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Sociedade e Contemporaneidade
REDES SOCIAIS NA ERA DIGITAL: AS FORMAS DE SOCIABILIDADE ON-LINE
Nesta unidade temática, você vai aprender
· entender as características das redes sociais digitais e da sociabilidade online;
· analisar as possibilidades de comunicação pós-redes sociais digitais;
· entender aspectos como a organização, a identidade, conversação e mobilização social que ocorrem neste novo espaço (lugar) que são as redes sociais;
· compreender as formas de construção de laços sociais nas redes sociais;
· problematizar a lógica da exposição online baseada em uma construção de si a ser tornada pública (imperativo da visibilidade);
· compreender as possibilidades associadas a partir da convergência do social com o tecnológico;
· entender esta forma distinta de cultura, a cultura digital;
· perceber a linha tênue entre o público e o privado através das redes sociais e suas implicações;
· entender a diferença entre notícia e informação;
· analisar os riscos associados ao descontrole da informação e suas implicações para a cultura e para a ação social;
· problematizar a relação entre o jornalismo e as redes sociais.
Introdução
A morte de uma dona de casa por espancamento, em 2014, no Guarujá (São Paulo), após ter sido “condenada” pelo tribunal popular das redes sociais e linchada brutalmente pelos conterrâneos nas ruas do bairro onde vivia, se tornou paradigmático ao revelar, a um só tempo, o poder de viralização da informação na Internet e os perigos decorrentes da falta de cuidado e de critério ao tomar como verdade e passar adiante aquilo que se lê online. Fabiane Maria de Jesus era casada, tinha dois filhos ainda pequenos e foi vítima de um boato de uma página do Facebook que publicou um suposto retrato falado de uma mulher acusada de sequestrar crianças em Bonsucesso, no Rio de Janeiro, para praticar rituais de magia negra. Fabiane foi confundida com o desenho, atacada na rua e linchada por um grupo de pessoas da sua própria cidade, que não questionou a veracidade da informação, a data da publicação ou o local onde teriam acontecido os crimes atribuídos à mulher (como se soube posteriormente, toda a história era falsa: não havia sequestro nem magia negra, e um retrato falado relativo ao caso não havia sido divulgado originalmente pela polícia).
Para aumentar os contornos brutais do acontecimento, os algozes de Fabiane registraram o linchamento com celulares e publicaram vídeos explícitos no YouTube, como se não houvesse problema algum no justiçamento com as próprias mãos; na execução sumária de uma pessoa que passa de suspeita à culpada, e de culpada à condenada à pena de morte sem sequer saber do que estava sendo acusada, sem ser levada à Justiça e sem possibilidade alguma de defesa (física e moral).
Para piorar ainda mais, os vídeos se tornaram virais, ou seja, foram compartilhados por milhares de usuários de redes sociais digitais. A polícia identificou nos vídeos alguns dos agressores e arrolou no processo também o administrador da página do Facebook em que o retrato falado foi publicado, que foi responsabilizado pela divulgação do boato. No entanto, ainda que não seja possível culpabilizar criminalmente os usuários de redes sociais que compartilharam um boato como se fosse verdade, podemos questionar se eles também não são responsáveis, em alguma medida, pelo trágico desfecho do caso. O questionamento se torna ainda mais plausível quando se considera que a página em questão não era de um jornal ou meio qualquer de imprensa (ou seja, conteúdo produzido por jornalistas profissionais) e, sim, apenas uma página amadora de divulgação de notícias policiais locais. Mendes Júnior e Costa definem o viral como algo que
se refere à forma de comunicação cuja dinâmica replica a da introdução de um vírus em um sistema, disseminação abrangente, veloz e fora de controle. Na era da tecnologia, quando milhares de pessoas estão conectados à webesfera o tempo todo, ideias são propagadas rapidamente nas redes sociais. (MENDES JÚNIOR e COSTA, 2014, s/p)
O exemplo que abre este texto permite iniciar uma discussão sobre diversos aspectos que envolvem a chamada sociabilidade online e alguns fenômenos a ela associados, especialmente o consumo de notícias e de conteúdo de entretenimento; a presença dos indivíduos nas redes sociais digitais; a criação de narrativas pessoais sobre suas próprias vidas; os laços que estabelecem com outros usuários e os seus comportamentos de produção e difusão de informações e conteúdos diversos. Redes sociais “analógicas” sempre existiram em alguma medida como espaços de sociabilidade envolvendo grupos unidos por laços familiares, profissionais, de amizade ou interesses em comum. Mas, ao mesmo tempo, o cenário que se desenha após a popularização da Internet banda larga, das redes sociais e dos dispositivos móveis de comunicação (como smartphones, tablets e notebooks) embaralha alguns conceitos e torna confusos alguns limites que dizem respeito aos fenômenos mencionados acima como, por exemplo: as fronteiras entre o público e o privado (muito mais fáceis de serem definidas no passado, quando as pessoas se expunham prioritariamente em seus círculos pessoais mais próximos); as diferenças entre a notícia e o boato; entre um jornalista e um cidadão comum que presencia um fato e o relata em uma rede social ou entre uma rede social e um veículo de comunicação tradicionalmente instituído. No entanto, antes de avançar, é necessário definir o que são exatamente as redes sociais na era digital e estabelecer alguns parâmetros que vão nortear a discussão proposta pelo texto.
As redes sociais como espaços de sociabilidade
Talvez as redes sociais não sejam responsáveis pela criação de fenômenos sociais ou comunicacionais até então inexistentes, mas certamente modificam seus modos de operação ao afetar a sociabilidade humana, ampliando exponencialmente o seu alcance. Nossa perspectiva, alinhada com Manuel Castells, evita o dilema do determinismo tecnológico e considera que “a tecnologia é a sociedade, e a sociedade não pode ser entendida ou representada sem suas ferramentas tecnológicas” (CASTELLS, 2009, p. 43, grifo do autor). Entretanto, algumas questões podem ser levantadas a respeito do modo como a tecnologia, em sua inevitável inserção no cotidiano dos indivíduos nas sociedades industrializadas, interfere nessa sociabilidade.
Muitos exemplos podem ser convocados para exemplificar a discussão ou iniciar um debate sobre as possibilidades da comunicação pós-redes sociais digitais (qualquer usuário de ferramentas e plataformas como Facebook, Instagram, Twitter ou YouTube é capaz de citar um caso viralizado que tenha lhe chamado muito a atenção). Como explica Raquel Recuero, esses fenômenos representam mudanças nos modos de “organização, identidade, conversação e mobilização social”, pois a comunicação passa a permitir uma capacidade de conexão diferente: as redes conectam não apenas computadores, mas pessoas (RECUERO, 2010, p. 16-17).
A autora aponta a possibilidade de expressão e sociabilização por meio das ferramentas de comunicação mediada pelo computador (e, posteriormente, pelos demais dispositivos móveis, podemos acrescentar) como a principal mudança que a Internet trouxe à sociedade. O que define uma rede social, segundo Recuero, são seus elementos: “atores (pessoas, instituições ou grupos; os nós da rede) e suas conexões (interações ou laços sociais)” (RECUERO, 2010, p. 24).
A autocomunicação de massa, comunicação do tipo todos-com-todos, modifica as formas de relações sociais.
Os sites de redes sociais, a exemplo do Facebook, permitem a criação de espaços públicos mediados, ou seja, “ambientes onde as pessoas podem reunir-se publicamente através da mediação da tecnologia” (BOYD apud RECUERO, 2009). Esses ambientes guardam algumas características que são definidas por Boyd e recuperadas por Recuero:
· Persistência: refere-se ao fato de que aquilo que foi dito permanecer no ciberespaço. Ou seja, as informações, uma vez publicadas, ficam no ciberespaço;
· Capacidade de Busca(searchability): refere-se à capacidade que esses espaços têm de permitir a busca e permitir que os atores sociais sejam rastreados, assim como outras informações;
· Replicabilidade: aquilo que é publicado no espaço digital pode ser replicado a qualquer momento, por qualquer indivíduo. Isso implica também no fato de que essas informações são difíceis de ter sua autoria determinada;
· Audiências Invisíveis: nos públicos mediados, há a presença de audiências nem sempre visíveis através da participação [...] (RECUERO, 2009).
Apesar do lugar de protagonismo que as redes sociais ocupam na sociabilidade do nosso tempo, é importante lembrar que elas se expandem fora e além do ambiente virtual, no modo como os indivíduos se utilizam delas para criar novos laços ou manter os já existentes – laços esses que irão afetar a sua vida de forma concreta, e não apenas isso: as pessoas passam boa parte do tempo em que estão acordadas acessando redes sociais para fins de relacionamento pessoal, mas também para falar de si, trabalhar, se informar, divulgar, comentar e compartilhar conteúdos, tornando mais complexa a sua presença online.
Este comportamento contribui para a criação de comunidades virtuais, definidas por André Lemos como agregações “em torno de interesses comuns, independentes de fronteiras ou demarcações territoriais fixas”, instituindo um território simbólico e não físico (LEMOS, 1997, s/p). O alargamento dos laços sociais em espaços que não são definidos geograficamente constitui uma mudança importante do cotidiano pós-redes sociais digitais, embora, como aponta Recuero (2010, p. 135), tecnologias anteriores como o telefone e a carta já proporcionassem a comunicação entre os indivíduos, independentemente de sua presença física em um mesmo lugar.
Do telefone público (orelhão) ao telefone celular: a comunicação a distância e o encurtamento das distâncias.
Ciberespaço é um espaço, um lugar de encontro que carrega consigo inúmeras novas possibilidades de interação social.
O que ocorre, segundo Lemos, é que o ciberespaço (formado pelas redes informáticas, a realidade virtual e o universo multimídia) promove uma forma distinta de cultura que se desenha a partir da convergência do social com o tecnológico. Como aponta o autor, não deixa de ser interessante que a tecnologia, vista historicamente como um instrumento de alienação, desencantamento e individualismo se torne a ferramenta promotora de um novo tipo de sociabilidade: “A cibercultura que se forma sob os nossos olhos mostra como as novas tecnologias são efetivamente ferramentas de compartilhamento de emoções, de convivialidade e de retorno comunitário” (LEMOS, 1997, s/p).
A construção da presença online 
No presente, quando falamos em redes sociais, as referências imediatas são Facebook, Twitter e Instagram. No entanto, alguns anos antes da popularização dessas ferramentas já existiam outras plataformas de autopublicação e troca de mensagens que permitiam a qualquer usuário da rede produzir e compartilhar seus próprios conteúdos e opiniões em blogs e fotologs, bem como existiam sites, fóruns e serviços de comunicação instantânea que os usuários utilizavam como chats (a exemplo dos instant messengers como o extinto MSN e de sites como Bate-Papo UOL ou Terra Chat, para ficar nos brasileiros).
O tipo de uso que deles se fazia é semelhante ao que ocorre atualmente, embora as redes mais populares hoje operem uma espécie de junção entre as funcionalidades das ferramentas de autopublicação e os serviços de troca instantânea de mensagens. Esse uso que visa à exposição e ao relacionamento interpessoal situa-se naquilo que Paula Sibilia (2003) nomeia como “imperativo da visibilidade”, um desejo de exibição que muitas vezes torna pouco definíveis as fronteiras entre o público e o privado, a depender de como um sujeito decide existir e se expor nas redes sociais digitais. A existência de uma rede específica para o compartilhamento de fotografias como o Instagram, por exemplo, denuncia e ao mesmo tempo alimenta a lógica da exposição online baseada em uma construção de si a ser tornada pública.
Para Sibilia (2003, s/p), mais do que simplesmente responder se os limites entre público e privado se apagaram, é importante considerar que a subjetividade contemporânea está passando por um processo de alteração bastante significativo, do qual as redes sociais são sintoma e fomentadoras, mas que também aparece na busca por visibilidade presente em publicações como revistas de celebridades, em reality shows, documentários em primeira pessoa e biografias e autobiografias literárias. As chamadas “narrativas do eu” vivem transformações profundas, “acompanhando as mudanças que estão acontecendo em todos os âmbitos – marcados pela aceleração, a virtualização, a globalização, a digitalização” (SIBILIA, 2003, s/p).
A presença online é transformada, portanto, em uma espécie de “performance” em que o indivíduo alimenta uma projeção de si em um perfil de rede social (ou de várias, de forma complementar). Há pessoas que passam inclusive a ganhar a vida em função dessa exposição, transformando seu cotidiano em produto a ser consumido por outros usuários das mesmas redes: não são artistas, modelos, atletas, políticos ou figuras de referência em qualquer área. São celebridades da Internet, e hoje esse título tem valor por si só, principalmente comercial.
Talvez a socialite norte-americana Kim Kardashian seja o exemplo maior nesse segmento que extrapola em muito as redes sociais digitais: ganhou fama após a divulgação de um vídeo amador de sexo explícito que ela mesma tornou público (nem a intimidade do ato sexual resistiu ao imperativo da visibilidade), expandiu sua presença da Internet à comunicação massiva tradicional (especialmente a televisão e as publicações impressas) e, enfim, passou a atuar como modelo e empresária, nunca deixando de alimentar os seus perfis nas redes sociais, principal espaço de divulgação do produto que ela vende, que é a sua própria persona.
Diferentemente do que quer o senso comum, a ideia de performance atrelada à presença online não está vinculada à mentira ou ao fingimento, pois as coisas são mais complexas do que nos diz o meme segundo o qual todas as pessoas são felizes nas redes sociais. O fato de a presença online pressupor performance não significa necessariamente que as pessoas mintam em relação ao que expõem, mas sim que escolhem, selecionam aquilo que querem tornar público a respeito da sua vida, trabalho, convívio familiar, interesses pessoais, lazer e dos diversos aspectos da sua rotina. Mesmo que por vezes haja a impressão de superexposição, os indivíduos fazem recortes segundo aquilo que consideram suas maiores qualidades, ou ainda de acordo com o modo como gostariam de ser vistos socialmente. A partir desse recorte, cada um vai construindo as suas possibilidades de socialização nas redes sociais digitais e constituindo grupos de interesse. Como explica Recuero:
Judith Donath (1999) sustenta que a percepção do Outro é essencial para a interação humana. Ela mostra que, no ciberespaço, pela ausência de informações que geralmente permeiam a comunicação face a face, as pessoas são julgadas e percebidas por suas palavras. Essas palavras, constituídas como expressões de alguém, legitimadas pelos grupos sociais, constroem as percepções que os indivíduos têm dos atores sociais. É preciso, assim, colocar rostos, informações que gerem individualidade e empatia, na informação geralmente anônima do ciberespaço. (RECUERO, 2010, p. 27)
 
 Criação de uma performance/construção de si mesmo é uma característica da sociabilidade online.
As pessoas constroem, assim, através da distinção, uma persona pública “adequada” às redes sociais digitais que gosta de algumas coisas e detesta outras (sim, falar do que se detesta é tão importante quanto falar do que se ama na elaboração dessa performance); que frequenta determinados ambientes ecírculos sociais (embora certamente não apenas aqueles que mostra); que manifesta opiniões políticas a partir de um determinado lugar de fala; que tenta tomar cuidado com o que diz a depender de quem vai ler.
Mas não é essa, afinal, a forma como todos nós tentamos nos expor e nos projetar enquanto sujeitos nos mais diversos âmbitos da vida fora da Internet?
O consumo e a difusão da informação com o advento das redes sociais digitais 
A seção anterior do texto foi iniciada com menções aos blogs e fotologs, apontados como espaços de sociabilidade online que antecederam as redes sociais que conhecemos e utilizamos atualmente. É possível, no entanto, apontar uma diferença fundamental de alcance entre os conteúdos publicados nos blogs dos primórdios da Internet e aquilo que circula nas redes sociais do presente: nos blogs, o usuário publicava algo e esperava que alguém desempenhasse a ação de ir até a sua página para ler o seu conteúdo (divulgado prioritariamente por e-mail e por messengers).
Enquanto isso, redes sociais como Facebook e Twitter são alimentadas de forma endógena pelos próprios usuários, que produzem conteúdos ou compartilham conteúdos produzidos por terceiros (que podem ou não ser empresas jornalísticas ou de entretenimento formalmente constituídas), de acordo com uma lógica segundo a qual basta estar online com essas páginas abertas para “receber” aquilo que seus contatos nessas redes irão compartilhar.
A possibilidade de compartilhamento potencializa imensamente o alcance dos conteúdos, e um post publicado em uma rede social pode se tornar viral em poucas horas (algo que dificilmente acontecia com as publicações daqueles primeiros blogs). Atualmente, o potencial de alcance dos blogs é maior do que no passado em função da profissionalização do campo e também da possibilidade de viralização dos seus links nas redes sociais mais populares. Os blogs foram vistos, inicialmente, como uma forma amadora de divulgação de textos e ideias ou como uma espécie de diário virtual, mas hoje, apesar de seguirem abrigando conteúdos amadores e pessoais, também formam, em sua vertente mais profissionalizada, um espaço importante de produção de conteúdo e publicação fora do espaço convencional dos grandes veículos de comunicação (ou mesmo hospedados nos portais desses veículos).
No entanto, o fato de, a princípio, qualquer pessoa poder se tornar um produtor de conteúdo ao publicar um texto, fotografia, vídeo ou informação em uma rede social não significa que todo usuário produza notícia ou possa ser considerado um jornalista. A distinção entre informação e notícia é fundamental, especialmente em um momento em que a falta de critério em relação àquilo que se decide passar adiante – seja no Facebook, no Twitter ou mesmo no Whatsapp – pode resultar em tragédias como a da dona de casa Fabiane de Jesus ou, de forma menos grave, na destruição da reputação de indivíduos e empresas em poucos minutos. Por esse motivo é importante, também, pensarmos no nosso próprio lugar enquanto consumidores e divulgadores de todo tipo de conteúdo nas redes sociais, especialmente aqueles que incluem juízos de valor.
A Internet inaugurou possibilidades até então inéditas de autopublicação, ou seja, qualquer pessoa que disponha de um computador ou dispositivo móvel com acesso à rede e um perfil em rede social ou plataformas de compartilhamento como o YouTube pode divulgar o que quiser. Se, antes, tínhamos um cenário em que poucas empresas e grupos de comunicação produziam quase todo o conteúdo e as informações que eram consumidas pelas populações em escala mundial (o que caracterizava a comunicação de massa), atualmente essa produção é muito mais difusa e descentralizada, o que tem inclusive provocado uma crise no jornalismo como o conhecemos e ocasionado enxugamentos em redações.
O empoderamento do indivíduo e sua autonomia comunicativa também desencadeia uma enxurrada de notícias falsas que são consumidas como verdades formando culturas e moldando comportamentos.
No entanto, quando se tem um volume de informações circulando tão grande que inclusive supera as possibilidades de que todas elas sejam efetivamente consumidas, o jornalismo opera como um balizador fundamental no sentido de orientar os cidadãos em relação à diferença entre notícias e meras informações produzidas e divulgadas de forma amadora, que não passaram pelos processos envolvidos na criação de conteúdo jornalístico. São algumas dessas etapas: elaboração de uma pauta, checagem e verificação, apuração, realização de entrevistas com todos os lados envolvidos e pesquisa documental, bem como a avaliação dos chamados “valores-notícia” (conjunto de qualidades ou atributos de um fato, que são levados em consideração no momento em que se analisa se um acontecimento qualquer deve ou não ser noticiado, como a quantidade de pessoas envolvidas e a sua importância social, fator tragédia, a proximidade local, atualidade, concorrência, perfil editorial da empresa, as chances de interessar a um grande número de pessoas, entre outros).
É possível que o caso da dona de casa assassinada no Guarujá não tivesse um fim trágico e cruel se a história do falso retrato falado tivesse sido devidamente apurada. A notícia não seria a suspeita de que uma mulher sequestrava crianças para usá-las em rituais de magia negra, e sim que um perigoso boato envolvendo um crime falso estava mobilizando uma cidade e poderia resultar em uma tentativa de vingança por parte da população.
Esse equilíbrio entre a liberdade proporcionada pela autopublicação na Internet e o respeito à informação de qualidade é bastante difícil de ser alcançado, mas a função balizadora do jornalismo segue forte: normalmente, quando queremos verificar se uma informação publicada em uma rede social é verdadeira ou não, consultamos a imprensa tradicional, buscando as rádios conceituadas na produção de notícias, acessando os portais dos jornais de maior credibilidade ou mesmo aguardando o noticiário televisivo. O problema ocorre quando o ímpeto de compartilhar se sobrepõe à necessidade de saber se um fato qualquer é falso ou verdadeiro e quais são as suas nuances, contribuindo para a circulação de boatos que só aumentam a sensação de confusão e excesso de informação que é partilhada por muitos usuários das redes sociais.
A existência da imprensa e de veículos de comunicação com grande credibilidade construída historicamente não quer dizer que o jornalismo é infalível. É possível que o jornalismo, como instituição, nunca tenha sido tão criticado quanto no presente. Se, antigamente, tínhamos um cenário em que se tomava como verdade absoluta o que era noticiado pelo jornalismo, atualmente as redes sociais não apenas ampliam a circulação das notícias como também oferecem outras visões, contrapontos, espaços de resposta e desmentidos, exigindo do usuário um papel bastante ativo na filtragem e na avaliação daquilo que ele consome e que vai ajudar a constituir a sua experiência no mundo.
A relação do jornalismo com as redes sociais, portanto, é de retroalimentação, tanto do ponto de vista de quem produz notícias quanto de quem consome: a imprensa baseia a sua produção de notícias em parte na repercussão real ou potencial de determinados assuntos nas redes sociais, de modo que as redes pautam efetivamente o jornalismo. O contrário também ocorre, e as discussões nas redes sociais são pautadas pelo que o jornalismo noticia, especialmente no âmbito da política e dos costumes.
Ao mesmo tempo, como consumidores, quando lemos algo em uma rede social que pode ser conteúdo amador ou falso, buscamos acessar o portal da Folha de São Paulo, da Globo, ou, localmente, da Zero Hora ou da rádio Gaúcha, para verificar se aquilo é verdade; em seguida, voltamos para a rede social e somos expostos ao compartilhamento massivo dessas mesmas notícias, acompanhado de comentários que confirmam, problematizam, desmentem ou complementam aquela informação que acabamos de consumir, em um fluxo bastante complexo e circular. Ocorre que esse fluxo será quase sempredeterminado por aquilo que cada um escolhe consumir nas redes sociais, a depender de quem sejam as suas conexões nas redes e do tipo de conteúdo publicado pelas páginas e perfis que o indivíduo segue.
Em outros tempos, o máximo que o consumidor de notícias e conteúdos podia fazer era trocar de canal, de estação, desligar a TV ou o rádio e fechar o jornal/revista (mas nunca alterar aquilo que tinha sido produzido e estava sendo exposto). Hoje em dia, o usuário pode selecionar de forma mais ativa os conteúdos e as notícias com os quais deseja ter contato de acordo com diversos critérios, como o interesse pessoal por um conjunto de assuntos, o seu posicionamento político-ideológico, seus valores familiares, religiosos etc. Assim se decide, por exemplo, quais páginas e perfis cada um quer acompanhar.
Uma das formas de filtrar as informações falsas é confrontar com órgãos de imprensa, como jornais e televisões. Aí se distingue informação (fofoca) de notícia.
No entanto, quando as pessoas aplicam esses filtros, por vezes acabam restringindo também o seu universo informativo e de referências, fazendo com que a experiência de consumo de notícias e conteúdos se baseie somente no que seus contatos nas redes e as páginas que segue compartilham. Ao mesmo tempo em que essa abertura representa uma possibilidade de autonomia do indivíduo que passa a ser responsável pelo seu consumo de bens simbólicos, também pode significar uma restrição da sua “dieta” informacional e cultural, levando a uma interpretação do mundo pouco tolerante e aberta à diferença, já que é possível que a pessoa receba apenas conteúdos com os quais concorda de antemão e que dialogam com a sua própria visão de mundo.
Isso pode acontecer a partir do momento em que as pessoas passam a tomar como universais alguns conjuntos de parâmetros e valores que, na verdade, são individuais ou, no máximo, dizem respeito apenas àquele grupo de pessoas que são suas conexões nas redes, criando falsos consensos. É importante considerar a existência de uma relação pendular e dialética entre a experiência individual e a coletividade. Do contrário, ao restringir o nosso consumo de informações apenas ao que nos interessa pessoalmente ou a pessoas e páginas que divulgam notícias alinhadas à nossa visão de mundo, podemos passar a achar que esses valores são universais.
O consenso sobre um assunto qualquer nas minhas redes sociais não significa que aquela é a visão geral da opinião pública, apenas que é a visão compartilhada pelos meus contatos (que pode condizer com a visão da opinião pública, mas não necessariamente). É fundamental, portanto, que os indivíduos sejam capazes de dialogar, inclusive, com outros que comungam valores distintos, mas que habitam o mesmo bairro, cidade, estado, país, contribuindo para a formação de uma experiência coletiva mais plural.
A convivência nas redes sociais pode limitar o usuário ao convívio apenas com as pessoas com quem tem afinidades ideológicas, políticas etc., o que pode criar a falsa ilusão de consenso e aumentar as convicções ao invés de relativizá-las e complexificá-las.
A ideia de performance e de produção de uma projeção de si que aparece no uso que é feito das redes sociais digitais está associada não apenas àquilo de muito pessoal que um sujeito publica (como relatos de viagens, impressões sobre lugares e produtos ou fotografias de momentos íntimos e familiares). O que ele comenta, opina e compartilha nas redes também constitui uma parte importante dessa performance, pois ajuda a construir uma persona que comunga de uma determinada visão de mundo e utiliza o espaço das redes para manifestá-la.
O modo como nos relacionamos com os indivíduos que nos são próximos no contato físico (como parentes, colegas de trabalho ou da universidade, amigos etc.) também é afetado por essa projeção, pois, ao estabelecer conexões nas redes sociais com as pessoas que conhecemos pessoalmente, tomamos contato com opiniões e interesses que por vezes nos eram desconhecidos, descortinando outras facetas dessas pessoas, para o bem e para o mal. Podemos dizer que a experiência da rede social não se encerra no ambiente virtual, e sim transcende a vida concreta. E porque, também, é fundamental agir nas redes sociais com a mesma responsabilidade e critério que pautam a vida fora delas.

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