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Carlos Aguiar BBoottâânniiccaa para Ciências Agrárias e do Ambiente VVoolluummee II Morfologia e função (fasc. 2) Instituto Politécnico de Bragança 2013 Publicado pelo Instituto Politécnico de Bragança Imagem da capa: Nymphaea lotus (Nymphaeaceae). Versão de 23-‐IV-‐2013 © Carlos Aguiar ISBN 978-‐972-‐745-‐123-‐4 1 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Índice 1. Sistema reprodutivo ........................................................................................................... 3 1.1. Gimnospérmicas .......................................................................................................... 3 1.1.1. Estruturas reprodutivas ......................................................................................... 3 1.1.2. Frutificações e sementes ...................................................................................... 4 Frutificações ....................................................................................................................... 4 Sementes ............................................................................................................................ 4 1.2. Angiospérmicas ........................................................................................................... 5 1.2.1. Inflorescência ....................................................................................................... 5 Constituição ....................................................................................................................... 5 Brácteas e bractéolas ......................................................................................................... 5 Tipos fundamentais ............................................................................................................ 6 Inflorescências grupadas simples ....................................................................................... 8 Inflorescências compostas ................................................................................................. 8 Pseudantos e proliferação tardia ....................................................................................... 9 1.2.1. Flor ..................................................................................................................... 11 1.2.1.1. Ciclo floral .................................................................................................. 11 Indução e iniciação florais ................................................................................................ 11 Ciclo floral ......................................................................................................................... 11 1.2.1.2. Constituição da flor e expressão sexual ...................................................... 12 Constituição ..................................................................................................................... 12 Expressão sexual .............................................................................................................. 12 1.2.1.3. Receptáculo ................................................................................................. 12 1.2.1.4. Filotaxia, merismo e simetria da flor .......................................................... 13 Filotaxia ............................................................................................................................ 13 Merismo ........................................................................................................................... 13 Simetria ............................................................................................................................ 13 1.2.1.5. Perianto ....................................................................................................... 14 Definição de perianto. Tipos fundamentais ..................................................................... 14 Perigónio .......................................................................................................................... 15 Cálice ................................................................................................................................ 15 Corola ............................................................................................................................... 15 Ptixia, estivação e posição espacial das peças da flor ...................................................... 18 1.2.1.6. Hipanto ........................................................................................................ 20 1.2.1.7. Androceu ..................................................................................................... 20 Estrutura e função dos estames ....................................................................................... 20 Número e forma ............................................................................................................... 20 Inserção e posição em relação às pétalas ........................................................................ 21 2 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Concrescência e aderência ............................................................................................... 21 Deiscência ........................................................................................................................ 21 1.2.1.8. Pólen ............................................................................................................ 22 1.2.1.9. Gineceu ....................................................................................................... 22 Estrutura e função dos carpelos. Conceito de pistilo ....................................................... 22 Número e concrescência dos carpelos ............................................................................. 23 Ovário ............................................................................................................................... 25 Estilete .............................................................................................................................. 26 Estigma ............................................................................................................................. 26 1.2.1.10. Primórdios seminais .................................................................................. 26 1.2.1.11. Nectários florais e osmóforos .................................................................... 27 1.2.1.12. Fórmulas florais ........................................................................................ 27 1.2.2. Fruto ................................................................................................................... 28 Definição e função do fruto ............................................................................................. 28 Estrutura do fruto............................................................................................................ 29 Critérios de classificação dos frutos s.l. ............................................................................ 29 Tipos de frutos s.l. ............................................................................................................ 30 Partes edíveis nos frutos s.l. ............................................................................................. 36 1.2.3. Semente .............................................................................................................. 37 Constituição da semente. Tecidos de reserva. ................................................................. 37 Episperma ......................................................................................................................... 37 Reservas nutritivas da semente ....................................................................................... 38 Embrião ............................................................................................................................ 38 1.2.4. Estruturas reprodutivas das gramíneas ............................................................... 38 2. Fisionomia e fenologia das plantas-com-semente ............................................................ 39 2.1. Tipos fisionómicos .................................................................................................... 39 2.2. Posição das inflorescências nos ramos do ano de plantas lenhosas .......................... 41 2.3. Ciclos fenológicos ..................................................................................................... 42 A escala fenológica BBCH ................................................................................................. 43 3. Referências ....................................................................................................................... 45 3 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente 1. Sistema reprodutivo 1.1. Gimnospérmicas 1.1.1. Estruturas reprodutivas As gimnospérmicas não têm flores: todos os fenómenos relacionados com reprodução sexuada ocorrem em estruturas reprodutivas unissexuais. Nas espécies ditas monoicas (vd. Expressão sexual) cada indivíduo possui, em diferentes pontos da copa, estruturas reprodutivas ♂ e ♀; condição mais frequente, e.g. Pinus (Pinaceae) «pinheiros» e Abies (Pinaceae) «abetos». Nas espécies dioicas, numa mesma população coexistem indivíduos ♂ e ♀; e.g. Ginkgo biloba (Ginkgoaceae) «ginkgo» e Taxus baccata (Taxaceae) «teixo». As estruturas reprodutivas ♂ das gimnospérmicas, também designadas por estróbilos ♂, são compostas por um número variável de escamas polínicas (= microsporofilos), com sacos polínicos (= microsporângios), regra geral dois, inseridos na face dorsal (vd. Contextualização taxonómica do ciclo de vida das plantas-‐terrestres [volume II]). Neste grupo de plantas os primórdios seminais (= megasporângio + 1 tegumento) contactam diretamente com o exterior: não estão encerrados num pistilo como nas angiospérmicas. Consoante as espécies os primórdios seminais apresentam-‐se: i) solitários, e.g. em Taxaceae; ii) aos pares (raramente solitários ou em grupos de três) na extremidade de um pequeno caule (pedúnculo) em Ginkgoaceae; iii) na margem de megasporofilos solitários em forma de leque (flabeliformes) em Cycadaceae; iv) na superfície ou na margem de megasporofilos organizados em estróbilos ♀, o tipo de dominante nas gimnospérmicas, característico das famílias Araucariaceae, Cupressaceae, Ephedraceae, Podocarpaceae, Pinaceae e Zamiaceae. Figura 2. Estruturas reprodutivas femininas de Ginkgo biloba. N.b. folhas em forma de lequen (flabeliformes) e pequenos caules (megaesporofilos) com dois primórdios seminais na extremidade. A Figura 1. Estruturas reprodutivas das Gimnospérmicas. A) Estróbilo ♂ e B) estróbilo ♀ de Chamaecyparis lawsoniana (Cupressaceae) (muito ampliados); n.b. em a) sacos polínicos, por abrir, inseridos na face dorsal de microsporofilos; em b) primórdios seminais livres, com uma gota de polinização exsudada pelo micrópilo, inseridos na axila de megasporofilos que mais tarde, na maturação, darão origem às escamas dos gálbulos (vd. imagem mais adiante) i B 4 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Os estróbilos ♀ são as estruturas reprodutivas ♀ dominantes nas gimnospérmicas. O estróbilo ♀ das coníferas (Pinidae) é interpretado como um sistema de ramos muito modificados, reduzidos a escamas de tamanho variável (megasporofilos), que sustêm na sua superfície os primórdios seminais. Estas escamas, designada por escamas ovulíferas ou escamas férteis, são axiladas por uma escama estéril (= escama tectriz), nem sempre observável. Os primórdios seminais nas gimnospérmicas têm apenas um tegumento a envolver a nucela (tecido maternal diploide de 2n cromossomas). A nucela, por sua vez, cinge um saco embrionário haploide (n cromossomas). À semelhança das angiospérmicas, a nucela é homologada a um megasporângio carnudo (vd. Contextualização taxonómica do ciclo de vida das plantas-‐terrestres [volume II]). O saco embrionário (= gametófito ♀) tem muito mais células do que nas angiospérmicas. Numa das extremidades do primórdio seminal existe uma abertura para o exterior (micrópilo). Em muitas espécies imediatamente abaixo do micrópilo situa-‐se uma câmara micropilar. 1.1.2. Frutificações e sementes Frutificações O fruto, num sentido estrito, resulta do desenvolvimento de um ovário, regra geral após a fecundação: o fruto é exclusivo das angiospérmicas. Quando presentes, as estruturas protetoras das sementes nas gimnospérmicas resultam do amadurecimento dos estróbilos ♀ e designam-‐se por frutificações. As frutificações são, portanto, análogas aos frutos das plantas-‐com-‐flor.As frutificações ocorrem nas Cycadidae – família Zamiaceae, – Gnetidae – família Ephedraceae – e Pinidae – famílias Araucariaceae, Cupressaceae, Podocarpaceae e Pinaceae. As sementes das Taxaceae, Cycadaceae e Ginkgoaceae não estão protegidas por qualquer tipo de estrutura. Entre as coníferas (Pinidae), o grupo de gimnospérmicas mais diverso das gimnospérmicas e de maior interesse económico, reconhecem-‐se dois tipos de frutificações: Gálbulos (= gálbulas) – estróbilo de forma globosa com escamas, normalmente, peltadas (em forma de guarda-‐chuva) inseridas mais ou menos no mesmo ponto; e.g. frutificações dos Cupressus (Cupressaceae) «ciprestes». Um tipo particular: gálbulos baciformes – gálbulos de escamas carnudas, semelhantes a uma drupa; e.g. frutificações características de Juniperus (Cupressaceae) «zimbros» e de Podocarpaceae; Pinhas – estróbilo de forma alongada com as escamas inseridas num eixo evidente; e.g. pinhas de Pinus (Pinaceae) «pinheiros». Sementes As reservas nutritivas das sementes de gimnospérmicas resumem-‐se a um endosperma primário haploide, formado antes da fecundação. Por conseguinte, o endosperma primário é um tecido gametofítico de origem maternal. O número de cotilédones é muito variável. Em Taxus (Taxaceae) «teixo» as sementes surgem Figura 2. Frutificações das Gimnospérmicas. A) Gálbulos de Chamaecyparis lawsoniana; n.b. no canto superior direito um estróbilo ♀ imaturo e as sementes aladas na axila de escamas férteis peltadas (em forma de guarda chuva). B) Pinha de Pseudosuga menziesii, n.b. escamas estéreis salientes (= excertas) na axila das quais se inserem escamas férteis arredondadas, cada uma com duas sementes apensas (não visíveis na foto) A B 5 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente envolvidas por uma estrutura carnuda (arilo), comestível, que atua como recompensa para a dispersão endozoocórica. As sementes de Ginkgo baloba (Ginkgoaceae) «ginkgo» têm uma sarcostesta (vd. Episperma) espessa de odor desagradável. 1.2. Angiospérmicas 1.2.1. Inflorescência Por definição a inflorescência é um sistema de caules com flores. A diferenciação da inflorescência a nível meristemática foi abordada no ponto Meristemas. A inflorescência é um dos tópicos mais difíceis e conflituosos da organografia vegetal (Prenner, Vergara-Silva, & Rudall, 2009). O livro de F. Weberling (Weberling, 1992) continua a ser a maior referência sobre a morfologia da inflorescência, mas a sua aproximação não é consensual. As dificuldades em torno da arquitetura das inflorescências vão para além da inconsistência terminológica. Muitas inflorescências são per se difíceis de interpretar ou não estão ainda suficientemente compreendidas para serem enquadráveis nos tipos definidos na bibliografia. Para escapar a estas dificuldades as Floras e monografias evitam, frequentemente, precisar as inflorescências, ficando-‐se os seus autores por termos vagos como sejam inflorescência racemosa, ou inflorescência definida. A aproximação que se segue procura um consenso de modo algum definitivo. Constituição Numa inflorescência reconhecem-‐se os seguintes componentes: Eixo – nas inflorescências simples (vd. Tipos fundamentais) troço de caule onde se inserem os pedicelos das flores ou, nas inflorescências de flores sésseis, diretamente uma flor; nas inflorescências ramificadas (inflorescências compostas) identificam-‐se eixos primários (= ráquis), secundários e assim sucessivamente; Pedúnculo – porção de caule que sustenta uma flor solitária ou uma inflorescência; numa inflorescência grupada reserva-‐se o termo pedicelo para o pequeno caule que suporta cada uma das flores; as inflorescências sésseis não têm pedúnculo; Bráctea – hipsofilo (vd. Tipos de filomas) que axila um eixo, um pedicelo ou uma flor (nas inflorescências de flores sésseis); Bractéolas1,2 – hipsofilo que precede, mas não axila, uma flor ou um eixo de uma inflorescência; Flores – vd. Flor. Brácteas e bractéolas Alguns tipos de brácteas ou de estruturas bracteolares merecem uma designação especial (quadro 1). 1 Por vezes confundida com o conceito de bráctea. 2 Para Prenner et al. (Prenner, Vergara-Silva, & Rudall, 2009) as bractéolas são profilos: 1 nas monocotiledóneas e dicotiledóneas basais e, geralmente, 2 nas dicotiledóneas (vd. Tipos de filomas). Seguindo à risca estes autores, nas inflorescências cimosas, uma bractéola de cuja axila emirja um eixo é, em simultâneo, uma bractéola em relação ao eixo anterior, e uma bráctea em relação ou eixo axilado. Figura 3. Componentes da inflorescência. Legenda: bra – bráctea, ped. – pedicelo, brl. – bractéola. 6 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Quadro 1. Tipos especiais de brácteas Tipo Descrição Exemplos Brácteas florais Brácteas em cuja axila se insere uma flor. Tipo mais frequente de brácteas. Brácteas involucrais Brácteas verticiladas que envolvem uma ou mais flores, ou, uma ou mais ramificações da inflorescência, geralmente sem as axilarem de forma evidente. Brácteas que revestem exteriormente os capítulos das Asteraceae. Cúpula Estrutura bracteolar característica da família Fagaceae. Em Castanea e Fagus um ouriço com 4 valvas; em Quercus com a forma de taça, rija e coberta por numerosas brácteas imbricadas e inferiormente concrescentes (vd. fam. Fagaceae[volume III]). Epicálice Pequeno grupo de bractéolas, livres ou concrescentes, localizado na base do cálice e aparentando a um segundo cálice. Frequente em muitas Malvaceae e em várias Rosaceae (e.g. Fragaria «morangueiros»). Espata Bráctea de grandes dimensões, frequentemente colorida e vistosa, que envolve certas inflorescências. Surgem solitárias, e.g. Araceae «família do jarro» e Arecaceae «palmeiras», ou aos pares, e.g. gén. Allium (Alliaceae) «alhos». Invólucro Conjunto de brácteas involucrais que nas asteráceas revestem exteriormente um capítulo; nas umbelíferas o conjunto de brácteas situado na base de uma umbela composta. A morfologia das brácteas varia de espécie para espécie, de indivíduo para indivíduo, ou mesmo ao longo das inflorescências. As brácteas podem ser semelhantes aos nomófilos, ou reduzidas a pequenas escamas ou espinhos, sendo possíveis todo o tipo de morfologias intermédias. Nas inflorescências ditas folhosas as brácteas assemelham-‐se aos nomófilos e, por isso, são frequentemente confundidas com caules floríferos. As glumas e glumelas que compõem as espiguetas das gramíneas são também brácteas. As brácteas escamiformes serão, muitas vezes, caracteres não funcionais, i.e. resíduos evolucionários sem uma função clara. Outras protegem os meristemas que dão origem às flores ou às ramificações da inflorescência; para tal podem estar transformadas em espinhos. Na Euphorbia pulcherrima (Euphorbiaceae) «poinsétia» e nas Bougainvillea (Nyctaginaceae) brácteas de grande dimensão exibem cores berrantes e atraem os polinizadores. Na frutificação as brácteas podem envolver e proteger os frutos (e.g. Fagaceae e Corylus avellana [Betulaceae] «aveleira») ou facilitar a sua dispersão (e.g. brácteas com ganchos de Arctium minus [Asteraceae]). Tipos fundamentais Consoante o número de flores as inflorescências são solitárias, se constituídas por uma única flor, ou grupadas, se possuem duas ou mais flores. As inflorescências grupadas são classificadas de acordo com vários critérios, consoante de expõe no quadro 2. Figura 4. Brácteas. A) Capítulo de Taraxacum sp. (Asteraceae), n.b. brácteas involucrais dobradas para trás (revolutas). B) Espádice e espata de Arum italicum (Araceae). A B 7 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Quadro 2. Tipologia de inflorescências Critério/tipo Descrição Intensidade da ramificação Inflorescências simples Inflorescências com flores, sésseis ou pediceladas, diretamente inseridas num eixo não ramificado. Inflorescências compostas Inflorescências ramificadas, com ramos (eixos) secundários, por vezes de ordem superior (Beentje, 2012). Posição nos caules Inflorescências axilares Situadas numa posição lateral, na axila de uma folha. Inflorescências terminais Situadas na extremidade de um caule. Presença de brácteas Inflorescências bracteadas Com brácteas; tipo mais frequente. Inflorescências ebracteadas Sem brácteas. Sistema de alongamento Inflorescências indefinidas3 (= monopodiais, centrípetas ou racemosas) O meristema apical do eixo principal origina periodicamente flores em posição lateral; findo o período de crescimento o meristema aborta (inflorescências indefinidas abertas) ou origina uma flor (inflorescências indefinidas fechadas). Inflorescências definidas (= simpodiais, centrífugas ou cimosas) O meristema apical do eixo primário diferencia-‐se rapidamente numa flor; na axila da(s) bractéolas(s) localizadas imediatamente abaixo da primeira flor emerge um novo eixo que, por sua vez, se diferencia numa flor, repetindo-‐se este processo duas ou mais vezes nas inflorescências definidas compostas. As inflorescências compostas quando constituídas por inflorescências parciais evidentes a inflorescência, no seu todo, designa-‐se por sinflorescência. As inflorescências parciais podem ser do mesmo tipo da inflorescência de primeira ordem (e.g. umbela de umbelas, cachos de cachos e dicásio de dicásios [= dicásio composto]) ou não (e.g. cacho de espigas e corimbo de capítulos). Nas inflorescências compostas os eixos de ordem superior são, tendencialmente, alternos ou opostos, respectivamente, nas plantas de filotaxia alterna e oposta. Nas inflorescências indefinidas o eixo principal da inflorescência têm um crescimento indeterminado (inflorescências indefinidas abertas) ou determinado (inflorescências indefinidas abertas), e a inflorescência demonstra um alongamento monopodial. Os eixos das inflorescências definidas têm um crescimento determinado e a inflorescência alonga-‐se e ramifica-‐se de forma simpodial. A discriminação destes dois tipos de inflorescências é difícil sem a presença de brácteas e bractéolas. As inflorescências podem apresentar diferentes combinações de flores hermafroditas, unissexuais e/ou estéreis, por sua vez agrupadas na base, no centro ou no topo da inflorescência. Existe uma vasta nomenclatura para designar cada uma das combinações possíveis, que não cabe aqui desenvolver. Os amentos de Castanea sativa (Fagaceae) «castanheiro» ilustram bem esta complexidade. Pouco depois do abrolhamento formam-‐se amentos unissexuais ♂ a partir de gomos prontos localizados na axila de algumas das folhas recém-‐diferenciadas. 10 a 15 dias depois, numa zona mais jovem do ramo do ano em alongamento e, portanto, numa região mais exterior da copa, surgem amentos androgínicos com numerosas flores ♂ acompanhadas por 1 a 6, raramente mais, glomérulos deflores ♀ na base (parte proximal do amento). 3 Conceito não consensual. Para alguns autores são cimosas as inflorescências com todos os eixos determinados (culminados por uma flor). Nas inflorescências definidas todos os eixos são indeterminados. 8 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Inflorescências grupadas simples Os principais tipos de inflorescências grupadas simples foram detalhados no quadro 3. Quadro 3. Tipos de inflorescências grupadas simples Tipo Descrição Indefinidas Cacho Flores pediceladas inseridas ao longo de um eixo; um tipo de grande importância com designação especial; os amento (= amentilho) são cachos pêndulos constituídos por flores unissexuais nuas (e.g. Salix [Salicaceae] «salgueiros») ou de perianto sepaloide (e.g. Quercus [Fagaceae]). Espiga Flores sésseis inseridas ao longo de um eixo; e.g. Brassica oleracea (Brassicaceae) «couve»; dois subtipos com designação especial; os espádice são espigas de eixo carnudo, geralmente revestidas por flores pequenas e pouco vistosas e envolvidas por uma espata (e.g. Zantedeschia aetyopica (Araceae) «jarro»); a espigueta – a inflorescência característica das Poaceae – é um subtipo de espiga. Corimbo Tipo particular de cacho com as flores mais ou menos dispostas no mesmo plano embora os pedicelos partam de pontos diversos do eixo da inflorescência. Capítulo Inflorescência achatada, côncava ou convexa, raramente mais ou menos globosa, com flores geral-‐ mente sésseis, inseridas num recetáculo capitular que corresponde ao eixo primário da inflorescência; recetáculo capitular revestido exteriormente por um número variável de brácteas (brácteas involucrais; vd. Brácteas). Umbela Pedicelos das flores inseridos num mesmo ponto, frequentemente algo dilatado e com um verticilo de brácteas (invólucro). Definidas Unípara (= monocásio) Apenas uma flor (de segunda ordem) inserida sob a flor terminal (de primeira ordem). Bípara (= dicásio) Duas flores opostas sob a flor terminal. Multípara (= pleiocásio) Mais de duas flores verticiladas sob a flor terminal. Inflorescências compostas Os principais tipos de inflorescências compostas estão resumidas no quadro 4. Quadro 4. Tipos maiores de inflorescências compostas Tipo Descrição/exemplos Tipos de menor complexidade Espiga de espigas Sinflorescência e inflorescências parciais tipo espiga; e.g. inflorescência masculina do milho-‐graúdo. Cacho composto Cacho de cachos. A panícula é um tipo particular de cacho composto, muito frequente nas poáceas, de forma piramidal, mais ramificado na base do que no topo, no qual o eixo principal e os eixos das inflorescências parciais terminam numa flor, i.e. são fechados. Umbela composta Sinflorescência e inflorescências parciais tipo umbela; característica da família das umbelíferas. 9 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Umbela de espigas Inflorescências parciais tipo espiga organizadas numa umbela; e.g. grama (Cynodon dactylon, Poaceae) com uma umbela de 3-‐4 espigas. Dicásio composto Sinflorescência e inflorescências parciais tipo dicásio; frequente na família das cariofiláceas. Monocásio composto Ssinflorescência e inflorescências parciais tipo monocásio. Tirso Cacho de inflorescências cimosas tipo monocásio ou dicásio, simples ou compostos; o eixo principal pode terminar (tirso fechado) ou não (tirso aberto) numa flor; e.g. cachos de dicásios de videira-‐ europeia. Subtipos de monocásio composto Cimeiras helicoides Cimeiras uníparas compostas com eixos consecutivos inseridos sempre na mesma posição (relativamente ao eixo anterior). Dois subtipos. Bóstrix – eixos consecutivos inseridos sempre para a direita ou sempre para a esquerda, formando uma espiral em torno de um eixo imaginário da inflorescência; e.g. inflorescências parciais de Hypericum perforatum (Hypericaceae) «milfurada». Drepânio (= cimeira falciforme) – eixos consecutivos dispostos num mesmo plano; brácteas, quando presentes, todas no mesmo lado da inflorescência; e.g. Gladiolus (Iridaceae) «gladíolos» e Juncus bufonius (Juncaceae). Cimeiras escorpioides Cimeiras uníparas compostas com eixos consecutivos de inserção alterna; brácteas, se presentes, alternas. Dois subtipos. Cincino – eixos consecutivos inseridos, alternadamente, para a esquerda e para a direita num zigzag tridimensional; e.g. característico de muitas Boraginaceae, e.g. Myosotis «miosótis» e inflorescências parciais de Echium «soagens». Ripídio (= cimeira flabeliforme) – eixos consecutivos inseridos, alternadamente, para a esquerda e para a direita no mesmo plano: e.g. Canna (Cannaceae) «canas» e Iris sp.pl. (Iridaceae) «lírios». Tipos especializados Ciato Inflorescência semelhante a uma flor hermafrodita, constituída por um invólucro em forma de taça, normalmente culminado por 1-‐5 glândulas nectaríferas, no interior do qual se encontra uma flor ♀ nua, na extremidade de um pedicelo, e 5 grupos de flores ♂ nuas com 1 estame, dispostos em torno da flor ♀; característica dos géneros Euphorbia (Euphorbiaceae) «eufórbias» e Chamaesyce (Euphorbiaceae). Glomérulos Inflorescências cimosas, multifloras, muito contraídas (com os eixos da inflorescência e os pedicelos muito pequenos), frequentemente globosa ou subglobosa; frequente em algumas famílias de flores muito pequenas e inconspícuas (e.g. Amaranthaceae). Verticilastros Inflorescências cimosas, multifloras, mais ou menos contraídas, axiladas por um par de brácteas opostas, com um aspeto verticilado (assemelham-‐se a umanel de flores em torno de um eixo); os verticilastros são frequentes entre as Lamiaceae, normalmente organizados em sinflorescências do tipo cacho (cacho de verticilastros). Pseudantos e proliferação tardia Os pseudantos são inflorescências que se assemelham a flores. Geralmente resultam da agregação de flores pequenas e reduzidas em inflorescências compactas que tomam, então, a forma de uma flor. O capítulo das asteráceas é o exemplo mais óbvio de pseudanto. Em Leontopodium (Asteraceae) «edelweiss» ou em Evax (Asteraceae) forma-‐se um pseudanto de capítulos. Nos géneros Callistemon «limpa-‐garrafas» (Myrtaceae) e Ananas «ananases» (Bromeliaceae) o meristema apical cessa de produzir flores, ou ramos laterais com flores, e retorna à condição de meristema vegetativo. O mesmo acontece em Lavandula (Lamiaceae) com a produção de um escasso número de folhas modificadas coloridas, com a função de atrair polinizadores. Designam-‐se estes casos por proliferação tardia (Weberling, 1992). 10 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Figura 5. Inflorescência. A) Tipos de inflorescências simples e compostas. Inflorescências definidas ou cimeiras: 1. Monocásio simples, 2. Cimeira helicoide tipo bóstrix (projecção num plano vertical em cima e projecção num plano horizontal em baixo), 3. Cimeira helicoide tipo drepânio; 4. Cimeira escorpioide tipo cincino; 5. Cimeira escorpioide tipo ripídio; 6. Dicásio. Inflorescências indefinidas ou racemosas: 7. Cacho; 8. Espiga; 9. Espigueta (g – glumas, l – lema, p – pálea), n.b. duas lodículas imediatamente abaixo dos estames; 10. Espádice; 11. Corimbo; 12. Umbela; 13. Capítulo (i -‐ brácteas involucrais, p -‐ brácteas interflorais). B) Tipos de inflorescências compostas. 1. Cachos de cachos; 2. Umbela de umbelas; 3. Espiga de espiguetas; 4. Capítulo de capítulos; 5. Corimbo de corimbos; 6. Dicásio composto; 7. Tirso; 8. Corimbo de capítulos; 9. Cacho de espiguetas; 10. Antela; 11. Capítulo; 12. Amento; 13. Verticilastro; 14. Ciáto (g – glândulas nectaríferas, b – receptáculo, m – flores ♂ com um estame) (Díaz Gonzalez, Fernandez-Carvajal Alvarez, & Fernández Prieto, 2004). B A 11 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente 1.2.1. Flor A flor é ramo curto de crescimento determinado (braquiblasto), com entrenós muito curtos e folhas profundamente modificadas, onde se consuma a reprodução sexuada nas angiospérmicas. Como se refere no Volume II (Sistemas de polinização), a interacção com os agentes polinização e os mecanismos de promoção da alogamia tiveram um efeito determinante na evolução e na forma da flor. Neste sentido, a flor, no seu todo, pode ser entendida como uma adaptação à polinização. 1.2.1.1. Ciclo floral Indução e iniciação florais A capacidade de produzir flores – a indução floral – é induzida por um conjunto complexo de sinais endógenos (e.g. activação endógena dos genes envolvidos na iniciação floral) e exógenos (e.g. exposição temporária ao frio [vernalização], comprimento do dia e exposição à secura). Por exemplo, nas cultivares mais produtivas de Triticum aestivum (Poaceae) «trigo-‐mole» a iniciação floral depende da exposição a um prolongado período de frio. Na Mangifera indica (Anacardiaceae) «mangueira» a iniciação floral é impulsionada pela escassez de água no solo. A exposição à luz favorece a diferenciação de flores nos gomos mistos de Vitis vinifera (Vitaceae) «videira-‐europeia». A indução floral é um fenómeno fisiológico, hormonalmente regulado, sem uma tradução morfológica a nível meristemático. Com a iniciação floral (= diferenciação floral)4 verifica-‐se a conversão anatómica (observável ao microscópio) dos meristemas vegetativos em meristemas reprodutivos (vd. Meristemas). Os meristemas reprodutivos começam por diferenciar a inflorescência, designam-‐se nessa fase por meristemas da inflorescência. Em seguida, acomodam-‐se meristemas florais na axila das folhas diferenciadas na inflorescência, i.e. das brácteas5. Cada um destes meristemas, por sua vez, produz uma flor. A produção de flores marca a diferenciação dos meristemas da inflorescência em meristemas florais. A diferenciação das peças florais (sépalas, pétalas, estames e carpelos) segue, geralmente, a regra de Hofmeister enunciada aquando da discussão da filotaxia dos caules vegetativos (vd. Filotaxia): os novos primórdios, de qualquer dos órgãos da flor (cálice, corola, androceu e gineceu), formam-‐se nos espaços mais amplos disponíveis entre os primórdios mais próximos já diferenciados. Por esta razão, por regra, a primeira sépala emerge no espaço mais distante da bráctea que axila a flor, e nas flores cíclicas as pétalas alternam com as sépalas e os estames alternam com as pétalas. Ciclo floral As flores cumprem, de forma sequencial, um conjunto de fases, que em conjunto constituem o ciclo floral. Primeiro os meristemas vegetativos volvem competentes para produzir flores (indução floral). A evidência de flores a nível meristemático marca a iniciação floral. Na fase de botão floral as flores por abrir (botões florais), organizadas, ou não, em inflorescências, são macroscopicamente visíveis. Concluída a diferenciação da flor verifica-‐se a ântese (= floração), i.e. a abertura da flor ao exterior, geralmente através da deflexão de sépalas e pétalas. Durante a ântese ocorrem adeiscências das anteras, a polinização, a fecundação e o início da formação do fruto e da semente, temas detalhados no vol. III. A deiscência das anteras pode anteceder, ser simultânea, ou suceder a polinização; a ordem das restantes etapas da ântese é constante. Finda a ântese a flor senesce, i.e. o perianto e os estames escurecem e perdem turgidez e morrem; geralmente ambas as estruturas acabam por tombar no solo. A formação do fruto e da semente principia com um aumento de volume do ovário e das sementes. Na maturação do fruto e da semente o fruto para de crescer e adquire o fenótipo (cor, forma, composição, etc.) que lhe é característico. Nesta fase a maior parte das sementes (sementes ortodoxas) perde água, adquire resistência à secura e entra em quiescência (suspensão do desenvolvimento) (vd. Desenvolvimento 4 Os termos indução floral e iniciação floral são, muitas vezes, usados como sinónimos. 5 Por perda evolutiva nem sempre presentes. 12 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente da semente, vol. III). Na dispersão, consoante as espécies, os frutos libertam as sementes (frutos deiscentes) ou dispersam-‐se em conjunto com estas (frutos indeiscentes). 1.2.1.2. Constituição da flor e expressão sexual Constituição A flor dita completa6 inclui: receptáculo (= eixo floral) – eixo caulinar, frequentemente alargado, onde se inserem as peças florais; perianto duplo – com sépalas e pétalas; característico das flores heteroclamídeas; androceu – parte ♂ da flor formada pelo conjunto dos estames; gineceu – parte ♀ da flor constituídas pelos carpelos. O receptáculo situa-‐se na parte proximal da flor e o gineceu, invariavelmente, no seu extremo distal, por cima dos estames. As flores completas têm os dois sexos funcionais são, portanto, hermafroditas (= bissexuais). A partir do modelo de flor completa7 definem-‐se vários tipos de flor incompleta: flor nua – sem perianto; flor estéril – não funcional, pela ausência de antófilos ou pelo facto destes não serem funcionais; flor apétala – sem pétalas; flor unissexual – apenas um dos sexos funcional e peças do sexo não funcional ausentes ou morfologicamente muito modificadas. As flores unissexuais podem ser pistiladas (flores ♀) ou estaminadas (flor ♂). As flores solitárias são sustentadas por uma pequena porção de caule designada por pedúnculo. Nas flores integradas em inflorescências grupadas este caule toma o nome de pedicelo. A flor séssil não possui pedúnculo (ou pedicelo), i.e. insere-‐se directamente num nó. Expressão sexual A expressão sexual (= sistemas sexuais) é discutida em profundidade na secção dedicada à polinização (vd. Polinização, vol. III). Nesta fase, ainda inicial, da exploração da flor apresentam-‐se os três sistemas sexuais (vd. Sistemas de reprodução, vol. III): homoicia, monoicia e dioicia. As plantas de flores hermafroditas dizem-‐se homoicas. As plantas monoicas possuem flores exclusivamente unissexuadas, estando ambos os sexos presentes num mesmo indivíduo, e.g. Fagaceae e Betulaceae. As plantas dioicas têm também flores unissexuadas, porém as flores ♂ e as ♀ ocorrem em indivíduos diferentes, e.g. Salix (Salicaceae) «salgueiros», Populus (Salicaceae) «choupos» e Ilex (Aquifoliaceae) «azevinhos». Nas flores funcionalmente unissexuais – funcionalmente ♂ ou ♀ – observam-‐se estames e carpelos aparentemente funcionais, i.e. de morfologia “normal”, porém, por mecanismos vários apenas um dos sexos é funcional. Pela mesma ordem de razões podem-‐se também utilizar as designações: planta funcionalmente monoica e planta funcionalmente dioica. 1.2.1.3. Receptáculo O receptáculo8 (= eixo floral ou tálamo) é um braquiblasto, ou seja um caule muito curto, de entrenós geralmente colapsados, no qual se inserem as peças que constituem a flor. Na maioria das angiospérmicas cada peça da flor é abastecida por um feixe vascular proveniente do receptáculo. A ramificação deste feixe varia consoante o órgão em causa, sendo mais pronunciada nas peças do perianto. Os entrenós do receptáculo podem alargar-‐se de forma diferenciada e dar origem a diferentes estruturas. Por exemplo, nas Caryophyllaceae o entrenó que separa a corola do androceu surge com frequência alargado 6 Nas estruturas reprodutivas da família Hydatellaceae os estames situam-‐se acima dos carpelos porém não se sabe se estas estruturas são verdadeiras flores, ou inflorescências condensadas semelhantes a flores (pseudantos) (Rudal, Anatomy of Flowering Plants. An Introduction to Structure and Development, 2007). 7 O conceito de flor completa, à semelhança do conceito de folha completa, não envolve inferências evolutivas. A descrição das flores incompletas tendo como referência a flor completa é um artifício pedagógico. 8 O termo receptáculo também é utilizado para designar alguns tipos particulares de eixos de inflorescência, geralmente em forma de disco, taça ou copo, como acontece nas famílias Euphorbiaceae, Moraceae e Asteraceae. 13 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente constituindo um antóforo. Se o alargamento ocorre entre o androceu e o gineceu forma-‐se um ginóforo, como acontece em Capparis spinosa (Capparaceae) «alcaparra». A partir do receptáculo podem ainda diferenciar-‐se gibas (pequenasbolsas) e esporões (estruturas mais longas do que as gibas). Os esporões da corolinos ou calicinais desempenham uma função análoga aos esporões receptaculares: a oferta de recompensas em néctar. 1.2.1.4. Filotaxia, merismo e simetria da flor Filotaxia Quanto à filotaxia as flores podem ser acíclicas, hemicíclicas ou cíclicas. Nas flores acíclicas as peças florais dispõem-‐se de forma alterna (uma por nó) e helicoidal (vd. Filotaxia); e.g. Nymphaea alba (Nymphaeaceae) «nenúfar-‐branco». Nas flores hemicíclicas (= filotaxia intermédia) parte das peças florais dispõem-‐se em verticilos (duas ou mais peças por nó), as restantes são alternas helicoidais (vd. Filotaxia); e.g. Clematis (Ranunculaceae) «clematides». Esta condição é bastante frequente porque o cálice geralmente segue a filotaxia das folhas caulinares (nomófilos), assim, se as folhas forem alternas o cálice muitas vezes é acíclico enquanto a corola é verticilada. Nas flores cíclicas (= filotaxia verticilada), a condição mais frequente nas angiospérmicas, as peças florais aparecem organizadas em verticilos (duas ou mais por nó). As plantas de flores acíclicas estão concentradas nas angiospérmicas basais, i.e. nos grupos mais próximos da base (mais antigos) da grande árvore filogenética das plantas com flor (vd. Relações filogenéticas entre as plantas-‐com-‐flor, vol. III). Ainda assim, as angiospérmicas basais e as eudicotiledóneas basais apresentam uma filotaxia variável, desde flores acíclicas a flores cíclicas. As flores hemicíclicas e cíclicas derivam de flores acíclicas (condição ancestral). As angiospérmicas mais avançadas são genericamente hemicíclicas ou cíclicas. As flores de alguns grupos recentes de angiospérmicas são secundariamente acíclicas; e.g. Theaceae e Paeoniaceae. O desenvolvimento de verticilos estáveis nas flores constituiu uma enorme aquisição evolutiva porque possibilitou a concrescência de peças, a aderência de órgãos e alterações na simetria da flor, com todas as vantagens que daí advieram (e.g. interacção com insectos polinizadores e protecção do ovário). Merismo O merismo refere-‐se ao número de peças por verticilo floral. As flores dímeras, trímeras, tetrâmeras, pentâmeras ou de merismo indefinido são os tipos mais frequentes. As flores acíclicas apresentam um merismo indefinido. Como se referiu no ponto anterior, o merismo indefinido primário caracteriza alguns grupos de angiospérmicas basais. Nas angiospérmicas basais, nas eudicotiledóneas basais e nas monocotiledóneas ocorrem com frequência plantas dímeras (e.g. Lauraceae e Buxaceae) e trímeras (e.g. monocotiledóneas). As flores das eudicotiledóneas são, genericamente, tetrâmeras (e.g. Brassicaceae) ou pentâmeras (e.g. condição dominante). Simetria A simetria é um dos caracteres florais de maior importância taxonómica nas plantas-‐com-‐flor. Os termos reunidos no quadro 5 podem ser aplicados, isoladamente, ao cálice e à corola. Como se refere do vol. II (Sistemas de polinização), a simetria da flor está relacionada com o sistema de polinização e o tipo vetor polínico. As flores actinomórficas entomófilas são pouco seletivas quanto aos insectos polinizadores. As espécies que as polinizam acedem ao pólen vindos de qualquer direção. Os himenópteros são os polinizadores mais frequentes das flores zigomórficas. As flores assimétricas rareiam na natureza, facto que estará relacionado com a preferência dos insectos polinizadores por formas simétricas. 14 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente Quadro 5. Simetria da flor Tipo Descrição/exemplos Flor actinomórfica* ** (= flor regular, flor polissimétrica) flor de simetria radial, i.e. qualquer plano divide a flor em duas partes iguais; nas flores actinomórficas as peças de cada verticilo são iguais entre si; e.g. Rosaceae; condição ancestral da qual derivam os outros tipos de simetria Flor zigomórfica (= flor monossimétrica) flor de simetria bilateral, i.e. com um único plano de simetria; e.g. grande parte das Lamiaceae Flor bissimétrica flor com dois planos de simetria; e.g. Brassicaceae pelo facto de ter estames didinâmicos, e Papaver rhoeas (Papaveraceae) «papoila-‐comum» porque as pétalas externas são maiores do que as internas Flor assimétrica flor sem planos de simetria; e.g. Canna (Cannaceae) «canas» e Lonicera (Caprifoliaceae) «madressilvas» * Muitos autores alargam o conceito de flor actinomórfica às flores bissimétricas. ** Em alternativa, flor actinomorfa. Também se usa a combinação flor zigomorfa em vez de flora zigomórfica. 1.2.1.5. Perianto Definição de perianto. Tipos fundamentais Constitui o perianto, num sentido lato, o conjunto dos antófilos estéreis, sempre situados nos verticilos mais externos da flor. Na grande maioria das angiospérmicas as peças do perianto evoluíram a partir de brácteas (Ronse De Craene, 2010). As pétalas derivadas de estames são um carácter raro e secundário; e.g. Rosa (Rosaceae). As flores aclamídeas (= flores nuas) não têm perianto. As flores com perianto dizem-‐se clamídeas. Reconhecem-‐se dois tipos de flores clamídeas cíclicas: haploclamídeas e diploclamídeas, respetivamente com um ou dois verticilos periantais. As plantas diploclamídeas, por sua vez, repartem-‐se por dois tipos. As flores homoclamídeas têm peças periantais iguais. As flores heteroclamídeas (= diclamídeas, de perianto duplo) possuem cálice e corola. Num sentido estritoo termo perianto só deve ser aplicado às plantas heteroclamídeas. As flores de perianto simples9, i.e. de perianto indiferenciado (com as peças todas iguais) têm perigónio, tal é o caso de muitas flores acíclicas, e das flores haploclamídeas e homoclamídeas. O perianto simples pode ser primário, ou resultar da perda evolutiva de sépalas ou pétalas (perianto simples secundário). A distinção destas três condições pode ser difícil na prática. O perianto simples primário tem uma grande expressão nas angiospérmicas basais, nas magnoliidas e nas monocotiledóneas, estando geralmente associado à filotaxia helicoidal ou a flores trímeras (Ronse De Craene, 2010). Este carácter surge ainda em algumas famílias de 9 As designações “perianto simples” e “perianto duplo” são inconsistentes na bibliografia. Neste texto são usadas para diferenciar flores com peças periantais, respectivamente, de um ou de dois tipos. Para outros autores, flor de perianto simples é um sinónimo de flor haplocamídea, e flor de perianto duplo de flor diploclamídea. Figura 3. Tipos de perianto. 1. e 2. Flor heteroclamídea de Erysimum cheirii (Brassicaceae) «goivo». 3. Flor haploclamídea de Ulmus minor (Ulmaceae) «ulmeiro». 3. Flor hermafrodita nua de Fraxinus angustifolia (Oleaceae) «freixo-‐de-‐folhas-‐estreitas». 4 Flor ♂ nua de Salix (Salicaceae) «salgueiro» na axila de uma bráctea. 5. Flor ♀ nua de Salix na axila de uma bráctea (Coutinho, 1898) 15 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente eudicotiledóneas basais; e.g. vários géneros de Ranunculaceae. As pétalas e, implicitamente, o perianto duplo, evoluíram de forma independente em várias linhagens de angiospérmicas, a partir de flores haploclamídeas ou homoclamídeas. A transição entre brácteas e sépalas nas flores heteroclamídeas nem sempre é clara (e.g. Camelia [Theaceae] «camélias). O mesmo pode acontecer entre as sépalas e as pétalas. Algumas famílias de plantas apresentam mais de um verticilo corolino; e.g. Berberidaceae. A concrescência das peças dos verticilos periantais – i.e. a união de tépalas, sépalas e pétalas, desenvolvendo-‐ se e crescendo em conjunto – é um dos caracteres de maior interesse taxonómico na morfologia da flor. A concrescência das peças do perianto dificulta o acesso de parasitas e animais ao néctar e a sua perda por evaporação. Portanto, a concrescência nos verticilos periantais aumenta a duração do néctar, reduz os riscos do seu consumo por não polinizadores e, possivelmente, incrementa a probabilidade de se virem a estabelecer relações planta-‐polinizador mais vantajosas por co-‐evolução. Este conjunto tão significativo de vantagens explica por que razão a concrescência das peças do perianto surgiu de forma independente em tantos grupos de plantas com flor. Perigónio Designa-‐se por perigónio o conjunto das tépalas, i.e. dos antófilos estéreis das flores de perianto simples primário, tenham elas um ou mais de um verticilos de peças. As tépalas podem ser sepaloides ou petaloideas. A restante terminologia relativa ao perigónio é análoga à aplicada às flores com perianto descrita em seguida. Existem perigónios dialitépalos e sintépalos, unha e limbo nas tépalas dos perigónios dialipétalos, e assim por diante. Como se referiu anteriormente, algumas flores haploclamídeas perderam o verticilo das pétalas ou das sépalas no decurso da sua história evolutiva. O conceito de tépala não deve ser aplicado a estes casos, e.g. flores das Amaranthaceae e flores tubulosas e liguladas de Anthemis (Asteraceae). Cálice O cálice é o conjunto das sépalas, as peças florais do verticilo mais externo de um perianto duplo. As sépalas, normalmente, seguem a mesma filotaxia dos nomófilos, têm uma consistência herbácea, cor esverdeada e desempenham a função fotossintética. Com frequência encontram-‐se tricomas, glândulas e estomas a revestir a superfície exterior das sépalas. O cálice desempenha duas importantes funções: proteger os verticilos mais interiores da flor no botão floral e produzir fotoassimilados para serem consumidos pelas da peças flor. O cálice diz-‐se petaloide quando as sépalas se assemelham a pétalas. Por vezes o cálice apresenta-‐se reduzido a uma coroa de escamas, sedas (pelos rígidos e fortes) ou de pelos, simples (não ramificados) ou plumosos (se ramificados). O cálice de pelos das Asteraceae, Dipsacaceae e Valerianaceae leva o nome de papilho. A concrescência do cálice é um carácter de enorme interesse taxonómico. Reconhecem-‐se dois tipos: i) cálice dialissépalo – com sépalas livres, e.g. magnoliidas; ii) cálice sinsépalo (= gamossépalo) – com sépalas concrescentes, i.e. soldadas entre si; fácil de observar em qualquer família de asteridas. Outros caracteres taxonómicos muito valorizados no cálice são a consistência, a forma e a duração. Quanto à consistência o cálice pode ser herbáceo, escarioso, membranoso, etc. Quanto à forma: campanulado, tubuloso, bilabiado, etc. Quanto à duração: caduco ou persistente (visível ainda no fruto). Na Physalis peruviana (Solanaceae) «fisális» e na família tropical Dipterocarpaceae), entre outras angiospérmicas, o cálice diz-‐se acrescente porque continua a crescer após a fecundação. Corola O conjunto das pétalas designa-‐se por corola. Na flor completa a corolasitua-‐se entre os verticilos do cálice e do androceu. As pétalas geralmente alternam com as sépalas. Nas plantas polinizadas por insectos as pétalas são, normalmente, maiores e mais delicadas e coloridas do que as sépalas porque têm a função de atrair animais polinizadores. A cor destas peças periantais depende da concentração e tipo de pigmentos – e.g. antocianinas, carotenoides, betalaínas e flavonoides – que se acumulam nas células da epiderme ou do mesofilo. Normalmente, a superfície das pétalas não tem estomas e encontra-‐se coberta de papilas. A superfície pode ainda apresentar-‐se ornada com guias de néctar e/ou de pólen – e.g. linhas e manchas de cor ultravioletas e 16 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente linhas de tricomas – a indicar a localização de recompensas aos insectos polinizadores. Nas plantas polinizadas pelo vento (anemófilas) as pétalas são, por regra, diminutas ou estão ausentes. Quanto à concrescência reconhecem-‐se dois tipos de corola: Dialipétala – de pétalas livres (não soldadas entre si); as corolas dialipétalas podem ter algumas pétalas soldadas entre si (e.g. corola papilionácea, com 2 pétalas parcialmente unidas formando uma quilha) Quadro 6. Tipos especiais de corola Tipo Descrição/exemplos Dialipétalas Crucífera Corola actinomórfica, de 4 pétalas com unha mais ou menos longa e limbos dispostos em cruz; característica da fam. Brassicaceae Papilionácea Corola zigomórfica, de 5 pétalas; a superior (estandarte) geralmente levantada, de maior dimensão e envolvendo as restantes 4 no botão; as 2 pétalas laterais (asas) por vezes ligeiramente soldadas à quilha (e.g. em Vicia); as 2 pétalas inferiores concrescentes numa peça com a forma da quilha de um barco (quilha); corola característica da subfam. Faboideae (Fabaceae) Rosácea Corola actinomórfica, de 5 pétalas com unha curta e limbo largo; característica da família das rosáceas Simpétalas Afunilada Corola actinomórfica em forma de funil, com as pétalas concrescidas a todo o comprimento; e.g. Convolvulus (Convolvulaceae) «corriolas» Assalveada (= corola hipocrateriforme) Corola actinomórfica, de tubo longo e estreito, e região distal de concrescência variável e mais ou menos patente (perpendicular ao tubo); e.g. Pistorinia hispanica (Crassulaceae) Bilabiada Corola zigomórfica, de fauce aberta e tubo mais ou menos longo, com as pétalas concrescentes em dois lábios (3 num lábio inferior e 2 num lábio superior); característica da fam. Lamiaceae, embora em alguns géneros desta família (e.g. Teucrium e Ajuga) a corola tenha apenas um lábio superior (corola unilabiada) ou seja tubulosa (e.g. Mentha) Campanulada Corola actinomórfica, de tubo mais ou menos longo, rapidamente alargado na base na forma de um sino; e.g. Campanula (Campanulaceae) «campânulas» Ligulada Corola zigomórfica, de tubo curto, com um lábio alongado, em forma de língua e dentado na extremidade (cada dente correspondendo a uma pétala); frequente na família Asteraceae Personada Corola zigomórfica, bilabiada, de fauce fechada por uma saliência do lábio inferior (palato), frequentemente provida de gibas ou de esporões; e.g. Antirrhinum (Plantaginaceae) «bocas-‐de-‐ lobo» Rodada Corola actinomórfica, de tubo curto, e região distal de concrescência variável, mais ou menos longa e patente (perpendicular ao tubo); e.g. Solanum tuberosum (Solanaceae) «batateira» Tubulosa Corola actinomórfica de tubo comprido, mais ou menos cilíndrico, e segmentos pequenos; frequente, entre outras famílias, nas Asteraceae Unilabiada Corola zigomórfica, de fauce aberta e tubo mais ou menos longo, com um único lábio; nas Orchidaceae e em certas Fabaceae tropicais (e.g. género Clitoria) o ovário sofre uma rotação de 180°, correspondendo o lábio à pétala superior (designada por labelo entre as Orquidáceas); as flores que evidenciam uma torção do ovário dizem-‐se resupinadas Urceolada (= corola gomilosa) Corola actinomórfica, bruscamente alargada num tubo bojudo, estreitado na fauce, e com segmentos muito curtos; e.g. Arbutus unedo (Ericaceae) «medronheiro» 17 Escola Superior Agrária de Bragança -‐ Botânica para Ciências Agrárias e do Ambiente porém nunca formam um tubo na base; a corola dialipétala de muitas Malvaceae e das Theaceae, entre outras famílias, confunde-‐se facilmente com uma corola simpétala porque as pétalas estão adnadas, na base, a um tubo formado pela concrescência dos filetes; Simpétala (= gamopétala) – com todas as pétalas concrescentes formando um tubo, mais ou menos longo, a partir da base; e.g. famílias do clado das Asteridas. Nas pétalas livres das corolas dialipétalas reconhece-‐se uma unha e um limbo. A unha corresponde à parte inferior, mais estreita e por vezes descorada, por onde se faz a inserção da pétala no receptáculo. Atinge uma dimensão assinalável Brassicaceae e as Caryophyllaceae. A parte terminal, geralmente laminar, das pétalas constitui o limbo. Nas corolas simpétalas a porção livre de uma pétala é designada por segmento (vd. Alguns conceitos fundamentais de organografia e biologia da evolução), e a entrada do tubo por fauce (fauce da corola ou fauce do tubo da corola). Os lóbulos e os dentes são, respectivamente, segmentos da corola arredondados ou triangulares e mais ou menos pontiagudos. Estes termos podem ser aplicados aos cálices tubulosos. Na corola diferencia-‐se um sem
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