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Aula 3 Educação em Direitos Humanos

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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ 
CURSO: Direito 
DISCIPLINA: Direitos Humanos (ARA0082) 
PERÍODO: 2022.1 
PROFESSOR: Danilo Mariano Pereira 
AULA 3: Educação em Direitos Humanos 
Temas de aprendizagem 
- Definição e distinção entre os conceitos de igualdade formal e igualdade substancial 
(igualdade e equidade) 
- Conceitos de desigualdade social, vulnerabilidade social e ações positivas e negativas 
- Desafios (jurídicos, políticos e culturais) para a construção de uma sociedade mais justa 
Situação-problema 
“Durante sua campanha para a presidência das Filipinas, Rodrigo Duterte deixou bastante claro 
seu desprezo pelos direitos humanos e pelo Estado de Direito. O presidente jurou matar 
aproximadamente 100 mil pessoas – que se tornariam “comida de peixe”. Ao longo do último ano, 
desde que Duterte se tornou presidente, milhares de pessoas foram assassinadas na chamada “guerra 
às drogas”. “Se você conhece algum viciado, vá em frente e mate-o você mesmo”, disse a uma 
multidão de apoiadores no ano passado. (...) Duterte não faz nenhum esforço para polir suas palavras 
ou disfarçar suas intenções. “Minha ordem é de atirar para matá-los”, disse a supostos infratores 
usuários de drogas. “Os direitos humanos não me importam, pode acreditar”. (Anistia Internacional). 
- Pergunta-se: O que se pode fazer para disseminar uma cultura de direitos humanos? 
Metodologia 
BRAGATO, Fernada; ADAMATI, Bianka. “Igualdade, não discriminação e direitos humanos: 
são legítimos os tratamentos diferenciados?”. Revista de Informação Legislativa, v. 51, n. 204, p. 91-
108, out./dez. 2014. 
MONTEIRO, Aida. TAVARES, Celma. “Educação em direitos humanos no Brasil: contexto, 
processo de desenvolvimento, conquistas e limites”. Educação, v. 36, n. 1, p. 50-58, jan./abr. 2013. 
Atividade Verificadora da Aprendizagem 
Em termos jurídicos, quais são problemas acarretados por uma cultura política de desprezo e 
de incentivo às violações de direitos humanos? 
 
 
Definição e distinção entre os conceitos de igualdade formal e igualdade substancial 
A ideia de igualdade é um princípio básico dos Direitos Humanos. O Art. 1º da Declaração 
Universal dos Direitos Humanos, de 1948, decreta: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais 
em dignidade e em direitos” (grifos nossos). No direito brasileiro, os Arts. 3º e 5º da Constituição 
Federal de 1988 estão entre os mais conhecidos da população justamente por determinarem os direitos 
à igualdade e à não discriminação. 
No entanto, existem várias formas de se defender e promover a igualdade entre os seres 
humanos ou entre os cidadãos de um país. Uma dessas variações é a diferença entre igualdade formal 
e igualdade substancial. 
O conceito de igualdade formal estabelece o princípio, segundo o qual, “somos todos iguais 
perante a lei”. Com base nesse princípio, considera-se inadmissível toda e qualquer forma de distinção 
ou discriminação entre os membros de uma sociedade ou grupo social. Trata-se de um princípio (i) 
negativo, pois tem caráter proibitivo, vedando ou limitando as ações que possam violar a igualdade 
entre os indivíduos; e (ii) a priori, pois vê a igualdade entre todos como um pressuposto, isto é, uma 
condição previamente dada que simplesmente não pode, em hipótese alguma, ser alterada. 
Historicamente, a noção de igualdade formal surgiu no começo da Modernidade, como forma 
de combater os privilégios de nascimento, concedidos pelo Estado, durante a Idade Média, aos reis, 
nobres e cleros, que tinham um status superior ao da população comum. 
Já o conceito de igualdade substancial (conhecido como equidade) estabelece o princípio, 
segundo o qual, “é preciso tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais”. Esse princípio 
busca apontar e denunciar a permanência e a perpetuação das desigualdades, mesmo sob a vigência do 
princípio da igualdade formal. Logo, entende-se que é preciso atuar, efetivamente, para corrigir essas 
desigualdades. Nesse sentido, trata-se de um princípio (i) positivo, pois tem caráter de obrigação, 
exigindo a adoção de medidas concretas que combatam as desigualdades; e (ii) a posteriori, pois vê a 
igualdade não como uma condição previamente dada, mas um objetivo a ser alcançado, isto é, uma 
realidade que ainda não está devidamente estabelecida e que, por isso, deve ser construída. 
Historicamente, a noção de igualdade substancial surgiu também no início da Modernidade, 
como forma de combater as chamadas desigualdades sociais, que se tornaram o grande problema do 
capitalismo. No século XX, a busca pela equidade ganhou mais força e legitimidade, tornando-se uma 
forma de combater diversos problemas sociais, como o racismo, o machismo, a pobreza, a intolerância 
religiosa, a perseguição às minorias, as desigualdades regionais etc. 
Atualmente, entende-se que, por um lado, é preciso conservar os avanços promovidos pelo 
princípio da igualdade formal. Inegavelmente, a construção de uma sociedade mais justa, moderna e 
democrática obriga necessariamente o reconhecimento de que todos são iguais (ou ao menos deveriam 
ser). No entanto, por outro lado, entende-se que é preciso buscar também a igualdade substancial, ou 
 
 
seja, a correção das desigualdades ainda existentes, por meio de ações que não apenas pressuponham a 
igualdade entre os indivíduos, mas que de fato promovam, ativamente, essa igualdade, nos diversos 
contextos sociais em que ela ainda não tenha sido conquistada. 
Em outras palavras, a busca pela igualdade substancial ou equidade implica a busca de 
medidas que beneficiem, protejam e incluam socialmente as pessoas ou grupos sociais que se 
encontrem nas chamadas situações de vulnerabilidade social, isto é, situações de desvantagens em 
relação ao restante da sociedade, as quais não estejam sendo resolvidas apenas por meio da aplicação 
do princípio da igualdade formal. 
Entre as políticas de promoção da equidade, destacam-se aquelas que combatem a fome e a 
pobreza extrema, o machismo, a violência contra a mulher e a população LGBTQIA+, o racismo etc. 
 
Figura 1: Igualdade formal vs. Igualdade substancial (igualdade vs. equidade) 
 
Fonte: https://falauniversidades.com.br/igualdade-x-equidade-os-reflexos-na-sociedade-brasileira/ 
 
A diferença entre igualdade formal e substancial aparece no próprio art. 3º da Constituição. 
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: 
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; 
II – garantir o desenvolvimento nacional; 
III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e 
regionais; 
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e 
quaisquer outras formas de discriminação. 
O parágrafo 3º aproxima-se do conceito de igualdade substancial, pois cita problemas sociais 
concretos, presumivelmente existentes no país e que devem ser combatidos, como a pobreza, a 
marginalização e as desigualdades. Já o parágrafo 4º aproxima-se do conceito de igualdade formal, 
pois estabelece basicamente a proibição de toda e qualquer forma de discriminação. 
 
 
Dados sobre desigualdade social e racial no Brasil 
As desigualdades sociais e raciais no Brasil são visíveis nos dados. Vejamos alguns: 
• 1% da população brasileira detém 50% da riqueza do país (World Inequality Lab, 2020); 
• 50% da população brasileira detêm 0,4% da riqueza do país (World Inequality Lab, 2020); 
• 40% da população brasileira vivem na pobreza ou extrema pobreza (IBGE, 2021); 
• Brasileiros com ensino fundamental incompleto: 57% são negros ou pardos (IBGE, 2010); 
• Brasileiros com ensino superior: 70% são brancos e 30% são negros ou pardos (IBGE, 2010); 
• Brasileiros empregados: 75% são brancos (IBGE, 2010); 
• Brasileiros empregados sem carteira assinada: 58% são negros (IBGE, 2010); 
• Brasileiros com renda inferior a 1 salário mínimo: quase 60% são negros (IBGE, 2010); 
• Brasileiros com renda superior a 30salários mínimos: 80% são brancos; menos de 1% são 
negros (IBGE, 2010). 
Os desafios da promoção da igualdade e da equidade no Brasil 
A disseminação de uma cultura de direitos humanos passa obrigatoriamente pela disseminação 
de uma cultura de promoção da equidade, que busque a resolução dos problemas sociais e a inclusão 
de grupos historicamente excluídos e marginalizados. 
Pode-se dizer que três desafios deverão ser enfrentados no caminho em direção a esse objetivo: 
(i) O desafio jurídico. É preciso responder à seguinte questão: como “tratar desigualmente os 
desiguais” sem, com isso, violar o princípio de igualdade formal? Esse tema foi muito debatido, por 
exemplo, quando da implementação das chamadas ações afirmativas, previstas no Estatuto da 
Igualdade Racial (Lei 12.228/2010) e que incluíam medidas como cotas raciais em universidades e 
concursos públicos e estímulo à contratação de pessoas negras em empresas privadas. Ainda hoje, 
vários setores da sociedade contestam a legitimidade e até a legalidade dessas medidas. 
Alguns conceitos importantes foram desenvolvidos com o intuito de respaldar e estabelecer 
critérios para as ações afirmativas e outras políticas de combate à desigualdade e promoção da 
inclusão, como os princípios da “justificativa objetiva, razoabilidade e proporcionalidade” (Bragato & 
Adamati, 2014). 
(ii) O desafio da visibilidade social dos conflitos. É preciso tornar visíveis os conflitos que 
surgem quando se busca solucionar o problema das desigualdades. O combate ao racismo, ao 
machismo, à pobreza extrema, à perseguição às minorias etc., é frequentemente descrito como de 
interesse geral da sociedade. Mas, não é tão simples assim. Trata-se, certamente, de uma pauta de 
interesse público, definida em lei como missão do Estado. A correção das desigualdades consta no art. 
3º da Constituição Federal de 1988. Entretanto, a inclusão social de grupos historicamente excluídos e 
marginalizados, como negros, mulheres, pobres e outras minorias, contraria os interesses econômicos, 
 
 
as ideologias, as visões de mundo etc. de importantes setores da sociedade, que reagem e buscam 
bloquear o cumprimento dessa missão constitucional, algumas vezes de forma explícita e declarada, 
outras vezes, de forma velada e até mesmo inconsciente. 
(iii) O desafio cultural (ou a desnaturalização das desigualdades). É preciso fomentar uma 
cultura de cidadania que leve as pessoas a perceberem os dados sobre desigualdade social, pobreza, 
racismo, machismo etc., como problemas graves a serem resolvidos com urgência, e não apenas como 
peculiaridades ou meros inconvenientes de nosso quadro social. Em outras palavras, é preciso 
desnaturalizar as desigualdades, isto é, aprender a estranhá-las, indignar-se perante elas. Essa é, por 
definição, a finalidade da chamada Educação em Direitos Humanos.

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