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PROCESSO COLETIVO 2021

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PROCESSO COLETIVO 2021
EMENTA E PLANO DE ENSINO
MÓDULO 0 - APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA 
Segundo Semestre 2021
Caro (a) aluno(a). 
Seja bem-vindo(a) ao sistema EAD.
 
INTRODUÇÃO/OBJETIVOS
 
1. Nesta disciplina trataremos de assuntos sobre o Processo Coletivo. Dentre os tópicos que serão objeto de estudo, destacamos os seguintes institutos: interesses transindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos); aspectos peculiares da tutela coletiva na ação civil pública e nos demais instrumentos de defesa dos direitos coletivos lato sensu.
 
Nosso objetivo é promover a compreensão e a importância do Processo Coletivo, assim como apresentar e discutir o significado dos institutos fundamentais da disciplina; de forma a estimular a capacidade de análise, domínio de conceitos e terminologia jurídica, argumentação, interpretação e valorização dos fenômenos jurídicos e sociais envolvidos. É nossa expectativa que você aprenda bastante.
 
2. Considerando-se que será você quem administrará seu próprio tempo, nossa sugestão é que se dedique ao menos quatro horas por semana para esta disciplina, estudando os textos sugeridos e realizando os exercícios de autoavaliação. Uma boa forma de fazer isso é já ir planejando o que estudar, semana a semana.
 
3. Para facilitar seu trabalho, apresentamos na tabela abaixo os assuntos que deverão ser estudados e, para cada assunto, a leitura fundamental exigida e a leitura complementar sugerida. No mínimo, você deverá buscar entender muito bem o conteúdo da leitura fundamental, só que essa compreensão será maior se você acompanhar também a leitura complementar. Você mesmo perceberá isso ao longo dos estudos.
 
CONTEÚDOS/LEITURAS SUGERIDAS
 
CONTEÚDOS DE ESTUDO
BIBLIOGRAFIA BÁSICA
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
Módulo 1- Introdução. Evolução histórica da tutela coletiva. Os direitos transindividuais no direito brasileiro..
 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – vol. II / . – 54. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020.
DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de Direito Processual Civil. Processo Coletivo. Bahia: Juspodium
VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. São Paulo: Malheiros.
Módulo 2 - Interesses coletivos lato sensu. Interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.
 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – vol. II / . – 54. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020.
DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de Direito Processual Civil. Processo Coletivo. Bahia: Juspodium
VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. São Paulo: Malheiros.
Módulo 3 - Ação coletiva para a tutela de interesses coletivos lato sensu. Legitimidade para a propositura de ações coletivas. Ônus da prova nas ações coletivas.
 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – vol. II / . – 54. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020.
DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de Direito Processual Civil. Processo Coletivo. Bahia: Juspodium.
 
VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. São Paulo: Malheiros.
Módulo 4 - Tutela antecipada e tutela específica nas ações coletivas.
 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – vol. II / . – 54. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020.
DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de Direito Processual Civil. Processo Coletivo. Bahia: Juspodium
VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. São Paulo: Malheiros.
Módulo 5 - Sentença e liquidação no processo coletivo. Noções gerais da execução individual da sentença proferida em processo coletivo.
 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – vol. II / . – 54. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020.
DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de Direito Processual Civil. Processo Coletivo. Bahia: Juspodium.
VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. São Paulo: Malheiros.
 
Módulo 6 - Coisa julgada nas ações coletivas.
 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – vol. II / . – 54. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020.
DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de Direito Processual Civil. Processo Coletivo. Bahia: Juspodium São Paulo: Saraiva, 2018. 
VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. São Paulo: Malheiros.
Módulo 7 - Inquérito Civil.
 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – vol. II / . – 54. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020.
DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de Direito Processual Civil. Processo Coletivo. Bahia: Juspodium
VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. São Paulo: Malheiros.
Módulo 8 - Noções gerais do procedimento na ação civil pública e na ação popular.
 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – vol. II / . – 54. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020.
DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de Direito Processual Civil. Processo Coletivo. Bahia: Juspodium
VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. São Paulo: Malheiros.
Nota: ver abaixo as referências bibliográficas, para maior detalhamento das fontes de consulta indicadas. 
 
AVALIAÇÕES
Como é de seu conhecimento, você estará obrigado a realizar uma série de avaliações (NP1, NP2, SUB* e EXAME), cabendo a você tomar conhecimento do Calendário Escolar dessas avaliações divulgado no campus e do agendamento das datas das suas provas através deste sistema on line, dentro dos períodos especificados. Na data e horário agendados para a sua avaliação dirigir-se ao Laboratório de Informática ou outro setor designado pela Instituição para a realização da prova em sistema on line.
 
Por outro lado, é importante destacar que uma das formas de você se preparar para as avaliações é realizando os exercícios de autoavaliação, disponibilizados para você neste sistema de disciplinas on line. O que tem de ficar claro, entretanto, é que os exercícios que são requeridos em cada avaliação não são a mera repetição dos exercícios da autoavaliação.
 
Para sua orientação, informamos na tabela a seguir, os conteúdos e exercícios que serão requeridos em cada uma das avaliações às quais você estará sujeito:
 
Conteúdos a serem exigidos nas avaliações
AVALIAÇÕES
CONTEÚDOS
EXERCÍCIOS
NP1
Módulo 1 ao módulo 4
Exercícios on line respectivos
NP2
Módulo 5 ao módulo 8
Exercícios on line respectivos
Substitutiva**
Todos os Módulos (1 ao 8)
Todos os exercícios
Exame 
Todos os Módulos (1 ao 8)
Todos os exercícios
 
 
 
 
 
 
 
 
 
* Apenas para a perda de uma das avaliações bimestrais.
** Idem
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
 
Básica:
 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – vol. II / . – 54. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020.
DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes. Curso de Direito Processual Civil. Processo Coletivo. Bahia: Juspodium.
GRINOVER, Ada Pellegrini. et.al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense Universitária.
MAZZILI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. São Paulo: Saraiva.
 
Complementar:
 
DONIZETTI, Elpídio; CERQUEIRA, Marcelo Malheiros. Curso de processo coletivo. São Paulo: Atlas.
MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança. São Paulo: Malheiros.
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. São Paulo.
RIZZATTO NUNES. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva.
VENTURI, Elton. Processo Civil Coletivo. São Paulo: Malheiros.
 
DÚVIDAS 
Dúvidas deverão ser sanadas na Coordenação do Curso de Direito no horário de atendimento ao aluno.
Bons Estudos!
Módulo 1 : Introdução. Evolução histórica da tutela coletiva. Os direitos transindividuais no direito brasileiro.
 
Caracterizam-se as ações coletivas pela circunstância de atuar o autor não em defesa de um direito próprio, mas em busca de uma tutela que beneficia toda a comunidade ou grandes grupos, aos quais compete realmente a titularidade do direito material invocado.
O surgimento das ações coletivas é fruto dasuperação, no plano jurídico-institucional, do individualismo exacerbado pela concepção liberal que o Iluminismo e as grandes revoluções do final do século XVIII impuseram à civilização ocidental. O século XX descobriu que a ordem jurídica não podia continuar disciplinando a vida em sociedade à luz de considerações que focalizassem o indivíduo solitário e isolado, com capacidade para decidir soberanamente seu destino. A imagem que se passou a ter do sujeito de direito, em sua fundamentalidade, é a “da pessoa humana dotada de um valor próprio, mas inserido por vínculos e compromissos, na comunidade em que vive”.[1]
Essa visão destacou não apenas o “homem social”, pois o próprio “grupo” impôs-se à valoração jurídica. Primeiro realçou-se o papel conferido a associações, sindicatos e outros organismos para ensejar o melhor exercício das franquias individuais e coletivas. Depois, reconheceram-se direitos subjetivos que, a par dos individuais, eram atribuídos diretamente ao grupo e, que, por isso mesmo, teriam de ser qualificados como coletivos, e, como tais, haveriam de ser exercidos e protegidos.
Por meio da ação popular concebeu-se, entre nós, o primeiro procedimento judicial de tutela de direitos coletivos. Por seu intermédio qualquer cidadão foi legitimado a pleitear em juízo contra atos ilícitos de autoridade pública, lesivos ao patrimônio público (Constituição de 1934, art. 113, nº 38).
Os direitos coletivos passaram a ser protegidos no Brasil em período um tanto posterior ao desenvolvimento das ações coletivas nos ordenamentos de common law. Todavia, o Brasil, suas leis, sua doutrina e seus julgados, não se mostram irrelevantes em matéria de direitos coletivos, pois foi o primeiro país ibero-americano a iniciar o pensamento coletivo e a desenvolver mecanismo de defesa desses direitos. O estudo mais aprofundado dos direitos coletivos no Brasil teve início na década de 70, com debates acerca de pensamentos da escola inglesa e americana e também da italiana[2].
Interessante ressaltar que, em vista do primeiro congresso realizado no Brasil em que se discutiram os direitos coletivos, em 1982, foi elaborado um Anteprojeto de lei para tutela dessa sorte de direitos, do qual participaram Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco, Kazuo Watanabe e Waldemar Mariz de Oliveira Júnior. No entanto, esse Anteprojeto veio a ser substituído por outro de autoria do Ministério Público.
Isso decorreu do lobby dessa entidade, que pretendia ser a única legitimada à propositura de ações em defesa dos direitos coletivos, amplamente considerados. Tanto é assim que a lei decorrente desse projeto foi a denominada Lei da Ação Civil Pública, assim chamada justamente para contrapor-se à ação penal, da qual já era quase que exclusivamente titular o Ministério Público. Certamente por essa razão é que se incutiu na sociedade a ideia de que é esse órgão responsável pela tutela dos direitos coletivos, não se incentivando a criação de organismos sociais intermediários para tanto[3]
No ordenamento jurídico brasileiro, atendendo à já referida mudança no espectro social do indivíduo, a Constituição Federal de 1988 trouxe um grande avanço no tocante à proteção de direitos, elencando, em seu artigo 5º, os direitos e deveres não só individuais, mas também aqueles coletivos, consoante se depreende já da enunciação do capítulo em que se insere a norma[4]. Além disso, consoante ressalta Mancuso, a Constituição Federal trouxe outros elementos a “impulsionar a linha evolutiva do nosso processo coletivo”, mencionando a positivação de importantes valores metaindividuais (como meio ambiente – artigo 225, patrimônio cultural – artigo 216, consumidores – artigo 170, V, política urbana – artigo 182), a instauração de uma democracia participativa, ao prever a legitimação do Ministério Público para a tutela de direitos coletivos, o credenciamento de entidades associativas (artigo 5o, XXI), de sindicatos (artigo 8o, III) a previsão do mandado de segurança coletivo (artigo 5o, LXX, b), a autorização para um rol de entes públicos para promover ação direta de inconstitucionalidade (artigo 103)[5].
É importante salientar que a referência a direitos coletivos deve ser entendida de modo amplo, para abarcar não só aqueles direitos coletivos propriamente ditos, ou seja, não só aqueles direitos pertencentes a uma determinada classe, que são os direitos ordinariamente tidos como coletivos. O que se pretende, ao conferir-se tutela aos direitos coletivos, é, de igual modo, a proteção dos direitos difusos e dos individuais homogêneos, categorias inseridas no que, de modo amplo, se denomina “direitos coletivos”.
Assim, o inciso XXXV, do artigo 5º, da Constituição Federal, alinhando-se à própria enunciação do capítulo em que se insere, estabeleceu a proteção, pelo Judiciário, de qualquer lesão ou ameaça a direito, não mais se referindo apenas aos direitos individuais. Por conta disso, fez-se necessária a criação de mecanismos processuais para que os direitos coletivamente considerados pudessem ser apreciados pelo sistema jurídico, para garantir, desse modo, o amparo que lhes foi assegurado pela Carta Magna.
Nesse sentido, no próprio artigo 5º da Constituição Federal, em seu inciso LXX, previu-se a possibilidade de impetração de mandado de segurança coletivo, por partidos políticos, organizações sindicais, entidades de classe ou associações, para tutela de direitos de seus membros.
Ainda antes da entrada em vigor da Constituição Federal de 1988, que conferiu dignidade maior à proteção aos direitos coletivos no Brasil, outras disposições legais, já atentando para as modificações sociais e para o que ordenamentos outros traziam sobre o tema, como adiante se verá, passaram a conferir proteção a esses direitos. Por primeiro, a ação popular, prevista pela Lei n. 4.717/65, foi criada com o objetivo de
possibilitar ao próprio cidadão a defesa de direitos de natureza coletiva.
A ampliação da tutela jurisdicional, para introduzir as autênticas ações coletivas, ou de grupo, no direito processual pátrio, ocorreu com a instituição da ação civil pública por meio da Lei Complementar nº 40, de 14.12.1981, e da Lei nº 7.347, de 24.07.1985. A partir de então, o campo de manifestação dos direitos coletivos ou difusos deixou de ser apenas o de atuação dos agentes do Poder Público, como se passava ao tempo da ação popular. A defesa coletiva tornou-se possível contra quem quer que cometesse ofensa aos interesses coletivos ou difusos, fosse um administrador público ou algum particular.
Posteriormente, foi criada a Lei n. 8.078/90, o denominado Código de Defesa do Consumidor, que dispôs sobre a proteção do consumidor, estabelecendo os direitos e deveres dos consumidores e dos demais participantes das relações de consumo, bem como trazendo regras processuais quanto ao modo de proteção do consumidor em juízo, tanto individualmente, como de maneira coletiva.
Esse último diploma legal foi de máxima importância, pois, além de trazer disposições substanciais e processuais essenciais aplicáveis a toda a sorte de direitos coletivos e a todos os meios processuais aptos a sua tutela, trouxe dispositivo de classificação desses direitos, assim entendidos em sentido lato, fixando o objeto material do direito processual coletivo.
Não há consenso quanto aos benefícios da positivação das várias espécies de direitos coletivos. Os críticos apontam a desnecessidade da previsão, especialmente porque não há restrição quanto aos direitos materialmente tuteláveis, de modo que não haveria razão para a lei estabelecer conceitos classificatórios.
No tocante à ação civil pública por dano a interesse coletivo, por exemplo, no caso de reparação por degradação ambiental, a demanda pode se voltar tanto contra o agente causador direto do evento danoso como contra qualquer outro que de alguma forma tenha dele participado, ainda que indiretamente, como o preponente pelo ato do preposto, ou o proprietário da carga perigosa transportada por terceiro. Essa amplitude da legitimação passiva, no entanto,limita-se à pretensão ressarcitória própria das ações de responsabilidade civil. Não se estende, segundo a jurisprudência do STJ, às demandas pertinentes à aplicação de sanções (multas) administrativas ou penais. Para estas, o que prevalece não é a lógica da responsabilidade objetiva da esfera civil de reparação dos danos causados, mas sim a teoria da culpa, ou seja, as penas só devem ser aplicadas a quem, de fato, transgrediu a lei ambiental, mediante demonstração de seu elemento subjetivo, bem como do nexo causal entre a conduta do agente e o dano.2
Relativamente aos danos ambientais – que geram condenação a cumprir obrigação de fazer ou a de não fazer cumulada com a de indenizar (Súmula 629/ STJ) –, reconhece-se a natureza de obrigação propter rem, permitindo-se que a cobrança seja feita tanto do proprietário ou possuidor atual, como dos anteriores, em conjunto ou separadamente, à escolha do credor (Súmula 623/STJ).
De qualquer modo, a Lei da Ação Civil Pública se viu, inspirado nas ações de classe norte-americanas, previu a ação ressarcitória por danos pessoalmente sofridos (class actions for damages), o que, até então, não tinha previsão legal no Brasil.
 
[1] TROCKER, Nicolò. Processo civile e costituzione. Milano: Giuffrè, 1974, p. 197
[2] Angelo De Santis deixou assente a primazia dos estudos brasileiros, em relação àqueles italianos referentes aos direitos e processos coletivos, anotando que, na Itália, a discussão a respeito intensificou-se apenas no fim dos anos 80, momento em que se impôs uma reestruturação da justiça civil, em razão das “mutate esigenze di tutela derivanti da una economia di massa” (DE SANTIS, Angelo Danilo. “I disegni di legge italiani sulla tutela degli interessi collettivi e il class action fair act of 2005”, in Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, Milão, v. 60, n. 2, jun/2006, p. 602/603).
[3] V. PASCHOAL, Maximiliam Fierro. A representatividade adequada ...., Op. Cit, p. 76/77. Os prós e os contras da atuação do Ministério Público como autor legitimado da ação coletiva ...que o ideal seria que a sociedade se organizasse para a defesa de seus próprios interesses, evitando a dependência a um agente estatal para tanto.
Isso, sem dúvida, traria mais independência e efetividade para a defesa dos interesses coletivos.
[4] Constituição Federal, Título II (Dos Direitos e Garantias Fundamentais), Capítulo I (Dos direitos e deveres
individuais e coletivos).
[5] V. MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Jurisdição coletiva e coisa julgada: teoria geral das ações
coletivas. 2ª ed. São Paulo: RT, 2007, p. 57.
Interesses coletivos lato sensu. Interesses difusos, coletivos stricto sensu e individuais homogêneos. 
 
1. Interesses ou direitos?
 
Por vezes, a doutrina e a própria legislação brasileira fazem referência aos substantivos interesses e direitos, a indicar que eles correspondem a dois institutos jurídicos não idênticos. Atentemos para os seguintes exemplos:
 
Constituição Federal de 1988
 
Art. 8º ...
 
III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;
 
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
 
V - defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas;
 
Lei nº 8.078, de 11.9.1990 (Código de Defesa do Consumidor)
 
Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo...”
 
Isto demanda algumas breves considerações a respeito do significado dos dois vocábulos em destaque. Afinal de contas, o que são interesses e o que são direitos?
 
A doutrina pátria não se põe de acordo quando busca dar resposta a tal pergunta. Autores há que sustentam ser cada uma das expressões dotada de acepção própria - de modo que, a depender do contexto, apenas uma delas poderá ser empregada -, enquanto outros preferem a utilização tão somente do substantivo interesses, havendo ainda os que defendem o emprego apenas da palavra direitos.
 
Pertencente ao primeiro grupo, Hugo Nigro Mazzili afirma que “ambas as expressões estão corretas, mas significam coisas diversas. Para os fins que ora nos dizem respeito, interesse é pretensão; direito é a pretensão amparada pelo direito”.[1]
 
Já Ricardo de Barros Leonel encontra-se entre os que optam pela expressão interesses, ao argumento de que ela possui maior amplitude de tutela para situações não reconhecidas como direitos subjetivos.[2]
 
Por seu turno, Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr., conquanto reconheçam ser comum na legislação brasileira a denominação conjunta “direitos e interesses” referindo-se a direitos difusos, direitos coletivos e individuais homogêneos, expressam seu entendimento de que, nesse contexto, o termo interesses é expressão equívoca que deve, portanto, ser afastada. Uma das razões é que, segundo afirmam, não existe diferença prática entre direitos e interesses; outra é que os direitos difusos e coletivos foram constitucionalmente garantidos e, portanto, apresentam-se como direitos. Na opinião desses autores, a utilização do substantivo interesses deu-se por mera adoção do italianismo decorrente da expressão “interessi legitimi” e que granjeou espaço na doutrina nacional.[3]
 
2. Direitos individuais e Direitos coletivos
 
A Constituição Federal brasileira atualmente em vigor dá ao seu Título II e ao Capítulo I deste as seguintes denominações, respectivamente: “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” e “Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos”.
 
Consoante a primeira dessas denominações, os direitos a que alude o Capítulo I são fundamentais, assim entendidos os direitos “nomeados e especificados no instrumento constitucional”, ou “aqueles direitos que receberam da Constituição um grau mais elevado de garantia ou de segurança”.[4]
 
O jurista alemão Konrad Hesse ressalta que “Os direitos fundamentais devem criar e manter condições elementares para assegurar uma vida em liberdade e dignidade humana. Isso só se consegue quando a liberdade da vida em sociedade resulta garantia em igual medida que a liberdade individual.”[5]
 
Ainda na dicção da Carta Política brasileira de 1988, os direitos fundamentais podem ser das espécies individuais ou coletivos.
 
Individuais são os direitos indispensáveis à pessoa humana e que se traduzem em limitações impostas pela soberania popular aos poderes constituídos. Deles são exemplos os direitos à vida, à liberdade e à propriedade. A qualificação que lhes é atribuída pela Constituição decorre de que seu titular é o próprio indivíduo, ou seja, a pessoa humana individualmente considerada.
 
De outro lado, em sentido amplo, coletivos são os direitos caracterizados pela pluralidade de titulares, isto é, são aqueles que ultrapassam o âmbito estritamente individual. Por isso costumam ser também chamados direitos transindividuais ou metaindividuais. São assim qualificados, por exemplo, os direitos à informação, à participação dos trabalhadores em colegiados de órgãos públicos e à representação coletiva.
 
É conhecida a discriminação dos direitos humanos a partir de suas respectivas gerações (ou dimensões). Temos, assim, os direitos de primeira geração, de segunda geração, de terceira geração, etc.
 
Como bem lembrado por Pedro Lenza,[6] os direitos de primeira geração dizem respeito às liberdades públicas e aos direitos políticos – é dizer, os direitos civis e políticos que traduzem o valor de liberdade (deles, o direito à vida é o melhor exemplo). Os direitos de segunda geração privilegiam os direitos sociais, culturais e econômicos, correspondendo ao valor de igualdade (exemplifica-se com os direitos à saúde, à moradia e à previdência social). Os de terceira geração, resultantes dos novos problemas e preocupações mundiais que emergiram nas últimas décadas, como, por exemplo, a necessidade de preservação do meio ambiente, correspondem ao valor de fraternidade, ou solidariedade (os direitos ao meio ambiente saudável e à proteção dos consumidores sãobons exemplos deles).
 
Analisando a evolução dos direitos humanos através dos tempos, Sérgio Pinto Martins assevera que
 
os direitos humanos foram evoluindo no curso da história, de acordo com a cultura de cada povo. Representam uma conquista histórica e política. São direitos históricos, mas também necessidades das pessoas no curso do tempo, que foram sendo reconhecidas. São caracterizados por lutas no sentido de obter novas liberdades. O objetivo foi obter a dignidade da pessoa humana contra opressões, tiranias, e o poder excessivo e a intervenção do Estado. Foram sendo obtidos de ‘modo gradual’, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas.[7]
 
Os direitos coletivos, objeto do presente módulo, enquadram-se no grupo dos direitos de terceira geração. Deveras, consoante o magistério de Washington Eduardo Perozim da Silva, uma atenta análise do catálogo de direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988 comprovará que o legislador constituinte não pretendeu proteger somente os de caráter individual (vida, liberdade, privacidade etc.), mas, também, aqueles de natureza transindividual, considerados pela doutrina como “direitos fundamentais da terceira dimensão”. O mesmo doutrinador acrescenta que
 
a proteção desses direitos transindividuais se fazia necessária, uma vez que na sociedade hodierna são inúmeras as relações fáticas e jurídicas cujo titular de tais direitos não poderia ser identificado de forma individualizada e, que a defesa desses interesses (difusos e coletivos) somente poderia ocorrer mediante a intervenção direta do próprio Estado ou por meio de órgãos representantes de classe.
Todavia, essa característica peculiar – a transindividualidade – implica uma série de tratamentos jurídicos distintos daqueles conferidos aos direitos fundamentais das duas primeiras dimensões, já que, tanto a “questão da titularidade” quanto a da “representação dos interesses dos titulares” geram diversas repercussões e questionamentos entre os juristas e demais operadores do direito.[8]
 
Como se verá na sequência, os direitos coletivos lato sensu se desdobram, na legislação pátria, em diferentes espécies.
 
3. Direitos coletivos
 
Foi afirmado linhas atrás que direitos coletivos, lato sensu, são aqueles que se caracterizam pela pluralidade de titulares, isto é, que ultrapassam o âmbito estritamente individual, sendo por isso qualificados também como transindividuais ou metaindividuais.
 
Também se destacou que os direitos dos consumidores pertencem ao grupo dos direitos coletivos, circunstância esta que nos remete à Lei nº 8.078, de 11.9.1990, conhecida como Código de Defesa do Consumidor, cujo artigo 81 possui a seguinte redação:
 
Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
 
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
 
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
 
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
 
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.
 
Verifica-se, destarte, que os direitos cuja defesa poderá ser exercida coletivamente são os direitos difusos, os direitos coletivos “stricto sensu” e os direitos individuais homogêneos.
 
Tomados os dispositivos do CDC em sua literalidade, o que temos no artigo acima são duas espécies de direitos coletivos (direitos difusos e direitos coletivos stricto sensu) e uma espécie de direitos individuais que, a exemplo dos dois primeiros, também podem ser objeto de defesa coletiva.
 
Não é difícil perceber que o legislador definiu melhor as duas primeiras espécies, deixando a cargo da doutrina a tarefa de aperfeiçoar a terceira espécie.
 
3.1 Direitos difusos
 
Diz o CDC que, para seus próprios efeitos, esses direitos são (1) transindividuais (portanto, do gênero direitos coletivos), (2) de natureza indivisível e (3) e têm como titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.
 
A transindividualidade (às vezes referida também como metaindividualidade, supraindividualidade, ou metasubjetividade) é da essência dos direitos coletivos lato sensu e, conforme referido anteriormente, diz respeito à pluralidade de titulares. Assim, por exemplo, diz-se que os direitos sociais são transindividuais porque não se contêm na esfera de direitos caráter individual, mas, ao contrário, não apenas ultrapassam tal limite como ainda transcendem o próprio indivíduo. Veja-se, a propósito, o art. 196 da Constituição Federal, que trata especificamente de um dos direitos sociais elencados em seu art. 6º - qual seja, o direito à saúde:
 
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
 
Aqui, o pronome indefinido plural todos é empregado com a mesma acepção que lhe foi atribuída no caput do art. 5º da Constituição, ou seja, com o significado de “todas as pessoas”, sem distinção de qualquer natureza. Indiscutivelmente, o direito à saúde é um dos melhores exemplos de direitos transindividuais, vez que seus titulares são, nada menos, do que todos os brasileiros e estrangeiros - repita-se, todas as pessoas - que estiverem no território nacional.
 
A indivisibilidade dos direitos difusos - que decorre da indeterminação de seus titulares - significa a impossibilidade de que eles sejam individuados, ou seja, destacados em unidades autônomas de fruição. Por isso a afirmação de José Maria Tesheiner no sentido de que tais direitos “não constituem direitos subjetivos e, ainda, que as ações para sua tutela tratam da proteção de direitos coletivos”.[9] Tais direitos, portanto, “só podem ser considerados como um todo”.[10]
 
Em igual sentido, a juíza Luciana de Oliveira Leal[11] pontua que “a indivisibilidade e a indeterminação têm o mesmo sentido, que é a impossibilidade de se repartir entre indivíduos, quaisquer que sejam, os benefícios decorrentes da tutela prestada. E isto, em primeiro porque o objeto em si não permite divisão, dada sua natureza mesma, e em segundo porque não é possível individualizar os titulares destes direitos. São indetermináveis, pois a titularidade é do todo como um corpo uno, e não dos muitos que compõem este todo.”
 
Ainda na letra do CDC, os titulares desses direitos são pessoas ligadas por circunstâncias de fato, é dizer, não existe entre eles vínculo de natureza jurídica. Para ilustrar essa característica, dá-se como exemplos o direito a um meio ambiente saudável e o direito à segurança pública, pois, tanto num caso como noutro, trata-se de direitos de titularidade de incontável e indeterminável número de pessoas, as quais não se encontram ligadas por uma relação jurídica base - ao contrário, o que liga essas pessoas, respectivamente, é apenas a sua afetação por eventual agressão ao meio ambiente ou insuficiência da segurança pública proporcionada pelo Estado.
 
Segundo o magistério de Ada Pellegrini Grinover,[12] “Os interesses difusos são aqueles que não encontram apoio em uma relação-base bem definida, reconduzindo-se, na realizada, o vínculo entre as pessoas a fatores conjuntos ou genéricos, a circunstâncias muitas vezes acidentais, tais como as que decorrem de habitar a mesma região, consumir o mesmo produto, viver em determinadas condições sócio-econômicas e etc.”
 
Os direitos difusos podem ainda ser analisados quanto ao sujeito ativo, ao sujeito passivo e ao objeto. Veja-se:
 
Sujeito ativo
Comovisto anteriormente, os direitos difusos são aqueles cujos titulares não são determináveis. Isto é, os detentores do direito subjetivo que se pretende regrar e proteger são indeterminados e indetermináveis. 
Se, por exemplo, um vendedor de remédios anuncia um medicamento milagroso que permita que o usuário emagreça cinco quilos por dia apenas tomando um comprimido, sem nenhum comprometimento à sua saúde, seria um caso de enganação tipicamente difusa, pois é dirigida a toda a comunidade.
É evidente que uma pessoa em particular pode ser atingida e enganada pelo anúncio: ela vai à farmácia, adquire o medicamento, ingere o comprimido e não emagrece. Neste caso, o consumidor tem um direito individual próprio, que também, obviamente, está protegido. Ele, como titular de um direito subjetivo, poderá exercê-lo plenamente com base na Lei 8.078/90. Poderá, por exemplo, ingressar com ação de indenização por danos materiais e morais.
Mas, o só fato de alguém em particular ter sido atingido pelo anúncio não só não elide os demais aspectos formadores dos direitos difusos em jogo, como ao contrário, exige uma rápida atuação dos legitimados para a tomada das medidas capazes de impedir a violação a esses direitos difusos (no caso, feita pelo anúncio enganoso).
Aliás, diga-se que é exatamente essa característica da indeterminabilidade da pessoa concretamente violada um dos principais aspectos dos direitos difusos.
O termo "difuso" significa isso: indeterminado, indeterminável. Então, não será preciso que se encontre quem quer que seja para proteger-se um direito tido como difuso. Ou, em outros termos, ainda que não se possa encontrar um único consumidor enganado concretamente por uma publicidade enganosa, ela poderá ser qualificada de enganosa assim mesmo.
Portanto, quer se identifique um consumidor que foi violado no seu direito - individual -, quer não se encontre nenhum, trata-se sempre de direitos difusos. Esta, repita-se, é que é sua marca, a não determinação do sujeito.
Diga-se mais: sempre que surgir, ao mesmo tempo, questão que envolva direitos difusos e outra que envolva direito individual, ambas ligadas pelo mesmo objeto - no exemplo, a publicidade enganosa -, ter-se-á dois tipos de direito em jogo, e ambos protegidos pelo regime legal consumerista: os direitos difusos e o direito individual. 
 
Sujeito passivo
 
São sujeitos passivos todas as pessoas obrigadas a respeitarem os direitos difusos. No caso de relações de consumo, são todos aqueles que direta ou indiretamente vendem, produzem, distribuem, comercializam etc., produtos e serviços, isto é, os fornecedores, cuja definição está estabelecida no artigo 3º do CDC.
 
Objeto
 
O objeto ou bem jurídico protegido é indivisível, exatamente por atingir e pertencer a todos indistintamente. Por isso, ele não pode ser cindido.
 
Faça-se uma ressalva esclarecedora: o fato de o mesmo objeto gerar dois tipos de direito não muda a natureza de indivisibilidade do objeto nos direitos difusos. Isto é, se um anúncio enganoso atingir um consumidor em particular, esse direito individual identificado não altera em nada a natureza indivisível do fato objetivo do anúncio.
É que na ação judicial de proteção aos direitos difusos, o caráter da indivisibilidade do objeto faz a ligação com a titularidade difusa, sem alterar o quadro da proteção particular.
 
3.2 Direitos coletivos stricto sensu
 
Assim como os direitos difusos, estes são também coletivos - o que impõe o reconhecimento da existência de um gênero desta categoria de direitos -, razão pela qual houve por bem o legislador, a fim de diferenciar o gênero da espécie tratada no inciso II do art. 81 do CDC, qualificá-la como stricto sensu. Temos, assim, os direitos coletivos stricto sensu como uma das espécies do gênero direitos coletivos lato sensu.
 
Na letra do mencionado Código, os direitos ora em foco são também transindividuais e de natureza indivisível, mas, diferentemente dos direitos difusos, têm como possíveis titulares grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.
 
Sobre as características da transindividualidade e da indivisibilidade, releia-se o que foi dito no item anterior.
 
Quanto à titularidade, cumpre destacar que os beneficiários desses direitos são pessoas pertencentes a grupos, categorias ou classes determináveis. Noutro dizer, em princípio, essas pessoas, individualmente consideradas, são indeterminadas, mas podem ser identificadas pelo fato de pertencerem a determinados grupos, categorias ou classes (cite-se como exemplo os engenheiros vinculados ao Crea - Conselho Regional de Engenharia e Agronomia).
 
Ainda quanto aos beneficiários, trata-se de pessoas ligadas entre si por uma relação jurídica base - e não, como se dá em relação aos direitos difusos, por uma circunstância de fato. Neste contexto, Eduardo Braga Bacal salienta que esses direitos “prendem-se à ideia de grupos sociais organizados e formalmente estruturados, como associações, as cooperativas, os sindicatos. De maneira distinta dos interesses difusos, os interesses coletivos se organizam de tal forma que todos os sujeitos envolvidos encontram-se vinculados a uma relação jurídica-base.”[13]
 
Comentando esta mesma particularidade, Didier Jr. e Zaneti Jr. destacam que a relação-base necessita ser anterior à lesão (caráter da anterioridade) e, ainda, o quanto segue:
 
Nesse particular, sabe salientar que essa relação jurídica base pode dar-se entre os membros do grupo affectio societatis ou pela sua ligação com a “parte contrária”. No primeiro caso temos os advogados inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (ou qualquer associação de profissionais); no segundo, os contribuintes de determinado imposto. Os primeiros ligados ao órgão de classe, configurando-se como “classe de pessoas” (advogados). Os segundos ligados ao ente estatal responsável pela tributação, configurando-se como “grupo de pessoas” (contribuintes).[14]
 
Pelo fato de os direitos difusos e os direitos coletivos stricto sensu possuírem características comuns - e nem poderia ser de outra forma, já que ambos pertencem ao gênero direitos coletivos lato sensu -, é de grande utilidade prática levar-se em conta a lição de Kazuo Watanabe, no sentido de que o que diferencia essas duas espécies de direitos é a determinabilidade das pessoas titulares da segunda, “seja através da relação jurídica-base que as une entre si (membros de uma associação de classe ou ainda acionistas de uma mesma sociedade), seja por meio do vínculo jurídico que as liga à parte contrária (contribuintes de um mesmo tributo, contratantes de um segurador com um mesmo tipo de seguro, estudantes de uma mesma escola etc.”.[15]
 
Vejamos a análise dos direitos coletivos stricto sensu quanto ao sujeito ativo, ao sujeito passivo e ao objeto:
 
Sujeito ativo
 
Nos chamados direitos coletivos, os titulares do direito são também indeterminados, mas determináveis. Isto é, para a verificação da existência de um direito coletivo não há necessidade de se apontar concretamente um titular específico e real. Todavia, esse titular é facilmente determinado, a partir da verificação do direito em jogo.
 
Assim, por exemplo, a qualidade de ensino oferecida por uma escola é tipicamente direito coletivo. Ela - a qualidade oferecida - é direito de todos os alunos indistintamente, mas, claro, afeta cada aluno em particular.
 
Sujeito passivo
 
São sujeitos passivos todas as pessoas obrigadas a respeitarem os direitos coletivos stricto sensu, ou seja, aqueles que se envolvem na relação jurídica base ou se relacionam com o grupo de consumidores com que formam essa relação jurídica. No exemplo acima, sujeito passivo é a escola.
 
Objeto 
 
O objeto ou bem jurídico protegido é indivisível. Ele não pertence a nenhum consumidor individual em particular, mas a todos em conjunto e simultaneamente.
 
3.3 Direitos individuais homogêneos
 
No inciso III do parágrafo único do art. 81 do CDC, o legislador avançou um poucomais e identificou uma nova espécie de direitos coletivos a que chamou direitos individuais homogêneos.
 
É curioso notar que, pela literalidade do referido inciso III, estes direitos não são transindividuais - ao contrário, são declaradamente individuais -, o que levou parte dos doutrinadores a não considerá-los como direitos coletivos, nem mesmo lato sensu. Para esses publicistas, sua inclusão nesse parágrafo único deve-se ao fato de que legislador utilizou como critério para a distinção desses direitos a sua origem, além de tê-los conceituado sob a uma perspectiva marcadamente processual - no caso, o da defesa coletiva. Assim, tais direitos, que se diferenciam dos demais direitos individuais por serem dotados da qualidade homogêneos, poderão ser defendidos coletivamente. Por isso, os direitos individuais homogêneos costumam ser considerados apenas acidentalmente coletivos, como se depreende das palavras de Teori Albino Zavascki, a seguir reproduzidas:
 
A expressão “direitos individuais homogêneos” foi cunhada, em nosso direito positivo, pelo Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei 8.078/90), para designar um conjunto de direitos subjetivos “de origem comum” (art. 81, parágrafo único, III), que, em razão de sua homogeneidade, podem ser tutelados por “ações coletivas”, na forma do Capítulo II, do Título III, do referido Código (art. 91 e ss.).
 
Não se trata, já se viu, de um novo direito material, mas simplesmente de uma nova expressão para classificar certos direitos subjetivos individuais, aqueles mesmos que ensejam situação que propicia a formação de litisconsórcio facultativo, indicado no inciso III do art. 113 do CPC, ou seja, quando “ocorrer afinidade de questões por ponto comum de fato ou de direito”.
 
A homogeneidade não é uma característica individual e intrínseca desses direitos subjetivos, mas sim uma qualidade que decorre da relação de cada um deles com os demais direitos oriundos da mesma causa fática ou jurídica. Em outras palavras, a homogeneidade não altera nem compromete a essência do direito, sob o seu aspecto material, que, independentemente dela, continua sendo um direito subjetivo individual. A homogeneidade decorre de uma visão do conjunto desses direitos materiais, identificando pontos de afinidades e de semelhanças entre eles e conferindo-lhes um agregado formal próprio, que permite e recomenda a defesa conjunta de todos eles. Os direitos homogêneos, repita-se o que escrevem Benjamin, “são, por esta via exclusivamente pragmática, transformados em estruturas moleculares, não como fruto de uma indivisibilidade inerente ou natural (interesses e direitos públicos e difusos) ou da organização ou existência de uma relação jurídica-base (interesses coletivos stricto sensu), mas por razões de facilitação de acesso à justiça, pela priorização da eficiência e da economia processuais”.[16]
 
Semelhante ideia é defendida por Viviane Siqueira Rodrigues, segundo a qual “infere-se que o legislador se propôs a disciplinar interesses que não são coletivos por natureza, mas sim essencialmente individuais. São interesses que ostentam a condição de direitos subjetivos com titulares determináveis, ou até bem determinados e, em si mesmos, nada têm de coletivo”.[17] 
 
Outros autores, no entanto, pensam de modo diverso, como é o caso de Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr., que se expressam nos seguintes termos:
 
Ora, pelo que pudemos perceber até aqui, a tutela desses direitos não se restringe aos direitos individuais das vítimas. Vai além, tutelando a coletividade mesmo quando os titulares dos direitos individuais não se habilitarem em número compatível com a gravidade do dano, com a reversão dos valores ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. Assim, não se pode continuar afirmando serem esses direitos estruturalmente direitos individuais, sua função é notavelmente mais ampla. Ao contrário do que se costuma afirmar, não se trata de direitos acidentalmente coletivos, mas de direitos coletivizados pelo ordenamento para os fins de obter a tutela jurisdicional constitucionalmente adequada e integral.[18]
 
Seja como for – “direitos apenas acidentalmente coletivos” ou “direitos coletivizados ex lege” –, o CDC os qualifica como homogêneos por decorrerem de origem comum. Discorrendo sobre esta última característica, Didier Jr. e Zaneti Jr. afirmam que se trata de “direitos nascidos em consequência da própria lesão, em que a relação jurídica entre as partes é post factum (fato lesivo). (...) Ou seja, o que têm em comum esses direitos é a procedência, a gênese da conduta comissiva ou omissiva da parte contrária, questões de direito ou de fato que lhes conferem características de homogeneidade, revelando, nesse sentir, prevalência de questões comuns e superioridade na tutela coletiva.”[19]
 
Ainda sobre o aspecto da origem desses direitos, Kazuo Watanabe aduz que
 
“Origem comum” não significa, necessariamente, uma unidade factual e temporal. As vítimas de uma publicidade enganosa veiculada por vários órgãos de imprensa e em repetidos dias ou de um produto nocivo à saúde adquirido por vários consumidores em um largo espaço de tempo e em várias regiões têm, como causa de seus danos, fatos com homogeneidade tal que os tornam “a origem comum” de todos eles.[20]
 
Em seu sempre oportuno magistério, Ada Pellegrini Grinover, destaca que “a origem comum (causa) pode ser próxima ou remota. Próxima, ou imediata, como no caso da queda de um avião, que vitimou diversas pessoas; ou remota, mediata, como no caso de um dano à saúde, imputado a um produto potencialmente nocivo, que pode ter tido como causa próxima as condições pessoais ou o uso inadequado do produto”.[21]
 
Então, por decorrem de origem comum, os direitos em foco se dizem homogêneos, característica que é assim explicada por Antônio Gidi:
 
A homogeneidade decorre da circunstância de serem os direitos individuais provenientes de uma origem comum. Isso possibilita, na prática, a defesa coletiva de direitos individuais, porque as peculiaridades inerentes a cada caso concreto são irrelevantes juridicamente, já que as lides individuais, no que diz respeito às questões de direito, são muito semelhantes e, em tese, a decisão deveria ser a mesma em todos e em cada um dos casos.
 
Importante diferença entre os direitos em foco e as duas outras espécies tratadas no parágrafo único do art. 81 do CDC está em que, diferentemente daqueles, nestes é possível determinar individualmente os lesados, circunstância que, segundo Didier Jr. e Zaneti Jr., não altera a possibilidade e pertinência da ação coletiva, eis que permanece o traço distintivo, a saber: o tratamento molecular nas ações pertinentes aos direitos difusos ou direitos coletivos stricto sensu, em comparação à fragmentação da tutela (tratamento atomizado) nas ações individuais.[22]
 
Além disso, consoante os mesmos publicistas (p. 101):
 
no direito coletivo em sentido estrito, o grupo existe anteriormente à lesão e é formado por pessoas que estão ligadas entre si ou com a parte adversária por uma relação jurídica base;
 
no direito difuso, o grupo é formado por pessoas que não estão relacionadas; e
 
nos direitos individuais homogêneos, o grupo é criado, por ficção legal, após o surgimento da lesão. Trata-se de um grupo de vítimas. A relação que se estabelece entre as pessoas envolvidas surge exatamente em decorrência da lesão, que tem origem comum: essa comunhão na ancestralidade da lesão torna homogêneos os direitos individuais.
 
Com relação aos direitos individuais homogêneos, os citados autores arrematam afirmando que “Criado o grupo, permite-se a tutela coletiva, cujo objeto, como em qualquer ação coletiva, é indivisível (fixação da tese jurídica geral); a diferença, no caso, reside na possibilidade de, em liquidação e execução da sentença coletiva, o quinhão devido a cada vítima poder ser individualizado.
 
São ainda de Didier Jr. e Zaneti Jr. estas relevantes observações:
 
os direitos individuais que serão reunidos nas ações coletivas para tutela dedireitos individuais homogêneos podem ser objeto de um processo individual instaurado pelas vítimas em litisconsórcio por afinidade (art. 113, III, CPC). Também podem ocorrer demandas por representação processual dos associados, com autorização constitucional do art. 5º, XXI, CF/88 (...). Podem, ainda, ser objeto de ações individuais propostas pelas vítimas isoladamente. Essas ações são um bom exemplo de demandas repetitivas que podem dar ensejo ao incidente de julgamento de casos repetitivos (art. 928, CPC – incidente de resolução de demandas repetitivas ou recurso extraordinário e especial repetitivos). Tudo isso reforça a importância da ação coletiva sobre direitos individuais homogêneos: evita a proliferação de causas “atômicas”, “molecularizando” a solução do conflito e impedindo a prolação de decisões divergentes. Justamente em razão disto o Código previu que quando o juiz se deparar com diversas demandas individuais repetitivas irá oficiar aos colegitimados para promover a propositura da ação coletiva respectiva (art. 139, X).[23]
 
Vejamos a análise dos direitos individuais homogêneos quanto ao sujeito ativo, ao sujeito passivo e ao objeto:
 
Sujeito ativo
Aqui os sujeitos são sempre em número superior a um e determinados. Mais de um, porque em sendo um só, o direito é individual simples, e determinado porque neste caso, como o próprio nome diz, apesar de homogêneos, os direitos protegidos são individuais.
Mas, note-se: não se trata de litisconsórcio e sim de direito coletivo. Não é o caso de ajuntamento de várias pessoas, com direitos próprios e individuais no polo ativo da demanda, o que se dá no litisconsórcio ativo; quando se trata de direitos individuais homogêneos, a hipótese é de direito coletivo - o que permitirá, inclusive, o ingresso de ação judicial por parte dos legitimados no artigo 82 da lei consumerista.
É verdade que a ação individual ou a ação proposta por litisconsórcio facultativo não estão proibidas, como também, não está proibido o ingresso de tais ações no curso da ação coletiva de proteção aos direitos individuais homogêneos. Porém, não se pode confundir os institutos, que têm natureza diversa: no litisconsórcio o que há é reunião concreta e real de titulares individuais de direitos subjetivos no polo ativo da demanda; na ação coletiva para defesa de direitos individuais homogêneos, o autor da ação é único: um dos legitimados do artigo 82 do CDC. 
Sujeito passivo
São sujeitos passivos os responsáveis pelos danos causados aos sujeitos ativos, isto é, todas as pessoas que, direta ou indiretamente, tenham causado o dano ou participado do evento danoso, ou ainda, que tenham contribuído
Objeto
Aqui o objeto é divisível. A origem é comum e atingiu a todos os titulares determinados dos direitos individuais homogêneos, mas o resultado real da violação é diverso para cada um, de tal modo que se trata de objeto que se cinde, que é divisível.
 
[1] A defesa dos interesses difusos em juízo (...). 25ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, pp. 54-55.
[2] Manual de Processo Coletivo, 3ª ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2013, p. 82.
[3] Curso de Direito Processual Civil, vol. 4, 14ª ed. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2020, pp. 89-90.
[4] Paulo Bonavides (apud Carl Schmitt), em “Curso de Direito Constitucional”, 30ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 575.
[5] “Temas fundamentais do direito constitucional”. São Paulo: Saraiva, 2013, pp. 33-34.
[6] “Direito Constitucional Esquematizado”, 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 740.
[7] “Direito do trabalho”, 23ª ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 6.
[8] “Natureza transindividual dos direitos difusos e coletivos e as suas implicações jurídicas quanto à titularidade e às formas de defesa dos interesses de seus titulares”. Cadernos de Direito, Piracicaba, v. 17(33): 101-123, jul.-dez. 2017 • ISSN Eletrônico: 2238-1228. Disponível em: https://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_informativo/bibli_inf_2006/Cad-Dir_n.33.06.pdf
[9] “Processos coletivos: ações transindividuais e homegeneizantes”. Porto Alegre: Edição do autor, 2015, p. 25.
[10] Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr. Opus cit., p. 96.
[11] “A coisa julgada nas ações coletivas”. Disponível em: https://www.tjrj.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=cce8be67-3e36-49f5-912b-219abbae66ea&groupId=10136
[12] “Tendência na tutela jurisdicional dos interesses difusos”. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2012, pp. 33-34.
[13] “A tutela processual ambiental e a coisa julgada nas ações coletivas.” Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012, p. 37
[14] Opus cit., p. 97.
[15] “Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto”. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998, p. 625.
[16] “Processo coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos”, 7ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil – Revista dos Tribunais, 2019.
[17] “O processo coletivo para a defesa dos direitos individuais homogêneos”. Dissertação de Mestrado. Universidade de São Paulo, 2012, p. 43.
[18] Opus cit., p. 103.
[19] Opus cit., p. 99.
[20] “Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto”. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998: p. 629.
[21] “Da class action for damages à ação de classe brasileira: os requisitos de admissibilidade. Revista de Processo nº 101, ano 26, janeiro a março de 2001, p. 21.
[22] Opus cit., p. 99.
[23] Opus cit., p. 102.
Ação coletiva para a tutela de interesses coletivos lato sensu. Legitimidade para a propositura de ações coletivas. Ônus da prova nas ações coletivas.
1 .Legitimação
A legitimação ativa para a ação civil pública é, naturalmente, do Ministério Público, a quem compete realizar o inquérito civil para apurar dados necessários à propositura da causa (Lei nº 7.347/1985, art. 8º, § 1º), e a quem cabe receber informações, de qualquer interessado ou das autoridades judiciárias, para ensejar a propositura da ação em foco (idem, arts. 6º e 7º).
A lei, contudo, atribui legitimação concorrente a outras entidades, pessoas jurídicas estatais, autárquicas e paraestatais, bem como associações destinadas à proteção do meio ambiente ou à defesa do consumidor para promover a ação civil pública (idem, art. 5º). Na ordem prática não há preferência alguma entre os diversos legitimados.
Uma nova legitimação para a ação civil pública foi instituída pelo art. 88-A, acrescentado pela Lei nº 13.806/2019 à lei que define a Política Nacional de Cooperativismo (Lei nº 5.764/1971). Segundo esse dispositivo legal, “a cooperativa poderá ser dotada de legitimidade extraordinária autônoma concorrente para agir como substituta processual em defesa dos direitos coletivos de seus associados quando a causa de pedir versar sobre atos de interesse direto dos associados que tenham relação com as operações de mercado da cooperativa, desde que isso seja previsto em seu estatuto e haja, de forma expressa, autorização manifestada individualmente pelo associado ou por meio de assembleia geral que delibere sobre a propositura da medida judicial”.
No caso das associações, a tutela dos direitos individuais homogêneos fica restrita à “defesa dos seus associados”, e se limita àqueles que tenham domicílio “no âmbito da competência territorial do órgão prolator” (Lei nº 9.494, de 10.09.1997, art. 2º-A, acrescido pela MP nº 2.180-35, de 24.08.2001).
Se a ação coletiva for intentada contra a União, Estado, Município, ou suas autarquias e fundações, será obrigatória a instrução da petição inicial com a relação nominal dos associados da entidade autora a serem beneficiados, com os respectivos endereços (Lei nº 9.494, art. 2º-A, parágrafo único). Já se decidiu, porém, que se ação foi proposta por associação veiculando tutela genérica para todos os consumidores de determinado produto, dentro do território de um Estado, e a sentença decidiu a lide coletiva com a dimensão proposta pela autora, descabe, na fase de liquidação/execução, a alteração do seu alcance, “sob penade vulneração da coisa julgada”. Sendo assim, não terá aplicação ao caso a limitação contida no art. 2º-A, caput, da Lei nº 9.494/1997.
A jurisprudência predominante do STJ é no sentido de que as associações, na qualidade de substitutos processuais, detêm legitimidade para atuar judicialmente na defesa dos interesses coletivos de toda a categoria que representam, por isso a coisa julgada advinda da ação coletiva deve alcançar todas as pessoas da categoria, legitimando-as para a propositura individual da execução de sentença. Esse entendimento, entretanto, é passível de modificação em face do posicionamento do STF, que discutiu a matéria em sede de repercussão geral. Assentou a Corte constitucional que as entidades associativas limitam-se a promover demandas apenas em favor de seus associados. Em decorrência, “as balizas subjetivas do título judicial, formalizado em ação proposta por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial”.
Permite, outrossim, a lei a formação de litisconsórcio ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos do art. 5º, caput, com qualquer das partes (Lei nº 7.347, art. 5º, § 2º). No entanto, entende o STJ que a formação de litisconsórcio ativo facultativo entre o Ministério Público Estadual e o Federal depende da demonstração de alguma razão específica que justifique a presença de ambos no processo. O fundamento invocado foi o de que o litisconsórcio não justificado pode contrariar o princípio da economia processual, acarretando maior demora na marcha do processo pela necessidade de intimação pessoal de cada membro do Ministério Público, com prazo específico para manifestação.
Reconhece a jurisprudência, em determinados casos, a legitimação ativa da Defensoria Pública para a propositura da ação civil pública. É o que, por exemplo, dá-se quando em jogo a defesa de necessitados, não só no sentido de carentes de recursos econômicos, mas também os hipossuficientes jurídicos, como os idosos. Nesse sentido, o STJ reconheceu a possibilidade de ação civil pública pela Defensoria Pública, relacionada com interesses dos idosos em face de plano de saúde. É que, por preceito constitucional, “a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida” (CF, art. 230, caput).
Ainda, algumas leis que compõem o microssistema processual coletivo têm regras próprias sobre competência territorial, a afastar, portanto, o padrão estabelecido no art. 2º da Lei n. 7.347/85. Assim é o art. 209 do ECA, que fixa o local onde ocorreu ou deva ocorrer a omissão violadora dos direitos e interesses individuais, difusos e coletivos, como sendo o territorialmente competente para as ações coletivas em tema de Infância e Juventude. Também o art. 80 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003), que fixa o foro do domicílio do idoso como sendo o competente para as ações coletivas tendentes a protegê-lo.
O Ministério Público, não sendo autor, funcionará sempre como fiscal da lei (art. 5º, § 1º). Pode, ainda, estabelecer-se litisconsórcio facultativo entre Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados (§ 5º).
A legitimação passiva da ação civil pública é ampla, compreendendo pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, ou seja, qualquer pessoa a que se impute, in concreto, responsabilidade por ofensa aos bens coletivos mencionados no art. 1º da Lei nº 7.347/1985.
2.Legitimação de pessoa jurídica de direito público
A Lei no 7.347/1985, art. 5o, III, confere às pessoas jurídicas de direito público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) legitimação ampla para promover a ação civil pública, nos limites do respectivo art. 1o (com a redação da Lei no 12.529/2011), nos quais se incluem os danos ao consumidor (inciso II).
Quando se trata, porém, de defesa dos consumidores, a Lei no 8.078/1990 (CDC) prevê que a ação coletiva pode tanto proteger direitos difusos e coletivos, como direitos individuais homogêneos (art. 81, parágrafo único). Mas, no tocante aos direitos individuais homogêneos, a tutela por ação coletiva pressupõe esteja em jogo o interesse coletivo. Ou seja:
“3. O traço que caracteriza o direito individual homogêneo como coletivo – alterando sua disponibilidade – é a eventual presença de interesse social qualificado em sua tutela, correspondente à transcendência da esfera de interesses puramente particulares pelo comprometimento de bens, institutos ou valores jurídicos superiores, cuja preservação importa à comunidade como um todo.”
Para a jurisprudência do STJ, “a qualidade moral e técnica necessária para a configuração da pertinência temática e da representatividade adequada tem íntima relação com o respeito das garantias processuais das pessoas substituídas, a legitimidade do provimento jurisdicional com eficácia ampla e a própria instrumentalização da demanda coletiva, evitando o ajuizamento de ações temerárias, sem fundamento razoável, ou propostas por motivos simplesmente políticos ou emulatórios”.
Diante de decisão recorrida, de segundo grau, que negara ao Município legitimidade para questionar por ação civil pública a cobrança da tarifa bancária de “renovação de cadastro”, o STJ decidiu que o caso não repercutia, como afirmado na decisão recorrida, apenas sobre o grupo restrito dos servidores públicos. Em razão disso, não julgou correto falar-se em falta de competência do Município para defesa de direitos individuais homogêneos, por suposta falta de representativa adequada ou de pertinência temática. Ao prover o recurso especial, aquela Corte Superior aduziu, no mesmo especial, o seguinte:
“8. Ainda que tenha sido mencionada como causa de pedir e pedido a cobrança da tarifa de “renovação de cadastro” de servidores municipais, é certo que o direito vindicado possui dimensão que extrapola a esfera de interesses puramente particulares dos citados servidores, o que é suficiente para o reconhecimento da legitimidade do ente político para essa primeira fase da tutela coletiva de interesses individuais homogêneos.”
3.Ação coletiva por meio de associação
As associações são legitimadas para ações coletivas em circunstâncias diversas: (a) podem defender, em ação civil pública, direitos difusos ou coletivos (Lei nº 7.347/1985, art. 5º, V);
(b) podem defender direitos individuais homogêneos de seus associados, de forma genérica (CDC, arts. 82, IV, e 91);
(c) podem, ainda, em ação comum, propor ação em defesa de seus associados, representando-os na forma do art. 5º, XXI, da Constituição, sem sujeitar-se ao regime procedimental do CDC.
I – Defesa dos direitos coletivos e dos individuais homogêneos
Nos dois primeiros casos, ocorre ação coletiva, em que os possíveis direitos individuais ofendidos são apenas genericamente beneficiados pela sentença de procedência do pleito patrocinado pela associação, como substituta processual. Cabe a cada consumidor ou interessado promover a liquidação e execução do prejuízo individual enquadrável na força da condenação genérica. A execução poderá, também, ser movida coletivamente pela associação, mas, já então, o caso será de representação, devendo cada interessado conferir-lhe poderes para a defesa de sua situação individual. É nesse sentido que o art. 95 do CDC qualifica como genérica a condenação obtida em ação coletiva de defesa de direitos individuais homogêneos. A ação de cognição desenvolve-se sob o regime de substituição processual, e, na fase de execução, submete-se ao de representação.
Observe-se que, sendo o direito defendido difuso ou coletivo, não há dúvida de que a ação intentada pela associação beneficia genericamente toda a comunidade interessada e não apenas seus associados, mesmo porque o direito tutelado é indivisível. Mas, quando se trata de direitos individuais homogêneos, a associação constitucionalmente só se legitima a defender os interesses deseus próprios filiados (CF, art. 5º, XXI), conforme jurisprudência atual do STF e do STJ. Não há como estender o efeito do decisório a quem, embora se encontre na mesma categoria, não integra o quadro de associados da entidade autora.
II – Defesa coletiva de direitos dos associados
Na terceira situação, a atividade da associação é, desde a origem, enquadrada na figura processual da representação, pois como literalmente se prevê no art. 5º, XXI, da Constituição, as entidades associativas só representam seus filiados em juízo “quando expressamente autorizadas”. Quando, então, a associação já ingressa em juízo como representante de seus filiados, e o faz para reclamar direitos individuais deles, desde logo identificados e líquidos, não há de se exigir nova representação para legitimá-la a promover o subsequente cumprimento da sentença ou a liquidação da condenação acaso obtida de forma ilíquida.
O permissivo constitucional, in casu, não é de uma ação coletiva como aquela regulada pelo CDC; é, na verdade, de uma ação singular, com vários titulares previamente definidos, todos representados pela associação. O efeito prático, querido pela regra constitucional, é apenas o de simplificar o procedimento, tornando a entidade associativa sujeito ativo da demanda, para eliminar os inconvenientes do litisconsórcio tradicional. Daí que não se hão de aplicar as normas de liquidação e habilitação individuais cogitadas pelos arts. 94 a 98 do CDC. A sentença, sendo líquida quanto à pretensão de cada associado representado pela entidade autora, terá o respectivo cumprimento promovido pela mesma entidade, não havendo que se cogitar de credores sujeitos a habilitação, nem de créditos genéricos pendentes de liquidação.
Enfim, a associação, nos moldes do art. 5º, XXI, da Constituição (e não do art. 91 do CDC), não age por legitimação apenas legal. Representa os associados porque estes lhe delegaram a representação que, em última análise, se desempenha no processo. Não se trata (diversamente do regime das ações coletivas do CDC) de simples imposição legal, mas de representação consentida pela ordem jurídica e autorizada pelos representados. Tendo a associação representação plena para o foro, habilitada se acha para obter a condenação, bem como para promover a competente execução, sem depender de novo ato de legitimação dos associados.
O entendimento exposto – advirta-se – vale para a ação comum intentada por associação, na defesa de interesses individuais perfeitamente identificados e individualizados desde a propositura da demanda (CF, art. 5º, XXI). Se a pretensão deduzida pela associação é genérica, não só quantitativamente, mas também subjetivamente, o grupo de interessados se apresenta aberto e não definido com precisão, de sorte que a ação realmente será coletiva e se sujeitará ao regime processual tratado pelo CDC, para a tutela dos direitos individuais homogêneos, especialmente no que toca à disciplina dos arts. 95, 97 e 98. A substituição processual se completa com a obtenção de sentença genérica, e a execução terá de se processar, segundo o interesse individual de cada associado, conforme o regime de representação, caso não queira o próprio credor promover pessoalmente o cumprimento da sentença na parte que lhe diz respeito.
Todavia, para o STF, nessa modalidade de demanda coletiva, a eficácia da coisa julgada somente alcança os filiados, da associação autora, “residentes no âmbito da jurisdição do órgão julgador, que o fossem em momento anterior ou até a data da propositura da demanda, constantes da relação jurídica juntada à inicial do processo de conhecimento”.
III – A associação e a ação civil pública
Para que seja legitimada a propor a ação civil pública, é necessário que a associação tenha sido constituída há, pelo menos, um ano (Lei nº 7.347/1985, art. 5º, V, a), nos termos da lei civil (CC, arts. 45 e 53). É exigido ainda que se inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (Lei nº 7.347/1985, art. 5º, V, b).
Entre os casos em que não se legitima a associação a defender direitos individuais homogêneos de seus filiados figura a ação civil pública que visa condenar seguradoras a indenizar vítimas acobertadas pelo DPVAT, por não se divisar na espécie relação contratual e tampouco relação de consumo.
4.Ações coletivas promovidas por sindicatos
Assegura a Constituição, ainda, outra legitimação para as ações coletivas aos sindicatos, a quem é conferida, ex lege, a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas (CF, art. 8º, III). As entidades sindicais, portanto, têm legitimidade ativa para demandar em juízo a tutela de direitos subjetivos individuais homogêneos dos integrantes da categoria, desde que “guardem relação de potencialidade com os fins institucionais do sindicato demandante”.
O sindicato, quando patrocina a defesa de direitos individuais homogêneos da categoria, atua como substituto processual, em busca de sentença genérica, nos moldes do art. 95 do CDC (Lei nº 8.078/1990), “sem qualquer juízo a respeito da situação particular dos substituídos”. Por isso, dispensável é, nas ações coletivas sindicais, “a autorização individual dos substituídos”.
I – Representação ou substituição processual?
Obtida a condenação genérica por obra do sindicato, cabe a cada um dos substituídos demandar as vantagens individuais, se não forem satisfeitas espontaneamente. Para esse fim, isolada ou conjuntamente, será proposta ação de execução da sentença coletiva. Se preferida a via coletiva, a execução será sob a forma de representação ou de substituição processual? Já se decidiu na 1ª Turma do STJ que a substituição exercida pelo sindicato prevaleceria apenas até a sentença e que, na fase de execução, o regime processual passaria a ser o de representação. Teria, por isso, o órgão sindical de comprovar a outorga dos exequentes e de liquidar os valores que individualmente correspondam a cada representado.
Em decisão da Corte Especial, porém, o STJ consagrou o entendimento de que a passagem da fase cognitiva para a de cumprimento da sentença não altera o regime de atuação processual do sindicato, que continua sendo o de substituição processual e não o de representação. Esse regime tem raízes constitucionais, e no art. 8º, III, da Constituição Federal, que o embasa, não se encontra ressalva capaz de autorizar a distinção da forma de atuação sindical no estágio anterior e no posterior à sentença. Desnecessária, portanto, a autorização dos filiados para que a execução coletiva tenha curso. Isto, porém, não afasta a necessidade lógica de que, no cumprimento da sentença, a entidade promovente da execução coletiva tenha de individualizar os credores substituídos e os valores dos respectivos créditos.
II – Execução da sentença em ações ajuizadas pelo sindicato: requisitos
Com efeito, para ter acesso à execução, não basta invocar a sentença condenatória genérica. A situação individual de cada exequente, isto é, o fato constitutivo do direito subjetivo de cada interessado, tem de ser demonstrado na fase de cumprimento do julgado coletivo. Os valores e os sujeitos da execução devem ser quantificados e identificados, ao mesmo tempo em que se procede à certificação das situações fático-jurídicas individuais. A execução coletiva, por meio da entidade sindical, depende de:
(a) existência da sentença condenatória coletiva;
(b) prova da situação individual enquadrável na conjuntura reconhecida pela sentença genérica;
(c) mensuração do direito subjetivo de cada exequente, realizada no procedimento preparatório da liquidação da sentença.
Também o STF, depois de idas e vindas, consolidou sua jurisprudência no sentido de que, tanto na fase de conhecimento, como na de liquidação ou de cumprimento da sentençaproferida em ações em que se discutam direitos individuais homogêneos, a atuação do sindicato se dá na qualidade de substituto processual, sem necessidade de prévia autorização dos trabalhadores.
Suscitada a repercussão geral da questão, o Pleno do STF não só a reconheceu por unanimidade, como no mérito reafirmou, por maioria, a jurisprudência dominante naquela Corte “no sentido da ampla legitimidade extraordinária dos sindicatos para defender em juízo os direitos e interesses coletivos ou individuais dos integrantes da categoria que representam, inclusive nas liquidações e execuções de sentença, independentemente de autorização dos substituídos”.
5.O Ministério Público e a tutela coletiva dos direitos individuais homogêneos
Com o advento do Código de Defesa do Consumidor, indagaram doutrina e jurisprudência se estaria o Ministério Público legitimado à defesa em juízo dos interesses individuais do consumidor isolado ou de pequenos grupos determinados de consumidores vítimas de um dano de origem comum.
Dispõe o art. 127 da Constituição Federal de 1988, verbis:
“O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.
Observa-se, pois, que a Carta Magna fez menção exclusivamente a direitos individuais indisponíveis como de possível defesa por parte do Ministério Público. Portanto, a sua legitimação somente se verifica quando houver a malversação de tal categoria de direitos, entendida como sendo “aqueles dos quais diz a palavra não se puder dispor, porque integrados na personalidade humana”.
A restrição imposta pelo legislador constituinte justifica-se na medida em que ao Ministério Público é vedada a prática da advocacia (art. 128, § 5.º, “b”). Advogar outra coisa não é senão promover a defesa de direitos individuais, particularmente os disponíveis.
É à luz do art. 127, pois, que se deve interpretar o art. 81, parágrafo único, III, do Código de Defesa do Consumidor, que autoriza o Ministério Público a promover a defesa coletiva dos interesses individuais homogêneos. Assim sendo, tem-se que somente em se tratando de direito individual homogêneo indisponível estará o Ministério Público legitimado à propositura da ação coletiva de consumo, jamais a ação civil pública.
Nesse sentido, é a orientação da melhor doutrina que tem como seu representante Hugo de Brito Machado:
“Não se pode admitir a defesa, pelo Ministério Público, de um direito individual disponível, ao argumento de que se trata de um direito homogêneo. Como já dissemos, isso implicaria admitir a prática da advocacia pelo Ministério Público”.
Com efeito, “vedado, como é, aos membros do Ministério Público o exercício da advocacia, e sendo atribuição sua apenas a defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis, não tem o parquet legitimidade para promover ações na defesa de interesses individuais disponíveis”. Diversa não tem sido a orientação preconizada pelos Tribunais, em especial pelo Superior Tribunal de Justiça.
Todavia, pode haver hipótese em que, num só ato, dois são os interesses lesados: um de natureza divisível, individual, subjetiva, cuja defesa cabe ao próprio lesado; e outro, de caráter indivisível, coletivo e difuso, de interesse social, cuja proteção se impõe ao Ministério Público. São, v.g., indivisíveis os interesses atinentes à saúde, à educação, ao transporte coletivo etc., porque uma vez ignorados geram grandes transtornos para a sociedade. O Ministério Público, então, estaria legitimado não pelo simples fato de haver uma soma de interesses individuais, mas sim pelo fato de a lesão a um direito subjetivo desse tipo causar repercussões prejudiciais a toda coletividade. Seria, então, o interesse social, como direito difuso, que estaria sendo protegido e tutelado pelo Ministério Público, e não apenas os direitos individuais homogêneos dos diversos prejudicados de per si. Nesse sentido, o STF assentou, por exemplo, que “o Ministério Público tem legitimidade para promover ação civil pública cujo fundamento seja a ilegalidade de reajuste de mensalidades escolares” (STF, Súmula nº 643).
Interesse social, conforme ensina Rodolfo de Camargo Mancuso, “é o interesse que reflete o que esta sociedade entende por ‘bem comum’; o anseio de proteção à res publica; a tutela daqueles valores e bens mais elevados, os quais essa sociedade, espontaneamente, escolheu como sendo os mais relevantes. Tomando-se o adjetivo ‘coletivo’ num sentido amplo, poder-se-ia dizer que o interesse social equivale ao exercício coletivo do interesse coletivo”.
Não é pelo simples fato de serem tratados numa dimensão coletiva que os direitos individuais assumem relevância social. Alerta Teori Albino Zavascki que os “direitos individuais só devem ser considerados como de interesse social quando sua lesão tiver alcance mais amplo que o da simples soma das lesões individuais, por comprometer também valores comunitários especialmente privilegiados pelo ordenamento jurídico”.
O Ministério Público não está legitimado a defender o interesse de pequenos grupos de consumidores, porque neste caso não estará afetado interesse da sociedade como um todo, mas apenas de parcela determinada dessa. É necessário que a lesão sofrida pelos titulares de direito subjetivo configure um interesse social. Isto é, que desta situação decorra, a um só tempo, direitos individuais homogêneos e interesse social, de natureza difusa. Em outros termos, a defesa de interesse de um grupo determinado convém à sociedade como um todo, quando a violação de direitos individuais ofende também o direito da coletividade. Nesta hipótese confere-se ao Ministério Público legitimidade para agir exatamente porque busca a tutela do interesse de dimensão coletiva ou difusa. A proteção dos interesses individuais homogêneos se faz, portanto, por via reflexa. De outro modo, não se pode entender o interesse social.
A maioria da doutrina é assente na necessidade de que haja a presença do interesse social na tutela do interesse individual homogêneo por parte do Ministério Público. A definição do que seja interesse social é que se mostra carregada de avaliação subjetiva, quando, na verdade, dever-se-iam adotar critérios objetivos, como ilustra no já citado aresto do STF o Ministro Sepúlveda Pertence.
O Ministério Público, portanto, não está institucionalmente concebido como defensor de direitos individuais homogêneos, mas apenas dos que correspondam a “interesses sociais” (CF, art. 127). Os “interesses individuais” somente entram na esfera de atuação do Parquet quando sejam “indisponíveis”, jamais quando disponíveis.
De maneira geral, os direitos do consumidor assumem feitio coletivo, com repercussão social, razão pela qual a jurisprudência inclina-se por reconhecer, com maior amplitude, a legitimidade do Ministério Público para a ação coletiva em sua defesa, até mesmo quando se trate de direitos individuais homogêneos. O STJ, por sua vez, já sumulou sua jurisprudência, no sentido de que “o Ministério Público tem legitimidade ativa para atuar na defesa de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores, ainda que decorrentes da prestação de serviço público” (Súmula 601/STJ).
Não se pode admitir, todavia, que o Ministério Público use sua titularidade da ação civil pública (coletiva por natureza) para promovê-la em ação singular na defesa individual e isolada de determinado consumidor. A substituição processual ocorre sempre como exceção aberta pela lei (CPC/2015, art. 18). A que se dá na ação civil pública é necessariamente coletiva. Pode até existir substituição processual exercitável pelo Ministério Público em relação a indivíduo apartado de qualquer coletividade, mas isto dependerá de previsão em lei especial. Fora dessas situações excepcionais, o Ministério Público é carecedor de ação individual em defesa de consumidor.
Eis alguns casos de ação coletiva em que os tribunais reconhecem legitimidade ao Ministério Público

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