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1 Nathália Brendler | Med. Vet. | Fisiologia do sistema digestório de monogástricos - Parte 1 Funções O sistema digestivo é responsável pela ingestão e armazenamento de alimentos, hidrólise de nutrientes, absorção dos produtos degradados quimicamente e excreção dos resíduos não absorvidos. OBS: alimento é qualquer substância que forneça ao ser vivo os nutrientes necessários à manutenção celular. Ex.: Carboidratos fornecem glicose e outros monossacarídeos. Lipídios ácidos graxos e glicerol. Proteínas aminoácidos essenciais e não essenciais. Estruturas do sistema digestivo • Boca • Dentes • Língua • Faringe • Esôfago • Estômago • Intestino delgado • Intestino grosso • Órgãos acessórios: glândulas salivares, pâncreas e fígado. Composição Células absortivas (células específicas que absorvem os micronutrientes no ID e IG); Glândulas secretoras (liberam substâncias que auxiliam de alguma forma no processo de digestão em todo trato gastrointestinal – TGI); Músculos (lisos e esqueléticos, são responsáveis pela contração e condução do bolo alimentar); Nervos (do sistema nervoso autônomo – SNA – e sistema nervoso entérico – SNE). O sistema sensorial, constituído dos receptores olfativos, gustativos e visuais, é utilizado para localizar e selecionar os alimentos. Alguns animais apresentam a visão mais desenvolvida (p. ex., as aves) e outros o olfato (p. ex., os cães). As estruturas físicas quebram os alimentos mecanicamente (p. ex., dentes e músculo masseter). Os processos químicos ocorrem através da secreção de substâncias que permitem a absorção, transporte e metabolização das moléculas menores (p. ex., ação enzimática). Processos dependentes de energia O sistema gastrointestinal necessita de energia para realizar determinados processos, como: Atividade motora; Secreção de enzimas e sais biliares; Mecanismos de transporte eletrolítico (transporte pela membrana); Barreira da mucosa gastrointestinal – essa barreira protege o organismo contra a invasão de toxinas e patógenos. Ela é mantida por mecanismos de defesa imunológicos e físicos. Demanda muita energia para sua constante renovação celular e produção de muco. Classificação anatômica do TGI 1) Monogástricos: animais que apresentam um estômago simples. Suíno, cão, gato, equino, coelho e aves. 2 Nathália Brendler | Med. Vet. | Fisiologia do sistema digestório de monogástricos - Parte 1 Os monogástricos fermentadores caudais (pós-gástrico1) têm o intestino grosso adaptado para a fermentação lenta da celulose. O ceco é o grande órgão fermentador, com uma abundante flora bacteriana. Ex.: equino. Em monogástricos carnívoros, o ceco não é funcional, pois o processo de digestão e absorção acontece quase inteiramente no intestino delgado. No intestino grosso ocorre apenas absorção de água. 2) Ruminantes: animais com estômago dividido em vários compartimentos (rúmen, retículo, omaso e abomaso2). Bovino, ovino, caprino, veado. São fermentadores pré-gástricos, ou seja, o alimento demora no pré-estômago (rúmen) e a fermentação ocorre antes da digestão enzimática. Classificação quanto ao tipo de alimentação O aparelho digestivo está adaptado ao tipo de alimento, logo sofre adaptações para processar a digestão e absorção. 1) Herbívoros: alimentam-se exclusivamente de vegetais. São os consumidores primários da cadeia alimentar. Vaca, cavalo, ovelha, cabrito, zebra, elefante. 2) Carnívoros: alimentam-se apenas de proteína animal através do consumo de outros animais. São considerados predadores na cadeia alimentar. Gato, cachorro, leão. 3) Onívoros: alimentam-se tanto de vegetais quanto de proteína animal. Porco, avestruz, rato, urso, homem. Diferenças do TGI entre as espécies a) Carnívoros: Digestão enzimática; Refeições ocasionais; Alto teor energético; 1 Pós-gástrico = a fermentação ocorre depois da digestão enzimática. 2 Abomaso é chamado de “estômago verdadeiro”. Dentição – caninos desenvolvidos; Articulação mandibular; Estômago extremamente ácido; TGI simples e curto. b) Onívoros: Digestão enzimática e fermentativa; Câmara de fermentação = ceco Saliva contendo amilase; TGI de comprimento médio; c) Herbívoros não ruminantes: Digestão fermentativa; Câmara de fermentação = ceco; Maior tempo de ingestão e quantidade de alimento de alimento; Digestão da fibra. d) Herbívoros ruminantes: Digestão fermentativa; Câmara de fermentação = rúmen; Baixo teor energético; Produção de glicose; TGI longo e complexo. Conceitos sobre a ingestão de alimentos Fome é a sensação visceral da necessidade de alimento, sentida quando o centro da fome é estimulado. 3 Nathália Brendler | Med. Vet. | Fisiologia do sistema digestório de monogástricos - Parte 1 Apetite é o desejo por determinado tipo de alimento. Saciedade é a parada da ingestão do alimento por satisfação da sensação de fome. Ocorre por estímulo do centro da saciedade. Teorias da ingesta alimentar Temperatura: no frio a ingestão de alimentos é maior do que em temperaturas elevadas para maior produção de calor. Distensão gástrica: a distensão do estômago ativa o centro da saciedade. Essa teoria é aceita para todas espécies. Teorias dos ácidos graxos voláteis (AGV): a quantidade de AGV no sangue regula a ingesta de alimentos. Teoria mais importante para ruminantes. Fatores que influenciam o processo digestivo Para que a digestão ocorra, é necessário que vários fatores se interrelacionem e influenciem em todo o processo digestivo. São eles: a) Fatores mecânicos: preensão do alimento, mastigação, deglutição, regurgitação, vômito, motilidade gástrica e intestinal e defecação. b) Fatores secretórios: estão ligados à secreção glandular. c) Fatores químicos: ação das enzimas e substâncias químicas não enzimáticas (p. ex., bile) que realizam a quebra dos nutrientes. d) Fatores microbiológicos: são as bactérias e protozoários do trato digestivo. OBS: o animal tem uma reduzida carga microbiana no rúmen, ocorre timpanismo, que é a distensão excessiva do rúmen e retículo causada pela retenção dos gases da fermentação. Fatores mecânicos a) Preensão em espécies Carnívoros: usam os dentes e membros torácicos. Bovinos e ovinos: utilizam a língua e dentes incisivos inferiores. No caso dos ovinos, o lábio superior fendido permite um pastejo rente ao solo. Equinos: têm o lábio superior altamente móvel e com células sensitivas. No pastejo, direcionam o lábio para trás e usam os dentes incisivos para cortar as gramíneas. Suínos: escavam a terra com o focinho e levam o alimento à boca com o lábio inferior. Aves: preenche o bico com água e ergue a cabeça, que desce pela gravidade. O bico é adaptado à dieta. No caso dos fluídos, a extremidade final da língua dos carnívoros forma uma concha. Nos demais animais, é através da sucção criada pelo processo de inspiração e contrações da língua. b) Mastigação O principal objetivo da mastigação é decompor o alimento em partículas menores para aumenta a superfície de contato com os sucos gástricos, além de misturar o alimento com a saliva. Nesse processo, estimula o SNA que prepara o TGI para receber o bolo alimentar. Os herbívoros levam mais tempo na mastigação do que carnívoros, já que os últimos têm uma digestão enzimática muito potente. A função dos dentes incisivos é lacerar e friccionar e a dos pré-molares e molares é triturar. 4 Nathália Brendler | Med. Vet. | Fisiologia do sistema digestório de monogástricos - Parte 1 c) Deglutição Ato que consiste em uma fase voluntária seguida de uma atividade reflexa. A primeiraetapa do processo de deglutição é voluntária, em que o animal utiliza neurônios motores para impelir o alimento até a faringe. A presença do bolo alimentar ativa os sensores nervosos no palato mole, faringe, raiz da língua e epiglote, os quais enviam um sinal para o centro da deglutição localizado no bulbo. A partir desse momento, o reflexo da deglutição torna-se involuntário. O centro da deglutição então gera um ato reflexo em que a faringe permite a passagem do bolo alimentar para o esôfago, enquanto a nasofaringe e traqueia ficam isoladas da cavidade bucal e inibem a respiração. O bolo alimentar chega ao estômago pelas ondas peristálticas. Esôfago O esôfago é o canal que conduz a ingesta da orofaringe até o estômago. É formado por músculo estriado e por músculo liso. O alimento é conduzido do esôfago até o estômago através do peristaltismo (dividido em peristalse primária e secundária), cujos movimentos são coordenados pelo plexo nervoso mioentérico. a) Peristalse primária: é provocada pela deglutição e força o bolo alimentar para baixo no esôfago. b) Peristalse secundária: movimento de contração obtido pela presença do bolo alimentar que estimula os receptores de estiramento presentes no esôfago. É importante para completar a passagem do bolo alimentar até o estômago. O músculo estriado forma uma faixa resistente na extremidade oral, que é normalmente mantido fechada para impedir o refluxo do conteúdo esofágico para dentro da faringe. Nos equinos, o esfíncter esofágico inferior não consegue relaxar o suficiente para possibilitar o vômito. Em muitos casos, quando a pressão intragástrica está patologicamente aumentada, o estômago se rompe antes que ocorra o vômito ou o refluxo esofágico. Estômago Local onde o quimo é formado. A função mecânica do estômago pode ser dividida em três zonas: a) Cárdia/porção dorsal/fundo: recepção e estocagem de conteúdo; b) Corpo: reservatório para misturar o suco gástrico ao alimento; c) Antro: bomba gástrica que empurra o alimento pelo esfíncter pilórico para o duodeno. Camadas histológicas a) Mucosa: formada por um revestimento epitelial (estratificado pavimentoso) e uma lâmina própria de tecido conjuntivo frouxo rico em vasos sanguíneos e linfáticos Muscular da mucosa: separa a mucosa da submucosa. Pontilhado: estriado; contínuo: liso 5 Nathália Brendler | Med. Vet. | Fisiologia do sistema digestório de monogástricos - Parte 1 b) Submucosa: TC com muitas glândulas, vasos sanguíneos e linfáticos. Apresenta o plexo nervosos submucoso. c) Muscular: células musculares lisas circulares e longitudianais. Tem o plexo mioentérico. d) Serosa: TC frouxo, revestida por um epitélio pavimentoso simples denominado de mesotélio. Características comuns a todas espécies: 1. Ter pregas gástricas; 2. Possuir 4 camadas histológicas; 3. Ter fossetas gástricas (invaginações na mucosa com células secretoras) 4. Epitélio cilíndrico simples. Fase digestiva A digestão é a quebra química e mecânica do alimento. Na região proximal do estômago, há um relaxamento adaptativo para acomodar os alimentos e as contrações são mais fracas e contínuas. Na distal, são fortes para triturar e selecionar o que vai para o duodeno. As contrações da parte distal misturam o suco gástrico ao alimento, trituram os sólidos e fazem a propulsão. No duodeno, apenas partículas muito pequenas (2mm) são conduzidos. Portanto, as mais sólidas retornam para a parte proximal até serem trituradas novamente. Por isso refeições líquidas têm digestão mais rápida. Controle do esvaziamento gástrico A velocidade de esvaziamento do estômago é regulada por sinais proveniente do estômago e duodeno. Depende do tipo e tamanho das partículas. A dilatação do estômago é o estímulo primário para aumentar a motilidade gástrica através da ativação de receptores mecânicos do SNA parassimpático. Depende do tamanho e da composição química das partículas. Controle inibitório do esvaziamento (necessário para que o alimento permaneça mais tempo no estômago) ocorre através do reflexo simpático e hormônio colecistocinina (CCK), geralmente quando há grande quantidade de gordura, carboidratos e/ou proteínas. Vômito O vômito é um reflexo complexo coordenado pelo centro do vômito, localizado no tronco cerebral. Essa atividade está associada ao relaxamento dos músculos do estômago e esfíncter esofágico inferior e fechamento do piloro; contração da musculatura abdominal, criando um aumento na pressão intra-abdominal; abertura do esfíncter esofágico superior; motilidade antiperistáltica. A estimulação tátil ou química da mucosa GI pode resultar em vômito, eliminação ou tentativa de eliminar o estímulo ofensivo do trato GI. Nos equinos, é extremamente raro. Portanto, a dilatação gástrica aguda pode ocorrer a ponto de levar a ruptura da parede do estômago. Carnívoros e onívoros (exceto roedores) vomitam mais facilmente, pois têm centro do 6 Nathália Brendler | Med. Vet. | Fisiologia do sistema digestório de monogástricos - Parte 1 vômito mais desenvolvido. Em ruminantes é raro, ocorre obstrução intestinal. Intestino delgado: duodeno, jejuno e ílio. É o local de absorção da maioria dos nutrientes, mas possui também funções digestivas. O fluxo é controlado para que a mistura tenha contato com as enzimas pancreáticas e a bile. O sistema de controle é a onda lenta, que se inicia no duodeno e tende a retardar o fluxo. Sua mucosa não tem fossetas, mas células específicas chamadas enterócitos. Mistura e propulsão O conteúdo do trato digestivo é movimentado e misturado por dois tipos principais de contrações de músculo liso: contrações segmentares (ou “reflexo de segmentação”) e contrações peristálticas (ou “reflexo peristáltico”). a) Contração de segmentação: contração dos músculos lisos circulares que mistura os conteúdos intestinais com os sucos digestivos. b) Contração peristáltica/reflexo peristáltico: contração sincronizada dos músculos lisos longitudinais que movimenta o conteúdo ao longo do trato digestivo. Intestino grosso O material que não foi absorvido no intestino delgado entra no intestino grosso e passa pela válvula ileocecal (também chamada de esfíncter ileocecal), que evita o refluxo fecal do cólon para o íleo. O reflexo gastroileal faz com que o esfíncter ileocecal relaxe e permita o esvaziamento do intestino delgado. Nos carnívoros, o intestino grosso absorve água e a flora microbiana fermenta proteínas e carboidratos que não foram absorvidos no ID. A defecação ocorre através de um reflexo. A tensão na parede do reto e o reflexo parassimpático intensificam as ondas peristálticas e estimulam o relaxamento do esfíncter anal interno (involuntário) e, ao alcançar o esfíncter anal externo (voluntário), o animal irá relaxar e defecar ou fará um esforço consciente para contrair o esfíncter externo do ânus e adiar a defecação.
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