 194). A Folia de Santos Reis, assim como o Carnaval, tem sua origem nos antigos rituais europeus da Idade Média, que acabaram tornando-se uma festa popular brasileira. Muitos acreditam que o Carnaval deixou de ser popular e, hoje, tornou-se uma festa puramente turística. Porém, é preciso pensar o tema com maior atenção. CULTURA EM MOVIMENTO Na atual sociedade em que vivemos, o Carnaval necessitou de uma nova estrutura de apoio que antes não era necessária. Isso demonstra que não há tradição pura e imutável. Por isso, a cultura popular não deve ser entendida separada da sociedade moderna. A CULTURA POPULAR BRASILEIRA EXEMPLOS: São João, Bumba-Meu-Boi; personagens como a Mãe-d’água e o Saci-Pererê; as religiões afro- brasileiras; as músicas como samba, xaxado, forró, sertanejo, maxixe; a literatura de cordel, as adivinhas e os ditados populares; o artesanato, como as “carrancas” de madeira, as rendas e colchas de retalho realizadas por mulheres rendeiras; a comida típica, como feijoada, tutu de feijão, vatapá, acarajé, e os doces, como quindim, cocada e brigadeiro. CULTURA E SOCIEDADE Precisamos entender as relações que todos esses elementos têm com a sociedade na qual são realizados. “Para se compreender a cultura popular, deve-se perguntar por que e por quem ela é produzida e por que, como, quando e por quem é consumida.” (TOMAZI, 2000, p. 196) Toda criação cultural está intimamente ligada à produção material da sociedade, inspirando-a e sendo inspirada por ela. A INDÚSTRIA CULTURAL Desenvolvimento a partir do século XVIII. O fato histórico que marca esse século é a multiplicação dos jornais na Europa, já que, até a Idade Média, a leitura e a escrita eram privilégios do clero e de parte da nobreza. Isso muda com o capitalismo, pois o novo modelo socioeconômico trouxe como características a urbanização, a industrialização e o aumento do mercado consumidor. As cidades tornam-se polos de importância econômica, social e cultural. A população deixa o campo rumo à cidade para trabalhar nas fábricas. Com a introdução das máquinas na produção de mercadorias, tem-se o barateamento dos produtos e, com isso, o aumento do mercado consumidor. Assim, a burguesia comercial e industrial constitui-se como classe hegemônica e as classes médias aumentam, sendo esse novo público conquistado pelo mercado e pelos bens culturais. Os jornais, como produto cultural, assumem grande importância, já que, com o barateamento do papel, há o aumento dos leitores, e esse produto divulga as notícias e os folhetins (histórias publicadas em nota de rodapé das páginas e cuja continuação só era conhecida pelo leitor se ele comprasse o próximo exemplar, como as novelas atuais). A INDÚSTRIA CULTURAL: DEBATES Assim, os veículos de comunicação serão chamados de indústria cultural. Na visão de Adorno, a indústria cultural, com seus anúncios, seduz as massas para consumir as mercadorias culturais, com o objetivo de fazê-las esquecer a exploração que sofrem no processo de produção, levando a massa à imobilização. O teórico Marshall McLuhan, que defendeu os meios de comunicação nos anos 1960, afirma que a televisão é a forma de aproximar os homens, diminuindo a distância territorial e social entre os seres humanos, levando à democracia. Segundo o pensador Umberto Eco, as duas concepções estão equivocadas, pois não podemos considerar a cultura de massa apenas ruim pelo seu caráter industrial, já que a sociedade em que vivemos é industrial, e nem a considerar boa, pois não podemos esquecer que a cultura de massa é produzida por aqueles que têm poder econômico, que buscam lucro e que, por meio das ideologias, buscam manter a estrutura social segundo seus interesses.
Compartilhar