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TEORIA CONTÁBIL AVANÇADA AULA 1 Prof. Tassiani Aparecida dos Santos CONVERSA INICIAL O objetivo desta aula é fazer uma introdução ao mundo teórico da contabilidade em seus aspectos mais avançados e que tem sido discutido extensivamente pela academia contábil. Portanto, esse conhecimento é fundamental para a formação do contador e para o desenvolvimento da própria contabilidade, que é uma ciência social aplicada e necessita que o desenvolvimento do seu corpo de conhecimento teórico seja disseminado e aplicado na prática profissional. Nesta aula, iniciaremos pelos aspectos conceituais da Teoria contratual da firma, discorrendo sobre os conceitos primordiais. O tema 2 deste material versa sobre os fundamentos da Teoria da agência. Em seguida, o tema 3 irá descrever os elementos primordiais do conceito de conflito de agência. O tema 4 discorrerá sobre os custos de agência. Por fim, o tema 5 explica a intersecção da Teoria da agência e a contabilidade. CONTEXTUALIZANDO Ao longo dos anos, a teoria da contabilidade tem avançado sempre na mesma direção das teorias econômicas. Desde o desenvolvimento teórico dessa disciplina, suas bases foram fundadas nas descobertas microeconômicas, em especial no que tange ao funcionamento do mercado financeiro. Assim, o primeiro aspecto relevante para a compreensão dessa disciplina teórica é a compreensão da base de desenvolvimento teórico: as ciências econômicas. Portanto, ao construirmos os tópicos aqui abordados, estaremos baseados nas teorias clássicas da microeconomia. A função desta aula é apresentar e discutir essas teorias microeconômicas, nomeadamente a Teoria contratual da firma e a Teoria da agência. A compreensão desses aspectos irá proporcionar a compreensão dos conflitos em que a contabilidade está inserida e como ela se relaciona com esse mundo retratado por ambas as teorias citadas. Para começarmos a aquecer as discussões sobre teoria avançada da contabilidade, vamos refletir sobre alguns aspectos relacionados ao dia a dia das empresas: como é a formação das empresas atualmente? Como os diferentes agentes econômicos fazem acordos nas organizações? Como é a relação entre o proprietário da empresa e a diretoria ou gerentes? É amistosa ou conflituosa? Quais são os problemas que existem nessa relação? Quais são os mecanismos 3 que existem para resolver esses problemas? Quem são os agentes que possuem o poder de decisão? Esses e outros questionamentos são importantes para o desenvolvimento desta aula. Reparem: ainda não estamos tratando diretamente da contabilidade, contudo a compreensão das relações econômicas e do comportamento dos diferentes agentes econômicos é essencial para o desenvolvimento da ciência contábil, em especial em meados do século XX. TEMA 1 – TEORIA CONTRATUAL DA FIRMA Neste primeiro tema, trataremos da Teoria contratual da firma, teoria muito importante para o desenvolvimento teórico da contabilidade, pois fundamenta as relações econômicas que ocorrem dentro da firma entre diferentes pessoas (agentes). A origem dessa teoria se deu com o nascimento das ciências econômicas no século XVIII, com a obra de Adam Smith sobre as riquezas das nações. A teoria microeconômica clássica pressupõe que o objetivo de uma empresa é maximizar o lucro e que os agentes são racionais e visam à maximização de sua utilidade (Boaventura et al., 2009). Para compreendermos melhor essa relação econômica da Teoria contratual da firma e seus desdobramentos em relação ao comportamento das pessoas dentro das empresas, vamos descrever os principais aspectos dessa teoria e como ela explica as relações entre os agentes. Sob os pressupostos teóricos dessa teoria, a empresa é vista como um conjunto de contratos, formais e informais, entre os diversos participantes das relações econômicas empresariais. Assim, podemos pensar que cada participante contribui com algo para a firma e, em troca, recebe uma contraprestação. Nisso consiste a relação contratual da firma: um agente contribui para a firma e, em troca, recebe uma bonificação, estabelecida por contrato de maneira formal ou informal (Iudícibus; Lopes, 2004). Por exemplo, os empregados contribuem com sua força de trabalho e, em troca, recebem seus salários; os acionistas contribuem com capital e, em troca, recebem dividendos e ganhos de capital; os fornecedores contribuem com produtos e serviços e recebem dinheiro, enquanto o governo contribui com a estabilidade institucional e, para isso, recebe os impostos (Iudícibus; Lopes, 2004). 4 É importante perceber que as relações entre os agentes, conhecidas como contrato, podem ser estabelecidas de maneira formal, como no caso dos empregados e acionistas, ou de maneira informal, como no caso do governo e em alguns tipos de contrato com clientes e fornecedores. Em todos os casos, as relações econômicas entre os agentes são estabelecidas por um outro tipo de contrato (Iudícibus; Lopes, 2004). Na prática, essas relações contratuais geram alguns problemas devido a duas situações que podem ser encontradas: informação imperfeita e informação incompleta. Os casos caracterizados como de informação imperfeita são aqueles em que as regras do jogo são claramente definidas e todos os agentes as conhecem, contudo os agentes não conhecem as ações dos outros agentes. Um exemplo disso é um jogo de pôquer, no qual as regras são claras, mas nenhum jogador conhece as cartas e intenções dos outros jogadores (Iudícibus; Lopes, 2004). Informação incompleta é o caso em que nem mesmo as regras do jogo são totalmente claras. Por exemplo, podemos citar uma partida de futebol. Nesse caso, existem regras do jogo, contudo a aplicação mais rigorosa ou menos rigorosa depende do árbitro da partida (Iudícibus; Lopes, 2004). Quando as relações contratuais não funcionam de forma adequada, a firma pode ter graves problemas para seu equilíbrio e funcionamento e até mesmo quebrar, como no caso da empresa Enron, como descrito por Iudícibus e Lopes (2004): Essa empresa conseguiu durante muito tempo esconder do mercado e, principalmente, de seus acionistas sua real situação financeira. Nesse caso, tem-se uma clara quebra de contratos entre os acionistas e os executivos da empresa. Por outro lado, os auditores que deveriam contribuir para reduzir o conflito também não cumpriram com suas obrigações. Assim, podemos sumarizar a Teoria contratual da firma como uma teoria econômica amplamente utilizada para explicar as relações econômicas que afetam a firma e a própria contabilidade. Dentro desse cenário, os diferentes contratos da firma irão determinar as relações econômicas existentes, de maneira formal ou informal. Enquanto essas relações são idealmente uma troca entre os agentes e a firma, de recursos, capitais ou força de trabalho, por uma remuneração, problemas de dois tipos são comumente encontrados nessas relações contratuais: informação imperfeita e informação incompleta. Dessa maneira, com base na compreensão da Teoria contratual da firma, iremos 5 abordar nos próximos temas desta aula, aspectos primordiais da Teoria da agência, que pode ser compreendida como uma extensão dos conceitos teóricos da teoria que acabamos de estudar. TEMA 2 – TEORIA DA AGÊNCIA Agora iremos tratar dos fundamentos da Teoria da agência. Em primeiro lugar, é preciso compreender que uma empresa é formada por dois tipos de agentes: os que possuem o capital e os meios de produção, que são os proprietários da firma, e os que possuem sua força de trabalho, os demais agentes. Contudo, quando um proprietário delega a administração a um agente (que não possui a propriedade da firma), passa a existir uma relação econômica entre o principal (proprietário da firma) e um agente (administrador). Dessa forma, iniciamos a discussãosobre os elementos fundamentais da Teoria da agência. Como explicitado no parágrafo acima, a Teoria da agência surge da separação entre o proprietário dos meios de produção e do capital e o administrador do negócio. Esse fato histórico surge com a profissionalização da gestão e a delegação de trabalho para um administrador. Antes, a administração da firma era de responsabilidade do proprietário, ou seja, administrador e dono da empresa eram a mesma pessoa (Akerlof, 1970; Watts; Zimmerman, 1978). Mas com essa separação entre proprietário e administrador surgiram conflitos e relações econômicas que foram explicadas pela Teoria da agência. Um desses problemas que surgiu com a separação entre o principal (proprietário da empresa) e o agente (administrador) foi a assimetria de informação. Os agentes, que tinham a responsabilidade de administrar o negócio do principal e assegurar o melhor resultado econômico para a firma, possuíam informações que o principal não tinha acesso. Mas por quê? É importante salientar que, ao delegar a administração da empresa para um terceiro (o agente), o proprietário perde acesso a todas as informações da empresa porque não está diretamente envolvido com o negócio, não está diariamente na empresa e não acompanha o dia a dia operacional de seu negócio. Esse fato gera a assimetria de informação, ou seja, o proprietário tem menos informações sobre sua firma do que o administrador que ele escolheu para gerir o seu negócio (Akerlof, 1970; Watts; Zimmerman, 1978). 6 Diante da assimetria de informação, que acabamos de discorrer, e da teoria microeconômica clássica, existe um problema que fundamenta a Teoria da agência: o ser humano é maximizador da sua utilidade individual e, portanto, age em benefício próprio. Isso significa que, dentro da organização, o administrador irá priorizar seus próprios benefícios em vez da maximização do lucro empresarial, desejado pelo proprietário. Como exemplo desse comportamento do agente, vamos citar o caso de participação nos resultados da empresa. Em muitas companhias, é comum os gestores receberem incentivos para maximizarem o lucro do proprietário; assim, como um prêmio pelo alcance de um resultado desejado pelo dono da empresa, o gestor recebe uma fatia do lucro da empresa em valores monetários. Portanto, o gestor só irá se esforçar para alcançar os lucros desejados pelo empresário quando for receber uma parcela do mesmo, como forma de remuneração variável (Akerlof, 1970; Watts; Zimmerman, 1978). De forma similar ocorre com as punições. Os agentes irão desempenhar um resultado positivo e alcançarão as metas estabelecidas, se sua posição na companhia depender disso. Assim, se houver uma regra clara sobre a permanência do gestor na empresa estar atrelada aos resultados econômicos desejados, então os agentes irão se esforçar para atingir esses resultados (Akerlof, 1970; Watts; Zimmerman, 1978). Um dos pressupostos da Teoria da Agência é que, à medida que o direito pela propriedade do administrador diminui, o seu incentivo a dedicar esforços significativos também diminui consideravelmente. Isto é, quando o administrador é também o dono da empresa, ele terá maiores incentivos para se esforçar em direção à maximização dos resultados da empresa. Agora, à medida que o administrador não tem tanto direito sobre a propriedade ou não possui nenhum direito, seus esforços serão direcionados cada vez mais para o aspecto individual em vez do empresarial. Os teóricos da teoria econômica afirmam que esse problema pode ser resolvido via remuneração, em especial a remuneração variável, como é o caso da participação nos resultados da empresa. Quanto maior o resultado da empresa, maior a compensação que o gestor receberá, portanto esse agente se esforçará para alcançar o melhor resultado possível (Akerlof, 1970; Watts; Zimmerman, 1978). Assim, surge o questionamento em relação a como corrigir as divergências de interesse entre o agente e o principal. Ainda, monitoramento, 7 vigilância e garantias: compensam? Esses questionamentos têm sido objeto de estudo dos pesquisadores, que tentam desenvolver regras de conduta para que o agente maximize o interesse do principal. Esse seria o mundo ideal. TEMA 3 – CONFLITOS DE AGÊNCIA No tema anterior, discorremos sobre os aspectos gerais da Teoria da agência. Como vimos, a relação de agência gera um conflito entre agente e principal, decorrente da divergência de interesses entre eles, fato explicado pela teoria microeconômica clássica (Akerlof, 1970; Watts; Zimmerman, 1978). Neste tópico, com o intuito de compreender essa questão e os efeitos para a organização, iremos aprofundar a discussão acerca desse conflito de agência. Segundo a teoria microeconômica clássica, o ser humano irá sempre maximizar sua utilidade individual. Portanto, o proprietário e o agente terão sempre interesses conflitantes dentro da empresa, cada qual objetivando maximizar sua utilidade individual (Akerlof, 1970; Watts; Zimmerman, 1978). Os administradores (agentes) irão procurar por situações vantajosas para si, de maneira geral, com o intuito de obter cada vez mais recursos econômicos e financeiros. Como exemplo, podemos citar situações que podem eventualmente acontecer das relações econômicas envolvendo os gestores, que tomarão decisões que tragam benefícios diretos ou indiretos para si: ao negociar com fornecedores ou clientes, os gestores podem tomar decisões prejudiciais para a empresa, mas que tragam benefícios para si, monetários ou não; os gestores podem contratar funcionários que são membros de sua família para trabalharem em sua equipe, mas estes podem não ser os melhores candidatos para a vaga de emprego; nesse caso, a decisão do gestor não foi em benefício da empresa, mas em benefício próprio, direta ou indiretamente etc. E os proprietários também estão procurando oportunidades de aumentar suas riquezas. Portanto, eles desejam que os administradores tomem decisões para maximizar o lucro da empresa. Por exemplo, o principal pode dar ordem para a retirada do bônus dos gestores; essa decisão irá desagradar os administradores e demonstra um interesse de maximizar sua utilidade individual, ou seja, a riqueza da organização. Outro exemplo é quando a empresa decide diminuir a qualidade de determinado produto para ter um lucro maior. Essa decisão visa maximizar sua utilidade, contudo irá afetar aos clientes, que obterão produtos com qualidade inferior. 8 Dentro das organizações, a princípio, o administrador está na posição de atender aos interesses da firma, ou seja, do proprietário da empresa. Deveria, portanto, se comportar de maneira a tomar as melhores decisões para aqueles que representam: os proprietários. Contudo, ao objetivar maximizar sua utilidade, ou seja, atingir seus próprios interesses, os agentes vão procurar tomar decisões que aumentem seu poder dentro da organização. Dessa forma, suas decisões tendem a aumentar mais ainda a assimetria informacional entre os agentes. Ao tomar decisões que tendem a aumentar seu poder dentro da organização, os agentes irão aumentar a assimetria informacional com o principal, visto que é a assimetria informacional, ou seja, a falta de conhecimento do principal, que gera o poder do agente (administrador). Dessa maneira, o proprietário terá que encontrar mecanismos para diminuir essa assimetria de informação, uma vez que esse comportamento do agente pode levar a organização para caminhos diferentes daqueles desejados pelo dono da empresa. Ainda, esses conflitos de agência podem ser prejudiciais para a empresa, levando a companhia, por vezes, ao caminho do fracasso. O caso da empresa Enron é um exemplo desse tipo, gerado pela presença de conflito de agência. Os executivos da empresa (agente) conseguiram por muito tempo esconder do mercado e, principalmente,dos seus próprios acionistas (principal) sua real situação financeira, fato que levou à falência da empresa (Iudícibus; Lopes, 2004). O tema 3 desta aula tratou do aprofundamento dos conflitos de agência existentes na empresa. O que é importante gravar desse tópico é o fato de que os conflitos de agência surgem da necessidade do ser humano de maximizar sua utilidade individual e da separação entre principal e agente dentro das empresas, dois aspectos que foram tratados no tema 2 desta aula. Dessa natureza econômica dos agentes, surge, também, a assimetria de informação. O executivo da empresa possui maior nível de informação de qualidade e menor incerteza, comparado ao principal; esse fato acarreta em conflitos de agência, que são as tomadas de decisão, por parte do agente, divergentes dos interesses do principal. Como o proprietário pode tratar esses conflitos de agência? 9 No próximo tema da nossa aula, iremos abordar os custos de agência, os quais são consequência dos conflitos de agência, uma vez que o principal irá objetivar implementar mecanismos para diminuir a assimetria de informação. TEMA 4 – CUSTOS DE AGÊNCIA Nos tópicos anteriores, introduzimos alguns problemas decorrentes da relação de agência e o surgimento de questionamentos em relação a como corrigir as divergências de interesse entre o agente e o principal, ou seja, o conflito de agência. Relembrando, conforme Niyama (2014): Uma relação de agência pode ser definida como um contrato sob o qual uma ou mais pessoa (o principal) designam uma outra (o agente) para executar algum serviço em seu benefício que envolve a delegação de alguma autoridade decisória para o agente. O ponto central da Teoria da Agência é o fato de que o agente busca maximizar a sua utilidade e, portanto, nem sempre age no melhor interesse do principal. É desse conflito que surgem os custos de agência, que representam a soma dos seguintes custos: monitoramento, vinculação e perda residual. Assim, podemos assegurar que os custos de agência são decorrentes dos conflitos que surgem naturalmente entre o agente e o principal, e que estão relacionados ao desalinhamento de seus interesses individuais e da assimetria informacional. A assimetria de informação existente entre o agente e o principal prejudica a conduta racional e estratégica dos indivíduos. Ao não ter acesso a todas as informações para a tomada de decisões, os indivíduos podem ser direcionados para decisões que não irão, necessariamente, implicar uma maximização da utilidade individual. É claro que essa diferença existe naturalmente, e é conhecida pelos agentes, entretanto isso gera uma diferença nos níveis de qualidade da informação e na incerteza existente entre os diferentes agentes. Como consequência, há um aumento dos custos de transação existentes nas relações econômicas. Mas o que são esses custos de agência? Como discutimos no tema anterior, os agentes têm interesses que muitas vezes conflitam com o objetivo do principal. Desses conflitos surgem o questionamento, por parte do proprietário, de como alinhar o comportamento dos agentes aos seus interesses. Os seguintes custos de agência representam os principais mecanismos de alinhamento entre principal e agente, conforme Niyama (2014): 10 Monitoramento: representam os custos decorrentes do monitoramento do comportamento dos agentes, tais como: auditorias periódicas, restrições orçamentárias, controle de atividades, estabelecimento de programas de compensação, etc. Vinculação: são os custos relacionados aos mecanismos que visam garantir que os gerentes atuem de acordo com os interesses do principal, ou garantir que eles compensem o principal, caso atuem de maneira contrária a esses interesses. Tais mecanismos podem ser instituídos pelos próprios gerentes (agentes) que, nesse caso, também arcam com tais custos. São exemplos: divulgações voluntárias de informações contábeis adicionais, garantia de submeter as demonstrações contábeis a auditorias, limitação do poder de decisão do agente, metas e indicadores de desempenho organizacional. Perda residual: é fruto da impossibilidade de garantir que ações do agente sempre serão no melhor interesse do principal. Trata-se de um custo residual, que reduz o valor da firma, cuja extensão dependerá da eficiência dos contratos que estabelecem o monitoramento e a vinculação. Consiste na redução da riqueza do principal, em razão de divergências entre as decisões que maximização e aquelas tomadas pelo agente. Como exemplo, tem-se a situação de price protection, em que os credores impõem uma maior taxa de juros à firma, em razão da ausência de mecanismos de vinculação ou que controlem a atuação do agente. Em suma, os custos de agência são decorrentes da implementação de mecanismos para diminuir a assimetria informacional decorrente do desalinhamento entre agente e principal, aspecto natural do ser humano, que visa maximizar a utilidade individual. Em decorrência desse desalinhamento natural, surgem três tipos de custos de agência: os custos de monitoramento, os custos de vinculação e os custos relacionados a perdas residuais. TEMA 5 – TEORIA DA AGÊNCIA E CONTABILIDADE O último tópico desta aula tratará da intersecção entre a Teoria da agência e a contabilidade. Dentro desse contexto, a contabilidade é um mecanismo de diminuição da assimetria de informação, que visa divulgar as informações 11 econômicas e financeiras aos usuários da informação contábil. Assim, investidores e credores, como acionistas e fornecedores, e ainda, clientes, funcionários, governo e a sociedade como um todo podem ter acesso às informações contábeis, fato esse que diminui a assimetria de informação entre os agentes e o principal. E, portanto, a informação contábil consiste em um custo de agência para a organização, mas também é um mecanismo de diminuição dos outros custos de agência dentro da empresa. Um dos tópicos mais estudados pela teoria da contabilidade são os mecanismos para diminuir o poder dos agentes para manipular o resultado contábil e, assim, obter melhores resultados, ou seja, diminuir a assimetria da informação. Dois fatos podem acontecer: primeiro, quando um resultado é positivo, o executivo tende a deixá-lo mais positivo para obter parcelas maiores de remuneração variável, assim irá gerenciar o resultado contábil para esse fim. Outro caso é quando o resultado da empresa é negativo, assim o executivo tende a deixá-lo mais negativo, uma vez que o impacto negativo no resultado contábil será sentido de uma só vez pela empresa. Portanto, o agente descarrega em apenas um período os valores que podem afetar o resultado contábil em outros períodos. Esse fato foi percebido nas demonstrações contábeis da Petrobrás, que, após os escândalos da Lava Jato e com um valor de mercado já abalado, resolveu lançar no resultado contábil um grande valor de impairment, aproveitando para “limpar” a contabilidade. Essas ações são decorrentes de assimetria de informação entre os diferentes agentes econômicas na relação da firma. Iudícibus e Lopes (2004) abordam cinco funções contábeis na coordenação dos vários contratos dentre agente e principal existente nas empresas: Mensurar a contribuição de cada um dos participantes nos contratos: um exemplo está nos papéis da contabilidade na remuneração dos executivos. Para reduzir os impactos do conflito de agência, tem sido apresentada a chamada remuneração variável. A ideia consiste na remuneração atrelada aos resultados da empresa. Dessa forma, os executivos são avaliados de acordo com sua participação nos contratos com o principal. Mensurar a fatia a que cada um dos participantes tem direito do resultado da empresa: para que o tópico anterior seja efetivamente 12 praticado, é necessário que se tenha uma métrica de avaliação dedesempenho do executivo, para que ele possa ser remunerado adequadamente. Informar os participantes a respeito do grau de sucesso no cumprimento dos contratos: a contabilidade também é um instrumento de avaliação de desempenho e feedback para os executivos, visto que a informação contábil é reconhecida como neutra e, portanto, eficaz para medir o resultado da organização de maneira imparcial entre os diferentes agentes econômicos. Distribuir informação para todos os potenciais participantes em contratos com a empresa para manter a liquidez de seus fatores de produção: a contabilidade também surge como um mecanismo de diminuição da assimetria da informação entre a empresa e outros agentes, como o governo, credores e a sociedade, mantendo assim a liquidez de seus ativos. Distribuir algumas informações como conhecimento comum para reduzir o custo da negociação dos contratos: outro mecanismo contábil para diminuir os custos de transação entre os contratos é a divulgação voluntária de informação contábil. Esse mecanismo tem como intuito diminuir ainda mais os custos de agência, ao tornar os demais agentes ainda mais informados para a tomada de decisões. Em suma, a contabilidade surge como um mecanismo para mitigar a assimetria de informação entre os agentes econômicos. Ao divulgar as informações econômicas e financeiras das empresas, a contabilidade contribui para a diminuição da assimetria de informação entre os diferentes agentes econômicos e, consequente, dos custos de agência. TROCANDO IDEIAS Para consolidar os conhecimentos adquiridos nesta aula, vamos realizar uma atividade de fórum. Você deverá articular os conceitos aprendidos nesta aula introdutória sobre as principais bases de desenvolvimento da teoria da contabilidade: as teorias microeconômicas clássicas, Teoria contratual da firma e Teoria da agência. Para tanto, elabore uma opinião, expondo os principais 13 conceitos supracitados das duas teorias no fórum, no qual o objetivo é debater com seus colegas. Essa atividade auxiliará na fixação dos conteúdos estudados. NA PRÁTICA Caros alunos, chegamos à última tarefa da nossa primeira aula. Essa atividade tem cunho prático, para que vocês possam desenvolver essas habilidades durante o curso. Embora esta aula tenha envolvido basicamente questões conceituais, iremos sempre fazer exercícios de abstração e reflexão de questões do mundo econômico. Pense, reflita, aplique os conceitos estudados sobre assimetria da informação nesta aula e elabore uma resposta para a seguinte questão: Você já se perguntou o porquê de o preço de um carro diminuir só de sair da concessionária? Em questões de minutos, um bem durável chega a perder quase um quinto de seu preço. Isso significa que, ao comprar um veículo zero quilômetro, após minutos da retira do bem da concessionária, ele já não possui o mesmo valor de mercado e sofre uma grande desvalorização. Resolução: esta aula tratou das teorias clássicas da microeconomia. O aluno deverá relacionar o ponto central de ambas as teorias, Teoria contratual da firma e Teoria da agência, que se refere à assimetria de informação presente nas relações econômicas dos diversos agentes econômicos. Nesse caso prático, tratamos do clássico problema do Marktet for Lemons, no qual a assimetria de informação entre os diferentes agentes econômicos gera um efeito denominado seleção adversa. Assim, podemos explicar por que um carro tem seu valor de mercado desvalorizado apenas uma fração de tempo após a saída da concessionária. No caso prático apresentado, um comprador de um veículo zero quilômetro decide vender o bem pouco tempo depois da aquisição. Ao adentrar ao mercado de veículos seminovos, vê o valor do bem ser muito desvalorizado, mesmo estando em estado praticamente novo. Por que isso acontece? Esse é o típico exemplo do Market for Lemons, gerado pela assimetria da informação. O comprador do veículo novo sabe exatamente o estado de seu bem uma fração de tempo após a sua aquisição. Contudo, ao se tornar vendedor no mercado de automóveis usados, o novo comprador não tem informações acerca do estado e motivos que levaram à transação econômica. Geralmente, no mercado de 14 automóveis usados, existem carros de má qualidade e boa qualidade, mas o comprador não possui essa informação. Por esse motivo, o valor dos carros de boa qualidade, como no nosso caso prático, é excessivamente desvalorizado, assim eventualmente carros de má qualidade têm seu valor de mercado superavaliado. Nos dois casos, de má e boa qualidade, a assimetria de informação entre os agentes econômicos, comprador e vendedor, gera um valor médio para os veículos. Isso acarreta em desvalorização maior de carros que deveriam ser considerados como “quase novos”. FINALIZANDO Esta aula tratou dos aspectos teóricos da economia que impactam diretamente a visão das ciências contábeis. A Teoria contratual da firma e a Teoria da agência são duas bases fundamentais para compreender o papel da contabilidade dentro do mercado financeiro. Como vimos nesta aula, a contabilidade é um importante mecanismo de diminuição da assimetria de informação e dos custos de agência dentro das relações econômicas. No primeiro tema desta aula, foram apresentados os principais conceitos da Teoria contratual da firma, em especial como foi o seu surgimento e seus elementos fundamentais. Após compreender a relação contratual da firma, os temas 2, 3 e 4 trataram da Teoria da agência, que surge da separação entre administrador e proprietário da firma. O tema 2 versou sobre as bases fundamentais da Teoria da agência. O tema 3 discorreu sobre o conflito de agência. O tema 4 explicitou os custos de agência. Por fim, o tema 5 concluiu esta aula demonstrando o papel da contabilidade dentro desse cenário da Teoria da agência, como um mecanismo de diminuição da assimetria informacional entre os agentes econômicos. 15 REFERÊNCIAS AKERLOF, G. A. The market for “lemons”: quality uncertainty and the market mechanism. The Quarterly Journal of Economics, v. 84, n. 3, p. 488-500, 1970. BOAVENTURA, J. M. G. et al. Teoria dos stakeholders e Teoria da firma: um estudo sobre a hierarquização das funções-objetivo em empresas brasileiras. Revista Brasileia de Gestão de Negócios, v. 11, n. 32, p. 289-307, 2009. IUDÍCIBUS, S.; LOPES, A. B. Teoria avançada da contabilidade. São Paulo: Atlas, 2004. NIYAMA, J. K. Teoria avançada da contabilidade. São Paulo: Atlas, 2014. WATTS, R. L.; ZIMMERMAN, J. L. Towards a positive theory of the determination of accounting standards. The Accounting Review, v. 53, p. 112-134, 1978.
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