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INTERPRETAÇÃO PRÉ-VESTIBULAR 85PROENEM.COM.BR FIGURAS DE LINGUAGEM II: FIGURAS DE CONSTRUÇÃO E DE HARMONIA09 FIGURAS DE CONSTRUÇÃO OU DE SINTAXE As figuras de sintaxe caracterizam-se por alterarem de alguma maneira as regras tradicionais da Gramática, isto é, a coesão normativa é substituída por uma coesão significativa, condicionada pelo contexto geral e pela situação, em busca de maior expressividade. Com isso, encontraremos repetições de termos, inversão de elementos, discordância entre outras modificações. Podemos classificá-las em grupos: 1. por repetição 2. por omissão 3. transposição 4. discordância FIGURAS DE CONSTRUÇÃO POR REPETIÇÃO Anáfora - é a repetição de um termo ao início de versos ou frases. “Tudo é silêncio, tudo (é) calma, tudo (é) mudez” Olavo Bilac Pleonasmo - repetição desnecessária de um termo já expresso, com valor enfático. Note que tal repetição tem de apresentar valor estilístico, do contrário será considerado vicioso. Podemos ainda dividir o pleonasmo em sintático e semântico. 1. Pleonasmo sintático - É a repetição de um termo da oração, normalmente por referência pronominal. “A mim, não me agradam tais comentários” 2. Pleonasmo semântico - Consiste na repetição das ideias presentes nos termos. “Sonhei que estava sonhando um sonho sonhado” Martinho da Vila Polissíndeto - emprego reiterado de conectivos entre elemen- tos coordenados. “Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua” Olavo Bilac FIGURAS DE CONSTRUÇÃO POR OMISSÃO Assíndeto - omissão do conectivo entre termos coordenados. “A barca vinha perto, chegou, atracou, entramos.” Machado de Assis Elipse - omissão de um termo da oração, facilmente percebido pelo contexto. Um cavalheiro. Até na miséria, um cavalheiro. Faltei à prova. Zeugma - tipo de elipse em que um termo participa de duas ou mais orações, porém só aparece em uma única vez. Eu fiz uma parte, Antônio fez outra e Sueli fez a última. FIGURAS DE CONSTRUÇÃO POR TRANSPOSIÇÃO Hipérbato - inversão da ordem natural das palavras na oração ou da ordem das orações no período. Existe, então, a introdução de uma expressão no interior de outro sintagma. Também é chamada de “inversão”. “A casa, torno a ver, em que moramos” Prolepse (ou Antecipação) - deslocamento de um termo do interior de uma oração para o início do período. “Os pastores parece que vivem no fim do mundo.” (Parece que os pastores vivem no fim do mundo) “Prima Justina creio que se levantou.” (Creio que prima Justina se levantou) FIGURAS DE CONSTRUÇÃO POR DISCORDÂNCIA Anacoluto - introdução aleatória de um termo sem qualquer função sintática dentro da oração. “Bom! Bom! Eu parece-me que ainda não ofendi ninguém!” José Régio Hipálage - transposição de uma virtude própria de determinado termo para outro integrante da oração. “As lojas loquazes dos barbeiros” (Loquazes, que tem o sentido de “falantes”, refere-se aos barbeiros, não às lojas.) Silepse - concordância estabelecida ideologicamente, contra- riando a norma gramatical. São de três tipos: 1. Silepse de gênero - concordância ideológica com a pessoa referida e não com a exigência do termo. “Senhor Presidente, Vossa Excelência parece cansado.” 2. Silepse de número - concordância ideológica com o número (singular ou plural), contrariando o número do termo referido. “A multidão ouvia com atenção. Ao final, aplaudiram.” 1. Silepse de pessoa - concordância ideológica com uma pessoa diferente da expressa na oração. “Todos entramos imediatamente” “no fundo a gente se consolava, pensávamos em nós mesmos.” Autran Dourado PRÉ-VESTIBULARPROENEM.COM.BR86 INTERPRETAÇÃO 09 FIGURAS DE LINGUAGEM II: FIGURAS DE CONSTRUÇÃO E DE HARMONIA FIGURAS DE HARMONIA Aliteração - é a incidência expressiva de fonemas consonantais idênticos. “Me deixa ser teu escracho capacho, teu cacho, riacho de amor...” Chico Buarque Assonância - é a repetição de sílabas ou vogais idênticas. “Duma nuança mansa que não cansa” E. Perneta Onomatopeia - quando o vocábulo busca reproduzir o próprio som ou ruído de objeto representado. “Sino de Belém, como soa bem! Sino de Belém bate bem-bem-bem.” Manuel Bandeira Paronomásia - consiste no emprego, ao final ou no interior dos versos, de vocábulos parônimos. “Por todo o dia um certo verde um inseto verde o incerto ver-te” Ramos Filho PROTREINO EXERCÍCIOS 01. Conceitue as três figuras de construção por omissão. 02. Cite duas figuras de construção por repetição. 03. Identifique os grupos pertencentes às figuras de construção ou sintaxe. 04. Conceitue duas figuras de harmonia. 05. Identifique quantos e quais são os grupos de silepse. PROPOSTOS EXERCÍCIOS 01. (IBMEC-RJ) Joaquim Maria Machado de Assis é cronista, contista, dramaturgo, jornalista, poeta, novelista, romancista, crítico e ensaísta. Em 2008, comemora-se o centenário de sua morte, ocorrida em setembro de 1908. Machado de Assis é considerado o mais canônico escritor da Literatura Brasileira e deixou uma rica produção literária composta de textos dos mais variados gêneros, em que se destacam o conto e o romance. Segue o texto desse autor, em poesia. À Carolina Querida! Ao pé do leito derradeiro, em que descansas desta longa vida, aqui venho e virei, pobre querida, trazer-te o coração de companheiro. Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro que, a despeito de toda a humana lida, fez a nossa existência apetecida e num recanto pôs um mundo inteiro... Trago-te flores - restos arrancados da terra que nos viu passar unidos e ora mortos nos deixa e separados; que eu, se tenho, nos olhos mal feridos, pensamentos de vida formulados, são pensamentos idos e vividos. “E num recanto pôs um mundo inteiro.” (verso 8). Observamos no verso destacado as seguintes figuras de linguagem: a) Metonímia e hipérbato. b) Hipérbato e hipérbole. c) Hipérbole e pleonasmo. d) Pleonasmo e anáfora. e) Personificação e pleonasmo. 02. (ENEM) Canção do vento e da minha vida O vento varria as folhas, O vento varria os frutos, O vento varria as flores... E a minha vida ficava Cada vez mais cheia De frutos, de flores, de folhas. [...] O vento varria os sonhos E varria as amizades... O vento varria as mulheres... E a minha vida ficava Cada vez mais cheia De afetos e de mulheres. O vento varria os meses E varria os teus sorrisos... O vento varria tudo! E a minha vida ficava Cada vez mais cheia De tudo. BANDEIRA, M. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1967. Na estruturação do texto, destaca-se a) a construção de oposições semânticas. b) a apresentação de ideias de forma objetiva. c) o emprego recorrente de figuras de linguagem, como o eufemismo. d) a repetição de sons e de construções sintáticas semelhantes. e) a inversão da ordem sintática das palavras. 03. (UECE) A Fita Métrica do Amor Martha Medeiros Como se mede uma pessoa? Os tamanhos variam conforme o grau de envolvimento. Ela é enorme pra você quando fala do que leu e viveu, quando trata você com carinho e respeito, quando olha nos olhos e sorri destravado. É pequena pra você quando só pensa em si mesmo, quando se comporta de uma maneira pouco gentil, quando fracassa justamente no momento em que teria que demonstrar o que há de mais importante entre duas pessoas: a amizade. Uma pessoa é gigante pra você quando se interessa pela sua vida, quando busca alternativas para o seu crescimento, quando sonha junto. É pequena quando desvia do assunto. Uma pessoa é grande quando perdoa, quando compreende, quando se coloca no lugar do outro, quando age não de acordo PRÉ-VESTIBULAR PROENEM.COM.BR 09 FIGURAS DE LINGUAGEM II: FIGURAS DE CONSTRUÇÃO E DE HARMONIA 87 INTERPRETAÇÃO com o que esperam dela, mas de acordo com o que espera de si mesma. Uma pessoa é pequena quando se deixa reger por comportamentos clichês. Uma mesma pessoa pode aparentar grandeza ou miudeza dentro de um relacionamento, pode crescer ou decrescer num espaço de poucas semanas: será ela que mudou ou será que o amor é traiçoeiro nas suas medições? Uma decepção pode diminuiro tamanho de um amor que parecia ser grande. Uma ausência pode aumentar o tamanho de um amor que parecia ser ínfimo. É difícil conviver com esta elasticidade: as pessoas se agigantam e se encolhem aos nossos olhos. Nosso julgamento é feito não através de centímetros e metros, mas de ações e reações, de expectativas e frustrações. Uma pessoa é única ao estender a mão, e ao recolhê-la inesperadamente, se torna mais uma. O egoísmo unifica os insignificantes. Não é a altura, nem o peso, nem os músculos que tornam uma pessoa grande. É a sua sensibilidade sem tamanho. Como figura de linguagem, a anáfora é caracterizada pela repetição de uma ou mais palavras no início de versos, orações ou períodos. Na crônica, a autora recorre à anáfora, nos três primeiros parágrafos do texto, pela repetição da conjunção “quando”, com o objetivo de a) ampliar a expressividade do conteúdo da mensagem, enfatizando o sentido do termo repetido consecutivamente. b) empregar a anáfora como um recurso estilístico indispensável a qualquer texto de cunho literário. c) respeitar as características da crônica, já que a anáfora é um recurso linguístico próprio deste tipo de gênero textual. d) fazer referência a uma informação previamente mencionada. 04. (UFG) Leia o poema a seguir. br um ônibus na estrada é só uma faixa contínua que puxa & piche & placas & postes & mais & mais asfalto & pastos & bois & soja & cana ao longo da estrada interminável & monótona & sem fim PEREIRA, Luís Araujo. Minigrafias. Goiânia: Cânone Editorial, 2009. p. 75. A anáfora é um recurso de linguagem cuja função é de organização textual, de retomada referencial ou de repetição da mesma palavra ou construção. No poema apresentado, emprega-se “&” por meio dessa figura de linguagem, fazendo a anáfora produzir efeito de sentido equivalente ao a) movimento acelerado do ônibus, evidente na imagem “um ônibus/ na estrada/ é só uma faixa/ contínua/ que puxa”. b) tipo de vida monótono dos motoristas de ônibus implicado na anáfora e na repetição de consoantes e de vogais. c) som do ônibus na estrada, sugerido pelo emprego de aliterações e assonâncias ao longo do poema. d) panorama econômico da rodovia, reiterado nas palavras “piche”, “placas”, “postes”, “asfalto”, “pasto”, “bois”, “soja” e “cana”. e) cenário da rodovia, igual a todas as estradas, presente na imagem “interminável/ & monótona/ & sem fim”. 05. (UEG) Leia o trecho abaixo: – Desde que estou retirando só a morte vejo ativa, só a morte deparei e às vezes até festiva; só morte tem encontrado quem pensava encontrar vida, e o pouco que não foi morte foi de vida severina (aquela vida que é menos vivida que defendida, e é ainda mais severina para o homem que retira). NETO, João Cabral de Melo. Morte e vida severina. Rio de Janeiro: MEDIAfashion, 2008. p. 82. Verifica-se, em termos estruturais, uma a) aliteração no penúltimo verso. b) anáfora no segundo e terceiro versos. c) comparação no quinto verso. d) metáfora no terceiro e quarto versos. 06. (UFU-MG) Dionisos Dendrites Seu olhar verde penetra a Noite entre tochas acesas Ramos nascem de seu peito Pés percutem a pedra enegrecida Cantos ecoam tambores gritos mantos desatados. Acorre o vento ao círculo demente O vinho espuma nas taças incendiadas. Acena o deus ao bando: Mar de alvos braços Seios rompendo as túnicas gargantas dilatadas E o vaticínio do tumulto à Noite – Chegada do inverno aos lares Fim de guerra em campos estrangeiros. As bocas mordem colos e flancos desnudados: À sombra mergulham faces convulsivas Corpos se avizinham à vida fria dos valados Trêmulas tíades presas ao peito de Dionisos trácio. Sussurra a Noite e os risos de ébrios dançarinos Mergulham no vórtice da festa consagrada. E quando o Sol o ingênuo olhar acende Um secreto murmúrio ata num só feixe O louro trigo nascido das encostas. SILVA, Dora Ferreira da. Hídrias. São Paulo: Odysseus, 2004. p. 42-43. Considerando a leitura do poema e o uso dos recursos expressivos, em Dionisos Dendrites, a) a aliteração no verso “Pés percutem a pedra enegrecida” indica um som reproduzido como o dos tambores do verso subsequente. b) a gradação em ‘bocas’, ‘faces’ e ‘corpos’, nos três primeiros versos da 3ª estrofe, aponta para a opulência do ritual. c) a metonímia em “seu olhar verde penetra a Noite entre tochas acesas” revela o embate estabelecido entre a vida e a morte. d) a metáfora em ‘taças incendiadas’, no verso “o vinho espuma nas taças incendiadas”, denota o sentimento de enfado dos presentes em relação ao ritual. 07. (FUVEST) Desde pequeno, tive tendência para personificar as coisas. Tia Tula, que achava que mormaço fazia mal, sempre gritava: “Vem pra dentro, menino, olha o mormaço!” Mas eu ouvia o mormaço com M maiúsculo. Mormaço, para mim, era um velho que pegava crianças! Ia pra dentro logo. E ainda hoje, quando leio que alguém se viu perseguido pelo clamor público, vejo com estes olhos o Sr. Clamor Público, magro, arquejante, de preto, brandindo um guarda-chuva, com um gogó protuberante que se abaixa e levanta no excitamento da perseguição. E já estava devidamente grandezinho, pois devia contar uns trinta anos, quando me fui, com um grupo de colegas, a ver o lançamento da pedra fundamental da ponte Uruguaiana- PRÉ-VESTIBULARPROENEM.COM.BR88 INTERPRETAÇÃO 09 FIGURAS DE LINGUAGEM II: FIGURAS DE CONSTRUÇÃO E DE HARMONIA Libres, ocasião de grandes solenidades, com os presidentes Justo e Getúlio, e gente muita, tanto assim que fomos alojados os do meu grupo num casarão que creio fosse a Prefeitura, com os demais jornalistas do Brasil e Argentina. Era como um alojamento de quartel, com breve espaço entre as camas e todas as portas e janelas abertas, tudo com os alegres incômodos e duvidosos encantos de uma coletividade democrática. Pois lá pelas tantas da noite, como eu pressentisse, em meu entredormir, um vulto junto à minha cama, sentei-me estremunhado* e olhei atônito para um tipo de chiru*, ali parado, de bigodes caídos, pala pendente e chapéu descido sobre os olhos. Diante da minha muda interrogação, ele resolveu explicar-se, com a devida calma: – Pois é! Não vê que eu sou o sereno... Mário Quintana, As cem melhores crônicas brasileiras. *Glossário: estremunhado: mal acordado. chiru: que ou aquele que tem pele morena, traços acaboclados (regionalismo: Sul do Brasil). Considerando que “silepse é a concordância que se faz não com a forma gramatical das palavras, mas com seu sentido, com a ideia que elas representam”, indique o fragmento em que essa figura de linguagem se manifesta. a) “olha o mormaço”. b) “pois devia contar uns trinta anos”. c) “fomos alojados os do meu grupo”. d) “com os demais jornalistas do Brasil”. e) “pala pendente e chapéu descido sobre os olhos”. 08. (UNESP) Elegia na morte de Clodoaldo Pereira da Silva Moraes, poeta e cidadão A morte chegou pelo interurbano em longas espirais metálicas. Era de madrugada. Ouvi a voz de minha mãe, viúva. De repente não tinha pai. No escuro de minha casa em Los Angeles procurei recompor tua lembrança Depois de tanta ausência. Fragmentos da infância Boiaram do mar de minhas lágrimas. Vi-me eu menino Correndo ao teu encontro. Na ilha noturna Tinham-se apenas acendido os lampiões a gás, e a clarineta De Augusto geralmente procrastinava a tarde. Era belo esperar-te, cidadão. O bondinho Rangia nos trilhos a muitas praias de distância... Dizíamos: “Ê-vem meu pai!”. Quando a curva Se acendia de luzes semoventes*, ah, corríamos Corríamos ao teu encontro. A grande coisa era chegar antes Mas ser marraio** em teus braços, sentir por último Os doces espinhos da tua barba. Trazias de então uma expressão indizível de fidelidade e paciência Teu rosto tinha os sulcos fundamentais da doçura De quem se deixou ser. Teus ombros possantes Se curvavam como ao peso da enorme poesia Que não realizaste. O barbante cortava teus dedos Pesados de mil embrulhos: carne, pão, utensílios Para o cotidiano (e frequentemente o binóculo Que vivias comprandoe com que te deixavas horas inteiras Mirando o mar). Dize-me, meu pai Que viste tantos anos através do teu óculo de alcance Que nunca revelaste a ninguém? Vencias o percurso entre a amendoeira e a casa como o atleta exausto no último lance da maratona. Te grimpávamos. Eras penca de filho. Jamais Uma palavra dura, um rosnar paterno. Entravas a casa humilde A um gesto do mar. A noite se fechava Sobre o grupo familial como uma grande porta espessa. Muitas vezes te vi desejar. Desejavas. Deixavas-te olhando o mar Com mirada de argonauta. Teus pequenos olhos feios Buscavam ilhas, outras ilhas... — as imaculadas, inacessíveis Ilhas do Tesouro. Querias. Querias um dia aportar E trazer — depositar aos pés da amada as joias fulgurantes Do teu amor. Sim, foste descobridor, e entre eles Dos mais provectos***. Muitas vezes te vi, comandante Comandar, batido de ventos, perdido na fosforência De vastos e noturnos oceanos Sem jamais. Deste-nos pobreza e amor. A mim me deste A suprema pobreza: o dom da poesia, e a capacidade de amar Em silêncio. Foste um pobre. Mendigavas nosso amor Em silêncio. Foste um no lado esquerdo. Mas Teu amor inventou. Financiaste uma lancha Movida a água: foi reta para o fundo. Partiste um dia Para um brasil além, garimpeiro sem medo e sem mácula. Doze luas voltaste. Tua primogênita — diz-se — Não te reconheceu. Trazias grandes barbas e pequenas águas- marinhas. (Vinicius de Moraes. Antologia poética. 11 ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1974, p. 180-181.) (*) Semovente: “Que ou o que anda ou se move por si próprio.” (**) Marraio: “No gude e noutros jogos, palavra que dá, a quem primeiro a grita, o direito de ser o último a jogar.” (***) Provecto: “Que conhece muito um assunto ou uma ciência, experiente, versado, mestre.” (Dicionário Eletrônico Houaiss) Marque a alternativa cujo verso contém um pleonasmo, ou seja, uma redundância de termos com bom efeito estilístico. a) De repente não tinha pai. b) Rangia nos trilhos a muitas praias de distância... c) Se curvavam como ao peso da enorme poesia d) Sobre o grupo familial como uma grande porta espessa. e) Deste-nos pobreza e amor. A mim me deste 09. (UNESP) Para chegar ao soberbo resultado de transformar a banha em fibra, aí vem o futebol. Mas por que o futebol? Não seria, porventura, melhor exercitar-se a mocidade em jogos nacionais, sem mescla de estrangeirismo, o murro, o cacete, a faca de ponta, por exemplo? Não é que me repugne a introdução de coisas exóticas entre nós. Mas gosto de indagar se elas serão assimiláveis ou não. No caso afirmativo, seja muito bem-vinda a instituição alheia, fecundemo-la, arranjemos nela um filho híbrido que possa viver cá em casa. De outro modo, resignemo-nos às broncas tradições dos sertanejos e dos matutos. Ora, parece- -me que o futebol não se adapta a estas boas paragens do cangaço. É roupa de empréstimo, que não nos serve. Para que um costume intruso possa estabelecer-se definitivamente em um país é necessário, não só que se harmonize com a índole do povo que o vai receber, mas que o lugar a ocupar não esteja tomado por outro mais antigo, de cunho indígena. É preciso, pois, que vá preencher uma lacuna, como diz o chavão. O do futebol não preenche coisa nenhuma, pois já temos a muito conhecida bola de palha de milho, que nossos amadores mambembes1 jogam com uma perícia que deixaria o mais experimentado sportman britânico de queixo caído. Os campeões brasileiros não teriam feito a figura triste que fizeram em Antuérpia se a bola figurasse nos programas das Olimpíadas e estivessem a disputá-la quatro sujeitos de pulso. Apenas um representante nosso conseguiu ali distinguir-se, no tiro de revólver, o que é pouco lisonjeiro para a vaidade de um país em que se fala tanto. Aqui seria muito mais fácil o indivíduo salientar- se no tiro de espingarda umbiguda, emboscado atrás de um pau. PRÉ-VESTIBULAR PROENEM.COM.BR 09 FIGURAS DE LINGUAGEM II: FIGURAS DE CONSTRUÇÃO E DE HARMONIA 89 INTERPRETAÇÃO Temos esportes em quantidade. Para que metermos o bedelho em coisas estrangeiras? O futebol não pega, tenham a certeza. Não vale o argumento de que ele tem ganho terreno nas capitais de importância. Não confundamos. As grandes cidades estão no litoral; isto aqui é diferente, é sertão. As cidades regurgitam de gente de outras raças ou que pretende ser de outras raças; nós somos mais ou menos botocudos, com laivos de sangue cabinda e galego. Nas cidades os viciados elegantes absorvem o ópio, a cocaína, a morfina; por aqui há pessoas que ainda fumam liamba². 1 mambembe: medíocre, reles, de baixa condição. 2 liamba: cânhamo, maconha. (Linhas tortas, 1971.) Na oração “O do futebol não preenche coisa nenhuma” (7o parágrafo) é omitida, por elipse, uma palavra empregada anteriormente: a) país. b) povo. c) lugar. d) costume. e) chavão. 10. (CISMETRO-SP – VETERINÁRIO) Observe o trecho do hino nacional apresentado a seguir, e responda à questão. “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas De um povo heroico o brado retumbante” Assinale a alternativa que corresponde à figura de linguagem empregada no trecho. a) Hipérbole. b) Eufemismo. c) Hipérbato. d) Zeugma. 11. (FEI) Assinalar a alternativa correta, correspondente à figuras de linguagem, presentes nos fragmentos abaixo: I. “Não te esqueças daquele amor ardente que já nos olhos meus tão puro viste.” II. “A moral legisla para o homem; o direito para o cidadão.” III. “A maioria concordava nos pontos essenciais; nos pormenores porém, discordavam.” IV. “Isaac a vinte passos, divisando o vulto de um, para, ergues a mão em viseira, firma os olhos.” a) anacoluto, hipérbato, hipálage, pleonasmo; b) hipérbato, zeugma, silepse, assíndeto; c) anáfora, polissíndeto, elipse, hipérbato; d) pleonasmo, anacoluto, catacrese, eufemismo; e) hipálage, silepse, polissíndeto, zeugma. 12. (PUC – SP) Nos trechos: “…nem um dos autores nacionais ou nacionalizados de oitenta pra lá faltava nas estantes do major” e “…o essencial é achar-se as palavras que o violão pede e deseja” encontramos, respectivamente, as seguintes figuras de linguagem: a) prosopopeia e hipérbole; b) hipérbole e metonímia; c) perífrase e hipérbole; d) metonímia e eufemismo; e) metonímia e prosopopeia. 13. (UM-SP) Indique a alternativa em que haja uma concordância realizada por silepse: a) Os irmãos de Teresa, os pais de Júlio e nós, habitantes desta pacata região, precisaremos de muita força para sobreviver. b) Poderão existir inúmeros problemas conosco devido às opiniões dadas neste relatório. c) Os adultos somos bem mais prudentes que os jovens no combate às dificuldades. d) Dar-lhe-emos novas oportunidades de trabalho para que você obtenha resultados mais satisfatórios. e) Haveremos de conseguir os medicamentos necessários para a cura desse vírus insubordinável a qualquer tratamento. 14. (CESGRANRIO) Na frase “O fio da ideia cresceu, engrossou e partiu-se” ocorre processo de gradação. Não há gradação em: a) O carro arrancou, ganhou velocidade e capotou. b) O avião decolou, ganhou altura e caiu. c) O balão inflou, começou a subir e apagou. d) A inspiração surgiu, tomou conta de sua mente e frustrou-se. e) João pegou de um livro, ouviu um disco e saiu. 15. (UNESP) Na frase: "O pessoal estão exagerando, me disse ontem um camelô", encontramos a figura de linguagem chamada: a) silepse de pessoa b) elipse c) anacoluto d) hipérbole e) silepse de número 16. (UDESC) O nome de Emir quase nunca era mencionado nas horas das refeições ou nas conversas animadas por baforadas de narguilé, goles de 1áraque e lances de gamão. 2Os filhos de Emilie éramos proibidos de participar dessas reuniões que varavam a noite e terminavam no pátio da fonte, aclarado por uma luz azulada. Era um momento em que os assuntos, já peneirados, esgotados e fartos de serem repetidos, 3davam lugar a 4confidências e 5lamúrias, 6abafadas às vezes pela linguagem dos pássaros, e entremeadas por exclamações e vozes que pronunciavam o nome de Deus. Era como se a manhã– 7como uma intrusa que silencia as vozes calorosas da noite – 8dispersasse o ambiente festivo, 9arrefecendo os gestos dos mais exaltados, chamando-os ao ofício 10que se inicia com a aurora. 11Mas, em algumas reuniões de sextas-feiras, o 12prenúncio da manhã não os dispersava. Eu acordava com berros dilacerantes, gemidos terríveis, ruídos de trote e 13uma algazarra de alimárias que 14assistiam à agonia dos carneiros que possuíam nomes e 15eram alimentados pelas mãos de Emilie. HATOUM, Milton. Relato de um certo Oriente. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, pp. 50 e 51. Assinale a alternativa correta em relação à obra Relato de um certo Oriente, Milton Hatoum, e ao texto. a) O uso do sinal gráfico da crase é opcional em “abafadas às vezes” (referência 6), assim como em “davam lugar a confidências” (referência 3). b) Em “Os filhos de Emilie éramos proibidos de participar dessas reuniões” (referência 2) há a figura de linguagem chamada silepse de pessoa. c) As palavras “áraque” (referência 1), “confidências” (referência 4), “lamúrias” (referência 5) e “prenúncio” (referência 12) são acentuadas por serem paroxítonas terminadas em ditongo. d) Infere-se da leitura da obra, que o nome de Emir, filho mais novo de Emilie, quase nunca era mencionado nos encontros familiares porque há muito abandonara a família, causando mágoa. e) Infere-se da leitura da obra, que os empregados, principalmente as mulheres, eram tratados com muita regalia, pois participa- vam de todos os encontros e de todas as atividades festivas da família de Emilie. PRÉ-VESTIBULARPROENEM.COM.BR90 INTERPRETAÇÃO 09 FIGURAS DE LINGUAGEM II: FIGURAS DE CONSTRUÇÃO E DE HARMONIA 17. (CPS) Leia o texto e o poema para responder à questão a seguir. A ondomotriz é uma forma de energia renovável que se aproveita da energia das ondas oceânicas. Além de poder fornecer energia, as ondas também serviram de inspiração para Manuel Bandeira compor o poema “A onda”. A onda a onda anda aonde anda a onda? a onda ainda ainda onda ainda anda aonde? aonde? a onda a onda Assinale a alternativa que apresenta uma figura de linguagem utilizada no poema. a) Antítese, associação de ideias contrárias por meio de palavras de sentidos opostos. b) Catacrese, emprego de uma palavra no sentido figurado por falta de um termo apropriado. c) Eufemismo, atenuação de ideias consideradas desagradáveis, ofensivas ou cruéis. d) Onomatopeia, palavras especiais criadas para representar sons específicos. e) Paranomásia, semelhança sonora e gráfica entre palavras de significados distintos. 18. (FAAP) Soneto de Separação De repente do riso fez-se o pranto Silencioso e branco como a bruma E das bocas unidas fez-se a espuma E das mãos espalmadas fez-se o espanto. De repente da calma fez-se o vento Que dos olhos desfez a última chama E da paixão fez-se o pressentimento E do momento imóvel fez-se o drama. De repente, não mais que de repente Fez-se de triste o que se fez amante E de sozinho o que se fez contente Fez-se do amigo próximo o distante Fez-se da vida uma aventura errante De repente, não mais que de repente. (Vinícius de Morais) "Silencioso e branco como a bruma". À repetição das mesmas consoantes em BRANCO e BRUMA em busca da sonoridade, dá-se o nome: a) assonância b) aliteração c) eco d) trocadilho e) pleonasmo 19. (UFRN) Sou homem de tristes palavras. De que era que eu tinha tanta, tanta culpa? Se o meu pai, sempre fazendo ausência: e O RIO-RIO-RIO - O RIO - PONDO PERPÉTUO [grifo nosso]. Eu sofria já o começo da velhice - esta vida era só o demoramento. Eu mesmo tinha achaques, ânsias, cá de baixo, cansaços, perrenguice de reumatismo. E ele? Por quê? Devia de padecer demais. De tão idoso, não ia, mais dia menos dia, fraquejar o vigor, deixar que a canoa emborcasse, ou que bubuiasse sem pulso, na levada do rio, para se despenhar horas abaixo, em tororoma e no tombo da cachoeira, brava, com o fervimento e morte. Apertava o coração. Ele estava lá, sem a minha tranquilidade. Sou o culpado do que nem sei, de dor em aberto, no meu foro. Soubesse - se as coisas fossem outras. E fui tomando ideia. (ROSA, João Guimarães. Primeiras estórias. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1976.) Pode-se afirmar que, na expressão em destaque no fragmento textual, a manifestação da função poética da linguagem evidencia o dinamismo do tempo. Esse dinamismo é representado por a) ritmo cadente e neologismo. b) assonância e reiteração de vocábulo. c) onomatopeia e uso de metáfora. d) efeitos de eco e uso de metonímia. 20. (FATEC) As Cousas do Mundo Neste mundo é mais rico o que mais rapa: Quem mais limpo se faz, tem mais carepa; Com sua língua, ao nobre o vil decepa: O velhaco maior sempre tem capa. Mostra o patife da nobreza o mapa: Quem tem mão de agarrar, ligeiro trepa; Quem menos falar pode, mais increpa; Quem dinheiro tiver, pode ser Papa. A flor baixa se inculca por tulipa; Bengala hoje na mão, ontem garlopa. Mais isento se mostra o que mais chupa. Para a tropa do trapo vazo a tripa E mais não digo, porque a Musa topa Em apa, epa, ipa, opa, upa. (Gregório de Matos Guerra, Seleção de Obras Poéticas) Em "Para a tropa do trapo vazo a tripa", pode-se constatar que o poeta teve grande cuidado com a seleção e disposição das palavras que compõem a sonoridade do verso, para salientar certos fonemas que se repetem (principalmente os "pês" e os "tês"), utilizando, ao mesmo tempo, palavras que se diferenciam por mudanças fonéticas mínimas (tropa/trapo/tripa). Os recursos estilísticos empregados aí foram a) personificação e alusão. b) paralelismo e comparação. c) aliteração e paronomásia. d) assonância e preterição. e) metáfora e metonímia. 05. APROFUNDAMENTO EXERCÍCIOS DE 01. (UNESP) Leia o poema de Manuel Bandeira (1886-1968) para responder à questão a seguir. Poema só para Jaime Ovalle1 Quando hoje acordei, ainda fazia escuro (Embora a manhã já estivesse avançada). Chovia. Chovia uma triste chuva de resignação PRÉ-VESTIBULAR PROENEM.COM.BR 09 FIGURAS DE LINGUAGEM II: FIGURAS DE CONSTRUÇÃO E DE HARMONIA 91 INTERPRETAÇÃO Como contraste e consolo ao calor tempestuoso da noite. Então me levantei, Bebi o café que eu mesmo preparei, Depois me deitei novamente, acendi um cigarro e fiquei pensando... – Humildemente pensando na vida e nas mulheres que amei. (Estrela da vida inteira, 1993.) 1 Jaime Ovalle (1894-1955): compositor e instrumentista. Aproximou-se do meio intelectual carioca e se tornou amigo íntimo de Villa-Lobos, Di Cavalcanti, Sérgio Buarque de Hollanda e Manuel Bandeira. Sua música mais famosa é “Azulão”, em parceria com o poeta Manuel Bandeira. (Dicionário Cravo Albin da música popular brasileira) Pleonasmo (do grego pleonasmós, superabundância): emprego de palavras redundantes, de igual sentido; redundância. Há o pleonasmo vicioso, decorrente da ignorância da língua e que deve ser evitado, e o pleonasmo estilístico, usado intencionalmente para comunicar à expressão mais vigor ou intensidade. (Domingos Paschoal Cegalla. Dicionário de dificuldades da língua portuguesa, 2009. Adaptado.) Transcreva o verso em que se verifica a ocorrência de um pleonasmo. Justifique sua resposta. Identifique ainda duas características do poema, uma formal e outra temática, que o vinculam ao movimento modernista brasileiro. 02. (FGV) Meu amigo Marcos O generoso e divertido companheiro de crônicas Conheci Marcos Rey há mais de vinte anos, quando sonhava tornar-me escritor. Certa vez confessei esse desejo à atriz Célia Helena, que deixou sua marca no teatro paulista. Tempos depois, ela me convidou para tentar adaptar um livro para teatro. Era O RAPTO DO GAROTO DE OURO, de Marcos. Passei noites me torturando sobre as teclas. Célia marcou um encontro entre mim e ele, pois a montagem dependia da aprovação do autor. Quando adolescente, eu ficara fascinado com MEMÓRIAS DE UM GIGOLÔ, seu livro mais conhecido. Nunca tinha visto um escritor de perto. Imaginava uma figura pomposa, em cima de um pedestal. Meu coraçãoquase saiu pela boca quando apertei a campainha. Fui recebido por Palma, sua mulher. Um homem gordinho e simpático entrou na sala. Na época, já sofria de uma doença que lhe dificultava o movimento das mãos e dos pés. Cumprimentou-me. Sorriu. Estava tão nervoso que nem consegui dizer “boa-tarde”. Gaguejei. Mas ele me tratou com o respeito que se dedica a um colega. Propôs mudanças no texto. Orientou-me. Principalmente, acreditou em mim. A peça permaneceu em cartaz dois anos. Muito do que sou hoje devo ao carinho com que me recebeu naquele dia. (WALCYR CARRASCO, PÁG. 98 - VEJA SP, 14 DE ABRIL, 1999.) Em português, expressões como SAIR PARA FORA ou SUBIR PARA CIMA são criticáveis por serem redundantes, isto é, conterem repetição desnecessária da mesma ideia. Trata-se de um defeito de estilo denominado PLEONASMO. Na frase a seguir, é possível perceber a presença de DOIS pleonasmos: Na reunião, houve uma inesperada surpresa: todos os membros do Conselho foram unânimes em reconhecer os méritos do escritor. Reescreva essa frase, eliminando os pleonasmos. Justifique as alterações feitas. 03. (UNESP) As questões de números seguintes tomam por base um fragmento da Poética, do filósofo grego Aristóteles (384- 322 a.C.), um fragmento de Corte na Aldeia, do poeta clássico português Francisco Rodrigues Lobo (1580-1622), e um fragmento de uma crônica do escritor realista brasileiro Machado de Assis (1839-1908). Poética Pelas precedentes considerações se manifesta que não é ofício de poeta narrar o que aconteceu; é, sim, o de representar o que poderia acontecer, quer dizer: o que é possível segundo a verossimilhança e a necessidade. Com efeito, não diferem o historiador e o poeta, por escreverem verso ou prosa (pois que bem poderiam ser postas em verso as obras de Heródoto, e nem por isso deixariam de ser história, se fossem em verso o que eram em prosa), - diferem, sim, em que diz um as coisas que sucederam, e outro as que poderiam suceder. Por isso a poesia é algo de mais filosófico e mais sério do que a história, pois refere aquela principalmente o universal, e esta o particular. Por “referir-se ao universal” entendo eu atribuir a um indivíduo de determinada natureza pensamentos e ações que, por liame de necessidade e verossimilhança, convêm a tal natureza; e ao universal, assim entendido, visa a poesia, ainda que dê nomes aos seus personagens; particular, pelo contrário, é o que fez Alcibíades ou o que lhe aconteceu. (Aristóteles, Poética) Corte na Aldeia — A minha inclinação em matéria de livros (disse ele), de todos os que estão presentes é bem conhecida; somente poderei dar agora de novo a razão dela. Sou particularmente afeiçoado a livros de história verdadeira, e, mais que às outras, às do Reino em que vivo e da terra onde nasci; dos Reis e Príncipes que teve; das mudanças que nele fez o tempo e a fortuna; das guerras, batalhas e ocasiões que nele houve; dos homens insignes, que, pelo discurso dos anos, floresceram; das nobrezas e brasões que por armas, letras, ou privança se adquiriram. [...] [...] — Vós, senhor Doutor (disse Solino) achareis isso nos vossos cartapácios; mas eu ainda estou contumaz. Primeiramente, nas histórias a que chamam verdadeiras, cada um mente segundo lhe convém, ou a quem o informou, ou favoreceu para mentir; porque se não forem estas tintas, é tudo tão misturado que não há pano sem nódoa, nem légua sem mau caminho. No livro fingido contam- se as cousas como era bem que fossem e não como sucederam, e assim são mais aperfeiçoadas. Descreve o cavaleiro como era bem que os houvesse, as damas quão castas, os Reis quão justos, os amores quão verdadeiros, os extremos quão grandes, as leis, as cortesias, o trato tão conforme com a razão. E assim não lereis livro em o qual se não destruam soberbos, favoreçam humildes, amparem fracos, sirvam donzelas, se cumpram palavras, guardem juramentos e satisfaçam boas obras. [...] Muito festejaram todos o conto, e logo prosseguiu o Doutor: — Tão bem fingidas podem ser as histórias que merecem mais louvor que as verdadeiras; mas há poucas que o sejam; que a fábula bem escrita (como diz Santo Ambrósio), ainda que não tenha força de verdade, tem uma ordem de razão, em que se podem manifestar as cousas verdadeiras. (Francisco Rodrigues Lobo, Corte na Aldeia) Crônica (15.03.1877) Mais dia menos dia, demito-me deste lugar. Um historiador de quinzena, que passa os dias no fundo de um gabinete escuro e solitário, que não vai às touradas, às câmaras, à rua do Ouvidor, um historiador assim é um puro contador de histórias. E repare o leitor como a língua portuguesa é engenhosa. Um contador de histórias é justamente o contrário de historiador, não sendo um historiador, afinal de contas, mais do que um contador de histórias. Por que essa diferença? Simples, leitor, nada mais simples. O historiador foi inventado por ti, homem culto, letrado, humanista; o contador de histórias foi inventado pelo povo, que nunca leu Tito Lívio, e entende que contar o que se passou é só fantasiar. PRÉ-VESTIBULARPROENEM.COM.BR92 INTERPRETAÇÃO 09 FIGURAS DE LINGUAGEM II: FIGURAS DE CONSTRUÇÃO E DE HARMONIA O certo é que se eu quiser dar uma descrição verídica da tourada de domingo passado, não poderei, porque não a vi. [...] (Joaquim Maria Machado de Assis, História de Quinze Dias. In: Crônicas) A leitura do último período do fragmento de Rodrigues Lobo revela que o escritor valeu-se com elegância do recurso à elipse para evitar a repetição desnecessária de elementos. Com base nesta observação, a) aponte, na série enumerativa que começa com a oração “se não destruam soberbos”, os vocábulos que são omitidos, por elipse, nas outras orações da série; b) considerando que as sete orações da série enumerativa se encontram na chamada “voz passiva sintética”, indique o sujeito da primeira oração e as características de flexão e concordância que permitem identificá-lo. 04. (UERJ) Ao 1valimento que tem o mentir Mau ofício é mentir, mas proveitoso... Tanta mentira, tanta utilidade Traz consigo o mentir nesta cidade Como o diz o mais triste mentiroso. Eu, como um ignorante e um baboso, Me pus a verdadeiro, por vaidade; Todo o meu 2cabedal meti em verdade E saí do negócio 3perdidoso. Perdi o principal, que eram verdades, Perdi os interesses de estimar-me, Perdi-me a mim em tanta 4soledade; Deram os meus amigos em deixar-me, 5Cobrei ódios e inimizades... Eu me meto a mentir e a aproveitar-me. GREGÓRIO DE MATOS PIRES, M. L. G. (org.). Poetas do período barroco. Lisboa: Comunicação, 1985. 1valimento − validade 2cabedal − conhecimento 3perdidoso − prejudicado 4soledade − solidão 5cobrar − receber A primeira estrofe do poema apresenta inversões da ordem direta das orações. Esse recurso expressivo, chamado hipérbato, é frequente na estética barroca. Reescreva os versos 2 e 3 da primeira estrofe na ordem direta, desfazendo o hipérbato. Em seguida, explique o efeito do hipérbato para a camada sonora dessa estrofe. 05. (UNESP) A questão a seguir tomam por base um texto do poeta simbolista brasileiro Alphonsus de Guimaraens (1870-1921). Eras a Sombra do Poente Eras a sombra do poente Em calmarias bem calmas; E no ermo agreste, silente, Palmeira cheia de palmas. Eras a canção de outrora, Por entre nuvens de prece; Palidez que ao longe cora E beijo que aos lábios desce. Eras a harmonia esparsa Em violas e violoncelos: E como um voo de garça Em solitários castelos. Eras tudo, tudo quanto De suave esperança existe; Manto dos pobres e manto Com que as chagas me cobriste. Eras o Cordeiro, a Pomba, A crença que o amor renova... És agora a cruz que tomba À beira da tua cova. (“Pastoral aos Crentes do Amor e da Morte”, 1923. In: GUIMARAENS, Alphonsus de. POESIAS - I. Rio de Janeiro: Org. Simões, 1955, p. 284.) A reiteração é um procedimento que, aplicado a diferentes níveis do discurso, permite ao poeta obter efeitos de musicalidade e ênfase semântica. Para tanto,o escritor pode reiterar fonemas (aliterações, assonâncias, rimas), vocábulos, versos, estrofes, ou, pelo processo denominado “paralelismo”, retomar mesmas estruturas sintáticas de frases, repetindo alguns elementos e fazendo variar outros. Tendo em vista estas observações, a) identifique no poema de Alphonsus um desses procedimentos. b) servindo-se de uma passagem do texto, demonstre o processo de reiteração que você identificou no item a. GABARITO EXERCÍCIOS PROPOSTOS 01. B 02. D 03. A 04. D 05. B 06. A 07. C 08. E 09. D 10. C 11. A 12. E 13. C 14. E 15. E 16. B 17. E 18. B 19. B 20. C EXERCÍCIOS DE APROFUNDAMENTO 01. Há pleonasmo no quarto verso: “Chovia uma triste chuva de resignação”. Aqui o autor procura enfatizar a ideia de chuva, pois poderia substituir o verbo “chover” pelo verbo “cair” (“Caía uma triste chuva de resignação”). Trata-se, portanto, de um pleonasmo estilístico. No aspecto formal, o poema se vincula ao movimento modernista brasileiro por apresentar versos livres. Quanto à temática, demonstra características modernistas por discorrer sobre o cotidiano. 02. Na reunião, houve uma surpresa: todos os membros do Conselho reconheceram os méritos do escritor. Há redundância em “surpresa inesperada” (toda surpresa é inesperada); e todos “unânimes”. 03. a) O que se encontra elíptico (por zeugma) no trecho mencionado é “se não”. O pronome apassivador seguido do advérbio de negação. b) O sujeito da primeira oração é “soberbos”, com o qual concorda o verbo “destruam”, apassivado pelo “se”. O que assegura a identificação do sujeito é a flexão do verbo no plural. 04. Uma das respostas: - O mentir traz consigo tanta mentira, tanta utilidade nesta cidade. - O mentir nesta cidade traz consigo tanta mentira, tanta utilidade. O hipérbato produz a rima. 05. a) O uso da anáfora. b) A anáfora gradativamente vai relevando os atributos da amada morta chegando à sublimação mística da mulher relacionando-a com o “Cordeiro” e a “Pomba”. ANOTAÇÕES
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