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direito a agua potavelAngélica Loro

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1 
 
 
 
UNIJUI - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO 
GRANDE DO SUL 
 
 
ANGÉLICA LORO 
 
 
 
 
 
 
 
 
RECURSOS HÍDRICOS: PROTEÇÃO JURÍDICA E A GARANTIA DO DIREITO DE 
ACESSO À ÁGUA POTÁVEL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Santa Rosa (RS) 
2015 
2 
 
 
 
 
 
ANGÉLICA LORO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RECURSOS HÍDRICOS: PROTEÇÃO JURÍDICA E A GARANTIA DO DIREITO DE 
ACESSO À ÁGUA POTÁVEL 
 
 
 
 
 
 
 
Monografia final do Curso de Graduação em 
Direito objetivando a aprovação no 
componente curricular Monografia. 
UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste 
do Estado do Rio Grande do Sul. 
DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e 
Sociais 
 
 
 
 
 
Orientadora: MSc. Fernanda Serrer Scherer 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Santa Rosa (RS) 
2015 
3 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho a todas as pessoas que se 
preocupam com a preservação ambiental, com 
a dignidade humana e continuação da 
existência. 
4 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
 
 
 
Primeiramente a Deus, acima de tudo, 
pela vida, força e coragem. 
 
Ao universo por ter me oportunizado 
através desse trabalho um maior crescimento 
pessoal e a enxergar a vida com um olhar 
mais humano e menos materialista. 
 
Aos meus pais, que acima de qualquer 
vontade, projeto pessoal e até mesmo 
necessidade, priorizaram o estudo e a 
educação me proporcionando, mesmo com 
muitas dificuldades, uma educação 
qualificada desde as séries inicias. 
 
À minha mãe em especial, por tantas 
vezes ao longo desta caminhada ter escutado 
meus desabafos, medos e angústias e, por 
vezes mesmo sem entender direito do que se 
tratava me fez acreditar que tudo daria certo, 
me dando força e incentivo para continuar no 
meu propósito de concluir o curso. 
 
À minha orientadora, professora 
Fernanda Serrer Scherer, que assumiu esse 
desafio junto comigo e sem medir esforços 
nem horários me proporcionou inúmeros 
aprendizados e brilhantemente me conduziu a 
um resultado satisfatório. 
 
A todos que de uma forma ou outra 
colaboraram durante toda a trajetória de 
construção deste trabalho, meu muito 
obrigada! 
5 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A água é uma necessidade primária, portanto, 
direito e patrimônio de todos os seres vivos, 
não apenas da humanidade. A água é, por 
excelência, um bem de destinação universal. A 
primazia da vida se estabelece sobre todos os 
outros possíveis usos da água. Nenhum outro 
uso da água, nenhum interesse de ordem 
política, de mercado ou de poder, pode se 
sobrepor às leis básicas da vida. 
 
CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS 
DO BRASIL. Fraternidade e água: CF-2002. 
São Paulo: Salisiana, 2003, p. 53. 
6 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
Diante da grave crise ecológica vivida atualmente e do reconhecimento da essencialidade da 
água para a manutenção da vida é preciso aprofundar o debate acerca da utilização, gestão e 
precificação dos recursos hídricos. Limitar o acesso à água com base em argumentos de 
mercado significa negar ao ser humano a dignidade e a própria existência. Com o propósito de 
compartilhamento de ideias e aprofundamento do diálogo acerca do tema, em um primeiro 
momento, faz um apanhado doutrinário e documental com um olhar para os mecanismos 
internacionais de proteção da água, seja como bem econômico ou recurso natural essencial, 
tanto no cenário global, como da América Latina e do Mercosul. Trata também, das Políticas 
Públicas brasileiras de Recursos Hídricos em âmbito Federal e Estadual, com vistas à 
democratização do acesso aos recursos hídricos, enfatizando a implantação de um Sistema de 
Gerenciamento por Bacia Hidrográfica e a eficácia desse sistema na destinação e controle dos 
usos das águas. Em um segundo momento, analisa os instrumentos de gestão hídrica e 
apresenta os entendimentos da água, considerada por vezes como bem ambiental dotado de 
valor econômico e por outras, como recurso natural disponível no meio ambiente e essencial à 
vida, demonstrando porque não pode e não deve ser considerada como simples mercadoria. 
Por fim, faz uma análise de dados nos diversos usos da água, destacando a importância da 
gestão descentralizada e participativa na definição do emprego dos recursos hídricos. 
 
Palavras-chave: Água. Recurso natural. Bem dotado de valor econômico. Direito 
fundamental. Gestãodescentralizada e participativa. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
Considering the severe ecological crisis that we are currently living, and recognizing how 
essential water is for life maintenance, it is necessary to deeply debate the use, management 
and pricing of hydric resources. Limit access to water based on market arguments means to 
deny the human dignity and existence. In order of sharing ideas and deepening dialogue on 
the subject, at first is needed a doctrinal and documentary summary looking at the 
international mechanisms for water protection, either as an economic or essential natural 
resource, both on the global stage such as Latin America and Mercosur. Furthermore, it is 
necessary to deal with Brazilian Public Policies of Water Resources in Federal and State 
levels; democratizing access to water resources, emphasizing the implementation of a 
Management System for River Basin and how this system can be somewhat effective in the 
allocation and control of water uses. Next, it is demanded to analyse water management tools 
and present the understandings about water, which is sometimes considered as environmental 
well with economic value, and by others as a natural resource available in the environment 
and essential to life - demonstrating why it should not be considered as a commodity. Last, 
analyse data of the different water uses, highlighting the importance of decentralized and 
participatory management in defining the use of water resources. 
 
Key-words: Water. Natural Resource. Well-endowed with economic value. Fundamental 
right. Decentralized participatory management. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 9 
 
1 A PROTEÇÃO JURÍDICA DAS ÁGUAS ........................................................................ 12 
1.1 Proteção das águas no cenário global ............................................................................. 12 
1.2 Proteção das águas na América Latina e Mercosul....................................................... 19 
1.3 Aspectos constitucionais da tutela das águas no Brasil ................................................. 21 
1.4 Aspectos infraconstitucionais: o Código de Águas e a Lei das Águas ......................... 24 
1.5 Competências na gestão das águas em âmbito nacional e estadual e a busca pela 
consolidação de um sistema democrático e participativo de tratamento das águas ......... 28 
 
2 A GESTÃO DA ÁGUA NO BRASIL: ASPECTOS ECONÔMICOS E SOCIAIS ...... 38 
2.1 Legislação e a economia: uma análise dos instrumentos de gestão hídrica ................ 38 
2.2 Água como bem econômico ou como recurso natural? ................................................. 48 
2.3 A água em seus diversos usos e a necessidade da consolidação do sistema de 
gerenciamento descentralizado e participativo dos recursos hídricos com vistas a 
garantir o acesso ao recurso enquanto direito humano fundamental ............................... 60 
 
CONCLUSÃO .........................................................................................................................76 
 
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 80 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
9 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
O presente trabalho visa a apresentar o tema proteção jurídica e garantia do direito de 
acesso à água potável a partir de uma gestão participativa e da visão da água como recurso 
natural essencial à vida digna. Essa é a relevância jurídica e social do tema proposto, já que 
não existe vida sem água e nem substituto possível de suprir a essencialidade desse recurso. 
Limitar seu acesso a qualquer ser vivo é também limitar a sua dignidade e a própria 
existência. 
 
O problema da pesquisa está no acesso à água potável, que embora previsto 
formalmente nos institutos jurídicos, nem sempre se concretiza e, no tratamento que é 
destinado aos recursos naturais, sobretudo a água, que não é um bem econômico como vem 
sendo propalada por alguns tratados e círculos internacionais, e sim, recurso natural vital e 
que precisa ser assim entendida para que possa efetivamente ser protegida. 
 
Elabora uma análise doutrinária e documental acerca do conjunto normativo existente 
em âmbito global, Latino-Americano, do Mercosul, nacional e estadual sobre a proteção dos 
recursos hídricos e acesso dos mesmos às populações fazendo uma análise da água tanto sobre 
seu viés econômico, quanto como recurso natural com garantia de acesso a todos por se tratar 
de direito humano fundamental. Nesse sentido analisa o conteúdo normativo apontando os 
dispositivos capazes de garantir a proteção e destinação do recurso primordialàs necessidades 
da vida. 
 
Inicialmente, estuda a proteção internacional das águas apresentando alguns dos mais 
relevantes acordos, tratados e declarações firmados pela Organização das Nações Unidas e 
por organismos dela decorrentes, bem como as características, objetivos e avanços trazidos 
por alguns desses documentos, principalmente no que diz respeito ao tema dos direitos 
humanos fundamentais, que vem consolidando o direito de todos os seres humanos ao meio 
10 
 
 
 
ambiente ecologicamente equilibrado e o acesso à água limpa como direito prioritário a ser 
considerado nas políticas públicas e na gestão do recurso. 
 
Também estuda os aspectos constitucionais e infraconstitucionais no tratamento 
brasileiro das águas, bem como as competências na gestão do recurso em âmbito Federal e 
Estadual com vistas à consolidação de um sistema descentralizado e participativo de 
tratamento das águas, por meio de bacia hidrográfica e de que forma esse sistema poderá ser 
mais ou menos eficaz na destinação e controle dos usos das águas, inclusive com a 
implementação do mecanismo de cobrança pelo uso d‟água aos setores que a tem apenas 
como insumo de seus processos produtivos, como forma de garantir a democratização do 
acesso ao recurso hídrico. 
 
Além disso, num segundo momento, diante da preocupação existente com o uso e 
aproveitamento sustentável dos recursos hídricos, faz-se uma análise dos instrumentos de 
gestão das águas previstos na Lei das Águas brasileira, lei nº 9.433/97, sob um viés crítico e 
reflexivo, em especial quanto ao paradoxo estabelecido na definição das águas, ora como bem 
público e ora como bem privado e precificável. 
 
Nesse sentido, discute os efeitos nefastos do processo econômico de mercantilização 
dos recursos hídricos e seus impactos sobre as populações menos favorecidas, bem como, 
apresenta a água como recurso natural vital e não como simples mercadoria, discutindo a 
maneira como deve ser administrada e gerenciada para que possa atender às necessidades 
básicas da vida humana e animal, não só em situações de escassez. 
 
Por último faz uma análise de dados relativos à quantidade, qualidade e 
disponibilidade da água doce em cenário global e nacional e de seus diversos usos, do qual 
assumem maior importância o abastecimento humano, os usos agrícola e industrial e a 
produção de energia. Analisa os percursos de desenvolvimento insustentável desses setores e 
as possíveis soluções para que o equilíbrio entre oferta e demanda possa ser restaurado, 
visando o crescimento e desenvolvimento sustáveis como forma de garantir a continuação da 
existência de vida e a dignidade humana. 
 
11 
 
 
 
O método aplicado na elaboração da presente pesquisa é hipotético-dedutivo, 
concretizando-se por meio do procedimento exploratório, de fontes bibliográficas disponíveis 
em meios físicos e na rede de computadores. 
 
Inicialmente foi realizada a seleção bibliográfica e de documentos afins à temática. 
Uma vez feita a leitura e fichamento do material selecionado, permitindo a reflexão crítica 
sobre o tema, foi possível a exposição dos resultados obtidos através de um texto escrito 
monográfico. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
12 
 
 
 
1 A PROTEÇÃO JURÍDICA DAS ÁGUAS 
 
O tema da água está presente nos diferentes espaços sociopolíticos e ambientais de 
âmbito mundial. Além de ser um recurso fundamental para a sadia e digna qualidade de vida, 
a água é para a maioria dos países, um bem escasso, tendo motivado disputas internas nos 
países e mesmo no âmbito internacional. Portanto, diante de sua essencialidade para vida, não 
é possível definir seu uso e cuidado, apenas observando as divisas políticas. 
 
Considerando tais aspectos, será desenvolvido ao longo deste capítulo, um apanhado 
dos documentos internacionais de proteção da água e sua internalização na estrutura jurídica e 
normativa brasileira, além da discussão dos aspectos históricos, a construção e os conteúdos 
do Código de Águas, da Lei Federal das Águas e da Lei Gaúcha, compreendendo a forma 
como o Brasil protege os recursos hídricos, assim como as competências das diferentes 
esferas de governo, na proteção e gerenciamento da água, entendida como bem público e 
recurso essencial à vida e à sustentabilidade do planeta. 
 
1.1 Proteção das águas no cenário global 
 
No âmbito global, o mais abrangente entre os documentos e tratados internacionais 
que visam a proteção e distribuição das águas é a Convenção das Nações Unidas sobre o 
Direito do Mar assinada em 10 de dezembro de 1982 em Montego Bay na Jamaica, sendo 
ratificada pelo Brasil em 1987 e entrando em vigor em 1995. A convenção objetiva regular a 
exploração econômica dos fundos marinhos e oceânicos, bem como, a proteção e preservação 
de espécies e meio ambiente marinhos (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2015a, grifo 
nosso). 
 
Conforme palavras de Fábio Konder Comparatto (2001, p. 405), “o texto da 
Convençãosobre o Direito do Mar tem 319 artigos e 08 anexos e é o mais longo de toda a 
história do direito internacional.” 
 
Ainda no cenário global, foi estabelecida em 02 de fevereiro de 1971 na cidade 
iraniana de Ramsar, a Convenção de Ramsar ou Convenção sobre Zonas Úmidas de 
13 
 
 
 
Importância Internacional
1
, como também é conhecida. A referida convenção está em vigor 
desde 21 de dezembro de 1975 e seu tempo de vigência é indeterminado.Trata-se de 
umtratado intergovernamental que estabelece marcos para ações nacionais fundamentadas no 
reconhecimento, pelos países signatários da Convenção, da importância ecológica e do valor 
social, econômico, cultural, científico e recreativo de tais áreas e, para a cooperação entre 
países com o objetivo de promover a conservação e o uso racional de zonas úmidas no 
mundo. Os países membros são denominados no âmbito da convenção como “partes 
contratantes” e até janeiro de 2010, a Convenção contava com 159 adesões (MINISTÉRIO 
DO MEIO AMBIENTE, 2015b, grifo nosso). 
 
O Brasil, possuidor de grande quantidade de zonas úmidas, assinou a Convenção em 
1993, vindo a ratificá-la três anos depois. Tal decisão possibilita ao país benefícios como a 
cooperação técnica e apoio financeiro para promoção e utilização dos recursosnaturais das 
zonas úmidas de maneira sustentável, proporcionando qualidade de vida aos habitantes dessas 
áreas (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2015b). 
 
A grande inovação trazida pelo Decreto nº 1.905/96 que promulgou a Convenção de 
Ramsar, está no caráter de regionalização de seu art. 5º, que considera a formação das bacias 
hidrográficas
2
 para estabelecer os critérios e normas de utilização das águas, algo inédito em 
termos de tratamento e regulação de uso das águas doces. O referido artigo estabelece ainda, 
que as partes contratantes deverão ser consultadas mutuamente sobre a utilização ou 
intervenção por uma das partes nas bacias hidrográficas, sempre que esta se estender sobre 
territórios de mais de uma parte contratante, como por exemplo, a bacia amazônica que 
perpassa fronteiras territoriais de vários países (BRASIL, 2015b). 
 
No debate sobre o tratamento internacional das águas, apesar de existir inúmeros 
outros tratados internacionais e acordos bilaterais quetratam sobre garantias dos direitos 
 
1
 O conceito de Zonas Úmidas adotado pela Convenção de Ramsar é abrangente, compreendendo, 
além de diversos ambientes úmidos naturais, também áreas artificiais, como represas, lagos e açudes. 
A inclusão de áreasartificiais decorre do fato de que, originalmente, a Convenção se destinava a 
proteger ambientes utilizados por aves aquáticas migratórias (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 
2015b). 
2
 Bacia hidrográfica é um complexo hídrico formado por diversos rios e lagos, bem como de 
reservatórios subterrâneos que formam um manancial aquático com grande diversidade biológica, 
onde se mantém e conservam suas fontes, mantendo uma intercomunicação entre si (SCHERER, 
2014). 
14 
 
 
 
humanos e do acesso e uso das águas em âmbito internacional, não se pode deixar de citar, o 
tratamento e regulação do uso das águas no âmbito da Organização das Nações Unidas para a 
Educação a Ciência e a Cultura - UNESCO, e algumas importantes iniciativas de outros 
setores da ONU. 
 
De acordo com João Alberto Alves Amorim (2015), a UNESCO lançou em 1975 o 
Programa Hidrológico Internacional (PHI) de caráter intergovernamental, que vem desde a 
sua criação, desempenhando importante papel de cooperação científica em matéria de 
pesquisa hidrológica, gestão, educação e criação de capacidades dos recursos hídricos, além 
de servir como plataforma para a criação e difusão de uma maior consciência sobre os temas 
da água. 
 
Outra importante participação no âmbito da ONU por meio de seu Programa das 
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) se deu em 20 de junho de 1990, em que foi 
adotada a Carta de Montreal sobre Água Potável e Saneamento, que em seu preâmbulo, prevê 
que o acesso à água potável, em quantidade e qualidade suficientes para a satisfação das 
necessidades básicas, é indissociável de outros direitos da pessoa humana (AMORIM, 2015). 
 
No ano de 1992, a Comissão Econômica das Nações Unidas para a Europa (UNECE) 
adotou, em âmbito regional, a Convenção sobre a Proteção e Uso Transfronteiriço de Cursos 
d‟Água e Lagos Internacionais, conhecida como Convenção de Helsinki, que entrou em vigor 
em 06 de outubro de 1996. Segundo definição dessa Convenção, águas transfronteiriças são 
“quaisquer águas superficiais ou subterrâneas que marquem, cruzem ou estejam na fronteira 
entre dois ou mais Estados.” (SANDS apud AMORIM, 2015, p. 156). 
 
Fundamentada no conceito de prevenção e controle da poluição, foi a Convenção de 
Helsinki que adotou de modo expresso o princípio do poluidor-pagador
3
 em relação à 
 
3
É possível conceituar o princípio do poluidor-pagador, dizendo que “Assenta-se este princípio na 
vocação redistributiva do Direito Ambiental e se inspira na teoria econômica de que os custos sociais 
externos que acompanham o processo produtivo (v.g., o custo resultante dos danos ambientais) 
precisam ser internalizados, vale dizer, que os agentes econômicos devem levá-los em conta ao 
elaborar os custos de produção e, consequentemente, assumi-los. Busca-se, no caso, imputar ao 
poluidor o custo social da poluição por ele gerada, engendrando um mecanismo de responsabilidade 
por dano ecológico, abrangente dos efeitos da poluição não somente sobre bens e pessoas, mas sobre 
toda a natureza. Em termos econômicos, é a internalização dos custos externos.” (MILARÉ, 2013, p. 
267). 
15 
 
 
 
poluição das águas doces, incentivando os Estados-Membros a adotarem medidas legais e 
administrativas de gestão hidrológicas buscando a satisfação de seus objetivos bem como, 
medidas para a melhor prática ambiental, como: o fornecimento de informações aos usuários 
e público em geral sobre o estado e qualidade das águas doces, reuso das águas, reciclagem, 
licenciamento de atividades entre outros (AMORIM, 2015). 
 
Não menos importante, é a Convenção da Biodiversidade e a Agenda 21 na questão do 
acesso à água no regulamento internacional (grifo nosso). Nesse sentido, conforme refere 
Amorim (2015, p. 110), 
 
[...] ambas adotadas durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio 
Ambiente e Desenvolvimento, em 1992, quebraram o silêncio normativo 
convencional que se mantinha até então, em nível multilateral global, em 
relação às águas doces. Apesar de não dispor especificamente sobre a água 
doce, a Convenção da Biodiversidade é a primeira norma internacional 
cogente a disciplinar o meio ambiente como um todo, através da busca da 
conservação de seus mais variados componentes, dentre eles os ecossistemas 
aquáticos. 
 
Em seu capítulo 18, a Agenda 21 aborda de forma integrada a questão do 
desenvolvimento, gerenciamento e utilização das reservas hidrológicas, tendo como principal 
objetivo, satisfazer as necessidades de água doce para o desenvolvimento de todos os países. 
Estabelece também, a proteção das fontes de água, priorizando o uso humano da água doce, e 
neste, a satisfação das necessidades básicas para a vida e a manutenção dos ecossistemas 
(AMORIM, 2015). 
 
Ainda em 1992, ano de realização da ECO-92 da qual resultou posteriormente a 
Agenda 21, foi realizada em Dublin na Irlanda, a Conferência Internacional sobre Água e 
Meio Ambiente, segunda conferência mundial sobre a água, convocada e preparada pela 
Organização Marítima Internacional. A conferência tratou da inserção de questões relativas à 
água, enfatizando a importância do envolvimento das partes interessadas no processo de 
tomada de decisões, assim como, estabeleceu a necessidade de reconhecimento do valor 
econômico da água nos seus múltiplos usos (AMORIM, 2015, grifo nosso). 
 
Também em 1992, a ONU, movida pela necessidade de conscientização dos 
governantes e de toda a população acerca da importância do uso racional e da proteção das 
fontes hídricas, publicou no dia 22 de março a Declaração Universal dos Direitos da Água. 
16 
 
 
 
Desde então, todos os anos este dia é dedicado à promoção de ações e discussões capazes de 
promover a preservação da água no planeta. A Declaração é ordenada em dez artigos e dispõe 
que: aágua é seiva e patrimônio do planeta; recursos naturais de transformação da água em 
água potável são lentos, frágeis e muito limitados; o equilíbrio e o futuro de nosso planeta 
dependem da preservação da água e de seus ciclos; a água não é somente herança de nossos 
predecessores, ela é, sobretudo, um empréstimo aos nossos sucessores; a água não é uma 
doação gratuita da natureza, possuindo valor econômico; ela é, algumas vezes, rara e 
dispendiosa podendo tornar-se escassa em qualquer região do mundo; não deve ser 
desperdiçada, poluída e envenenada; e, que sua utilização e gestão implicam respeito à lei 
mantendo-se o equilíbrio entre os imperativos de sua proteção e as necessidades de ordem 
econômica, sanitária e social, considerando a solidariedade e o consenso em razão desua 
distribuição desigual sobre a terra (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2015f). 
 
Embora não possua força de lei, a Declaração representa um chamado importante da 
ONU aos cidadãos e aos países do mundo inteiro para que se esforcem no desenvolvimento da 
cultura do direito e dos deveres em relação a água. 
 
Importante espaço para se tratar sobre a temática água e seu acesso, se dá também, nos 
Fóruns Mundiais sobre a água, organizados pela ONU, que já conta com sete edições 
realizadas a cada três anos em diferentes países. O último evento de temática “Água para 
nosso futuro” realizou-se entre os dias 12 a 17 de abril do corrente ano na cidade sul-coreana 
Daegu-Gyeongbuk, considerada a maior estância de debates sobre recursos hídricos do 
mundo, motivando a comitiva brasileira a debater sobre questões como: mudanças climáticas, 
governança dos recursos hídricos, nexus água e saneamento, água e energia, água e alimento e 
ecossistemas aquáticos (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2015c, grifo do autor). 
 
Ainda, no dia 26 de fevereiro, em sua 51ª Reunião, os Governadores do Conselho 
Mundial da Água definiram que o 8º Fórum Mundial da Água a se realizar em março de 2018 
acontecerá no Brasil, na cidade de Brasília. Esta, que será a primeira edição a realizar-se no 
hemisfério sul do planeta trará a temática “Compartilhando Água”, possibilitando que 
técnicos de todo o planeta compartilhem conhecimento, experiências e fundamentalmente, 
benefícios e soluções para a questão da água (ÁGUAS DO BRASIL, 2015, grifo nosso). 
 
17 
 
 
 
Conforme salienta Marcos Paulo Scherer (2014), ao final de cada edição dos Fóruns 
em que participam a maioria dos mais importantes Chefes de Estados do planeta, é emitido 
um relatório final contendo todos os pontos de ajustamento dos assuntos abordados no Fórum, 
e que serão, no âmbito dos Estados nacionais, implantados ou implementados de forma a 
melhorar tanto as condições de acesso, quanto de preservação da água potável no mundo. 
 
No ano de 2005, a UNESCO emitiu a Resolução A/Res/58/217 proclamando o período 
compreendido entre 2005 a 2015 como a Década Internacional para Ação “Água, Fonte de 
Vida” iniciando-se em 22 de março de 2005, consagrado como Dia Mundial da Água 
(UNESCO, 2015a). 
 
Afirma a Resolução, que o objetivo principal da década é dar um maior foco nas 
questões relacionadas a água em todos os níveis. Salienta também, a implementação de 
programas relacionados a água de forma a atingir os objetivos acordados internacionalmente 
na Agenda 21, nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio das Nações Unidas, e no Plano 
de implementação de Johannesburgo (UNESCO, 2015a). 
 
Ainda, em 28 de julho de 2010, a Assembleia Geral da ONU após mais de uma década 
de debates, aprovou a Resolução A/RES/64/292, a qual “reconhece oficialmente que 
odireito à água potável e ao saneamento é um direito fundamental, essencial ao pleno 
gozo da vida e de todos os direitos humanos.” Com 122 votos a favor e nenhum contra, a 
Resolução foi aprovada, porém, contou com 41 abstenções de países como Estados Unidos, 
Dinamarca, Japão, Canadá entre outros (AMORIM, 2015, p. 120, grifo do autor). 
 
A Resolução apela aos Estados e Organizações Internacionais para que 
 
[...] providenciem os recursos financeiros, contribuam para o 
desenvolvimento de capacidades e transfiram tecnologias de modo a ajudar 
os países, nomeadamente os países em vias de desenvolvimento, a 
assegurarem água potável segura, limpa, acessível e a custos razoáveis e 
saneamento para todos. (ONU, 2015). 
 
A constatação e inclusão do acesso à água potável e ao saneamento no rol dos direitos 
humanos pela comunidade internacional é sem dúvida, o resultado de que atualmente no 
planeta, cerca de 748 milhões de pessoas não tem acesso a água potável, sobretudo os mais 
pobres e vulneráveis (ONUBRASIL, 2015a). Da mesma forma, uma em cada três pessoas, ou 
18 
 
 
 
2,4 bilhões de cidadãos no mundo não tem acesso a qualquer tipo de serviço de 
saneamento(ONUBRASIL, 2015b). Estima-se ainda, que até o ano de 2050 a demanda global 
por água poderá ultrapassar em 44% os recursos hídricos disponíveis e que a maioria dos 
cerca de 3 bilhões de habitantes previstos a somar-se à população mundial nos próximos 35 
anos, nascerão em países com escassez hídrica (ONU BRASIL, 2015c). 
 
Igualmente, em setembro de 2010 o Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou 
a Resolução A/HRC/15/L.14, acerca dos direitos humanos e acesso a água e saneamento, 
contando com a participação e apoio de inúmeros Estados que não faziam parte do Conselho à 
época. Nesta Resolução se afirma o direito humano à água potável intrinsicamente ligado ao 
direito à vida e dignidade da pessoa humana e, se reafirma que a delegação do fornecimento 
de água e saneamento a terceiros, não exonera a responsabilidade primária dos Estados em 
garantir a plena realização de todos os direitos humanos (AMORIM, 2015). 
 
Em maio de 2011 pela Resolução A/RES/64/24, a Organização Mundial da Saúde 
através de sua Assembleia convocou os Estados-Membros a garantirem o alcance das metas 
de desenvolvimento do milênio relativas à água e ao saneamento em suas políticas nacionais 
de saúde, além de estabelecer ao Diretor-Geral da organização, o fortalecimento dos órgãos 
do sistema ONU relativos a água, em torno de uma cooperação internacional visando à 
promoção do acesso aos serviços de água, higiene e saneamento (AMORIM, 2015). 
 
Também em 28 de setembro de 2011, convocando os Estados a assegurar o 
financiamento necessário para o fornecimento sustentável dos serviços de água e saneamento, 
o Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou a Resolução A/HRC/RES/18 (AMORIM, 
2015). 
 
Posteriormente, em 04 de junho de 2012, a Organização dos Estados Americanos 
(OEA) adotou na sua 42ª sessão regular da Assembleia Geral, a Resolução AG/doc.5242/12 
ver. 2, que aprova a Carta Social das Américas que dentre outras posições reconhece a água 
como recurso fundamental não só para a vida, mas, para o desenvolvimento socioeconômico 
e sustentabilidade ambiental, bem como, que o acesso igualitário e não discriminatório da 
população à água potável e aos serviços de saneamento no âmbito da legislação e das políticas 
nacionais, contribui no combate à pobreza (AMORIM, 2015). 
19 
 
 
 
Estabelece, além disso, o compromisso dos Estados-membros de acordo com suas 
realidades nacionais, a continuar trabalhando para garantir o acesso a água potável e 
saneamento tanto para as gerações presentes quanto futuras. A OEA aprovou ainda, em junho 
de 2012, a Resolução AG/RES.2760 (XLII-O/12), em defesa ao direito humano à água e 
saneamento básico. Em termos práticos, embora frustrante, essa resolução insere finalmente o 
reconhecimento do direito humano à água e ao saneamento no âmbito multilateral regional, o 
fazendo por meio de seu mais importante foro intergovernamental de cunho político 
(AMORIM, 2015). 
 
Percebe-se, portanto, que programas e iniciativas visando o aumento da 
conscientização sobre a necessidade de uma tutela jurídica mais eficaz, bem como, de 
mudança nos padrões de consumo das sociedades do mundo em relação a água potável, tem 
sido empreendidos não só por organizações como a UNESCO, FAO (Organização das Nações 
Unidas para Agricultura e Alimentação), e pela própria ONU, mas, por organizações 
governamentais e não governamentais, por universidades, centros de pesquisa e associações 
civis mundo afora (AMORIM, 2015). 
 
Contudo, apesar da mudança de paradigma e de tratamento jurídico operado pelo 
direito internacional em relação a água nas últimas décadas, ainda há muito que ser feito nesse 
campo, principalmente no que diz respeito à escassez física e econômica de água e à 
mercantilização de seu acesso. 
 
1.2 Proteção das águas na América Latina e Mercosul 
 
No âmbito da América Latina, o primeiro documento a ser criado é o Tratado da 
Baciado Prata. Assinado em Brasília em 1969, trata-se de acordo multilateral composto de 
oito artigos, que objetiva segundo seu artigo 1º, promover o desenvolvimento harmônico e a 
integração física da Bacia do Prata e de suas áreas de influência direta. Importante salientar 
que foi antecedido pela Declaração Conjunta dos Chanceleres dos Países da Bacia do Prata, 
assinada em Buenos Aires, em 1967 e pela Ata de Santa Cruz de La Sierra, de 1968 
(MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2015d, grifo nosso). 
 
No tratado da Bacia do Prata, em nenhum dos seus artigos é feita referência à água 
para o consumo humano ou qualquer afirmação sobre sua importância para a vida ou valor 
20 
 
 
 
ambiental. Mantém-se apenas, a previsão de aproveitamento econômico para as águas 
abrangidas pela Bacia, apesar de o referido artigo 1º, dizer também que não é seu objetivo 
direto a integração econômica entre os países. Dessa forma, perdeu-se a oportunidade de tratar 
da água como recurso fundamental, deixando somente o aspecto econômico prevalecer nas 
negociações e previsões normativas (SCHERER, 2014). 
 
Já em 1977 em Mar Del Plata na Argentina, foi realizada a Conferência das Nações 
Unidas sobre a Água, conhecida como Conferência de Mar Del Plata. Foi o primeiro 
encontro multilateral para a discussão exclusiva de temas ligados ao consumo de água doce e 
sua disponibilidade, diante da crise hídrica mundial que na época, todos acreditavam se 
aproximar. Um conjunto de metas e programas de gerenciamento integrado de recursos 
hídricos foi adotado na Conferência, sendo substituído, mais tarde, por capítulo específico 
sobre água na Agenda 21 (AMORIM, 2015, grifo nosso). 
 
Ainda, em 1978, o Brasil firmou o Tratado de Cooperação Amazônica, juntamente 
com países como a Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela. O 
objetivo desse acordo era promover ações conjuntas para o desenvolvimento equilibrado da 
bacia Amazônica, adotando um compromisso comum com a preservação do meio ambiente e 
o uso racional de recursos naturais, principalmente da água doce. Considera-se ainda, em 
termos de gestão hidrológica, o primeiro a adotar corretamente a visão e o conceito de bacia 
hidrográfica (AMORIN, 2015, grifo nosso). 
 
No âmbito Regional, mais especificamente no Mercosul, por sinal uma das regiões 
mais ricas e nobres em disponibilidade de água doce do planeta, há muito quese evoluir. 
Ainda são poucos os acordos ou tratados internacionais criados ou desenvolvidos ainda mais 
no que diz respeito à preservação e conservação dos mananciais e das bacias hidrográficas. O 
que existe, está concentrado na exploração da região visando principalmente à construção de 
barragens hidrelétricas, com vistas a atender os anseios econômicos. 
 
Apenas em 21 de julho de 2001 é que surge o Acordo-Quadro sobre Meio Ambiente 
do Mercosul, que estabelece que os Estados-membros principalmente por “terem adotado os 
princípios da Declaração do Rio e da Agenda 21, em 1992, devem aplicar, nas suas políticas 
de integração regional, os princípios e metas por elas estabelecidos.” (AMORIM, 2015, p. 
105, grifo nosso). Em verdade, tal acordo serviu apenas para dar uma satisfação à população 
21 
 
 
 
regional para não parecer que em nada havia resultado os encontros das nações mundiais em 
prol da defesa do meio ambiente. 
 
Malgrado a falta de iniciativas das lideranças regionais na proposta e realização de 
acordos e tratados internacionais regionais visando à preservação ou regulação do uso e 
acesso aos recursos hídricos, foram realizados alguns atos isolados, como o Acordo de 
Cooperação do Rio Quaraí e Acordo de Cooperação do Rio Apa. No bojo do Tratado da 
Bacia do Prata, anteriormente adveio o Tratado da Bacia da Lagoa Mirim e o Tratado do Rio 
Uruguai, e somente no ano de 2010, o Acordo sobre o Aquífero Guarani (SCHERER, 2014, 
grifo do autor). 
 
Ambos tratados de uma forma geral trazem ou estão construindo importantes 
inovações e evoluções na área ambiental, tanto em termos políticos quanto jurídicos, 
institucionais e culturais dentro do cenário nacional e internacional, dando mais importância à 
temática ambiental e sustentabilidade dos usos das águas e estimulando iniciativas e projetos 
nesse sentido. 
 
1.3 Aspectos constitucionais da tutela das águas no Brasil 
 
Como bem refere Eduardo Coral Viegas (2005), o ordenamento jurídico pátrio é rico 
em normas de tutelas das águas, seja por meio de leis estabelecedoras de regras para os 
recursos hídricos, seja por normas ambientais gerais protetivas desses recursos. 
 
Conforme João Marcos Adede y Castro (2008), a Constituição Federal de 1988, em 
seu capítulo II “Da União”, art. 20, relaciona como bens da União, rios, lagos, lagoas e outros 
mananciais, nos dando a entender o legislador, tratar-se não de bens pertencentes aos 
governos e administrações, mas bens de uso comum de povo e essenciais à sadia qualidade de 
vida, cabendo aos detentores do poder que nos representam o dever de preservar aquilo que é 
de uso comum do povo. 
 
Ainda, na visão deAdede y Castro (2008, p. 54): 
 
Não está o Poder Público, em qualquer de suas esferas, autorizado a dispor 
dos recursos hídricos de outra forma que não seja o de proteger, preservar, 
22 
 
 
 
recuperar, fiscalizar sua devida utilização, de maneira a garantir a 
continuidade de sua existência, com qualidade. 
Tanto isso é verdade que o Estado, mesmo estando autorizado a fazer uso 
dos recursos hídricos, em proveito dos interesses coletivos de recolhimento, 
tratamento e distribuição de água e construção e manutenção de usinas de 
geração de energia, não está dispensado da obrigação de reparar, 
minimamente, os danos daí gerados. 
 
Desse modo, resta claro que Estado tem o dever, assim como o cidadão, de proteger e 
usar de forma adequada e sustentada os recursos hídricos, bem e direito de todos (ADEDE Y 
CASTRO, 2008). 
 
À União compete, conforme art. 21, XIX, da CF/88, “instituir o Sistema Nacional de 
Gerenciamento de Recursos Hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso.” 
(BRASIL, 2015b). Portanto, de forma a permitir o uso dos recursos hídricos e ao mesmo 
tempo garantir sua preservação, conservação e reparação dos danos causados, a legislação 
impôs ao Estado a obrigação de estabelecer os critérios de utilização desses recursos (ADEDE 
Y CASTRO, 2008). 
 
O artigo 22, inciso IV, do mesmo diploma legal trata por seu turno, da competência 
privativa da União para legislar sobre águas, em vista da importância do recurso para a vida 
nacional, excluindo assim, a intervenção legislativa dos Estados e dos Municípios, salvo para 
legislar sobre questões específicas em que houver expressa autorização legal (ADEDE Y 
CASTRO, 2008). 
 
Adede y Castro (2008, p. 56) ainda destaca que: 
 
Como a responsabilidade pela proteção e fiscalização dos recursos hídricos é 
concorrente entre a União, os Estados e os Municípios, é evidente que 
qualquer lei Estadual ou Municipal, desde que não contrarie nem revogue o 
dispositivo Federal, pode ser aplicada. 
 
Nesse sentido o art. 23 da Carta Magna, trata de forma geral, da competência comum 
entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios na proteção e combate da poluição do 
meio ambiente em qualquer de suas formas, bem como, na preservação das florestas, da fauna 
e flora e no registro, acompanhamento e fiscalização das concessões de direitos de pesquisa e 
exploração de recursos hídricos e minerais dentro dos seus territórios. O artigo 24 por sua vez, 
trata da competência concorrente entre União, Estados e Distrito Federal em legislar sobre 
23 
 
 
 
florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, 
proteção do meio ambiente e controle da poluição (ADEDE Y CASTRO, 2008). 
 
Em relação à competência dos entes, entende Paulo Affonso Leme Machado (2002, p. 
20): 
 
Em matéria de águasa competência privativa (art. 22 da CF) e a 
competência concorrente (art. 24 da CF) cruzam-se e permanecem 
entrelaçadas[...]. Os Estados podem estabelecer, de forma suplementar à 
competência da União, as normas de emissão dos efluentes lançados nos 
cursos de água, visando a controlar a poluição e a defender o recurso natural 
(art. 24, VI, da CF), mas dependem no que dispuser a lei federal, à qual cabe 
definir os padrões de qualidade das águas e os critérios de classificação das 
águas de rios, lagos e lagoas. 
 
Nesses parâmetros, parece ficar o Município excluído da função de tratar sobre a 
conservação das águas e de tomar providências com fins a evitar a contaminação dos recursos 
hídricos. Porém, a quantidade e qualidade das águas dos lagos, rios, riachos, ribeirões e 
represas, vai depender da legislação existente e da implementação da política ambiental, 
principalmente no âmbito dos municípios. O Município, não pode legislar sobre volume e/ou 
classificação das águas, pois estaria invadindo competência privativa da União. Entretanto, 
tendo em vista o interesse local em matéria de efluentes domésticos e industriais, pode de 
maneira mais restritiva, suplementar as normas de emissão Estaduais e Federais. Também 
poderá, conforme art. 30, I, da CF/88, criar norma autônoma desde que, comprove o interesse 
local e que no campo normativo estejam inertes a União e o Estado. Ainda, nos Comitês de 
Bacias Hidrográficas em que são aprovados os Planos de Recursos Hídricos, os Municípios 
podem e devem atuar (MACHADO, 2002). 
 
Logo, a dominialidade pública da água faz do Poder Público Federal e Estadual gestor 
desse recurso ambiental, e não proprietário ou comerciante (MACHADO, 2002). Também, 
por esse motivo, “não pode o Governo Federal negar aos Estados e Municípios o poder de 
dispor, através de leis que atendam situações específicas locais, no sentido de proteger o 
interesse ambiental de cada região do País.” (ADEDE Y CASTRO, 2008, p. 57). 
 
Assim, conforme ensina Amorim (2015, p. 306): 
 
24 
 
 
 
Distribuídos ao longo da atual Carta Política, nos mais diversos títulos, estão 
os contornos constitucionais da tutela jurídica das águas doces, em seus 
múltiplos aspectos: como elemento natural, como fonte geradora de energia, 
como via de transporte, como elemento essencial ao saneamento e saúde 
públicos, bem como fator de integração e equilíbrio ambiental. 
 
Também, a Constituição Federal de 1988 foi a primeira a dedicar um capítulo 
específico ao meio ambiente. Segundo José Afonso da Silva (2004, p. 46) “pode-se dizer que 
ela é uma Constituição eminentemente ambientalista.” Avançada, impõe ao Poder Público e à 
coletividade, em seu art. 225, não só o direito de uso dos bens naturais, mas o dever de 
defender, preservar e garantir um meio ambiente ecologicamente equilibrado para as gerações 
presentes e futuras, como direito fundamental. 
 
Além disso, a Constituição consolida a questão ambiental como um todo. Quanto à 
água, “seu texto tem disciplina jurídica geral, como elemento do bioma e específica, nos 
diversos dispositivos que, explícita ou implicitamente – em função de sua importância e 
multissubjetividade -, são a ela correlatos.” (AMORIM, 2015, p. 306). 
 
Portanto, percebe-se que a visão adotada pela Constituição em relação ao meio 
ambiente, reconhece e reflete toda a evolução normativa de proteção ambiental ocorrida no 
direito internacional público, inovando ainda, na técnica legislativa, visto que tratou em 
artigos diferentes a competência para legislar e a competência para administrar. 
 
1.4 Aspectos infraconstitucionais: o Código de Águas e a Lei das Águas 
 
No século passado, sob regime ditatorial em que o Poder Executivo legislava por 
decretos com força de lei, o governo entendia que o Brasil no que se referia ao uso das águas, 
estava orientado por legislação ultrapassada, que não acolhia os interesses da coletividade 
nacional, e se fazia essencial modificá-la para permitir que o Poder Público controlasse e 
incentivasse o aproveitamento industrial racional (ADEDE Y CASTRO, 2008). 
 
Assim, o primeiro modelo regulador dos recursos hídricos no Brasil foi o ainda não 
integralmente revogado Código de Águas, instituído pelo Decreto nº 24.634, de 10 de julho de 
1934, instrumento de concepção avançada para a época e pioneiro no tratamento das águas no 
país. 
25 
 
 
 
Conforme menciona Wilson Cabral de Sousa Júnior (2004), tal instrumento passou 
mais de meio século sem regulamentação de seu inteiro teor, o que se atribui à necessidade de 
intervenção do Estado na regulação e uso das águas na geração hidrelétrica, que demandou a 
partir de meados do século passado, grandes obras e investimentos em infraestrutura, 
principalmente na construção da grande represa da Usina Hidrelétrica de Itaipu, na divisa 
entre o Brasil e o Paraguai. 
 
Das décadas de 1920 a 1980, o mandatário da regulação hídrica, tendo em vista o 
aumento de consumo de energia elétrica pelo setor industrial, foi de fato, o setor de geração 
hidrelétrica, inicialmente do setor privado e mais tarde sob orientação do Estado que passa a 
intervir diretamente neste setor, com a assinatura do Código de Águas, assumindo o poder de 
concessão dos direitos de uso de qualquer curso ou queda d‟água. 
 
Nesse sentido, o Código de Águas serviu de normativa inicial para a administração das 
águas no Brasil. Na prática, a gestão das águas no Brasil foi inicialmente capitaneada 
pelosetor elétrico, que junto com a hegemonia política do setor sobre a gestão das águas, 
foram contempladas em 1965 com a criação do Departamento Nacional de Água e Energia 
(DNAE, lei nº 4.904/65), denominado mais tarde através do Decreto 63.951/68, como 
Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE) (SOUSA JÚNIOR, 2004). 
 
Desde a referida época até a criação da Secretaria de Recursos Hídricos em 1995, toda 
regulação associada à gestão das águas estava de uma ou de outra forma vinculada ao 
DNAEE. Inclusive, a Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama, 20, de 
1986), responsável por estabelecer os critérios para classificação das águas no país, é baseada 
nos estudos diagnósticos feitos pelo DNAEE no início de 1980 (SOUSA JÚNIOR, 2004). 
 
Ainda que as intenções fossem positivas, o Código de Águas é orientado para a 
proteção das atividades econômicas que dependem do uso das águas, preocupando-se pouco 
em protegê-las como recurso ambiental vital, somente, como insumo industrial de utilidade 
econômica. Nesse aspecto, Adede y Castro (2008, p. 61) destaca com primazia que: 
 
É evidente que não havia, à época, a consciência ambiental que, hoje, 
permeia todas as relações sociais e que informa a redação de textos legais 
dos mais diversos matizes. De outro lado, estávamos sob regime ditatorial, 
em que o Poder Executivo legislava por decretos com força de Lei. 
26 
 
 
 
Ainda sobre o Código de Águas, analisa Santilli (apud VIEGAS, 2005, p. 45): 
 
O código de Águas (Decreto 24.634/34, modificado pelo Decreto-Lei 
852/38)[...] concebido e elaborado na década de 30, dá grande ênfase ao 
aproveitamento de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica, 
e pouca (embora alguma) atenção à água enquanto recurso ambiental a ser 
protegido, racionalizado e gerenciado. 
 
Essa primazia do setor elétrico na gestão das águas, só foi afetada a partir da 
reestruturação política e administrativa do Estado e da promulgação da Constituição Federal 
de 1988, responsável por significativas mudanças na administração dos recursos naturais 
(SOUSA JÚNIOR, 2004). 
 
De maneira diferentedo que ocorre hoje com a Constituição Federal que define as 
águas como bem comum de todos, o Código de Águas, divide-as em águas públicas, comuns 
e particulares, mantendo assim, a possibilidade de domínio da água nas mãos dos particulares. 
Nesse sentido é adisposição de seu art. 8º que diz: “São particularesas nascentes e todas as 
águas situadas em terrenos que também o sejam, quando as mesmas não estiverem 
classificadas entre as águas comuns de todos, as águas públicas ou as águas comuns.” 
(BRASIL, 2015c). 
 
No que concerne às águas subterrâneas, o art. 96 do Decreto nº 24.643/34, prevê que: 
 
Art. 96.O dono de qualquer terreno poderá apropriar-se por meio de poços, 
galerias, etc., das águas que existam debaixo da superfície de seu 
prédiocontanto que não prejudique aproveitamentos existentes nem derive 
ou desvie de seu curso natural águas públicas dominicais, públicas de uso 
comum ou particulares. (BRASIL, 2015c). 
 
Posteriormente a essa fase, a tendência da legislação brasileira, inclusive e 
principalmente no plano constitucional, foi a de publicização do domínio das águas, 
terminando com a extinção da propriedade privada desse recurso pela Constituição Federal de 
1988, que dispôs de forma cristalina em seu art. 225, que o meio ambiente é bem comum de 
todos (VIEGAS, 2005). 
 
Como bem refere Viegas (2005) passados alguns anos desde a entrada em vigor da 
atual Carta Magna que, conforme referido, não recepcionou a legislação infraconstitucional 
nos pontos em que estabelecia a propriedade privada sobre as águas, foi publicada em 8 de 
http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10603071/art-96-do-codigo-de-aguas-decreto-24643-34
27 
 
 
 
janeiro de 1997 a Lei das Águas, como é conhecida a lei nº 9.433, estabelecendo já em seu 
primeiro artigo os fundamentos que determinam o tratamento da água pelo ordenamento: 
 
Art. 1º A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes 
fundamentos: 
I - a água é um bem de domínio público; 
II - a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico; 
III - em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o 
consumo humano e a dessedentação de animais; 
IV - a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo 
das águas; 
V - a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação da 
Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de 
Gerenciamento de Recursos Hídricos; 
VI - a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a 
participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades. (BRASIL, 
2015d). 
 
Sousa Júnior (2004, p. 47-48) traça com clareza os principais fundamentos do Código 
de Águas incorporados pela atual Lei das Águas quando diz que: 
 
Em seu bojo estava contida boa parte dos princípios orientadores da atual 
política de recursos hídricos, quais sejam: 
• o uso direto para necessidades essenciais à vida; 
• a necessidade de concessão e/ou autorização para derivação de águas 
públicas; 
• o conceito poluidor-pagador, que previa a responsabilização financeira e 
penal para atividades que contaminassem os mananciais hídricos. 
 
Desse modo e tendo em vista que o Código de Águas já mencionava o caráter público 
da água e seu uso múltiplo com prioridade para o consumo humano, necessidade primordial à 
vida, as inovações ficam por conta dos incisos II, V e VI do artigo 1º da Lei das Águas, que 
respectivamente distingue a água como bem dotado de valor econômico, institui a gestão por 
bacia hidrográfica e determina a participação da sociedade na gestão hídrica (SOUSA 
JÚNIOR, 2004). 
 
Ressalta-se ainda, que a referida Lei das Águas estabelece em vários dispositivos a 
cobrança pelo uso das águas, mas jamais o direito de venda, portanto, o Governo Federal e os 
Estaduais não podem se tornar comerciantes de água e sim, meros gestores desse recurso 
(MACHADO, 2002). 
 
28 
 
 
 
Estabeleceu-se assim, um novo marco legal para a tutela das águas doces, cabendo à 
Lei das Águas, a instituição da Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) e a criação do 
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (Singreh), implementados com a 
criação da lei nº 9.984/2000 que instituiu a Agência Nacional de Água (ANA), responsável 
por estabelecer regras de atuação, bem como, estruturação administrativa e fontes de recursos 
(VIEGAS, 2005). Assim, 
 
O estado brasileiro revela no trato atual da questão hídrica, em verdade, uma 
atitude histórica em relação aos recursos naturais: sua consideração apenas 
pela perspectiva da utilização econômica, e não como um elemento que, 
devido ao seu caráter multissubjetivo, tem importância vital, ainda que 
dissociado de qualquer aproveitamento ou destinação econômica, o que 
demanda – acima de tudo – uma disciplina competente e integral. 
(AMORIM, 2015, p. 312). 
 
Portanto, ressalta-se a importância da visão jurídica do acesso à água potável como 
recurso e direito fundamental, não só em função da sua essencialidade para a vida humana e 
animal e para a manutenção de todo o equilíbrio natural da biosfera, mas também, em função 
de questões vitais e estratégicas que decorrem da riqueza hídrica que o Brasil dispõe. 
 
1.5 Competências na gestão das águas em âmbito nacional e estadual e a busca pela 
consolidação de um sistema democrático e participativo de tratamento das águas 
 
Primeiramente é necessário salientar que a gestão das águas não deve ser confundida 
com a competência para legislar sobre águas. Conforme determinado pela Constituição 
Federal no artigo 21, XIX, já estudado anteriormente, compete à União instituir um Sistema 
Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e definir os critérios de outorga para os 
direitos de uso. O Regulamento determinado pelo artigo 21 e a divisão de atribuições entre 
União e Estados na gestão hídrica foi definido pela Lei Federal nº 9.433/97, chamada Lei das 
Águas. Reconhecida internacionalmente como uma das mais avançadas do mundo para o 
setor, foi em suma idealizada e praticamente copiada da Lei Gaúcha, lei nº 10.350/94, 
responsável por estabelecer ainda no ano de 1994, a Política Estadual de Recursos Hídricos do 
Rio Grande do Sul. 
 
Determina a Lei das Águas, em seu artigo art. 1º, VI, que “A gestão dos recursos 
hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e 
das comunidades.” (BRASIL, 2015d). Portanto, a descentralização recomendada e instaurada 
29 
 
 
 
pela Lei das Águas é no domínio da gestão, pois a competência para legislar sobre águas é 
conforme o também já estudado art. 22, IV, da CF/88, matéria centralizada nas mãos da 
União, podendo, entretanto, conforme preceitua o parágrafo único do referido artigo, lei 
complementar autorizar que os Estados legislem sobre águas (MACHADO, 2002). 
 
Em seu artigo 33, a Lei das Águas determina quem participará do Sistema Nacional de 
Gerenciamento, dispondo em seus incisos que participarão: 
 
I – o Conselho Nacional de Recursos Hídricos; 
I-A. – a Agência Nacional de Águas; 
II – os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal; 
III – os Comitês de Bacia Hidrográfica; 
IV – os órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do Distrito Federal e 
municipais cujas competências se relacionem com a gestão de recursos 
hídricos; 
V – as Agências de Água; (BRASIL, 2015d). 
 
Assim, além de efetivar a Política Nacional e o Sistema Nacional de Gerenciamento de 
Recursos Hídricos, a legislação possibilitou por meio da criação desses entes, a participação 
popular na gestão dos recursos hídricos brasileiros, em especial dos Conselhos de Recursos 
Hídricos em níveis nacional, distrital e estaduais e dos Comitês de Bacias Hidrográficas, que 
estão no primeiro nível de administração dos recursos hídricos, e contam com a Agência de 
Águas para exercer de forma mais abrangente e efetiva suas competências (BLOG DO 
PLANALTO, 2015). 
 
Quanto a competência de cada ente, além de ser responsável por implementar a 
Política Nacional e o Plano Nacional de Recursos Hídricos, à União, cabe fiscalizar e regular 
a gestão hídrica no País, o que é feito através da atuação compartilhada entre o Ministériodo 
Meio Ambiente e a Agência Nacional de Águas (ANA) (BLOG DO PLANALTO, 2015). 
 
É responsabilidade da União ainda, gerenciar os Comitês de Bacias Federais ou 
Interestaduais. Atualmente, nos rios de domínio da União, existem nove Comitês de Bacias 
Hidrográficas Interestaduais
4
 criados e localizados nas Regiões Sudeste e Nordeste do País 
(COMITÊS DE BACIAS HIDROGRÁFICAS - CBH, 2015). 
 
4
São eles: CBH Piranhas Açu, CBH São Francisco, CBH Verde Grande, CBH Paranaíba, CBH Rio 
Grande, CBH Rio Doce, CBH Paraíba do Sul, CBH Piracicaba, Capivarí e Jundiaí e CBH 
Paranapanema (COMITÊS DE BACIAS HIDROGRÁFICAS - CBH, 2015). 
30 
 
 
 
Aos Estados, cabe a responsabilidade pela gestão das águas em seu território e sob seu 
domínio, além, da elaboração de legislação específica para a área. Também dos Estados é o 
dever de organizar o Conselho Estadual de Recursos Hídricos e de garantir o funcionamento 
dos Comitês de Bacia dentro da sua região. Ao Distrito Federal, cabe a mesma competência 
dos Estados na gestão dos seus recursos hídricos (BLOG DO PLANALTO, 2015). 
 
No país, todos os 26 Estados da Federação e o Distrito Federal possuem suas leis e 
Conselhos Estaduais de recursos hídricos. Atualmente, existem cerca de 190 Comitês de 
Bacias Hidrográficas Estaduais em atuação no Brasil (BLOG DO PLANALTO, 2015). 
 
Sobre a competência dos municípios, como não possuem atribuições específicas na 
gestão hídrica, cabe a eles a responsabilidade de integrar as políticas locais de meio ambiente, 
saneamento básico e de uso e ocupação do solo com as políticas federal e estadual de recursos 
hídricos. 
 
O Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) que vigora atualmente foi aprovado 
no início de 2006 pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH). No plano são 
previstas ações até o ano de 2020 e sua aprovação envolveu a participação de mais de 10 mil 
membros da sociedade civil. Ainda, ao CNRH, cabe à regulamentação da Política Nacional de 
Águas, realizada em conjunto pelo Governo Federal, Estados, setores usuários de água e 
sociedade civil (BLOG DO PLANALTO, 2015). 
 
Em âmbito estadual, a Lei Gaúcha seguindo em linhas gerais premissas 
constitucionais, instituiu a Política Estadual dos Recursos Hídricos. Com caráter aberto no 
que concerne à participação social, caracteriza e concede aos usuários e às entidades da 
sociedade civil, a maior parte do espaço de representação na gestão das águas, conforme se 
percebe do exposto a seguir: 
 
Art. 13 - Cada Comitê será constituído por: 
I - representantes dos usuários da água, cujo peso de representação deve 
refletir, tanto quanto possível, sua importância econômica na região e o seu 
impacto sobre os corpos de água; 
II - representantes da população da bacia, seja diretamente provenientes 
dos poderes legislativos municipais ou estaduais, seja por indicação de 
organizações e entidades da sociedade civil; 
III - representantes dos diversos órgãos da administração direta federal e 
estadual, atuantes na região e que estejam relacionados com os recursos 
31 
 
 
 
hídricos, excetuados aqueles que detém competências relacionadas à outorga 
do uso da água ou licenciamento de atividades potencialmente poluidoras. 
Parágrafo único - Entende-se como usuários da água indivíduos, grupos, 
entidades públicas e privadas e coletividades que, em nome próprio ou no de 
terceiros, utilizam os recursos hídricos como: 
a) insumo em processo produtivo ou para consumo final; 
b) receptor de resíduos; 
c) meio de suporte de atividades de produção ou consumo (RIO GRANDE 
DO SUL, 2015, grifo nosso). 
 
A Lei determina ainda, em seu art. 14, que deverá ser observada a distribuição de 40% 
dos votos para os representantes dos usuários de água e da população da bacia e 20% para os 
representantes dos órgãos da Administração Federal e Estadual, que conforme art. 15 e 
reforçando o já disposto no art. 13, III, participarão nas deliberações, mas, sem direito de voto 
quando exercerem atribuições relacionadas à outorga de uso da água ou licenciamento de 
atividades que possam causar poluição (RIO GRANDE DO SUL, 2015). 
 
No mesmo sentido, a Lei Federal das Águas traz em seu art. 39, a composição dos 
Colegiados dos Comitês de Bacia Hidrográfica, determinado que: 
 
Art. 39. Os Comitês de Bacia Hidrográfica são compostos por 
representantes: 
I - da União; 
II - dos Estados e do Distrito Federal cujos territórios se situem, ainda que 
parcialmente, em suas respectivas áreas de atuação; 
III - dos Municípios situados, no todo ou em parte, em sua área de atuação; 
IV - dos usuários das águas de sua área de atuação; 
V - das entidades civis de recursos hídricos com atuação comprovada na 
bacia (BRASIL, 2015d, grifo nosso). 
 
Essa formação de Comitês de Bacia Hidrográfica, como se percebe, foi instituída nos 
moldes do que a Lei Gaúcha já previa e também como forma a atender o disposto no acima 
reproduzido art. 1º, VI da Lei Federal, que exige como fundamento da Política Nacional dos 
Recursos Hídricos a gestão descentralizada e participativa do Poder Público, dos usuários e 
das comunidades. 
 
Porém, de forma a garantir maior efetividade a essa previsão, o artigo 39 da Lei 
Federal acima transcrito, foi regulamentado pela Resolução 5/2000 do CNRH, que dispõe 
acerca do espaço de representação garantido a cada um dos entes na gestão das águas. Assim, 
determina a Resolução em seu art. 8º que: 
32 
 
 
 
Art. 8º Deverá constar nos regimentos dos Comitês de Bacias Hidrográficas, 
o seguinte: 
I - número de votos dos representantes dos poderes executivos da União, dos 
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, obedecido o limite de 
quarenta por cento do total de votos; 
II - número de representantes de entidades civis, proporcional à população 
residente no território de cada Estado e do Distrito Federal, cujos territórios 
se situem, ainda que parcialmente, em suas respectivas áreas de atuação, 
com pelo menos, vinte por cento do total 3 de votos, garantida a participação 
de pelo menos um representante por Estado e do Distrito Federal; 
III – número de representantes dos usuários dos recursos hídricos, obedecido 
quarenta por cento do total de votos; e 
IV - o mandato dos representantes e critérios de renovação ou substituição 
(CONSELHO NACIONAL DE RECUROS HÍDRICOS - CNRH, 2015). 
 
Tal disposição acompanhou novamente o que a Lei Gaúcha de forma semelhante já 
havia previsto, garantindo ao Poder Público (União, Estados e Municípios) e a sociedade 
civil, limites máximos e mínimos de participação, tendo os usuários espaço garantido de 40% 
nos Comitês Federais. 
 
Tudo isso quer dizer que a legislação federal transferiu para os Comitês de Bacia 
Hidrográfica o empenho de negociação dos espaços representativos, flexibilizando a 
participação social. Eis aí um importante instrumento de gestão e gerenciamento dos recursos 
hídricos no sistema brasileiro, pois que deve ser implantado através da ampla participação da 
comunidade por meio da criação de Comitês de Bacia Hidrográfica, que junto com as demais 
instituições mencionadas no art. 33 da Lei das Águas, irão fazer o gerenciamento efetivo, 
democrático e participativo dos mananciais aquáticos no âmbito de sua área de atuação, em 
cada bacia hidrográfica ou grupo de bacias (SOUSA JÚNIOR, 2004). 
 
A Lei Gaúcha
5
, igualmente prevê no seu art. 3º, III, que os benefícios e os custos para 
utilização da água devem ser repartidos considerando a complexidade dos interesses e suas 
possibilidades locais, com a participação dos indivíduos e das comunidades ribeirinhas. Tal 
previsão é reforçada pelos incisos I e II do seu art. 4º, que determina como diretrizes 
 
5
 Art. 3º - A Política Estadual de Recursos Hídricos reger-se-á pelos seguintes princípios: 
III - os benefícios eos custos da utilização da água devem ser equitativamente repartidas através de 
uma gestão estatal que reflita a complexidade de interesses e as possibilidades regionais, mediante o 
estabelecimento de instâncias de participação dos indivíduos e das comunidades afetadas; [...] 
Art. 4º - São diretrizes específicas da Política Estadual de Recursos Hídricos: 
I – descentralização da ação do Estado por regiões e bacias hidrográficas; 
II – participação comunitária através da criação de Comitês de Gerenciamento de Bacias 
Hidrográficas congregando usuários de água, representantes políticos e de entidades atuantes 
na respectiva bacia;(RIO GRANDE DO SUL, 2015). 
33 
 
 
 
específicas da Política Nacional de Recursos Hídricos a descentralização da ação do Estado 
por região e por bacias hidrográficas e a ampla participação da sociedade por meio da criação 
dos Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica em cada região. Essa descentralização 
por região é por que o estado do Rio Grande do Sul divide-se em três grandes Regiões 
Hidrográficas: Região Uruguai, Região Litoral e Região Guaíba. 
 
Diante disso, Wilson Cabral de Sousa Júnior (2004, p. 61-62), salienta que: 
 
Aqui se nota um entendimento do legislador de que o usuário (no sentido 
formal dado pela lei, como o detentor da outorga pelo uso da água) é a peça-
chave do sistema. Esse entendimento denota um caráter regulatório do 
sistema de gestão adotado, uma vez que as negociações serão estabelecidas 
tendo como foco não o poder público (modelo gerencial) mas os usuários de 
água. 
 
É importante salientar que as primeiras tentativas de descentralização de atividades de 
gestão hídrica aconteceram no ano de 1976, mediante acordos de iniciativa do Ministério de 
Minas e Energia (MME), consideradas como fase embrionária dos atuais Comitês de Bacia 
Hidrográfica. Interesses de caráter político permearam tais iniciativas, contribuindo na 
extinção gradual dos Comitês especiais criados na época (SOUZA JÚNIOR, 2004). 
 
Entretanto, isento de motivações políticas e com forte enraizamento sociocomunitário, 
o marco da participação social na gestão hídrica no Brasil, se deu noestado do Rio Grande do 
Sul em 1988 com a criação dos Comitês do rio dos Sinos e do rio Gravataí, ambos afluentes 
do Rio Guaíba, que teve um Comitê especial extinto. Na ocasião, as comunidades de ambas 
sub-bacias reuniram-se em conjunto com os setores usuários da água e municípios, e através 
do apoio do Estado, fundaram os Comitês de Bacia Hidrográfica com o objetivo de promover 
a melhoria da qualidade dos recursos hídricos e do meio ambiente na área de suas bacias. Esse 
foi o primeiro caso registrado pela literatura no que se refere ao surgimento dos Comitês de 
Bacia Hidrográfica, sem iniciativa exclusiva do Poder Público (SOUZA JÚNIOR, 2004). 
 
Feitas tais considerações, percebe-se que tanto a Lei Federal quanto a Lei Gaúcha, 
garantem que o gerenciamento efetivo das águas se dará por participação descentralizada e 
igualitária do Poder Público estatal, dos usuários das águas (indústrias, agricultores e 
criadores) e da população em geral que utiliza o recurso para o abastecimento humano. 
 
34 
 
 
 
Sendo feito por bacia hidrográfica e não por limites geopolíticos, o gerenciamento dos 
recursos hídricos que deverá contar com a participação ativa da sociedade civil organizada em 
equilíbrio de forças com o Poder Público, poderá garantir de fato que a política de recursos 
hídricos seja construída de acordo com a real vontade da população e da comunidade local, 
atribuindo valor ao bem quando usado como insumo de processos produtivos e garantindo 
livre acesso quando a água for usada apenas como recurso natural vital. 
 
Esse modelo de gestão democrática, descentralizada e participativa adotado pelo 
ordenamento brasileiro e também gaúcho parece estar muito próximo de um sistema ideal, 
mas claro que como qualquer outro, possui seus defeitos. Ainda assim, é mais avançado do 
que muitos outros sistemas desenhados por países desenvolvidos. Como assevera Souza 
Júnior (2004, p. 152-153), a opção brasileira por um modelo democrático de “gestão de 
recursos hídricos, no aspecto restrito à participação social, representa um avanço, conquanto 
outros países desenvolvidos possuem estruturas bastante centralizadas de gestão.” 
 
No Sistema Estadual de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul, considerado um dos 
mais adiantados do Brasil, o grande entrave que existe ainda atualmente, está na vontade 
política de governantes que, ao deixarem de implementar por completo o sistema como 
preconizado em lei, permitem que a água continue sendo livremente explorada e 
comercializada pelos setores que a utilizam como insumo de processos produtivos, sem impor 
qualquer tipo de controle ou precificação, tanto no estado quanto no país. 
 
Nesse completo Sistema de Gerenciamento das Águas, para que a Lei Gaúcha possa 
ser integralmente cumprida, é preciso que todos os organismos previstos nela de fato existam. 
Conforme determina seu art. 5º, são eles: o Conselho de Recursos Hídricos, o Departamento 
de Recursos Hídricos, os Comitês de Gerenciamento de Bacia Hidrográfica e as Agências de 
Região Hidrográfica (RIO GRANDE DO SUL, 2015). 
 
O Conselho de Recursos Hídricos – CRH constitui órgão deliberativo superior do 
sistema e responsável por resolver os conflitos de água em última instância. Além de emitir 
resoluções e normatizações acerca da política estadual e das políticas de governo para os 
recursos hídricos o órgão é responsável pela definição e gestão do uso dos recursos 
financeiros do Fundo de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul – FRH-RS, principalmente 
provenientes da cobrança pelo uso das águas interestaduais e até estaduais para a geração de 
35 
 
 
 
hidroeletricidade. É formado por um colegiado de Secretários de Estado e de representantes 
dos Comitês de Bacias e dos Sistemas Nacionais de Recursos Hídricos e do Meio Ambiente 
(SECRETARIA DO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO 
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, 2015a). 
 
O Departamento de Recursos Hídricos – DRH é órgão da administração direta que 
representa o Estado junto ao Sistema de Gerenciamento, e tem por função precípua dar o 
suporte técnico necessário ao Conselho Estadual e aos Comitês de Gerenciamento de Bacias, 
ao menos até a criação das Agências de Bacias. Ainda cumpre ao DRH, propor ao Conselho 
de Recursos Humanos os critérios de outorga do uso das águas, bem como elaborar o 
anteprojeto de Lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos, subsidiando o CRH no que tange 
à coordenação e acompanhamento da execução do plano (SECRETARIA DO AMBIENTE E 
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, 
2015b). 
 
Os Comitês de Gerenciamento de Bacias Hidrográficas são colegiados instituídos 
oficialmente pelo Governo Estadual em cada bacia hidrográfica, dentro das três regiões. São 
formados majoritariamente por representantes da sociedade e de usuários das águas. 
Considerados como verdadeiros "parlamentos das águas" lhes cabem à coordenação 
programática das atividades dos agentes públicos e privados, relacionados aos recursos 
hídricos, além de discutir e deliberar sobre os assuntos de interesse comum aos diversos 
usuários da água de uma bacia hidrográfica, compatibilizando no âmbito de sua bacia, a 
crescente melhoria da qualidade das águas, com a preservação de suas quantidades, 
observando as metas estabelecidas no Plano Estadual dos Recursos Hídricos (SECRETARIA 
DO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO ESTADO DO RIO 
GRANDE DO SUL, 2015c). 
 
Além disso, a autonomia dos Comitês de Bacias na instituição das Agências de Bacias, 
responsáveis pela operacionalização dos instrumentos econômicos de responsabilidade dos 
Comitês, representa a garantia da aplicabilidade desses instrumentos em sua região de 
abrangência (SOUZA JÚNIOR, 2004). 
 
Para completar definitivamente osistema previsto no Rio Grande do Sul, faltam as 
Agências de Bacias, a serem instituídas por lei como integrantes da administração indireta do 
36 
 
 
 
Estado, conforme prevê o art. 20, caput, da Lei Gaúcha. De acordo com o previsto nos incisos 
do referido artigo, às Agências de Bacias cumpre o papel mais prático da gestão, ou seja, 
caberá a elas prestar o apoio técnico ao Sistema Estadual de Recursos Hídricos, tendo como 
principal atribuição a de assessorar e subsidiar tecnicamente os Comitês de Gerenciamento de 
Bacias Hidrográficas, inclusive os necessários para a fixação dos valores da cobrança pelo uso 
das águas e pelo rateio dos custos de obras de interesse comum da bacia hidrográfica. Ainda, 
cumpre às Agências o papel de arrecadar e aplicar os valores correspondentes à cobrança pelo 
uso das águas de acordo com o Plano de cada bacia hidrográfica, aprovado e implementado 
com a participação dos Comitês (RIO GRANDE DO SUL, 2015). 
 
Esse então é o ponto essencial a ser perseguido para que a o sistema seja de fato 
efetivado, visto que passados mais de 20 anos desde a aprovação da lei que instituiu o Sistema 
Estadual de Recursos Hídricos no Rio Grande do Sul, assim como mais de 18 anos da 
implantação da Lei Federal que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o 
Sistema Nacional de Gerenciamento desses recursos, ainda não estão implementadas as 
Agências de Bacias Hidrográficas, tornando com isso, impossível a plena implantação do 
Sistema de Gerenciamento dos Recursos Hídricos, com a sistematização da cobrança pelos 
usos das águas. 
 
Assim, a sistematização que vem sendo implementada no Brasil acaba configurando 
uma espécie de sistema híbrido entre os modelos francês e inglês de gestão/operacionalização, 
já que conforme mencionado por Souza Júnior (2004, p. 153-154): 
 
Enquanto a gestão propriamente dita obedece a um esquema 
socioparticipativo, a operacionalização preconiza características econômicas 
neoclássicas, por meio da possibilidade de privatização das empresas 
públicas de abastecimento e saneamento, além do estabelecimento de 
mercados de água com base na comercialização de direitos de uso. A retirada 
do Estado de funções que lhe eram tradicionais – no caso, abastecimento e 
saneamento – mais uma vez colocaria a sociedade em evidência, como 
determinante do papel público no uso de recursos também públicos. E o 
fórum para essa influência são os comitês de bacia. 
 
Sobre a cobrança pelo uso dos recursos hídricos, é importante frisar que essa cobrança 
deve se dar de forma a exigir dos usuários da água a respectiva contrapartida, ressaltando a 
importância da água como essencial à manutenção da vida, nesse sentido, tomada como 
direito humano fundamental, ao contrário do que representa os entes privados que utilizam as 
37 
 
 
 
águas apenas como insumo de produção e meio de incrementar seus lucros na industrialização 
ou produção de mercadorias que posteriormente serão comercializadas. 
 
Portanto, enquanto não houver a vontade política dos governantes, em criar as 
Agências de Bacia Hidrográfica previstas por lei, não haverá a cobrança pela água. Não 
havendo cobrança pela água não haverá também a implementação das ações e medidas 
necessárias para reinvestir os recursos financeiros provenientes desta cobrança em melhorias 
na qualidade das águas e no efetivo controle e fiscalização da utilização das mesmas. Assim, 
esse sistema que parece estar próximo de um modelo ideal, ainda possui deficiências sérias, 
porém solucionáveis, visto que com um pouco mais de ativismo social será possível enraizar 
nos governantes a motivação necessária a implementar completamente às instâncias da 
gestão, servindo o modelo de gestão de águas brasileiro de exemplo para outros países. 
 
Feita a análise acerca da gestão das águas no Brasil e no estado do Rio Grande do Sul 
e considerando-se que o domínio sobre as mesmas é público e sua administração 
compartilhada entre o setor público e outros interessados, cabe examinar os aspectos 
econômicos e sociais da gestão hídrica e principalmente como essas questões vêm sendo 
enfrentadas na atualidade face à escassez de água que assola grande parte do país e do planeta. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
38 
 
 
 
2 A GESTÃO DA ÁGUA NO BRASIL: ASPECTOS ECONÔMICOS E SOCIAIS 
 
A expansão da preocupação com o uso e aproveitamento sustentável dos recursos 
hídricos no Brasil, principalmente nos últimos anos, tem refletido na consolidação de um 
processo mais descentralizado e participativo na gestão das águas, apoiado e fortalecido por 
um ordenamento jurídico-institucional no qual a água tem papel primordial entre os bens 
públicos da humanidade. 
 
Porém, os aspectos de descentralização e participação preconizados na legislação 
brasileira dos recursos hídricos, ainda carecem de definitividade. Tais aspectos se constituem 
na tomada de decisões em níveis hierárquicos mais baixos de governo, ou seja, no âmbito das 
bacias hidrográficas contando com a participação dos usuários, da sociedade civil organizada, 
das ONGs e outros agentes interessados. 
 
Nesse sentido, o presente capítulo pretende analisar os instrumentos de gestão das 
águas no contexto legislativo nacional com especial destaque para os princípios e 
instrumentos da gestão hídrica, previstos na lei nº 9.433/97, sob um viés crítico e reflexivo 
tomando em conta a proposta axiológica prevista na Lei das Águas, em especial o paradoxo 
estabelecido entre a água como bem público e a água como bem privado e precificável. 
 
2.1 Legislação e a economia: uma análise dos instrumentos de gestão hídrica 
 
A preocupação com a preservação da riqueza hídrica encontrada em território 
brasileiro decorre tanto da imprescindibilidade desse recurso para a vida e manutenção do 
equilíbrio natural da biosfera, como de questões essenciais e estratégicas, como aquelas que 
vinculam o discurso de proteção dos recursos naturais com estratégias de mercado. 
 
Ao definir a Política Nacional de Recursos Hídricos e criar o Sistema Nacional de 
Gerenciamento de Recursos Hídricos, a Lei das Águas, lei nº 9.433/97, proporcionou um 
aporte legal importante para o enfrentamento da questão hídrica no Brasil, reorganizando em 
âmbito nacional o setor de gestão e planejamento de recursos hídricos com base em quatro 
princípios básicos: a gestão por bacia, a contemplação dos múltiplos usos, o reconhecimento 
da água como bem público e finito dotado de valor econômico e a exigência de um plano de 
gestão. 
39 
 
 
 
A adoção da bacia hidrográfica como unidade de planejamento e gestão, possibilita a 
distinção de diversos objetivos de uso das águas, tais como o desenvolvimento econômico, a 
equidade social, econômica e ambiental e, a sustentabilidade ambiental. Permite ainda, com 
maior facilidade harmonizar a disponibilidade e a demanda do recurso, essenciais para o 
estabelecimento do balanço hídrico (AMORIM, 2015, grifo nosso). 
 
Os múltiplos usos dos recursos hídricos, regulamentados pela Resolução nº 357/2005 
do Conama, significa que a gestão dos recursos, no que concerne à outorga, deve evitar que 
um setor usuário tenha privilégios em relação aos demais, colocando assim, todas as 
categorias usuárias em igualdade de condições em termos de acesso (MACHADO, 2002, 
grifo nosso). 
 
O reconhecimento da água como bem finito e vulnerável, dotado de valor econômico 
(grifo nosso), procura a partir da lei nº 9.433/97 e da adoção dessa perspectiva reduzir e 
induzir o uso racional de água, servindo de base à exigência de uma contraprestação pelo seu 
uso e viabilizando assim, a aplicação de um dos instrumentos por ela estabelecidos, qual seja, 
a cobrança pelo uso do recurso hídrico (AMORIM, 2015, grifo do autor). 
 
Por último, a definição de gestão descentralizada e participativa, adota como filosofia 
que tudo o quanto puder ser decidido em níveis hierárquicos

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