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0 1 Cristiano Costa de Carvalho ORGANIZADOR Neilando Alves Pimenta COLABORADOR Teófilo Otoni – 2021 2 Copyrigth ©: Autores diversos Projeto gráfico: Núcleo de Investigação Científica e Extensão (NICE) Diagramação: André Vitor G. e Núcleo de Investigação Científica e Extensão (NICE) Capa: André Vitor Gonçalves e Núcleo de Investigação Científica e Extensão (NICE) DIREITOS PRESERVADOS – É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio sem a citação dos autores. A violação dos direitos de autor (Lei Federal 9.610/1998) é crime previsto no art. 184 do Código Penal. Temas contemporâneos no processo de trabalho do Serviço Social/ Cristiano Costa de Carvalho, (Org.). - Teófilo Otoni - Editora NICE, Dezembro/2021. 223 f. Vários autores. ISBN 978-65-994641-6-4. E-book 1. Serviço Social. 2. Assistente Social. 3. Direitos Humanos. 4. Trabalho profissional. 5. Política Social. CDD-361.981 3 SUMÁRIO SOBRE OS AUTORES..................................................................................................................5 PREFÁCIO Kênia A. Figueiredo.....................................................................................................................10 APRESENTAÇÃO Cristiano Costa de Carvalho.......................................................................................................13 BLOCO 01 - TEMAS EMERGENTES E O SERVIÇO SOCIAL Capítulo 01 - CRISE E CRÍTICA DA PANDEMIA DA COVID-19 E O SERVIÇO SOCIAL Marisaura dos Santos Cardoso Cristiano Costa de Carvalho.......................................................................................................16 Capítulo 02 - APROXIMAÇÕES TEÓRICAS SOBRE FLUXOS MIGRATÓRIOS MOTIVADOS PELO ENSINO SUPERIOR E OS REFLEXOS DA CRISE SANITÁRIA PROVOCADA PELA COVID-19: BRASIL-PORTUGAL Fabrícia Cristina de Castro Maciel .............................................................................................33 Capítulo 03 - VULNERABILIDADES DA POPULAÇÃO LGBTQIA+: A SITUAÇÃO DAS TRAVESTIS E DAS MULHERES TRANS NO CONTEXTO PANDÊMICO Renato Tadeu Veroneze.............................................................................................................51 Capítulo 04 - POBREZA E AUXÍLIO EMERGENCIAL EM TEMPOS DE COVID-19 Leni Maria Pereira Silva Alan Farley Prates Oliveira Luciney Sebastião da Silva.........................................................................................................72 BLOCO 02 – MUNDO DO TRABALHO, TÉCNICAS E INTERVENÇÕES DO SERVIÇO SOCIAL Capítulo 05 - SOFRIMENTO ÉTICO-POLÍTICO EM TRABALHO PRECÁRIO Leni Maria Pereira Silva Luciney Sebastião da Silva.........................................................................................................97 Capítulo 06 - ESTUDO SOCIOECONÔMICO: NOTAS PARA SUA EXECUÇÃO NO SERVIÇO SOCIAL Ludson Rocha Martins...............................................................................................................118 Capítulo 07 - PROTOCOLO DO ACOMPANHAMENTO (DO SERVIÇO SOCIAL) AO PACIENTE DURANTE O PROCESSO DE INTERNAÇÃO HOSPITALAR E PÓS-ALTA. Gesiene Aparecida Cordeiro Reis............................................................................................137 4 Capítulo 08 - NOTAS E REFLEXÕES SOBRE A ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NO CAMPO SÓCIO-JURÍDICO Cibelle Dória da Cunha Bueno................................................................................................152 BLOCO 03 – DEMANDAS E COMPETÊNCIAS PROFISSIONAIS Capítulo 09 - CIDADANIA, REPÚBLICA E DEMOCRACIA NO BRASIL: CONTRIBUIÇÕES PARA COMPREENDERMOS O DEBATE EM TORNO DO CONTROLE SOCIAL E DA PARTICIPAÇÃO POPULAR Marisaura dos Santos Cardoso...............................................................................................164 Capítulo 10 - SERVIÇO SOCIAL NAS EMPRESAS: UM ESTUDO SOBRE AS PRODUÇÕES BIBLIOGRÁFICAS. Maria José de Oliveira Lima Viviane Arcanjo de Oliveira....................................................................................................176 Capítulo 11 - A ASSESSORIA/CONSULTORIA EM SERVIÇO SOCIAL: um espaço sócio ocupacional em expansão para o trabalho profissional Rosângela M A Soares..........................................................................................................184 Capítulo 12 - A POLÍTICA DE REDUÇÃO DE DANOS COMO POSSÍVEL ESTRATÉGIA ÉTICA NOS ATENDIMENTOS DE ASSISTENTES SOCIAIS EM INSTITUIÇÕES DE ASSISTÊNCIA ESTUDANTIL Carla Cristina Cangussu Marisnei Souza Dourado Verita Perpétua Saraiva.........................................................................................................195 Capítulo 13 - OS DIREITOS À SAÚDE DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA: CONTRIBUIÇÕES DO PROGRAMA CONSULTÓRIO DE RUA DE BELO HORIZONTE - MG. Carla Cristina Alves Cangussú Cristiano Costa de Carvalho Luisa Maria Furbeta Boeri Verita Perpétua Saraiva...........................................................................................................207 5 SOBRE OS AUTORES Alan Farley Prates Oliveira Mestrando em Serviço Social, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. PUCSP. E- mail: alanfarleyp@gmail.com Carla Cristina Cangussu Estudante de Serviço Social pelo Centro Universitário UNA. Integrante do Laboratório de Direitos Humanos (LabDH) e Escritório do Serviço de Assistência Judiciária da Una (ESAJUNA), participa do Grupo de estudo e pesquisas sobre formação, exercício e prática profissional do Serviço Social. Cibelle Dória da Cunha Doutoranda em Serviço Social pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestre em Serviço Social, Trabalho e Questão Social pela Universidade Estadual do Ceará - UECE, Pós-graduada em Serviço Social, Políticas Públicas e Direitos Sociais pela Universidade Estadual do Ceará (UECE) e Bacharel em Serviço Social pelo Centro Universitário UNA de Belo Horizonte / MG. Docente do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Ouro Preto – UFOP e Universidade Estadual de Minas Gerais – UEMG. Pesquisadora e gerente de Projetos na Visão Mundial. E-mail: cibelledoria@gmail.com Cristiano Costa de Carvalho Assistente social com graduação pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), Mestre em Gestão Social, educação e desenvolvimento local pelo Centro Universitário Una com especialização em Serviço Social: Direitos Sociais e Competências Profissionais pela Universidade de Brasília (UnB) e Intervenção Psicossocial no Contexto das Políticas Públicas, pelo Centro Universitário Una. Doutorando pelo Programa de Pós- Graduação em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Experiência profissional na área da saúde, onde atuei no Hospital das Clínicas da UFMG (HC/UFMG). Assistente Social na Prefeitura de Belo Horizonte na área da Saúde atuando como Referência Técnica na Gerência de Assistência, Epidemiologia e Regulação na Regional Centro-Sul. Professor e coordenador do Curso de pós-graduação em Instrumentalidade e Técnicas-Operativas em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). 6 Fabrícia Cristina de Castro Maciel Doutora em Serviço Social pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de mesquita Filho” – UNESP/FRANCA; Mestre em Administração Pública: gestão de políticas sociais pela Fundação João Pinheiro; Graduada em Serviço Social pela Universidade Católica de Minas Gerais. Professora da Universidade Lusófona do Porto. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-3001-5276. Gesiene Aparecida Cordeiro Reis Possui graduação em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2007) e Pós-GraduaçãoLatu sensu em Administração e Planejamento de Projetos Sociais - Universidade Veiga de Almeida RJ / Instituto Aleixo BH (2008). Pós- graduação Latu Sensu em Gestão de Instituição Federal de Educação Superior pela Universidade Federal de Minas Gerais (2013). Mestrado em Promoção da Saúde e Prevenção da Violência pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais no Programa Promoção da Saúde e Prevenção da Violência (2019). Integrante do Núcleo de Promoção da Saúde e Paz e do Programa "Para Elas, Por Elas, Por Eles e Por Nós" da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. Atualmente é Assistente Social efetiva na Universidade Federal de Minas Gerais, lotada no Hospital das Clínicas/UFMG também Assistente Social efetiva na Prefeitura de Belo Horizonte na área da Saúde atuando como Referência Técnica na Gerência de Assistência, Epidemiologia e Regulação na Regional Centro-Sul. Kênia Augusta Figueiredo Assistente Social, professora Adjunta do Departamento de Serviço Social e da Pós- Graduação em Política Social da Universidade de Brasília - UnB. Doutora pela Faculdade de Comunicação/UnB, na linha de pesquisa sobre Política de Comunicação e Cultura. Mestre em Serviço Social e políticas sociais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Coordena o Grupo de pesquisa estudos, pesquisa e extensão sobre Comunicação pública e Assistência Social (Compass) vinculado ao Departamento de Serviço Social (SER/UnB). Participa do Grupo de Pesquisa Trabalho, Educação e Discriminação (TEDis/PPGPS/SER/UnB) e do Laboratório de Políticas de Comunicação (LapCom/Fac/UnB). Coordena o grupo interdepartamental de Extensão "FALAS-ICH", vinculado ao Instituto de Ciências Humanas da UnB. Integrante do Grupo de Estudos sobre Direitos Animais e Interseccionalidades (GEDAI) e colaboradora da disciplina Mobilização Pública e Direitos Animais. Realiza pesquisa sobre comunicação pública da política de Assistência Social em tempos do Corovid-19 no Brasil, com destaque para o Distrito Federal. 7 Leni Maria Pereira Silva Doutora em Ciências Sociais UERJ (2016). Mestre em Desenvolvimento Social – Unimontes (2012). Especialista em Intervenção Social junto a Família nas Faculdades Santo Agostinho (FACISA), Graduação em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Docente do curso de Serviço Social da Universidade Estadual de Montes Claros. Membro do Núcleo de estudo das infâncias e adolescências (NINA), membro do observatório do empoderamento feminino (OEF). Luciney Sebastião da Silva Possui Mestrado em Filosofia (Estética e Filosofia da Arte) pela Universidade Federal de Ouro Preto (2014). Especialização em Filosofia (Tópicos Especiais em Filosofia Moderna e Contemporânea) pela Universidade Estadual de Montes Claros (2009). Especialização em Gestão Pública Municipal pela Faculdade Santo Agostinho (2006). Especialização em Psicanálise pela Facitec. Bacharelado e licenciatura em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2002). Atualmente é professor da Associação de Ensino Vale do Gorutuba - FAVAG; da Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES. Tem experiência em docência na área de Filosofia, com ênfase em Iniciação Filosófica, Ética, Filosofia da Educação, Filosofia Política. Luisa Maria Furbeta Boeri Enfermeira (UEMG), especialista em Saúde da Família e Enfermagem em Emergência pela Escola de Enfermagem da UFMG. Atualmente é gerente em uma unidade básica de saúde na Prefeitura de Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Saúde. Ludson Rocha Martins Assistente social, atuando na Prefeitura Municipal de Nova Lima. Graduado em Serviço Social pelo Centro Universitário UNA, e Mestre em Serviço Social pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Investiga a temática dos fundamentos do Serviço Social, associada à questão da legitimidade no âmbito da teoria das profissões; possui, ainda, interesse no estudo dos problemas de gênero e da democracia e professor no curso de pós-graduação em Instrumentalidade e Técnicas-Operativas em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Maria José de Oliveira Lima Assistente Social, doutora em Serviço Social pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, docente do Departamento de Serviço Social na Faculdade de Ciências Humanas e Sociais UNESP/Franca. Líder do Grupo de estudos e pesquisas Gestão Socioambiental e a Interface com a Questão Social - GESTA 8 Marisaura dos Santos Cardoso Mestre em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local no Centro Universitário UNA (2016). Pós-graduação Lato sensu em Seguridade Social e Mercado de Trabalho pelo Instituto de Educação Continuada - IEC - PUC Minas (2010) e em Serviço Social pela Universidade de Brasília - UnB (2010), graduação em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2008); Professora no curso de graduação em Serviço social do Centro Universitário UNA e no curso de pós-graduação em Instrumentalidade e Técnicas-Operativas em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Marisnei Souza Dourado Gerente de Assistência Social da Fump/UFMG. Possui graduação em Serviço Social pela Universidade Católica do Salvador (UCSal), especialização Interdisciplinar em Adolescência e especialização em Saúde Mental da infância e adolescência pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, especialização em Gestão Estratégica de Pessoas pela Faculdade Senac Minas, Mestrado em Administração pela Centro Universitário Unihorizontes. É membro do LaPPEEI (Laboratório de Políticas e Práticas em Educação Especial e Inclusão, vinculado ao CNPQ). Desenvolve atualmente pesquisas na área de educação especial e de políticas de educação inclusiva, atuando principalmente com os seguintes temas: educação inclusiva, educação especial, assistência estudantil e ensino superior. Renato Tadeu Veroneze Assistente social, especialista em Educação, Didática e Metodologia no Ensino Superior, especialista em Filosofia Contemporânea, mestre, doutor e pós-doutorando em Serviço Social, membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Identidade (NEPI) da PUC-SP, coordenado pela Profª. Drª. Maria Lúcia Martinelli e membro do Comitê Científico de Serviço Social do Centro de Investigação de Estudos Transdisciplinares (CET) Latino- Americano da Bolívia. Rosângela M A Soares Bacharel em Serviço Social, Centro Universitário UNA, especialista em Instrumentalidade, Instrumentos e técnicas em Serviço Social pelo Centro Universitário UNA. Verita Perpétua Saraiva Estudante de Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Foi integrante do Laboratório de Direitos Humanos (LabDH) e Escritório do Serviço de Assistência Judiciária da Una (ESAJUNA), participa do Grupo de estudo e pesquisas sobre formação, exercício e prática profissional do Serviço Social. Atualmente é estagiária de Serviço Social no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). 9 Viviane Arcanjo de Oliveira Mestranda em Serviço Social pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP/ Franca), especialista em Saúde Publica com enfase em atendimentos em Urgência e Trauma, através do Programa de Residência Multiprofissional do Hospital Municipal Odilon Behrens. Assistente Social pelo Centro Universitário UNA, Membro do Conselho Regional de Serviço Social do Estado de Minas Gerais - CRESS 6ª Região (2014/2017), atuando de maneira orgânica nas Comissões de Trabalho e Formação Profissional e na Comissão Ampliada de Ética e Direitos Humanos gestão. 10 PREFÁCIO Temas Contemporâneos no Processo de Trabalho do Serviço Social desperta em nós leitoras/es uma compreensão compartilhada por Louise Michel em “O pai Remmy”1 de que a “humanidadeainda é muito frágil, mas um dia será grande se as pessoas que têm inteligência (...) sentirem bater no peito e vibrar na inteligência o coração e a mente de uma geração inteira”. Certamente temos em nossas mãos um material fruto da capacidade reflexiva e critica de profissionais e estudantes dispostas/os a contribuir para ampliar nosso entendimento sobre temas emergentes extremamente atuais e a relação destes com o Serviço Social tanto no que tange ao fazer profissional quanto à própria condição de trabalhador/a. Esse arsenal de conhecimentos produzido em sua maioria por jovens pesquisadores traz a marca dos desafios vivenciados nesse contexto de profundas transformações no mundo do trabalho onde as tecnologias digitais de informação e comunicação são meio e fim para o capital. É imperativo refletirmos sobre as transformações societárias e seus rebatimentos nas profissões, como nos exortou José Paulo Netto (1996). Esse tempo de esgotamento estrutural do capitalismo sob a batuta do neoliberalismo aliado ao neoconservadorismo aprofunda a superexploração das e dos trabalhadoras/es, substitui o trabalho vivo por trabalho morto e reduz o papel do Estado que vem promovendo concomitantemente o desmonte das políticas sociais. Trata-se da banalização generalizada da vida. Como num efeito cascata a violação dos direitos humanos compromete os direitos dos animais, a flora, as águas...o meio ambiente em sua totalidade, ferindo de morte toda forma de vida no planeta. Por isso tão importante as análises de totalidade que partem de uma singularidade, considerando as particularidades. A observação de Behring e Santos (2009, p. 277) nos chamaram a atenção sobre a relação que nas últimas décadas, sob hegemonia neoliberal, se passou a ser estabelecida na dinâmica entre questão social e direitos. Segundo as autoras “prevalece, nos dias atuais, ampla disseminação da concepção teórica fundada na ideia de que a política e o direito fundam a sociedade”. 1 Louise Michel nasceu na França, em 1830. Foi professora primária, militante, escritora, poeta, sendo uma das principais lideranças da Comuna de Paris em 1871. “Pensem na mulher inteligente, crítica, corajosa, solidária, justa e revolucionária. Alguém que nunca perdeu a capacidade de se indignar com as injustiças do mundo, sobretudo no que diz respeito à violência e à opressão contra os animais e as pessoas em situação de vulnerabilidade mulheres, viúvas, crianças, órfãos, operários e colonizados”. Luciana Carvalho Fonseca, no Prefácio da tradução para o português do livro “Contos e lendas” de Louise Michel. Acesse em: https://www.linkedin.com/posts/luciana-carvalho-fonseca- 8360314_louise-michel-contos-e-lendas-ema-livros-activity-6883781886380908544-eVu4 https://www.linkedin.com/posts/luciana-carvalho-fonseca-8360314_louise-michel-contos-e-lendas-ema-livros-activity-6883781886380908544-eVu4 https://www.linkedin.com/posts/luciana-carvalho-fonseca-8360314_louise-michel-contos-e-lendas-ema-livros-activity-6883781886380908544-eVu4 11 Não se trata de negar a importância de lutar por direitos e pelos espaços democráticos de decisão, mas de compreender que o deslocamento do reconhecimento do trabalho como o ato fundante da existência humana esvazia a relação entre as classes, nos deixando com a visão ofuscada em relação a construção da hegemonia da classe dominante. Sem o reconhecimento do que somos e de nossa identidade coletiva os elementos que geram propulsão às políticas sociais se esvai uma vez que as mesmas decorrem da “luta dos trabalhadores urbanos e rurais pela apropriação da riqueza socialmente produzida, sendo as demandas articuladas junto ao Estado e patronato que no enfrentamento da questão social, formulam as políticas sociais” (Raichelis, 2000, p. 60). Compreendido que o modo capitalista de produção não organiza somente a economia, mas também as relações, temos presenciado com destaque para o último período como o Estado burguês está sempre pronto para “reverter as formas democráticas em formas abertamente autocráticas, na medida em que seus interesses econômicos corporativos se vejam real ou potencialmente ameaçados” (Gramsci, 2007, p. 41-42 apud IASI 2019, p. 426). E assim temos percebido que a cada reforma vão nos esvaziando de nossa identidade de classe trabalhadora, vide a uberização, o pregão, o Home Care, a/o colaborador e outras formas de precarização do trabalho. Na luta cotidiana pela manutenção das nossas vidas a classe dominante, com seu acúmulo em transformar suas questões como algo universal, nos faz acreditar que a crise estrutural do capitalismo tem relação com o quanto o Estado aplica em políticas sociais, sendo essas mesmas uma alternativa do próprio para a mediação dos conflitos entre o capital e o trabalho. Na verdade, o que eles querem é se apropriar vorazmente do fundo público (Behring, 2021) que existe pela tributação das/os trabalhadores/as para atender necessidades comuns como: saúde, educação, proteção às crianças, adolescentes, jovens, idosos, mulheres, população LGBTQIA+, povo negro, povos originários e etc. É disso que este livro trata: dos desafios de pertencer à classe trabalhadora e estar à serviço das/os trabalhadores/as em espaços socio ocupacionais de mediação dos conflitos de classe. Certamente, ao “desenrolar o novelo” a/o leitor/a será convidado a refletir e também conhecer intervenções técnica-operativas alicerçadas em sólidos referenciais teórico-metodológico e ético-político. Muito tem sido feito e muito temos a fazer. A pandemia do Covid-19 já é em si um marco na história da humanidade visto sua gravidade e extensão, mas também é um acelerador da crise estrutural e de mudanças que estavam em curso. Contudo, não é sua causa. Daí que devemos concordar e nos unir ao Emicida quando diz: “É um mundo cão pra nóis, perder não é opção, certo?” 12 Vamos em frente, pois a história tem começo, mas não tem fim. Kênia A. Figueiredo Planalto Central do Brasil, 13/01/2022. Bibliografia BEHRING, Elaine Rossetti. Fundo Público. Valor e Política Social. 1.ed. São Paulo. Cortez Editora. 2021. BEHRING, Elaine Rossetti. SANTOS, Silvana Mara Morais dos. Questão social e direitos. In: CFESS/ABEPSS. Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. Brasília, 2009. IASSI, Mauro Luis. Cinco Teses sobre a formação brasileira (notas de estudos guiadas pelo pessimismo da razão e uma conclusão animada pelo otimismo da prática). Serv. Soc. Soc. (136) • Sep-Dec 2019. E-book. https://doi.org/10.1590/0101-6628.187. Acesso em 16/06/2021. NETTO, José Paulo. Transformações societárias e Serviço Social. Serviço Social e Sociedade, n. 50, ed. Cortez, São Paulo, 1996. RAICHELES, Rachel D. Desafios da gestão democrática das Políticas Sociais. In: Cfess/Abepss/Cead-UnB. Caderno de capacitação em Serviço Social e Política Social – Módulo 3. Brasília: UnB, 2000. 13 APRESENTAÇÃO O presente livro representa uma parte do conjunto de intencionalidades e esforços da Faculdade Alfa em contribuir com o desenvolvimento do nordeste mineiro. A instituição de ensino possui abrangência, ações, programas e projetos nos municípios de Aimorés, Almenara, Ataléia, Campanário, Capelinha, Catuji, Felisburgo, Franciscópolis, Inhapim, Itaipé, Ladainha, Padre Paraíso, Pavão, Ponto dos Volantes, Poté e Teófilo Otoni. A extensão promovida pela Faculdade Alfa é provocada a todo momento a estar sintonizada com a realidade local e regional, o que exige dos diversos sujeitos, implementar ações que ampliem e compartilhem os saberes produzidos dentro da instituição com o entorno. O conhecimento produzido e compartilhado com o público externo ao universo acadêmico, não só contribui para uma formação profissional do estudante, mas, sobretudo, para sua formação humanista, como um cidadão atuante no processo de transformação social.As novas configurações societárias e as particularidades do Vale do Mucuri, Jequitinhonha e região impõem novos desafios para uma instituição de ensino que está comprometida com uma formação superior de qualidade, e que, por este motivo, trabalha para formar profissionais qualificados que atuarão no mercado de trabalho com competência técnica, capazes de compreender e analisar as múltiplas expressões do contexto regional e local, sejam elas de ordem política, econômica, cultural, socioespacial e ambiental, para que possam atuar com a criatividade e com a resolutividade esperadas utilizando-se dos recursos e dos potenciais existentes na região. A Faculdade Alfa reconhece o Serviço Social como uma área que forma profissionais competentes para atuarem nos mais diversos espaços sócio-ocupacionais. O assistente social possui formação intelectual, crítica e rigorosa, capaz de utilizar um instrumental científico multidisciplinar das Ciências Humanas e Sociais para análise e intervenção nas diversas refrações da “questão social”. Esta profissão, e tem ganhado força e notoriedade na região tendo em vista a sua capacidade para intervir na realidade social desenvolvendo ações e estratégias de enfrentamento dos problemas sociais que afetam a vida da população. Com o crescimento da profissão na região, a instituição de ensino convidou profissionais acadêmicos, estudiosos da área para produzir uma coletânea de artigos sobre o Serviço Social e temas que são pertinentes a área. A publicação que ora apresentamos é fruto deste trabalho e da contribuição desses estudiosos que se dedicam em aprofundar seus conhecimentos sobre uma profissão em constante movimento de defesa, conservação e ampliação dos direitos sociais, culturais, econômicos e políticos. 14 A produção deste livro foi cuidadosamente organizada para proporcionar uma leitura crítica e reflexiva acerca de TEMAS CONTEMPORÂNEOS RELACIONADOS COM O SERVIÇO SOCIAL, os quais apontam para as consequentes alterações como aquelas que são perceptíveis no mundo do trabalho, bem como a relação da profissão com Estado, com a sociedade e com as políticas sociais. Os textos contribuem para refletirmos sobre a atuação profissional no contexto da pandemia da Covid-19, o que nos proporciona a compreensão do tempo presente. Esperamos que esta obra possa contribuir com os profissionais inseridos nas mais diversas áreas como: saúde, assistência social, educação, habitação, lazer, sociojurídico, dentre outros, e que assumem um importante trabalho de potencializar as ações de planejamento, gestão, administração e execução de programas, projetos e serviços, procurando romper com o imediatismo, com o tarefismo e com o senso comum tão prejudiciais à profissão. Esta obra é direcionada aos profissionais em formação e aos já “formados”, que pretendem continuar o seu processo de estudo e de aprendizado. O livro oferece contribuições para as reflexões voltadas para as políticas públicas e áreas correlatas. Entendemos que a formação permanente compreende o processo em que o sujeito desenvolve as capacidades de reflexão- crítica sobre sua prática pedagógica, superando concepções e posturas de um saber-fazer bancário para construir um saber-fazer que seja promotor das mudanças necessárias à sociedade. Como nos diz a Profa. Dra. Ana Maria de Vasconcelos, “É pelo conjunto da prática dos Assistentes Sociais que a profissão de Serviço Social é reconhecida ou não, valorizada ou não, respeitada ou não, conquistando sua autonomia ou não” (Vasconcelos, 2006, p. 245). Prof. Cristiano Costa de Carvalho Cidadão de Teófilo Otoni e assistente social. REFERÊNCIA VASCONCELOS, Ana Maria de. Serviço Social e Práticas Democráticas na Saúde. In Serviço Social e Saúde: Formação e trabalho profissional. ABEPSS/OPAS/OMS/MS/Cortez. 2006, p. 242 – 15 TEMAS EMERGENTES E O SERVIÇO SOCIAL 16 CRISE E CRÍTICA DA PANDEMIA DA COVID-19 E O SERVIÇO SOCIAL Marisaura dos Santos Cardoso Cristiano Costa de Carvalho Resumo: O artigo tem como objetivo discutir a crise da pandemia da COVID-19 e a crise atual da economia, expressões da contradição interna do modo de produção capitalista, trazendo elementos para refletirmos sobre o trabalho do assistente social. A pandemia que se alastrou em escala planetária é o acelerador da crise estrutural, mas não sua causa. O esgotamento estrutural do capitalismo iniciou-se em 1960, e as bibliografias revelam o quanto ele tem se empenhado para criar as condições adequadas, a fim de ampliar a superexploração dos trabalhadores, ao substituir trabalho vivo por trabalho morto. Como consequências deste movimento, têm-se a ampliação do exército industrial de reserva, a submissão da classe trabalhadora aos baixos salários, à instabilidade e à ausência de direitos. A pandemia encontrou um Brasil em crise, que retorna ao mapa da fome, congela gastos sociais e adota como mecanismos de combate à doença, a ignorância e o negacionismo. Isso tudo tem um preço, mas o que a população enfrenta, faz parte de um projeto de genocídio em massa. Esperamos que esta leitura contribua para evidenciar a lógica perversa e encarnada na dinâmica do capital mobilizando-o, à medida que o sofrimento e o desamparo se aprofundam. Como profissão que atua nas expressões da questão social, o assistente social tem sido afetado, não só pelos desafios enfrentados, mas pelas respostas profissionais, diante da escassez de políticas e da inoperância dos governantes, ante ao flagelo sofrido pela população, todos os dias. A pandemia só acentuou esse poço de tragédias e de profundas disparidades de classe, raça, etnia e gênero. Palavras-chaves: Crise do capitalismo. Pandemia da Covid-19. Mercado financeiro. Trabalho precarizado. Serviço Social. INTRODUÇÃO O ponto de partida para a reflexão que se propõe através deste artigo é a acumulação do capital em sua face mais aguda, as transformações históricas que fortalecem a vocação do capital para aprofundar o desenvolvimento desigual de classes e de nações, através da financeirização, para expandir os limites de acumulação e ampliar as margens de lucros das grandes corporações internacionais. O discurso neoliberal traduz as suas demandas em políticas a serem adotadas pelos Estados para benefício próprio, contrapondo-se a qualquer tipo de promoção do bem-estar social e de qualquer agente que tenha a intenção de implementá-la. O mercado das finanças tornou-se uma instância autônoma e o seu funcionamento e dominação conta com o efetivo respaldo do Estado e de grandes potências internacionais para avançar em seu empreendimento de geração de superlucros, sem o intermédio dos trabalhadores. CAPÍTULO 1 17 O trabalho é o mais afetado por essa dinâmica predatória do capital em crise estrutural, e a pandemia da COVID-19 apenas evidenciou de forma assustadora, o que já ocorre, como o sucateamento e a destruição das forças produtivas. Com ameaças à saúde pública, a COVID-19 está produzindo impactos econômicos e sociais graves que afetam os meios de subsistência e o bem-estar de bilhões de pessoas, produzindo mudanças de forma mais rápida e avassaladora, com isso, intensifica as graves consequências já existentes na vida dos trabalhadores e das trabalhadoras. O modelo econômico neoliberal sinaliza o seu fracasso, bem antes do aparecimento da COVID-19, mas no caso brasileiro, ele conta com total apoio dos últimos governos brasileiros, principalmente o de Michel Temer e o do ultraneoliberal Bolsonaro / Guedes. Ao reunir elementos para refletirmos sobre a dinâmica do capitalismo contemporâneo e suas determinações estruturais e conjunturais, pretendemos nos aproximar de um arguto panorama do que vem se processando no mundo do trabalho, em tempos de pandemia e de crise econômica,e os impactos para o trabalho de assistentes sociais. Buscamos apontar as mudanças promovidas no conteúdo e nas modalidades do trabalho profissional, ao desnudar os desafios e os dilemas vivenciados pelos profissionais, bem como as múltiplas expressões e determinações da precarização do trabalho profissional, no contexto atual. A ‘não crise’ da COVID-19 A crise provocada pela COVID-19, assim como outras situações de catástrofe, é concebida comumente como consequências causadas por fatores externos ao capitalismo. É habitual tratar doenças pandêmicas como causas puramente biológicas, de tal forma que elas são encaradas como algo natural e não uma disfunção de ordem social, econômica e política. Segundo o clarão da ideologia dominante, a presidente da Comissão Europeia, Úrsula von der Leyen, não foi a última a dizer que era preciso enfrentar um choque externo e simétrico que atinge empresas em bom estado e saúde. [...] Palavras semelhantes saíram da pena do economista francês Jean-Marc Daniel [...], para quem a dimensão endógena da recessão mundial doravante inevitável não tem importância. A queda da atividade se deve [...] a um choque exógeno (JAPPE et all, 2020, p. 32). Os defensores de uma visão exógena sobre a doença irão ressaltar que antes da COVID-19, a economia estava em bom estado de saúde e as causas da crise não têm ressonância na dinâmica do capitalismo. O objetivo desses defensores é afastar qualquer responsabilidade à “corrida tresloucada da economia”, e assim, blindar o sistema de qualquer crítica que possa afetar a ordem social (JAPPE et all, 2020, p. 32). Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 18 Para Jappe et all, (2020), as doenças e infecções virais são como todas, provocadas por fatores biológicos, entretanto, as pandemias são consequências da forma como a sociedade está organizada, pois “o biológico para a humanidade só existe embutido na trama das relações sociohistóricas. Isso porque o indivíduo não é exterior à sociedade [...] constitui-se nela e por ela” (p. 32). O que se observa, a partir da visão dos autores (2020), é que há uma consciência subjetiva do homem pós-moderno, que oculta os indivíduos do contexto social onde estão inseridos, que descontextualiza os problemas sociais, deslocando-os para o reino da biologia e da natureza. Dessa forma, a ordem social vigente está “isenta” de qualquer responsabilidade pelo surgimento dos problemas sociais. As epidemias são “grandes personagens da história”. Desde os primórdios, já havia uma forte relação entre elas e a vida social. O mesmo se pode afirmar da relação entre a COVID-19 e o capitalismo atual, uma vez que esta doença é um produto da vida social que o sustenta. O termo “catástrofe socionatural” é empregado pelos autores (2020) para denominar as relações entre o plano biológico e o social, para evocar as devastações relacionadas às mudanças climáticas e para designar o momento presente afetado por uma pandemia em escala mundial. O vírus é o detonador de uma bomba causadora do agravamento da crise estrutural global subjacente à contradição do capitalismo que adotou um regime de acumulação estruturado pela antecipação da produção de mais valor de futuro, por meio do endividamento generalizado, do vilipêndio dos trabalhadores, acentuados por uma crise sanitária que só acelerou esse processo. A pandemia despertou a figura do Estado que ressurge, após décadas de um neoliberalismo aparentemente exitoso. Muitos saudaram esse retorno. A pandemia mostrou de forma clara o caráter nefasto das políticas neoliberais com seus cortes implementados nos serviços públicos e nas políticas sociais, provocando o caos social, e milhares de mortos que se multiplicam todos os dias, por conta das condições precárias de hospitais e dos poucos aparatos de saúde pública (JAPPE et all, 2020). Nos termos dos autores, “O Leviatã ressurge, não apenas como o guardião da guerra de todos contra todos, mas como o único capaz de vencer a “guerra” contra o inimigo invisível [...]” (p. 12). Em vários países, os Estados assumiram o seu papel de administradores da crise e tomaram as medidas necessárias para salvaguardar a população, fortalecer a economia e garantir serviços de saúde para o enfrentamento da pandemia. A intervenção estatal, no contexto das duas crises, sanitária e econômica, dividiu opiniões como as daqueles que defendem “apaixonadamente”, o poder do Estado, sendo este, o único capaz de “salvar Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 19 vidas”. Já as opiniões contrárias a esta ideia criticam suas ações, pois elas obstaculizam o desenvolvimento econômico, desta feita, os contrários alinham-se aos fanáticos da economia “[...] para quem as mortes de pessoas contam menos do que as perdas da bolsa de valores [...]” (p. 12). É importante lembrar que o Estado e a economia exercem uma relação de complementaridade hostil. Ambos são parte de uma totalidade social que se orienta pela necessidade incessante de reprodução do capital, o qual encontra sua substância na força de trabalho para a manutenção do sistema de exploração, e por isso, é preciso garantir a vida de parte da população (JAPPE, et all, 2020). Os autores (2020) alertam para o fato de que boa parte dessa força de trabalho declina a cada avanço tecnológico, e a vida de homens e mulheres torna-se supérflua, um objeto a ser descartado. E é por tudo isso, que os acontecimentos recentes só podem ser compreendidos se inserirmos a “crise do vírus”, no contexto mais amplo do processo de crise do capitalismo que tem se confrontado com seus limites históricos internos, como: “a desvalorização do valor e a redução irreversível de parte do trabalho vivo”, e externos, como: “o esgotamento dos recursos naturais e a ameaça do colapso ambiental” (p. 13). O fato é que o capital fictício procura se salvar, quando ele se apropria daquilo que os autores chamam de “massa de valor futuro”, mas que não durará para sempre. Entretanto, na tentativa de manter em curso, a dinâmica de acumulação, os Estados têm assumido o setor privado na produção do capital fictício, já faz tempo. Ao se estabelecer em 2,4%, em 2019, a crise econômica global teve seu pior desempenho desde a crise financeira de 2008. O crescimento do PIB desacelerou-se em 90% em todo mundo, desde os países avançados até os emergentes. O próprio Fundo Monetário Internacional (FMI) criou uma expressão para denominar esse fenômeno do baixo crescimento de “desaceleração sincronizada” (JAPPE, et all, 2020, p. 21). A economia mundial, segundo os autores (2020), encontra-se em estado de deterioração no plano da acumulação real, e esse processo de crise não se iniciou, em 2020, sob efeito da crise dos subprimes. Essa crise econômica atual origina-se de uma contradição inerente ao próprio capitalismo. A compulsão pela produtividade é parte imanente da dinâmica do capitalismo e afeta toda cadeia produtiva. Presenciamos o esgotamento de um modelo que afasta massivamente da esfera de produção, a força de trabalho e explora ao máximo toda sua capacidade produtiva. Nas palavras dos autores, [...] o que solapa estrutural e irreversivelmente o capitalismo não é a baixa tendencial da taxa média de lucro [...], o que asfixia o capitalismo, é a diminuição absoluta do trabalho vivo implicado no processo de produção imediato e a consequente queda da massa de mais valor social [...] (p. 22). Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 20 Os mecanismos de compensação que foram utilizados nos “Trinta Anos Gloriosos” (1945-75) para equilibrar a expansão dos mercados e a redução do trabalho abstrato decorrente do aumento da produtividade não funcionam mais, desde o surgimento e o avanço da tecnologia e da informática no setor produtivo, substituindo mão de obra. Dessa forma, o nível de produtividade foi atingidoe o trabalho imediato implicado na produção enquanto a fonte que produz valor se esvai cada vez mais. O capital atinge seu limite interno de expropriação da mais valia (JAPPE, et all, 2020). A cada nível de produtividade, o capitalismo necessita cada vez menos de trabalho vivo, mesmo diante de uma quantidade crescente de riqueza. Por este motivo, o capitalismo substitui o trabalho humano em todos os setores da exploração empresarial, por tecnologias e maquinários, ele não tem mais outro caminho, devido a concorrência em que cada empresa tenta esmagar seu competidor com a redução do preço de mercadorias. Nas palavras dos autores, o capitalismo é como “uma sociedade autodestrutiva ou autofágica” (JAPPE, 2017 apud JAPPE, et all, 2020, p. 23). O processo fundamental de crise do capitalismo tornou-se um processo de “dessubstancialização” de sua própria substância (p. 23). Minado por sua própria contradição interna, a partir do fim dos anos de 1970, e sob a égide neoliberal, o capitalismo, para sobreviver, reestrutura-se em um novo regime de acumulação fundado na produção de capital fictício, em outros termos, na antecipação de uma produção futura de mais-valor, que ao final não será capaz de frear a compulsão do sistema. O mercado financeiro abdicou do papel clássico de combustível ou de agente impulsionador do capitalismo, para se tornar a sua entidade autorreferencial, o próprio motor de um regime de acumulação fictícia. Esta entidade acumula montanhas de títulos que chegam a termo por outras montanhas de títulos ainda maiores, para evitar um provável prejuízo que pode derruir seu investimento (JAPPE, et all, 2020). Desde os anos 1980, a economia neoliberal tem sido uma sucessão de bolhas de especulação e ondas de dívidas cada vez mais crescentes, mostrando o fracasso do modelo, quando neste mesmo período, a crise da dívida nocauteou o desenvolvimento em inúmeros países do Terceiro Mundo. Desde então, o capitalismo mundial vivenciou quatro ondas de dívidas (JAPPE, et all, 2020). As duas primeiras ondas ocorreram na América Latina e na Ásia. A terceira onda foi nos Estados e na Europa com a grande bolha especulativa das ações de alta tecnologia, a bolha “doctom” ou “ponto.com” que estourou em 2000. A política de baixa taxa de juros do Banco Central norte americano utilizada para amortecer os reflexos negativos da crise, desencadeou as circunstâncias para a crise imobiliária que estourou Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 21 em 2007-2008. A quarta onda para conter a crise provocada pela onda anterior fez com que os bancos centrais de vários países agissem como “bombeiros” para tentar conter a nova crise que se instaurou. Desde 2008, com o objetivo de retomar os rumos da economia, os Estados injetaram 15 trilhões a juros negativos em papéis da dívida, gerando um déficit orçamentário de enormes proporções. Os bancos centrais repassaram para o mercado financeiro, o “combustível necessário” para fortalecer e ampliar a sua capacidade de acumulação. “Essas políticas permitiram a formação de uma megabolha de liquidez que constituiu a base do desenvolvimento econômico, aparentemente estável da última década (JAPPE, et all, 2020, p. 25). O setor público tornou-se o multiplicador do capital fictício, e a megabolha estatal mundial amparou-se nas obrigações ou nos créditos acordados e fornecidos pelos governantes de vários países, fazendo do Estado um bom refúgio, pois o risco do mercado receber um calote é mínimo. A megabolha estatal sustenta-se na crença de que os Estados possuem capacidade de arrecadação quando a economia estiver em situação melhor no futuro (JAPPE, et all, 2020). As dívidas atuais do setor privado não são oriundas de empréstimos imobiliários ou hipotecas como foi em 2008. Elas são provenientes de empréstimos das próprias empresas que aumentaram o endividamento mundial em 322% do PIB global, no terceiro trimestre de 2019, com consequências alarmantes para o desenvolvimento dos países emergentes, que sofrem com as baixas taxas de crescimento. Parte da bolha das matérias-primas que explodiu, em 2015, refletiu negativamente nos países periféricos, como Brasil, que entraram em recessão e vivenciaram grandes perdas de capital, fazendo com que as crises cíclicas do capitalismo se constituíssem num problema sistêmico sem possibilidade de superação (JAPPE, et all, 2020). A crise do mercado financeiro vai refletir diretamente no mercado de trabalho o qual será impactado com a redução de força viva dos trabalhadores e trabalhadoras, substituída por máquinas e pela informatização que, a partir de então, desobrigam a produção de mercadorias da subordinação da habilidade operária para tornar-se uma aplicação da tecnologia e da informatização. As mudanças do trabalho na era do capitalismo digital e informacional A reestruturação produtiva permanente que se instaurou a partir da década de 1970, e se intensificou a partir de 2008, caracterizada pela expansão de redes de Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 22 subcontratações, salários flexíveis, células de produção, times de trabalho, trabalho polivalente e multifuncional, submete milhões de pessoas a ocupações intermitentes, esporádicas e eventuais e ao aumento do desemprego. Trabalhadoras e trabalhadores são vitimados por uma precarização ampliada e multiforme. Em vários setores, em especial, o setor de serviços em que se desenvolve uma rotina de alta rotatividade associada a pouca qualificação e a baixa remuneração da força de trabalho. Em contexto de crise e de recessão ocorre uma erosão devastadora dos empregos, uma corrosão e destruição dos direitos trabalhistas. Amplia-se o tempo de trabalho não pago e, sobretudo, com reformas trabalhistas, submete os trabalhadores às demandas de mercado. Para que possamos compreender como os processos de precarização estrutural do trabalho se desenvolveram no contexto brasileiro, é preciso apreender os principais significados da contrarreforma trabalhista em curso, num cenário de intensificação e aprofundamento do neoliberalismo e de sua reorganização produtiva (ANTUNES e PRAUN, 2020). No bojo da contrarreforma trabalhista implementada no Brasil, a partir de mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), alterando regras relativas ao contrato por tempo determinado, ampliou-se a terceirização dos trabalhadores que antes estava restrita às atividades-meio. As alterações do ponto de vista legal nas leis que regulamentam o trabalho produziram impactos qualitativos na estruturação e na dinâmica das relações de trabalho. Essas alterações incidem no nível e na composição dos empregos, afetando, de forma direta, a capacidade de mobilização e de organização sindical enfraquecendo os sindicatos ainda mais, para deixarem o caminho livre, sem resistência dos trabalhadores (ANTUNES e PRAUN, 2020). A segurança jurídica e de flexibilidade são noções que estão relacionadas em quatro dimensões da reforma trabalhista, e revelam o quanto elas correspondem à nova dinâmica do mercado, às finanças globais, aos impulsos da tecnologia da informação digital que invadiu o mundo da produção em seu sentido mais amplo. A primeira dimensão refere-se à “prevalência do negociado sobre o legislado”. Esta dimensão é a espinha dorsal da contrarreforma trabalhista, e ela abre caminho a uma ampla flexibilização das normas trabalhistas, por meio de acordos ou convenções coletivas, incluindo as situações nas quais passam a ser validados, os acordos individuais (p. 182). A instituição deste dispositivo viabiliza uma situação de alto desemprego e fechamento de postos de trabalho. Instituição de condições laborais cada vez mais rebaixadas e a legalização de formas ilegais nas relações trabalhistas. A prevalência do Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 23negociado sobre o legislado propicia às corporações mundiais acentuar a precarização do trabalho a condições que sejam compatíveis com a viabilização de superlucros, agora sob a égide da segurança jurídica instituída pela contrarreforma (ANTUNES e PRAUN, 2020). A segunda dimensão está relacionada à “supressão dos poros de não trabalho” nas jornadas de trabalho, contribuindo para a diminuição dos intervalos laborais e para ampliação da flexibilização do trabalho por meio dos “bancos de horas”. Este dispositivo favoreceu a aplicação de jornadas parciais adotadas através dos acordos individuais entre patrões e trabalhadores. Nessa mesma direção, diversificaram-se os vínculos contratuais com a introdução do trabalho intermitente que submete o trabalhador aos interesses das empresas, sem a garantia de que o trabalho terá durabilidade (ANTUNES e PRAUN, 2020, p.183). A Lei nº 13.467 de 2017 instituiu, em capítulo específico da CLT, sobre a modalidade do teletrabalho que pode ser realizado por meio de contrato por tempo determinado ou indeterminado. Geralmente, o teletrabalho é realizado fora das dependências da empresa, com uso de suporte tecnológico. Vale destacar que o capítulo II-A não detalha e nem regula questões básicas como as responsabilidades relativas a equipamentos tecnológicos e a infraestrutura necessária à execução da atividade profissional. O teletrabalho, no aspecto relativo à regulação da jornada diária não é mencionado na legislação, e as precauções a serem tomadas, a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho, por exemplo, ficam a cargo do trabalhador, conforme sustenta o artigo 75-E (ANTUNES e PRAUN, 2020). [...] a exclusão do teletrabalho do capítulo que regula a duração da jornada de trabalho [...] aponta, claramente, para a instituição do trabalho sem limites, sem direito à desconexão, alheio a qualquer proteção (ANTUNES e PRAUN, 2020, p. 185). Segundo os dois autores (2020), as alterações implementadas na legislação trabalhista brasileira buscam, portanto, instituir dispositivos “hiperflexibilizadores” das relações de trabalho e a heterogeneidade das formas de flexibilização convenientemente utilizadas, roubando o tempo do trabalhador dentro e fora das empresas, impondo-lhes ritmo, produtividade e intensidade de trabalho que são constantemente acentuados. Associa-se a esse cenário, o aparecimento de uma nova onda de mudanças tecnológicas que se manifestam na “Indústria 4.0” (p. 185). A terceira dimensão, segundo os autores (2020), diz respeito à “fragmentação, fragilização e restrição da capacidade coletiva de negociação” existentes, antes de 2017, mas que se acentuaram com as mudanças na legislação trabalhista. De um lado, essas mudanças almejam legalizar um conjunto de dispositivos que reforçam a flexibilização e a Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 24 precarização das relações de trabalho, bem como ampliam as mais variadas formas de contratação cada vez mais flexíveis e precarizadas da força de trabalho, proporcionando a fragmentação da classe trabalhadora e a desestruturação efetiva das forças sindicais (p. 187). A quarta dimensão diz respeito aos distintos mecanismos que inviabilizam o acesso dos trabalhadores e trabalhadoras à Justiça do trabalho. A segurança jurídica para o empresariado viabiliza-se pela tentativa de impedir o acesso dos trabalhadores e das trabalhadoras ao recurso jurídico, o que favorece a desresponsabilização da classe patronal e a “burla dos direitos trabalhistas”. Tais mecanismos caminham na contramão da “noção do direito de acesso à justiça, como direito fundamental, condição e possibilidade do próprio exercício de direitos sociais” (ANTUNES e PRAUN, 2020, p. 188). O advento das tecnologias da informação e comunicação (TIC) e a especialização e flexibilização das relações de trabalho não lograram a tão prometida era auspiciosa por seus defensores. Pelo contrário, presenciamos a precarização paulatina do trabalho, intensificada de forma drástica com a crise estrutural de 2008, generalizando a supressão dos direitos a grande parte dos trabalhadores. O trabalho reconfigurou-se com os avanços dessas novas tecnologias digitais, da inteligência artificial e da chamada “Indústria 4.0”. A flexibilização deixa transparecer a sua essência que abriga uma gama de novas e velhas formas de exploração da força de trabalho. A “Indústria 4.0” é um conjunto de propostas tecnológicas de produção que faz parte de uma política econômica, científica e tecnológica que reage ante à redução da participação da indústria manufatureira no produto interno bruto dos países capitalistas centrais, tendo em vista os menores índices de investimento em bens de capital com impactos negativos à balança comercial de seus produtos (PINTO, 2020). A crise dos subprimes que se iniciou nos Estados Unidos, 2007, agravou o quadro regressivo das indústrias manufatureiras, provocando a emersão de plataformas que sob a orientação de entidades públicas e privadas passam a ser implementadas no setor produtivo. A Indústria 4.0 origina-se, na Alemanha, a partir de iniciativas governamentais para o desenvolvimento de alta tecnologia de produção de bens de consumo: big data, internet das coisas, inteligência artificial e muito mais. Ela engloba automação e a tecnologia da informação, além das principais inovações tecnológicas desses campos (PINTO, 2020). A indústria 4.0 dá um salto tecnológico ao elevar automação no setor produtivo à máxima potência, permitindo aos robôs desempenharem funções cada vez mais complexas, e aos algoritmos fazerem com que as máquinas analisem dados em uma Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 25 velocidade sobrehumana, tornando a tecnologia industrial mais rápida, inteligente e precisa. O termo indústria 4.0 surgiu de um projeto de um grupo de trabalho presidido por Siegfried Dais e Henning Kagermann, que em 2012, apresentaram um relatório de recomendações para o governo alemão, planejando a implementação e desenvolvimento do que chamaram de indústria 4.0. Segundo este grupo, o projeto está alicerçado em seis princípios tais como: Tempo real que está relacionado com a capacidade de coleta e tratamento de dados de forma instantânea, permitindo uma tomada de decisão qualificada em tempo real. Virtualização que se trata de uma reprodução virtual do ambiente fabril, só que mais inteligente graças aos sensores espalhados em toda a planta para rastrear e monitorar de forma remota todos os seus processos. Descentralização diz respeito à ideia de que a máquina é responsável pela tomada de decisão, devido à sua capacidade de autoajuste e avaliação das necessidades da fábrica em tempo real, fornecendo informações sobre seus ciclos de trabalho. Orientação a serviços está relacionada a um conceito em que softwares são orientados a disponibilizarem soluções como serviços conectados com toda a indústria. Modularidade diz respeito a uma estruturação das fábricas, em módulos, de forma que eles sejam acoplados e desacoplados segundo a demanda fabril, oferecendo mais flexibilidade na condução das tarefas laborais. Interoperabilidade que diz respeito à capacidade das empresas para se comunicarem entre si. (FIA, 2020). Segundo Pinto (2020) a Indústria 4.0 sugere padrões de tecnologias, modelos e referências que orientem políticas tecnológicas ao país. Um estudo de Tommaso Pardi, Martin Krzywdzinski e Boy Luethje, citado pelo autor (2020), ressalta que, de uma perspectiva política, a Indústria 4.0 é uma campanha para mobilizar fundos públicos significativos e investimentos privados para a modernização e inovação tecnológica. Uma motivação importante [...] é a percepção de que a Alemanha é forte na manufatura, mas no campo das tecnologias da informação sofre a ameaça de ficar para trás dos Estados Unidos, além de países como a China (PINTO,2020, p. 198). A preocupação desses estudiosos é com a necessidade do governo alemão atentar-se para o desenvolvimento de estratégias de promoção do avanço tecnológico no setor produtivo, para que o setor industrial deste país possa competir com os demais países, a partir do conhecimento avançado que possui sobre manufatura combinado com as tecnologias de informação (TI). Portanto, tem-se no horizonte alemão, a criação de fábricas inteligentes, as “smart factories” estruturadas através de sistemas “ciberfísicos” com alto nível de autorregulação da automação do trabalho humano, tanto o manual, Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 26 quanto o intelectual, através da “internet of things” (IoT)2 – internet das coisas – que permite às empresas uma conexão em rede entre diferentes máquinas e componentes com a integração da TI, possibilitando, ainda, a coleta, a organização e a análise de dados, e processos de produção em tempo virtualmente real. Do ponto de vista da assistência, os novos sistemas, dotam de processamento computacional e conexão à internet, os equipamentos como tablets e celulares, relógios e luvas, (Smart watches3, Smart glovers4, etc), fornecendo informações aos trabalhadores durante as jornadas de trabalho (PINTO, 2020). Na esteira da Indústria 4.0, o trabalho uberizado cresce de forma assustadora, com surgimento das plataformas digitais de trabalho, e produz oportunidades de lucros, cada vez maiores, para as empresas de aplicativos, e na outra ponta iceberg, a precarização e a baixa aquisição de renda, sem garantias, nem estabilidades aos trabalhadores e às trabalhadoras. As plataformas digitais de trabalho quintuplicaram-se, em todo o mundo, na última década, segundo o último relatório: “World Employment and Social Outlook. The role of digital labour platforms in transforming the world of work” da Organização Internacional do Trabalho (OIT). De acordo com o relatório, as plataformas digitais oferecem novas oportunidades de trabalho, para homens, mulheres, pessoas com deficiência, jovens e pessoas marginalizadas pelo mercado de trabalho tradicional. Elas permitem que as empresas tenham acesso a uma força de trabalho ampla, flexível e com habilidades variadas, enquanto expandem sua base de clientes. A ideia de liberdade e flexibilidade propagadas pelas empresas de aplicativos (trabalhar quando e onde quiser) constitui na transferência deliberada dos riscos para aumentar o controle sobre a força de trabalho, “pois essa liberdade significa ausência de salário garantido e do incremento de custos fixos que se convertem em responsabilidade dos trabalhadores” (ANTUNES e FILGUEIRAS, 2020, p 66). O relatório menciona dois tipos principais de plataformas digitais de trabalho: as plataformas online baseadas na web, nas quais as tarefas são realizadas online e 2 A internet das coisas, também conhecida pela sigla IoT (de Internet of Things), é um conceito que trata da conexão de aparelhos físicos à rede. Não se trata de ter mais dispositivos para acessar a internet, mas sim a hiperconectividade ajudando a melhorar o uso dos objetos. Isso acontece dentro das residências (televisão, ar condicionado, geladeira e campainha conectados, por exemplo), mas também nas indústrias, com máquinas gerando relatórios instantâneos de produção para o software de gestão na nuvem. ³ Smart watch é o nome dado para um relógio inteligente, ou seja, um aparelho que mistura a aparência de um relógio de pulso tradicional com as funcionalidades de um smartphone. Em inglês, smart watch é a junção de duas palavras distintas: smart, que significa “inteligente”, e watch, que quer dizer “relógio”. ids ds Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 4 Smart glovers: as luvas que tratam das frieiras e da osteoartrose. À primeira vista são luvas normais. Mas as smart glovers têm no interior, incluem uma tecnologia de aquecimento automático que as transformam numa solução eficaz e mais económica para o tratamento de pessoas com osteoartrose e frieiras. 27 remotamente por trabalhadores e trabalhadoras, e as plataformas baseadas em localização, nas quais as pessoas, como motoristas de táxi ou entregadores, realizam o trabalho em uma localização geográfica específica. Os principais desafios para os seus trabalhadores estão relacionados às condições e à regularidade do trabalho e da renda, bem como à impossibilidade de usufruir dos direitos à proteção social, liberdade de associação e negociação coletiva. Além disso, a jornada de trabalho costuma ser longa e imprevisível. Metade dos trabalhadores de plataforma digital ganha menos de dois dólares americanos por hora. Existem diferenças salariais perceptíveis em algumas plataformas. O relatório destaca que a pandemia de COVID-19 pôs ainda mais em evidência muitos desses problemas como a concorrência desleal, a falta de transparência sobre dados e preços, as altas taxas de comissão, e a dificuldade das pequenas e médias empresas (PMEs) para terem acesso ao financiamento e à infraestrutura digital. As novas oportunidades criadas pelas plataformas digitais de trabalho estão apagando ainda mais a distinção antes bem definida entre empregados e autônomos. As condições de trabalho dependem em grande medida dos termos de contrato de serviço, que muitas vezes são determinados unilateralmente. Cada vez mais, os algoritmos estão substituindo os humanos na alocação, na avaliação do trabalho e na administração e monitoramento de trabalhadores. O relatório aponta para a necessidade de políticas coerentes e coordenadas frente ao fato de que as plataformas operam em diferentes jurisdições, a fim de garantir que elas ofereçam oportunidades de trabalho decente e impulsionem o crescimento de empresas sustentáveis. O trabalho tem sido agravado nestes últimos tempos e com o surgimento da COVID-19, suas consequências são cada vez mais drásticas. A crise pandêmica por muitos é defendido como causadora de uma crise estrutural da economia. Grupos ligados aos grandes setores econômicos e o mercado financeiro, atribuem à doença uma causa natural. A crise da COVID-19 é provocada pela dinâmica destrutiva do capital, o trabalho e os trabalhadores, bem como toda a população são os maiores impactados. As grandes corporações tendem a superar essas crises, mas o rastro de miséria e pobreza que deixam pelo caminho afeta a vida dos indivíduos mais vulneráveis. Na queda de braço com o capital, os trabalhadores serão os mais prejudicados e o Serviço Social não está protegido das refrações provocadas pela crise. Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social https://www.ilo.org/brasilia/temas/covid-19/lang--pt/index.htm https://www.ilo.org/brasilia/temas/covid-19/lang--pt/index.htm 28 Serviço Social e Coronavírus As principais estratégias neoliberais de enfrentamento das crises que se aprofundam, há pelo menos quatro décadas, provocam a corrosão ampliada da regulamentação das relações de trabalho, em favor de um trabalho precário e desregulamentado. Com a reestruturação do mercado de trabalho, reduz-se o número de trabalhadores contratados, amplia-se o desemprego estrutural, e deteriora-se a qualidade do trabalho, dos salários e das condições em que ele é exercido. Segundo Raichéllis (2019), o que estamos vivenciando, é a pejotização do trabalho, que desponta como modalidade de contratação sem vínculo empregatício tradicional, mas através da constituição de pessoa jurídica pelo trabalhador, com isso, descaracterizam-se as relações do emprego formal e desrespeita-se a legislação trabalhista. A uberização organiza e remunera a força de trabalho, e distancia-se da regularidade do salário formal e das garantias trabalhistas. Trata-se de uma contratação direta sem garantias sociais e com forte cultura de competição entre os ‘colaboradores’ em benefício das empresasde aplicativos. No mercado de trabalho do Serviço Social, cresce o número de profissionais subcontratados para exercerem um trabalho individualizado. Os assistentes sociais são contratados para prestarem serviço por intermédio de empresas de serviços ou de assessoria, de organizações não governamentais, de (falsas) cooperativas de trabalhadores para prestarem serviços aos Estados, especialmente em âmbito local, configurando o trabalho profissional privado e autônomo. Raichellis (2019) destaca, a ampliação das parcerias público-privadas no âmbito das políticas sociais e da terceirização dos serviços públicos, através da subcontratação de instituições ou empresas que intermediam a relação com a contratante. Os trabalhadores públicos, inclusive os assistentes sociais, são afetados por uma lógica gerencialista que enquadra os processos de trabalho a uma dinâmica direcionada ao cumprimento de metas e de produtividade, esvaziando do trabalho o seu conteúdo. O gerencialismo enquanto ideologia de gestão do capital ganha espaço e estrutura as relações de trabalho entre empregadores e trabalhadores. O Estado como um agente público insere-se nessa dinâmica a partir do momento que ele adota regras empresariais da “governança público- privada” (p. 53). Este modelo gerencial estimula o assalariado a trabalhar com dispêndio máximo de suas energias, em troca de incentivos, sob a crença de que essas medidas resolvem o problema da ineficiência do Estado e aprimoram os processos de trabalho nos órgãos e setores públicos. O servidor público perde suas garantias trabalhistas, submete-se a Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 29 diferentes modalidades de contratação mais precárias, menos regulamentadas e com salários mais baixos (Raichellis, 2019). Segundo a autora (2019), a flexibilização da jornada de trabalho e dos vínculos contratuais, a terceirização e a subcontratação de novos trabalhadores contribuem para deteriorar ainda mais os serviços prestados à população. O trabalho do assistente social não está isento dessa dinâmica racionalizadora imposta pelo gerencialismo que se introduziu na esfera estatal. Como consequência disto, a autora (2019) destaca a existência de uma tendência crescente de padronização dos processos interventivos apoiada pelas tecnologias e pela informatização. A intensificação do trabalho profissional que impõem aos assistentes sociais mais ritmo e velocidade na execução de tarefas que demandam tempo e que se desdobram em outras estratégias. O intuito é mensurar a qualidade do trabalho profissional pela eficiência nas tarefas que são desempenhadas, sem levar em consideração que o trabalho do assistente social é de outra natureza, por ser mais processual, as métricas utilizadas para o controle da eficiência no desempenho profissional, não se relaciona e não mensura o impacto que seu trabalho produz, na vida dos inidivíduos. Além disso, não podemos deixar de mencionar, que está sendo incorporada nos processos de trabalho, a polivalência e a lógica da produção multitarefas com cobranças de produtividade e de responsabilidade. O novo Coronavírus tem emergido questões relativas ao trabalho do assistente social, não só aquelas relacionadas à sua condição de trabalhador assalariado suscetível aos reflexos que afetam o mundo do trabalho e a classe trabalhadora, mas também, aos aspectos que se referem às especificidades, competências e o compromisso ético-político dessa profissão. A pandemia acelerou o processo de entrada das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) no trabalho profissional de assistentes sociais, e esse novo recurso desafia a profissão, pois produz impactos no trabalho profissional, em sua relação com os usuários e nas condições éticas e técnicas, no sigilo e proteção das informações. O teletrabalho que incorpora o exercício profissional indica três pontos que precisam ser discutidos no âmbito da profissão: segurança do trabalhador e da população atendida, o dilema do acesso aos direitos pela população, e a avaliação das condições éticas e técnicas no contexto do teletrabalho. A segurança e a proteção de dados e o sigilo do atendimento são desafios do trabalho profissional que a inovação tecnológica não está totalmente preparada para enfrentar. A nota técnica do Conselho Federal de Serviço Social, que trata do Teletrabalho e Teleperícia dá outras orientações para assistentes sociais no contexto da Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 30 pandemia e problematiza os limites da tecnologia no trabalho do assistente social, principalmente no que tange as condições éticas e técnicas, mas não só isso (CFESS, 2020). O acesso aos direitos e serviços fica limitado, uma vez que as barreiras socioeconômicas, geracionais, comunicacionais dificultam a posse e o manejo de ferramentas tecnológicas para vários segmentos da população. A falsa impressão de que todos os indivíduos possuem dispositivo com acesso à internet, produz a falácia em torno da universalização de acesso às TICs. O público que é atendido por assistentes sociais integra uma massa da população que têm dificuldade para acessar recursos tecnológicos e, por conseguinte, muitos deles, não têm acesso aos serviços socioassistenciais de maneira remota. Nas situações em que há impossibilidade do atendimento remoto, cabe a reflexão sobre a necessidade do atendimento presencial, tomadas todas as medidas de segurança sanitária. A nota chama a atenção para o nosso compromisso com valores e princípios éticos em um contexto de ataque aos direitos e à vida. Para isso, as normativas da profissão oferecem os insumos necessários para que os assistentes sociais planejem e executem suas atividades, sem colocar em risco a sua vida e a dos inidvíduos com os quais trabalham. (CFESS, 2020). Sobre as condições de saúde dos trabalhadores, é importante ressaltar que as estratégias de intensificação do trabalho no contexto do neoliberalismo ocorrem de forma gradativa e ganham materialidade, à medida que o trabalho se precariza e o trabalhador perde sua estabilidade para fazer reivindicações. Os malefícios desse processo refletem na vida e na saúde dos profissionais, gerando um desgaste físico, emocional e intelectual. Vicente (2019) frisa que o desgaste proveniente do consumo dos corpos e dos potenciais psíquicos, pelo processo de trabalho e pelos constrangimentos a ele vinculados, leva a perda das capacidades corporais e psíquicas do trabalhador. Ela continua, ao destacar os vários agravos que o acometem como: “alteração do sono, apetite e humor, [...] síndrome de burnout, dependências químicas, depressão e suicídio” (p. 132). Tais agravos são experiências típicas de uma forma de organização do trabalho que provoca o esvaziamento significativo do seu conteúdo, potencializando a geração de sofrimento e de vivência depressiva. A vivência depressiva produz segundo a autora (2019) sentimentos de indignidade, inutilidade e desqualificação. Isso amplia a sensação de cansaço, pois exige um esforço de vontade ainda maior para desempenhar uma tarefa sem investimento material e/ou afetivo, alimentando uma “sensação de adoecimento intelectual, de anquilose mental, de Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 31 paralisia da imaginação e marca o triunfo do condicionamento ao comportamento produtivo” (DEJOURS, 1991 apud VICENTE, 2019, p. 141). Com a precarização das relações de trabalho instaura-se o medo e a insegurança, o ressentimento e o desconforto provocados pela instabilidade. Para a autora (2019), o trabalhador se sente um fardo a se arrastar diariamente, além de se sentir prejudicado nas relações pessoais, familiares e no âmbito da afetividade. Situações como as que foram apresentadas por Vicente são agravadas no contexto atípico da pandemia da COVID-19, quando todas as situaçõesde precarização são agudizadas pela crise sanitária afetando os profissionais em todas as suas dimensões. E tudo isso gera o isolamento, a apatia e o adoecimento. Seguindo sua linha de raciocínio, fica claro, portanto, que a pandemia está nos mostrando o quanto alguns fatores de ordem socioeconômica, psicológica e biológica podem colocar em risco, o nível de saúde mental de indivíduos e grupos. Situações como as rápidas mudanças sociais, a perda de laços sociais ou familiares, as condições de trabalho estressantes, a instabilidade e a precarização, a discriminação e a exclusão social, a violência e a violação de direitos, e as pressões socioeconômicas contínuas, expressam-se de maneira contundente e reforçam as incertezas e provoca instabilidade do trabalhador. O acúmulo de demandas, o isolamento, o afastamento dos entes queridos, o luto, a falta de estrutura para o trabalho remoto ou a falta de equipamento para o trabalho presencial agravam ainda mais as condições do trabalhador e compromete a qualidade do seu trabalho. Fica evidente, o quanto é necessária a mobilização e a articulação da classe trabalhadora juntamente com as forças progressistas que coadunam com o mesmo projeto societário. Mas para isso, precisamos compreender que a luta não é individual. Os desafios que estão presentes e se intensificam na pandemia, inserem-se num projeto político de sucateamento dos trabalhadores, de destruição das conquistas trabalhistas e de deterioração das condições de vida, de saúde e da dignidade humana. CONSIDERAÇÕES FINAIS O debate ora realizado não esgota as questões complexas que envolvem a crise econômica estrutural e a crise provocada pela pandemia, mas elucida aspectos que relacionam essas duas crises como a organização social segundo a lógica do capitalismo como sua fonte e origem, de tal sorte que não foi a pandemia a causadora da crise econômica, mas é a dinâmica contraditória do capital que manifestou, através da pandemia, a sua face mais perversa. Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social 32 O processo de reestruturação da produção do capital financeiro, por muito tempo, mostra um fracasso anunciado com consequências sem precedentes. A nova forma de acumulação e de flexibilização dos mercados, das relações de trabalho e dos direitos são como nos diz Raichéllis (2019), a sua expressão mais emblemática. As mudanças estruturais do trabalho assalariado impactaram na materialidade e na subjetividade dos trabalhadores, Antunes (2020) diz que o trabalho está se ‘desantropomorfizando’, em outras palavras, o trabalho sofre mudanças estruturais radicais em seu modo de produção. Regido por máquinas e algoritmos, esse novo modelo reduz quantitativamente e qualitativamente o trabalho vivo, de tal sorte, que a classe trabalhadora tornou-se item supérfluo para o capital, e isso se reflete em toda a cadeia produtiva e afeta as profissões. Contudo, o projeto ético-político do Serviço Social brasileiro assume uma função estratégica na articulação e na organização da categoria profissional, buscando a unidade política com outras forças sociais, o que abre as possibilidades para o fortalecimento e resistências diante da ordem social do capital e as estratégias a serem efetivadas estão presentes na luta coletiva dos trabalhadores e trabalhadoras. REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo e FILGEIRAS, Vitor. Plataformas digitais, uberização do trabalho e regulação no capitalismo contemporãneo. In.: ANTUNES, Ricardo (org.) Uberização, Trabalho Digital e Indústria 4.0. São Paulo: Editora Boitempo, 2020, p. 59-78. ANTUNES, Ricardo e PRAUN, Luci. A demolição dos direitos do trabalho na era do capitalismo informacional-digital. In.: ANTUNES, Ricardo (org.) Uberização, Trabalho Digital e Indústria 4.0. São Paulo: Editora Boitempo, 2020, p. 179-192. Fundação Instituto de Administração (FIA). Indústria 4.0: o que é, consequências, impactos positivos e negativos [Guia Completo]. Publicado em 11 nov. 2020. Disponível em: https://fia.com.br/blog/industria-4-0/. Acesso em 25 mar. 2021. JAPPE, Anselm.; AUMERCIER, Sandrine.; HOMS, Clément e ZACARIAS, Gabriel. Capitalismo em quarentena: notas obre a crise global. São Paulo. Editora Elefante. 2020. Nota Técnica do Conselho Federal de Serviço Social (CFESS). Teletrabalho e Teleperícia: orientações para assistentes sociais no contexto da pandemia. Distrito Federal. 2020. PINTO, Geraldo Augusto. A Indústria 4.0 na cadeia automotiva: A Mercedes-Benz em São Bernardo do Campo. In.: ANTUNES, Ricardo (org.) Uberização, Trabalho Digital e Indústria 4.0. São Paulo: Editora Boitempo, 2020, p. 193-216. RAICHELLIS, Raquel. Serviço Social: trabalho e profissão na trama do capitalismo contemporâneo. In.: RAICHELLIS, Raquel; VICENTE, Damares e ALBUQUERQUE, Valéria (orgs). A nova morfologia do trabalho no Serviço Social. 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Crise e crítica da pandemia da COVID-19 e o serviço social https://fia.com.br/blog/industria-4-0/ 33 APROXIMAÇÕES TEÓRICAS SOBRE FLUXOS MIGRATÓRIOS MOTIVADOS PELO ENSINO SUPERIOR E OS REFLEXOS DA CRISE SANITÁRIA PROVOCADA PELA COVID-19: BRASIL-PORTUGAL Fabrícia Cristina de Castro Maciel Resumo: O objetivo deste artigo é alargar os conhecimentos sobre os processos migratórios e analisar os possíveis efeitos da crise sanitária provocada pela COVID-19 sobre as imigrações motivadas pelo interesse na formação em ensino superior. Coloca-se em evidência a relação Brasil-Portugal, a considerar a distância, seja pela perspetiva geográfica/territorial, seja pela estratégia do uso de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs). A investigação perpassa a metodologia de tipo bibliográfico e documental, circunscrevendo uma natureza qualitativa. O artigo se estrutura em quatro tópicos, a identificar as teorias sobre os fluxos migratórios, as aproximações e nexos entre os aspetos Gerais do processo de mundialização do sistema do capital e as experiências imigratórias para ascender ao ensino superior. Palavras-chave: globalização; migrações (fluxos, imigração e emigração); Estado, diretos de cidadania; educação superior. INTRODUÇÃO A crise sanitária provocada pela COVID-19 alterou de forma substantiva a realidade social e econômica do conjunto da população mundial. Este artigo pretende analisar os possíveis efeitos desta crise nos fluxos migratórios originados do interesse na formação em ensino superior, pela perspetiva geográfica/territorial, bem como pela estratégia do uso de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs). A investigação desta temática justifica-se tendo em vista tanto as medidas governamentais relacionadas os aspectos de mobilidade das populações, bem como o agravamento da crise econômica, influenciando os movimentos de estudantes que buscam uma formação superior em países diferentes de suas origens. Este breve artigo estrutura-se em quatro tópicos, a apresentar uma feição de análise da realidade social a partir da totalidade (dimensão global) para alcançar a CAPÍTULO 2 34 singularidade em questão que se pretendeu apreender. As aproximações e nexos entre o universal (os aspetos Gerais do processo de mundialização do sistema do capital) e o singular (neste caso, as experiências imigratórias no sentido de ascender ensino superior) são marcadas pelas mediações que compõem a particularidade das condições
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