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PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO Professora Dra. Rachel de Maya Brotherhood Professora Me. Waléria Henrique dos Santos Leonel GRADUAÇÃO Unicesumar C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Distância; BROTHERHOOD, Rachel de Maya; LEONEL, Waléria Henrique dos Santos. Psicologia da Educação. Rachel de Maya Brotherhood; Waléria Henrique dos Santos Leonel. Maringá-Pr.: UniCesumar, 2018. Reimpresso em 2019. 182 p. “Graduação - EaD”. 1. Educação. 2. Psicologia . 3. Aprendizagem 4. EaD. I. Título. ISBN 978-85-459-0139-6 CDD - 22 ed. 150 CIP - NBR 12899 - AACR/2 Reitor Wilson de Matos Silva Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi NEAD - Núcleo de Educação a Distância Diretoria Executiva Chrystiano Mincoff James Prestes Tiago Stachon Diretoria de Graduação e Pós-graduação Kátia Coelho Diretoria de Permanência Leonardo Spaine Diretoria de Design Educacional Débora Leite Head de Produção de Conteúdos Celso Luiz Braga de Souza Filho Head de Curadoria e Inovação Jorge Luiz Vargas Prudencio de Barros Pires Gerência de Produção de Conteúdo Diogo Ribeiro Garcia Gerência de Projetos Especiais Daniel Fuverki Hey Gerência de Processos Acadêmicos Taessa Penha Shiraishi Vieira Gerência de Curadoria Giovana Costa Alfredo Supervisão do Núcleo de Produção de Materiais Nádila Toledo Supervisão Operacional de Ensino Luiz Arthur Sanglard Coordenador de Conteúdo Marcia Maria Previato de Souza Design Educacional Yasminn Zagonel Projeto Gráico Jaime de Marchi Junior José Jhonny Coelho Arte Capa Arthur Cantareli Silva Editoração Priscila Stadler Revisão Textual Jaquelina Kutsunugi Ilustração André Luís Onishi Ficha catalográica elaborada pelo bibliotecário João Vivaldo de Souza - CRB-8 - 6828 Impresso por: Viver e trabalhar em uma sociedade global é um grande desaio para todos os cidadãos. A busca por tecnologia, informação, conhecimento de qualidade, novas habilidades para liderança e so- lução de problemas com eiciência tornou-se uma questão de sobrevivência no mundo do trabalho. Cada um de nós tem uma grande responsabilida- de: as escolhas que izermos por nós e pelos nos- sos farão grande diferença no futuro. Com essa visão, o Centro Universitário Cesumar assume o compromisso de democratizar o conhe- cimento por meio de alta tecnologia e contribuir para o futuro dos brasileiros. No cumprimento de sua missão – “promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, formando proissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária” –, o Centro Universi- tário Cesumar busca a integração do ensino-pes- quisa-extensão com as demandas institucionais e sociais; a realização de uma prática acadêmica que contribua para o desenvolvimento da consci- ência social e política e, por im, a democratização do conhecimento acadêmico com a articulação e a integração com a sociedade. Diante disso, o Centro Universitário Cesumar al- meja ser reconhecido como uma instituição uni- versitária de referência regional e nacional pela qualidade e compromisso do corpo docente; aquisição de competências institucionais para o desenvolvimento de linhas de pesquisa; con- solidação da extensão universitária; qualidade da oferta dos ensinos presencial e a distância; bem-estar e satisfação da comunidade interna; qualidade da gestão acadêmica e administrati- va; compromisso social de inclusão; processos de cooperação e parceria com o mundo do trabalho, como também pelo compromisso e relaciona- mento permanente com os egressos, incentivan- do a educação continuada. Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está iniciando um processo de transformação, pois quan- do investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou proissional, nos transformamos e, consequente- mente, transformamos também a sociedade na qual estamos inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportunidades e/ou estabelecendo mudanças capa- zes de alcançar um nível de desenvolvimento compa- tível com os desaios que surgem no mundo contem- porâneo. O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens se educam juntos, na transformação do mundo”. Os materiais produzidos oferecem linguagem dialó- gica e encontram-se integrados à proposta pedagó- gica, contribuindo no processo educacional, comple- mentando sua formação proissional, desenvolvendo competências e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em situação de realidade, de maneira a inse- ri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal objetivo “provocar uma aproxi- mação entre você e o conteúdo”, desta forma possi- bilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos conhecimentos necessários para a sua formação pes- soal e proissional. Portanto, nossa distância nesse processo de cres- cimento e construção do conhecimento deve ser apenas geográica. Utilize os diversos recursos peda- gógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possi- bilita. Ou seja, acesse regularmente o AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns e en- quetes, assista às aulas ao vivo e participe das discus- sões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de professores e tutores que se encontra disponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranqui- lidade e segurança sua trajetória acadêmica. Professora Dra. Rachel de Maya Brotherhood Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Alagoas (1970), especialização em Métodos e Técnicas de Ensino pela Universidade Federal do Ceará (1974), mestrado em Psicologia Educacional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1977) e doutorado em Psicologia Escolar pela Universidade de São Paulo (1994) . Professora Me. Waléria Henrique dos Santos Leonel Possui graduação em Psicologia pelo Centro Universitário de Maringá (2003). Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em Psicologia Clínica, Psicologia da Aprendizagem, Psicologia Escolar e Psicologia do Desenvolvimento. Pós-graduada em nível de Mestrado em Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá. Especialização em Trabalho Pedagógi- co em Educação Infantil (UEL). Pós- graduação em Docência para o Ensino Superior (Centro de Ensino Superior do Paraná). Pós-graduação em Atendi- mento Educacional Especializado Educação Especial e Inclusiva pelo Centro Universitário de Maringá . A U T O R A S SEJA BEM-VINDO(A)! Prezado(a) acadêmico(a), nossa disciplina, Psicologia da Educação, é um dos fundamen- tos da prática pedagógica. Seu estudo nos possibilita uma visão do educando por meio de seus processos de desenvolvimento e também descreve as maneiras como a apren- dizagem ocorre e quais são os seus condicionantes. Sabendo da importância desta disciplina e também do seu apelo motivacional para to- dos os acadêmicos(as), pois também favorece a compreensão dos nossos próprios pro- cessos de desenvolvimento, esperamos que você encontre no seu estudo o prazer da busca de uma qualiicação que possa fazer da proissão docente o seu futuro e também a compreensão do seu próprio eu, pelo entendimento dos processos de sua construção. O material foi escrito em duas mãos, por uma proissional da Educação e uma da Psi- cologia, ambas atuantes no campo da docência, mais especiicamente, no ensino da Psicologia Escolar. Compreendemos a importância de uma abordagem pluridisciplinar dos fenômenos que ocorrem na escola, dentre os quais se incluem os processos de de- senvolvimento e aprendizagem de crianças e jovens. Assim, a Psicologia é um dentre outros fundamentos da ação educativa e base de compreensão dos fenômenos indivi- duais e sociais que condicionam e ao mesmotempo resultam dos processos educativos que ocorrem no contexto escolar. Assim, esperamos que você faça uma relexão crítica sobre as teorias apresentadas e busque, a partir destes referenciais, reletir sobre a prática pedagógica possível e neces- sária para que a escola possa contar com o vigor e a esperança da sua ação fundamen- tada cientiicamente para promover uma transformação social na busca de realidades mais justas, igualitárias e solidárias. Somos a professora Rachel Brotherhood e a professora Waléria Henrique dos Santos Le- onel e elaboramos este material sobre Psicologia da Educação. Queremos ajudá-lo(a) a ler o material para que ele atinja seu objetivo. A inalidade desta apresentação é fa- vorecer a sua compreensão do livro, que trata dos processos psicológicos e sociais que ocorrem na escola. A Psicologia da Educação reúne estudos de diversas áreas, buscando compreender o homem e explicar os processos sociais, cognitivos e afetivos no qual ele se insere. Para explicá-lo(a), a Psicologia lança mão da sociologia, da epistemologia, da antropologia, dentre outras ciências, cujo objeto de estudo também é o ser humano. Na unidade I deinimos aprendizagem e mostramos que o sentido deste termo está li- gado a diferentes visões epistemológicas. Assim, no início do nosso livro, conceituamos aprendizagem, seus objetivos e outros conceitos básicos, como os conceitos de me- tacognição, raciocínio e estratégias de aprendizagem, além de apresentarmos alguns fatores interferentes no processo, e indicarmos as possibilidades de trabalhar com tais conceitos, isto é, as diferentes teorias pedagógicas às quais eles correspondem. Aborda- mos também os objetivos do processo formal de educação. APRESENTAÇÃO PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO Na unidade II abordamos algumas teorias explicativas do desenvolvimento. Inicial- mente, falando de determinantes do desenvolvimento, destacamos as diferentes posturas e ênfases nos determinantes genéticos e ambientais. Em seguida, falamos das teorias de desenvolvimento. Apresentamos conceitos básicos da Análise do Comportamento, prática que se apoia nos princípios do Behaviorismo para explicar a aprendizagem. Posteriormente, discutimos o Construtivismo Interacionista e So- ciointeracionista, no qual a ênfase concentra-se nos processos de pensamento e nos comportamentos que reletem tais processos. Para demonstrar o construtivismo, apresentamos os pontos de vista de Piaget e Vy- gotsky sobre como se aprende. Expomos a Epistemologia Genética (Piaget) e a Teo- ria Histórico-Cultural (Vygotsky). Piaget enfatiza o processo de construção de novos conhecimentos a partir dos conhecimentos anteriores, mas com uma explicação baseada na biologia. Já Vygotsky ressalta as relações sociais, nos fatores contextuais mediados que afetam o desenvolvimento. Para este autor, o indivíduo aprende por meio de internalizações possibilitadas pela interação social. Dando continuidade às abordagens do processo de aprendizagem/desenvolvimen- to, chegamos ao Humanismo. Este tira o foco da aprendizagem tanto dos processos cognitivos como do processo de condicionamento e o coloca na visão do indivíduo como constituído de várias dimensões, em que a dimensão afetiva atinge direta- mente as dimensões cognitiva e comportamental. Na unidade III discutimos o desenvolvimento cognitivo descrito por Piaget. Para o autor, o desenvolvimento cognitivo da criança avança em uma série de quatro es- tágios que envolvem tipos qualitativamente distintos de operações mentais, nos quais você irá conhecer a partir da leitura do livro. A seguir, na unidade IV, abordamos o processo de desenvolvimento da personalida- de, com uma apresentação da Teoria Psicanalítica de Sigmund Freud. Uma aborda- gem psicanalítica do desenvolvimento é a busca de uma explicação dos processos de desenvolvimento ou a tentativa de explicar os fatos relativos a esses processos, pelos conceitos fundamentais da psicanálise. Freud defende que o desenvolvimen- to humano é moldado por forças inconscientes que você terá oportunidade de es- tudar na unidade. Dando sequência em nosso estudo, abordamos, na unidade V, temas de relevância para a sociedade contemporânea, os quais foram selecionados dentre outros que também são importantes. O critério de escolha dos temas foram seus relexos no ambiente escolar e sua força determinante no processo de aprender e na relação professor – aluno. Falamos de violência, um tema que perpassa vários outros, tais como: relações na escola, falta de interesse ou de esforço nas atividades escolares, constituição fami- liar, consumismo etc. APRESENTAÇÃO A violência escolar, sobre a qual vamos direcionar nossa atenção ao bullying, é uma temática que exige nossa relexão, pois na atualidade é uma questão que tem se tor- nado desaiadora e resulta em consequências extremamente negativas para as pes- soas envolvidas e para o ambiente escolar. A unidade V ainda abrange o conceito e a importância da família na formação do indivíduo, a educação moral e a socialização, e diferentes maneiras de enfrentar os dilemas da escola. Na leitura desta unidade, procure questionar o texto, dialogar com ele, complementá-lo e enriquecê-lo com sua própria experiência. Esperamos, com esse enfoque da Psicologia da Educação, favorecer sua formação proissional, dando ao ensino um caráter de prática social viva e multidisciplinar, cientiicamente fundamentada e individualmente compreendida e construída. Bom estudo! APRESENTAÇÃO SUMÁRIO 11 UNIDADE I APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS 17 Introdução 18 Aprendizagem e Desenvolvimento Humano: Conceitos Básicos 24 Fatores que Inluenciam a Aprendizagem 25 Desenvolvimento 26 A Psicologia Evolutiva no Século XX 30 Compreendendo as Inluências do Processo de Maturação e do Ambiente no Desenvolvimento 34 Compreendendo o Desenvolvimento na Ênfase Sócio-Histórica Cultural 34 Fatores Determinantes do Desenvolvimento 42 Considerações Finais UNIDADE II TEORIAS DE DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM 51 Introdução 52 Diferentes Abordagens Teóricas do Processo de Aprendizagem 69 Considerações Finais SUMÁRIO UNIDADE III DESENVOLVIMENTO SÓCIOCOGNITIVO NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA 77 Introdução 78 O Desenvolvimento Segundo Jean Piaget 88 O Desenvolvimento Moral 90 Moral da Obediência e Moral de Cooperação 91 Considerações Finais UNIDADE IV O DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE 101 Introdução 102 Desenvolvimento da Personalidade 105 A Teoria Psicanalítica de Sigmund Freud 110 Fases de Desenvolvimento Psicossexual 113 Considerações Finais SUMÁRIO 13 UNIDADE V TEMAS EMERGENTES NA ESCOLA CONTEMPORÂNEA 123 Introdução 124 Socialização: Emancipação ou Normatização? 128 Violência na Escola – O Bullying 134 Educação Moral 140 Atuando na Formação Intelectual e Social: Ensino para a Compreensão 143 Ambiente Familiar 152 Atuando na Área da Interação Social: uma Proposta Teórica 161 Atuando na Formação Moral do Indivíduo 163 Considerações Finais 171 Conclusão 173 Referências 181 Gabarito U N ID A D E I Professora Dra. Rachel de Maya Brotherhood Professora Me. Waléria Henrique dos Santos Leonel APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS Objetivos de Aprendizagem ■ Estudar a Psicologia da Educação como área do conhecimento: objeto de estudo. ■ Compreender as principais dimensões da Psicologia da Educação. ■ Conhecer o processo de desenvolvimento e aprendizagem em diferentes abordagens teóricas. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: ■ Aprendizagem e desenvolvimento humano: conceitos básicos ■ Fatores que inluenciam a aprendizagem ■ Desenvolvimento ■ A psicologia evolutiva no século XX ■ Compreendendo as inluências do processo de maturação e do ambiente no desenvolvimento ■ Compreendendo o desenvolvimento na ênfase sócio-histórica cultural ■ Fatores determinantesdo desenvolvimento INTRODUÇÃO O homem é um ser em desenvolvimento, logo, frente a sua complexidade, muitas ciências buscam compreender e explicar como esse desenvolvimento acontece. Entre algumas ciências como a medicina, a biologia, encontramos a psicologia, que, a partir de teorias explicativas, auxilia na compreensão do homem, nos seus aspectos biopsicossociais. Pensando no processo de desenvolvimento cognitivo, debruçamos na compreensão das teorias da Psicologia da Educação, esta vem para auxiliar e somar aos proissionais no entendimento desse homem. Dessa forma, entendemos que o proissional da área da educação tem uma inluência decisiva e uma grande responsabilidade com a formação de crianças e jovens. A Psicologia irá auxiliar o trabalho do professor e poderá compreender os processos de desenvolvimento e aprendizagem que são descritos e explica- dos pela Psicologia Escolar, que tem como objeto de estudo o ser humano nas dimensões consideradas e indica diretrizes para que os proissionais da educação encaminhem com cientiicidade a sua prática. Justiica-se, assim, a importância da disciplina Psicologia Escolar no currículo. Vamos estudar três dimensões do desenvolvimento humano essenciais para a compreensão do processo ensino-aprendizagem – o desenvolvimento da per- sonalidade, o desenvolvimento cognitivo e o desenvolvimento sociocultural. As teorias escolhidas para a análise dessas dimensões são as de Freud, Piaget e Vygotsky, respectivamente. O desaio é, partindo dessas teorias, chegarmos à compreensão do indivíduo, buscando entender o particular, mas o particular inserido no social; sendo uma compreensão dialética, que dá corpo a uma relexão sobre as múltiplas conexões desses processos individuais na unidade homem-mundo, considerando como referencial, sobretudo, o ambiente escolar, e como critério a relação teoria-prática. Introdução R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 17 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E18 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS Descrevemos, a seguir, os principais enfoques dados pela Psicologia Educacional no processo de aprendizagem. Nosso estudo tem como ponto central as aborda- gens citadas anteriormente, no entanto, frente a sua importância, apresentaremos os pressupostos teóricos do Comportamentalismo e Humanismo, por possuir inluência na educação. Analisaremos algumas práticas pedagógicas preconi- zadas na atualidade (Skinner, Piaget, Vygotsky e Rogers), iniciando com uma apresentação de alguns conceitos e ideias que fundamentam as propostas peda- gógicas que serão vistas. A Psicologia da Aprendizagem é um ramo da Psicologia Educacional cujo interesse, historicamente documentado, é “contribuir para a formação intelectual dos alunos com a qualidade de suas aprendizagens, bem como com o seu completo desenvolvimento pessoal e social” (BORUCHOVITCH; BZUNEK, 2004, p. 7). Muitas vezes, nas licenciaturas ou mesmo na pós-graduação, o aluno se pergunta: “por que preciso estudar psicologia, se não pretendo ser psicólogo?”. Acontece que a Psicologia tem o mesmo objeto de estudo, de interesse de outros campos do saber, o ser humano. Na Educação e na Psicologia, as relações com o outro são o eixo central, para construir a prática pedagógica nos complexos espaços interativos da escola precisamos buscar na psicologia o entendimento dessas relações, assim, a compreensão dos processos de aprendizagem e desen- volvimento possibilita a construção de novas práticas pedagógicas, mais efetivas. Voltando à deinição de Psicologia Educacional, nela podemos identiicar Aprendizagem e Desenvolvimento Humano: Conceitos Básicos R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 19 duas dimensões: a primeira dimensão é o processo de aprendizagem dos alu- nos, a segunda, o seu desenvolvimento pessoal e social. Vejamos como cada um desses dois pontos pode ser abordado. O objetivo de promover a aprendizagem começa a ser alcançado mediante a compreensão de como o aluno aprende. Esse fenômeno envolve processos e fato- res. Em outras palavras, saber como acontece a aprendizagem constitui-se em elemento facilitador e promotor do desenvolvimento de estratégias de ensino mais eicazes. Salientando os processos, vejamos alguns conceitos. ■ APRENDIZAGEM – comportamento novo e relativamente estável, que aparece em decorrência da experiência ou do treino, uso de conhecimento na resolução de problemas, construção de novos signiicados, de novas estruturas cognitivas, aquisição de informação etc. ■ COMO APRENDEMOS – por imitação, insight, condicionamento e raciocínio; o raciocínio é a forma de aprender exclusiva do ser humano. ■ RACIOCÍNIO – operação mental que envolve: prever, julgar, plane- jar, levantar hipóteses, fazer deduções, avaliar a situação para encontrar soluções. O processo de ensino consiste em promover a aprendizagem do aluno. Sendo a aprendizagem um processo interno, a função da escola e do professor é levar o aluno a dominar esse processo, desenvolvendo estratégias de aprendizagem. ■ ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM – ações mentais e comporta- mentos com os quais se envolve o aluno durante a aprendizagem, com o objetivo de realizar a codiicação e assim possibilitar a aquisição e o pro- cesso de recuperação das informações armazenadas na memória. Tornar-se um processador de informações eicaz e conhecer diferentes estraté- gias de aprendizagem, bem como saber por que, como e quando usá-las, torna o sujeito um bom aprendiz. ■ OBJETIVOS – Houve um momento na história da educação brasileira, quando o paradigma dominante era o do Tecnicismo (últimas décadas do século XX), em que os objetivos de aprendizagem, formulados de maneira comportamental, estavam voltados, sobretudo, para as questões de con- teúdos. Nesta perspectiva, APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E20 a pesquisa cientíica, a tecnologia educacional, a análise experimental do comportamento garantem a objetividade da prática escolar, uma vez que os objetivos instrucionais (conteúdos) resultam da aplicação de leis naturais que independem dos que a conhecem ou executam (LIBÂ- NEO, 1985, p. 29). Pode-se dizer que a formulação de objetivos educacionais como exigência para a realização de uma prática pedagógica eiciente se traduzia, a partir de meados da década de 1950, na utilização da taxionomia de objetivos educacionais de Benjamim Bloom (domínio cognitivo 1956 e domínio afetivo 1964), proposta que sustentava o pragmatismo economicista norte-americano e correspondia à Pedagogia Tecnicista (LUCKESI, 2011). Os objetivos comportamentais da prática pedagógica deveriam colocar ênfase no conteúdo e deinir critérios de execução e parâmetros de avaliação eicientes, capazes de direcionar a prática escolar. Funcionavam quase como uma “camisa de força” da ação do professor, não permitindo nenhuma lexibilidade e/ou adap- tação às características dos alunos. Com o advento das denominadas Pedagogias Críticas, a formulação de objetivos foi amplamente atacada e inalmente perdeu seu signiicado no pla- nejamento escolar. Atualmente, observa-se um movimento de retomada desse processo com uma conotação diferente (LUCKESI, 2011). O autor defende que há, na formu- lação de objetivos comportamentais, uma qualidade a ser retomada neste início deséculo XXI e argumenta que os objetivos trazem: O entendimento e a coniguração clara do que se deseja ao exercitar as práticas pedagógicas no ensino escolar, formulado em termos precisos e organizados, tendo por base processos fundamentais da psicologia humana relacionados com o ensino e a aprendizagem (LUCKESI, 2011, p. 39). Para Luckesi (2011, p. 39), a formulação de objetivos possibilita “[...]uma ges- tão eiciente, que se assenta no tripé planejamento, execução efetiva e avaliação consistente” do processo educativo que considera os seus determinantes ilosó- icos e práticos1. 1 Leia na íntegra o artigo: LUCKESI, Cipriano. Taxonomia: de objetivos educacionais – sessenta anos depois. Educatrix: a Aprendizagem e Desenvolvimento Humano: Conceitos Básicos R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 21 O que se observa atualmente é que a educação tem trabalhado com obje- tivos mais amplos e está voltada para um enfoque pluridimensional da ação pedagógica, que considera as dimensões técnica, política, ética e estética, além da dimensão de transmissão e domínio dos conteúdos produzidos pela huma- nidade, pela ciência. Essa mudança de foco, ampliação do foco da ação educativa sistematizada está ligada diretamente a uma visão mais política do processo educativo e à responsa- bilidade da escola com a formação de cidadãos capazes de intervir na realidade, por meio da criação de saberes e valores na busca da realização do bem comum. Assim, a inalidade do trabalho educativo seria, segundo Rios (2006, p. 61), uma educação que buscaria “[...]a realização do bem comum, como inalidade da ação coletiva dos seres humanos vivendo em sociedade”. Para cumprir tal inalidade, a autora defende o equilíbrio na articulação de todas as capacidades dos seres humanos, tanto para intervir na realidade como para se relacionar com os seus semelhantes, entretanto, também enfatiza a importância dos conteúdos nessa ação e destaca que o valor destes estaria em não se restringir a conceitos, mas englo- bar também comportamentos e atitudes como explicitado na seguinte citação: Se a educação é um processo contínuo de busca de um saber ampliado e aprofundado, de um viver inteiro, é preciso que os indivíduos estejam inteiros nesta busca. Ao lado da razão, a imaginação, os sentimentos, os sentidos são instrumentos de atuação na realidade e criação de saberes e valores. O bom ensino será, então, estimulador do desenvolvimento desses instrumentos/capacidades (RIOS, 2006, p. 61). Este posicionamento corresponde à proposta pedagógica Progressista Libertadora de Paulo Freire que vê a educação como “[...]uma atividade onde professores e alunos, mediatizados pela realidade que apreendem [...], atingem um nível de consciência dessa mesma realidade, a im de nela atuarem num sentido de trans- formação social” (LIBÂNEO, 1985, p. 33). Paulo Freire, em seu livro Pedagogia da Autonomia (1996), abordando a for- mação do professor em uma perspectiva ampla e multidimensional, apresenta nove pressupostos da prática docente que contêm as diretrizes da sua doutrina2 Revista que pensa a Educação, Natal: Editora Moderna, ano 1, n. 1, p. 39-47, set. 2011. Disponível em: <http://issuu.com/ ed_moderna/docs/educatrix_edicao_01>. Acesso em: 22 abr. 2015. 2 Os pressupostos apresentados e explicitados por Paulo Freire em sua obra “Pedagogia da Autonomia” (1996) são: APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E22 e airma que, no processo de ensinar/aprender, “[...]participamos de uma expe- riência total, diretiva, política, ideológica, gnosiológica, pedagógica, estética e ética [...]” (FREIRE, 1996, p. 24). A citação nos mostra que o enfoque do autor, tão representativo do pensamento pedagógico da atualidade, coincide com a perspectiva de formação do cidadão pela escola, como exposto anteriormente. Por outro lado, Pimenta (1999 apud RIOS, 2006, p. 27), questionando tam- bém o aspecto das inalidades da educação, pergunta: Como garantir que todos os alunos se apropriem dos instrumentos ne- cessários para se situarem no mundo? Como estabelecer os vínculos entre conhecimentos, formação cultural, desenvolvimento de hábitos, atitudes e valores? Para que ensinar? Que materiais, equipamentos, mídias preci- sam ser mobilizados no processo de ensino? Diante desses questionamentos, vemos que, embora a posição de muitos cientistas da educação seja acerca da necessidade de uma educação voltada para a formação integral do educando, ainda se está em busca de formas efetivas de atingir as ina- lidades e objetivos da educação no século XXI. No entanto há alguns construtos que permanecem presentes na nossa prática pedagógica e que são objetivos pre- liminares que possibilitam a busca das inalidades da edu- cação da maneira como já foram defendidas. Estamos falando da Motivação e da Autorregulação, que fazem parte dos processos Metacognitivos dos seres humanos e que abordare- mos a seguir. ENSINAR EXIGE: 1) rigorosidade metódica; 2) pesquisa; 3) respeito aos saberes dos educandos; 4) criticidade; 5) estética e ética; 6) corporeiicação das palavras pelo exemplo; 7) risco, aceitação do novo, rejeição a qualquer forma de discriminação; 8) relexão crítica sobre a prática; 9) reconhecimento e assunção da identidade cultural. Aprendizagem e Desenvolvimento Humano: Conceitos Básicos R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 23 ■ AUTORREGULAÇÃO – controle do comportamento, das emoções e dos processos cognitivos. ■ MOTIVAÇÃO – construto central da autorregulação e do desenvolvi- mento de todas as formas de controle voluntário; a etimologia da palavra sugere que “motivo” é aquilo que move uma pessoa, que a põe em ação ou a faz mudar de curso e assegura a persistência em uma atividade (BZUNECK, 1987 apud BORUCHOVITCH; BZUNECK, 2001). É um processo psicológico dinâmico, presente em qualquer atividade humana. Em sala de aula, leva o aluno a envolver-se em atividades pertinentes ao seu processo de aprendizagem, escolhendo um curso de ação dentre outros possíveis e ao seu alcance. É a motivação que assegura a ocorrência de produtos de aprendizagem ou tipos de desempenho socialmente valoriza- dos. Atualmente, com a notável prevalência das abordagens cognitivistas e sócio-históricas da aprendizagem, e com o destaque na importância do outro signiicativo no desenvolvimento e na aprendizagem, o estudo da motivação do aluno tem-se voltado para os componentes internos da motivação, cognitivos, como metas, crenças, atribuições, percep- ções, com destaque para a crença na autoeicácia e outras variáveis ligadas ao self, como autorrealização, satisfação, medo, ansiedade, entre outras, e também para o processo de socialização, pois a presença do outro é fundamental para a aprendizagem e o desenvolvimento. Pode-se dizer que a escola deve trabalhar no sentido de desenvolver a motivação do aluno na busca de sua autorregulação cognitiva, emocional e social, que promove uma educação para a vida e o exercício da cidadania. Considerando todos os aspectos motivacionais e autorregulares, pode-se airmar que o desenvolvimento cognitivo é: ■ Exercer controle sobre a atenção e os processos de memória. ■ Desenvolver regras e estratégias para pensar e resolver problemas. ■ Organizar o pensamento e ajustar o comportamento (curso da ação) sem- pre que necessário. APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d efe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E24 Tal processo de busca da autorregulação visa substituir a regulação externa assis- tida por uma autorregulação baseada nas ferramentas adquiridas na relação com o outro, chegando o aluno a um controle consciente, relexivo. Segundo Ribeiro (2003), a partir dos estudos de Flavel e Wellman (1977), entendemos que a metacognição é a capacidade de compreendermos o que foi aprendido. É a capacidade de irmos além de nossa capacidade de pensar, e de ser autorrelexivos, isto é, pensar sobre seus pensamentos de forma consciente. Clariicando, “[...]metacognição signiica para além da cognição, isto é, a faculdade de conhecer o próprio ato de conhecer, ou, por outras palavras, consciencializar, analisar e avaliar como se conhece” (RIBEIRO, 2003, p. 109). Alunos com desempenho escolar insatisfatório apresentam claros atrasos no desenvolvimento metacognitivo, ou seja, um dos pontos principais de diferença entre alunos com alto e baixo desempenho escolar é o grau de autorregulação da aprendizagem deles. FATORES QUE INFLUENCIAM A APRENDIZAGEM Pensemos agora em alguns fatores determinantes da aprendizagem do aluno. Destacamos que aqui vamos apenas citá-los, já que pretendemos abordá-los com maior profundidade dentro do enfoque das três teorias que serão estudadas no nosso curso. Podemos dividir esses fatores, para ins didáticos, em: ■ FATORES INTRAPESSOAIS – são fatores internos e individuais, que resultam de capacidades genéticas, história de vida, situações informais e formais de aprendizagem, entre outros. Como exemplo, podemos citar: idade mental, nível de inteligência, maturidade emocional, prontidão, com- portamentos sociais, padrões familiares, motivação. Também podemos falar de temperamento, personalidade, nível de inteligência e autoeicácia. ■ FATORES SITUACIONAIS – os interpessoais são fatores do contexto social. O contexto escolar possibilita interação com os pares, interação professor-aluno, socialização. Esses aspectos contextuais possibilitam o Desenvolvimento R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 25 atendimento da necessidade do indivíduo de pertencer e estabelecer vín- culos essenciais na construção da identidade e têm relexos importantes na aprendizagem e no desenvolvimento humano. Destacamos que com- portamentos desadaptados, disfuncionais ou patologias mais severas na adolescência e na vida adulta podem ser resultantes ou agravados por vivências escolares. Ressaltamos que os aspectos intrapessoais e situacionais da aprendizagem não se opõem nem representam uma divisão dicotômica, mas são inseparáveis e se constituem em visões complementares de um mesmo fenômeno psicológico, a aprendizagem. Dessa forma, devemos reletir sobre a formação do professor na atualidade, pois, a prática desse tem grande importân- cia, fortalecendo também nas discussões sobre os aspectos psicológicos e socioemocionais dos alu- nos. Vejamos no próximo item como podemos caracterizar o desenvolvimento e como esse pro- cesso se relaciona com a aprendizagem. DESENVOLVIMENTO O ser humano é dotado de capacidades como a memória, pensamento, lingua- gem, inteligência. Ainda podemos mencionar a capacidade motora, física, nosso comportamento, entre muitas outras, mas para entender como tudo isso se forma e também muda no homem no decorrer da vida, é de interesse do campo da Psicologia do Desenvolvimento, também conhecida de Psicologia Evolutiva. Griggs (2009, p. 236) nos diz que “A psicologia do desenvolvimento é o estudo cientíico do desenvolvimento biológico, cognitivo, social e da persona- lidade ao longo de todo o período da vida”. APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E26 Porém, para compreender as questões evolutivas sob uma perspectiva psicoló- gica, faz-se necessária uma relexão sobre alguns núcleos conceituais signiicativos, tais como: as bases das grandes orientações teóricas da Psicologia Evolutiva, os conceitos de aprendizagem e de desenvolvimento decorrentes dessas orientações, o signiicado de estágios de desenvolvimento ou períodos críticos, dentre outros. Só partindo dessas relexões poderemos entender as orientações predomi- nantes na atualidade sobre o desenvolvimento do ser humano, vendo-o não como determinado exclusivamente pela herança biológica nem pela força do ambiente, mas como fenômeno histórico e culturalmente determinado. Para chegar a essa compreensão, iniciamos este item apresentando as prin- cipais orientações teóricas da Psicologia Evolutiva no último século. A seguir, explanamos o conceito de desenvolvimento adotado por alguns autores repre- sentativos da Psicologia Evolutiva e o papel atribuído à herança e ao ambiente por esses autores. Para concluir, aprofundamos um pouco as visões de Piaget e Vygotsky neste campo. A PSICOLOGIA EVOLUTIVA NO SÉCULO XX3 O objeto de estudo da Psicologia Evolutiva é toda a vida das pessoas e os pro- cessos de mudanças psicológicas que nela ocorrem. Durante séculos, essa preocupação não esteve presente na ciência psicoló- gica, uma vez que a Psicologia fazia parte do campo da Filosoia e seu objeto central decorria das visões de homem e de mundo predominantes nas teorias ilosóicas e da resultante relação sujeito-objeto do conhecimento. Os principais autores que se ocuparam especiicamente das questões evoluti- vas sob uma perspectiva psicológica situam-se na segunda metade do século XIX e nas primeiras décadas do século XX, porém, as bases das grandes orientações 3 As ideias expostas neste item são defendidas principalmente por Pallacios (1988 apud COLL; MARCHESI; PALACIOS, 2004). A Psicologia Evolutiva no Século XX R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 27 teóricas da Psicologia Evolutiva se encontram em época bem anterior. No século XVII e XVIII, encontramos os britânicos John Lock e David Hume, cujos posi- cionamentos ilosóicos são conhecidos como empirismo. Dentre as principais ideias de Lock encontra-se a conhecida metáfora segundo a qual, no momento do nascimento, a mente humana seria uma folha em branco, uma ‘tábula rasa’. O conteúdo psíquico seria resultante apenas da experiência que o indivíduo adquire em contato com o meio, da estimulação que recebe. Para dizê-lo de forma mais clássica, remetendo a Aristóteles, “[...]nada existe na inteligência que não tenha passado antes pelos sentidos”. Fundados nesse princípio estão, de forma geral, os modelos mecanicistas de desenvolvimento, de base behaviorista. Resumindo esta visão, podemos dizer que o empirismo ilosóico inglês do século XVIII fundamenta, mais de duzentos anos depois, o Condutivismo Psicológico, que defende que a história psicológica das pessoas não é mais do que a história de suas aprendizagens. De forma diferente, Jean Jacques Rousseau e Immanuel Kant (século XVIII) exempliicam o ponto de vista acerca da existência de determinadas categorias inatas no ser humano. Rousseau pensava sobre a bondade natural da criança; e Kant, a existência de categorias inatas de pensamento. Rousseau também sugere uma divisão da infância em estágios, cada um dos quais apresentando características próprias e exigindo tratamento educacional diferenciado. Essa abordagem inatista-maturacionista parte do princípio de que fatores hereditários ou fatores maturacionais têm mais importância para o desenvolvi- mento da criança e para a determinação de suas capacidades do que os fatores relacionados à aprendizagem e também à experiência (FONTANA; CRUZ, 1997). Podemospensar que a hereditariedade é um conjunto de qualidades que estão ixadas no indivíduo desde o nascimento, ou seja, é sua herança gené- tica que não dependeria inicialmente de fatores externos. Para os teóricos que defendem tal pensamento, a inteligência, as aptidões individuais, traços como a cor dos olhos, são características herdadas e independem da aprendizagem e da experiência (FONTANA; CRUZ, 1997). APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E28 Vale ressaltar que é também neste período (século XVII, XVIII) que movi- mentos culturais e religiosos, como o IIuminismo e o Protestantismo, deram origem a uma visão de infância diferente daquela da Idade Média. Pois até então considerava-se a criança como adultos menores, mais frágeis e menos inteligen- tes. Na Idade Média, as crianças se tornavam aprendizes no sistema de trabalho a partir dos 7 anos, sob a tutela de um adulto, passando a ter responsabilidades que se tornavam progressivamente mais próximas daquelas do adulto. Os avanços das descobertas cientíicas oportunizaram que se diminuísse o índice de mortalidade infantil até então, muito comum nesse período da história, ainda no século XVII, de forma gradativa, passou-se a considerar a criança como dife- rente do adulto, o que até então não ocorria, a ela era permitido participar de todas as atividades dos adultos, incluindo trabalho e festas (FONTANA; CRUZ, 1997). Segundo Fontana e Cruz (1997), no século XVIII, Rousseau traz suas ideias sobre a criança apontando a diferenciação do funcionamento da mente da criança e do adulto, possibilitando com isso o estudo da criança e do seu comportamento numa visão cientíica. As ideias dos ilósofos da época inluenciaram o pensa- mento de grandes nomes na história da Psicologia. Esses estudos cientíicos somente se efetivaram no século XX e se estendem até a atualidade por meio de pesquisas na busca de compreender o desenvolvimento infantil, sendo de inte- resse da Psicologia Evolutiva. A Psicologia Evolutiva tem raízes na concepção Inatista de desenvolvimento, a qual enfatiza os fatores inatos do desenvolvimento na determinação de aptidões individuais. Com essa linha de pensamento foram se desenvolvendo os primei- ros estudos com foco na avaliação da inteligência humana. Podemos citar, como um grande nome, Alfred Binet (1857-1911), que focou seus estudos na avalia- ção da inteligência por meio de testes (FONTANA; CRUZ, 1997). Os estudiosos começaram a trabalhar a partir de um modelo de teoria evo- lucionista, entendendo o homem como determinado biologicamente restando ao ambiente pouca inluência (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Com o interesse cientíico pela criança no inal dos séculos XIX e início do XX, surgem várias abordagens na busca pela compreensão dos processos de desenvolvimento e aprendizagem, com uso de diferentes métodos de acordo com cada ênfase teórica (FONTANA; CRUZ, 1997). A Psicologia Evolutiva no Século XX R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 29 Piletti, Rossato e Rossato (2014) nos dizem que na perspectiva empirista nosso desenvolvimento é inluenciado e determinado pelo ambiente no qual estamos inseridos, sofremos inluência do meio social e físico. Nesta perspectiva, para o aprendizado são importantes a experiência e o ambiente, não enfatizando a hereditariedade no seu desenvolvimento. Na visão interacionista do ambiente e da hereditariedade, os teóricos que a defendem airmam que a interação pode ocorrer desde a concepção, não impedindo que se destaque um ou outro aspecto ao longo do desenvolvimento (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Concluindo essa discussão sobre a importância dada à hereditariedade ou ao meio no processo de desenvolvimento, bem como a origem dessas posições, podemos apresentar a visão atualmente predominante na Psicologia sobre o tema. Segundo Papalia, Olds e Feldman (2009), algumas inluências têm origem prin- cipalmente na hereditariedade – traços inatos ou características herdadas dos pais biológicos. Outras vêm do meio (interno e externo) – o mundo que está do lado de fora do eu e que começa no útero, e a aprendizagem está relacionada à experiência. Para as autoras, os cientistas já são capazes de deinir com mais pre- cisão, em uma determinada população, o papel da hereditariedade e do ambiente no desenvolvimento de alguns traços. Assim, traços como a inteligência, por exemplo, são inluenciados fortemente pela hereditariedade, “[...]a estimulação parental, a educação, a inluência dos amigos e outras variáveis também a afe- tam” (PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2009, p. 14). Arnold Gessel (1880-1961) foi o maior expoente das teorias do desenvol- vimento que dão ênfase à maturação. É considerado o primeiro psicólogo escolar norte-americano. Entre muitas obras do autor, destacamos: GESSEL, A. L. A criança dos 0 aos 5 anos. São Paulo: Martins Fontes, 1996. Fonte: Fontana; Cruz (1997). APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E30 Pode-se concluir, portanto, que embora ainda exista algum debate sobre a questão da importância relativa da natureza e da experiência no desenvolvi- mento, muitos teóricos acreditam que esses dois fatores operam juntos e estão buscando formas de determinar como essa operação se dá. COMPREENDENDO AS INFLUÊNCIAS DO PROCESSO DE MATURAÇÃO E DO AMBIENTE NO DESENVOLVIMENTO Deine-se maturação como “[...]o desdobramento de uma sequência natural de mudanças físicas e padrões de comportamento, que incluem a prontidão para adquirir novas habilidades como andar e falar”, resultantes de mudanças bioló- gicas no corpo e no cérebro (PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2009, p. 14). Os estudiosos do desenvolvimento parecem concordar sobre a importância do papel da maturação na emergência de capacidades típicas da primeira e da segunda infância. Pode-se, portanto, atribuir à maturação a emergência daqueles processos comuns a todos os indivíduos. Os eventos maturacionais, que embora apareçam em momentos ou ritmos diferentes, mantêm uma média de idade, decorrem das características herdadas do indivíduo. Dentre eles, podemos citar a primeira palavra, o primeiro passo, a primeira menstruação, o desenvolvimento do pensamento lógico, a menopausa, dentre outros. Vê-se que não são eventos relacionados apenas ao desenvolvimento biológico, mas também intelectual. Considerando o desenvolvimento intelectual, a visão maturacional levou à criação do conceito de Prontidão. Para Watson (1982 apud OLSON; TORRANCE, 2000), o conceito de Prontidão tem origem nas ideias de Comenius (1592-1670), que acreditava que a criança não estava pronta para o ensino formal antes dos seis anos. Já Rousseau (1712-1778), que tinha uma visão mais naturalista sobre as sensibilidades e capacidades iniciais da criança e defendia a importância das Compreendendo as Inluências do Processo de Maturação e do Ambiente no Desenvolvimento R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 31 experiências iniciais para o desenvolvimento, via a instrução formal como com- plemento à experiência que “[...]não deveria ser imposta até que as sensibilidades naturais da criança estivessem suicientemente desenvolvidas no inal da infân- cia ou na adolescência” (OLSON; TORRANCE, 2000, p. 132). William James (1842-1910) também argumentava a favor do início tardio do ensino formal, em funçãoda imaturidade intelectual da criança. Dewey (1859-1952), embora defendesse a possibilidade de desenvolvimento por meio da atividade da criança e a prontidão como dependente da interação entre a maturação e a experiência da criança ativa, acreditava que o ensino for- mal (da leitura) deveria esperar até que a criança chegasse aos oito anos de idade. Argumentava que “[...]a mente da criança pré-escolar é amplamente indiferen- ciada e egocêntrica” (OLSON; TORRANCE, 2000, p. 133). No século XX, a noção de prontidão surge na teoria de aprendizagem de Torndike (1874-1949). O autor falava de ‘unidades de condução neuronal’ que são ativadas quando determinado potencial de estímulo é satisfeito, mas defendia que haveria uma progressão constante por meio de vários platôs de capacidades gerais, portanto maturacionais. Continuando a apresentar o processo histórico de construção do conceito de prontidão e sua inluência no processo de aprendizagem formal, Olson e Torrance (2000) deinem prontidão como a maturidade biológica da criança que prepara e possibilita a aprendizagem. Assim, qualquer forma de apressar ou interferir no desenvolvimento seria considerado prejudicial. Pensando o ensino formal condicionado, a premissa supramencionada, a solução seria esperar até que a criança tenha amadurecimento suiciente para aprender, isto é, que esteja pronta. Vimos a aplicação desse princípio à educa- ção até bem recentemente, quando o processo de alfabetização era condicionado pela prontidão, o que resultava em submeter o ingresso da criança na educação formal ao atingimento da maturação biológica, aos seis ou sete anos de idade. Atualmente, existem métodos de pesquisa capazes de determinar com mais precisão, em uma determinada população, o papel da hereditariedade e do meio no desenvolvimento de alguns traços especíicos, no entanto, ainda existe muita discussão e polêmica sobre o tema da inluência desses fatores no desenvolvimento. APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E32 Tem-se a impressão de que há um predomínio entre teóricos e pesquisadores acerca da interação entre os dois fatores: há uma combinação entre meio e here- ditariedade na deinição do processo de desenvolvimento. Olson e Torrance (2000), em uma abordagem inovadora, deinem um novo conceito de prontidão, qual seja: a capacidade adaptativa dos indivíduos a exi- gências institucionais, que envolvem demandas sociais, físicas e intelectuais; conceito que está presente atualmente em nossas escolas, decorrente das novas visões de escola, de sala de aula e de educação, das descobertas da Psicologia do Desenvolvimento e das ‘novas pedagogias’. Em relação às inluências ambientais, considerando que os serem humanos são seres sociais e que o desenvolvimento não ocorre de forma descontextua- lizada, Papalia, Olds e Feldman (2009, p. 15-19) apresentam um conjunto de fatores que interferem no desenvolvimento. As autoras citam a família, os condi- cionantes socioeconômicos e a vizinhança, cultura e etnia, raça e etnia e contexto histórico. O contexto familiar, que é afetado pelos demais e tem atualmente uma nova coniguração, será abordado mais adiante na unidade V. A seguir, apresentamos os conceitos condensados dos fatores que abordamos. ■ Ambiente – totalidade das inluências não hereditárias ou experienciais sobre o desenvolvimento. ■ Família nuclear – unidade econômica e doméstica que compreende laços de parentesco envolvendo duas gerações e que consiste em um ou dois genitores e seus ilhos biológicos, adotados ou enteados. ■ Família extensa – rede de parentesco envolvendo muitas gerações formadas pelos pais, ilhos e outros parentes às vezes vivendo juntos no mesmo lar. ■ Condições socioeconômicas – combinação de fatores econômicos e sociais que descrevem um indivíduo ou uma família, que incluem renda, edu- cação e ocupação. ■ Cultura – modo de vida global de uma sociedade ou de um grupo, que inclui costumes, tradições, crenças, valores, linguagem e produtos mate- riais – todo comportamento adquirido que é transmitido dos pais para os ilhos. Compreendendo as Inluências do Processo de Maturação e do Ambiente no Desenvolvimento R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 33 ■ Grupo étnico – grupo unido por ancestralidade, raça, religião, língua e/ ou origens nacionais que contribuem para formar um senso de identi- dade comum. Papalia, Olds e Feldman (2009) trazem em sua obra uma interpretação do desen- volvimento afetado por todos os fatores já indicados e ressaltam que cada um deles pode inluir diferentemente, em função do momento em que estão pre- sentes na vida dos indivíduos. Para maior entendimento, em relação ao momento do desenvolvimento em que os fatores atingem o indivíduo, determinando o seu efeito no com- portamento, é importante trazer o conceito de períodos críticos ou sensíveis. Os períodos críticos seriam “[...]intervalos de tempo especíicos em que um determinado evento [ou fator] ou sua ausência causa grande impacto sobre o desenvolvimento” (PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2009, p. 21). Exemplos des- ses períodos, que deixam bem clara a sua importância para o desenvolvimento, são relacionados à vida intrauterina, como: mães submetidas a raios X ou que ingerem determinados medicamentos, ou contraem doenças, podem ter efeitos nocivos especíicos sobre seus fetos; na infância, alguns tipos de experiências também podem impedir o desenvolvimento de habilidades especíicas, como, por exemplo, a incapacidade de focar os dois olhos no mesmo objeto, que, se não for corrigida cirurgicamente logo no início da infância, pode impedir o desen- volvimento da percepção de profundidade. Outro conceito importante relacionado ao desenvolvimento é o da plasti- cidade, que, em contraposição ao conceito de períodos críticos, gera polêmica entre os cientistas, pois se sabe que mesmo no domínio biológico/neurológico há uma ‘modiicabilidade de desempenho’, uma capacidade adaptativa do indi- víduo que pode levá-lo a superar os efeitos dos fatores ambientais. Devido à polêmica, sugerimos o uso do termo “períodos sensíveis” (ao invés de críticos), para deinir quais aspectos do comportamento são mais sensíveis aos efeitos do ambiente e em que momento do desenvolvimento. Na continuidade deste item, apontamos um exemplo sobre os efeitos diferenciados de um evento (a grande depressão americana da década de 1930), em função da idade e condição social. APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E34 COMPREENDENDO O DESENVOLVIMENTO NA ÊNFASE SÓCIO-HISTÓRICA CULTURAL A Psicologia construiu suas bases nas ciências biológicas, todavia, a partir do século XX, surgem na história as discussões que envolvem os aspectos da cultura no desenvolvimento humano, considerando as relações e as condições objetivas e os contextos culturais (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014). Pautados nesse pensamento, revelamos a importância de compreender a relação entre homem e sociedade, pois “[...]o homem é um ser social, político e histórico e é construído, cria e é recriado mediado pelas relações sociais estabe- lecidas historicamente” (PILETTI; ROSSATO; ROSSATO, 2014, p. 35). Por isso, entendemos que o homem vai construindo seu mundo, transformando a socie- dade e sendo transformado por ela. Na construção desse pensamento, por volta de 1920, originou-se na Rússia a Teoria Histórico-Cultural, concebida por L. S. Vygotski (1896-1934), a partir dos ideaisdo Materialismo Histórico-Dialético proposto por Karl Marx (1818- 1883). Marx contou com os seguidores Alexander Romanovich Luria (1902-1977) e Alexei Nicolaevich Leontiev (1903-1979) que o ajudaram a construir a teoria que vem sendo muito utilizada na atualidade, na busca de compreender esse homem social, visto que suas transformações ocorrem em um processo dialé- tico a partir de suas relações (TULESKI, 2008). FATORES DETERMINANTES DO DESENVOLVIMENTO O estudo do desenvolvimento teve início no século XVIII, com as ’biograias de bebês’. Alguns cientistas evolucionistas acreditavam que a observação do compor- tamento infantil poderia levar a uma melhor compreensão da espécie humana. O estudo do desenvolvimento na adolescência, quando essa etapa da vida pas- sou a ser vista como um período especíico do desenvolvimento, só aconteceu a partir do início do século XX, e a inclusão de todo o ciclo da vida como objeto de Fatores Determinantes do Desenvolvimento R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 35 estudo do desenvolvimento é ainda mais recente: só na década de 1920 os psicó- logos começaram a se interessar pelo envelhecimento. Atualmente, a maioria dos cientistas do desenvolvimento reconhece que esse processo continua ao longo de toda a vida. Esse conceito é conhecido como desenvolvimento do ciclo da vida e já existe uma estrutura teórica consistente para que se compreenda todo o processo de desenvolvimento. Para estudar o ciclo da vida, os cientistas criaram uma divisão em perío- dos ou etapas, a qual é uma construção teórica, arbitrária e muitas vezes não se aplica igualmente a todas as sociedades, mas é amplamente aceita na sociedade para facilitar a compreensão dos processos de desenvolvimento. Segue, então, a tabela que representa o ciclo. FAIXA ETÁRIA DESENVOLVIMENTO FÍSICO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DESENVOLVIMENTO PSICOSSOCIAL PERÍODO PRÉ-NATAL (DA CONCEPÇÃO AO NASCIMENTO) Ocorre a concepção por fertilização nor- mal ou por outros meios. Desde o começo, a dotação genética interage com as influências ambien- tais. Formam-se as es- truturas e os órgãos corporais básicos: inicia-se o surto de crescimento do cérebro. O crescimento físico é o mais acelerado do ciclo de vida. É grande a vulnerabilidade às influências ambientais. Desenvolvem-se as capacidades de aprender e lembrar, bem como as de responder aos estí- mulos sensoriais. O feto responde à voz da mãe e desenvolve uma preferência por ela. APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E36 PRIMEIRA INFÂNCIA (DO NASCIMENTO AOS 3 ANOS) No nascimento, todos os sentidos e sistemas corpo- rais funcionam em graus variados. O cérebro aumenta em complexida- de e é altamente sensível à influência ambiental. O crescimento físico e o desenvol- vimento das habili- dades motoras são rápidos. As capacidades de aprender e lembrar estão presentes, mesmo nas primei- ras semanas. O uso de símbolos e a capacidade de resolver problemas se desenvolvem por volta do final do segundo ano de vida. A compreensão e o uso da linguagem se desenvolvem rapidamente. Formam-se os vínculos afetivos com os pais e com outras pessoas. A autoconsciência se desenvolve. Ocorre a passagem da dependência para a autonomia. Aumenta o inte- resse por outras crianças. Fatores Determinantes do Desenvolvimento R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 37 SEGUNDA INFÂNCIA (3 A 6 ANOS) O crescimento é constante; a aparência torna-se mais esguia e as proporções mais parecidas com as de um adulto. O apetite diminui e são comuns os problemas com o sono. Surge a preferência pelo uso de uma das mãos; aprimo- ram-se as habilida- des motora fina e gerais e aumenta a força física. O pensamento é um tanto egocên- trico, mas aumenta a compreensão do ponto de vista dos outros. A imaturidade cognitiva resulta em algumas ideias ilógicas sobre o mundo. Aprimoram-se a memória e a lingua- gem. A inteligência torna- -se mais previsível. É comum a experi- ência do maternal e mais ainda a da pré-escola. O autoconceito e a compreensão das emoções tornam- -se mais comple- xos, a autoestima é global. Aumentam a independência, a iniciativa e o auto- controle. Desenvolve-se a identidade de gênero. O brincar torna-se mais imaginativo, mais elaborado e, geralmente, mais social. Altruísmo, agres- são e temor são comuns. A família ainda é o foco da vida social, mas outras crianças tornam-se mais importantes. APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E38 TERCEIRA INFÂNCIA (6 A 11 ANOS) O crescimento tor- na-se mais lento. A força física e as habilidades atléti- cas aumentam. São comuns as do- enças respiratórias, mas de um modo geral a saúde é melhor do que em qualquer outra fase do ciclo de vida. Diminui o egocen- trismo. As crianças começam a pensar com lógica, porém concretamente. As habilidades de memória e lingua- gem aumentam. Ganhos cognitivos permitem à criança beneficiar-se da instrução formal na escola. Algumas crianças demonstram ne- cessidades educa- cionais e talentos especiais. O autoconceito torna-se mais com- plexo, afetando a autoestima. A co-regulação reflete um desloca- mento gradual no controle dos pais para a criança. Os colegas assu- mem importância fundamental. ADOLESCÊNCIA (11 A APROX. 20 ANOS) O crescimento físico e outras mu- danças são rápidas e profundas. Ocorre a maturida- de reprodutiva. Os principais riscos para a saúde emer- gem de questões comportamentais, tais como transtor- nos alimentares e abuso de drogas. Desenvolve-se a capacidade de pensar em termos abstratos e de usar o raciocínio cien- tífico. O pensamento imaturo persiste em algumas atitudes e comportamentos. A educação se concentra na preparação para a faculdade ou para a profissão. A busca pela iden- tidade, incluindo a identidade sexual, torna-se central. O relacionamento com os pais geral- mente amadurece. Os amigos podem exercer influência positiva ou nega- tiva. Fatores Determinantes do Desenvolvimento R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 39 INÍCIO DA VIDA ADULTA (20 A 40 ANOS) A condição física atinge o auge, depois declina ligeiramente. Opções de estilo de vida influenciam a saúde. O pensamento e os julgamentos morais tornam-se mais complexos. São feitas as esco- lhas educacionais e vocacionais. Traços e estilos de personalidade tornam-se relati- vamente estáveis, mas as mudanças na personalida- de podem ser influenciadas pelos estágios e eventos da vida. São tomadas deci- sões sobre relacio- namentos íntimos e estilos de vida pessoais. A maioria das pes- soas casa-se e tem filhos. VIDA ADULTA INTERMEDIÁRIA (40 A 65 ANOS) Pode ocorrer uma lenta deterioração das habilidades sensoriais, da saú- de, do vigor e da força física, mas são grandes as diferen- ças individuais. As mulheres entram na meno- pausa. As capacidades mentais atingem o auge, a especializa- ção e as habilidades relativas à solução de problemas práti- cos são acentuadas. A criatividade pode declinar, mas sua qualidade é melhor. Para alguns, o sucesso na car-reira e o sucesso financeiro atingem seu máximo; para outros, poderá ocorrer esgotamen- to ou mudança de carreira. O senso de iden- tidade continua a se desenvolver, pode ocorrer uma transição para a meia-idade. A dupla responsa- bilidade pelo cuida- do dos filhos e dos pais idosos pode causar estresse. A saída dos filhos deixa o ninho vazio. APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E40 VIDA ADULTA TARDIA (65 ANOS EM DIANTE) A maioria das pessoas é saudável e ativa, embora ge- ralmente haja um declínio da saúde e das capacidades físicas. O tempo de reação mais lento afeta alguns aspectos funcionais. A maioria das pessoas é men- talmente alerta. Embora inteligência e memória possam se deteriorar em algumas áreas, a maioria das pessoas encontra meios de compensação. A aposentadoria pode oferecer novas opções para o aproveitamento do tempo. As pessoas desen- volvem estratégias mais flexíveis para enfrentar perdas pessoais e a morte iminente. O relacionamento com a família e com amigos ínti- mos pode propor- cionar um impor- tante apoio. A busca de sig- nificado para a vida assume uma importância funda- mental. Tabela 1: Principais desenvolvimentos típicos em oito períodos do desenvolvimento humano Fonte: Papalia, Olds e Feldman (2009, p. 12-13). As ideias apresentadas anteriormente nos levam a concluir que, atualmente, a Psicologia Educacional tem uma visão interacionista da inluência da here- ditariedade, ambiente e maturação na aprendizagem e no desenvolvimento. Pode-se também destacar que à medida que a criança se torna adolescente e depois adulta, embora a maturação continue a inluenciar certos aspectos bio- lógicos do desenvolvimento, as experiências de vida de cada indivíduo têm uma inluência fundamental nas características inatas. Essas inluências estão liga- das à nutrição, à estimulação parental, à inluência dos amigos, à educação, ao contexto familiar e cultural, dentre outros fatores, que passam a ter papel impor- tante no desenvolvimento. Para representar as ideias sobre desenvolvimento aqui apresentadas, traze- mos uma síntese das ideias de Baltes (1987 apud PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2009, p. 23-24) sobre os princípios básicos do desenvolvimento do ciclo da vida, na seção ‘Leitura Complementar’, encontrada ao inal desta unidade. Fatores Determinantes do Desenvolvimento R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt . 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e L e i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e f e v e re ir o d e 1 9 9 8 . 41 Resumindo, sobre a relação desenvolvimento-aprendizagem, na perspectiva his- tórico-cultural, Vygotsky e Luria (1996, p. 53) demonstram em seus estudos que o desenvolvimento psicológico está “[...]solidamente introduzido no contexto de todo o desenvolvimento social e revela-se em seu elemento constituinte orgânico”. Assim, Tuleski (2008) airma que os processos de desenvolvimento estão ligados dialeticamente, de modo que um é responsável por transformar o outro, rompendo com o determinismo biológico, pois este é o que iguala o homem aos animais, reduzindo-o a simples reações e relexos isiológicos. A mesma autora discorre que romper com o determinismo biológico leva à consciência da trans- formação do homem biológico em homem social. Conforme a nossa compreensão, seguem alguns tópicos orientados pela con- cepção Histórico-Cultural: ■ A expansão e o aprofundamento da experiência individual é decorrência da apropriação da experiência social. ■ Na dinâmica do processo de desenvolvimento das funções mentais supe- riores do ser humano, há uma internalização da dimensão cultural por meio de um processo de interação/mediação. ■ Aprendizagem e desenvolvimento não acontecem de modo simétrico, paralelo, nem igual para todos os indivíduos, eles dependem da atividade e das características sociointerativas e individuais de cada um. ■ Mesmo considerando a inluência dos fatores biológicos no desenvolvi- mento, o sujeito se constitui na relação. Há, verdadeiramente, duas coisas diferentes: saber e crer que se sabe. A ci- ência consiste em saber; em crer que se sabe está a ignorância. Fonte: Hipócrates. APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO HUMANO: CONCEITOS BÁSICOS R e p ro d u çã o p ro ib id a . A rt. 1 8 4 d o C ó d ig o P e n a l e Le i 9 .6 1 0 d e 1 9 d e fe v e re iro d e 1 9 9 8 . IU N I D A D E42 CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta unidade procuramos deinir alguns parâmetros para a aplicação dos estu- dos da Psicologia à Educação e à Aprendizagem. Conceituamos aprendizagem e mostramos a relação dela com diferentes visões epistemológicas. Buscamos demonstrar algumas vertentes de estudo na área de aprendizagem que hoje ocu- pam lugar de destaque nas pesquisas sobre a aplicação dos princípios da Psicologia à Educação. Dentre as vertentes, destacamos os estudos sobre metacognição, raciocínio e estratégias de aprendizagem, além de apresentarmos alguns fato- res interferentes no processo de indicarmos as possibilidades de trabalhar com esses conceitos, isto é, as diferentes teorias pedagógicas às quais eles correspon- dem e os objetivos do processo formal de educação. A seguir, analisamos os conceitos relativos ao Desenvolvimento do ser humano, identiicando os fatores determinantes do processo e as maneiras de abordar o seu estudo. Expomos a discussão sobre a inluência da hereditariedade e do ambiente sobre o desenvolvimento, trazendo diferentes pontos de vista sobre o tema, destacando diferentes visões teóricas sobre o estudo do ciclo da vida. Também mencionamos o desenvolvimento na ênfase da perspectiva his- tórico-social e cultural, apontando a visão de homem apresentada por esse pensamento teórico que vem norteando a compreensão e a prática dos prois- sionais da Psicologia e da Educação. Esperamos que o domínio dos conceitos sobreditos possa lastrear a deinição de uma prática pedagógica coerente com os princípios da ciência, no que tange à compreensão do educando em seu processo de aprendizagem e desenvolvimento. Sugerimos que você, caro(a) aluno(a), busque, a partir de seus interesses pesso- ais, aprofundar os conceitos estudados, por meio de pesquisa e estudo. Sabemos que debruçar-se sobre o desenvolvimento humano exige muito, no entanto, é a partir de uma base sólida fundamentada em teorias cientíicas que irá alcançar respostas para as indagações corriqueiras que surgem ao nos depararmos com um objeto de estudo tão complexo quanto o homem. 43 1. A aprendizagem em seu processo de desenvolvimento pode ser inluenciada por fatores intrapessoais e situacionais, visto sua ação direta ou indireta na aprendizagem da criança, é essencial que o professor compreenda sobre os relexos dos fatores citados em sua prática, para isso é importante conhecer e reletir sobre os mesmos, para práticas interventivas assertivas. Pautado(a) na airmação, apresente os fatores descritos que interferem no desenvolvimento e aprendizagem. 2. Os cientistas evolucionistas se interessavam por compreender o desenvolvi- mento humano estudando o comportamento infantil. A partir da década de 1920, a ciência se interessou por compreender outros períodos de desenvolvi- mento, como o envelhecimento humano, isso revela que o processo de desen- volvimento ocorre em todas as fases da vida. Diante do exposto, descreva os períodos de desenvolvimento humano e as características típicas do desenvol- vimento psicossocial na vida adulta tardia. 3. O pensamento teórico com ênfase sócio-histórica cultural nos diz que a matu- ração é um fator secundário no desenvolvimento, sendo a experiência social dominante para o desenvolvimento humano. De acordo com a airmação, apre- sente a compreensão de ‘homem’, a partir dessaperspectiva teórica. PSICOLOGIA ESCOLAR E EDUCACIONAL Vamos apresentar alguns fragmentos da entrevista com o professor Lino de Macedo4 Entrevistadora: Marilene Proença Rebello de Souza LINO DE MACEDO é Professor Titular na área de Psicologia do Desenvolvimento e Doutor em Psicologia pela Universidade de São Paulo, instituição em que desenvolveu sua carreira docente, no Instituto de Psicologia. Um dos maiores estudiosos da Teoria de Piaget no Brasil, o Professor Lino é unanimidade quando se trata de pensar, problemati- zar e discutir temas educacionais. Marilene: Lino, como se deu sua aproximação com a área de Psicologia Escolar e Edu- cacional? Lino de Macedo: [...] Fiz a escola normal e, com 18 anos, já era professor de alunos das primeiras séries de uma escola rural. Fiz o curso Pedagogia (1963-1966) e recém-forma- do passei a dar aulas de Psicologia de Desenvolvimento nesta mesma faculdade. Desde 1970, sou professor desta disciplina na USP (primeiro em Ribeirão Preto e, a partir de 1976, no Instituto de Psicologia, em São Paulo) considerando suas aplicações à perspec- tiva da aprendizagem escolar de crianças e adolescentes. [...] Em síntese, posso dizer que, em toda minha vida, a questão escolar, principalmente em sua relação com a Psicologia do Desenvolvimento foi uma constante. Minha tese de doutorado (1973) refere-se a um trabalho experimental sobre as relações entre desenvolvimento operatório e aprendizagem. Finalmente, desde 1988, coordeno um laboratório onde os jogos são usados como recursos para a promoção dos processos de desenvolvimento das crianças em favor de sua aprendizagem escolar. Marilene: Lino, que contribuições você considera que Piaget tem trazido para a Psicolo- gia Escolar e Educacional? Lino de Macedo: Para mim, sua contribuição é fundamental, necessária, ainda que insu- iciente e incompleta para dar conta da complexidade desta questão. Enumero algumas das contribuições de Piaget: - Análise teórica e experimental dos processos de tomada de consciência, abstração, generalização, construção de possíveis e necessários, correspondências e transforma- ções, implicações, lógica das signiicações e formas elementares da dialética. Todos es- ses temas foram estudados na perspectiva do sujeito que conhece, no caso, crianças, com idade, aproximadamente, entre 5 e 15 anos, entrevistadas em uma dada situação experimental. 4 Conheça na íntegra a entrevista em: SOUZA, Marilene P. R. de. Entrevista com o professor Lino de Macedo. Psicol. Esc. Educ., Campinas, v. 8, n. 2, dez. 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/pee/v8n2/v8n2a13.pdf>. Acesso em: 25 mar. 2015. 45 - Descrição dos níveis ou estádios de desenvolvimento das crianças em relação a temas fundamentais à sua compreensão e realização de problemas da lógica e da matemática, como, por exemplo, classiicar, ordenar, quantiicar, inferir, excluir variáveis, comparar, anular, compensar, estabelecer relações, deduzir etc. - Descrição dos níveis ou estádios de desenvolvimento da função simbólica na criança (imagem, imitação, jogo, representação, linguagem etc.). - Análise das formas pelas quais as crianças aprendem pouco a pouco a cooperar, trocar pontos de vista, descentrar, relacionar-se segundo regras, superar sua visão simpática ou antipática em favor da reciprocidade e da vontade como regulação social e afetiva das trocas interindividuais. Ora, esses temas são fundamentais tanto para o professor como para o aluno. Piaget e colaboradores izeram muitos estudos experimentais sobre noções e opera- ções da lógica e da matemática na criança. Disse na criança e não da criança. Por que saber isso é necessário ao processo educacional? As disciplinas escolares ensinam ainda hoje os conteúdos (conceitos e operações) pautados na perspectiva dos adultos, isto é, do conhecimento cientíico tal como estabelecido, demonstrado pelos pesquisadores. A didática tradicional, neste sentido, consistia em apenas um esforço de simpliicar e organizar os conceitos de modo didático e em propor exercícios e problemas que, em princípio, facilitariam a aprendizagem das crianças. Marilene: Você tem se preocupado em buscar possíveis aproximações da teoria de Pia- get com o processo educativo, com a prática em sala de aula, como você analisa tais possibilidades? Lino de Macedo: Penso que há uma correspondência entre os interesses teóricos de Piaget e os objetivos da prática em sala de aula. Para ambos, o tornar-se é a questão mais importante. No caso da escola, como a criança torna-se alfabetizada? Como aprende noções de cálculo? No caso de Piaget, como a criança torna-se operatória, cooperativa, sensível a uma interação pautada por regras e projetos? No meu caso, especiicamente, o propósito sempre foi o de saber compartilhar o pro- cesso construtivo de meus orientandos em favor de sua formação pós-graduada. Em outras palavras, como um aluno torna-se mestre e doutor? Como produz uma pesquisa, escreve uma tese? Não se trata de ser construtivista (no sentido ideológico), mas de aprender a observar e a favorecer um processo de construção. Onde está uma tese que ainda não foi escrita? Onde está a alfabetização de um aluno ainda ignorante da leitura e da escrita? O interessante da idéia de construção - que na maior parte das vezes refe- re-se a uma reconstrução - resume-se ao problema do como criar o que não existe (caso, por exemplo, da tese) ou de transpor o que existe em um plano ou escala (já temos ciências da linguagem, os professores já sabem ler e escrever) para um outro (tornar o aluno alfabetizado). O que é construção como processo revela-se, pouco a pouco, como descoberta daquilo que já é conhecido no plano social, por exemplo. O que é constru- ção se expressa, na prática, como invenção de estratégias ou recursos para aprender. Mas construir não se reduz de imediato a inventar ou a descobrir. Em outras palavras, os objetivos da escola coincidem, correspondem aos interesses de Piaget, ainda que este não tenha uma contribuição especíica para a aprendizagem escolar. ABORDAGEM DE BALTES AO DESENVOLVIMENTO DO CICLO DE VIDA Paul B. Baltes e seus colegas (1987; BALTES, LINDENBERGER; STAUDINGER, 1998; STAU- DINGER & BLUCK, 2001) identificaram seis princípios básicos em sua abordagem do desenvolvimento do ciclo de vida que retoma muitos dos conceitos discutidos neste capítulo. Juntos, esses princípios servem como uma estrutura conceitual amplamente aceita para o estudo do desenvolvimento do ciclo de vida: 1. O desenvolvimento é vitalício. O desenvolvimento é um processo vitalício de mudança na capacidade de se adaptar às situações escolhidas ou nas quais a pessoa se encontra. Cada período do ciclo de vida é afetado pelo que aconteceu antes e afetará o que está por vir. Cada período tem suas próprias características e valores; nenhum é mais ou menos importante que qualquer outro. Mesmo pessoas muito velhas podem crescer emocionalmente e intelectualmente. A experiência da morte pode ser última tentativa de chegar a um acordo com a própria vida – em resumo, de se desenvolver. 2. O desenvolvimento envolve ganho e perda. O desenvolvimento é multidimen- sional e multidirecional. Ocorre ao longo de múltiplas dimensões que interagem – biológica, psicológica e social –, cada uma delas podendo se desenvolver em ritmos diferentes. O desenvolvimento também prossegue em mais de uma di- reção. Enquanto as pessoas ganham em uma área, podem perder em outra, às vezes ao mesmo tempo. As crianças crescem principalmente em uma direção – para cima – tanto em tamanho quanto em habilidades. Depois o equilíbrio aos poucos se desloca. Os adolescentes ganham em termos de habilidade física, mas perdem a facilidade em aprender uma língua. Algumas habilidades, como o vocabulário, continuam crescendo ao longo da idade adulta; outras, como a capacidade de resolver problemas não familiares, poderão diminuir; e alguns novos atributos, como o conhecimento especializado, poderão se desenvolver
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